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ABILIO ARRUDA

PSICOPEDAGOGIA E EDUCAÇÃO
RELIGIOSA CRISTÃ

2013
AGRADECIMENTOS

À Profª. Me. Edy Simone Del Grossi, Psicopedagoga, quem me orientou na


confecção da minha monografia de Especialização em Psicopedagogia.

Ao Rev. Ricardo Baracho dos Anjos, pastor da Igreja Presbiteriana Independente do


Jardim Leonor, Londrina, Paraná, e ao Conselho da mesma, que abriram as portas
da comunidade para que pudesse realizar meu estágio em Psicopedagogia
Institucional.

2
À Rose, oportunidade do amor.
Às minhas filhas, oportunidade de aprendizado.

3
“Quem não compreende um olhar
tampouco compreenderá uma longa explicação.”

Mário Quintana

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................07

4
PRIMEIRA PARTE: ASPECTOS BÍBLICO-TEOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO
RELIGIOSA CRISTÃ.................................................................................................09

I TEOLOGIA BÍBLICA DA EDUCAÇÃO RELIGIOSA................................................10


1 A Educação Religiosa no Antigo Testamento.......................................................10
1.1 A sinagoga...........................................................................................................12
1.2Educação religiosa no Antigo Testamento: métodos e propostas..................... 12
2 A Educação Religiosa Cristã no Novo Testamento..............................................13
2.1 Jesus como Mestre nos evangelhos....................................................................14
2.2 A relação educador/educando nos evangelhos...................................................16

II O REINO DE DEUS COMO PARADIGMA DA EDUCAÇÃO RELIGIOSA


CRISTÃ................................................................................................................19
1 Educação Religiosa Cristã para a Vida................................................................23
1.1 O ser humano como "ser aprendente".................................................................24
2 Vida e liberdade: Reino de Deus e Educação Religiosa Cristã........................... 27

III TEOLOGIA LATINO-AMERICANA E EDUCAÇÃO RELIGIOSA CRISTÃ.............31


1 A Educação Religiosa Cristã como Educação Popular........................................31
2 A Educação Religiosa Cristã como Processo de Alienação.................................33
3 A Educação Religiosa Cristã como Processo Libertador.....................................35

SEGUNDA PARTE: PSICOPEDAGOGIA APLICADA À EDUCAÇÃO RELIGIOSA


CRISTÃ.................................................................................................................40

I PSICOPEDAGOGIA: ASPECTOS HISTÓRICOS E PRÁTICOS.............................41


1 Breve Histórico da Psicopedagogia........................................................................41
2 Dificuldades de Aprendizagem................................................................................44
3 A Psicopedagogia Institucional...............................................................................46
4 A Psicopedagogia Clínica........................................................................................52
II PSICOPEDAGOGIA E EDUCAÇÃO RELIGIOSA CRISTÃ....................................56
1 Educação Religiosa Cristã e Escola Dominical.......................................................56
2 Psicopedagogia e Escola Dominical: a intervenção psicopedagógica....................59
2.1 Histórico da instituição..........................................................................................60
2.2 Filosofia de trabalho.............................................................................................60

5
2.3 Espaço físico........................................................................................................61
2.4 População atendida..............................................................................................61
2.5 Formação e capacitação docente........................................................................61
2.6 Sistema de avaliação...........................................................................................62
2.7 Reunião com os pais............................................................................................62
2.8 Etrevistas..............................................................................................................62
2.9 Testes psicopedagógicos.....................................................................................62
2.10 1º Sistema de hipóteses.....................................................................................63
2.11 Observações......................................................................................................63
2.12 2º Sistema de hipóteses.....................................................................................63
2.13 Relatório de assessoramento.............................................................................63
2.14 Devolutiva...........................................................................................................64
3 Psicopedagogia e Escola Dominical: quem são nossos alunos?...........................64
3.1 Crianças de 2 a 3 anos.........................................................................................64
3.2 Crianças de 4 a 6 anos.........................................................................................65
3.3 Crianças de 7 a 9 anos.........................................................................................65
3.4 Pré-adolescentes (10 a 12 anos).........................................................................66
3.5 Adolescentes (13 a 17 anos)................................................................................66
3.6 Jovens..................................................................................................................66
3.7 Adultos..................................................................................................................67

4 Psicopedagogia e Escola Dominical: o quê e como ensinar?.................................67


4.1 Crianças de 2 a 3 anos.........................................................................................68
4.2 Crianças de 4 a 6 anos.........................................................................................69
4.3 Crianças de 7 a 9 anos.........................................................................................70
4.4 Pré-adolescentes (10 a 12 anos).........................................................................71
4.5 Adolescentes (13 a 17 anos)................................................................................72
4.6 Jovens e adultos...................................................................................................73

CONCLUSÃO.............................................................................................................74

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...........................................................................76

APÊNDICE: RELATÓRIO DE INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA


INSTITUCIONAL REALIZADA NA IGREJA PRESBITERIANA INDEPENDENTE DO
JARDIM LEONOR – LONDRINA – PARANÁ.............................................................81

6
INTRODUÇÃO

A Educação é um fenômeno humano. Por sermos inacabados, precisamos buscar meios de


nos construir e de sobreviver frente aos obstáculos que o meio ambiente nos proporciona. Assim
agindo, criamos mecanismos de sobrevivência, criamos cultura. Cada povo tem a sua cultura e esta
precisa ser repassada para as novas gerações. Ao processo de repassar às novas gerações os
mecanismos de sobrevivência, a cultura, denominamos Educação.
Todos os povos desenvolvem métodos e metodologias de repasse de
informações e essas informações também visam à socialização, isto é, ao
aprendizado de normas e condutas para conviver em sociedade, sendo que um dos
fatores culturais mais poderosos para a manutenção de normas e condutas de uma
sociedade é a religião. Também o aparato religioso de um povo deve ser repassado
às novas gerações, e a esse processo denominamos educação religiosa.
Tanto o Antigo quanto o Novo Testamento nos revelam a existência de um processo
pedagógico com vistas ao ensino religioso, com seus modelos, métodos, metodologias e objetivos
voltados para a socialização, primeiro do povo hebraico/judeu, em seu contexto religioso-sacrificial
delineado pela Lei e, depois, no contexto de uma doutrina que emerge como religião em meio a
tantas doutrinas religiosas do período helênico.
A utopia do Reino de Deus é o paradigma da educação religiosa tanto no Antigo quanto no
Novo Testamento. Este último evidencia o surgimento da Igreja como instituição educativa que tem
por finalidade educar seus partícipes para que possam compreender e efetivar o Reino de Deus, com
seus ideais geradores e mantenedores da vida e da liberdade.
No entanto todo processo educacional se torna bilateral. Por um lado reproduz todo um
sistema da ideologia dominante, onde aos educandos é imposta toda uma carga massificante que o
torna um ser passivo e alienado. Por outro lado, contudo, pode produzir novas formas de
educação/pedagogia que viabilize o diálogo, respeitando o conhecimento que o educando já adquiriu
no decorrer da vida.

O processo educacional cristão não deve basear-se apenas na mudança do pensamento


religioso através da transmissão de novas informações. Para que o ser humano possa ter certa
atitude em relação a um determinado objeto, este deve ser abordado em relação aos sentidos, pois
são nos contextos de situações reais que se dá a relação ensinagem/aprendizagem.
É este o objetivo deste livro. Mostrar que o processo educativo/pedagógico pode ser
prazeroso, já que aprender envolve nossos sentidos. Mostrar que em cada fase das nossas vidas
somo capazes de adquirir conhecimento ou não. Conhecimento á adquirido quando informações são
processadas pelo cérebro/mente e para que possamos ter acesso à dada informação esta precisa ser
compreendida. Crianças, adolescentes, jovens e adultos têm “modos” diferenciados de adquirir
informação e estes “modos” têm que ser respeitados sob pena da não aquisição da informação e,
como consequência, de conhecimento.

7
A Psicopedagogia tem como objetivo prevenir, amenizar e até sanar estas disparidades no
processo de ensinagem e aprendizagem. Busca, por meio do diagnóstico e do prognóstico, viabilizar
novos modelos, métodos e metodologias para que o processo educativo/pedagógico seja prazeroso
e, por isso, efetivo.

Ao correlacionar Psicopedagogia e Educação Religiosa Cristã, queremos contribuir com este


importante ministério da Igreja como instituição que tem como objetivo educar para a vida em
abundância, que é o alicerce do Reino de Deus.

PRIMEIRA PARTE

ASPECTOS BÍBLICO-TEOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO RELIGIOSA CRISTÃ

8
I TEOLOGIA BÍBLICA DA EDUCAÇÃO RELIGIOSA CRISTÃ

A educação religiosa cristã encontra parâmetros em toda a Escritura. O Antigo e o Novo


Testamento estão repletos de textos que dão bases sólidas para a realização de um programa de
educação religiosa cristã. Dissertar sobre essas bases é o que objetiva a primeira parte desta
monografia, que será dividida em dois momentos. Um primeiro aspecto a ser desenvolvido neste
capítulo, com base nos livros do Êxodo e do Deuteronômio, é como se dava o processo de ensino no
Antigo Testamento, seus métodos e objetivos. Já no Novo Testamento, abordar-se-á a figura de
Jesus de Nazaré, o Mestre por excelência, quais os métodos que utilizava para ensinar e com quais
objetivos. Outro aspecto que será abordado no Novo Testamento é a relação educador/educando
(mestre/discípulo) presente nos evangelhos.

1 Educação Religiosa no Antigo Testamento

Ao nascer, a criança imediatamente passa a participar de um grupo menor, a família, que por
sua vez pertence a um grupo maior, um clã, uma tribo. Esse grupo maior possui certos costumes,
certas crenças, uma maneira peculiar de ser e de viver que é transmitida de geração a geração e que

9
caracteriza o que se denomina cultura. À transmissão, por parte da geração precedente, da herança
cultural de um povo à nova geração, dá-se o nome de educação. Quando o que se transmite são os
costumes e as tradições religiosas, obtém-se a chamada educação religiosa.

Todo esse processo, como não poderia deixar de ser, também ocorre com o povo hebreu. A
educação religiosa judaica se dá, assim como em todos os povos, por meio de métodos peculiares e
objetivos definidos, dentre os quais se abordará alguns. No Antigo Testamento, especialmente nos
livros do Êxodo e do Deuteronômio, encontram-se claras evidências da existência de um sistema
educacional entre os hebreus e, posteriormente, entre os judeus.

É fator inquestionável que toda educação começa em casa, e que os primeiros educadores
são os pais. À criança hebréia e, depois à judia, era transmitida a história de seu povo. Eram-lhes
relatados os atos de Javé em prol de seus antepassados, a começar pela chamada de Abraão, pela
saída da terra do Egito e a peregrinação no deserto com destino à terra prometida (GEORGE, 1988,
p. 45). Toda essa história, bem como as leis de Deus, deve ser transmitida pelos pais aos filhos, de
geração a geração (cf. Êx 12,26; 13,8,14; Dt 6,4-9,20-21; 11,19). O que vale a pena ressaltar, é que
de todas essas passagens a mais importante é Dt 6,4-9, conhecido por Shema, por se tratar do
fundamento bíblico-teológico onde se baseia todo o ensino religioso no Antigo Testamento, e que,
portanto, faz-se necessário descrevê-la:

4. Escuta Israel! O Senhor nosso Deus, é o Senhor que é UM.


5. Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com todo o
teu ser, com todas as tuas forças.
6. As palavras dos mandamentos que hoje te dou estarão presentes
no teu coração;
7. tu os repetirás a teus filhos; tu lhes falarás deles quando estiveres
em casa e quando andares pela estrada, quando estiveres deitado e
quando estiveres de pé;
8. tu farás deles um sinal amarrado à tua mão, uma faixa entre teus
olhos;
9. tu os inscreverás sobre as ombreiras da porta de tua casa e na
entrada de tua cidade.1

Como já foi dito, o processo educacional se dá, desde a mais remota antiguidade, no lar, e no
período anticotestamentário não foi diferente. Nos tempos do patriarcado não havia sistema
organizado de instrução. O lar era a única escola, e os pais eram os únicos professores
(ARMSTRONG, 1987, p. 19. Cf. Êx 12,26-27; Dt 4,9-10; 6,4-7; 11,18-19; 32,7). As crianças ocupavam
lugar de significativa importância entre o povo, sendo que havia certa prioridade no que diz respeito à
educação dos filhos.

Sem dúvida existiam outras formas de educação hebraico-judaica. Algumas crianças eram
entregues ao Templo, por ocasião de algum juramento, e sua educação ficava a cargo de um
sacerdote. Havia também as escolas de profetas e as sinagogas, se bem que estas últimas surgiram

1
Tradução da Edição Pastoral da Bíblia Sagrada.

10
por ocasião do exílio2. Por causa de sua importância capital na educação hebraico-judaica, faz-se
necessário discorrer sobre a sinagoga.

1.1 A sinagoga

A sinagoga aparece como instituição educacional na história judaica posterior.


Surgiu com a necessidade de se ter um local para realizar as orações, estudar a lei
e educar as crianças, sendo assimilada tanto pelos judeus da Diáspora como pelos
que voltaram à Palestina após o exílio (SISEMORE, 1985, p. 19; ARMSTRONG,
1988, p. 20). A sinagoga era o centro do impulso religioso, a força dinamizadora da
formação e expressão do judaísmo. Era o lugar onde se aprendia as tradições orais,
os ritos cerimoniais, se inteirava sobre as festas e tudo aquilo que a lei instituía
como obrigação para o povo.

Existia uma sinagoga em cada comunidade, sendo que sua função


fundamental era instruir o povo acerca da Lei. A direção do culto estava sob a
responsabilidade do presidente, que também designava os homens para fazerem
orações, bem como ler e explicar as Escrituras. Cabia ao servo, outro responsável
pela sinagoga local, a manutenção dos rolos das Escrituras, direcionar os
participantes do culto e, extraordinariamente, ensinar as crianças.

O processo educacional se dava por meio da leitura e exposição das


Escrituras, sendo que qualquer homem poderia fazê-los. Apesar de o ensino fazer
parte do culto, as crianças eram educadas por um mestre num local específico. Essa
forma de educação compreendia uma instrução primaria e, mais tarde, os jovens
eram instruídos na exposição da Lei.

1.2. Os métodos e propósitos da educação religiosa no Antigo Testamento

Todo processo educacional pressupõe métodos e objetivos a fim de que o


aprendizado dos educandos seja satisfatório e a meta desejada seja alcançada. A
educação religiosa no Antigo Testamento se dava basicamente de forma oral. A
princípio, quando o povo hebreu era seminômade, essa forma de ensino era a mais
utilizada, ocasião em que tradições históricas eram relembradas e transmitidas de

2
O surgimento das sinagogas é de difícil datação, mas há certo consenso entre os estudiosos sobre
seu surgimento no exílio.

11
pai para filho, segundo ordem expressa do Shema (cf. Dt 6, 4-9). Desse modo, cabia
à geração mais velha o desenvolvimento do processo dialógico de ensino, e à
geração mais nova a recepção e a continuidade da transmissão desse ensino.
Também fica evidenciado, a partir da leitura de textos tais como Êx 12,26;
13,8,14; Dt 6,20-21, que essa instrução oral se dava por meio do esquema
pergunta/resposta. Outras formas de instruções usadas eram as parábolas e os
rituais religiosos. O povo hebreu e, posteriormente, o povo judeu, celebrava três
festas principais (Páscoa, Pentecostes e Tabernáculos), além de outras de menor
importância. Através do esquema pergunta/resposta, as crianças iam se inteirando
de sua herança cultural (cf. Dt 6,5-7). Além disso, os pais eram obrigados a explicar
o significado dos rituais religiosos, bem como o das festas (cf. Êx 13,8). Outro
método de instrução utilizado era a repetição e a memorização, apesar de não ser
permitida a recitação dos textos das Escrituras de memória, pois “temia-se que, no
recitar, ocorressem alterações inesperadas das palavras sagradas” (ARMSTRONG,
1988, p. 21).

Assim, pode-se depreender que três eram os propósitos da educação


religiosa no Antigo Testamento, a saber, a transmissão da herança histórica (cf. Êx
12,26-27; 13,7-8,14-15; Dt 4,9-10; 6,20-21; 7,6-19; 32,7), ensinar acerca das
cerimônias religiosas (cf. Êx 13,8; Dt 6,5-7) e a transmissão da Lei (cf. Dt 6,20,24-25;
11,19-20).

Pode-se, então, confirmar, com base nos livros do Êxodo e do Deuteronômio,


que o povo anticotestamentário possuía um sistema educacional com o intuito de
inteirar as gerações mais novas sobre o Deus-Javé e sua Revelação especial, a um
povo também especial. Neste mesmo seguimento, o Novo Testamento vai procurar
dar continuidade a este processo, através de uma ação pedagógica que vai falar de
Jesus Nazareno, o filho de Deus, e de seus ensinamentos que visavam à
implantação do Reino de Deus em continuidade com o Antigo Testamento.

2. Educação Religiosa Cristã no Novo Testamento

Um dos papéis mais importantes da Igreja na era cristã foi o de dar


continuidade à educação religiosa presente no Antigo Testamento. Cabia aos
discípulos de Jesus a tarefa de desenvolver uma prática pedagógica para que os

12
ensinamentos que dele receberam pudessem ser transmitidos ao mundo todo (cf. Mt
28,19-20a).

Quando se pretende tratar sobre educação religiosa no Novo Testamento,


deve-se ter em mente dois pressupostos básicos, a saber, que: 1) Jesus é o Mestre
por excelência, fonte e exemplo de toda ação educativa; e que: 2) educação
religiosa no contexto neotestamentário é educação religiosa cristã.

A partir desses pressupostos, o presente tópico se propõe discorrer, em


primeiro lugar, sobre Jesus de Nazaré como Mestre (Rabi), quais suas
características como educador, suas formas e métodos de ensinar e quais seus
objetivos. Em segundo lugar, abordar-se-á a relação entre Jesus, o Mestre, e seus
discípulos, bem como as implicações desta relação para o ensino do Reino de Deus.
Cabe ainda ressaltar que por todo o Novo Testamento ecoam bases que
fundamentam a educação religiosa cristã, no entanto nosso objetivo é fundamentá-la
apenas nos evangelhos.

2.1. Jesus como mestre nos evangelhos

Os ensinamentos de Jesus de Nazaré podem ser encontrados em todos os


quatro evangelhos, sendo que em todos os relatos os evangelistas fizeram questão
de deixar bem claro que Jesus exercia a função de mestre. O que é mais pertinente,
porém, é sua própria reivindicação como tal (cf. Mt 10,24-25; 23,8; 26,18//Mc
14,14//Lc 6,40; 22,11//Jo 13,13-14.16).

As passagens bíblicas nos mostram que, além dos discípulos (cf. Mc 4,38;
9,5.8; 10,35; 13,1//Lc 5,5; 7,40; 8,24.45; 9,33.49; 21,7//Jo 9,2; 11,8; 20,16), os
escribas e fariseus se dirigiam a Jesus chamando-o de Mestre (cf. Mt 8,19; 9,11;
12,38; 22,16.36//Mc 12,14.32//Lc 10,25; 11,45; 19,39; 20,39), bem como muitas
outras pessoas (cf. Mt 17,24; 19,16; 22,24//Mc 5,35; 9,17; 10,17.20.51; 12,19//Lc
3,12; 8,49; 9,38; 12,13; 17,13; 18,18; 20,21.28//Jo 1,38.49; 4,31; 6,25).

Não resta dúvida, portanto, pelo texto bíblico, que Jesus era realmente um
mestre, um rabi. Mesmo que não pertencia a nenhuma escola rabínica, sua
autoridade para ensinar provinha da profunda compreensão que tinha da Torá,

13
sensibilidade para ensinar acerca do Reino de Deus e da sua própria experiência de
vida (FINDLEY, 1991, p. 12-13).

Jesus era um mestre itinerante (cf. Mt 11,1//Lc 13,22). Por onde quer que
tenha passado, a começar pela Galiléia (cf. Mc 1,14), seus ensinamentos iam se
tornando conhecidos. Todos os lugares serviam como ponto de ensinamento (cf. Mt
4,23; 5,1-2; 9,35; 13,2.54; 26,55//Mc 1,21.39; 4,1; 6,2; 10,1; 11,17; 14,49// Lc 1,39;
4,15.16.31; 5,3; 13,26; 19,46-47; 22,53//Jo 3,1-15; 7,14; 8,2.20; 18,20).

Jesus possuía um profundo conhecimento das tradições orais de seu povo


(cf. Mt 5,21.27.31.38.43) e, desse modo, se utilizava das formas mais comuns da
sabedoria tradicional de sua época para ensinar. Dentre as muitas formas utilizadas
por Jesus, serão relacionadas a seguir as mais pertinentes:

 Provérbios ou sentenças proverbiais (cf. Mt 16,25-26;


23,11-12//Mc 8,35-36; 9,35//Lc 9,24-25.48b; 18,14//Jo 3,8; 4,35.37.43-44; 11,9-
10);

 Símbolos3 (cf. Mt 14,13-21; 15,32-39; 21,18-22//Mc 11,12-


14.20-24//Lc 5,1-11//Jo 11,1-[25]44; 13,1-17; 21,1-13);

 Lições objetivas (cf. Mt 12,46-50; 19,13-15.23-26; 22,15-


22//Mc 3,31-35; 10,13-16.23-27; 12,13-17.43-44//Lc 8,19-21; 18,15-17.24-27;
20,20-26; 21,3-4);

 Figuras de retórica: a) parábolas: Encontradas nos


sinópticos, [...] são ao todo, descontadas as repetições, sessenta e cinco
parábolas4; b) paradoxos (cf. Mt 5,3-16 [Lc 6,20-23]; 16,25; 20,26-27//Mc 8,35;
10,43-44//Lc 9,24; 14,11; 22,26//Jo 12,25); c) linguagem figurada (cf. Mt 4,19;
5,14; 7,15; 9,37-38; 10,16; 13,3-9.31.33; 16,6; 23,27.37//Mc 1,17; 4,30-31; 8,15//
Lc 5,10; 10,2-3; 11,44; 12,1; 13,18-21.32.34//Jo 4,35-38; 8,12; 9,5; 15,1.5); d)
jogo de palavras (cf. Mt 16,18; 23,24//Jo 3,8); e) ironia (cf. Mt 9,12-13; 12,12b;
21,25a//Mc 2,17; 3,4; 11,30//Lc 5,31-32; 6,9; 10,36; 20,4).

3
GRENIER salienta que nem todos os símbolos eram milagres, como p. ex. Jo 13,1-17.
4
cf. MANSON, T. W.. O Ensino de Jesus, p. 84.

14
Mesmo tendo em alta estima as Escrituras Sagradas, Jesus se recusou
veementemente a ensiná-las de acordo com os métodos utilizados na época. O
Mestre se utilizava, então, de alguns métodos peculiares para ensinar. Aqui, todavia,
serão abordados os mais importantes para o desenvolvimento de seu ministério:

 Jesus utilizava as Escrituras hebraicas (cf. Mt 4,1-11;


9,13; 12,3-8; 15,1-9; 19,3-9; 21,15-16.42-44; 22,23-46//Mc 2,25-26; 7,1-13; 10,2-
11; 12,10-11.18-37a//Lc 4,1-13; 6,3-4; 10,25-28; 20,17-18.27-44);

 Jesus ensinava através de exemplos (cf. Mt 5,16; 7,12.16-


20; 11,29//Lc 6,31//Jo 8,12; 9,5; 14,6);

 Jesus utilizava o método pergunta/resposta (cf. Mt 16,15;


18,21-22//Mc 3,4; 8,29//Lc 2,46; 6,9; 9,20; 10,36//Jo 1,38; 5,6; 9,35; 11,25-26;
13,12; 18,4.7; 20,15; 21,15-17). É importante ressaltar que esse é o método mais
usado por Jesus ao ensinar, sendo que "o Evangelho de João é o que contém
maior número de perguntas  161 ao todo" (GRENIER, 1987, p. 60).

 Jesus se utilizou do discurso (cf. Mt 5-7 [Sermão do


Monte]; Mt 10 [Missão]; Mt 18 [Disciplina]; Mt 23-25 [Juízo Final]).

Todo mestre ao ensinar o faz com objetivos e Jesus de Nazaré não fugiu à
regra. Nas palavras de Preiswerk (1987, p. 70), "a principal novidade da pregação e
dos ensinamentos de Jesus com relação às correntes de sua época diz respeito ao
Reino de Deus.
O Reino de Deus irrompe na pessoa de Jesus, trazendo, entre outros ideais,
o ideal da vida, realizado na prática do amor ao próximo. Por isso, pode-se afirmar
que o objetivo maior dos ensinamentos do Mestre Jesus era gerar e manter a vida
(cf. Jo 10,10; 11,26). Para que o Reino de Deus pudesse se estabelecer, Jesus
buscou "transformar as vidas de seus discípulos, e, por meio deles, transformar
outras vidas e regenerar a sociedade humana" (PRICE, 1989, p. 45. Cf. Mt 6,33//Lc
13,3//Jo 3,3).

15
2.2. A relação educador/educando nos evangelhos

Um dos pontos mais surpreendentes do ministério educativo de Jesus foi a


liberdade que deu a seus discípulos durante o processo de aprendizagem destes.
Surpreendente porque o processo educacional de sua época vedava ao aluno
“encontrar o espírito da lei por sí mesmo em sua própria experiência [...], e em seu
lugar lhe era dado um jogo de leis tradicionais” (EDGE, 1988, p. 14).

A irrupção do Reino de Deus (cf. Mc 1,15) passa a exigir uma entrega total da
parte de seus adeptos. Por este motivo, Jesus de Nazaré ensinava de forma
especial a seus discípulos, através de uma convivência diária. Estes participavam de
forma ativa, observando, ouvindo, perguntando, respondendo, agindo, seguindo,
imitando e obedecendo (GEORGE, 1988, p. 61-62. Cf. Mt 10,5-14//Mc 3,14). O
mestre procurou ensinar a seus discípulos de tal forma que desenvolvessem
virtudes positivas.

Jesus de Nazaré buscou despertar em seus discípulos, através de seus


ensinamentos, o interesse sobre assuntos de importância vital para o Reino que se
inaugurava. As lições do mestre levavam o aluno sempre à meditação, cujo corolário
era o aprofundamento das convicções (cf. Mt 18,12; 22,42).

Outra peculiaridade do ministério pedagógico de Jesus de Nazaré é a escolha


dos discípulos. Enquanto era costume os futuros alunos procurarem ou serem
enviados aos mestres, era Jesus quem escolhia seus discípulos (cf. Mt 10,1//Mc
1,16-20; 2,13-14; 3,13-19). Nas palavras de Price (1987, p. 57), "Jesus mostrou-se
bem mais interessado na qualidade de seus seguidores do que na quantidade
deles".

Mesmo rechaçando a ênfase que o ensino judaico dava aos resultados


externos, Jesus de Nazaré também requeria resultados de seus seguidores. A
assimilação da religião interior expressava-se na prática, isto é, a confirmação de
uma vida regenerada se dava na correta relação com o próximo (cf. Mt 5,9.44;
7,20.24//Jo 14,15; 15,14). Pode-se afirmar, assim, que o Mestre ensinou a
paternidade de Deus e a fraternidade humana.

Neste primeiro capítulo, procurou-se apresentar as formas, os métodos e


objetivos do processo educacional, num primeiro momento, entre o povo

16
hebreu/judeu e, num segundo momento, como se deu a continuidade desse
processo com Jesus de Nazaré, o Mestre por excelência. No próximo capítulo, será
efetuada uma abordagem teológica do tema proposto, sendo que esta se dará no
âmbito eclesial, onde será evidenciado o Reino de Deus, bem como a vida e a
liberdade que dele emergem.

17
II O REINO DE DEUS COMO PARADIGMA DA EDUCAÇÃO RELIGIOSA CRISTÃ

Para que se possa refletir teologicamente sobre a educação religiosa cristã,


deve-se abordá-la no âmbito eclesial. Isso porque, o ensino é tido como um
ministério, dentre os vários ministérios que a Igreja possui com o intuito de atender a
todas as áreas da vida religiosa e, também, social. Dessa forma, este capítulo
objetiva sistematizar teologicamente a educação religiosa cristã e, para isto, a
abordaremos sob o significado teológico do símbolo do Reino de Deus. Para tanto,
faz-se necessário, antes de mais nada, definir a expressão “Reino de Deus”.
Biblicamente, essa expressão é usada tanto no Antigo quanto no Novo Testamento. Mas foi
principalmente Jesus quem dessa expressão mais se utilizou para tornar compreensível sua
pregação, sendo ele mesmo, através de sua vida e de sua mensagem, o responsável pela sua
irrupção. O anúncio do Reino de Deus, no contexto do Império romano, possui implicações
contraditórias. Enquanto este Império se impõe através do poderio militar, de uma ideologia opressora
e através do monopólio do poder econômico e político, o reino que Jesus se propõe inaugurar prega o
senhorio do Filho de Deus, um reino onde sobrepujem a paz e a prosperidade, o amor e a liberdade;
um reino que segue na mesma linha de significado do Antigo Testamento, onde,

O Reino de Deus não é basicamente um território governado, nem,


por outro lado, um conceito abstrato. É antes, um símbolo que se
refere à atividade concreta de Deus na História, estabelecendo a
soberania de Deus (GROOME, 1988, p. 67).

Tomando por base esta definição, pode-se afirmar aqui que o Reino de Deus
é uma utopia. Isto é, o Reino trás em seu bojo o projeto salvífico de Deus em prol da
humanidade, e este projeto se refere à vida e à liberdade as quais todo homem e
toda mulher têm direito. A liberdade humana e a vida em abundância que esse reino
quer estabelecer aparecem como horizonte, como modelo de uma sociedade e de
um mundo perfeito que não pode jamais ser alcançado, mas que dá força e mantém
a esperança na caminhada rumo à construção de um mundo onde caibam todos.

O Reino de Deus se torna diferente dos reinos temporais por seu caráter espiritual, tendo
em vista que foi instituído por Deus, em Jesus de Nazaré. Ao entrar em contato com a realidade

18
humana, este reino provoca profundas transformações. Desse modo, não possui apenas um único
aspecto.

O Reino de Deus que Jesus Cristo anuncia não é uma libertação de


tal ou qual mal, da opressão política dos romanos, das dificuldades
econômicas do povo, ou do pecado somente. Abarca tudo: o mundo,
a pessoa humana e a sociedade. A realidade inteira há de ser
transformada por Deus (SCHIPANI, 1988, p. 81).

Pode-se deduzir, então, que a tarefa da educação religiosa cristã “é a


formação para a liberdade”, para nos referirmos a uma expressão de Comblin, e isto
ocorre ao, na sua prática pedagógica, guiar as pessoas à apropriação do Reino de
Deus. Esta apropriação ocorre quando o ser humano responde

[...] ao chamado à conversão e ao discipulado em meio da


comunidade de Jesus Cristo, a qual há de promover a transformação
social para o aumento da liberdade humana, fazer acessível o
conhecimento e o amor de Deus, e estimular a plena realização
humana e o desenvolvimento pessoal (COMBLIN, 1998, p. 7).

Desse modo, cabe à educação religiosa cristã instrumentalizar a práxis 5


educativa que o povo de Deus realiza no seu engajamento ao Reino de Deus. Ao
lado disso, cabe-lhe, também, um papel crítico em relação ao ministério educativo
da Igreja, em relação à comunidade e à sociedade, atentando para os sinais visíveis
do Reino de Deus.

O processo educativo que objetiva levar o educando a apropriar-se da


liberdade do Reino de Deus pode ser compreendido, de forma análoga, como o
processo de plantar no coração do ser humano a semente deste reino, fazendo-a
crescer de forma plena e abundante. Deve ser processo dinâmico, porém não
apressado. Isto é imprescindível no ensino religioso cristão, pois

[...] a liberdade não se alcança satisfazendo os desejos da carne,


mas atuando o serviço mútuo voluntário. [...] A liberdade não consiste
em agir de acordo com os desejos imediatos. Tal agir seria, antes,
uma forma de escravidão (COMBLIN, 1998, p. 7).

5
Para Thomas H. Groome, práxis significa mais que a mera prática. É o engajamento da pessoa
humana no sentido de transformar a realidade que a cerca.

19
A liberdade é uma utopia cristã. Para esclarecer o leitor sobre a nossa
compreensão de utopia, remetemos à definição dada ao termo por Assmann e Sung
(2003, p. 134): "Utopia é aqui entendida no sentido de desejar e de ‘ver’ um mundo,
um lugar, [...] que ainda não existe e que talvez nunca venha a existir, mas que dá
um sentido às ações que nascem do nosso desejo de um mundo melhor”. E esta
utopia, como o horizonte, deve ser diariamente perseguida, pois na sua constante
busca, podemos criar modelos de liberdade que aos poucos nos conduzirá, a nós e
aos outros, à liberdade plena. A liberdade não é espontânea. É diariamente
construída com atos concretos.

Por ser inacabado, o ser humano vive em contínua busca de um sentido para
a vida. E a vida só tem sentido quando é vivida livremente. Podemos dizer que é
nesta constante busca pelo sentido da vida que o ser humano existe. Existir é
definido, aqui, como um conceito dinâmico:

Implica numa dialogação eterna do homem com o homem. Do


homem com o mundo. Do homem com o seu criador. É essa
dialogação do homem sobre o mundo e com o mundo mesmo, sobre
os desafios e problemas, que o faz histórico (FREIRE, 1987, p. 68).

É certo que esta empreitada humana pelo sentido da existência é feita de


contradições, de crises. Nas palavras de Comblin (2002, p. 8), “os seres humanos
sabem o que é bem, mas não o fazem, não por má vontade, mas por fraqueza, por
incapacidade”. Buscar um sentido para a vida é buscar uma vida melhor. Diante
desse desafio, os seres humanos se vêem cercados por inúmeras possibilidades,
cabendo, então, à educação “ajudar as pessoas na escolha de critérios para optar
por uma possibilidade, dentre tantas, que dê sentido à vida”. 6

O Reino de Deus surge, assim, como possibilidade de sentido para a


existência, com sua utopia da liberdade, da vida plena. Para que esse reino se
realize em meio aos seres humanos, faz-se necessária uma educação religiosa
cristã que os conduza à apropriação desse reino, de maneira que, vislumbrando o
horizonte, as pessoas possam promover atos de libertação, em prol de si mesmas e
dos que as cercam. Isto é imprescindível no ensino religioso cristão, pois, “quando
os cristãos recuperam eficazmente o Reino de Deus [...] sua fé não é igual; torna-se
6
Anotação de Palestra realizada pelo Dr. Jung Mo Sung em 26/08/2004, no auditório da Universidade
Metodista de São Paulo.

20
inédita e criativa, torna-se mais evidentemente evangélica, mais cristã” (SOBRINO,
1982, p. 142).

Esse tipo de educação terá que, obrigatoriamente, se desenvolver num contexto de


comunidade, onde o processo ensino/aprendizagem ocorre de forma mútua.

Por eso Dios ha unido a su Iglesia con el vínculo que le pareció más
apropiado para mantener en ella la unión, confiando la salvación y la
vida eterna a hombres, a fin de que por su medio les fuese
comunicada a los demás (CALVINO, 1974, p. 837).

Desta forma, todos os processos pedagógicos que promovem a mera doutrinação


dos educandos são questionados.

À Igreja, como promulgadora dos ideais do Reino de Deus, compete


apresentar uma nova forma de ensino religioso cristão que faça do ser humano um
sujeito de seu próprio aprendizado. Nas palavras de Wolkmann (apud DREHER,
1984, p. 103) “tanto aquele que ensina, o pastor, o catequista, o professor de escola
dominical, quanto aquele que aprende [...], são eternos aprendizes".

O Reino de Deus implica em justiça. Portanto, trata-se de um reino cujos ideais devem ser
transformadores e libertadores. A sua inauguração e a salvação que dele emerge são dádivas de
Deus, mas o seu realizar na História requer a participação humana.

A missão da Igreja é anunciar este reino de equidade e liberdade e esta,


como comunidade ensinadora, assevera Schipani (1987, p. 101), é “comunidade
sacramental”. Esta sacramentalidade da Igreja é vista como um sinal que revela algo
invisível.7 Neste sentido, o Reino de Deus se torna visível na comunidade cristã,
enquanto ensinadora.

Se a Igreja deve ser um sinal efetivo do Reino, [...] terá de pregar


aqueles valores do Reino. Mas só a pregação não bastará. Para ser
um sinal credível do Reino, ela terá de incorporar as suas próprias
estruturas e valores (GROOME, 1985, p. 68).

Assim, a educação religiosa cristã torna-se um canal através do qual os


ensinamentos de Jesus de Nazaré, o Cristo, mediante a fé e o seguimento
interpelam a vida humana, para redimi-la e governá-la 8. Aqui se confundem, de
7
Cf. GROOME, Thomas H. Op. cit., p. 67.
8
Cf. GRENIER, Brian. Op. cit., p. 38-39. O autor salienta que Jesus era “um mestre profético” e um
“mestre de caminho de vida”. Profético porque, na mesma linha dos antigos profetas, tinha

21
forma extraordinária, os ideais do processo pedagógico cristão e os ideais do Reino
de Deus. Nisto se baseia a fé cristã, que num primeiro momento é dádiva de Deus.
No entanto a fé pode

[...] tornar óbvia ou supérflua a pregação e a responsabilidade


educacional da comunidade cristã. Pelo contrário, se a resposta de fé
de alguém à graça de Deus pretende tornar-se e permanecer
explicitamente cristã, a comunidade deve partilhar sua fé vivenciada,
tornando acessível a tradição de fé, corporificada na comunidade
(GROOME, 1985, p. 93).

A educação religiosa cristã torna-se um instrumento, isto é, capacita a comunidade rumo à


maturidade cristã. Esta maturidade, no âmbito eclesial, é entendida como

[...] uma presença transformadora no mundo e uma profunda


comunhão com todas as pessoas; uma encarnação dos imperativos
de amor e justiça absoluta, um compromisso radical para a
transformação do mundo, segundo uma intencionalidade divina e
transcendente (SCHIPANI, 1987, p. 48).

Entende-se, do exposto até aqui, que a ação educativa da Igreja é imprescindível para que
o Reino de Deus se torne presente em meio aos seres humanos, sendo que a irrupção deste reino
tem como corolário a vida plena em Cristo, bem como a liberdade que esta vida enseja.

1 Educação Religiosa Cristã para a Vida

Para se cogitar sobre uma educação religiosa cristã para a vida, ou seja,
sobre uma educação que conduza as pessoas a ações que gerem e mantenham a
vida, existe a necessidade de se discutir o pressuposto no qual se baseia esta
proposta, a saber, que o ser humano é um "ser aprendente".

1. 1. O ser humano é “ser aprendente” 9

Nós, seres humanos, somos seres aprendentes. Isso quer significar que
desde os primeiros momentos de vida já estamos aprendendo a nos comportar

compromisso com a justiça, a favor dos oprimidos e em “confronto com os poderosos”. Um mestre de
caminho de vida, pois, “[...] Jesus não era primariamente mestre de crenças corretas ou de princípios
morais certos. Antes, ele era mestre de caminho, especialmente de caminho de transformação”.
9
Resumo do subtítulo O ser humano é “ser aprendente”, do meu livro Calvino e a Educação para a
Solidariedade, São Paulo: Fonte Editorial; Aparecida (SP): Santuário, 2010, pp. 54-59.

22
como seres humanos, a nos humanizar. Conforme Assmann e Sung (2003, p. 213),
“nós não nascemos prontos e o fato de nascermos prematuros, exigindo um útero
externo acolhedor, marcou toda a nossa evolução, principalmente a do cérebro”. O
fato de os seres humanos serem inacabados os coloca em contato imediato e
constante com o meio, num processo de contínuo aprendizado, que é o responsável
pela manutenção da vida.

Isso significa dizer que o ser humano é um ser que necessita aprender para
manter-se vivo. Ou seja, o ser humano precisa aprender continuamente a conhecer
o mundo no qual atua passiva e ativamente, e este aprendizado passa pela
aquisição dos mais variados conhecimentos que são necessários à sua
sobrevivência.

[...] a aprendizagem é entendida como alterações comportamentais


mais ou menos permanentes, alterações que não podem ser
creditadas a processos de maturação fisiológica, à fadiga ou à
adaptação sensorial, mas sim a alguma experiência anterior e que
são devidas a modificações a nível de sistema nervoso central. [...]
importa-nos considerar a aprendizagem como um todo, um processo
contínuo de transformações e que determina uma orientação,
intelectual e práxica, definida pela história de vida de cada qual, uma
especialização mesmo, e alguns interesses específicos ( GARCIA,
2001, p. 18).

Afirmar que a aprendizagem é um processo contínuo de transformações


equivale a dizer que o ser humano, em contato com o meio ambiente, com o mundo,
está em constante processo de aquisição de conhecimento. E, segundo Strieder
(2003, p. 295), “a aprendizagem é efetiva quando torna compatível o agir do ser vivo
em seu entorno ambiente, viabilizando um constante processo de reestruturação
interna”.

Todo o conhecimento adquirido e toda a prática desenvolvida ao longo da


vida estão relacionados ao modo como se dá o contato do ser humano com o meio.
Na luta pela sobrevivência, o ser humano vai aprendendo a sobreviver, e estas
aprendizagens vitais vão sendo captadas pelo cérebro/mente, dotado, na longa
evolução genética, de uma capacidade incrível, de captação, criação e observação
das mais variadas regras operacionais.

23
Mas sua destinação, amadurecida evolucionariamente, já não é
primordialmente a elaboração e o cumprimento de regras. Já não
está condenado a lógicas rígidas e lineares. [...] Forçar o ser humano
ao puro enquadramento em lógicas rígidas significa desqualificar seu
potencial humano (ASSMANN, 2001, p. 144-45).

Embora a aprendizagem de técnicas fosse e é essencial para a manutenção


da vida humana, ficar restrito a esse tipo de conhecimento somente não deixaria
espaço para a humanização do ser humano. O ser humano, ciente de seu
inacabamento bem como de sua finitude, é capaz de trabalhar, de criar, de construir,
mas, ao mesmo tempo, é também capaz de sonhar, de desejar, de transcender.

[...] é o homem, e somente ele, capaz de transcender. A sua


transcendência, acrescente-se, não é um dado apenas da sua
qualidade “espiritual” [...] A sua transcendência está também, para
nós, na raiz de sua finitude (FREIRE, 1998, p. 48).

Se o ser humano é capaz de desejar outras realidades, de transcender ao meio ambiente


imediato, necessário se faz abandonar a visão de que a aquisição de conhecimentos só ocorre por
transmissão de conteúdos ou informações. Esta proposição está ancorada no conceito de enaction.

Nossos sentidos não são apenas ‘janelas’ para o mundo. São muito
mais do que isso porque nossos sentidos participam ativamente não
apenas na recepção de informação desde o meio ambiente, mas
também na construção da realidade percebida (ASSMANN; SUNG,
2003, p. 246).

Nas relações diárias a que os seres humanos são submetidos, dentro do meio ambiente em
que vivem, já está ocorrendo a aquisição do conhecimento dos dados culturais específicos para a sua
sobrevivência. Segundo Morin (2001, p. 25), “os indivíduos conhecem, pensam e agem segundo
paradigmas inscritos culturalmente neles”.

Assim, a educação consiste em potencializar os conhecimentos já


adquiridos pela pessoa em contato com o seu meio ambiente, pois “aprender
significa o aprimoramento de algo menos perfeito que já existia no organismo e não
criar algo do nada, fazer surgir uma habilidade qualquer do vazio, da ausência”
(GARCIA, 1998, p. 43).

Mas também ocorre que, ao adquirirem conhecimentos culturais específicos


que propiciam sua sobrevivência, como resultado da relação constante com o meio,

24
os seres humanos promovem, por sua vez, a perpetuação da cultura e da sociedade
específicas e também da espécie.

No nível antropológico, a sociedade vive para o indivíduo, o qual vive


para a sociedade; a sociedade e o indivíduo vivem para a espécie,
que vive para o indivíduo e para a sociedade. Cada um desses
termos é ao mesmo tempo meio e fim: é a cultura e a sociedade que
garantem a realização dos indivíduos, e são as interações entre
indivíduos que permitem a perpetuação da cultura e a auto-
organização da sociedade (MORIN, 2001, p. 54).

Dessa afirmação é possível depreender que o ser humano, a sociedade e a


cultura, que é o resultado da inter-relação dos dois anteriores, foram sendo
construídos juntos, ao longo da evolução humana. E esta constatação é de salutar
importância para o tema da educação para a vida, porque estabelece a discussão da
complexidade tanto do ser humano quanto da sociedade e da cultura.
Esta relação de complexidade quer dizer que a hominização e a
humanização são decorrentes da evolução conjunta do ser humano, do
cérebro/mente, da sociedade e da cultura. O que implica em que o ser humano
precisa adquirir conhecimentos que promovam e garantam a manutenção da vida,
isto é, da ininterrupta inter-relação do ser humano com o seu semelhante em
sociedade e na cultura.

A raiz bio-organizativa e bio-social da vida, vista como sistema


dinâmico de interação, carrega consigo a flexibilidade necessária no
nosso agir. Os direcionamentos forçados, inibidores da dinâmica
auto-organizativa, reclusos da pura racionalidade, interpõem-se a
uma visão de vida como unidade mente/corpo e, mais ainda como
unidade ser humano/entorno (STRIEDER, 2003, p. 293).

Tocar no assunto de uma educação para a manutenção da vida é cogitar


sobre uma educação para a solidariedade. Ou seja, um modelo de educação que,
sem romper com a salutar importância de se transmitir informações necessárias ao
aprendizado de técnicas indispensáveis para a preservação da vida e da espécie
humana, leve as pessoas à compreensão de que vivem numa relação de
interdependência, portanto numa relação de solidariedade, e que esta relação é
imprescindível para a “perpetuação da cultura” e a “auto-organização da sociedade”.

25
Se se pode afirmar que a solidariedade é um dos ideais do Reino de Deus, a
proposta de uma educação religiosa cristã para a vida se torna viável, tendo em
vista que serão os ideais do reino transmitidos pedagogicamente à comunidade
cristã, para que esta viabilize, pela prática e pelo discurso, projetos e ações
geradores e mantenedores da vida como dádiva de Deus.

2. Vida e Liberdade: os ideais do Reino de Deus e a educação religiosa cristã

A relação entre o ser humano e os valores que a cultura lhe impõe só pode ser levada a
efeito pedagogicamente. Essa relação desenvolve no ser humano a formação da personalidade, que,
em última instância, irá refletir nas suas ações. Neste processo, o educador não age de forma
intermediária entre o educando e o valor, mas, colocando-se ao lado do educando, o direciona pela
ação pedagógica.

A relação educativa, em um sentido de comunicação de valor, pode


persistir na juventude e inclusive durante toda a vida sem resistência
do educando. […] o educador não pode considerar-se como superior,
apenas como companheiro, estimulador e guia. O que está sobre o
educando são os valores (HENZ, 1982, p. 78).

A Igreja, como instituição educativa, possui seus valores. Valores estes que devem ser
passados aos neófitos para que possam ser reconhecidos como membros do grupo. Sendo o anúncio
das boas novas do Reino de Deus o objetivo da Igreja, cabe a ela ensinar aos seus partícipes, entre
outras coisas, o que são essas boas novas, para que possam, também eles, anunciá-las.
A promoção da vida é a preocupação básica do Evangelho, sendo que a fé
no Cristo vivo é o pré-requisito para se obtê-la. A Igreja é uma comunidade
composta de seres humanos. A nova vida em Cristo distingue os cristãos das
demais pessoas, o mesmo ocorrendo com a Igreja, isto é, a faz diferente de todas as
instituições humanas. A vida em Cristo, em contraste com a morte, elimina a
opressão, a inimizade e o medo, liberta os seres humanos, tirando-os de seu estado
de passividade “demoníaca”. Tem o poder de manter vivas as utopias.

A própria pedagogia dos pais da Igreja já apontavam para uma educação para a vida. Para
Clemente de Alexandria, o Logos é o "conhecimento de Deus" 10 Sua teologia, oriunda da Patrologia
grega, considera Deus como a causa primeira de todas as coisas; o pecado de Adão como o
esquivar-se da ação educativa de Deus, sendo que o pecado não se transmite por hereditariedade
mas pelo mau exemplo.11 O pecado, bem compreendido teologicamente, é morte, e a reconciliação
10
Cf. GOMES, C. Folch. Antologia dos Santos Padres, p. 138.
11
Cf. ALTANER, B.; STUIBER, A.. Patrologia, p. 156.

26
com Deus, mediante o seguimento a Jesus, reconduz o ser humano aos auspícios da pedagogia
divina, que, reconciliando também o homem com o seu semelhante, promove a preservação da vida.

A filosofia de Santo Agostinho foi, de certa forma, uma filosofia educativa,


pois, ao suscitar dúvidas e tentar resolvê-las, tratar das questões da fé sob os
auspícios da razão, traz à tona o que ele chama de “Mestre interior”, que na sua
concepção é o próprio Deus, realizando-se, assim, um processo de formação
humana, portanto um processo educativo. Poder-se-ia argumentar que Santo
Agostinho se deixa seduzir pela teoria platônica da reminiscência. Porém, segundo
ele, todo conhecimento e verdade novos implicam num ensinamento que os
ocasionem, sendo que tal ensinamento, que ele entende como um contato direto
com as palavras, possui uma intervenção divina direta que se realiza como uma
iluminação no interior do ser humano. 12

Ao avaliar as disciplinas liberais (a gramática, a retórica, a música, a


aritmética, a geometria e a astronomia), Santo Agostinho vai concluir que estas
conduzem a um processo de formação e purificação onde a alma se torna capaz de
captar a unidade do mundo material, bem como do espiritual. Nesse sentido,
defende a ideia de que ao se ensinar a doutrina cristã aos indoutos, deve-se
simplificá-la o máximo possível para que a possam compreender (ABBAGNANO;
VISALBERGHI, 1986, p. 148).
Nesta mesma linha de pensamento estão os reformadores. Lutero
argumenta ser necessário que existam muitos homens formados nas artes liberais,
indicando sua preocupação com a educação. A esse respeito indaga: “Donde viriam
pregadores, juristas e médicos, se não houvesse a gramática e outras artes
retóricas?” (BECK, 1991, p. 89).

Essas mesmas preocupações serão encontradas na doutrina teológica e


social desenvolvida por João Calvino. Ele sempre levou em conta a importância das
artes liberais para a formação e desenvolvimento dos seres humanos. 13 Além disso,
pode-se afirmar que Calvino sempre teve uma grande preocupação e sempre esteve
compromissado com aquilo que é humano. Basta olharmos para a instituição dos
Diáconos em Genebra, no século XVI, que tinham como objetivo cuidar dos pobres,
dos idosos e dos enfermos.14
12
Cf. ABBAGNANO, N.; VISALBERGHI, A.. Op. cit., p. 147. Teoria que admite a preexistência da
alma em relação ao corpo, sendo que alma contemplou as idéias numa vida anterior.
13
Cf. REID, W. Stanford. (editor) Calvino e sua Influência no Mundo Ocidental, p. 13.
14
Cf. BIÉLER, André. O Pensamento Econômico e Social de Calvino, p. 224.

27
Disso se pode depreender que nos Apologistas, na Patrística, em Agostinho, e também nos
reformadores, como Lutero e Calvino, estava presente o germe de uma educação voltada para a vida.
Desse modo, a Igreja, como herdeira direta do pensamento desses estudiosos, deve zelar para que
seu processo pedagógico seja, ao mesmo tempo, gerador e mantenedor da vida.

Os teólogos e educadores cristãos, tendo em vista que ambas as áreas se inter-relacionam


no processo educativo da Igreja, procurarão compreender os conteúdos das doutrinas da fé, de forma
que a boa nova do Reino de Deus integre a vida do cristão na relação de serviço mútuo, numa práxis
que, através do estímulo, culmine no seu amadurecimento. Os reformadores entendem a Igreja como
um organismo e, desse modo, sua edificação ocorre no corpo, pelo corpo e para o corpo.

A educação religiosa cristã objetiva ensinar aqueles que têm vida em Cristo a se inter-
relacionarem no processo de amadurecimento próprio e, consequentemente, da Igreja. Por isso
mesmo, a eclesiologia se torna o ponto de partida para se refletir teologicamente sobre o ensino
religioso cristão. Os ministérios, que são os dons que cada crente possui, servem para a edificação
do corpo, mas estes devem acontecer subordinados ao dom da vida.

O processo educacional cristão não deve basear-se apenas na mudança do pensamento


religioso através da transmissão de novas informações. Para que o ser humano possa ter certa
atitude em relação a um determinado objeto, este deve ser abordado em relação aos sentidos, pois
são nos contextos de situações reais que se dá a relação ensinagem/aprendizagem. Cabe à Igreja
criar tais situações pela prática da verdade como realidade. Deve atuar como unidade cultural, onde
aqueles que receberam o dom da vida possam ser socializados de forma que se envolvam com os
ideais do Reino de Deus, na promoção e manutenção da vida e da liberdade para vivê-la.
A educação religiosa cristã ultrapassa o mero processo de intercâmbio de
ideias, se comprometendo com os problemas reais da vida humana. Se o seu
objetivo maior é a promoção da vida, tem-se que, dessa forma, partir da
compreensão de “que toda a vida da Igreja, todo o relacionamento dos crentes é
parte do ministério da Igreja em termos de educação” (RICHARDS, 1995, p. 98).

Esta exposição sobre o papel do ensino religioso cristão em relação à irrupção do Reino de
Deus, com seus ideais de justiça, vida e liberdade induz a uma reflexão sobre a situação da
catequese na América Latina. Sendo o processo educativo imprescindível para a vida cristã e para a
compreensão e efetivação do Reino de Deus, tem-se que repensá-lo, criticá-lo e redimensioná-lo,
para que a educação religiosa cristã possa alcançar seu objetivo, qual seja, a promoção e a
manutenção da vida e da liberdade que emergem da apropriação do reino, que se torna possível sob
o senhorio de Jesus Cristo, o Filho de Deus. Este é o objetivo do próximo capítulo, onde se abordará
a educação religiosa cristã como educação popular, nas suas nuanças alienante e libertadora.

III TEOLOGIA LATINO-AMERICANA E EDUCAÇÃO RELIGIOSA CRISTÃ

28
Percebe-se, na América Latina, o aparecimento de uma teologia que se ergue como
discurso crítico frente a uma realidade de opressão e empobrecimento de milhões de pessoas vítimas
de um processo cada vez mais crescente de exclusão econômica e inclusão marginal como resultado
do capitalismo que a tudo e a todos quer valorizar como mercadoria. Ao elaborar um discurso que se
contraponha a uma cultura mercadológica, como contracultura, a Igreja latinoamericana possibilita o
nascimento de um processo educativo cristão que tem conduzido muitos cristãos à práxis que gera
condições de resistência e denúncia frente aos desmandes deste sistema desumano e
desumanizante.

1 Educação Religiosa Cristã como Educação Popular

A tarefa da educação religiosa cristã não se encontrava, por muito tempo, nem na área da
teologia nem na da pedagogia, isso se devendo à sua falta de identificação enquanto disciplina, ou
seja, por não ser considerada, de acordo com Streck (1992, p. 47), "como área de ensino e pesquisa
com objetivos e metodologia devidamente definidos". Tradicionalmente, tem sido entendida como o
ensino da doutrina cristã, ou seja, como a responsável pela transmissão de doutrinas fixas acerca de
Deus, da Igreja, da liturgia, das Escrituras, da fé. Compreendida desta forma, a tarefa da educação
religiosa cristã fortifica e reproduz a ideologia eclesiástica, que é tida como instituída por Deus.

A partir da segunda metade década de 1950, porém, a educação religiosa cristã,


impulsionada por novas perspectivas na área da teologia, passa a ser identificada como mais que o
mero ensino de doutrinas didaticamente apresentadas. Começa a ser entendida como a transmissão
de uma mensagem de vida, da proclamação da salvação, da redenção e libertação, efetuadas na
pessoa de Jesus Cristo e na implantação dos ideais do Reino de Deus.

Nesse sentido, a educação religiosa cristã assume uma dimensão libertadora, e como tal,
deixa de ser um simples instrumento a serviço da ideologia eclesiástica. Passa a existir um diálogo
entre a educação religiosa cristã e a teologia, que no contexto latino-americano, é libertadora, e, mais
do que isto, "estabelece-se uma [...] contribuição de ambas [...] na reflexão sobre os objetivos e na
determinação do conteúdo e metodologia" (STRECK, 1991, p. 52) da primeira.

A educação religiosa cristã, ao dialogar com uma teologia libertacionista, descarta aquelas
teologias que, ao tratarem da Revelação, das questões da fé, da Igreja como comunidade cristã,
estavam ligadas inexoravelmente aos pressupostos do clero, com sua doutrina definitiva e
cristalizada, sem abertura ao diálogo. Assim sendo, buscou dialogar com uma teologia, e teólogos,
que, ao falarem

[...] da Revelação, enfatizavam a palavra de Deus dirigida ao homem


de hoje no Cristo vivo, através das mediações históricas da
comunidade eclesial; ao falar da fé, destacavam seus aspectos
existenciais de opção livre e responsável [...]; finalmente, ao falar da

29
igreja, colocavam em relevo sobretudo sua dimensão de povo de
Deus, de comunhão beneficente, litúrgica e apostólica, de
sacramento... (GROOPO, p. 99-100)

Ao se posicionar ao lado de uma teologia que leva em consideração o ser humano e suas
aspirações, a educação religiosa cristã passa a ser entendida

[...] (como) processo hermenêutico, cujo objetivo não é a recepção


ingenuamente obediente das verdades da fé apresentadas, nem a
instrução e exercitação na vida eclesial, mas o confronto  também
crítico  com modelos, apresentados nas tradições religiosas, de
interpretação do mundo e de atribuição de sentido à vida ( EICHER,
1982, p. 228).

A educação religiosa cristã, para lograr êxito na sua tarefa de anunciar o Reino de Deus,
hoje, deve ser concebida como ajuda no processo de hominização e humanização. Uma catequese
que se propõe fiel a Deus e ao ser humano, não pode limitar-se a ser anúncio da mensagem cristã,
mas tem que converter-se, também, em interpretação da vida humana à luz dessa mensagem. Como
processo hermenêutico, o ensino religioso cristão se torna um processo crítico e libertador. Aliando-
se, num processo de contínuo diálogo, com uma teologia libertacionista e posicionando-se ao lado do
ser humano, a educação religiosa cristã torna-se, então, no contexto latino-americano, educação
popular.

2 Educação Religiosa Cristã como Processo de Alienação

A educação religiosa cristã, em sua definição mais tradicional, é entendida


como "a instrução e exercitação de crianças e jovens [...] na fé, na oração e na
liturgia da Igreja, bem como na maneira cristã de viver" (EICHER, 1981, p. 228).
Porém, esta definição é por demais estanque e por si só já denuncia seu caráter
alienante. O diálogo é próprio da educação. Porém, o que tem ocorrido através
desse diálogo, é que as gerações mais velhas têm transmitido às mais jovens seus
conhecimentos, moldando o jovem de acordo com suas experiências, sem respeitar
sua personalidade e originalidade.

Ditamos ideias. Não trocamos ideias. Discursamos aulas. Não


debatemos ou discutimos temas. Trabalhamos sobre o educando.
Não trabalhamos com ele. Impomos-lhe uma ordem a que ele não
adere, mas se acomoda. Não lhe propiciamos meios para o pensar
autêntico, porque recebendo as fórmulas que lhe damos,
simplesmente as guarda. Não as incorpora porque a incorporação é

30
o resultado de busca de algo que exige, de quem o tenta, esforço de
recriação e de procura. Exige reinvenção (FREIRE, EPL, p. 104).

Faz-se necessária uma educação que desenvolva nas novas gerações um ser
autêntico, sem moldes culturais impostos através de uma educação antidialógica e
alienante.

O que se percebe nesse tipo de educação, é que a relação


educador/educando é simplesmente narrativa, o que implica num não diálogo. No
lugar do diálogo entre educador e educando, o que se tem é um mero ato de
depositar, em que os educandos tornam-se recipientes prontos para o
preenchimento.

Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem


de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os
depósitos, guardá-los e arquivá-los. Margem para serem
colecionadores ou fichadores das coisas que arquivam (FREIRE, PO,
p. 66).

Nesse tipo de educação alienante, onde educar é o ato de depositar, de mera transmissão
de valores, verifica-se um estado de passividade do ser humano, que ingenuamente se amolda ao
sistema, ao invés de transformá-lo. Quanto mais for exercitado no arquivamento daquilo que lhe é
transmitido, menos desenvolverá uma consciência crítica, que o transformaria em sujeito
transformador.

A educação bancária promove a preservação da ordem vigente, do status quo, se


colocando à disposição da ideologia dominante, o que não modifica em nada a situação de alienação,
muito pelo contrário, fornece subsídios para a sua cristalização.

[...] nesse quadro, a educação vem a tornar-se um dos mais válidos


instrumentos da conservação de tal estado de coisas. [...] Por seu
estilo, esta educação contribui decisivamente para a permanência
diversificada destas ordens (AZEVEDO, 1987, p. 25).

Triste é o fato de o mesmo se verificar na educação religiosa cristã. Entendida como a


transmissão da tradição cristã da fé, torna-se dissertadora, onde o educador se impõe ao educando
sem deixar espaço para o diálogo, de forma que tanto educador como educando alienam-se do
processo de aquisição de conhecimentos para a vida.

A educação religiosa cristã está a serviço da implantação do Reino de Deus, que é o


símbolo da ação criadora e libertadora de Deus em favor dos seres humanos, ou nas palavras de
Schipani (1981, p. 81), "uma transfiguração e revolução total, global, e estrutural da realidade dos
seres humanos". O objetivo maior do ensino religioso cristão é integrar o educando no contexto que o

31
cerca, fazê-lo conhecedor crítico de seu mundo, para depois levá-lo a comunicar-se com outros
educandos, transmitindo-lhes as boas novas do Reino de Deus. No seu objetivo verifica-se o seu
paradoxo.

Enquanto a educação religiosa cristã for mera transmissão das tradições eclesiásticas,
estará formando cristãos passivos. Enquanto as igrejas cristãs continuarem a se considerar
possuidoras do conhecimento, sua ação educativa será alienante. O mesmo ocorre com os
educadores cristãos. Ao se considerarem, ou serem considerados, conhecedores e os educandos
desconhecedores, a relação educador/educando desconhecerá o diálogo.

Esta postura, por parte da Igreja e dos educadores cristãos, tem cooperado para que os
cristãos sejam sempre seres passivos, pois sem um diálogo que os torne conhecedores da sua
situação de opressão, no contexto latino-americano, não poderão jamais desenvolver um pensamento
crítico, que na prática torna-se transformador. Alguém já disse que a não opção é a opção pela
ideologia dominante. A opção pela ação transformadora é um corolário do pensamento crítico.

Esta concepção bancária da educação religiosa cristã implica numa visão distorcida da
relação homem/mundo, isto é,

[...] numa visão onde os seres humanos são vistos como parte do
mundo e não numa inter-relação com este e com outros seres
humanos. Insistimos, inexiste o diálogo. Daí que um dos seus
objetivos fundamentais, mesmo que dele não estejam advertidos
muitos dos que a realizam, seja dificultar, em tudo, o pensar
autêntico (FREIRE, PO, p. 73).

Se a educação religiosa cristã objetiva levar os educandos à compreensão e ao


estabelecimento do Reino de Deus e sua justiça, não pode privá-los do pensar autêntico, o que é uma
forma de alienação. Deve, isto sim, conceber uma forma de educação que seja um processo de
conscientização e de libertação, uma práxis.

3 Educação Religiosa Cristã como Processo Libertador

Até aqui, pretendeu-se demonstrar que a educação religiosa cristã,


entendida como mero anúncio da mensagem evangélica, como transmissão das
doutrinas tradicionais do cristianismo, torna-se alienante, contrapondo-se ao seu
objetivo maior que é a libertação.
Como a própria raiz do termo exprime, educação implica em diálogo. O
diálogo gera no ser humano a curiosidade que o leva a indagar, refletir e criticar.
Uma educação religiosa cristã que se compromete com a libertação, não pode
considerar os seres humanos como recipientes vazios prontos para receberem

32
aquilo que lhes é imposto. Tem que se impor como uma educação que problematize
as relações dos educandos com o mundo.

Ao se localizar no mundo, o ser humano toma consciência de sua pertença


ao mundo, de sua situação de opressão e, o mais importante, começa a vislumbrar
modos de agir para transformar essa situação. A esse processo dá-se o nome de
conscientização, que segundo Ammann (apud NÓBREGA, 1983, p. 18), é "o
processo pelo qual os grupos passam a compreender as relações sociais que se
estabelecem numa sociedade historicamente determinada e a atuar criticamente em
nível das mesmas relações".

Esse processo tem sua origem na problematização. A educação religiosa cristã, ao romper
com sua tradição bancária, se abre ao diálogo, tornado-se problematizadora. Quanto mais
problematizar as informações adquiridas, mais os educandos se sentirão como seres pertencentes ao
grupo e desafiados a transformarem seu estado de alienação e de submissão.

A educação religiosa cristã, ao se enveredar por este caminho, se transforma numa


educação que permite ao educando sua inserção na problemática que o envolve. Ao invés de
submeter-se às convenções alheias, o educando ganha força e coragem para lutar por seus ideais de
libertação.

Nesse sentido, uma catequese que se pretende libertadora, deve agir levando em
consideração as novas condições da atualidade. No contexto de uma educação popular, o ensino
religioso cristão se apresenta como processo de transformação social, no qual o educando tem direito
à participação. Isto se dá pelo fato de que o objetivo da educação religiosa cristã é encaminhar os
educandos para uma compreensão e para uma efetivação do Reino de Deus e sua justiça, como já
foi salientado anteriormente.

Desse modo, um novo sujeito irrompe como articulador da educação religiosa cristã: o povo
oprimido, empobrecido e sofredor. Este povo, como sujeito/objeto da catequese popular, tem sabido
se apropriar da Bíblia, reconhecendo-se como interpretado por ela. A Bíblia passa a ser entendida
como

[...] una Palabra que acompaña al pueblo en su lucha por una vida
digna, que le da fuerzas contra el fatalismo, que lo alimenta en su
vida espiritual, que corrige su práctica política, finalmente es una
Palabra que lo educa (PREISWERK, 1981, p. 21).

Assim, a educação religiosa cristã se estrutura e se realiza em meio às reivindicações do


povo sofrido e pobre. Constrói no educando uma visão dialética da vida, isto é, leva-o a enxergar que
todas as situações e experiências possuem duas maneiras de ser vistas, a saber, sob a ótica do
dominador e sob a ótica do dominado.

33
Vista sob este prisma libertador, a educação religiosa cristã se torna educação popular a
serviço do Reino de Deus e de seus ideais. Como corolário desta afirmativa, tem-se que a catequese
se torna transformadora, por isso realizadora. Segundo Preiswerk (1981, p. 104), "[...] a educação
cristã é parte integrante da evangelização e por isso tampouco se pode limitar a ensinar acerca do
Reino; tem que contribuir para sua construção".

Se a educação religiosa cristã quer ser fiel ao Evangelho, tem que ouvir as reivindicações
do povo oprimido e empobrecido, marginalizado e alienado, que por meio de suas instituições está
engajado na construção de uma nova sociedade. Ao invés de instrumento do clero, torna-se, segundo
Preiswerk (1981, p. 105), "um instrumento nas mãos dos pobres para contribuir na construção do
Reino da vida plena".

Uma educação religiosa cristã que se propõe ser fiel ao Evangelho e ao ser humano, deve
ser libertadora e popular. No contexto do povo latino-americano, oprimido e marginalizado, a
catequese deve assumir um papel revolucionário, no sentido de não se conformar com a ideologia
dominante.

Porém, esta é uma questão bifacética. Por ser um micro-sistema, a Igreja tende a reproduzir
os mesmos mecanismos de defesa do macro-sistema, que é a sociedade na qual se encontra
inserida. Dentre os vários mecanismos de defesa existentes, o mais eficiente é o que Freire chama de
a absolutização da ignorância15 que, em outras palavras, é alienação.

A educação religiosa cristã tende a ser alienante, pois não pode fugir, pelo menos de
imediato, de uma obrigação necessária a todo o grupo religioso: transmitir as tradicionais doutrinas
que delineiam a fé.

Dentro dessa necessidade de ordenação das coisas, de um nomos


socialmente estabelecido como garantia da ordem e do sentido,
Peter Berger diz que a religião aparece como expressão óbvia da
natureza das coisas, uma vez que, entre outras, ela contribui para a
manutenção da ordem, se opõe ao caos e fornece ao homem o
escudo contra o terror da anomia. Ao lado da religião se apresentaria
também a educação como um fenômeno que se tornou necessário
como expressão óbvia da natureza das coisas, no processo social,
para a afirmação e reafirmação das normas e garantia da ordem, da
tradição cultural, crenças, ideias, usos e costumes da sociedade e
suas instituições (SANTOS, 1987, p. 51).

A Questão que se impõe à educação religiosa cristã é: como, então, transmitir tais doutrinas sem
transformar-se numa educação alienante? Talvez a resposta a esta questão tão desafiadora esteja no
diálogo, entendido como respeito, entre educadores e educandos.

A educação religiosa cristã, para ser libertadora, deve desvencilhar-se daquela concepção
tradicional, onde o educador possui o conhecimento enquanto o educando é o desconhecedor. Deve
refutar a idéia da imposição do educador sobre o educando. Uma catequese que compartilha dessa

15
Cf. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido, p. 67.

34
forma de ensino foge aos ideais do Reino de Deus, tendo em vista que é alienante ao invés de
libertadora, massificante ao invés de conscientizadora.

Para poder alcançar seu objetivo, que é levar os educandos à compreensão e efetivação do
Reino de Deus e sua justiça, a educação religiosa cristã deve abrir-se ao diálogo e fundamentar-se
num pressuposto de Paulo Freire para uma educação libertadora, a saber, que "ninguém educa
ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão,
mediatizados pelo mundo" (FREIRE, PO, p. 79).

Segundo o mesmo autor, a educação deve estar aberta à "pesquisa ao invés da mera,
perigosa e enfadonha repetição de trechos e de afirmações desconectadas das suas [do homem]
condições mesmas de vida" (FREIRE, EPL, p. 101). Quanto mais possui validade esta afirmativa para
a educação religiosa cristã, que tem seus ideais entrelaçados aos do Reino de Deus!

Paulo Freire mais uma vez toca fundo no cerne da catequese ao afirmar, de forma
maravilhosa, diga-se de passagem, que "a educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem.
Não pode temer o debate. A análise da realidade. Não pode fugir à discussão criadora, sob pena de
ser uma farsa" (FREIRE, EPL, p. 104). Se a educação religiosa cristã for uma farsa, no sentido de
não ser criadora, ou geradora, da fé, da esperança, da perseverança, da liberdade, pode continuar
sendo uma forma de educação, até mesmo de educação religiosa, mas, sem a menor sombra de
dúvida, jamais poderá ser chamada de educação cristã.

A educação religiosa cristã se encontra inerentemente ligada à evangelização. Por isso


implica em uma mensagem de vida, uma mensagem que proclame a salvação, a redenção e a
libertação que só podem se tornar realidade no seguimento a Jesus Cristo e na consequente
implantação do Reino de Deus.

A Igreja tem por obrigação divulgar essa mensagem de amor, sendo que tal tarefa só é
possível através do desenvolvimento de um processo pedagógico que ensine os valores e os ideais
desse reino e conduza os educandos a assimilá-los, praticá-los e vivenciá-los.

35
SEGUNDA PARTE

PSICOPEDAGOGIA APLICADA À EDUCAÇÃO RELIGIOSA CRISTÃ

36
I PSICOPEDAGOGIA: ASPECTOS HISTÓRICOS E PRÁTICOS

A Psicopedagogia tem como objeto de estudo a aprendizagem humana e


como esta ocorre em determinado contexto sociocultural. No entanto, como se
aprende não é a única preocupação da Psicopedagogia, visto que
concomitantemente ao aprendizado podem ocorrer deturpações no processo de
aquisição de conhecimentos. A obstaculização do aprendizado é, também, seu
objeto de estudo. O aprendizado, bem como sua distorção, acontece em todas as
situações vivenciadas pela pessoa, nas mais diversas instituições, e acontece não
somente pedagogicamente, mas também afetivamente.
Entre a aquisição de conhecimentos e o contato com o intermeio que os
promovem, existem empecilhos biológicos, psicológicos, sociais, cognitivos e
afetivos. Dentre estes, a afetividade e sua relação com a aprendizagem tem surgido
como objeto de estudo da Psicopedagogia, auxiliada pela Psicologia e pela
Psicanálise, tendo em vista o grande número de casos em que a dificuldade para
aprender está correlacionada a problemas de ordem emocional.

1 Breve Histórico da Psicopedagogia

37
A Europa foi o berço do que hoje se denomina Psicopedagogia. George
Mauco dirigiu o primeiro Centro Médico-Psicopedagógico na França, voltado para o
atendimento de crianças com problemas da aprendizagem sem comprometimento
da inteligência e com comportamentos socialmente inadequados, articulando a
Medicina, a Psicanálise, a Psicologia e a Pedagogia (BOSSA, 2000).
O objetivo desta articulação era conhecer a criança e seu desenvolvimento
em relação ao entorno ambiente, num esforço de levantar os possíveis
condicionantes da não aprendizagem e promover sua remediação. A preocupação
subjacente à ação era a separação daquelas crianças com problemas de
aprendizagem apesar de serem “inteligentes” daquelas com possível quadro de
retardo mental.
Esta corrente européia, que articulava a Medicina, a Psicanálise, a Psicologia
e a Pedagogia no intuito de levantar e remediar possíveis problemas de
aprendizagem, influenciou vários estudiosos argentinos, o que levou ao surgimento
da Psicopedagogia neste país, e sua capital, Buenos Aires, a oferecer o primeiro
curso de formação em nível de graduação na área (BOSSA, 2000).
A Psicopedagogia chegou ao Brasil na década de 1970, em uma época em
que as dificuldades de aprendizagem eram associadas a uma disfunção neurológica
denominada Disfunção Cerebral Mínima (RAMSON, 1987), e se irradiou neste
período, servindo para mascarar problemas de ordem sociopedagógicas. No entanto
esta concepção organicista e linear, de acordo com Kiguel (1991, p. 24),
“apresentava uma conotação nitidamente patologizante, uma vez que todo indivíduo
com dificuldades na escola era considerado portador de disfunções
psiconeurológicas, mentais e psicológicas".
A Psicopedagogia brasileira, influenciada pela argentina, se desenvolveu
como área de estudo que se ocupa com os problemas relacionados à
aprendizagem, e seu referencial teórico está fortemente marcado por grandes
psicopedagogos argentinos, tais como Jorge Visca, Sara Paín e Alícia Fernandez,
dentre outros.
No entanto, a Psicopedagogia brasileira também deu seus passos rumo à sua
configuração como profissão. Em Porto Alegre, RS, foram organizados centros de
estudos destinados à formação e atualização em Psicopedagogia, como o que foi
fundado e dirigido pelo professor Nilo Fichtner, denominado Centro de Estudos
Médicos e Psicopedagógicos, que priorizava a formação psicopedagógica dentro

38
dos moldes terapêuticos. Também é digno de nota o trabalho realizado pela
professora Genny Golubi de Moraes pela sua contribuição no tratamento dos
problemas relacionados à aprendizagem, priorizando a ação preventiva com o intuito
de diminuir o número de crianças que chegavam às clínicas por causa de
dificuldades escolares (GOLBERT, 1985).
Porém o primeiro curso oficial de Psicopedagogia no país foi oferecido pelo
Instituto Sedes Sapientiae, na cidade de São Paulo, em 1980, por iniciativa de Maria
Alice Vassimon, pedagoga e psicodramaticista, e Madre Cristina Sodré Dória, que foi
a diretora do Instituto. Este curso nasceu da preocupação de Vassimon com o ser
humano global, nas suas dimensões intelectuais, afetivas e corporais, da crítica à
Psicologia da época e da vontade de reformar a educação bem como também de
valorizar o educador. Após o termino do curso, uma associação que reuniu um
grande numero de profissionais foi fundada por um grupo de pedagogas, liderado
por Leda Barone e Edith Rubinstein, cuja preocupação girava em torno do estudo e
da divulgação da nova profissão (MENDES, 1991).
No Brasil, ainda hoje os “psicopedagogos” são profissionais de áreas como a
Pedagogia, a Psicologia, a Fonoaudiologia, entre outras, que se especializam em
cursos de Pós-graduação em Psicopedagogia, e existe uma preocupação quanto a
influência da graduação destes na sua ação psicopedagógica. Preocupação um
tanto infundada em tempos de valorização da transdisciplinaridade e da
complexidade. Ao exemplo de outros países, em especial França e Portugal, a
profissão ainda hoje não foi regulamentada no país.
Em 2005, o primeiro curso de graduação em Psicopedagogia no país foi
oferecido pela PUC/RS, e pela mesma época, existiam outros dois em andamento:
um no Centro Universitário La Salle, em Canoas, RS e outro no Centro Universitário
FIEO, na cidade de Osasco, SP. Em 2006, a CAPES recomendou o primeiro
mestrado acadêmico, com área de concentração em Psicopedagogia.
Desde o ano de 1997 transita em Brasília um projeto de lei cujo objetivo é
regulamentar a profissão de psicopedagogo no país, bem como criar os Conselhos
Regionais de Psicopedagogia. O referido projeto, que se encontrava na mesa
diretora da Câmara dos Deputados desde 31 de janeiro de 2007, na situação de
arquivado, foi recentemente aprovado pela Comissão de Trabalho e aguarda ser
sancionado (ABPp, 2012).
Se, no entanto, apenas se olhar teoricamente para o desenvolvimento

39
histórico da Psicopedagogia no Brasil, corre-se o risco de entender que esta luta
pelo reconhecimento da profissão está isento de problemas e que todo esse
processo ocorre linearmente. No entanto, sérios problemas de ordem
socioeconômica deturpam o agir psicopedagógico, como acontece em todas as
outras áreas. O sistema capitalista-mercadológico, que intensifica a luta pela
sobrevivência econômica, faz com que muitos especialistas em Psicopedagogia
deixem de exercer sua tarefa preventiva e terapêutica e menosprezem tanto a luta
pelo reconhecimento da profissão quanto o debruçar acadêmico para a construção
de referencial teórico dentro dos nossos parâmetros culturais, passando a agir como
“especialistas em reforço escolar”, perpetuando, com isso, a cultura do aprendizado
apenas especializado, passaporte para se ter um “lugar ao sol” nas sociedades
capitalista-mercadológicas, e criando uma geração de especialistas em todas as
áreas do conhecimento mecânico, esquecendo-se de educar áreas tais como o
afeto, a emoção e o corpo sem as quais não ocorre aprendizado adequado e eficaz.

2 Dificuldades de Aprendizagem

A educação envolve os aspectos ensinagem e aprendizagem, sendo que


esses aspectos estão interconectados. Dito de outra forma, não ocorre
aprendizagem adequada sem ensinagem adequada, e não há ensinagem adequada
sem aprendizagem adequada.
A Psicopedagogia enfoca esses dois aspectos e atua de forma preventiva e
terapêutica sobre as demandas das possíveis perturbações que desfavorecem o
processo de aprendizagem. Embora deva intervir em todos os aspectos que
ocasionam perturbações no processo de aprendizagem, não o fará isoladamente,
mas sim com o apoio de outras ciências tais como a Psicanálise, a Psicologia, a
Neurologia, a Pedagogia, a Fonoaudiologia, para citar algumas.
Com relação ao processo de ensinagem, cabe ao especialista em
Psicopedagogia, na linha preventiva, preparar os profissionais da educação para
que sua atuação na escola seja responsável, isto é, que ao “ensinar” não transmita
apenas o conteúdo, mas que este esteja de acordo com o desenvolvimento sócio-
psico-cognitivo do educando. Já com relação à aprendizagem, o especialista em
Psicopedagogia tem como função descobrir possíveis obstáculos no processo de

40
aquisição de conhecimento. Tais obstáculos podem ser de ordem social, cognitiva e
afetiva, podendo, em muitos casos, estar presente mais de um aspecto.
Para que a intervenção psicopedagógica possa lograr êxito em sua linha
preventiva, se faz necessário que o especialista em Psicopedagogia participe da
dinâmica das relações da comunidade educativa com a finalidade de favorecer o
processo de integração e troca. Hoje é consenso entre os estudiosos da educação
que processo cognitivo e processo vital são idênticos, o que tem levado tais
estudiosos a falar em uma “ecologia cognitiva”, como forma de afirmar a
incontestável relação entre conhecer e sobreviver no fenômeno humano a que
chamamos educação. Por isso, fatores como a localização da escola, sua estrutura
física, o projeto político-pedagógico, os professores, o perfil sócio-econômico dos
alunos, de suas famílias e da comunidade em geral, devem ser levados em
consideração para uma adequada e responsável intervenção psicopedagógica de
cunho preventivo.
Levantados os possíveis obstáculos, o próximo passo é promover orientações
metodológicas de acordo com as características dos indivíduos e grupos, e para isso
o especialista em Psicopedagogia pode começar pela análise do material escolar
utilizado pelos alunos: cadernos, livros, desenhos, brinquedos, etc, pois nesse
material serão encontradas as metodologias utilizadas pelos professores, e caberá
ao especialista analisá-las e dizer se tais metodologias ocasionam um aprendizado
eficiente. Caso detecte possíveis desvios didático-metodológicos, deverá realizar
processo de intervenção com o fim de orientação educacional, vocacional e
ocupacional, tanto na forma individual quanto em grupo, ou seja, adaptações
metodológicas e práticas com o fim de promover adequado processo educacional
onde os processos de ensinagem e aprendizagem sejam entendidos como os dois
lados da mesma moeda.
A Psicopedagogia não se atenta somente à linha preventiva, mas sua atuação
envolve também a linha terapêutica, e é a interconexão entre estas duas frentes de
atuação que faz da Psicopedagogia uma vertente das Ciências da Educação em
plena ascensão.
Quando, em Psicopedagogia, se fala em linha terapêutica, deve-se salientar
que esta ação é totalmente voltada para a aprendizagem. O especialista em
Psicopedagogia, na sua ação terapêutica, trata das dificuldades de aprendizagem, e
procura diagnosticar as possíveis “bloqueios” que dificultam esse processo e, se

41
suspeitar que existam outras dificuldades que escapam ao seu conhecimento, deve
encaminhar seu cliente para outros especialistas com os quais desenvolve seu
trabalho de forma interdisciplinar. Em diagnosticando alguma dificuldade, o
especialista em Psicopedagogia intervirá através de técnicas remediativas de
orientação tanto para o aluno, quanto para seus pais e professores. As dificuldades
de aprendizagem geram, muitas vezes, problemas emocionais e o seu contrário
também é verdadeiro. A intervenção psicopedagógica deve promover ocasiões onde
o educando possa ser atendido como um todo bio-sócio-psico-motor-afetivo.
As Dificuldades de Aprendizagem são problemas específicos de origem
pedagógica, tais como inadequação curricular, método de alfabetização,
dispedagogias, dificuldades processuais, entre outras, sem envolvimentos
neurobiológicos, culturais e sistêmicos, diferenciando-se, então, dos transtornos de
aprendizagem. Em um enfoque psicopedagógico uma dificuldade
de aprendizagem não é entendida como patologia, e, sim, como um obstáculo que
pode estar dificultando o processo de aprendizagem. Estes obstáculos são
classificados como:

• Obstáculo Epistêmico - refere-se à estrutura cognitiva do aprendiz,


que deriva do nível de operatividade da estrutura cognitiva
alcançada, ou seja, ninguém pode aprender além do que sua
estrutura cognitiva permite.
• Obstáculo Epistemofílico - é utilizado para designar o vínculo
afetivo que o aprendiz estabelece com os objetos e situações
de aprendizagem.
• Obstáculo Epistemológico - está relacionado ao meio cultural em
que o aprendiz está inserido. Quando uma criança de um meio
cultural desfavorecido é inserida em outro com melhores condições,
poderá apresentar o que denominamos de obstáculo epistemológico.
• Obstáculo Funcional - corresponde às diferenças de funcionalidade
da estrutura do pensamento, como as desigualdades entre os
aspectos figurativos e operativos, as formas de oscilações deste
pensamento e a impossibilidade de usar certas justificativas
(PERES, 2009).

Portanto, uma das mais importantes contribuições da Psicopedagogia é sua


abordagem multidimensional, que torna evidente que as dificuldades de
aprendizagem dependem de vários fatores que podem agir isoladamente ou estarem
entrelaçados na obstaculização da aprendizagem.
Todos esses obstáculos, por dificultarem o processo de aprendizagem, se
caracterizam como dificuldades de aprendizagem. A preocupação fundamental que

42
deve dimensionar e direcionar toda a prática psicopedagógica está vinculada ao
levantamento destas dificuldades, bem como à sua prevenção e intervenção
remediativa.

3 A Psicopedagogia Institucional

A Psicopedagogia Institucional tem como objetivo prevenir a instalação dos


sintomas decorrentes de defasagens educacionais, bem como também a
intervenção terapêutica, sendo que, neste caso, o educando com algum problema
de aprendizagem deve ser encaminhado para o devido acompanhamento e o
educador, ou grupo de educadores, deve ser conscientizado sobre as demandas
que o seu agir educativo faz surgir.
Ao trabalhar com as instituições, sejam escolares ou não, o especialista em
Psicopedagogia deve viabilizar algumas ações das quais dependem o êxito, ou não,
de seu trabalho preventivo, tais como observar, entrevistar e fazer as devidas
devolutivas; administrar ansiedades e conflitos; promover o esclarecimento dos
papéis no grupo; identificar sintomas de dificuldades no processo
ensinagem/aprendizagem; organizar ações preventivas; constituir estratégias para o
exercício da autonomia; problematizar as “reclamações”; criar espaços de escuta;
etc. (NOFFS, 1995 apud LIMA, 2008).
Essas ações devem fazer parte do trabalho psicopedagógio no espaço
institucional com a finalidade de diagnosticar os obstáculos presentes na relação
ensinagem/aprendizagem, quer nas escolas, nos hospitais e nas empresas, ou
mesmo nas organizações filantrópicas.
Na escola, urge a necessidade de atualizações que, se aplicadas com rigor
crítico às novas informações adquiridas por professores e alunos, ocasionarão a
inserção de um e de outro na sociedade atual. Também, a necessidade de
transformar estas informações em conhecimentos aumenta a cada dia, no que diz
respeito à escola.
É nesse novo contexto que a Psicopedagogia pode vir a ser poderoso
instrumento de transformação e atualização da escola como o lugar por excelência
onde ocorre o aprendizado formal, tendo em vista que as propostas educacionais
advindas da práxis psicopedagógica estabelecem mudanças na relação

43
ensinagem/aprendizagem, visto que a criança passa a ser sujeito ativo de seu
processo de aprendizagem (ALESSANDRINI, 1996).
Partindo dessa perspectiva inovadora, a Psicopedagogia pode dar sua
contribuição direcionando a instituição escolar a reformular e/ou criar novos
processos educacionais que permitam aos atores desse contexto retomar a
importância de seu agir pedagógico para a sobrevivência da organização escolar,
atuando sobre as relações de ensinagem e aprendizagem. A intervenção
psicopedagógica na escola parte do desenvolvimento e aprimoramento cognitivo das
pessoas envolvidas no processo educacional, que se expressam em alterações
qualitativas no desempenho de suas atividades.
A atuação psicopedagógica no âmbito escolar deve estar direcionada para o
conhecimento global deste contexto específico onde acontecem, juntas, a
ensinagem e a aprendizagem. Conhecer os dados de como se dá a aquisição do
conhecimento e de como este é construído pela criança, compreender as múltiplas
relações da criança com a escola, com os agentes envolvidos no processo
educacional, com o conteúdo aprendido e assimilado para posteriormente relacionar
estes conteúdos com os aspectos cognitivos e afetivos, faz com que o especialista
em Psicopedagogia sinta-se mais seguro para a realização do processo de
prevenção e intervenção.
A atuação psicopedagógica, no espaço escolar, deverá ser a de esclarecer e
orientar professores, alunos e familiares sobre a existência de conflitos que podem
gerar obstáculos relacionados às áreas cognitiva, afetiva, funcional e social, bem
como identificar, analisar, diagnosticar e intervir para eliminar a queixa transformada
em demanda e resolver o problema instalado.
A observação dos tipos de vínculos estabelecidos entre os agentes
envolvidos no processo de ensinagem e aprendizagem, ou seja, entre o aluno ou
grupo de alunos e os conteúdos de aprendizagem, entre o aluno ou grupo de alunos
e os professores, entre os professores e os conteúdos de aprendizagem é outra
imprescindível ação do trabalho psicopedagógico no âmbito escolar, sem a qual não
se pode viabilizar a prevenção e a intervenção (COLOMER; MASSOT; NAVARRO,
2003).
Outro importante aspecto que não pode deixar de ser abordado e investigado
pelo especialista em Psicopedagogia, no espaço escolar, é a relação da família do/a
aluno/a com a escola, pois através da sua participação efetiva a existência de

44
sintomas significativos pode ser detectada com mais rapidez em vínculos
relacionados ao aprender, visto ser o ambiente familiar o primeiro lugar em que
ocorrem as primeiras trocas afetivas e emocionais e a construção da identidade,
portanto lugar de aprendizado (PAIN, 1985).
A família é o primeiro núcleo de socialização da criança, e voltar, portanto, a
atenção para os seus objetivos, anseios e expectativas com relação ao seu
desenvolvimento é de suma importância para o diagnóstico psicopedagógico. Com a
avaliação psicopedagógica pretende-se não somente melhorar a aprendizagem com
relação ao aluno, mas também contribuir para que ocorram transformações no
contexto escolar e familiar (COLOMER; MASOT; NAVARRO, 2003).
A escola e a família devem agir juntas para que o pleno desenvolvimento da
criança seja alcançado com êxito, pois ambas as instituições fazem parte de um
complexo sistema socializador no qual a criança está inserida. O especialista em
Psicopedagogia deve atuar no sentido de estabelecer a intersecção entre estas duas
instituições educativas proporcionando encontros que possibilitem a inclusão dos
familiares no contexto escolar e, por outro lado, direcionar a escola no
estabelecimento de canais de comunicação com a família através de ininterrupto
processo dialogical.
O especiaista em Psicopedagogia, ao atuar na escola, deve buscar
compreender como se dá o processo de ensinagem/aprendizagem tanto no
ambiente familiar quanto no escolar para, através de metologias que incentivem a
relação harmoniosa entre a ensinagem e a aprendizagem, possa diagtnosticar os
sintomas que denunciam algum problema na aquisição de conhecimentos.
Na instituição hospitalar, a primeira intervenção pedagógica acontece no ano
de 1935, quando Henri Sellier inaugura, em Paris, a primeira escola para crianças
vítimas da tuberculose. Mas foi com advento da Segunda Guerra Mundial,
provocando a mutilação de um incontável número de civis e, dentre estes, crianças e
adolescentes, que esta prática se espalhou e se firmou. A mutilação, as doenças e a
desintegração familiar mudaram radicalmente o cotidiano desse contingente, que
passou a vivenciar uma longa jornada de internações nos hospitais. Surge, assim, a
preocupação em suprir as necessidades escolares que foram interrompidas por
causa da guerra. Para prover esta necessidade, foram criadas as primeiras classes
hospitalares na França, depois em toda a Europa e Estados Unidos (ESTEVES,
2008).

45
O ambiente hospitalar, por causa de seu contexto tomado por pessoas
doentes, debilitadas e com dor, está diretamente ligado ao sofrimento. Com sua
aguçada sensibilidade, crianças e adolescentes podem absorver esta relação de
forma mais intensa que o adulto e em consequência respondem a esse ambiente
com medo, tensão, irritabilidade, impaciência e indisciplina, entre outras reações
(MATTOS; MUGIATTI, 2007 apud CALDEIRA, 2011).
Neste contexto de sofrimento e exclusão social, a Psicopedagogia pode
intervir como a intermediadora entre o paciente, que pode enfrentar longos períodos
de internamento, e os processos de aquisição de conhecimentos formais dos quais
se encontra alijado. Além de favorecer a continuidade do processo escolar, a
Psicopedagogia pode, também, intervir propiciando outras experiências cognitivas
que vão equipá-lo com novas competências para viver e conviver neste novo
ambiente.
Ao chegar ao ambiente hospitalar, a primeira ação do especialista em
Psicopedagogia deverá ser a de conhecer a estrutura local, quais e quantos
especialistas ali atuam, qual o número de pacientes internados, quais os motivos
das internações, se informar sobre dias de visitas, além de outros dados relevantes
para que, de forma interdisciplinar, possa intervir satisfatoriamente junto ao paciente
e aos demais envolvidos na recuperação do mesmo.
A conduta do especialista em Psicopedagogia também é fator interfere no seu
trabalho no hospital, pois vai permitir-lhe, ou não, desenvolver satisfatoriamente sua
ação psicopedagógica, tais como: a observação e anotação dos setores e da
dinâmica hospitalar; conhecer sobre as patologias tratadas pelo hospital; ler as
observações dos prontuários; ser ético, amistoso e agir de maneira interdisciplinar
(CARVALHO; CURIN, 2008).
Neste ambiente, ao mesmo tempo acolhedor e hostil, o especialista em
Psicopedagogia deve perceber o que está sendo dito nas entrelinhas das falas dos
atores envolvidos no processo de recuperação, já que em cada discurso estão
presentes a objetividade e a subjetividade. Os temores e as angústias muitas vezes
não são verbalizados pelas crianças e pelos adolescentes, e esse tipo de atitude faz
surgir um quadro de desespero, revolta e até mesmo de depressão, e o especialista
terá o desafio de resgatar sentimentos tais como a “valorização da vida, o amor
próprio, a autoestima, a aceitação e a segurança”, bem como outros conhecimentos
que estariam sendo adquiridos se estivesse, frequentando a escola (BEYER, 2011).

46
São inúmeras as situações de aprendizagem oferecidas pelo ambiente
hospitalar devido à interação entre estes atores, e o papel da Psicopedagogia será o
de promover o encontro destas com os valores já adquiridos pelo paciente. Para que
esse encontro cognitivo realmente ocorra, o especialista deve permitir-se envolver
com o paciente de forma que consiga mostrar-lhe que é singular. Para que estas
singularidades sejam captadas e respeitadas, é necessário que se exercite a escuta
para que o processo psicopedagógico seja humanizado e humanizador, isto é, que o
paciente não seja observado apenas como mais um cliente que precisa de reforço
escolar, mas como um todo social, cognitivo e afetivo (LOPES, 2010).
Se a ação psicopedagógica no ambiente hospitalar visa a recuperação da
saúde daqueles que se encontram em processo de internação e,
consequentemente, a continuidade do processo de socialização, já que o
afastamento da escola o impede de vivenciá-lo, o espaço hospitalar deve ser
(re)contextualizado de forma que se configure numa verdadeira ecologia cognitiva,
onde a alegria, o prazer e o desejo de continuar aprendendo seja mantido ou
restaurado.
Por fim, a Psicopedagogia ainda pode atuar nas empresas. As Organizações
estão divididas em privadas, públicas e filantrópicas, cada qual com objetivos bem
definidos e normas que garantam o alcance destes bem como a sua manutenção no
tempo e no espaço. Todo conhecimento é adquirido e, por isso, consiste num
processo de aprendizagem. No ambiente empresarial, a aprendizagem necessária
para se conhecer todos os meandros da organização da qual participa é a
organizacional. O processo de aprendizagem organizacional é definido como a

[...] capacidade de gerar novas ideias multiplicadas pela capacidade


de generalizá-las por toda a empresa. A aprendizagem
organizacional corresponde, assim, à forma pela qual as
organizações constroem, mantêm, melhoram e organizam o
conhecimento e a rotina em torno de suas atividades e culturas, a fim
de utilizar as aptidões e habilidades de sua força de trabalho de
modo cada vez mais eficiente (STEWRT, 1998 apud BEYER,
2011).

As empresas passam a ser reconhecidas como espaço cognitivo onde são


construídas aprendizagens efetivas que resultem em aptidões e habilidades, ou
mesmo as resgatem, com o intuito de utilizá-las na resolução de problemas da
própria organização.

47
Se a Psicopedagogia é, “uma área cujo objeto é o ser que aprende, como
aprende e de que maneira esse aprendizado se insere, e o insere no ambiente do
qual faz parte” (COSTA, 2009, p. 14), sua função na empresa é a de intermediar o
aprendizado de habilidades por parte dos seus colaboradores, visando a otimização
da mesma. Nesse sentido, a atuação do especialista em Psicopedagogia se dá
como facilitador e intermediador tanto no processo de construção quanto no de
compartilhamento do conhecimento, indicando novas maneiras de inter-relação e
criando sinergia entre os comportamentos dos sujeitos envolvidos no processo
organizacional (BEYER, 2011).
No entanto a inter-relação humana não é algo que ocorre linearmente, sem
interferências. Entre o ideal de um bom relacionamento interpessoal e sua real
efetivação nos grupos existentes nas empresas, existem obstáculos com relação à
função, à comunicação, ao desempenho profissional e aos objetivos (BENGEZEN,
2010), e cabe ao especialista em Psicopedagogia minimizá-los ou saná-los através
da intervenção e orientação psicopedagógicas.
Variados são os problemas relacionados às funções a serem desenvolvidas
pelos colaboradores nas empresas, visto ser muito comum a existência de
profissionais que exercem funções diferentes daquelas para as quais possui
habilidade. Através de entrevistas e testes que julgar necessários, o especialista
levantará quais as habilidades o colaborador possui e onde as mesmas podem ser
desenvolvidas com maior eficácia, promovendo, assim, seu melhor aproveitamento
pela empresa.
Para um bom relacionamento pessoal e profissional a comunicação eficaz é
imprescindível. Muitas vezes, na empresa, comunicabilidade fica prejudicada pelo
simples motivo de o colaborador ter medo de falar sobre acontecimentos do
cotidiano que interferem no desenvolvimento organizacional, outras vezes por
dificuldade de aceitarem uma crítica e se colocarem na defensiva e, ainda, pela
dificuldade de feedback (BENGEZEN, 2010). Cabe ao especialista em
Psicopedagogia fazer o levantamento destas dificuldades de comunicação
resgatando o importante papel exercido pelo colaborador dentro da empresa,
ressaltando que sua participação é de vital importância para o fortalecimento da
empresa e para ele mesmo enquanto profissional que almeja continuar no mercado
de trabalho.

48
Um dos principais requisitos para que as empresas sobrevivam ao agressivo
processo de concorrência incentivado pelo mercado neoliberal, hoje, é a abertura às
mudanças exigidas por esse mesmo mercado. A mudança de paradigmas torna-se
imprescindível para que gestores e colaboradores compreendam que, embora
exerçam papéis e atividades hierárquicas diferentes, fazem parte de um mesmo
sistema que necessita do envolvimento de todos os profissionais para o alcance dos
objetivos organizacionais.

4 A Psicopedagogia Clínica

A Psicopedagogia Clínica é o exercício de um olhar diferenciado que pode ir


além do problema de aprendizagem como uma aparente dificuldade que se
apresenta apenas como a incapacidade que o cliente tem para adquirir
conhecimentos escolares, tendo em vista que esta se caracteriza por uma atitude
que envolve a observação, a escuta e a tradução, transformando o especialista em
Psicopedagogia em uma testemunha atenta que valida a palavra do paciente
(FERNÁNDEZ, 1991). Ou seja, a Psicopedagogia Clínica olha além da dificuldade
de aprender do educando, com o intuito de descobrir porque e como esta dificuldade
ocorre, sensibilizando-se com a história de vida do ser humano. A intervenção
clínica pressupõe o potencial aprendente do ser humano.
A Psicopedagogia Clínica, como método de abordagem terapêutica, afirma-se
na Epistemologia Convergente de Jorge Visca. É o que ele mesmo declara:

[...] quando se fala de psicopedagogia clínica, se está fazendo


referência a um método com o qual se tenta conduzir à
aprendizagem e não a uma corrente teórica ou escola. Em
concordância com o método clínico podem-se utilizar diferentes
enfoques teóricos. O que eu preconizo é o da epistemologia
convergente (VISCA, 1987, p. 16).

Conforme a epistemologia convergente, uma avaliação psicopedagógica


utilizará de recursos diagnósticos provenientes da Psicanálise freudiana, da Escola
de Genebra e da Psicologia Social de Pichón, conduzindo o educando para a
realização de atividades que forneçam elementos para uma compreensão de seu
desenvolvimento cognitivo e de sua relação afetiva com o objeto de aprendizagem.

49
O principal objeto de estudo da Psicopedagogia são os níveis de inteligência,
as teorizações da psicanálise sobre as manifestações emocionais e as proposições
da psicologia social, visto que a aprendizagem escolar além de estar cerceada pelos
problemas sociais e emocionais está inserida em um contexto onde as experiências
vivenciadas e os grupos sociais são específicos (VISCA, 1987).
Na sua ação terapêutica, o especialista em Psicopedagogia trata das
dificuldades de aprendizagem, procurando diagnosticar os possíveis “bloqueios” que
dificultam o processo de aprendizagem e, se suspeitar que existam outras
dificuldades que escapam de seu conhecimento, deve encaminhar seu cliente para a
avaliação concomitante com outras ciências com as quais desenvolve seu trabalho
de forma interdisciplinar, tais com a Psicologia, a Neurologia, a Fonoaudiologia, a
Linguística, a Psicanálise, para citar algumas.
No exercício clínico, o especialista em Psicopedagogia deve identificar a
estrutura do educando, suas transformações no decorrer do tempo, as influências do
intermeio nestas transformações e como ele se relaciona com o processo
ensinagem/aprendizagem. Este saber exige do especialista o conhecimento do
processo de ensinagem/aprendizagem e todas as suas inter-relações com outros
fatores que podem influenciá-lo, bem como das interferências emocionais, sociais,
pedagógicas e orgânicas que obstaculizam esse processo.

Não se deve esperar [...] identificar a causa do problema, na medida


em que não se pretende estabelecer uma relação linear de
causa/efeito, de ação/reação por se acreditar num processo dialético
[...] de uma teia de possíveis causas inter-relacionadas que, como
uma rede, aprisiona a criança impedindo-a de aprender plenamente
(ANDRADE, 1998, p. 38).

É necessário que o especialista em Psicopedagogia conheça como se dá o


processo educativo, quais as alterações encontradas neste processo, como este é
influenciado por outros fatores, como ocorre sua evolução para, posteriormente,
fazer a intervenção psicopedagógica com o objetivo de tratamento e prevenção.

Isso significa que, nesta modalidade de trabalho, deve o profissional


compreender o que o sujeito aprende, como aprende e por que, além
de perceber a dimensão da relação entre psicopedagogo e sujeito de
forma a favorecer a aprendizagem (BOSSA, 2000, p. 24).

50
A Psicopedagogia Clínica deve investigar e compreender os aspectos
orgânicos, cognitivos, emocionais, sociais, dentre outros, que desfavorecem o
processo de aprendizagem. Por outro lado, ao mesmo tempo em que a
Psicopedagogia, na clínica, busca compreender a causa do não aprendizado, deve
investigar “como” o cliente aprende e o “que” sente prazer em aprender. De acordo
com Scoz (apud BOSSA, 2000, p. 67), o especialista em Psicopedagogia deve “[...]
possibilitar situações que resgatem o prazer de aprender em sua totalidade [...]”.
Nesta relação dialética entre detectar as causas que dificultam a ação de
aprender e do que e como aprender, o especialista deve manter uma linha
investigativa constante, visando observar o processo de evolução do seu cliente,
pois, conforme Bossa (2000, p. 99), “[...] é de extrema relevância detectarmos, por
meio do diagnóstico, o momento da vida da criança em que se iniciam os problemas
de aprendizagem”.
Na busca pelas causas que impedem ou desnorteiam o processo de
aprendizagem, o especialista em Psicopedagogia fará a utilização de instrumentos
tais como entrevistas e anamnese, provas psicomotoras, de linguagem, de nível
mental, pedagógicas, provas de percepção, projetivas e outras, segundo o
referencial escolhido pelo profissional, a fim de detectar e diagnosticar o problema, e
fazer a devida intervenção.
Em resumo, a Psicopedagogia Clínica tem como fim, com seu processo de
investigação, diagnóstico e intervenção, a (re)elaboração e a (re)construção do
processo de aprendizagem, o resgate da autonomia, e, através de uma
metodologia flexível, estabelecer estratégias que possibilitem uma nova relação
ensinagem/aprendizagem para devolver ao educando o desejo e o prazer de
aprender.

Ele ou ela me ensina, e eu aprendo. Eu não “sou ensinado”, nem ele


“me faz aprender”. Entre ensinar e aprender abre-se um espaço. Um
campo de autorias, de diferenças. Aprender é a-prender, ou seja,
não-prender. Des-prender e desprender-se (FERNANDEZ, 2001,
p. 34).

Se os processos subjetivos são fenômenos que permeiam tanto os sujeitos


quanto as instituições, se faz indispensável ressaltar que a Psicopedagogia Clínica
não está relacionada apenas ao consultório, como a nomenclatura pode nos induzir

51
a pensar, mas se coloca como a intérprete dos sentimentos que estão presentes nas
palavras, nas ações e até mesmo no silêncio, quer do educando, quer do grupo.

II PSICOPEDAGOGIA E EDUCAÇÃO RELIGIOSA CRISTÃ

1 Educação Religiosa Cristã e Escola Dominical

Embora a educação religiosa cristã ocorra das mais variadas formas


(sermões ou homilias, iconografia, hinologia, etc.), o estudo bíblico e a Escola
Dominical são considerados o veículo por excelência e o espaço pedagógico vital
desta modalidade pedagógica protestante.
As reuniões para estudo da Bíblia acontecem, como já foi visto, desde os
tempos da instituição das sinagogas judaicas no período intertestamentário e
perpassam toda a história da Igreja. No entanto, cabe ao protestantismo o mérito da
continuidade e da sistematização desses estudos bíblicos que aconteciam, via de
regra, em reuniões aos Domingos e que vieram a ser conhecidos como Escola
Dominical.
Foram encontrados vestígios históricos destes encontros na França do século
XVII, e, no alvorecer do século XVIII, mais precisamente em 1703, o Bispo Thomas
Wilson instituiu escolas bíblicas na ilha de Man, arquipélago das Ilhas Britânicas

52
(Dicionário de Biografia Nacional, p. 1885-1900). Em 1737, John Wesley reunia
crianças para estudar a Bíblia em Savannah, Geórgia, Estados Unidos
(DORNELLAS, 2013).
Hannah Ball Moore começou a evangelizar crianças através de estudos
bíblicos em sua casa, situada em High Wycomb, na Inglaterra, no ano de 1769, aos
26 anos de idade. Mais tarde esses estudos passaram a ser ministrados nas
dependências da Igreja Anglicana desta mesma cidade (DORNELLAS, 2013;
CANTO, 2011). Por ser a primeira pessoa de que temos conhecimento a
desenvolver este tipo de trabalho nas dependências de uma instituição religiosa,
cabe a ela o mérito da invenção da Escola Dominical nos moldes que hoje
conhecemos.
No entanto o crédito da invenção da Escola Dominical foi dado de forma
equívoca ao jornalista inglês Robert Raikes, muito mais por seu prestígio como
editor do Gloucester Journal (BALTCHEDER, 1985, p. 8; HANN, 1989, p. 275) do
que pela sua iniciativa, sem desmerecer esta última, que consistiu em reunir
crianças carentes, entre seis e catorze anos (MATOS, 2011) que perambulavam aos
Domingos pelas ruas de Gloucester, cidade situada no Centro-Oeste da Inglaterra, e
alfabetizá-las através do ensino da língua materna, da aritmética, da ética e
educação religiosa (LEMOS, 2013).
Como a cidade de Gloucester era um importante polo industrial têxtil na
época, as pessoas trabalhavam de Segunda a Sexta-feira e folgavam apenas aos
Domingos, incluindo as crianças. Não havia escolas públicas na Inglaterra do século
XVIII, apenas particulares, e Robert Raikes decidiu alfabetizá-las. Sendo o dia de
Domingo o único em que estas crianças folgavam da dura lida nas fábricas têxteis,
ele começou a reuni-las em praças públicas e em casas particulares. Mais tarde,
com o apoio de outras pessoas e da própria Igreja Anglicana 16, que frequentava,
passou a alfabetizá-las nas dependências de alguns templos que lhe abriram as
portas (SILVA, 1998, p. 16; ARMSTRONG, 1992, p. 74).
Além do trabalho de alfabetização, que era feito com a colaboração de
professoras de sua própria paróquia, as quais Raikes remunerava, ele utilizava de
seu periódico para angariar doações de materiais escolares, roupas, sapatos e
propiciava o almoço de Domingo para seus alunos (LEMOS, 2013).
16
O Reverendo Thomas Stock já realizava uma escola dominical desde 1777, quando era pároco em
Ashbury e veio a somar esforços com Raikes em Gloucester. Cf. CANTO, Judson em:
https://judsoncanto.wordpress.com/2011/12/28/a-escola-dominical-nao-comecou-com-robert-raikes/

53
Raikes percebeu, depois de três anos, que seu projeto com as crianças
estava colhendo frutos motivadores e decidiu publicar em seu jornal, em 3 de
novembro de 1783, os resultados da sua Escola Dominical (CANTO, 2011). Apenas
quatro anos depois da publicação, a Escola Dominical iniciada por ele já havia se
espalhado pela Inglaterra e já contava com aproximadamente 250 mil matriculados
(BATCHELDER, 1985, p. 8).
Quando Robert Raikes veio a falecer, em 1811, o número de matriculados
chegava a 400 mil (LEMOS, 2013) e, “em 1831, 20 anos após sua morte, havia na
Grã-Bretanha escolas dominicais que, unidas, envolviam no estudo da Palavra de
Deus, semanalmente, perto de 1.250.000 crianças” (DORNAS, 2002, p. 33).
O próprio equívoco histórico de atribuir a Robert Raikes a fundação da Escola
Dominical nos ajuda a distinguir o seu trabalho dos demais que o antecederam e
precederam. É nítido que existe uma diferença marcante entre os estudos bíblicos
que eram, muitas vezes, realizados aos Domingos e o trabalho de alfabetização
realizado por Raikes. Enquanto aqueles eram estudo sistemático da Bíblia com o
objetivo de instruir e evangelizar (MATOS, 2011), a proposta de Raikes era a de
alfabetizar e formar cidadãos (LEMOS, 2013).
Quando a Escola Dominical chegou aos Estados Unidos da América do Norte,
no final do século XVIII, o principal objetivo proposto por Raikes ainda estava vivo,
qual seja, a educação de crianças pobres que trabalhavam nas fábricas. No entanto
na década de 1870 já havia sido esquecido e existiam dois tipos de Escola
Dominical: “missionárias, que evangelizavam crianças em áreas rurais e bairros
pobres das grandes cidades [e] eclesiásticas, que educavam os filhos dos membros
das igrejas” (MATOS, 2011). A Escola Dominical deixou de ser educação popular
para se tornar especificamente eclesiástica.
A Escola Dominical, no Brasil, chegou nos mesmos moldes da estadunidense.
Fundada oficialmente em 19.08.1855 17, em Petrópolis, Rio de Janeiro, pelo casal de
missionários escoceses Robert Kalley e Sarah Poulton Kalley (MAIA, 2010), tinha
por objetivo o ensino da Bíblia como forma de evangelização (LEMOS, 2013; MAIA,
2010). Em maio de 186118, o Reverendo Ashbel Green Simonton, missionário

17
Embora geralmente aceita como a data oficial, uma carta do Reverendo Justin Spaulding,
missionário metodista, datada de 05.05.1836 declara que este havia começado uma escola dominical
com mais de 40 alunos entre crianças e jovens. Cf. REILLY, Duncan A. História Documental do
Protestantismo no Brasil, p. 82.
18
MAIA estabelece a data de 22.04.1860 com base no Diário de Simonton. Cf.
www.mackenzie.br/.../Introducao_a_Educacao_Crista_15_-_Final_pdf

54
presbiteriano estadunidense inicia uma escola dominical, na cidade do Rio de
Janeiro e, mais tarde, em 17.04.1864, o Reverendo Alexander L. Blackford, também
presbiteriano, dirige a primeira na cidade de São Paulo com a presença de sete
crianças (MAIA, 2010), ambas voltadas para o estudo da Bíblia e a evangelização.
No início do século XX, a Escola Dominical no Brasil existia com o firme
propósito de conservar os filhos da igreja no seio dela, promover conhecimento
metódico da Bíblia para os membros da igreja e treinar os mesmos para o
evangelismo ou para “ganhar almas” (SILVA, 1998, p. 21-25; MAIA, 2010), e este
tem sido o seu objetivo desde então.
Percebemos, sem muito esforço, que as atividades desenvolvidas na atual escola dominical
têm como fim a manutenção da instituição religiosa tanto no tempo quanto no espaço e que a
formação de cidadãos comprometidos com a realidade social foi relegada.
Segundo Campos, fica cada vez mais evidente que é o próprio modelo de educação
religiosa cristã, centrado na escola dominical, que está em crise:
A ED (Escola Dominical) é uma instituição sem flexibilidade, [...]
sufocada pelo moralismo. [...] A Bíblia é lida numa ótica
fundamentalista, estreita e literal, o que elimina qualquer forma de
criatividade, [...] A estrutura da ED está ancorada numa “ecologia
organizacional” que pressupunha [...] uma sociedade ainda
fortemente sacralizada na qual a religião ocupava um lugar
privilegiado (apud STRECK, 1985, p. 45. Grifo nosso).

O atual processo pedagógico das escolas dominicais, onde acontece, "o doutrinamento dos
novos convertidos, através de um estudo literal da Bíblia e de uma concentração no aspecto ético-
individualista da fé cristã" (STRECK, 1982, p. 40), torna evidente que esta importante instituição
educativa protestante passa por crise de identidade sem precedentes, resultado da gradativa fuga
histórica dos problemas sociais por parte das igrejas protestantes.

2 Psicopedagogia e Escola Dominical: a intervenção psicopedagógica

O trabalho da Psicopedagogia Institucional objetiva a intervenção preventiva


para que se neutralize a instalação dos sintomas decorrentes de defasagens
educacionais e também a intervenção terapêutica, sendo que, neste caso, o
educando com déficit de aprendizagem deve ser encaminhado para
acompanhamento ou tratamento, e o educador, ou grupo de educadores, ser
conscientizado sobre as demandas que o seu agir educativo faz surgir.
Ao trabalhar com a instituição, o especialista em Psicopedagogia deve
viabilizar uma série de ações das quais dependem o êxito, ou não, de seu trabalho.

55
Podem-se enumerar as seguintes: observa, entrevista e faz devolutivas; administra
ansiedades e conflitos; trabalha com e esclarece papéis no grupo; identifica
sintomas de dificuldades no processo ensino/aprendizagem; organiza ações de
prevenção; estabelece estratégias para o exercício da autonomia; problematiza as
“queixas”; cria espaço de escuta; etc. (NOFFS, 1995 apud LIMA, 2008).
Embora a Psicopedagogia tenha nascido de uma preocupação com o
processo de aprendizagem ligado ao ambiente escolar, hoje está presente em vários
outros ambientes institucionais. A atuação da Psicopedagogia Institucional está
voltada para as escolas, empresas, hospitais, creches e organizações assistenciais,
como as ONGs. O sujeito desta modalidade de atuação psicopedagógica é o grupo
ou a instituição, que se caracteriza como uma rede complexa de relações que
precisam ser investigadas e conhecidas para que a investigação, o diagnóstico e a
intervenção logrem êxito.
Essa investigação está relacionada à coleta de informações, e isso se dá a
partir das observações realizadas no ambiente em que vai ocorrer o trabalho
psicopedagógico. Entretanto,

[...] para obter informações de valor científico, [...] é preciso usar


metodologias adequadas, a fim de evitar a identificação de fatores
que têm pouca ou mesmo nenhuma relação com o comportamento
complexo que se deseja estudar (PORTO, 2006, p. 121).

Trata-se do levantamento de prováveis demandas que vão determinar os


possíveis diagnósticos bem como direcionar as intervenções necessárias.
O objetivo da atuação psicopedagógica, no âmbito institucional, deverá ser a
de esclarecer e orientar os envolvidos no processo de ensinagem e aprendizagem
sobre a existência de conflitos que podem gerar obstáculos relacionados às áreas
cognitiva, afetiva, funcional e social, bem como identificar, analisar, diagnosticar e
intervir para eliminar a queixa transformada em demanda e resolver o problema
instalado.
Para alcançar este objetivo, faz-se necessário a aplicação de metodologias,
tais como levantamentos feitos através de questionários e observações, bem como
de testes psicopedagógicos, que serão abaixo elencados e discutidos.

2.1 Histórico da instituição

56
Toda instituição foi fundada com um ou mais objetivos. No entanto com o
decorrer do tempo o objetivo proposto muitas vezes foi deturpado, seja por questões
ideológicas, políticas ou mesmo pessoais. O levantamento do histórico da
instituição, como primeiro passo da intervenção psicopedagógica, é imprescindível
para que possíveis desvios sejam diagnosticados.

2.2 Filosofia de trabalho

A chamada filosofia de trabalho sempre está ancorada numa ideologia. É


esta maneira de ver o mundo e a sociedade que vai direcionar todas as ações
voltadas para a realização dos objetivos da instituição. O levantamento desta
filosofia e o confrontamento com as ações realizadas evidenciarão os problemas
relacionados à deturpação dos objetivos ou ao não alcance dos mesmos.

2.3 Espaço físico

O espaço físico compreende as instalações onde serão realizadas as


atividades pedagógicas e este deve estar adequado ao número de alunos
matriculados, de forma que estes sejam pedagogicamente distribuídos nas salas de
aulas, ou seja, que nesta distribuição seja respeitado um número máximo de alunos
por sala.

2.4 População atendida

O levantamento da população atendida é crucial para o diagnóstico


psicopedagógico. Mesmo em uma determinada cidade, cada bairro tem uma cultura
peculiar e a instituição educativa deve levar em conta este dado para que não
incorra no erro de oferecer atividades extracurriculares que ao invés de atrair a
população a afaste ou a desmotive da participação na vida da escola.

2.5 Formação e capacitação docente

57
A defasagem do corpo docente é uma das principais barreiras para que os
processos de ensinagem e aprendizagem se efetivem. A formação deve ser
coerente com a grade curricular que vai ser desenvolvida e a capacitação, que
acontece na formação continuada, nas especializações, nos cursos de curta duração
vai proporcionar a descoberta de novas tecnologias e metodologias que promovam a
ação pedagógica de forma mais prazerosa. A inexistência da formação continuada
acarreta em desânimo para o educador e para o educando, e em atividades
repetitivas e desmotivadoras.

2.6 Sistema de avaliação

Em todo processo pedagógico deve estar presente um sistema de avaliação.


Mas isto não significa que deva ser um processo estanque, onde os educandos
sejam avaliados somente pelas provas escritas, por exemplo. Cada ação, cada
gesto, cada palavra e mesmo o silêncio por parte do aluno proporciona ao educador
indicativos de como os processos de ensinagem e aprendizagem estão acontecendo
e se estão efetivamente acontecendo.

2.7 Reunião com os pais

Quando os agentes educativos se reúnem com mães e pais de alunos,


acontece o encontro da instituição escolar com a sociedade. Estas reuniões não
devem ser momentos para o repasse de “problemas”, apenas, mas devem ser,
também, momento para falar das potencialidades dos educandos e de escuta, por
parte dos educadores, daquilo que as mães e os pais têm a dizer, a criticar, a elogiar
e a sugerir. Perde-se tempo quando a reunião com os pais de alunos é apenas um
encontro para o repasse dos problemas escolares.

2.8 Entrevistas

58
As entrevistas com todos os envolvidos no projeto pedagógico devem ser
elaboradas previamente. Porém isto não significa que o entrevistador vais apenas
coletar dados do entrevistado, mas deve ficar atento, em cada resposta dada, aos
gestos, às expressões, às ênfases, e também ao que não foi dito, pois quer dizer
muita coisa.

2.9 Testes psicopedagógicos

Os testes psicopedagógicos são de extrema importância no processo de


intervenção, pois, via de regra, são testes projetivos. Muito do que não foi dito pelos
educandos e pelos educadores, por ocasião das entrevistas, pode ser levantado ao
se aplicar um teste de projeção, visto que o inconsciente tem muito a dizer através
de desenhos, de jogos, de brincadeiras ou mesmo da recusa em participar do teste.
Os testes psicopedagógicos devem ser escolhidos de acordo com o diagnóstico
levantado nas primeiras intervenções realizadas.

2.10 1º Sistema de hipóteses

O primeiro sistema de hipóteses é o resultado do cruzamento das


informações levantadas pelos questionários, pelas entrevistas e pelos testes
projetivos. O objetivo é levantar a primeira hipótese diagnóstica, ou seja, é a primeira
ideia sobre o problema ou problemas que estão sendo investigados para serem
minimizados ou mesmo sanados. A hipótese nunca é definitiva.

2.11 Observações

As observações acontecem no ambiente onde ocorrem as atividades


educativas e pedagógicas. Pode ser a sala de aula, a sala de recursos, a sala de
jogos e brinquedos, a biblioteca, o pátio. Tudo o que acontece no ambiente escolar
deve ser observado, pois tudo o que acontece é fenômeno educativo e pode vir a
ser pedagógico. As observações serão anotadas para posterior cruzamento com as
informações levantadas na primeira hipótese diagnóstica.

2.12 2º Sistema de hipóteses

59
As informações levantadas na primeira hipótese diagnóstica (1º Sistema de
Hipóteses) agora devem ser confrontadas com as levantadas nas observações. O
resultado evidenciará quais ações devem ser elencadas para que os agentes
educativos (Diretores, Pedagogos, Professores, Secretários, Funcionários) possam
modificar sua prática pedagógica.

2.13 Relatório de assessoramento

É no relatório de assessoramento que serão elencadas pelo responsável


pela intervenção psicopedagógica as ações que deverão ser realizadas pelos
agentes educativos para que os processos de ensinagem e aprendizagem possam
ser melhor efetivados. É o guia teórico que direcionará a prática pedagógica da
instituição daqui em diante.

2.14 Devolutiva

A Devolutiva é um documento onde o diagnóstico (levantamento dos


problemas) e o prognóstico (entendimento de como os problemas podem ou não
persistir) estarão descritos na íntegra. Nenhum diagnóstico ou prognóstico é
definitivo, devendo haver, por parte dos agentes educativos, certa maleabilidade na
aplicação das ações elencadas ao longo do tempo.

3 Psicopedagogia e Escola Dominical: quem são nossos alunos? 19

Primeiramente, nossos alunos são humanos e, como tais, são “seres


aprendentes”. Independentemente da idade ou da faixa etária que se encontram
eles aprendem, isto é, assimilam, criticam e dilatam informações. Por isso, o
processo pedagógico na Escola Dominical deve levar em conta as fases

19
Os subcapítulos 3 e 4 estão baseados nos livros: MELO, Maria Taís de. Filhote de Homem:
aspectos cognitivos, psicológicos e sociais. São Paulo: IGGE, 2005; SANTOS, Tereza Ichiki dos;
KEYES, Bill. O Bom Professor Conhece os Seus Alunos. Venda Nova, MG: Edições Luz do
Evangelho, s/d.

60
psicogenéticas20 em que se encontram os educandos, tendo em vista o aprendizado,
ou seja, fenômeno que resulta na transformação das informações em conhecimento.

3.1 Crianças de 2 a 3 anos

A partir do primeiro ano de vida, a criança adquire a marcha, e isso lhe


proporciona maior mobilidade e independência. Ao entrar no segundo ano, a
fonação é o fenômeno que propicia à criança o reconhecimento de si mesmo e, ao
mesmo tempo, a comunicação com o outro. A mãe ainda é o referencial mais
importante, mas, por volta dos três anos, começa a ocorrer a transição para a figura
paterna.
As crianças dessa faixa etária possuem necessidade de manipular materiais
variados, visto que já conseguem enfileirar e empilhar os objetos. É a fase onde
precisam ter a criatividade e a observação aguçadas, a fim de que o conhecimento
dos objetos que as cercam seja despertado.
Embora gostem de brincar sozinhas, necessitam conviver com outras
crianças.

3.2 Crianças de 4 a 6 anos

Nesta faixa etária as crianças estão com sua coordenação motora mais
desenvolvida e seus movimentos são mais seguros. São naturalmente intuitivas e
egocêntricas. Gostam de mostrar o que sabem fazer e esperam ser elogiadas.
Suas emoções são extremas, por isso necessitam de autocontrole diante de
medos de coisas ou de situações que mechem com elas, sendo um oportuno
momento para leva-las a vencer seus temores.
Por gostarem de novidades (lugares, pessoas e objetos), ficam pouco tempo
realizando uma determinada atividade, o que exige, por parte do/a educador/a a
troca constante de atividades. Se motivadas, conseguem se prender por mais tempo
em uma determinada atividade.
Estão deixando o egocentrismo e descobrindo o prazer de brincar com outras
crianças.

20
A divisão em faixas etária não representa a fase psicogenética, apenas procura aproximar a idade
biológica da psicológica para fins pedagógicos.

61
3.3 Crianças de 7 a 9 anos

A vida em grupo começa a atrair a criança desta fase. São curiosas e o


raciocínio está ficando mais profundo. Os sentimentos para com o outro estão mais
aguçados e por isso são mais cooperadores.
Por volta dos sete anos gostam tanto de fantasias quanto de fatos reais e
conseguem diferenciar um do outro. Têm uma ótima memória, no entanto sua
capacidade de expressão é limitada.
Aos oito anos têm prazer em ler, aprender, responder e em pesquisar.
Aos nove anos seu gosto já está mais refinado, passando a expor suas
ideias, discutir, questionar. Passam a gostar de ouvir histórias mais longas e de
serem desafiadas. São éticas e críticas.

3.4 Pré-Adolescentes (10 a 12 anos)

A partir desta fase, a convivência em grupos á a característica principal.


Assim sendo, as atividades precisam ser específicas para meninos ou meninas,
devido à diferença de interesses e ao ritmo de amadurecimento.
Começam a questionar o “certo” e o “errado” imposto pelos adultos. Têm boa
memória, gostam de ler, de ter responsabilidades, mas ainda não pensam com
profundidade.
São emocionalmente instáveis, podendo ir da gargalhada ao choro em
questão de minutos, e não gostam de manifestações de afeto.
Possuem grande interesse por jogos e atividades em grupo, músicas do
momento e ações de humor.

3.5 Adolescentes (13 a 17 anos)

A procura pela identidade própria começa a delinear esta fase da vida, a


adolescência. Por isso o interesse por assuntos culturais e religiosos é muito grande,
bem como a busca por seus ideais.

62
Como a capacidade de raciocínio está em pleno desenvolvimento, a busca
por novidades é intensa.
São práticos, sendo necessário dizer-lhes “para que” estão desenvolvendo
determinada atividade ou pesquisando determinado material.
Querem pertencer a um grupo, e quando os formam são grupos fechados,
onde a lealdade a estes está acima até mesmo daquela devida aos pais.
Começaram a ter consciência de seus problemas pessoais, o que os leva aos
sentimentos inconstantes e às emoções intensas.
Necessitam de atividades que trabalhem os movimentos gerais e a
flexibilidade.

3.6 Jovens

Apesar de aparentemente serem fortes e decididos, jovens frequentemente


têm problemas com autoaceitação e são propensos a descuidarem da saúde.
Dão preferência a assuntos práticos e àqueles que causam polêmica, e têm
uma fé mais prática e menos mística. Como resultado de uma fé mais prática, veem
a igreja/comunidade como um organismo vivo e não como uma instituição cheia de
regras e normas a serem obedecidas.

3.7 Adultos

Já os adultos chegaram ao momento em que suas emoções estão


equilibradas, salvo em casos de psicopatias. Por serem práticos, gostam de
assuntos voltados para o dia a dia e desejam ser desafiados. Por isso, não gostam
do corriqueiro.
Vale lembrar que adultos sabem mais do que fazem, devem “querer” e “sentir
necessidade” de aprender, o que é indício de que devem falar mais do que ouvir,
que os encontros devem ser muito mais informais que formais, e que a variedade de
métodos e metodologias deve fazer parte dos encontros.

4 Psicopedagogia e Escola Dominical: o quê e como ensinar?

63
A pergunta “o quê” nos remete ao conteúdo, enquanto “como” nos remete à
metodologia empregada para que o conteúdo seja transmitido, assimilado, criticado
e transformado em conhecimento pelo educando. Sendo o aluno da Escola
Dominical um ser “aprendente”, necessário se faz democratizar o conteúdo e
expandir a metodologia. Quero dizer com isso que o que vai ser transmitido deve ser
co-elaborado com a mediação do educador, e que as mais variadas maneiras de
transmiti-lo devem ser empregadas.
Nas tabelas a seguir, serão elencadas algumas ações pedagógicas de acordo
com a faixa etária. Não se trata de um quadro definitivo, mas de ideias para que os
educadores possam ampliá-las e melhorá-las.

4.1 Crianças de 2 a 3 anos

64
Nesta fase da vida, o ser humano
tem a atenção muito limitada. A
criança presta atenção aos
acontecimentos à sua volta por no
máximo dois minutos. Mesmo
assim, a observação deve ser
despertada para que a criança
adquira conhecimento através da
manipulação de objetos que as
cercam.

Crianças de 2 a 3 anos
Não precisaria dizer que o local
deve estar sempre cheio de
brinquedos e outros objetos.

Se a atenção é limitada, variar as


atividades é imprescindível.

A se contar histórias, que estas


sejam repetitivas e rápidas. O uso
de gestos para simbolizar o que se
quer apresentar vão prender sua
atenção.

Nunca ajudar ou apressar a criança


a encontrar palavras.
4.2 Crianças de 4 a 6 anos

65
Para crianças desta fase, as
atividades devem ser
desenvolvidas em grupo e,
preferencialmente, ao ar livre.

Tanto as brincadeiras como os


jogos devem conter regras e
limites.

Use recursos didáticos tais como


dramatização, recortes, pintura e
histórias, entre outros, mas que
Crianças de 4 a 6 anos
sejam recursos simples e
significativos para a idade. Ao
contar histórias, evite palavras
figuradas e comparações. Toda
palavra nova deve ser explicada.

Sempre faça perguntas que são


capazes de responder.

Proporcione um ambiente calmo


e jamais grite com uma criança.
Em caso de problemas no grupo,
converse com uma criança de
cada vez.

4.3 Crianças de 7 a 9 anos

66
Para esta fase, brincadeiras e
jogos devem ser elaborados de
maneira que estimulem a
curiosidade. As respostas
prontas estão fora de cogitação.
Deixe-as ajudarem quando
pedirem.

7 anos: Comece a aula


recapitulando a anterior e
termine fazendo perguntas
sobre o conteúdo abordado.
Crianças de 7 a 9 anos Deixe-as participar ativamente
da aula. Reconte histórias. Não
responda pela criança.

8 anos: Estimular a leitura.


Fazer perguntas sobre o texto.
Promover brincadeiras e jogos
de pesquisa. Dê tarefas difíceis e
desafie-as a realizá-las.

9 anos: Deixá-las falar bastante.


Sempre responder suas
perguntas de forma simples e
objetiva. Promover atividades
que as levem a pensar. Dê-lhes
bastante trabalho prático.

4.4 Pré-adolescentes (10 a 12 anos)

67
Esta fase se caracteriza pela
energia. Dê atividades onde
possam usar as suas forças.

Dê-lhes oportunidade de
pensarem, perguntarem e se
expressarem.

Encoraje e motive a memorização


ensinando-lhes cronologia e
geografia bíblica com uso de
mapas e gráficos.

Ajude-os na formação de bons


hábitos de leitura, sempre os
auxiliando na escolha do que vão
ler.

Pré-Adolescentes Estipule responsabilidades


individuais e em grupo, dando-lhes
oportunidade de aprender e
exercitar a cidadania.

Promova reuniões sociais e


passeios para a classe, visitas a
ONGs e instituições filantrópicas.
Aguçar a sensibilidade leva ao
aprendizado da solidariedade.

O desenvolvimento da lição da
escola dominical através de
competição grupal além de
envolvê-los fará com que
desenvolvam a competitividade.

68
4.5 Adolescentes (13 a 17/18 anos)

Nesta fase tão valiosa da vida,


métodos e metodologias repetitivos
de ensino não servem mais para
manter nossos alunos interessados
em participar ativamente das aulas.
O estimulo, por parte do/a
educador/a, a contribuírem com
ideias e sugestões é a melhor
maneira de incentivá-los. A
utilização de ilustrações práticas,
claras e reais vão ajudar muito
neste objetivo.

Quando for necessário pedir para


que façam algo sempre lhes
explique o objetivo, e nunca o faça
num tom de voz que os levem a
entender o pedido como uma
Adolescentes
ordem.

Delegar responsabilidades é um
excelente meio de fazer com que
os adolescentes se sintam parte do
processo e, por isso, valorizados.
No entanto não cobre resultados
imediatos.

Deixe-os fazer quantas perguntas


quiserem e responda sempre de
forma prática, aplicando às
situações da vida real.

Outra estratégia para incentivar


adolescentes à participação e ao
aprendizado é a organização de
grupos de atividades mistos.
69
4.6 Jovens e Adultos

Jovens e adultos são motivados a


aprender na medida em que
experimentam que suas necessidades e
interesses serão satisfeitos. Por esse
motivo, a orientação de aprendizagem
do jovem e do adulto está centrada na
vida e o programa de aprendizagem
deve ser organizado com base em
situações de vida, que são dinâmicas, e
não em disciplinas estanques.

A experiência é a mais rica fonte para o


jovem e o adulto aprender e, por isto, o
centro da metodologia na educação de
Jovens e Adultos
jovens e adultos é a análise das suas
experiências vivenciadas no dia a dia.

Por terem uma profunda necessidade de


serem autodirigidos, jovens e adultos
devem colaborar com o/a educador/a no
processo de mútua investigação e não
apenas receberem informações.
Precisam participar do processo de
ensinagem/aprendizagem.

Além do mais, devem ser levadas em


consideração as diferenças individuais
de estilo, tempo, lugar e ritmo de
aprendizagem por parte daquele/a que
tem o papel de mediar o processo
educativo.

70
CONCLUSÃO

É fato que as religiões, através de seus líderes, estabelecem vias de ensinar


aos fiéis seus mitos, ritos e interditos que estabelecem para estes, em última
instância, normas e regras a serem seguidas. Também é impreterível que estas
normas e regras sejam repassadas às novas gerações visando o estabelecimento
das religiões no tempo e no espaço. Existe, portanto, em todas as religiões um
processo educativo.
Percebemos, no decorrer deste livro, que tanto os hebreus, no Antigo
Testamento, quanto os cristãos, no Novo Testamento, estabeleceram meios de
transmitir os ensinamentos de Javé, o Deus que se revelou na libertação da
escravidão do Egito e em Jesus, o Nazareno e que continua a se revelar em atos
concretos de libertação de todas as formas de escravidão. Nas duas diferentes
épocas e culturas (AT e NT) os ensinamentos divinos foram repassados através de
estratégias educacionais, como leitura, escuta (tradição oral) repetição e
memorização (AT) e, entre outros, exposição da Torá, discursos, parábolas e
exemplos práticos (NT).
No entanto, por mais refinados que eram estes métodos, metodologias e
modelos aplicados na transmissão da fé, atualmente podemos e devemos
reformular, e até mesmo dispensar, alguns deles, com o apoio das Ciências
Cognitivas. Dentre estas ciências, opto neste trabalho pela Psicopedagogia, tendo
em vista que a mesma utiliza, na sua abordagem do fenômeno educativo, de forma
inter e transdisciplinar, de outras ciências, tais como a Medicina, a Psiquiatria, a
Psicologia, a Fonoaudiologia e a Pedagogia, para citar algumas.
Tendo em vista que a maior parte do processo educativo-pedagógico cristão
acontece nas chamadas escolas dominicais, procedemos nossa investigação a partir
deste ambiente. Podemos perceber, no decorrer da investigação, que a Escola
Dominical passou por transformações quanto ao seu objetivo desde que as pioneiras
e os pioneiros deste projeto puseram as mãos à obra. Porém, independentemente
das transformações por que passou a ED, nosso objetivo, neste trabalho, foi
averiguar os meios de transmissão (métodos), como se processa a transmissão
(metodologias), quem são os agentes transmissores e receptivos
(educadores/educandos) e o que é transmitido (conteúdo).

71
A Educação Religiosa Cristã, que acontece, prioritariamente, nas escolas
dominicais não acontece de forma isenta. A Escola Dominical está inserida em
determinada instituição religiosa, que tem a sua história, que por sua vez está
inserida em determinado contexto social e histórico. Existe, neste contexto,
determinado tipo de população, com suas características históricas, sociais e
econômicas. Este contexto que cerca a Escola Dominical vai definir o modelo, os
métodos e as metodologias da educação cristã a ser desenvolvida pela instituição
religiosa.
O processo educativo-pedagógico religioso cristão não pode ser o mero
repassar de informações desconexas da realidade tanto da instituição religiosa
quanto da dos educadores e educandos. Todos esses atores educativos estão
inseridos no contexto maior do Reino de Deus, inaugurado e ensinado por Jesus
Nazareno. A instituição tem valores a salvaguardar, os educadores a repassar e os
educandos a assimilar e praticar. A Solidariedade (amor ao próximo) é o maior
destes valores e o que deve permear toda a ação educativa da Igreja.
Ensinar valores do Reino é o papel da Igreja como instituição educativa.
Mas, para lograr êxito nesta difícil tarefa, deve levar em conta que educadores não
mantêm o monopólio do conhecimento e que educandos não são “tábulas rasas”,
como se pensava até pouco tempo atrás. Cada aluno/a da Escola Dominical tem
com que contribuir no processo educativo, tendo em vista que em cada fase do
desenvolvimento humano somos capazes de receber e assimilar informações e
transformá-las em conhecimento. Nenhum educando vai para a sala de aula sem
nada saber, como desconhecedor do mundo que o cerca e do qual participa.
Assim sendo, cabe a todos aqueles e aquelas que desenvolvem o ministério
educativo nas escolas dominicais respeitar cada aluno/a, desde o mais novo até ao
mais idoso deles/as, respeitar o que são, o que dizem, o que fazem, o que pensam,
enfim, o que sabem da vida, pois a vida é o ideal por excelência do Reino de Deus.

72
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WALKER, W. História da Igreja Cristã. Volume. I. São Paulo: ASTE, 1967.
WEISS, Maria Lúcia. PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA: uma visão diagnóstica dos
problemas de aprendizagem escolar. 14ª ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2012.
WOLF, R. A. do Prado. Pedagogia Hospitalar: a prática do pedagogo em instituição
não hospitalar. 2007. Disponível em:
http//www.uepg.br/revistaconexao/revista/edicao03/artigo11.pdf. acesso em: 20
set. 2011.

APÊNDICE

77
RELATÓRIO DE INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA INSTITUCIONAL
REALIZADA NA IGREJA PRESBITERIANA INDEPENDENTE DO JARDIM
LEONOR – LONDRINA – PARANÁ

O presente relatório foi elaborado como resultado do estágio em


Psicopedagogia Institucional, conforme disciplina em vigência no curso de
Especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional da Universidade Norte do

78
Paraná – UNOPAR. Os dados que se seguem são o resultado de investigação
realizada através da aplicação de questionários, entrevistas e testes projetivos aos
envolvidos no processo de ensinagem e aprendizagem, bem como de observações
em sala de aula da Escola Dominical (ED) da Igreja Presbiteriana Independente do
Jardim Leonor, na cidade de Londrina, Paraná.

1 Histórico da instituição

A Igreja Presbiteriana Independente do Jardim Leonor iniciou sua história no


ano de 1977, quando o Sr. Erasmo de Araújo, acompanhado de sua família, fixou
sua residência no bairro denominado Jardim Leonor, na cidade de Londrina, estado
do Paraná. Ao verificar que o conjunto habitacional era bastante populoso e que os
bairros circunvizinhos também cresciam assustadoramente, decidiu fazer um
trabalho de visitação a todas as famílias crentes daquela região, com o objetivo de
reunir as pessoas visando à criação de uma “congregação” da Igreja Presbiteriana
Independente naquele bairro.
Muitas pessoas se interessaram por frequentar a congregação e um cômodo
de uma propriedade do Sr. Jair Gouveia Goulart, na Rua Jequitibá, 174, foi
desocupado e imediatamente alugado pelo grupo. Neste local, no dia 11 de
Fevereiro de 1977 aconteceu a primeira reunião daquelas pessoas, com a presença
do Rev. Jaime Clóvis da Silva.
Para solidificar os objetivos do grupo era necessário que a instalação fosse
oficializada perante os órgãos superiores da referida igreja. Para isso o Conselho da
3ª IPI de Londrina se reuniu, e, após ouvir a exposição dos motivos e das
necessidades existentes, autorizou a abertura de uma frente de trabalho missionário
no local pretendido, que deveria funcionar sob a jurisdição daquela igreja. O
Conselho determinou que tudo fosse feito de acordo com as normas constitucionais
da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil. Então, foi criada a Escola Dominical
e estabeleceu-se, ainda, que os cultos deveriam ser realizados nas Quartas-feiras e
Domingos. Decidiu-se, também, que em todos os primeiros Domingos de cada mês
seria realizada a Santa Ceia. O Conselho também determinou que durante os três
primeiros meses seguintes, todas as Segundas-feiras, se ministrassem aulas de
catecúmenos a fim de preparar candidatos para a Profissão de Fé e Batismo. A
estrutura eclesiástica da Congregação ficou assim constituída:

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Pastor: Rev. Jaime Clóvis da Silva
Diretor da Congregação: Presbítero Antônio Marcondes
Superintendente da Escola Dominical: Presbítero Erasmo de Araújo
Vice-Superintendente: Neide Pereira
1º Secretário: Nicolau Mitsuhiro Itiyama
2º Secretário: Paulo Jurandir Judar
Tesoureiro: Presbítero Erasmo de Araújo
Professores da Escola Dominical: Geni Goulart Araújo, Nadir Nicolau da Silva,
Rosemeire Goulart Itiyama, Sebastião Bernardino Pereira e Ângelo de Oliveira.

Como resultado do trabalho e da dedicação daquelas pessoas a


Congregação começou a crescer de tal forma que no dia 18 de Outubro de 1981 um
ofício firmado pelo diretor da Congregação foi enviado ao Conselho da 3ª IPI
acompanhado de uma lista com 47 assinaturas, solicitando a formação da Igreja
Presbiteriana Independente do Jardim Leonor (6ªIPI). Todos os que subscreveram
aquele documento residiam no Jardim Leonor e bairros adjacentes. No dia 23 de
Outubro de 1981 o pedido foi oficialmente apresentado ao Presbitério de Londrina
por ocasião de sua 26ª reunião ordinária, realizada no templo da 3ªIPI. Entre outros
argumentos, o documento informava que a Congregação já havia adquirido um
terreno e estava agilizando a construção do templo. A Comissão designada pelo
Presbitério para estudo do documento deu parecer favorável ao pedido por entender
que as justificativas apresentadas eram coerentes e obedeciam, inclusive, as
Normas Constitucionais da IPIB. Foi assim que, no dias 9 de Janeiro de 1982, por
ocasião de sua 27ª reunião ordinária, o Presbitério de Londrina aprovou o pedido de
organização da igreja. O Presbitério nomeou, então, uma comissão presidida pelo
Rev. Ozéas da Silva e representada pelos membros da mesa executiva, para
realizar o ato solene de organização da igreja a qual foi marcada para o dia 14 de
Março de 1982.
A ata especial lavrada por ocasião da organização da igreja, registra o Ato
Solene, no templo da Congregação, no dia 14 de Março de 1982. O Presidente da
Comissão designada pelo Presbitério, Rev. Ozéas da Silva se fez presente,
acompanhado dos senhores: Presbíteros Ivan Pires de Camargo e Emanuel Góis e
do Rev. Oliveira de Souza, membros da referida comissão. Na oportunidade foram
arrolados 48 membros comungantes, cujos nomes estão registrados na referida ata.

80
O então Presidente do Presbitério de Londrina, Presbítero Ivan Pires de Camargo
usou da palavra para instruir os membros sobre a eleição dos oficiais, lembrando
dos deveres e responsabilidades de cada um.
A votação teve início após a leitura do capítulo 3 da primeira carta de Paulo a
Timóteo e de três orações voluntárias. Foram eleitos para presbítero: José Machado
de Oliveira, Antônio Marcondes e Erasmo de Araújo. Para a Mesa Diaconal: Martha
Durão Judar, Raimundo Augusto de Jesus, Nicolau Mitsuhiro Itiyama e Geni Goulart.
A nomeação do tesoureiro foi feita na primeira reunião do Conselho e o escolhido foi
o irmão Lourival Nicolau. Por determinação do Presbitério, desde 1º de Janeiro de
1982 o então pastor da 4ª IPI de Londrina, Rev. Oliveira de Souza assumira o
pastorado da Congregação. No dia 14 de Março de 1982 assumiu definitivamente o
pastorado da igreja permanecendo até Dezembro de 1990. O primeiro conselho da
igreja ficou assim constituído:
Presidente: Rev. Oliveira de Souza
Vice-Presidente: Presbítero Antônio Marcondes
Secretário: Presbítero Erasmo de Araújo
Membro: Presbítero José Machado de Oliveira

2 Filosofia de trabalho

A Igreja Presbiteriana Independente do Jardim Leonor que tem como regra


única e infalível de fé e prática as Santas Escrituras (Bíblia) do Antigo e do Novo
Testamento, adota a forma Presbiteriana de governo e o sistema doutrinário da
Confissão de Fé de Westminster, tem por fim o culto a Deus, a promoção do Seu
Reino, o ensino das Sagradas Escrituras, a proclamação do Evangelho e o
aperfeiçoamento da vida cristã.

3 Espaço físico

A Igreja Presbiteriana Independente do Jardim Leonor está localizada à Rua


dos Eucaliptos, nº 348, Jardim Leonor, Londrina, Paraná. Neste espaço existem dois
prédios: o templo e o prédio de Educação Cristã. Este último, onde acontecem as
aulas da Escola Dominical, é composto por sete (6) salas, sendo uma (1) secretaria,

81
uma (1) sala para adultos, uma (1) sala para jovens e adolescentes, uma (1) para
pré-adolescentes e duas (2) para crianças.

4 População atendida

A população atendida pela Escola Dominical é constituída pelos membros da


própria comunidade (igreja) e por moradores do bairro que queiram frequentá-la.

5 Formação e capacitação docente

A formação e capacitação docente são feitas, esporadicamente, por


organismos externos à Escola Dominical.

6 Sistema de avaliação

Não possui sistema de avaliação.

7 Reunião com pais

As reuniões com os pais acontecem apenas em ocasiões especiais e em


datas festivas.

8 ENTREVISTAS

8.1 Entrevista com o diretor/pastor

Pergunta-se, primeiramente, ao Diretor qual é a sua formação e o mesmo é


graduado em Psicologia, com mestrado na mesma área e com seu doutoramento
em fase de conclusão. Também é Psicanalista. Em seguida, a pergunta diz respeito
ao papel da Escola Dominical, e ele vê a mesma como a porta de entrada para a
igreja, pois é nela que acontece o forjamento do caráter cristão. A próxima pergunta
tem a ver com as atribuições do Diretor, e a resposta é que suas atribuições são a
supervisão do material pedagógico e, no seu caso especificamente, o
acompanhamento psicológico dos professores. Com relação às dificuldades

82
encontradas na administração da ED e na efetivação da aprendizagem dos valores
cristãos, responde que o pouco tempo para reuniões, a pouca proximidade e as
influências externas, como os diferentes discursos, são as maiores dificuldades
encontradas. Quando perguntado sobre a importância de seu trabalho no processo
de ensino e aprendizagem, ele diz que seu trabalho como cuidador dos professores
e ser o exemplo em tudo o que ensina. O que já foi feito para minimizar ou sanar os
problemas que interferem no processo ensino/aprendizagem, bem como quais os
resultados obtidos, ele diz que a escolha, pela Diretoria, dos envolvidos no processo
educacional daquelas pessoas que tem algum perfil educacional/pedagógico e a
continuidade dessa equipe e que essas ações trouxeram maior frequência na ED, a
escolha de temas coesos, com uma mesma linha semântica e uma Abertura mais
dinâmica. Sobre o relacionamento entre os integrantes da ED, responde que é
excelente e coeso. Foi perguntado ao Diretor sobre o organograma dos cargos e
funções da ED e se todos estão dispostos como preestabelecido pela Secretaria
Nacional de Educação Cristã (SEC), e ele disse que o mesmo está assim
organizado: Superintendente (Coordenador) e vice; Secretário e vice; Professores, e
que não existe um quadro de cargos e funções estabelecidos pela Secretaria
Nacional, mas, sim, normas, tais como ser membro professo da igreja há pelo
menos dois anos e ser aprovado pelo Diretor. Quanto à realização de reuniões com
os responsáveis pela Educação Cristã e se os mesmos são atuantes, a resposta é
negativa para as reuniões e que os responsáveis pela Educação Cristã estão
abertos a uma boa atuação, mas que falta efetivação. A última pergunta é se,
enquanto Diretor, ele gostaria que alguma coisa mudasse na ED e como
poderíamos ajudar nisso, e ele diz que mudaria o horário, talvez agregado ao do
culto da noite, bem como alguns paradigmas, tais como viabilizar mais trabalhos
externos, atividades mais práticas e mais atraentes.

8.2 Entrevista com a coordenadora/superintendente

A primeira pergunta diz respeito à formação da Coordenadora, e ela responde


que é formada em Pedagogia, em Teologia e tem Especialização em Sociologia da
Educação. Sobre o papel da Escola Dominical (ED), ela diz que é a transmissão de
conhecimentos bíblicos e teológicos para que os alunos possam repassar para as
pessoas de fora da igreja. Quanto a sua função enquanto Coordenadora, diz que é

83
agilizar os mecanismos de funcionamento da ED, formar, organizar o material
pedagógico, levantar as ausências e que é responsável pelo próprio formato da ED.
Quando perguntado sobre a relação entre a coordenação e os professores, ela
responde que não tem muito êxito, que existe uma distância dos professores e que
cada um “faz o seu”, por causa da existência das Revistas. Da mesma forma, com
relação à participação da coordenação no planejamento com os professores,
responde negativamente e complementa que o motivo é que as lições já estão nas
revistas. Pergunta-se se os professores têm acesso ao material de apoio
pedagógico e se o acervo é atualizado e diversificado e a resposta é que existe, sim,
uma biblioteca nova, ainda com pouco material, mas que já é de grande ajuda aos
professores. Quanto a comunicação entre os membros da instituição e a Escola
Dominical e entre a esta e o bairro, a coordenadora responde que a comunicação
com os membros da igreja na abertura da ED e, às vezes, pessoalmente, no culto
da noite, e que com o bairro a comunicação acontece através do Departamento
Infantil quando na Escola Bíblica de Férias (EBD). Se a ED estabelece parceria com
outras instituições de ensino, a resposta é negativa. A próxima pergunta é se os
professores dispõem de auxiliares e com que frequência, e a resposta é que todos
têm um auxiliar, com exceção do professor dos jovens e adolescentes. Quando
questionada sobre as medidas que podem ser tomadas nos casos em que os
professores se sentem frustrados na sua atuação, responde que através do diálogo.
Quanto à formação e capacitação docente e com que frequência acontece,
responde que às vezes, que a ênfase está no Departamento Infantil e que no ano
anterior não ocorreu nenhuma. Por fim, quando se pergunta sobre as mudanças que
ela proporia para a ED, responde que na implementação de um Projeto Pedagógico
para que todos possam seguir a mesma linha e a mesma direção.

8.3 Entrevista com os/as professores/as

A primeira pergunta feita aos professores foi sobre as estratégias usadas para
ajudar os alunos desinteressados e/ou com dificuldades de aprendizagem e se essa
intervenção tem tido sucesso e as respostas, por agrupamento, são: conhecer suas
dificuldades; elaborar a lição de acordo com suas dificuldades; aula dinâmica e
participativa; mudanças constantes de estratégias; exemplos; carinho; gincanas com
prêmios; músicas; maior tempo com o aluno. Todos responderam que as estratégias

84
adotadas surtem efeito. Quando perguntado sobre a realização como professor/a da
ED, as respostas da maioria foi positiva, um deles disse que apenas um pouco e
outro disse que não. Em seguida, a pergunta feita é se o professor tem uma postura
crítica em relação a sua ação pedagógica e obtiveram-se seis respostas afirmativas
e três negativas. Com relação ao relacionamento professor/aluno e
professor/direção, as respostas foram “tranquilo”, “muito bom” e “ótimo”. A próxima
pergunta foi sobre o papel do professor na ED e as respostas foram: ensinar
conteúdos cristãos e bíblicos, ensinar a palavra de Deus, ensinar os alunos a terem
uma vida cristã, criar consciência e crescimento espiritual, “ensinar”, “orientar”,
“servir”. Com relação à postura, como professor, diante de uma situação de
frustração, as respostas foram as mais variadas: acompanhamento, oração, diálogo,
mudança de método, chateação, naturalidade, seguir em frente. Os professores
foram questionados sobre a maior dificuldade encontrada na realização de seu
trabalho e responderam que a união entre eles, crianças de diferentes fases de
desenvolvimento na mesma sala, timidez, aceitar as ações de cada aluno, escolha
do material que atenda os objetivos, problemas pessoais, desânimo, falta de
formação, conflitos internos, “não tenho dificuldade”. Foi perguntado se a afetividade
ajuda na relação professor/aluno e oito professores responderam que sim e apenas
um disse que pode “ajudar e atrapalhar”. Por fim, pergunta-se a quem o/a
professor/a atribui o desinteresse da maioria pela ED e as respostas foram muito
variadas, tais como: à metodologia, à falta de disciplina pessoal, família,
professores, sociedade, tecnologia, falta de estratégias, assuntos repetitivos e ao
horário.

8.4 Entrevista com os/as alunos/as

Os/as alunos/as da Escola Dominical da Igreja Presbiteriana Independente do


Jardim Leonor estão divididos em classes ou turmas assim dispostas: Crianças de 0
– 6 anos; Crianças 7 – 9 anos; Pré-Adolescentes (10 – 12/13 anos); Jovens e
Adolescentes (14 – 20 anos), Adultos I e Adultos II.

8.4.1 Crianças de 0 – 6 anos

85
Embora a denominação da classe seja a de crianças de 0 a 6 anos, os
alunos matriculados têm entre 4 e 6 anos. A primeira questão foi em forma de teste
projetivo, e foi pedido aos alunos que pintassem uma árvore de natal (ANEXO B),
tendo em vista que a escolha da cor está relacionada com as reações afetivas.
Depois que a árvore foi pintada, foram feitas algumas perguntas numa roda de
conversa informal e a resposta dos quatro alunos presentes à aula, para a primeira
delas, qual seja, se eles gostam de ir à ED, foi positiva. A segunda pergunta foi
sobre o que eles mais gostam em sua professora e que ela cuida dos alunos, faz as
atividades juntamente com eles e que é muito legal foram as respostas. Perguntado
se eles gostam das atividades, todos responderam que gostam muito. Se eles têm
algum amiguinho foi a última pergunta feita e todos eles responderam
afirmativamente.

8.4.2 Crianças de 7 – 9 anos

Primeiramente, foi aplicado o teste projetivo denominado “Par Educativo”


(Anexo B) com o objetivo de verificar se esses alunos apresentam vínculo com a
aprendizagem, e levantou-se que o vínculo da maioria com a aprendizagem é
negativo, que essas crianças têm maior vínculo com a aprendizagem sistemática e
também que a metade dos alunos apresentam problemas com relação ao docente.
Quando perguntado se gostam de ir à ED, todos responderam afirmativamente, e
sobre o que mais gostam e o que menos gostam na ED, as respostas foram:
histórias, atividades, e um deles que de tudo. A seguir, foi perguntado a eles se a
professora passa tarefa para casa e se são ajudados pelos pais, ao que todos
responderam afirmativamente para a primeira parte da pergunta, sendo que dois
responderam que são ajudados pelos pais e os outros dois que não são ajudados.
Se eles gostam da professora foi a próxima pergunta feita e todos eles responderam
que gostam. Com relação às atividades realizadas durante as aulas, as respostas
foram unânimes: histórias, desenhos, colagem e pintura. Como última questão,
perguntou-se o que mudariam na ED se pudessem e os quatro alunos submetidos
ao questionário responderam que nada mudariam.

8.4.3 Alunos pré-adolescentes (10 – 12/13 anos)

86
Como primeira questão, foi aplicado aos alunos um teste denominado “A
Árvore dos Valores”, cujo objetivo é levantar os tipos de valores que essas crianças
têm adquirido nas aulas da ED (Anexo B). Os valores, neste teste, estão divididos
em Éticos, Estéticos, Religiosos e Políticos. Dispostos os valores escritos em
pequenas tiras de papéis espalhadas aleatoriamente sobre uma mesa, pediu-se que
as crianças, uma de cada vez, escolhessem um valor e colasse na árvore, que foi
desenhada e colada na parede, e os valores mais escolhidos foram os políticos
seguidos pelos religiosos. Em seguida, foi aplicado o mesmo questionário que às
crianças de 7 – 9 anos. Assim sendo, primeiramente foi perguntado se eles gostam
de ir à ED e todos respondem afirmativamente. À pergunta sobre o que mais gostam
e o que menos gostam na ED, as respostas para o que gostam são: as histórias, de
tudo, da aula e das atividades. Com relação ao que não gostam, responderam que
de escrever, “peca”, do pessoal, de falar mentira, “nada” e de alunos que atrapalham
a aula. Na próxima pergunta, o objetivo foi o de levantar se a professora passa
tarefas para casa e se os pais os auxiliam e todos os alunos responderam
afirmativamente. Com relação ao auxílio dos pais, dois alunos responderam que sim,
quatro responderam que não e um não respondeu. Se eles gostam da professora foi
a pergunta seguinte e todos eles responderam afirmativamente. A próxima questão
é sobre as atividades realizadas durante as aulas e estas foram assim
discriminadas: histórias, leitura da Bíblia, desenhar, pintar, gincanas, “tudo”, “ensino
sobre Abraão”, questionário e leituras. O questionário é encerrado com uma última
pergunta, a saber, se os alunos pudessem modificar alguma coisa da ED, o que
modificariam e seis deles responderam que não modificariam nada e apenas um deu
uma sugestão: teatros com fantoches.

8.4.4 Alunos jovens e adolescentes (14 – 20 anos)

A primeira questão dirigida a estes alunos foi sobre a importância da ED e


que explicassem sua resposta e os quatro alunos presentes à aula disseram que a
ED é importante porque ensina sobre a vida com Cristo, a conhecer mais a Deus,
por ser um momento de troca de opiniões e porque se aprende mais sobre Deus.
Em seguida é perguntado se as atividades são interessantes e respondem que são
muito interessantes. A próxima pergunta diz respeito à oportunidade de participação

87
durante as aulas e todos respondem que sim, sendo que um aluno complementa
que na maioria das vezes não sabe o que dizer por não ter opinião formada.
Também é perguntado se as aulas são objetivas e todos respondem que são. Foi
pedido que os alunos dissessem o que eles mais gostam na ED e que explicassem
e as respostas foram: a facilidade de compreender os temas e poder discuti-los; das
aulas, porque são ótimas para a vida; um respondeu que gosta dos temas, sem
explicar a resposta e outro do momento de mostrar as opiniões, também sem
explicar a resposta. Da mesma forma, foi perguntado o que eles menos gostavam na
ED e três deles responderam nada, por enquanto; quando não tem Escola
Dominical; o horário; um aluno não respondeu a questão e apenas um a explicou. A
próxima pergunta foi se mudariam alguma coisa na ED e que explicassem a
resposta, e as respostas de três dos quatro alunos presentes foram que não
mudariam nada, sendo que apenas um respondeu que a forma como as classes são
tratadas pelas pessoas da própria instituição. A última questão foi sobre suas
opiniões sobre a preparação dos professores, sendo que dois alunos responderam
que sim, um respondeu que na maioria das vezes e o outro que alguns o são, mas
outros apenas transmitem o conteúdo da revista.

8.4.5 Alunos adultos I e II

Pergunta-se aos adultos porque participam da ED e a resposta dada pela


maioria dos alunos foi a de que participam para aprender a palavra de Deus. Um
aluno responde que sente prazer em estar na ED, outros dois que amam a ED, mais
dois porque trás crescimento e um deles por causa da oportunidade de discussão. A
segunda questão, se os conteúdos transmitidos atendem as suas necessidades, a
maioria responde apenas que sim, um deles complementa a resposta e diz que é
porque não se usa a revista, e dois não respondem a questão. Perguntado se o que
é aprendido pode ser aplicado ao dia a dia, a maioria dos alunos responde que sim,
e as demais respostas são: que a palavra de Deus tem resposta pra tudo, que ajuda
a viver melhor e a se relacionar com os irmãos; no entanto dois alunos discordam e
respondem que algumas lições podem e outras não. Quanto a participação na
elaboração das aulas, a maioria responde que não participa, três alunos não
respondem a questão, um que às vezes e três que participam. Sobre a oportunidade
de participação durante as aulas todos respondem que têm oportunidade. Quando

88
perguntado se suas perguntas são respondidas satisfatoriamente, a maioria
responde que são e apenas três respondem que na maioria das vezes. Se alguma
coisa poderia ser mudada na ED foi a próxima pergunta e a maioria disse que nada,
seguido por duas respostas sobre a pontualidade, duas sobre se ter maior tempo
para as aulas, uma resposta sobre maior utilização da Bíblia nas aulas, aulas mais
atrativas, maior aprofundamento e dois alunos não responderam. A última questão
foi se a liderança da ED é bem preparada e atuante e treze alunos responderam que
sim, um que poderia melhorar, outro que quase sempre, sendo que apenas um não
respondeu a pergunta.

9 Testes Psicopedagógicos

PAR EDUCATIVO

CRIA

NÇA DE 8 ANOS

ÁRVORE DOS VALORES

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VALORES ESCOLHIDOS (ALUNOS 10 – 12 ANOS)

10 1º SISTEMA DE HIPÓTESES

Algumas dificuldades na efetivação do papel da ED, previsto na


filosofia de trabalho da IPI do Jardim Leonor, foram identificadas no cruzamento de
informações retiradas das respostas dadas às perguntas feitas ao diretor de
Educação Cristã, à coordenadora, ao secretário, professores e alunos. O papel da
ED consiste em, de um lado, contribuir para o forjamento do caráter cristão através
do ensino da Bíblia, e, de outro lado, proporcionar conhecimento bíblico e teológico
para que seus alunos transmitam os ensinos bíblicos para as pessoas que não
frequentam a igreja. As dificuldades na efetivação da ensinagem/aprendizagem
percebidas são a falta de uma metodologia adequada, de um projeto pedagógico, a

90
quase nulidade das reuniões pedagógicas, as revistas com suas lições prontas, falta
de planejamento por causa das revistas, pouco investimento na formação docente,
preocupação em transmitir o conteúdo das revistas, salas com crianças de
diferentes estágios de desenvolvimento, dificuldade de escolha de material
pedagógico apropriado, falta de ajuda dos pais nas tarefas das crianças, falta de
atividades práticas, pouco trabalho externo e o horário da ED. Também dificultam o
processo de ensinagem/aprendizagem o pouco envolvimento relacional entre os
responsáveis pela educação cristã e entre os docentes e os discentes.

11 OBSERVAÇÕES

As observações abaixo descritas foram colhidas na ED da IPI do


Jardim Leonor, que é formada por seis turmas assim denominadas: Classe de
Adultos I, Classe de Adultos II, Classe de Jovens e Adolescentes, Classe de Pré-
Adolescentes (10 – 12/13 anos), Classe de Crianças de 0 – 6 anos e Classe de
crianças de 7 – 9 anos.

11.1 Observação geral

Antes do início das aulas, os alunos participam de um momento denominado


de “Abertura da Escola Dominical (ED)”, que acontece no templo e cujo início é
previsto para as 09h. Neste momento que antecede as aulas, são feitas algumas
orações, lidos os avisos que se encontram no Boletim Semanal por quem dirige o
momento e são cantadas três canções com a direção do Grupo de Louvor. Depois
desse momento acontece a separação das turmas (classes) para as respectivas
salas. Pode-se observar que durante o momento de “abertura”, as crianças ficam o
tempo todo dispersas, brincando umas com as outras e caminhando pelo templo.

11.1.1 Classe dos Adultos I


11.1.1.1 Observação da sala de aula

Os alunos se reúnem para as aulas no interior do próprio templo, que


conta com espaço bastante amplo e é bem ventilado. Para que participem das aulas,

91
os alunos se sentam em bancos de madeira enfileirados e o professor conta com um
pequeno púlpito de madeira.

11.1.1.2 Observação dos professores e alunos

A aula tem início com saudação e chamada, além de o professor


perguntar pelo número de Bíblias e revistas trazidas pelos alunos. Terminada a
chamada, ele faz referência ao tema que está sendo estudado, tema este que se
encontra na Revista de Adultos e está dividido em assuntos, e anuncia o assunto
que será estudado. Faz uma oração e começa a ler a Revista e vai discorrendo
sobre o assunto enquanto os alunos o ouvem. Desde o início alguns alunos já
demonstram que estão dispersos. Terminada a leitura da introdução ao assunto, o
professor começa a explanar sobre o que acabou de ler e pede para alguns alunos
lerem textos bíblicos que ele anuncia. O aluno (1) faz uma pergunta ao professor e
este lhe responde, mas o aluno (1) não fica satisfeito com sua resposta e volta a
questionar o professor. Durante a aula, por muitas vezes o aluno (1) questionou o
professor, mas em apenas dois momentos obteve respostas que o deixaram
satisfeitos. Esta polarização da discussão entre o professor e o aluno (1)
visivelmente desagradou a muitos alunos, que passaram a olhar para os lados, a
lerem o Boletim Semanal e a Bíblia, demonstrando desinteresse. O professor
continuou a ler trechos da revista e textos bíblicos que tinha anotado em uma folha
de papel. De vez em quando perguntava aos alunos se alguém queria fazer uma
pergunta, no entanto não dava espaço para que isso acontecesse. Com mais da
metade da classe dispersa, com o aluno (1) questionando e causando polêmica e
com o aluno (2) discordando do aluno (1), o professor, ainda assim, mantém seu
estilo de leitura dos textos bíblicos, de trechos da revista e de explicação dos
mesmos. Quando alunos (3) e (4) esboçaram algum tipo de participação na aula, o
professor, visivelmente ansioso por transmitir o conteúdo da lição, não lhes deu o
espaço necessário, apenas concordando com o que disseram. Passa rapidamente
para a conclusão do assunto e a lê na revista, explanando e concluído a lição.

92
11.1.2 Classe dos Adultos II
11.1.2.1 Observação da sala de aula

A sala se localiza no segundo andar do Prédio de Educação Cristã e


seu acesso é feito unicamente pelas escadas. O espaço físico é amplo, bem
ventilado e as cadeiras estão dispostas em círculo. Há uma pequena biblioteca e
uma pequena videoteca.

11.1.2.2 Observação dos professores e alunos

O professor, que está substituindo o professor titular por alguns


encontros, aguarda os alunos se sentarem e neste momento o secretário entra na
sala e entrega a ele a caderneta de chamada. Enquanto os alunos aguardam em
silêncio pelo início da aula, o professor olha para cada um dos alunos e faz
anotações na caderneta, dando a entender que faz a chamada visualmente. O
primeiro momento da aula é bem acolhedor, com o professor dando as boas vindas
aos alunos e com um dos alunos cantando uma canção acompanhada pelo violão.
Em seguida o professor abre uma folha de papel onde tem algumas anotações e diz
aos alunos que o tema da aula será “CRISE”. Abre sua Bíblia e anuncia a leitura de
um texto, pedindo que os alunos acompanhem a leitura em suas Bíblias, mas
percebe-se que nem todos o fazem ou não trouxeram suas Bíblias para a aula.
Terminada a leitura do texto anunciado, o professor passa a explanar sobre ele, mas
é interrompido pelo secretário que abre a porta para recolher a caderneta e trazer
até a sala um novo aluno que parece ser um visitante. Após este momento de
interrupção da aula, o professor pergunta aos alunos quem tem uma história de crise
para compartilhar e um deles começa a falar sobre a doença da mãe. É bastante
interessante que durante a sua fala, os demais alunos prestam bastante atenção e
um deles chega mesmo a interrompê-lo com palavras encorajamento. Em seguida,
outro aluno compartilha sobre o acidente sofrido pelo filho, sobre sua distância
enquanto pai que trabalha fora da cidade e chora, e desta vez é o professor quem
lhe dirige palavras de conforto e esperança. O que chama a atenção neste momento
de partilha, é que o primeiro aluno a compartilhar sobre a crise vivida com a doença
da mãe trouxe maior união aos familiares e, em contrapartida, o segundo confessa
que a crise vivenciada com a demorada recuperação do filho tem trazido muito

93
desânimo. O professor, então, intermedia a partilha fazendo referência ao texto
bíblico e um terceiro aluno pede a palavra e dá continuidade ao assunto, dizendo
que o objetivo de toda crise é trazer fortalecimento e crescimento e não desânimo, e
neste momento se estabelece um clima de tensão, porque enquanto falava o aluno
que compartilhou o acidente do filho estava conversando paralelamente com outro
que estava sentado ao seu lado. Houve trocas de palavras em tom rude e ruptura
imediata do diálogo. O professor percebe o clima de tensão que se estabeleceu
entre os dois alunos e retoma o assunto, pautando-se nas suas anotações. A aula
se desenvolve, a partir desse momento, sem muita participação dos alunos, e
quando esta ocorre, percebe-se que são sempre os mesmos que participam, até
que, um deles, fez referência a um passeio realizado na noite anterior e muitos dos
que até então não haviam participado da aula começaram a compartilhar seus
sentimentos com relação ao passeio e a rirem bastante dos acontecimentos. O
professor se mostra descontente com o rumo da aula e, assim que tem uma
oportunidade de falar, faz uma pergunta sobre o assunto com o claro intuito de
retomar a discussão sobre a crise, no entanto nenhum deles responde, o leva a
prosseguir falando. A aula está chegando ao fim, conforme anunciado pelo professor
e além da maioria dos alunos não participar, três deles permaneceram o tempo todo
olhando para os lados e para baixo, numa clara demonstração de desinteresse pelo
assunto. Outro acontecimento que chamou a atenção durante a aula, é que o aluno
que chegou depois de começada a aula, trazido pelo secretário, retirou-se da sala
em poucos minutos e não mais retornou, sendo que tal fato aparentemente não
incomodou nem o professor e nem os alunos.

11.1.3 Classe dos Jovens e Adolescentes


11.1.3.1 Observação da sala de aula

A sala de aula está localizada à direita do templo, no andar térreo. O espaço é


pequeno e com pouca ventilação (apenas uma janela). Está equipada com uma
mesa e com cadeiras expostas em seu redor e um armário de aço.

94
11.1.3.2 Observação dos professores e alunos

Os alunos chegam à sala e se sentam ao redor da mesa silenciosamente, a


princípio, mas logo começam a conversar entre si e a rirem enquanto o professor se
prepara para iniciar a aula retirando de uma pasta algumas folhas de papel. O
Professor faz uma oração e percebe-se que todos os alunos o acompanham com
suas cabeças abaixadas e olhos fechados em atitude de respeito. O professor diz
que a aula será atípica por causa do pequeno número de alunos presentes e propõe
dois temas a serem discutidos de forma sucinta nesta aula e com continuidade da
discussão nos próximos encontros. Os temas propostos foram: “CASAMENTO” e
“HOMOSSEXUALIDADE”. A maneira como o professor dispõe a aula é interessante:
Primeiro discorre sobre o tema e depois se dirige aos alunos, um de cada vez, e faz
perguntas pessoais. Com relação ao primeiro tema, “CASAMENTO”, as
participações foram discretas, com respostas curtas e demonstraram tanto o
despreparo quanto o desinteresse dos alunos pelo assunto. O professor, que
também é jovem, percebe o despreparo de seus alunos com relação ao tema, mas
diz que devem se preparar para as discussões que vão acontecer nos próximos
encontros. Passa para o segundo tema, a “HOMOSSEXUALIDADE”, e já pode se
perceber as reações de interesse da turma. Discorre rapidamente sobre o tema e,
como fez no primeiro momento, dirige-se para cada um dos alunos e faz perguntas
de cunho pessoal. Desta vez os alunos participam de forma mais ativa e intensa e
dão abertamente suas opiniões sobre o polêmico assunto que tratam como tabu nas
igrejas. O que mais chama a atenção desta vez é a opinião de um dos alunos e o
que esta causa no professor. Como o aluno parece ser abertamente preconceituoso
em relação à homossexualidade, o professor passa a lhe fazer mais perguntas,
como se quisesse pô-lo a prova, o que leva o aluno em questão a posicionar-se de
uma forma mais branda com relação ao seu preconceito. Dos quatro alunos
presentes, uma se mostra tímida nas suas respostas talvez por ser, aparentemente,
a mais nova. Como a discussão fica de certa forma restrita ao professor e a um dos
alunos, os demais começam a apresentar sinais de desinteresse e, mesmo quando
o professor tenta recomeçar a discussão, as respostas dadas são curtas. Três fatos
ocorridos durante a aula são dignos de nota: o uso da Bíblia como fonte de
preconceito e condenação à homossexualidade por parte do professor, a sua visão
acerca da Escola Dominical como “lugar de aprendizado para a vida” e o

95
desinteresse do aluno questionado pelo professor quanto ao seu preconceito ao final
da aula.

11.1.4 Classe dos Pré-Adolescentes


11.1.4.1 Observação da sala de aula

A sala de aula está situada no segundo andar e seu espaço é bem amplo.
Possui uma lousa, duas mesas, encostadas uma na outra, um armário de aço e um
“painel de presença semanal”. As cadeiras estão dispostas ao redor da mesa e os
alunos sentam um ao lado do outro.

11.1.4.2 Observação dos professores e alunos

Enquanto a professora faz a chamada visualmente e pergunta pelo número


de Bíblias, os alunos estão bastante eufóricos por causa da notícia dada pela
professora de que está grávida. Nota-se que todos trouxeram as suas para a aula.
Ela faz uma oração e três das sete crianças presentes a acompanham com suas
cabeças baixas e os olhos fechados. O aluno (1) é bastante agitado, comenta sobre
o jeito que o aluno (2) tem de orar e a professora chama a sua atenção. Sem perder
tempo, já fala para as crianças se aquietarem para que comecem a estudar o tema
da aula que será a “AMIZADE”. Embora a maioria delas preste atenção ao que a
professora fala, os alunos (1) e (2) continuam a conversar. Faz introdução ao tema e
pergunta aos alunos quem deles tem um amigo que seja sincero e a aluna (3)
comenta sobre uma amiga que lhe falou alguma coisa sobre seu jeito de ser, que
ficou magoada com ela e que a perdoou por que ela lhe falou a verdade. A
professora passa para a lição que quer ensinar, faz outra pergunta relacionada ao
tema e faz referência ao texto bíblico que fala da amizade entre um homem e Deus.
Os alunos não prestam muita atenção, no entanto a professora dialoga bastante
com eles e percebe-se que gostam bastante dela e a respeitam. Foi pedido que os
alunos lessem em suas Bíblias textos que fazem menção ao tema da amizade com
Deus e é bastante interessante como os alunos pedem para participar das leituras.
O aluno (2), que é o mais velho da turma, com doze anos, está muito agitado e
atrapalha a aula conversando bastante e perturbando o aluno ao lado. Esses dois
alunos conversam o tempo todo. Vale a pena ressaltar que embora o aluno (2) seja

96
bastante agitado, pede constantemente para participar da aula e a professora não
lhe dá muita atenção. Os textos bíblicos são, então, divididos entre os alunos e
todos encontram os textos sem dificuldades em suas Bíblias. Todos os alunos são
convocados a ler um texto que faz menção ao tema e a professora faz a
intermediação com explicações e perguntas sobre o que leram. O aluno (4) está
totalmente disperso e as alunas (6) e (7), que são as mais novas da turma,
escrevem e desenham nas mãos e mostram uma para a outra. A professora não dá
atenção ao caso e continua falando sobre o texto bíblico, dando continuidade à lição.
Termina esta parte da lição e diz aos alunos que na próxima aula dará continuidade
ao tema, por que ainda tem que falar sobre “SACRIFÍCIO” e “OBEDIÊNCIA”,
fazendo comentário sobre uma história bíblica que fala sobre as duas coisas. É
digno de nota que enquanto a professora faz menção ao tema do sacrifício, o aluno
(2) faz gestos de violência batendo na mesa como se estivesse cortando algo. A
Professora termina a aula passando atividade de pintura para ser feita em casa e
sem levar em consideração a não participação das duas alunas mais novas.

11.1.5 Classe das crianças (0 – 6 anos)


11.1.5.1 Observação da sala de aula

A sala de aula tem espaço adequado e contém uma janela e uma porta.
Possui uma mesa e bancos apropriados para a faixa etária, um armário de aço, um
armário arquivo, prateleiras com diversos materiais pedagógicos e paredes pintadas
com desenhos. Está localizada nos fundos do prédio de Educação Cristã no andar
térreo.

11.1.5.2 Observação dos professores e alunos

Antes de iniciar a aula, os alunos já se encontram sentados e estão bastante


eufóricos, chamando pela professora e falando sobre acontecimentos da semana ou
do dia anterior. A professora dá bastante atenção a todos eles, mas sempre os
direcionando para o objetivo que é a aula. A chamada é feita e é pedido para que
todos fiquem em pé para brincarem de estátua, cujo objetivo é introduzir o tema da
lição, a saber, a desobediência. Todos compreendem as ordens dadas pela
professora e participam da brincadeira com bastante animação. É feita a leitura do

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texto na Bíblia onde se encontra a história de uma mulher que virou uma estátua de
sal por desobedecer a ordens dadas por Deus com as crianças sentadas, e, a
seguir, lê pausadamente um pequeno trecho e pede que repitam. Deste modo
consegue com que participem da aula. Mesmo que as crianças façam perguntas que
não estão relacionadas com o tema, a professora sempre as responde, dando a
devida atenção aos alunos. A história passa a ser contada de uma forma mais
simples, com uma linguagem mais apropriada para a faixa etária. Durante a
atividade a professora senta com as crianças e sempre atenciosa e carinhosa, passa
a fazer perguntas relacionadas à história contada e todas respondem, denotando
atenção à aula. É bastante interessante o fato de fazerem bastantes perguntas
sobre a história e darem sugestões para os personagens. A partir de determinado
momento da aula, o aluno (1) fica bastante disperso e começa a brincar em
separado, ao mesmo tempo em que os demais também já não prestam tanta
atenção, no entanto a professora percebe e os convida para pintarem a figura da
mulher que virou estátua de sal, enquanto aponta os lápis de cor.

11.1.6 Classe das crianças (7 – 9 anos)


11.1.6.1 Observação da sala de aula

A sala é adequada para o número de alunos e possui mesa de plástico,


cadeiras de ferro, armário de aço. As paredes são pintadas com desenhos e versos
bíblicos estão colados em uma delas. Tem uma janela e uma porta.

11.1.6.2 Observação dos professores e alunos

Excepcionalmente a aula foi dada para uma classe ou turma mista, pois as
professoras dos pré-adolescentes estavam ausentes. Procurou-se observar os
alunos menores que estavam, de certa forma, agrupados. A professora fez a
chamada dos dois grupos e disse que a aula seria sobre a história do Filho Pródigo.
Ela faz a leitura do texto e permite que os alunos façam perguntas, embora as
crianças menores fossem intimidadas pelas maiores, e depois explica a mensagem
que esta história quer transmitir por se tratar de uma parábola. Durante a leitura da
história bíblica, percebe-se que a maioria dos alunos conversa bastante e o aluno (1)
por várias vezes exagera nas brincadeiras com o aluno (2). Em uma dessas

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brincadeiras, o aluno (1) acusa o aluno (2) de revidar com agressividade e a
professora defende o primeiro. Essa atitude enfurece o aluno (2) que acusa a
professora de não prestar atenção no que aconteceu. A professora, para
desvencilhar-se do problema, passa rapidamente para uma atividade relacionada ao
tema, que consiste em responder perguntas relacionadas à história bíblica.
Enquanto respondem as perguntas que lhe foram entregues já prontas, algumas
crianças dizem que não entenderam determinada questão e a professora responde
para elas. Cada criança que terminava a atividade entregava o papel com as
perguntas e respostas para a professora, e dessa forma a aula chega ao seu fim.

12 2º SISTEMA DE HIPÓTESES

As aulas da ED são baseadas na Bíblia e em revistas com lições para cada


faixa etária, como uma espécie de cartilha com assuntos preparados por teóricos da
SEC, que são cobradas por ocasião das aulas. Este método leva o professor a ler
constantemente tanto uma quanto a outra e a ter uma preocupação exagerada em
transmitir o conteúdo da lição. Os resultados dessa metodologia são respostas às
perguntas sem o aprofundamento do assunto e sua explicação unilateral, respostas
com ausência de interdisciplinaridade, dispersão, alunos sem interesse em participar
das discussões ou fomentá-las, desinteresse pelos assuntos e ansiedade por parte
do professor em terminar a aula. Outros problemas puderam ser levantados nas
observações realizadas em salas de aula que dificultam a efetivação do processo
ensinagem/aprendizagem, tais como crianças de diferentes estágios de
desenvolvimento na mesma sala, constante ausência dos professores, má
administração de conflitos, ausência de aulas práticas e de um Projeto Pedagógico
que direcione as ações educativas. Também se evidenciou que a “Abertura” da ED,
como momento lúdico, é extremamente repetitiva e sem atrativos, principalmente
para as crianças, os pré-adolescentes e adolescentes.

99
13 RELATÓRIO DE ASSESSORAMENTO PSICOPEDAGÓGICO

13.1 Indicadores para diagnóstico e coleta

Através dos questionários e entrevistas, dos testes e das observações feitas


em sala de aula foi possível o levantamento de demandas que sugerem que
algumas dificuldades encontradas na ED da IPI do Jardim Leonor comprometem a
efetivação do ensino e da aprendizagem. Para discriminar essas dificuldades, será
utilizada a classificação elaborada por Gasparian (1997, p. 76):

• Preocupação excessiva em ler e transmitir os conteúdos das revistas


elaboradas por faixa etária, bem como da Bíblia, desrespeito às fases de
desenvolvimento psicogenético e ausência de avaliação reguladora e
formativa (Pedagógico-metodológicas);
• Defasagem profissional e relacional dos envolvidos no processo educacional
por causa da escassez de formação e aprimoramento pedagógico
(Administrativa);
• Falta de um envolvimento relacional mais profundo e de interesse pelo que as
crianças aprendem na ED (Familiar);
• Desinteresse da maioria dos alunos pelos assuntos tratados por causa do
método e da metodologia aplicados (Discente/Docente).

13.2 Devolutiva

A transmissão de conteúdos é imprescindível para que ocorra a efetivação do


processo de ensinagem e aprendizagem, no entanto existem novos métodos e
novas metodologias que proporcionam maneiras mais prazerosas e eficientes de
ensinar e aprender. Também é importante salientar que o respeito às fases de
desenvolvimento psicogenético do aprendente devem ser respeitadas a título de
uma eficiente efetivação da aprendizagem.
Sugere-se para a Classe de Adultos que o programa de aulas seja organizado
com base em situações de vida e que a metodologia utilizada seja a análise das
experiências e a mútua investigação e não apenas a transmissão de conhecimentos.

100
Para a Classe de Jovens e Adolescentes, a sugestão é que se utilizem
metodologias de ensino variadas, tais como a participação ativa dos alunos durante
as aulas, que tenham a oportunidade de contribuir com idéias e sugestões e a
utilização de ilustrações práticas, claras e reais.
Com relação à Classe dos Pré-Adolescentes, as metodologias devem ser
desenvolvidas de modo que proporcionem a estes alunos a oportunidade de
empregar suas energias tais como a oportunidade de pensarem, perguntarem e se
expressarem; o ensino de cronologia e geografia bíblica (motivação da
memorização), estipular responsabilidades individuais e em grupo (cidadania),
promoção de reuniões sociais e passeios e o estudo da lição através de competição
grupal.
As crianças de 7 – 9 anos são curiosas e prestativas, e cada uma dessas
faixas etárias tem peculiaridades que devem ser levadas em conta no processo
ensino/aprendizado:

 7 anos: Não responder pela criança; começar a aula recapitulando a anterior


e terminar fazendo perguntas sobre o conteúdo abordado; deixá-las participar
ativamente da aula; recontar histórias;
 8 anos: Estimular a leitura; fazer perguntas sobre o texto; promover
brincadeiras e jogos de pesquisa; dar tarefas difíceis e desafiá-las a realizá-
las;
 9 anos: Deixá-las falar; sempre responder suas perguntas de forma simples;
promover atividades que as levem a pensar; dar-lhes bastante trabalho
prático.

Para as crianças de 4 – 6 anos, promover atividades em grupo e ao ar livre,


proporcionar brincadeiras e jogos que contenham regras e limites, proporcionar um
ambiente calmo, usar recursos visuais simples e significativos para a idade, fazer
perguntas que são capazes de responder, ao contar histórias evitar o uso de
palavras figuradas e comparações, explicar toda palavra nova. Em caso de
problemas no grupo, conversar com uma criança de cada vez.
Nas crianças de 2 – 3 anos a atenção é limitada (dois minutos), por isso
sugere-se que as atividades sejam bastante variadas e que ao contar histórias que

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estas sejam repetitivas e rápidas, que a sala tenha vários objetos e brinquedos à
disposição, nunca ajudar ou apressar a criança a encontrar palavras e usar gestos
para simbolizar o que se quer apresentar.
Em todas as turmas ou classes propõe-se a avaliação reguladora e formativa
dos valores que se pretende transmitir através da Educação Cristã, com propostas e
vias de solução dos problemas apresentados na aquisição destes valores, sem as
quais o processo de formação corre o risco de não se efetivar, ou, na melhor das
hipóteses, de apenas gerar uma atitude de conformismo e passividade.
Vale apena frisar que as propostas acima recomendadas só vieram a lume
porque a Igreja Presbiteriana Independente do Jardim Leonor abriu as portas do
prédio de Educação Cristã, onde acontecem as aulas da Escola Dominical (ED). Por
isso, nossos sinceros agradecimentos à Diretoria da igreja, aos líderes da ED e aos
seus alunos, sem os quais não seria possível a realização do estágio institucional e
também do presente trabalho.

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