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ACONSELHAMENTO CRISTÃO

Sumário
ACONSELHAMENTO CRISTÃO ............................................................. 0

NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 3

INTRODUÇÃO ......................................................................................... 4

Objetivos, Opções, Limites do Atendimento ............................................ 4

Aspectos Psicodinâmicos da Vida Espiritual ........................................... 9

Premissa: tudo é psíquico, o psíquico não é tudo ................................... 9

A mente representacional ...................................................................... 10

Das representações mentais à maturação religiosa .............................. 13

Para um confronto entre atendimento psicológico e acompanhamento


espiritual ........................................................................................................... 15

Especificidades e interações ................................................................. 15

Aspectos Psicodinâmicos da Relação de Ajuda: Traços Confronto para


......................................................................................................................... 18

Relação funcional e temporária ............................................................. 18

Assimetria da relação ............................................................................ 19

A exigência da abstinência .................................................................... 21

A neutralidade ........................................................................................ 23

AS ABORDANGENS METODOLÓGICAS ATUAIS ............................... 31

ABORDAGEM DIRETIVA CONFRONTATIVA ...................................... 31

Skinner e a Terapia Comportamental (Behaviorismo) ........................... 31

Adams e o Aconselhamento Noutético .................................................. 33

ABORDAGEM NÃO-DIRETIVA CENTRADA NA PESSOA ................... 35

ACONSELHAMENTO PARTICIPATIVO CENTRADO NAS


NECESSIDADES PSICOLÓGICAS ................................................................. 37

A ABORDAGEM DE APOIO CENTRADA NA LIBERTAÇÃO E NO


CRESCIMENTO ............................................................................................... 39

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A ABORDAGEM INTERPRETATIVA CENTRADO NA PSICANÁLISE . 40

Freud e a interpretação na Psicanálise.................................................. 40

REFERÊNCIAS ..................................................................................... 45

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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ACONSELHAMENTO CRISTÃO

INTRODUÇÃO

Objetivos, Opções, Limites do Atendimento


Para uma primeira aproximação a uma temática complexa como a que
nos propomos, seria uma boa aquisição a que levasse a identificar alguns pontos
de confronto (semelhanças e diferenças), a indicar as possíveis interações úteis
e a assinalar as consequências de apressadas contaminações, entre
atendimento psicológico e acompanhamento espiritual.

No entanto, ciente de que "onde se chega" é também função de "de onde


se parte", gostaria de explicitar, a modo de premissa, algumas suposições e os
consequentes limites das intervenções.

No nível metodológico, é em primeiro lugar, por uma comunicação


pragmática e eficaz, voltada para a reflexão de alguns aspectos do que já se faz,
a fim de oferecer estímulos ao debate e ao confronto.

No que diz respeito a minha intervenção, isso se traduz no intento de


comunicar algum fragmento de conhecimento derivado de uma prática
psicoterapêutica efetivamente exercida, confrontando-a com alguns princípios
da psicodinâmica.

O privilégio concedido à praxe (não uma prática qualquer, mas aquela


guiada pela reflexão crítica) comporta a renúncia a demorar-nos no grande
debate, hoje particularmente aceso em âmbito anglófono e germânico, acerca
das oportunidades, modalidades, significado do acompanhamento espiritual e,
mais em geral, acerca da complexidade das relações que entrelaçam pastoral e
psicologia.

Certamente não falaremos de como se articula uma direção espiritual, de


seus fins, de suas diversas modalidades de intervenção. Essas são assinaladas

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e, às vezes, esclarecidas (outras, confundidas) também por diferentes


denominações: discernimento e/ou acompanhamento vocacional, direção
espiritual, counselling, diálogo pastoral ou também psicoterapia pastoral... As
diversas formas de acompanhamento espiritual variam em função do objetivo,
do destinatário e de seu nível de crescimento espiritual e também da pessoa que
assume o papel de guia.

O ponto de vista aqui privilegiado é principalmente o de quem fornece a


ajuda, não tanto do destinatário-fruidor, embora, certamente, muito se pudesse
dizer também do ponto de vista de quem solicita a ajuda. Por exemplo, será
diverso o discernimento e o acompanhamento vocacional da direção de um leigo
cristão empenhado ou de uma pessoa não crente mas "em busca"; ainda mais
diferente será a tarefa de guia exercida por um "padre" prior ou por uma "madre"
abadessa em um mosteiro, onde essas figuras são chamadas a reassumir em si
mesmas os papéis típicos, seja da figura paterna, seja da materna (autoridade,
ternura, para resumir esquematicamente). Pense-se ainda na especificidade da
figura do confessor e/ou diretor espiritual designado em um mosteiro de clausura,
onde a liberdade de escolha é, de fato, limitada.

Não deveriam ser, tampouco, descuradas as variáveis introduzidas


pela própria personalidade do guia/diretor, por sua sensibilidade e por sua
sintonia, seja com a pessoa que o procura, seja com a tarefa que lhe foi delegada
e, sobretudo, pela sua experiência pessoal de vida espiritual.

Perante tanta variedade, iremos limitar a um discurso geral, aplicável a


todas as situações individuais, falando de estruturas, processos psíquicos e,
sobretudo, modalidades relacionais envolvidas e operativas em toda forma de
diálogo pastoral, e em suas diversas funções.

Naturalmente, o ponto de vista da psicologia é unilateral (não partidário,


mas certamente parcial) e, como tal, apela, na prática da vida cotidiana, à
integração com outros pontos de vista.

O homem é uno e unitário. Põe-se por inteiro em jogo em toda relação –


também naquela de direção espiritual não menos que na relação com Deus –,
quer dizer, sua identidade pessoal e a complexa história de seu estruturar-se.

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Na realidade, no homem "real", as distinções entre psique e espírito, corpo e


alma e, internamente à psique, entre cérebro e mente, natureza e cultura,
ontogênese e filogênese são tão metodologicamente úteis quanto
substancialmente redutoras.

A chamada à integração da personalidade, no sujeito real, diz também da


continuidade entre "sadio" e "doente".

O conceito de saúde tem uma matriz comparativa e processual, que não


exclui distorções e desvios patológicos, e isso inclui também o estado doentio.
Isso é tanto mais verdade quando se trata da psique, onde o bom funcionamento
é variável, dependente de tantos fatores (do biológico ao cultural, dos
mecanismos inconscientes às escolhas conscientes...) que se entrelaçam na
vasta e variadíssima gama de comportamentos psicologicamente "sadios", isto
é, funcionais para o equilíbrio psicodinâmico da pessoa.

A patologia consiste na incapacidade parcial ou total, persistente ou


temporária, de resolver conflitos psicológicos que pessoas "normais" estão em
condição de elaborar sem excessivo dispêndio de energias (critério econômico).

Tampouco se deve temer que uma perspectiva clínica induza uma visão
preconceituosa do homem e de sua psique ("doente"): porque exatamente o que
é observado dessa forma é o homem concreto, real, posicionado numa linha de
continuidade entre os pólos abstratos da saúde e da doença.

A psicologia clínica (e a psicologia clínica da religião, especificamente)


aprendeu que estruturas, processos, mecanismos psíquicos se manifestam de
modo igualmente fácil tanto em seu "mau funcionamento" como na
"normalidade" funcional.

Como acontece, dizia Freud, com o cristal mineral que, despedaçando-se


segundo linhas de clivagem que já estavam presente na sua estrutura cristalina,
revela seus segredos internos e constitutivos.

O ponto de vista aqui adotado é o da prática clínica de psicoterapia


psicanalítica. De uma prática, a saber, entendida como lugar do surgimento da
verdade do sujeito ao próprio sujeito, mediante a palavra trocada entre duas

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pessoas em uma situação de profunda tensão relacional (transferência e


contratransferência).

Trata-se de uma "cura", o que significa que não sequestra a atenção para
a gestão de sintomas patológicos e/ou para a recuperação de competências
mentais fragmentárias e segmentadas; que não usa o psicofármaco em função
anestésica, como faz aquela parte da psiquiatria que se reduz a encefalolatria e
com o fármaco tende a tornar muda a dor e, ao mesmo tempo, a cortar a palavra
ao paciente...

Se uma irmã num mosteiro de estrita clausura sofre de graves formas


de claustrofobia, alguma coisa certamente isso quer dizer acerca de sua escolha
de vida e acerca de seu modo de interpretar sua história de sofrimento. Isolar o
sintoma do conjunto da história do sujeito e calá-lo com o psicofármaco,
permanece um gesto "restaurador" isolado em si, que fala da recusa a
confrontar-se, a escutar e compreender.

Ao contrário, a terapia a que me refiro propõe-se como compreensão da


orientação pessoal, representacional e relacional do sujeito-pessoa na
complexidade de seus componentes: corpóreos, neurobiológicos, emotivo-
afetivos, motivacionais, intelectuais, sociais, culturais... seguindo-o na sua
história e em seu vir-a-ser mediante processos que não são sempre harmoniosos
e sincrônicos, mas são atravessados por dificuldades, conflitos e crises, de
soluções não unívocas e não previsíveis.

Daí nasce uma perspectiva clínica, um modo de olhar o sujeito que supõe
ficar "inclinado" sobre ele, dirigindo a atenção para suas características
específicas, idiossincráticas, não contidas dentro das gaiolas teóricas dos
modelos diagnósticos psicológicos ou psiquiátricos.

Uma tal perspectiva clínica torna possível, mesmo de fora da prática


psicoterapêutica, reconhecer a complexidade da "formação" da identidade
pessoal ao longo da história do sujeito e fornece referências para avaliar a
ontogênese psíquica do sujeito e a adequação dos atendimentos de direção e
de acompanhamento (eventualmente, espiritual), sugerindo alguma consciência
a mais acerca das modalidades de um trabalho que, em todo o caso – é bom

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recordar –, tem sido sempre praticado, também antes do esclarecimento trazido


pelas disciplinas psicológicas.

Essa última chamada pretende sublinhar que a direção espiritual é


modalidade relacional antiga na história do homem, bem anterior à teorização
psicológica. Mas em geral, todos temos uma psique e todos utilizamos
modalidades psicológicas de comunicação em nosso relacionamento com os
outros, mesmo se nem todos temos disso o conhecimento reflexo e sistemático
sintetizado (e esquematizado, vale dizer empobrecido) da psicologia científica.

Para fazer uma comparação, o homem desde sempre navega os mares,


aproveitando a força dos ventos, muito antes de conhecer as leis da dinâmica
eólica.

Mas o conhecimento reflexo e consciente habilita a uma conscientização


daquilo que já acontece em nós e por nosso intermédio, também sem nosso
conhecimento, no nosso relacionamento, profissional ou pessoal, com o outro.
Hoje navegamos melhor do que no passado, não porque bússola, anemômetro
e navegador por satélite mudam a força dos ventos... mas porque podemos fazer
deles um uso mais consciente, graças aos conhecimentos, seja da meteorologia,
seja da dinâmica dos ventos.

Procurarei articular o discurso a partir de uma dupla perspectiva: uma, que


chamarei ad intra, voltada para a elucidação de alguns aspectos psicodinâmicos
no interior da vida espiritual e de seu acompanhamento e uma perspectiva ad
extra, que sugerirá pontos de confronto (semelhanças, diferenças, interações)
com o atendimento psicológico.

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Aspectos Psicodinâmicos da Vida Espiritual


Proponho aqui só algumas deixas para reflexão, selecionadas com base
em sua funcionalidade para o discurso sucessivo de confronto entre as duas
relações de ajuda: a psicológica e a espiritual.

Premissa: tudo é psíquico, o psíquico não é tudo


O fundamento de uma leitura psicológica da vida espiritual está em seu
pleno enraizamento nas dinâmicas humanas. Nesse sentido, enraizado quer
dizer também encarnado, impresso/expresso na unidade corpo-cérebro-mente.

Tudo o que é humano é psíquico. Vale também para a religião e para a


vida espiritual, como para toda experiência humana que tudo é psíquico, embora
o psíquico não seja tudo. Porque a psique é mediação entre o biológico e o
cultural.

Naturalmente, na religião existem outros fatores: sociais, históricos,


lingüísticos, teológicos, filosóficos e certamente, para o crente, em sua relação
com Deus, existe um fator único, específico e imprescindível: a graça divina e o
encontro pessoal com Deus que se revela e doa e, mediante essa relação, age
no coração do homem.

Mas também esse encontro com Deus deve ser na medida do homem,
compreensível ao homem, passar através das dinâmicas da psique humana e,
destaco, não menos as inconscientes do que as conscientes.

Naturalmente, a psicologia, de seu canto, pode reconhecer na mente do


crente apenas as pegadas e o desejo de Deus, não a realidade daquele que as
deixa.

A psicologia permite colher os significados e as valências psicológicas dos


símbolos, crenças e ritos religiosos. Mas, em razão de seus instrumentos de
pesquisa, a psicologia não pode jamais verificar a existência da graça de Deus
nem vê-la em obra no homem, nem, ao contrário, reconhecer na conduta
humana a ação do Maligno.

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O que transcende a observação empírica não pode ser para a psicologia


nem objeto de investigação, nem critério de explicação do comportamento
humano. Mas o psicólogo não pode prescindir da convicção subjetiva do crente:
isto é, do fato, observável empiricamente, de que esse sabe que Deus opera
nele e essa convicção orienta também seu relacionamento com Deus, seu modo
de ser religioso.

Certamente, por exemplo, ter fé no Deus de Jesus Cristo é coisa bem


diversa (também psicologicamente diversa) de uma genérica crença numa força
primordial que origina o mundo.

A mente representacional
Nós conhecemos por meio de nossas representações mentais;
propriamente, conhecemos nossas representações dos "objetos", e não os
objetos. Assim acontece desde o objeto primário de amor, a mãe. A criança não
conhece propriamente a mãe, mas sua relação com ela. Nessa perspectiva
estrutural e relacional do indivíduo, Donald Winnicott podia propor um de seus
célebres paradoxos: "A criança cria a mãe que encontra" (vale dizer: aquela
mulher já está lá, mas não é "a mãe" da criança enquanto a criança não entra
em relação com ela).

É importante, nesse ponto, ter presente que a representação psíquica não


é um conceito, nem uma imagem, nem um símbolo.

A representação psíquica de um objeto é um conjunto organizado de


processos de memória, governado pelo princípio econômico do equilíbrio
psicodinâmico, que resulta de um conjunto de condições, das quais muitas
fogem à consciência do sujeito e algumas estão ancoradas em experiências
"arcaicas" relativas à consciência: corpóreas, neurobiológicas, proprioceptivas,
sensoriais. Não se pretende excluir os componentes conscientes, mas apenas
sublinhar que esses são um surgimento posterior ao longo da evolução do sujeito
e na estruturação dos posicionamentos do indivíduo.

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Esse enraizamento profundo vale para qualquer experiência humana e,


por isso, também para a experiência religiosa.

Certamente não a esgota, ao contrário, dela é apenas uma pré-condição.


Mas, em consideração do fato de que é vezes demais escotomizada, pretendo
sublinhá-la, com consciente unilateralidade.

Também para denunciar a contradição de uma certa espiritualidade que,


enquanto exalta o corpo como manifestação da glória divina, tende, na realidade,
a renegá-lo rumo a uma pretensa espiritualização, que parece perseguir como
próprio ideal o de uma alma sem corpo e de uma figuração religiosa sem
representação mental. Aqui, ao contrário, queremos lembrar que nossa relação
com Deus e "nossa religião" são também funções de experiências emotivas
primárias que retrocedem até o contato físico com as pessoas que de nós
cuidaram nos primeiros meses de vida.

O mesmo Winnicott – é bom recordá-lo, grande pediatra, além de


psicanalista –, chamado a fazer uma conferência sobre a evangelização na
família, surpreendeu seu auditório falando quase exclusivamente dos cuidados
pré-verbais, a partir da importância decisiva do modo como a criança é segurada
no braço e sustentando que é só em continuidade com a experiência pré-verbal
da "confiabilidade humana", colhida no sentir-se abraçado e protegido, que a
criança estará em situação de aproximar-se do conceitos de "braços eternos" de
Deus (Winnicott, 1996, p. 116)

Assim, para mim, a religião é também minha avó. O terço com que pegava
no sono em seus joelhos à noitinha e a visita junto com ela ao cemitério; a avó
que, perto de morrer, falando de sua sepultura, dizia: "Não gastem dinheiro com
meu funeral: eu estarei já do outro lado...".

De certo, a seguir, para estruturar a "minha" religiosidade, entraram em


jogo também as orações junto a meus pais, o catecismo na paróquia e, mais
tarde, as interrogações existenciais e as respostas encontradas na Palavra de
Deus, as figuras dos sacerdotes encontrados, o estudo da teologia, a celebração
litúrgica e sacramental e também o estudo dos dinamismos psíquicos mediante
os quais se forma uma certa representação de Deus e não outra... Tudo isso

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contribuiu ao magma inconsciente representacional sobre o qual eu construí,


gradualmente, a minha imagem de Deus, a minha teologia pessoal. Mas ocorre
recordar que o pensamento consciente sobre Deus, a imagem que dele fazemos,
nosso teologar intelectual e emotivo passa também pela representação
inconsciente. E, por exemplo, quando vejo uma criança na igreja com o avô, em
mim se reativam experiências profundas do passado que me fazem sentir mais
vizinho a Deus.

A fé em um Deus não visível se ancora numa representação de Deus que


o torne perceptível pelo homem. O nome de Deus é oferecido pela cultura, mas
passa através do filtro da representação mental pessoal. Ecoando ainda uma
vez Winnicott, diria que o crente "re-cria" a fé que "encontra".

Creio que se possa dar, agora, por adquirido que, para poder falar de
Deus, para relacionar-nos com Ele, devemos fazer dele uma representação, que
tem a função de mediação psíquica. Assim, quando digo que Deus é Pai, ativo
esquemas representacionais que provêm: da valência simbólica intrínseca à
figura paterna; da cultura, pela qual a expressão é mediada; e da apropriação
pessoal da figura paterna, mediante as representações mentais, da infância e
atuais.

A psicologia da religião mais perspicaz fala de figura paterna, não de


conceito de pai, e Antoine Vergote argumenta que as características da figura
paterna tornaram possível a Jesus tomar o termo humano para articular a própria
relação com Deus, quando, para a reflexão filosófica, o conceito abstrato de pai
não seria outra coisa que uma metáfora demasiado humana, a ser superada bem
depressa (Vergote, 2006).

A figura do pai se coloca dentro da família, lugar onde se entrecruzam a


ordem biológica e a ordem cultural, transmissão da vida pela dualidade sexual e
instauração de uma relacionalidade absolutamente privilegiada de amor
fecundo.

Em conseqüência de sua dupla pertença à ordem biológica e à cultural, a


paternidade tem um sentido universal e ao mesmo tempo específico com base
nas determinações histórico-culturais e nas significações pessoais que adquire

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para cada indivíduo. A paternidade assume, assim, também uma valência


normativa que estrutura a diversidade, o desejo, a lei, o amor, a generatividade.

Das representações mentais à maturação religiosa


A incidência de processos inconscientes e em particular das
representações das figuras parentais na estruturação do posicionamento de uma
pessoa em relação a Deus foi evidenciada por Ana-María Rizzuto em um volume,
alicerçado na prática clínica e teoricamente muito bem argumentado, que estuda
a formação, o uso e a transformação das representações de Deus ao longo de
todo o ciclo de vida (Rizzuto, 1979).

Rizzuto mostra como a representação objetal de Deus, que se forma


inicialmente na infância, conhece uma história e uma transformação dinâmica. A
isso alude o título do volume O nascimento do Deus "vivo".

A representação de Deus é uma realidade composta e sobredeterminada:


para ela concorrem, em interação dinâmica, as relações com os objetos
primários, a situação edípica e o gênero sexual a partir do qual ela é vivida, as
características pessoais dos pais e das modalidades da interação real entre eles
e a criança, a experiência dos irmãos, o ambiente sócio-cultural, e também
circunstâncias específicas e individuais que podem acompanhar o momento em
que a representação se forma.

Se a representação de Deus está profundamente ancorada nas


representações de mãe e pai, o crente maduro está consciente de que a
linguagem da fé é caracterizada por um excesso de sentido que se prolonga para
além dos sinais. A maturidade religiosa inclui um progressivo distanciar-se e
diferenciar-se da imagem de Deus, de suas fontes originais, num percurso de
maturação (nunca concluído) do desejo, que permite a passagem "do ídolo ao
ícone".

Isso pode acontecer no homem de fé, com o estímulo da meditação, da


oração, do encontro com o Deus vivo por meio da palavra com que Ele se revela
ao homem e mediante mediações eclesiais, e não em último lugar a direção
espiritual.

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Mais complexa é a questão de como e em que condições se realiza uma


transformação profunda da representação inconsciente em que se radica a
imagem de Deus.

Rizzuto faz referência a eventos importantes da experiência relacional,


possíveis ao longo de todo o ciclo da vida, que incidam e reestruturem a
representação do self, dos objetos primários e de seu relacionar-se dialético.
Certamente isso é possível mediante as modificações intrapsíquicas e
relacionais profundas que se podem verificar no curso de uma análise; se é
possível instaurar um relacionamento maduro com os próprios genitores, será
possível também uma representação de Deus não infantilmente ligada à
nostalgia do pai.

De outra parte, se a transformação da representação de Deus supõe uma


reestruturação de memórias compostas por múltiplos níveis, em uma gradação
que vai do visceral ao conceitual, coloca-se a questão da possibilidade, da
eficácia, dos percursos e dos êxitos dos estímulos conscientes (suplemento de
conhecimentos religiosos, participação em ritos coletivos, inserção numa cultura
ricamente religiosa, escuta do Magistério e da Tradição, direção espiritual, etc.)
relativamente a essa mudança profunda.

E, a seguir, poder-se-ia perguntar se as transformações eventualmente


verificadas devem ser reduzidas à força motivacional e transformadora interna
ao sistema simbólico religioso (conteúdo da mensagem) ou à experiência
relacional, que implica movimentos transferenciais e contratransferenciais,
conexa com o encontro interpessoal, mediadora da mensagem (no caso que nos
interessa, a pessoa do diretor espiritual).

É claro que isso levanta muitas interrogações (e algumas perspectivas)


sobre os níveis a que se orienta a ação pastoral e, no caso específico, o
acompanhamento espiritual.

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Para um confronto entre atendimento psicológico e


acompanhamento espiritual
De imediato, uma chamada a algumas suposições preliminares (de certo
modo, arbitrárias, mas funcionais para o confronto), já em parte antecipadas.
Com o termo sintético de acompanhamento espiritual, referimo-nos aqui
indistintamente a níveis de aconselhamento pastoral que podem ser muito
diversos uns dos outros, quanto à modalidade de intervenção, aos destinatários,
à figura do guia.

Dentro dessa simplificação e em razão de minha específica (e por isso


limitada) competência, escolhi privilegiar unilateralmente o aspecto relacional, e
não os aspectos de conteúdo, intelectual e, evidentemente, sobrenatural. Insisto,
além disso, que com "atendimento psicológico" faço referência à psicoterapia
psicanalítica, como aquela interessada em compreender em profundidade as
raízes representacionais, motivacionais e relacionais do comportamento.

Especificidades e interações
A psicoterapia é uma relação funcional e temporária, livre, assimétrica (e
não recíproca) que se instaura como resposta a um pedido de ajuda de uma
pessoa que experimenta algum incômodo ligado aos próprios pensamentos,
afetos e comportamentos perturbadores ou, em outros casos, que se sente
interpelada por uma crise diante de novas tarefas ou de expectativas da
sociedade circunstante, ou também apenas diante de interrogações acerca de
sua identidade pessoal.

Só para exemplificar, pense-se em como esse apelo para uma


reestruturação do self se põe de forma dramática, às vezes com risco de
patologias depressivas, no acesso de uma mulher à maternidade, especialmente
se primípara.

A psicoterapia requer forte envolvimento pessoal, que encontra expressão


numa comunicação verbal da parte do paciente, sem reservas preconceituosas
ou censuras, direcionada a instaurar um melhor conhecimento de si, uma melhor

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competência dos próprios processos psíquicos, um amadurecimento das


capacidades relacionais e, só conseqüente e subordinadamente, a "cura" dos
sintomas.

A investigação do incômodo atual conduz, inevitavelmente, a analisar a


história pessoal do paciente, ao longo da qual os posicionamentos atuais vieram
sendo estruturados.

A história pessoal não é aqui entendida como a sucessão serial dos


acontecimentos que tiveram lugar na vida do paciente, mas refere-se à
modalidade com a qual ele os viveu, compreendeu, enquadrou, no interior de
sua experiência de vida dentro de um discurso narrativo coerente, mas não
necessariamente egossintônico, que estrutura sua identidade, por meio de crises
e conflitos, às vezes com derivações patológicas.

Porque a compreensão "i-mediata" de si do paciente não é


necessariamente adequada a suas necessidades existenciais e a construção da
identidade remete para uma matriz estrutural e relacional da pessoa humana.

De resto, nem mesmo a compreensão que o terapeuta pode construir e


eventualmente transmitir ao paciente esgota a riqueza das vivências (e menos
ainda das vivências religiosas) e atinge a verdadeira "identidade" profunda do
sujeito, que está sempre em devir e que o terapeuta só pode entrever por meio
de sua própria mente representacional.

A personalidade do indivíduo é o resultado complexo e em processo de


vir-a-ser de memórias compostas e estratificadas, que resulta de uma rede de
relações (condições e condicionamentos) que fogem à consciência, que são
inicialmente corpóreas e neurobiológicas (por exemplo, toda atividade mental
tem um correspondente cerebral), hormonais (pense-se apenas na incidência do
sexo biológico na percepção das diferenças de gênero), relacionais (o
reconhecimento do outro e de suas expectativas funda a separação, a identidade
e a diferenciação), histórico-epigenéticas (as experiências precedentes orientam
e predispõem às experiências sucessivas), culturais (o modo e o grau de
consciência de si do sujeito é também função do progresso dos estudos e do
conhecimento deles).

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Ora, a partir de uma descrição de algumas características da psicoterapia,


gostaria de propor alguns temas de confronto entre a "cura" psicológica e o
"cuidar" que sustenta também a intervenção do conselheiro espiritual.

Certamente, as finalidades das duas tipologias de intervenção sobre a


experiência espiritual são diversas, embora ambas estejam voltadas para uma
religiosidade que seja relação madura com um Deus significativo do ponto de
vista psicodinâmico, vale dizer, com uma representação de Deus integrada e
coerente com o conjunto do psiquismo do sujeito.

Mas o objetivo da psicoterapia é a libertação da personalidade in toto e o


surgimento da verdade do sujeito. Para a intervenção psicológica, a vivência
religiosa é um dos aspectos da personalidade, que deve ser harmonizado com
os outros aspectos.

E o amadurecimento do posicionamento em relação a Deus (na acepção


"neutra", ou seja, no duplo sentido da aceitação de fé ou também da recusa)
entre a tarefa mais vasta da formação de uma personalidade madura. Para a
direção espiritual, o fim específico, e muitas vezes único, é o amadurecimento
da fé do sujeito. Isso deveria comportar tanto uma fidelidade ao nível
maturacional do indivíduo quanto a coerência com a concepção de Deus da
religião de referência.

Mas observe-se que, na direção espiritual, a tarefa de fazer amadurecer


uma boa relação com Deus visa muitas vezes um objetivo ou um percurso
específico: o discernimento vocacional, a formação para a pastoral, etc.,
enquanto, por aquilo que me foi possível observar na realidade concreta da
prática clínica com pessoas religiosas, a atenção à especificidade da relação
com Deus, às vezes, deixa em segundo plano o contexto do crescimento
pessoal.

Constatadas algumas diversidades nos objetivos entre acompanhamento


espiritual e prática psicoterapêutica, o confronto pode ainda ser feito com
utilidade nas modalidades relacionais, nos auxílios de comunicação, nas
transformações interiores.

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Aspectos Psicodinâmicos da Relação de Ajuda: Traços


Confronto para um

A proposta de um confronto não pode articular-se a não ser como uma


reflexão sobre alguns característicos processos psicodinâmicos a destacar na
psicoterapia como acima definida.

Relação funcional e temporária


A relação de cura encontra sua justificativa na orientação a um escopo
sobre o qual se constitui uma "aliança" terapêutica e uma espécie de "contrato";
em outras palavras, um final e uma finalidade. Contra isso se projetam alguns
riscos, como os da interminabilidade, da infantilização e da "seqüela", pela qual
o consultante se torna um sequaz e/ou o próprio consultor se compraz em ter
um séqüito de filhos espirituais.

Às vezes, acontece verificar-se a formação de grupos de sequazes ao


redor de figuras carismáticas de guias (espirituais). Estes deveriam interrogar-se
como tornar os próprios filhos espirituais "crentes adultos", independentes
também deles próprios.

A esperança de qualquer bom professor é que o discípulo, a quem


ensinou a caminhar, possa andar longe e descobrir terras novas. Tarefa de
qualquer bom professor (como de um bom analista) é encaminhar o aluno a
andar com ele, mas também além dele, e não obstante ele.

De resto, quantos diretores espirituais viram florir a santidade na vida de


seus assistidos, discípulos que foram além das linhas de chegada que eles eram
capazes de indicar.

A razão de ser da relação funcional psicoterapêutica, que pode ser muito


profunda, é a busca do bem-estar do paciente. A consecução desse fim assinala
também o fim da relação.

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E o fim é a finalidade da terapia: a deiscência do terapeuta, a diminuição


de sua necessidade e, por conseguinte o seu afastamento para livrar o aluno de
sua própria sombra. Creio que isso valha para qualquer processo de educação
e formação e também para o acompanhamento espiritual.

Dado por aceite que o amadurecimento da pessoa (e do cristão) segue


uma linha assintótica, deve-se perguntar em que nível se dá o alcance da
estatura adulta (cristã) na qual o sujeito se torna autônomo e, por sua vez, capaz
e responsável pela formação de outros.

Os filhos nascem, mas tornam-se adultos, genitores e mestres, por sua


vez. Por essa característica temporária da experiência formativa, creio que se
devam medir o conceito, o sentido e a eficácia da chamada formação
permanente.

Assimetria da relação
A assimetria é conscientemente reconhecida e livremente aceita no que
diz respeito à competência entre os dois. Isso não exime o consulente (embora
parte mais "frágil") da própria responsabilidade sobre a correta gestão do
processo relacional e sobre a tomada de decisões para a própria vida, embora a
assimetria atribua maiores responsabilidades ao guia do processo relacional.

Como todas as relações assimétricas, a relação de ajuda está exposta ao


risco da sedução e da perversão incestuosa.

A sedução é um deslizamento de planos na dinâmica relacional, da


assimetria da diversidade à simetria da complementaridade e à assimilação do
outro a si mesmo (se-ducere).

O bom professor, ao contrário, estimula no aluno o desejo da


diversificação e da superação; indica uma estrada que ele percorreu de um certo
modo e até um certo ponto, mas que não está nunca acabada, lançada em
direção a uma meta nunca alcançada, aberta a possíveis novos percursos. O
que ao professor se pede é que ensine a caminhar: transmitir um método, não
fixar uma meta.

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2
0

Uma outra anotação à margem pode dizer respeito à necessidade da livre


escolha na determinação da oportunidade e da pessoa do parceiro na relação
de ajuda.

O terapeuta, em virtude também da assimetria da relação, tem a


responsabilidade maior em aceitar ou recusar o paciente; e deve renunciar a
trabalhar com pessoa com quem não se sinta em sintonia ou não se sinta em
condição de condividir um percurso, necessariamente longo e exigente.

A propósito, embora reconhecendo que muitos outros são os fatores em


jogo no acompanhamento espiritual, poderia-se perguntar se o fator humano
relacional pode ser negligenciado a propósito da escolha do diretor espiritual:
pense-se, por exemplo, na situação de vínculo mais ou menos imposto com o
diretor espiritual proposto ou preposto à comunidade religiosa, aos seminaristas,
etc.

Certamente, menor é a responsabilidade dos dois parceiros, e talvez não


predeterminável, quanto ao resultado do percurso de ajuda. Isso é motivo de
contraste entre psicanalistas e ambientes médicos (e companhias de seguro!)
que pretendem uma prognose e um cronograma dos resultados, para verificar a
chamada eficácia da psicoterapia, ao passo que não se pode garantir uma cura
definida e fixada preventivamente.

Da mesma forma, não se poderá garantir, por exemplo, no discernimento


vocacional, o resultado do itinerário do seminarista.

Certamente bom resultado de uma correta prática de discernimento


poderia ser, também, o encaminhamento do seminarista por uma outra estrada,
no caso que apareça chamado a responder a sua vocação cristã por vias
diversas da do sacerdócio ordenado. Isso comporta, em muito diretores
perspicazes, a disponibilidade em acompanhar o jovem também depois de sua
saída do seminário, naquele difícil momento de crise e de escolha de uma nova
orientação de vida. Em toda plenitude, também essa tarefa mereça o nome de
acompanhamento vocacional.

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2
1

A exigência da abstinência
A cura em seu conjunto e todo ato seu deve estar orientada para o bem-
estar de quem pede ajuda e não para a gratificação pessoal de quem presta
ajuda.

Os desvios são possíveis por meio de uma multiplicidade de percursos


nem sempre conscientes.

Os processos de transferência e contratransferência, entendidos como


reatualização inconsciente de processos psicodinâmicos importantes na história
pessoal, podem ter nisso grande influência.

Uma primeira verificação de uma correta posição da própria


contratransferência poderia resultar da pergunta: o que digo/faço ajuda a mim ou
ao paciente/consulente?

Um sacerdote, que tinha colóquios com uma jovem senhora, me contava:


"depois de me ter dito essas coisas tão transtornantes a seu respeito, estava tão
perturbada que senti que tinha necessidade de ternura e a abracei".

Não nego as boas intenções e quiçá também, em algum (raríssimo) caso,


a utilidade de gesto semelhante, embora me deixem em geral perplexo certas
formas doentias, ou doentes, de contato no interior de uma relação de ajuda.

Mas as perguntas a que aquele jovem padre teria devido responder, para
melhor captar os significados de seu gesto, teriam podido ser deste teor: aquela
"necessidade de ternura" era uma necessidade da senhora ou, antes, minha, ou
de nós ambos? E, como necessidade, deveria ser satisfeita? Para qual benefício
espiritual estava orientado meu comportamento? Porque tantas vezes sou eu
que lhe telefono para perguntar-lhe como está e para oferecer-lhe uma
conversa? Não me acontece um pouco demais de sentir a necessidade de
contatos afetuosos com as jovens que vêm falar comigo? Que coisa isso quer
dizer para a minha vida de consagrado?

Na realidade, creio que seja muito importante verificar com freqüência as


próprias motivações, para evitar cumplicidades afetivas, relações muito

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2
2

mórbidas, envolvimentos e transtornos do próprio mundo afetivo e do mundo dos


outros.

Os psicanalistas o aprendem no curso de um longuíssimo período de


formação, mediante a análise e a supervisão.

E isso significa quanto seja delicada a situação. Daí nasce uma questão,
que abro com interrogações: quem forma os formadores religiosos?

De onde surgem os diretores espirituais dos seminários?

Por meio de quais experiências, percursos, verificações de requisitos ou


designações?

Como floresce e amadurece a capacidade de maternidade-paternidade


de um abade, de uma madre abadessa?

Da teoria e da praxe mais estritamente psicanalítica deriva um conceito


ainda mais rigoroso de abstinência, que se refere a todo o conjunto do tratamento
e comporta que a cura se funde na interpretação e não na satisfação das
necessidades. Isso significa que nem sempre será procurada a satisfação do
consulente, seu senso subjetivo de bem-estar, a gratificação emotiva ou sua
consolação espiritual.

De igual forma, deveria ser analisada e interpretada a gratificação do


consultor ao constatar o próprio "sucesso": "Achou-se bem comigo... disse-me
coisas que nunca tinha dito a nenhum outro", etc.

O clima emotivo (transferência/contratransferência), único – conditio sine


qua non – a tornar possível a análise, não é a relação de simpatia, de facilitação
da comunicação consciente entre paciente e analista. Supõe a reatualização de
dinâmicas inconscientes que são investidas em novos objetos de afeto, in
primis o analista. E isso se refere também às pulsões agressivas, destrutivas e
autodestrutivas, e de certo não se reduz ao transporte erótico banalmente
descrito como "enamorar-se do analista".

A transferência, de fato, é processo de "transferir", projeção de


representações interiores sobre a figura do analista. Visa fornecer ao paciente,

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2
3

no analista, um lugar de projeção de suas vivências que, radicadas no passado,


mas agora reatualizadas e postas em jogo poderão permitir, na análise, uma
recontextualização dos afetos.

Para melhor tornar possível a projeção, o analista procura não invadir o


campo, ou melhor, "a tela de projeção" com suas pessoais vivências, juízos,
comportamentos. Para isso, ele se faz pequeno, se subtrai à vista, não só física
(pense-se no uso do divã), do paciente.

A neutralidade
A neutralidade consiste substancialmente num posicionamento disposto
a reconhecer e não influenciar deliberadamente as opções de valor e os
comportamentos conseqüentes da pessoa.

Caracteriza a psicoterapia profunda em comparação com intervenções


mais sugestivas.

A neutralidade analítica foi representada por Freud com metáforas


lamentavelmente infelizes que passam uma imagem de distanciamento e frieza
(cirurgião, espelho, telefone), que depois foram retomadas por alguns discípulos
de maneira literal e rígida, a ponto de desnaturar-lhe o sentido.

Mas, na esteira de numerosas indicações do próprio Freud, sabemos que


a neutralidade não constitui o analista como frio espelho.

Na realidade, o processo de transferência não acontece num âmbito de


esterilização dos afetos do analista, mas só no quadro do respeito e da
predominância das vivências do analisando. As reações emotivas pessoais do
analista não podem ser negadas, mas não devem invadir o campo terapêutico
da relação dual.

A aplicação da neutralidade no âmbito da direção espiritual coloca


problemas práticos e questões teóricas, entre os pólos do respeito dos ritmos de
crescimento espiritual da pessoa e as metas e percursos (às vezes institucionais)
que se lhe pretende propor.

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2
4

Outras dificuldades derivam das relações entre "foro interno" e "foro


externo", que vêem muitas vezes prevalecer as instâncias do primeiro. Deixo,
porém, a outras competências as considerações sobre a aplicabilidade, no
acompanhamento espiritual, de certos aspectos da neutralidade, que descrevo
a seguir da forma como são requeridas na correta prática clínica.

a) Aceitar a incompletude e o gradualismo, intrínsecos a qualquer relação


de crescimento humano, assim como a não-linearidade do percurso; regressões,
avanços desarmônicos, não sincrônicos.

Na direção espiritual, isso deverá confrontar-se e harmonizar-se com a


proposta de desempenhos de crescimento.

Talvez pudesse ser procurada uma "discrepância ótima" entre o estado


atual e a meta proposta. Esse critério se propõe, na prática, a pedir ao
crescimento do sujeito sempre o passo mais comprido possível.

Os dois termos do confronto ("mais comprido" e "possível") devem ser


entendidos em posição dialética: sem perder de vista a meta, mas sem
negligenciar as características e possibilidades do sujeito.

A sabedoria pastoral sabe graduar esse princípio e, ao mesmo tempo,


colher o sentido dos momentos e das etapas internas ao percurso da pessoa,
medindo-os segundo o nível de maturidade e de crescimento do sujeito e de sua
fé, numa ótica genética do vir-a-ser religioso que veja a maturidade como um
projeto jamais completado, que se realiza segundo os parâmetros
da processualidade e da perfectibilidade.

b) Faz parte da neutralidade também saber escutar. Muitas vezes indo


além das palavras, para colher a verdade do não-dito, na não-verdade do dito; a
"talking cure", de que fala Freud, é análise do discurso, mas também das lacunas
do discurso: os esquecimentos, as preterições, as redundâncias...

Saber escutar significa não só saber colher o incômodo, mas também


deixar que ele se expresse nas palavras do paciente, em seu próprio formular-
se, no processo em que o sofrimento se torna palavra, evitando o recurso fácil a
formas de silenciamento do sujeito.

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2
5

Esse risco pode ser verificado, como já observei, em algumas formas de


intervenção psiquiátrica, quando a prescrição de fármacos adquire uma função
anestésica do sintoma. Isso pode significar tolher ao paciente a voz que se
exprime no sintoma, em vez de compreendê-lo.

E não se pode esquecer que também a prescrição de um fármaco


estabelece modalidades relacionais e coloca-se em um contexto relacional.

No que diz respeito ao paciente, a tomada do fármaco fora do contexto


relacional veicula, muitas vezes, uma visão do distúrbio psíquico como parte
separada do self, a ser gerida com uma intervenção pontual e fragmentária. E a
esse propósito me permito só um aceno ao fato de que, em pessoas e
comunidades religiosas, se encontra um discreto uso de psicofármacos, e
assinalo que o efeito ansiolítico do fármaco pode, às vezes, ser procurado
também no álcool ou em outras formas de desordens e de esquisitices.

c) Saber escutar quer dizer também abster-se da gratificação de tipo


voyeurístico. O que se quer obter é um conhecimento em função do consulente,
não a saciação de uma inútil ou perversa curiosidade.

A psicanálise evita isso abstendo-se quanto possível de fazer perguntas


e forçar confidências; na confiança de que o que é verdadeiramente relevante
surgirá no curso das associações livres do paciente ou, em todo caso, em seu
contar-se. As revelações forçadas ou muito profundamente escavadas, inclusive
pelo próprio sujeito, de coisas há muito tempo conservadas em segredo, têm um
significado psíquico e relacional que deve ser indagado. Se há silêncio, se o
paciente não consegue contar para si mesmo aspectos ou episódios da própria
vida, significa que não está pronto para agüentar a visão deles, que o sofrimento
(às vezes, o distúrbio psíquico) que daí resultaria é muito forte.

Com freqüência também o esforço de sinceridade auto-imposto, até


mesmo o bem-estar aparentemente derivado de uma confissão penosa pode,
em seguida, fazer uma reviravolta, como dificuldade no prosseguimento da
relação terapêutica (ou espiritual).

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2
6

Uma pessoa idosa, mulher de mais de 80 anos, consumiu todo o tempo


da primeira sessão em contar-me, com aparente senso de libertação, alguns
episódios de uma vida sexual marcada pela masturbação que persistia
atualmente e era investida de gravíssimos sentimentos de culpa, com angústias
de perdição eterna.

Interpunha entre as narrativas dos episódios freqüentes expressões do


tipo "Isso nunca contei a ninguém, nem mesmo na confissão", nas quais não era
difícil ler tentativa de sedução em relação a mim ("olhe que privilégio lhe
concedo").

Mas, em contraste com esse aluvião de revelações íntimas, no curso da


sessão sucessiva me comunicou sentir-se "violentada" de minha parte pelo fato
de que eu a teria induzido a abrir-se a certas confidências que ela, vindo ao
atendimento, tinha decidido não revelar.

Para o terapeuta, assim como para o conselheiro espiritual, existe


também o risco de uma espécie de voyeurismo, que chamaria da "vida vivida por
procuração".

Às vezes, pessoas que vivem em alguma forma de solidão (social, afetiva


ou, quiçá, também física) encontram uma espécie de compensação em
participar, também emotivamente, nas vicissitudes, inclusive mais íntimas, dos
outros e em seus movimentos interiores.

d) Saber escutar quer dizer também saber esperar. Esperar que a


verdade do sujeito se instaure nele mediante o seu contar-se. Não antepor a
própria palavra à do paciente, deixando-lhe a possibilidade e o tempo de falar,
de escutar-se e de reencontrar-se em sua própria narrativa, de dar expressão a
estados de alma que ainda não tinham encontrado o caminho. Nem mestre, nem
médico da alma, o analista não tem o poder da cura, nem o do desvelamento;
mas tem a competência de ser testemunha e hermeneuta da autenticidade do
sujeito. Esse saber esperar que apareça a verdade vale também para o paciente
em relação a si mesmo, sem velozes corridas à frente e escolhas não
amadurecidas gradualmente no curso do tempo. Em muitos casos, a

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2
7

capacidade, da parte do terapeuta, de tolerar a incerteza e o indefinido se


comunica, positivamente, também ao paciente.

e) Encontrar as palavras para escutar é uma outra das declinações


possíveis do saber escutar. Muitos aparentes entendimentos ou cumplicidades
com o paciente, que começam com um "compreendi perfeitamente", "já
enquadrei seu caso", "é um caso clássico; vejo muitos como o Sr." ou também
"não deve preocupar-se, são coisas que acontecem a todos", que querem ser
tranqüilizadoras, são muitas vezes, na realidade, perturbadoras: tiram do sujeito
a possibilidade de falar, de escutar-se em sua própria narrativa, ou chegam
mesmo a comunicar "você é um ‘ caso' como tantos outros" e desencorajam a
possibilidade de sentir-se protagonista do próprio percurso. De fato, transmitem
a mensagem: "eu posso ser de ajuda para você, porque eu lhe dou minha
competência; eu o curo". E não, ao contrário, "coloco-me a seu serviço para que
você possa ver a solução de seus problemas, a resposta a suas interrogações,
a possibilidade de sua resposta ao apelo de um Deus que chama você pelo
nome". Uma intervenção do diretor espiritual que seja animado pela esperança
de que Deus se manifesta e apela à pessoa por meio da relação instrumental
com o "pai" espiritual, estará sempre menos preocupado em "ajudar" e "acelerar"
o crescimento mediante os conteúdos das exortações, das prescrições, das
proibições, das opções guiadas.

f) Acerca das relações entre percurso terapêutico e adesão de fé, a


experiência clínica mostra que uma abordagem fincada na neutralidade pode
ajudar as pessoas a aprofundar as razões de sua fé e de sua adesão. Ao mesmo
tempo pode ajudar outras a libertar-se de resíduos patológicos de sua
religiosidade. O problema da perseverança na fé é, ao contrário, conexo com a
própria fé. Nenhuma psicoterapia faz "perder a fé". Uma fé que cai por causa de
uma psicoterapia é um fiapo de fé, que não se sustenta ao confronto crítico e à
consciência do sujeito.

Em conseqüência, para uma boa psicoterapia não é necessário que o


psicólogo seja crente. Basta que seja um bom psicólogo, isto é, que saiba manter
a própria neutralidade e abstinência. Ao contrário, eu creio que a expressão

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2
8

"psicólogo católico" tenha sentido só se revirada em "católico psicólogo",


enquanto o adjetivo "católico" não acrescenta nada à especificidade profissional.

Quando um paciente religioso praticante me pergunta "Antes de iniciar a


terapia quero saber se o Sr. tem fé", anoto mentalmente que tem, além de uma
certa desconfiança em minha competência profissional, alguma resistência em
analisar algum material de sua psique e, provavelmente, se sente inseguro
acerca de sua própria fé. Do mesmo modo que a senhora que começa dizendo
"Podemos falar de tudo, mas não tenho a intenção de discutir meu casamento",
com boa probabilidade está comunicando que seu casamento está em crise.

Um aspecto mais crítico da neutralidade se manifesta quando são mais


radicais as alternativas entre a tarefa educativa e a liberdade a deixar ao
educando. Cito um caso em que talvez seja mais evidente a diferença de posição
entre o psicanalista e o diretor espiritual e o retiro, ainda uma vez, de Winnicott
que, com seu eficaz e personalíssimo estilo paradoxal, sublinhava que uma
educação religiosa verdadeiramente libertadora deveria colocar o indivíduo em
condição de libertar-se também dos nós que podem ter-se constituído pelas
próprias formas religiosas institucionais. De sua própria experiência pessoal, ele,
não crente, dizia: "Sempre fiquei muito contente com o fato de que minha
educação religiosa tenha permitido que eu me desenvolvesse em outras
direções" (Winnicott, 1996, p. 111s), em relação à religião. Aqui, a neutralidade
se apóia na confiança nos percursos do homem e na espera. Mas até que ponto
semelhante posicionamento poderá ser assumido por um diretor ou
acompanhante espiritual?

Na realidade, a neutralidade não é especificamente requerida, antes, é


por muitos lamentada no diretor espiritual.

Este divide a mesma fé com quem lhe pede ajuda, é desejável que tenha
feito nela um longo percurso e é considerado mestre e exemplo na fé.

Além disso, a direção espiritual é também função da experiência e do


crescimento espiritual do diretor, de sua maturidade religiosa, de sua experiência
pessoal de Deus, de sua capacidade de ser mediação e "figura" do amor de
Deus.

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2
9

É preciso sublinhar que a troca da conversação, a proposta de metas, a


indicação de modelos é realizada principalmente no nível do "consciente". Mas
é, de qualquer forma, importante que o diretor esteja consciente de quanto
acontece nele, mediante ele, e também, sem que ele o saiba, através das
dinâmicas inconscientes, representacional transferenciais/contratransferenciais.

As motivações, os afetos e os aspectos relacionais inconscientes agem


tanto na direção espiritual quanto na psicanálise, porque agem em qualquer
relação humana, como húmus da troca verbal.

A questão decisiva está em se estar disso consciente e na utilização que


disso se faz.

A psicoterapia, em especial a psicanalítica, faz da exploração e


interpretação da transferência e dos desejos inconscientes, o lugar para uma
reestruturação de toda a vida afetiva, enquanto o acompanhamento espiritual
visa um amadurecimento da relação com Deus, apoiando-se na clarificação
consciente e no empenho da vontade, além de, certamente, na graça.

Esses diversos horizontes conceituais e metodológicos apontam que


situações complexas são aquelas de uma psicoterapia de uma pessoa religiosa,
da psicoterapia exercida por um religioso, do acompanhamento espiritual de
um psicoterapeuta.

Carl Ranson Rogers (1902-1987), psicólogo norte-americano,


desenvolveu uma teoria de terapia que surgiu como a terceira via (terceira força)
entre os campos predominantes na Psicologia na metade do século 20: a
Psicanálise e o Behaviorismo.

Rogers criou a sua metodologia de aconselhamento totalmente centrada


no cliente, não diretiva e facilitadora, numa perspectiva humanista.

O método não diretivo, centrado no cliente, de Rogers, tem afetado o


mundo ocidental de forma impressionante, tanto na área da terapia, como em
processos de formação de liderança, e na educação.

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3
0

Jay Adams (1929- ), considerado como aquele que resgatou o


aconselhamento bíblico no contexto cristão, reagiu à proposta de Rogers e criou
o Aconselhamento Noutético, com a abordagem diretiva.

Quais são as outras possibilidades em termos de abordagem?

Qual a melhor abordagem para o aconselhamento pastoral?

Por entender que é de suma importância discutir sobre o método de


aproximação e abordagem do aconselhamento, o autor procura desenvolver
essa reflexão em dois artigos, neste artigo, desenvolve-se uma análise das
abordagens mais conhecidas na atualidade, e no próximo artigo a ser publicado,
será apresentada a proposta da abordagem interpretativa centrada nas
Escrituras Sagradas.

As abordagens mais conhecidas na atualidade são: a abordagem diretiva


confrontativa, a abordagem não diretiva centrada no cliente, a abordagem
participativa centrada nas necessidades psicológicas do aconselhado, a
abordagem de apoio centrada na libertação e no crescimento, a abordagem
interpretativa centrada na psicanálise.

Inicialmente, será desenvolvida uma análise detalhada de cada uma


dessas abordagens. Dessa forma, o artigo procura examinar as atuais
abordagens metodológicas que influenciam o aconselhamento pastoral, e que
indicam o relacionamento e a maneira de intervir do conselheiro com o
aconselhado. Além da percepção dos aspectos fundamentais e teóricos do
aconselhamento, avaliar as abordagens de aproximação é de suma importância
para o processo do aconselhamento pastoral, visto que esta afetará positiva ou
negativamente a atividade de ajuda.

Quanto à metodologia deste trabalho, será a bibliográfica. Serão


analisadas as obras de autores importantes de cunho bíblico-teológico, em
busca de uma metodologia de aproximação do aconselhado que faça jus às
questões teológicas.

A obra de Roger Hurding F., A árvore da cura: fundamentos psicológicos


e bíblicos para aconselhamento cristão e cuidado pastoral (São Paulo: Vida

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3
1

Nova,1995). Nessa primeira parte, como já foi dito, procura-se analisar as


principais abordagens metodológicas atuais que influenciam o processo do
aconselhamento pastoral, com breve avaliação das mesmas.

AS ABORDANGENS METODOLÓGICAS ATUAIS


As abordagens metodológicas atuais no aconselhamento e na
psicoterapia, de uma forma ou outra, procuram contribuir na mediação de
conflitos e enfrentamento dos problemas; contudo, algumas abordagens acabam
se conflitando em alguns pontos com os princípios bíblicos trazendo prejuízos.
Vejamos isso por meio de uma análise cuidadosa das mesmas:

ABORDAGEM DIRETIVA CONFRONTATIVA


O método diretivo é aquele no qual a responsabilidade cabe, em maior
escala, ao conselheiro que é visto como um orientador, ou expert no assunto e
no processo.

O conselheiro é quem dirige a entrevista e todo o processo de


aconselhamento; neste método, na maior parte do tempo, o conselheiro fala e o
aconselhando ouve. Nesse sentido, o [...] conselheiro é visto como perito que faz
o diagnóstico e a análise do problema, às vezes define ou categoriza o
comportamento, e decide sobre soluções para o problema do aconselhamento
e, de várias maneiras, comunica estas soluções ao aconselhamento (COLLINS,
2002, p. 154).

Skinner e a Terapia Comportamental (Behaviorismo)


Skinner (1904-1990) é considerado o pai do behaviorismo radical, com a
teoria do comportamento operante, a partir da qual acreditava que seria possível
modelar todo comportamento humano.

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3
2

O homem é considerado como uma máquina que se pode controlar e


conduzido em um processo de modelagem dirigido pelo terapeuta ou educador.
(HURDING, 1995).

Por meio de reforçamento positivo, de forma especial, alcança-se a


modelagem do comportamento desejado. O processo é completamente dirigido
pelo terapeuta.

Ellis e a Terapia Racional Emotiva

De acordo com Ellis (1973, apud COLLINS, 2002, p.154) e sua teoria
(RET – Terapia Racional Emotiva), “[...] não devemos perder tempo com os
sentimentos e as ações.

Pelo contrário, devemos focalizar nossa atenção no pensamento;


devemos ensinar as pessoas a controlar seu destino por meio de aprender a
pensar mais racionalmente.”

Na sua teoria, Ellis Encoraja os conselheiros (mais do que os


aconselhandos) a dirigir a maior parte da Conversação, a desafiar diretamente
as ideias que o aconselhando tem acerca de si mesmo ou do mundo, e, se
necessário, argumentar, ridicularizar, ordenar, ou até mesmo xingar o
aconselhando a fim de alterar seu modo de pensar. (ELLIS, 1970 apud
COLLINS, 2002, p.154).

O conselheiro que tem o hábito de trabalhar apenas dando conselhos,


falando, direcionando, emitindo sua opinião particular, nem sempre ajuda as
pessoas que sofrem; ao contrário, mais comumente aumenta sua dificuldade e
causam frustrações.

Os objetivos do conselheiro e os do aconselhando, nesse caso, são


diferentes entre si e se chocam. Enquanto o sofredor quer a solução de seus
problemas, o conselheiro pensa que tem o direito de falar sozinho e apresentar
a solução de sua própria maneira.

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3
3

Quem está precisando falar e expressar suas dores mais profundas


(aconselhando) não está pronto para ouvir seu conselheiro, pelo menos nos
primeiros encontros; e quem tem o hábito e entende que tem que falar e dar
direcionamentos (conselheiro), toma o tempo falando e constrangendo seu
aconselhando.

Adams e o Aconselhamento Noutético


Jay E. Adams (1929 - ) foi deão do Instituto de Estudos Pastorais e
professor de teologia prática a convite do Seminário Teológico de Westminster,
na Filadélfia, Estados Unidos.

É uma figura influente entre os conselheiros evangélicos nos dois lados


do Atlântico, voltados para o Aconselhamento Noutético; graduou-se em
Teologia com especialização em Homilética e Oratória; e foi pastor em vários
ramos da Igreja Presbiteriana da Pensilvania e de Nova Jérsei. (HURDING,
1995).

Adams frequentemente se refere ao objetivo geral na ajuda aos outros


como o de ‘mudança bíblica’. Reconhecendo-se que todo homem, mulher ou
criança que busca conselho pertence ou ao reino da luz ou ao reino das trevas’,
então a ‘mudança bíblica’ significa o processo de santificação, para os que
pertencem ao primeiro, e a realidade da conversão, para os do segundo.
(HURDING, 1995, p. 320).

No aconselhamento para o cristão, a ‘mudança bíblica’ é compreendida


principalmente como o processo de santificação. Desenvolve-se um
relacionamento onde há uma confrontação amorosa, nesse relacionamento, “[...]
O amor é visto como um ‘relacionamento condicionado pela observância
responsável dos mandamentos de Deus’. (Adams, apud, Hurding, 1995, p. 320).

A ‘mudança bíblica’ é crida e esperada com base na confiança em Deus.


Outro objetivo do aconselhamento, conforme Adams, é a completa dependência
do Espírito Santo, considerando que conselheiros não mudam as pessoas pois
essa é uma obra de Deus.

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3
4

Da mesma forma, os conselheiros devem ter plena consciência de que


são instrumentos importantes nessa dependência da obra do Espírito Santo.
Adams também destaca que, neste processo, a obra do Espírito Santo está
totalmente relacionada à Palavra de Deus.

Para ele, a Bíblia é o fundamento de todo aconselhamento


verdadeiramente cristão pois, como Paulo afirma: “Toda escritura divinamente
inspirada é proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em
justiça” (2 Tm 3.16).

Segundo Adams (apud, Hurding, 1995, p. 321), esses dois alicerces, a


Bíblia e o Espírito Santo, estão inextricavelmente vinculados, uma vez que o
Espírito Santo emprega sua palavra como meio principal pelo qual os cristãos
podem crescer em santificação. No entanto, Hurding observa que o
Aconselhamento Noutético apresentado por Adams é bastante diretivo com
tendências autoritárias.

O Conselheiro, nessa abordagem, dirige o processo, inclusive como


disciplinador, confrontativo e às vezes com tendências punitivas, visto que nessa
abordagem diretiva, conforme Adams, o aconselhado pode ser dispensado se
ele não fizer todas as tarefas designadas pelo conselheiro. “Se um paciente se
recusa a cumprir a vontade de Deus, a melhor coisa que o centro aconselhador
pode fazer é despedilo, ou então, nas situações necessárias, informar a seu
pastor”. (HURDING, 1995, p. 323).

Para Adams (2003), o aconselhamento, na forma de orientação diretiva,


era prática universal nos tempos bíblicos. Logo, expor o cliente à palavra
autorizada de modo diretivo é desafiar ao processo de mudança bíblica; isso faz
parte do discipulado pessoal e, por consequência, da possibilidade de disciplina
da igreja.

Dessa forma, observa-se que o aconselhamento de Adams favorece o


estilo mais diretivo e admoestador diferente daqueles modelos mais
reanimadores e consoladores. Adams tomou os termos gregos noutheo e
nouthesia, utilizados nas Escrituras com o sentido de aconselhar, admoestar,

34
3
5

confrontar, exortar, a fim de propor um método de aconselhamento, que tem


seus méritos.

Contudo, Hurding observa que a tendência de Adams de apresentar seu


estilo confrontador, diretivo e autoritário de aconselhamento como o método
bíblico por excelência é que deve se questionar, visto que a Bíblia fala, também,
de confortar, apoiar, consolar e encorajar dentre outros aspectos que vão além
de confrontação diretiva.

Ser muito diretivo, pode levar o conselheiro a precipitações tanto no


diagnóstico como nas intervenções e também a ser autoritário, sempre agindo
como aquele que conhece toda verdade e todos os problemas, como também
todas as soluções, dando a impressão que o aconselhando nada sabe e nada
tem a contribuir com sua própria batalha.

Nessa perspectiva, o aconselhando pode ficar quase à margem do


processo de análise.

ABORDAGEM NÃO-DIRETIVA CENTRADA NA PESSOA


No aconselhamento não-diretivo centrado no cliente, o indivíduo é o foco,
o conselheiro é um facilitador do processo.

O objetivo principal é ajudar o indivíduo a ser independente e obter


amadurecimento que lhe ajude a resolver possíveis problemas que esteja
enfrentando ou que possam aparecer no futuro.

O mais expressivo representante dessa abordagem é Carl Ransom


Rogers (1902- 1987). Rogers foi um psicólogo estadunidense atuante na terceira
força da psicologia e desenvolvedor da Abordagem Centrada no Cliente. Um dos
destaques de sua proposta está na importância da relação da pessoa e do
terapeuta, que são iguais e não possuem posição de hierarquia.

Rogers, de certa forma, é filho do seu tempo. A humanidade estava


influenciada pelo clima cultural predominante em seus dias, isto é, por uma
tendência crescente de otimismo quanto ao poder que homens e mulheres, como

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indivíduos, têm de transformar para melhor tanto a sociedade quanto a si


próprios.

Afirmaram sobre ele que, “expressou uma ideia cuja época chegara”, e
não resta dúvida de que sua impressionante popularidade se relaciona ao
momento do destaque que dispensou ao “primado do indivíduo na vida humana,
agora não como um ideal, mas como um programa, primeiro como um programa
terapêutico e finalmente como um programa social”. (HURDING,1995, p.132).

De acordo com as crenças de Rogers, todos os homens e mulheres


possuem dentro de si os recursos para uma mudança construtiva, uma tônica
fortemente humanista.

Embora reconheça haver “sentimentos hostis e anti-sociais” dentro das


pessoas, Rogers declara que eles não existem nos níveis mais profundos e mais
fortes da natureza humana. Hurding (1995, p. 132), apresenta um resumo dos
objetivos do aconselhamento de Rogers, e destaca que, ao longo dos anos,
houve mudanças e desenvolvimentos em sua teoria e prática.

Pode-se acompanhar a fluidez de suas ideias a partir de seu


aconselhamento não-diretivo na década de quarenta, com o destaque à não-
interferência do conselheiro, passando pela terapia centrada no cliente, da
década de cinquenta, com ênfase no relacionamento terapêutico, e indo até a
visão centrada na pessoa, da décadas de sessenta e de oitenta.

Em relação aos seus métodos, Rogers adotava uma posição de não-


interferência, afirmando que tudo de que o cliente precisa é de um facilitador, o
qual deixará que a pessoa necessitada atinja o insight de sua própria condição.

Por essa razão, excluem-se todas e quaisquer palavras de conselho,


adulação, sugestão, interpretação, orientação, desafio, confrontação e
persuasão. (HURDING, 1995).

Para Rogers, é por meio dessa nãodiretividade que o cliente encontra


espaço para reconhecer e manifestar emoções e, conforme já descrito, caminhar
em direção a conceitos mais válidos acerca de si mesmo.

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Segundo Collins (2002, p. 155), “O conselheiro no aconselhamento não-


diretivo é uma pessoa que facilita e estimula o orientando a resolver seus
próprios problemas, criando para 8 isso um ‘ambiente permissivo’, em que ao
mesmo tempo em que ocorre a solução do problema há também o ‘crescimento
pessoal’”.

Com isso, no aconselhamento não-diretivo de Rogers, o conselheiro


procura lidar com o cliente como pessoa e não como um problema, procurando
propiciar a ele maior autonomia e amadurecimento para alcançar seus objetivos
pessoais.

Ao se examinar as pressuposições, os objetivos e os métodos de Carl


Rogers, numa avaliação crítica, percebe-se que a sua metodologia é firmada
naquilo que ele crê a respeito da natureza humana como tendo todos os recursos
para solução de problemas.

Sabe-se que essa perspectiva influencia todos os aspectos práticos, visto


que qualquer coerência entre teoria e prática exige que seja assim.

Conselheiros cristãos, portanto, devem ser críticos tanto com a teoria de


Carl Rogers como com a correspondente prática não-diretiva centrada na
pessoa.

Segundo as Escrituras, o ser humano, no mais profundo do seu ser está


contaminado pelo pecado, sendo incapaz de compreender, por si mesmo, o seu
real estado bem como a maravilhosa graça de Cristo.

ACONSELHAMENTO PARTICIPATIVO CENTRADO NAS


NECESSIDADES PSICOLÓGICAS
Gary R. Collins, diálogo amistoso e participativo em busca de suprir
necessidades psicológicas Gary Collins (1943- ), psicólogo americano com
doutorado em Psicologia Clínica pela Universidade de Purdue, é também escritor
e conferencista.

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Ele propõe trabalhar dentro de uma cosmovisão cristã, integrando


aspectos da Psicologia com as Escrituras Sagradas. Ele tem, como pressuposto,
que o coração do ser humano é motivado por necessidades ou desejos de
desenvolver uma atividade ou causar um impacto no mundo, e por necessidade
de relacionar-se de modo amoroso com outros.

Com este pressuposto, Collins opta pela abordagem participativa para o


aconselhamento. Nessa abordagem, ambos – conselheiro e aconselhando –
falam em diálogo amistoso e participativo.

Os dois são ativos porque ambos falam, e são também passivos, porque
ouvem igualmente um ao outro na busca de que necessidades sejam supridas.

É importante ser sensível e usar todas as técnicas disponíveis para fazer


com que o aconselhando se sinta à vontade, mas, ao que parece, são as
características pessoais do conselheiro que propiciam o estabelecimento de uma
relação terapêutica eficaz: o calor humano, a sinceridade e a empatia.
(COLLINS, 2004).

Na sua compreensão, o conselheiro precisa conhecer para entender


melhor o comportamento humano, tendo uma perspectiva mais clara sobre as
bases bíblicas do aconselhamento, e desenvolver as habilidades necessários
para o trabalho do conselheiro.

O problema de Collins é que acaba contando mais com a Psicologia do


que com a Bíblia para a compreensão do ser humano e seu comportamento.
Falar de necessidades de propósito e necessidades relacionais, e limitar o
comportamento humano à esfera social, como se a Bíblia não falasse mais
amplamente sobre o ser humano e as motivações de seu coração, é um grande
equívoco. Essa tendência, portanto, de definir a natureza humana com relação
ao próprio homem e não a Deus, e de compreender o coração em si mesmo, faz
com que o aconselhamento pretensamente bíblico seja um processo de apoio
para suprimento de necessidades sociais do ser humano.

Portanto, a abordagem participativa de Collins e outros conselheiros


cristãos fica limitado por seu pressuposto que limita a compreensão do coração

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humano e suas motivações, ao negligenciar os aspectos relacionados


diretamente com Deus, os quais, de fato, fazem a diferença no viver.

A ABORDAGEM DE APOIO CENTRADA NA LIBERTAÇÃO


E NO CRESCIMENTO
De acordo com Clinebell, espera-se, na poimênica e no aconselhamento
de apoio, que o pastor use métodos que alicercem, estabilizem, alimentem,
motivem ou orientem pessoas atribuladas, capacitando-as a manejar seus
problemas e relacionamentos mais construtivamente. Isso deve acontecer,
dentro dos limites que lhes são impostos pelos recursos de sua personalidade e
pelas circunstancias.

A natureza do aconselhamento de apoio torna-se mais clara quando é


contrastado com métodos de ajuda voltados para a descoberta e orientados para
os insights (estes métodos também são chamados de psicoterapia pastoral).

Estes últimos visam mudanças básicas da personalidade, que ocorrem


descobrindo e lidando com aspectos anteriormente ocultos de nós mesmos e de
nossos relacionamentos atuais. Seu objetivo é ajudar as pessoas a obterem
força e perspectiva para usarem seus recursos psicológicos e interpessoais com
maior eficácia, ao enfrentarem criativamente sua situação de vida. (CLINEBELL,
1987, p. 165).

A participação do aconselhando é de suma importância, a menos que ele


esteja tão debilitado que não possa ajudar em nada no processo. Nessa
perspectiva o que prevalece no ser humano é um potencial para crescer.

Todo ser humano tem este potencial, só precisa de ajuda para manejá-lo.

O Aconselhamento Pastoral deve capacitar as pessoas para manejarem


seus problemas e relacionamentos mais produtivamente. Cleinebell firma-se em
um pressuposto próximo ao de Carl Rogers em relação à visão do ser humano.

Como Rogers, ele assume que, não houve algo como o que a teologia
tradicional chama de ‘morte espiritual do homem’, afetando todo o seu ser,

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contudo, ele não chegou ao ponto de aceitar que o ser humano tem bondade
intrínseca. (HURDING, 1995).

Verificar os recursos da personalidade e as circunstâncias é importante,


mas não pode servir de limites para a atuação do conselheiro bíblico.

O que limita tudo no aconselhamento bíblico é a própria verdade de Deus


revelada na Bíblia, não os recursos da pessoa ou as circunstâncias; neste caso,
a participação do aconselhamento se torna um desafio, pois tende para o
aconselhamento não diretivo centrado no aconselhando, pois, de qualquer
forma, acredita que a pessoa tem um potencial próprio, doado por Deus, para o
seu crescimento que não foi afetado pela queda, necessitando apenas de
aprendizado para manejá-lo.

A ABORDAGEM INTERPRETATIVA CENTRADO NA


PSICANÁLISE
Há duas perspectivas de se ver a abordagem metodológica interpretativa.
A primeira seria a perspectiva psicológica secular.

Nessa perspectiva busca-se interpretar os eventos de forma realista, visto


que todas as pessoas tendem a interpretar eventos do passado de forma não
realista; a base da “realidade” nesse ponto de vista é aquilo que se interpreta do
ponto de vista humanista.

Freud e a interpretação na Psicanálise

Na terapia psicanalítica procura-se contribuir com o paciente, para que


conheça melhor seu inconsciente e compreenda em profundidade a real situação
na qual encontram as causas dos seus problemas.

Freud procurava, por meio de uma escuta paciente e dedicada, fazer a


análise de forma não diretiva nem autoritária.

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Por isso, na Psicanálise, o terapeuta interpreta os fatos fazendo a


associação livre, ou seja, estimula que o paciente fale de forma espontânea sem
muitas intervenções do terapeuta.

A base dessa interpretação são os pressupostos humanistas de Freud


que considerava o homem um ser em evolução. (HURDING, 1995).

Para ele, em poucos anos o ser humano estaria se libertando da ideia de


um pai necessário (Deus) e, assim, a humanidade chegaria a uma idade madura
e os homens estariam livres e capazes de dirigir seu próprio destino.

A resposta forjada por Freud para compreender esse ‘novo problema


psicológico’ está assentada sob a noção de ilusão e sua correlação com o
sentimento de desamparo infantil e o complexo paterno.

As ideias religiosas têm tanto vigor porque ‘são ilusões, realizações dos
mais antigos e prementes desejos da humanidade.

O segredo de sua força reside na força desses desejos’ (FREUD,


1927/1996, p.39 apud MOREIRA; PINTO, 2012, p. 391).

É importante lembrar o pensamento de Freud sobre a religião, ele negou


a existência de Deus, e a necessidade de uma fé sobrenatural. A sua terapia
psicanalítica, portanto, é centrada nela mesma, em sua teoria e pressupostos,
numa perspectiva humanista.

O processo da Psicanálise se resume à tentativa de ajudar o paciente a


trazer à tona as necessidades não supridas por meios das técnicas humanistas
de Freud, com o propósito de superação de traumas e a busca por uma maneira
coerente para se viver de forma socialmente aceitável.

Segundo Hurding, (1995, p. 84), “O objetivo de todo esse esclarecimento


é ajudar o paciente a lidar com o verdadeiro eu, ao permitir que lembranças,
desejos, pensamentos e atitudes reprimidos aflorem à consciência.”

O abandono de Deus e da revelação bíblica faz com que Freud e seus


amigos, com a intenção de chegar a níveis mais profundos dos problemas das
pessoas, acabem ficando em um ponto muito distante do real estado das

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pessoas, pois é impossível chegar no âmago das questões mais profundas do


ser humano sem a perspectiva bíblica.

Da mesma forma, acreditar em uma maturidade existencial


negligenciando o Criador, sua revelação e sua graça, segundo a Psicanálise e
outras escolas da Psicologia, torna-se apenas uma tentativa ilusória na busca de
sentido da vida. O positivismo de Freud em relação ao ser humano e suas
possibilidades é inconsistente.

Para Freud, algumas pessoas passaram por situações complexas e


ficaram com graves traumas do passado (por necessidades libidinosas da
primeira infância não satisfeitas), que afetam suas vidas no presente (Hurding,
2015, p. 92).

A terapia psicanalítica pode ajudar na análise do problema até certo


ponto, e ajudar a focar em uma maneira lícita de suprir essas necessidades, ou
até mesmo a sublimá-las com técnicas psicológicas, no entanto, não alcança as
reais e mais profundas questões existenciais do coração humano afetado pelo
pecado.

Ser um conselheiro eficaz continua sendo um dos grandes desafios da


atualidade. Para isso acontecer é necessário certos conhecimentos e atitudes
adequados para a tarefa de aconselhar.

Os principais conhecimentos estão relacionados à Bíblia, como palavra


de Deus, que apresenta o conselho do Senhor como fundamento para a prática
do aconselhamento pastoral.

Sem a crença e a apropriação dos ensinos das Escrituras, e sem a


presença e a graça do Criador, nosso aconselhamento estará muito longe das
questões essenciais da vida.

O conselheiro não pode simplesmente se colocar como um ouvinte


facilitador como na abordagem não diretiva centrada no cliente, proposta por
Carl Rogers, ou como alguém que faz um processo de apoio ao aconselhado no
manejamento de seu potencial próprio para a libertação e crescimento. Sabe-se,

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pelas Escrituras, que o ser humano não pode ser visto como tendo toda
capacidade própria para resolver seus problemas.

Ele precisa de uma direção centrada nas Escrituras e não em si mesmo.

No entanto, o modelo de Adams tem a desvantagem de ver o conselheiro


dirigindo o processo como um disciplinador autoritário, com possíveis tendências
julgadoras e punitivas.

Ainda que não se possa acusar Adams disso, muitas vezes conselheiros
noutéticos inclinaram-se a ouvir muito pouco os aconselhandos com tendências
impacientes e julgadoras.

Tudo isso, com possíveis tendências de se induzir os aconselhados ao


desânimo, visto que não são pouco ouvidos, e não envolvidos na interpretação
da sua própria vida.

De fato, é preciso ter cuidado com a rebeldia humana e não alimenta-la.


No entanto, é preciso reconhecer que os aconselhandos certamente terão
recaídas no processo de mudança e crescimento e que tais recaídas não podem
ser compreendidas como rejeição da vontade de Deus, levando o conselheiro a
rejeitá-los, dispensando-os.

No aconselhamento participativo, não ficou claro qual o centro do


aconselhamento,

Deus ou o ser humano. Se isso não fica claro, a tendência é de ser um


modelo, ou abordagem metodológica também humanista, visto que, pelo menos,
em parte, está centrado nas necessidades psicológicas humanas.

Nesse tipo de participação, portanto, parece que se acredita na


importância de se buscar os recursos humanos do aconselhado firmados em si
mesmo.

Nesse processo de ajuda, pode-se facilmente deixar de se ter como centro


as Escrituras Sagradas.

O aspecto relacional é importante, mas o relacionamento conselheiro e


aconselhado deve ser movido pela centralidade de Deus e sua palavra que

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apontam para as necessidades espirituais do ser humano carente da graça de


Deus, e não apenas para as necessidades psicológicas.

Dessa forma, observa-se que o aconselhamento de Adams favorece o


estilo mais diretivo e admoestador diferente daqueles modelos mais
reanimadores e consoladores.

Adams fez das palavras gregas noutheo e nouthesia, a fim de propor um


método de aconselhamento, que tem seus méritos. Contudo, Hurding observa
que a tendência de Adams de apresentar seu estilo confrontador de
aconselhamento como o método bíblico por excelência é que deve se questionar,
visto que a Bíblia fala também de confortar, apoiar, consolar e encorajar dentre
outros aspectos que vão além de confrontação diretiva.

Por isso, é preciso ir além do que até aqui foi tratado e buscar por uma
abordagem mais consistente com as Escrituras Sagradas. Isso será feito no
artigo que há de ser publicado em uma próxima edição da revista.

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REFERÊNCIAS
A BÍBLIA. Bíblia de Estudo Pentecostal. Tradução de João Ferreira
Almeida. Ed. Revista e Corrigida. Rio de Janeiro: CPAD, 1995. ADAMS, Jay E.
Conselheiro capaz. São Paulo: Fiel, 2003.

CLINIBELL, Howard J. Aconselhamento pastoral: modelo centrado em


libertação e crescimento, tradução de Walter O. Schlupp e Luis Marcos Sander.
5ª ed. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2011.

COLLINS, Gary R. Ajudando uns aos outros pelo aconselhamento. São


Paulo: Vida Nova. 1982. (Reimpressão, 2005).

COLLINS, Gary R. Aconselhamento cristão. São Paulo: Mundo Cristão,


2011. MACARTHUR, John Jr. MACK, Wayne. Introdução ao aconselhamento
bíblico. Niterói: Editora Hagnos. 2008.

MOREIRA, Claudia Maria Silva, PINTO, Jeferson Machado. Para além da


ilusão: o real. Revista Ágora (Rio de Janeiro) v. XV número especial dez 2012
389-404. Disponível em . Acesso em: 01 mar. 2020.

POWLISON, David. Uma nova visão: o aconselhamento e a condição


humana atraves das lentes da Escritura, São Paulo: Ed. Cultura Cristã, 2010.

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