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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI

TRANSTORNOS MENTAIS –
TEA E PSICOSES

GUARULHOS – SP
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 4
2 CONCEITUANDO O TRANSTORNO MENTAL............................................. 5
2.1 Conceito de Transtorno mental no DSM-5 ..................................................... 7
3 ESPECTRO DA ESQUIZOFRENIA E PSICOSE ......................................... 11
3.1 Critérios diagnósticos de esquizofrenia ........................................................ 13
3.2 Transtornos psicóticos .................................................................................. 15
3.3 Transtorno psicótico breve ........................................................................... 15
3.4 Transtorno esquizofreniforme ....................................................................... 16
3.5 Transtorno esquizoafetivo ............................................................................ 16
3.6 Transtornos delirantes .................................................................................. 17
4 TRANSTORNO BIPOLAR e DEPRESSIVOS .............................................. 19
4.1 Transtornos depressivos .............................................................................. 21
4.1.1 O transtorno depressivo maior ..................................................................... 22
4.1.2 Transtorno depressivo persistente (distimia) ................................................ 23
4.1.3 Transtorno disruptivo da desregulação do humor ........................................ 24
5 TRANSTORNOS DE ANSIEDADE E DE PERSONALIDADE ..................... 25
5.1 Transtorno de ansiedade generalizada ........................................................ 25
5.2 Transtorno do pânico .................................................................................... 26
5.3 Transtorno de ansiedade social .................................................................... 27
5.4 Transtornos da personalidade ...................................................................... 28
6 TRANSTORNO DO NEURODESENVOLVIMENTO .................................... 32
6.1 Transtorno do desenvolvimento intelectual .................................................. 32
6.1.1 Esfera conceitual .......................................................................................... 35
6.1.2 Esfera Social ................................................................................................ 36
6.1.3 Esfera Prática ............................................................................................... 36
6.1.4 Tratamento de deficiência intelectual ........................................................... 37
6.2 Síndrome de Down ....................................................................................... 38
6.3 Fenilcetonúria (PKU) .................................................................................... 39
6.4 Síndrome do X frágil ..................................................................................... 40
6.5 Síndrome de Rett.......................................................................................... 42
6.6 Transtorno do espectro autista ..................................................................... 43
6.6.1 Teorias e tratamento de transtorno do espectro autista ............................... 47
6.6.2 Transtorno do espectro autista de alto funcionamento ................................. 49
7 INTERVENÇÕES COMPORTAMENTAIS PARA TEA NO AMBIENTE
ESCOLAR .................................................................................................... 50
7.1 Intervenções comportamentais: uma visão geral ......................................... 51
7.2 Tipos de dificuldades comportamentais no TEA ........................................... 54
7.2.1 Comportamentos estereotipados, agitação e irritabilidade ........................... 54
7.2.2 Agressão e autoagressão ............................................................................. 56
7.2.3 Rigidez e comportamentos perseverativos ................................................... 57
7.2.4 Atenção e hiperatividade .............................................................................. 60
7.2.5 Ansiedade..................................................................................................... 62
7.2.6 Depressão .................................................................................................... 63
7.2.7 Transtorno desafiador de oposição ou transtorno de oposição desafiante... 64
7.2.8 Distúrbios do sono ........................................................................................ 64
7.3 Adaptação curricular para alunos com TEA ................................................. 65
8 BIBLIOGRAFIA BÁSICA ............................................................................. 70

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1 INTRODUÇÃO

Prezado aluno!
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante
ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável -
um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma
pergunta , para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum
é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão
a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as
perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão
respondidas em tempo hábil.
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da
nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à
execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da
semana e a hora que lhe convier para isso.
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser
seguida e prazos definidos para as atividades.

Bons estudos!

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2 CONCEITUANDO O TRANSTORNO MENTAL

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Historicamente, indivíduos com transtornos mentais são caracterizados como


seres perigosos, anormais e incapazes de se relacionar e conviver em sociedade. Tal
mentalidade, advinda de séculos passados, ainda persiste até os dias atuais.
Pensava-se, inclusive, que o transtorno mental como uma punição divina pelos
pecados cometidos e, portanto, a saúde seria medida pela devoção e obediência aos
ditames religiosos. Da mesma forma, os comportamentos que fogem ao preconizado
pela cultura vigente também já foram tratados como sinal de adoecimento. Assim, por
exemplo, nos Estados Unidos do século XIX, o desejo de um escravo fugir ou sua falta
de motivação para o trabalho forçado eram diagnosticados respectivamente como
“drapetomania" e “disestesia etiópica", ambas “doenças" tratadas com açoite
(TAVARES; CASABURI; SCHER, 2019).
No entanto, no período anterior à Reforma Psiquiátrica, iniciada no Brasil na
década de 70, essa caracterização era ainda mais marcante. Os indivíduos
considerados como loucos eram retirados do seio familiar e confinados em espaços
em que não era possível de se estabelecer terapêuticas de reabilitação, ou seja, não
se esperava a recuperação, mas seu definhamento, uma vez que naquela época
pouco se conhecia sobre as causas dos transtornos mentais e, por esse motivo, as
formas de tratamento eram baseadas no encarceramento, associado à violência, à
brutalidade e às terapias desumanas. A mentalidade de que o indivíduo com
transtorno mental era incapaz de conviver em sociedade contribuiu para que eles não
recebessem os devidos cuidados e fortalecesse a ideia de isolamento. Ao afastá-los

5
de suas famílias, a possibilidade de viver em sociedade tornava-se ainda mais
distante, uma vez que é no convívio familiar que o indivíduo aprende a conviver em
sociedade (TAVARES; CASABURI; SCHER, 2019).
Estabelecer uma diferenciação entre o sofrimento psíquico não patológico e o
transtorno mental torna-se fundamental para compreender os conceitos que serão
tratados nesta disciplina. Não se deve tratar como patologia o sofrimento comum, que
todos passamos ao longo da vida, correndo o risco de fomentar uma indústria da
doença. Igualmente equivocado seria deixar de reconhecer a gravidade e
necessidade de intervenção em uma pessoa que padece de um transtorno mental
(TAVARES; CASABURI; SCHER, 2019).
Foi em 1948 que a Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu o conceito de
saúde como “o estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a
ausência de doença”. Tal concepção ampliou os horizontes do significado de saúde,
uma vez que este passou a se alicerçar no tripé: físico/biológico, psicológico/mental e
social/cultural. Também ampliou a percepção sobre a assistência em saúde,
redirecionando o modelo exclusivamente curativista, ou seja, focado unicamente no
tratamento de doenças, para a importância da prevenção de agravos, promoção de
saúde e reabilitação. Assim, para existir saúde a nível individual e coletivo, torna-se
imprescindível a existência de saneamento básico, o acesso a alimentação saudável,
as políticas de imunização, o acesso a lazer e atividade física, a educação em saúde,
dentre outros (FISHER; ERNST, 2015).
O governo brasileiro e o Ministério da Saúde não têm uma definição autoral de
saúde ou de saúde mental, mas a Constituição Federal de 1988 assegura a
universalidade da assistência em saúde em seu art. 196, quando declara que: “A
saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação" (BRASIL, 1988).
Esse direito representa uma ruptura com os modelos de saúde adotados até
então, no qual o acesso aos serviços de saúde eram exclusividades dos trabalhadores
com carteira de trabalho assinada e seus dependentes. Também assegura que não
deverá ocorrer qualquer forma de exclusão por classe social, etnia, idade, credo,
orientação sexual, naturalidade ou quaisquer outros motivos. Uma crítica ao art. 196

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argumenta que ele coloca o cidadão em uma posição passiva e infantilizada, como se
a saúde fosse um bem concreto que pudesse ser dado a alguém sem exigir nenhuma
ação por parte do indivíduo.
O Estado pode fornecer assistência, promoção e educação em saúde, pode
promover acesso à alimentação balanceada e barata, fomentar a prática de atividades
físicas, garantir saneamento básico, realizar imunização e prevenção de agravos, etc.
Porém, o indivíduo precisar ser corresponsabilizado pela própria saúde, pois somente
ele tem o poder de praticar os diversos hábitos de vida recomendados para garantir a
própria saúde física e mental (TAVARES; CASABURI; SCHER, 2019).
Considera-se por tudo isso que o conceito de saúde e de saúde mental é
dinâmico e reflete o momento histórico de sua construção. Atualmente, vivemos em
uma era que almeja a percepção holística e integrativa da saúde, incorporando
diversas visões sobre a saúde e concretizado no conceito de saúde proposto pela
Organização Mundial da Saúde (OMS). Não se trata de uma “superação” ou
“evolução” dos modelos anteriores, mas, sim, da valorização e integração deles.
Existem críticas a este conceito proposto pela OMS. Uma delas seria de que o
conceito é idealizado e utópico, já que o completo bem-estar físico, mental e social é
inatingível a qualquer ser humano. Ninguém pode ser considerado saudável se o
conceito de saúde for interpretado de forma concreta e literal. Alternativamente, pode-
se interpretar que cada indivíduo está em um processo de saúde/doença contínuo e
mutável. Diante dessa compreensão, entende-se que qualquer modelo de doenças e
transtornos mentais serão, inevitavelmente, limitados e incompletos.
A classificação das doenças mentais foi realizada por um conselho de
especialistas da associação américa de psiquiatria e publicado no Manual Diagnóstico
e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), que deriva do inglês Diagnostic and
Statistical Manual of Mental Disorders). Atualmente se encontra em sua quinta edição
(DSM-5), lançada em 2013 (TAVARES; CASABURI; SCHER, 2019).

2.1 Conceito de Transtorno mental no DSM-5

Os profissionais da saúde mental baseiam-se no Manual de Diagnóstico e


Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) para identificar as doenças e os transtornos,
mas também para permitir que seus pacientes recebam tratamento em hospitais e o
reembolso dos planos de saúde. Conforme declara-se no DSM-5:

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O Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM), da
American Psychiatric Association, é uma classificação de transtornos mentais
e critérios associados elaborada para facilitar o estabelecimento de
diagnósticos mais confiáveis desses transtornos. Com sucessivas edições ao
longo dos últimos 60 anos, tornou-se uma referência para a prática clínica na
área da saúde mental. Devido à impossibilidade de uma descrição completa
dos processos patológicos subjacentes à maioria dos transtornos mentais, é
importante enfatizar que os critérios diagnósticos atuais constituem a melhor
descrição disponível de como os transtornos mentais se expressam e podem
ser reconhecidos por clínicos treinados. O DSM se propõe a servir como um
guia prático, funcional e flexível para organizar informações que podem
auxiliar o diagnóstico preciso e o tratamento de transtornos mentais. Trata-se
de uma ferramenta para clínicos, um recurso essencial para a formação de
estudantes e profissionais e uma referência para pesquisadores da área
(APA, 2014, p. 41, grifos dos autores).

Assim, de acordo com o DSM-5 (2014), existem cinco critérios para


diagnosticar um transtorno mental. Os critérios usam o termo “clinicamente
significativo” para estabelecer que os comportamentos não são sintomas passageiros
ou dificuldades menores. O manual é dividido em 22 capítulos, organizados de modo
que os transtornos relacionados apareçam mais próximos uns dos outros. Doenças
psicológicas e biológicas com frequência têm relação entre si. (WHITBOURNE;
HALGIN, 2015).
A OMS desenvolveu a Classificação internacional de doenças (CID) como um
instrumento epidemiológico. Com um sistema diagnóstico comum, as 110 nações-
membro podem comparar as taxas de doença e assegurar-se de que empregam a
mesma terminologia por uma questão de consistência. A CID encontra-se em sua 11ª
versão e está disponível nos seis idiomas oficiais da OMS (árabe, chinês, inglês,
francês, russo e espanhol), bem como em outros 36 idiomas. A seguir apresentamos
as categorias de transtornos presentes no DSM-5. (Quadro 1).

Tabela 1 –Transtornos no DSM-5


CATEGORIA DESCRIÇÃO EXEMPLOS
 Transtorno do
Transtorno que em geral se
espectro do autismo
desenvolvem durante os
 Transtorno específico
TRANSTORNO DO primeiros anos de vida,
da aprendizagem
NEURODESENVOLVIMENTO principalmente envolvendo
 Transtorno de déficit
desenvolvimento e
de
amadurecimento anormais.
atenção/hiperatividade.
Transtornos envolvendo
ESPECTRO DA  Esquizofrenia
sintomas de distorção na
ESQUIZOFRENIA E OUTROS  Transtorno psicótico
percepção da realidade e
TRANSTORNO PSICÓTICOS breve
prejuízo no pensamento, no

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comportamento, no afeto e na
motivação.

TRANSTORNO BIPOLAR E Transtornos envolvendo  Transtorno bipolar


TRANSTORNOS humor elevado.  Transtorno ciclotímico
RELACIONADOS
 Transtorno depressivo
TRANSTORNOS Transtornos envolvendo maior
DEPRESSIVOS humor triste.  Transtorno depressivo
persistente
 Transtorno do pânico
Transtorno envolvendo
 Agorafobia
TRANSTORNO DE experiência de intensa
 Fobia específica
ANSIEDADE ansiedade, preocupação,
 Transtorno de
medo ou apreensão.
ansiedade social.
 Transtorno obsessivo-
TRANSTORNO OBSESSIVO- compulsivo
COMPULSIVO E Transtornos envolvendo  Transtorno dismórfico
TRANSTORNO obsessões e compulsões. corporal
RELACIONADOS  Transtorno de
acumulação
 Transtornos de
estresse pós-traumático
TRANSTORNOS
Respostas a eventos  Transtorno de
RELACIONADOS A TRAUMA E
traumáticos. estresse agudo
ESTRESSORES
 Transtorno de
adaptação
Transtornos nos quais a
 Transtorno
integração normal de
TRANSTORNOS dissociativo de
consciência, memória,
DISSOCIATIVOS identidade
sentido de self ou percepção
 Amnésia dissociativa.
é perturbada.
Transtornos envolvendo
TRANSTORNOS DE queixas recorrentes de  Transtorno de
SINTOMAS SOMÁTICOS E sintomas físicos que podem ansiedade de doença
RELACIONADOS ou não estar associados com  Transtorno conversivo
a condição médica.
 Anorexia nervosa
Transtornos caracterizados
TRANSTORNOS  Bulimia nervosa
por perturbações graves no
ALIMENTARES  Transtorno de
comportamento alimentar.
compulsão alimentar
Transtorno envolvendo
TRANSTORNO DE  Enurese (bexiga)
distúrbios da bexiga e dos
ELIMINAÇÃO  Encorprese (intestino).
intestinos.
Transtorno envolvendo
TRANSTORNO DO SONO-  Transtorno de insônia
distúrbios nos padrões do
VIGÍLIA  Narcolepsia.
sono.
 Transtorno erétil
Transtornos envolvendo
 Transtorno de
perturbações na expressão
DISFUNÇÕES SEXUAIS orgasmo feminino
ou experiência de
 Ejaculação prematura
sexualidade.
(precoce).
Discrepância
DISFORIA DE GÊNERO  Disforia de gênero
(incompatibilidade) entre

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sexo biológico e identidade
de gênero.
TRANSTORNOS Transtornos caracterizados  Cleptomania
DISRUPTIVOS, DO por expressão repetida de  Transtorno explosivo
CONTROLE DE IMPULSOS E comportamentos impulsivos intermitente
DA CONDUTA ou disruptivos.  Transtorno da conduta
 Transtornos
TRANSTORNOS
decorrentes do uso de
RELACIONADOS A Transtornos relacionados ao
substâncias
SUBSTÂNCIAS E uso de substâncias.
 Transtorno induzidos
TRANSTORNOS ADITIVOS
por substâncias
Transtornos envolvendo
 Transtorno
prejuízos nos processos de
TRANSTORNOS neurocognitivo leve
pensamento causados por
NEUROCOGNITIVOS  Transtorno
substâncias ou condições
neurocognitivo maior
médicas.
 Transtorno da
personalidade
borderline
Transtorno relacionados à
TRANSTORNO DA  Transtorno da
personalidade de um
PERSONALIDADE personalidade
indivíduo.
antissocial
 Transtorno da
personalidade narcisista
 Transtorno pedofílico
Transtorno no qual uma
TRANSTORNOS  Transtorno fetichista
parafilia causa sofrimento e
PARAFÍLICOS  Transtorno
prejuízo.
transvéstico
Condições ou problemas  Outro transtorno
OUTROS TRANSTORNOS para os quais uma pessoa mental especificado
MENTAIS pode buscar ajuda devido a outra condição
profissional. médica
TRANSTORNO DO
 Discinesia tardia
MOVIMENTO INDUZIDOS POR Distúrbios que podem estar
 Tremor postural
MEDICAMENTOS E OUTROS relacionados ao uso de
induzido por
EFEITOS ADVERSOS DE medicamentos.
medicamento
MEDICAMENTOS

 Problema
OUTRAS CONDIÇÕES QUE Condições ou problemas
relacionados a abuso
PODEM SER FOCO DE para os quais uma pessoa
ou negligência
ATENÇÃO CLÍNICA pode buscar ajuda médica.
 Problema ocupacional

Fonte: DSM-5 (APA, 2014).

O diagnóstico categorial permite uniformizar o diagnóstico psiquiátrico ao redor


do mundo, possibilitando a troca de informações confiáveis por pesquisadores e
profissionais de saúde. Os autores do DSM-5 afirmam que:

Os critérios são concisos e claros, e sua intenção é facilitar uma avaliação


objetiva das apresentações de sintomas em diversos contextos clínicos –
internação, ambulatório, hospital-dia, consultoria (interconsulta), clínica,
consultório particular e atenção primária –, bem como em estudos
epidemiológicos de base comunitária sobre transtornos mentais. O DSM-5

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também é um instrumento para a coleta e a comunicação precisa de
estatísticas de saúde pública sobre as taxas de morbidade e mortalidade dos
transtornos mentais. Por fim, os critérios e o texto correspondente servem
como livro-texto para estudantes que precisam de uma forma estruturada
para compreender e diagnosticar transtornos mentais, bem como para
profissionais experientes que encontram transtornos raros pela primeira vez.
Felizmente, todos esses usos são compatíveis entre si (APA, 2014, p. 41).

Sem uma padronização diagnóstica não seria possível comparar os achados


de um estudo com outro (já que cada um utilizou critérios distintos para classificar os
enfermos). Também permite a realização de pesquisas clínicas sobre a efetividade do
tratamento (medicamentoso ou não medicamentoso), levantamento de dados
estatísticos e epidemiológicos e investigação de mecanismos fisiopatogênicos. Sem
embasamento científico, a psiquiatria não seria diferente do curandeirismo
(TAVARES; CASABURI; SCHER, 2019).
Nos próximos tópicos caracterizaremos alguns dos transtornos que podem
estar associados com o Transtorno do Espectro do Autismo.

3 ESPECTRO DA ESQUIZOFRENIA E PSICOSE

Fonte: https://br.freepik.com/

Foi o médico francês Benedict Morel (1809–1873) quem identificou pela


primeira vez a esquizofrenia como uma doença que denominou demência cerebral do
jovem. Posteriormente, o psiquiatra alemão Emil Kraepelin (1856–1926) a renomeou
como demência precoce, incluindo nessa definição um grupo de nove formas clínicas
diferentes que compartilham um curso semelhante, no qual os indivíduos afetados,
em última análise, vivenciaram declínio comportamental e cognitivo grave. Kraepelin
acreditava que os sintomas levavam ao enfraquecimento dos processos mentais
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

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Por sua vez, o psicólogo suíço Eugen Bleuler (1857–1939) propôs uma
mudança drástica tanto no nome como no entendimento do transtorno. De acordo com
Bleuler, o transtorno não era um, mas um conjunto de doenças ao qual chamou de
esquizofrenias. O termo esquizofrenia não é uma cisão de personalidades (como no
transtorno dissociativo de identidade), mas uma cisão (schiz) das funções da mente.
Ao contrário de Kraepelin, Bleuler achava que era possível pessoas com esquizofrenia
se recuperarem do transtorno. Os profissionais ainda se referem aos aspectos
fundamentais do transtorno que Bleurer identificou como os “Quatro As”:

 Transtorno do pensamento, como poderia ser evidente pela fala


desconexa e incoerente (Associação).
 Transtorno da experiência e da expressão de emoção (Afeto)
 Incapacidade de tomar ou levar adiante decisões (Ambivalência)
 Afastamento da realidade (Autismo)

Nas décadas seguintes ao trabalho de Bleuler, os clínicos na Europa e nos


Estados Unidos propuseram outras diferenciações no agrupamento de esquizofrenia.
Um colaborador notável ao debate foi o psiquiatra alemão Kurt Schneider (1887–
1967), o qual acreditava que os médicos devem apenas diagnosticar esquizofrenia
quando um indivíduo tem certos sintomas de primeira ordem. Estudos apontam
predisposição genética para esquizofrenia, uma vez que as pesquisas mostraram que
parentes de pessoas com esquizofrenia desenvolviam não apenas essa condição,
mas também transtornos semelhantes à esquizofrenia. Por isso, os pesquisadores
começaram a falar do “espectro da esquizofrenia”, levando a novas categorias
diagnósticas que incluíam, por exemplo, transtornos da personalidade e transtornos
afetivos (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
A Seção III do DSM-5 inclui um conjunto de classificações de gravidade do
sintoma, as quais podem fundamentar o processo de diagnóstico, bem como permitir
aos terapeutas acompanharem as mudanças nos sintomas do cliente ao longo do
tempo e durante o curso do tratamento. Junto com a mudança nas conceituações de
esquizofrenia, pesquisadores e clínicos começaram a diferenciar entre os chamados
sintomas “positivos”, como delírios e alucinações, e os sintomas “negativos”, que
incluíam afastamento social, perda da vontade, embotamento afetivo, e fala vazia ou

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sem sentido. Os pesquisadores propuseram que os sintomas positivos refletissem
níveis de dopamina ativados no sistema nervoso, e os sintomas negativos,
anormalidades na estrutura do cérebro. Cada vez mais, os estudiosos estão
começando a reconhecer que o prejuízo cognitivo desempenha um papel importante
nesse transtorno. Em vez de se focalizarem apenas nos sintomas positivos, eles estão
redefinindo os déficits cognitivos como aspectos centrais do transtorno
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
As disparidades no risco de mortalidade entre pessoas com e sem
esquizofrenia são significativas, em parte porque os medicamentos usados para tratar
esses sujeitos podem contribuir para ganho de peso, que, por sua vez, aumenta o
risco de doenças potencialmente fatais. A prevalência sexual identificada é
maioritariamente masculina. Para cada três homens que desenvolvem esquizofrenia
ao longo de suas vidas, duas mulheres são afetadas pelo transtorno. Embora o
diagnóstico de esquizofrenia seja bastante baixo quando comparado com outros
transtornos psicológicos, uma porcentagem surpreendentemente alta de adultos
relata experimentar sintomas psicóticos menores (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
O espectro da esquizofrenia inclui um conjunto de transtornos nos quais os
indivíduos vivenciam uma percepção distorcida da realidade e um prejuízo no
pensamento, no comportamento, no afeto e na motivação. A esquizofrenia é um
transtorno mental sério, dado seu impacto potencialmente grande sobre a capacidade
de o indivíduo levar uma vida produtiva e realizada. Embora um número significativo
de pessoas com esse transtorno algumas vezes consiga viver sem sintomas, muitas
precisam encontrar formas de adaptar suas vidas à realidade do transtorno
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

3.1 Critérios diagnósticos de esquizofrenia

Para ser diagnosticado com esquizofrenia, um indivíduo deve satisfazer todos


os critérios listados na Tabela 2.

Tabela 2 – Critérios diagnósticos de esquizofrenia.


CRITÉRIO SINTOMAS
Dois (ou mais) dos itens a seguir, cada um presente por uma
A
quantidade significativa de tempo durante um período de um

13
mês (ou menos, se tratados com sucesso). Pelo menos um
deles deve ser (1), (2) ou (3):
1. Delírios.
2. Alucinações.
3. Discurso desorganizado.
4. Comportamento grosseiramente desorganizado ou
catatônico.
5. Sintomas negativos (i.e., expressão emocional diminuída
ou avolia)
Por período significativo de tempo desde o aparecimento da
perturbação, o nível de funcionamento em uma ou mais áreas
importantes do funcionamento, como trabalho, relações
B interpessoais ou autocuidado, está acentuadamente abaixo do
nível alcançado antes do início (ou, quando o início se dá na
infância ou na adolescência, incapacidade de atingir o nível
esperado de funcionamento interpessoal, acadêmico ou
profissional).
Sinais contínuos de perturbação persistem durante, pelo
menos, seis meses. Esse período de seis meses deve incluir
no mínimo um mês de sintomas (ou menos, se tratados com
sucesso) que precisam satisfazer ao Critério A (i.e., sintomas
da fase ativa) e pode incluir períodos de sintomas prodrômicos
C
ou residuais. Durante esses períodos prodrômicos ou
residuais, os sinais da perturbação podem ser manifestados
apenas por sintomas negativos ou por dois ou mais sintomas
listados no Critério A presentes em uma forma atenuada (p.
ex., crenças esquisitas, experiências perceptivas incomuns).
Transtorno esquizoafetivo e transtorno depressivo ou
transtorno bipolar com características psicóticas são
descartados porque 1) não ocorreram episódios depressivos
D maiores ou maníacos concomitantemente com os sintomas da
fase ativa, ou 2) se episódios de humor ocorreram durante os
sintomas da fase ativa, sua duração total foi breve em relação
aos períodos ativo e residual da doença.
A perturbação pode ser atribuída aos efeitos fisiológicos de
E uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento) ou a
outra condição médica.
Se há história de transtorno do espectro autista ou de um
transtorno da comunicação iniciado na infância, o diagnóstico
adicional de esquizofrenia é realizado somente se delírios ou
F
alucinações proeminentes, além dos demais sintomas exigidos
de esquizofrenia, estão também presentes por pelo menos um
mês (ou menos, se tratados com sucesso).
Fonte: APA (2014, p. 99).

Whitbourne e Halgin (2015) explicam que os critérios A apresentam os


sintomas que se referem à fase ativa do transtorno, ou seja, o período durante o qual
os sintomas do indivíduo são mais proeminentes. Esses sintomas enquadram-se em
duas categorias: positivos e negativos. Os sintomas positivos são exageros ou
distorções de pensamentos, emoções e comportamentos normais. Os sintomas
numerados de 1 a 4 respondem aos sintomas positivos. Os sintomas negativos
envolvem o funcionamento abaixo do nível de comportamento normal como: o afeto

14
restrito, avolição e associabilidade. O afeto restrito faz referência a uma limitação da
gama de expressões externas de emoções. A avolição é uma falta de iniciativa, não
querer agir ou faltar a energia e vontade para agir. A associalidade diz respeito a uma
falta de interesse nos relacionamentos sociais, incluindo uma ausência de empatia ou
incapacidade de formar relacionamentos íntimos com os outros
Nos Critérios B descrevem-se os sintomas que implicam prejuízo significativo.
Este critério indica o período de distúrbio, assegurando que as pessoas recebam esse
diagnóstico apenas se demonstrarem uma duração substancial dos sintomas. Os
critérios D e E referem-se a outros transtornos que não devem estar presentes em
pessoas diagnosticadas com esquizofrenia. Os critérios F referem-se aos sintomas de
esquizofrenia associados aos transtornos do espectro autista.

3.2 Transtornos psicóticos

O DSM (APA, 2014) apresenta o transtorno psicótico explicando-nos que ele


configura-se pela cronicidade, ou seja, o paciente convive com o transtorno durante
sua vida sem ter uma cura efetiva. São casos graves, pois, são acometidos por delírios
e/ou alucinações, apresenta-se uma fala consideravelmente desorganizada,
comportamentos desajustados e sintomas negativos. Por tanto, quem sofre com este
transtorno necessitam de uma atenção contínua dos serviços de saúde,
principalmente do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). Além disso, para o melhor
resultado dos tratamentos propostos para esses pacientes, faz-se necessário o apoio
e o monitoramento familiar. O funcionamento de um paciente com esquizofrenia é
social e profissionalmente prejudicado. Para o diagnóstico, o paciente deve apresentar
dois ou mais sintomas, desde que pelo menos um deles seja delírios, alucinações e/ou
discurso desorganizado. Além destes sintomas, o paciente pode apresentar
comportamento grosseiramente desorganizado ou catatônico e sintomas negativos.
Estes sintomas devem estar presentes por pelo menos um mês (APA, 2014).

3.3 Transtorno psicótico breve

Como o termo sugere, o transtorno psicótico breve cujos sintomas de psicose


não persistem. Para receber esse diagnóstico, o sujeito deve apresentar 1 de 4

15
sintomas, que incluem delírios, alucinações, fala desorganizada e comportamento
grosseiramente desorganizado ou catatônico. O diagnóstico requer que os sintomas
sejam vivenciados por mais de um dia, mas ocorra recuperação em menos de um
mês. Ao atribuir esse diagnóstico, o profissional deve levar em consideração a
herança cultural do cliente. O profissional também deve registrar se o cliente vivenciou
um estressor recente, tal como um desastre natural, a perda de um parente próximo
ou um acidente de automóvel. Os clínicos também registram se uma mulher
desenvolve esse transtorno no período de quatro semanas após o parto
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

3.4 Transtorno esquizofreniforme

As pessoas recebem um diagnóstico de transtorno esquizofreniforme se


apresentarem sintomas de esquizofrenia por um período de 1 a 6 meses. Se tiveram
seus sintomas por mais de meio ano, o clínico conduziria uma avaliação para
determinar se devem receber um diagnóstico de esquizofrenia. As pessoas têm boas
chances de recuperação e de não desenvolver esquizofrenia quando apresentam um
desenvolvimento rápido de sintomas (em um período de 4 semanas), confusão ou
perplexidade no auge do episódio e bom funcionamento social e pessoal antes do
episódio. Também há tendência a um bom prognóstico se elas não demonstrarem os
sintomas negativos de apatia, afastamento e associabilidade (WHITBOURNE;
HALGIN, 2015).

3.5 Transtorno esquizoafetivo

No transtorno esquizoafetivo, as pessoas com transtorno depressivo ou bipolar


também têm delírios e/ou alucinações. O diagnóstico torna-se difícil, pois, as pessoas
não podem apresentar sintomas de transtorno do humor durante duas semanas, mas
estarem acometidas por sintomas psicóticos. Entretanto, na maior parte da duração
da crise, devem ter um episódio de humor maior (depressivo ou maníaco), bem como
sintomas de esquizofrenia (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

16
3.6 Transtornos delirantes

Pessoas acometidas por este transtorno têm como único sintoma delírios, que
duram por pelo menos um mês. Elas recebem esse diagnóstico se não apresentarem
qualquer outro sintoma de esquizofrenia. Entende-se, portanto, como delírio a falsa
crença falsa arraigada profundamente e não compatível com a inteligência ou a
herança cultural do cliente. Por exemplo, um delírio de perseguição é a falsa crença
de que alguém ou alguma coisa quer prejudicá-lo. A tabela 3 apresenta alguns temas
de delírios para melhor compreensão.

Tabela 3 – Exemplos de delírios


TEMAS CARACTERÍSTICAS
Uma concepção muito exagerada da própria importância do indivíduo.
Esses delírios variam desde acreditar que se tem um papel importante na
GRANDEZA
sociedade até a crença de que se é, na verdade, Cristo, Napoleão ou
Hitler.
O sentimento de que a pessoa está sendo controlada por outros, ou
CONTROLE mesmo por máquinas ou aparelhos. Por exemplo, um homem pode
acreditar que suas ações estão sendo controladas pelo rádio, que o está
"forçando" a realizar certas ações contra sua vontade.
A crença da pessoa de que o comportamento dos outros ou certos objetos
ou eventos estão se referindo pessoalmente a ela. Por exemplo, uma
REFERÊNCIA mulher acredita que uma novela está na verdade contando a história de
sua vida, ou um homem acredita que os artigos vendidos em um
supermercado local se destinam em particular a suas próprias
deficiências dietéticas.
A crença de que outra pessoa ou pessoas estão tentando prejudicar o
PERSEGUIÇÃO indivíduo, sua família ou seu grupo social. Por exemplo, uma mulher
sente que um grupo organizado de sujeitos politicamente liberais está
tentando destruir a organização política de direita à qual ela pertence.
Sentimentos de remorso sem justificativa. Um homem considera-se
AUTOCULPA responsável pela fome na África devido a certas ações cruéis ou
pecaminosas que acredita ter cometido.
Preocupações inadequadas sobre o próprio corpo, normalmente
relacionadas a doença. Por exemplo, sem qualquer justificativa, uma
SOMÁTICO
mulher acredita que tem câncer de encéfalo. Para aumentar ainda mais
o tom bizarro, ela acredita que formigas invadiram sua cabeça e estão
devorando seu cérebro.
Uma crença falsa, geralmente associada com ciúme patológico,
envolvendo a noção de que o(a) amante da pessoas estar sendo infiel.
INFIDELIDADE
Um homem agride sua esposa com palavras ríspidas, insistindo que ela
está tendo um caso com o carteiro devido a sua ansiedade pela chegada
da correspondência todos os dias.
A ideia de que os pensamentos do indivíduo estão sendo retransmitidos
IRRADIAÇÃO DE
para os outros. Um homem acredita que todas as pessoas na sala podem
PENSAMENTO
ouvir o que ele está pensando ou que seus pensamentos, na verdade,
estão sendo transmitidos por ondas de televisão ou rádio.

17
A crença de que forças externas estão inserindo pensamentos na mente
INSERÇÃO DE da pessoa. Por exemplo, uma mulher conclui que seus pensamentos não
PENSAMENTO são dela, mas que estão sendo colocados lá para controlá-la e perturbá-
la.
Fonte: APA (2014, p. 87).

A paranoia, o medo ou a percepção irracional das pessoas de que os outros


desejam lhes fazer mal, pode estar associada com delírios ou alucinações auditivas
relacionadas a um tema de que alguém as está perseguindo ou assediando.
Entretanto, não têm sintomas de fala desorganizada ou comportamento perturbado.
Os diagnósticos são feitos baseados nos temas delirantes que se apresentam
de forma proeminente no paciente e conforme os tipos descritos na Tabela 4,
conforme o DSM-5 (APA, 2014, p. 90).

Tabela 4 – Tipos de delírios


TIPO CARACTERÍSTICA
Esse subtipo aplica-se quando o tema central do delírio é o de que
EROTOMANÍACO outra pessoa está apaixonada pelo indivíduo.

Esse subtipo aplica-se quando o tema central do delírio é a


convicção de ter algum grande talento (embora não reconhecido),
GRANDIOSO insight ou ter feito uma descoberta importante.

Esse subtipo aplica-se quando o tema central do delírio do indivíduo


CIUMENTO é o de que o cônjuge ou parceiro é infiel.

Esse subtipo aplica-se quando o tema central do delírio envolve a


crença de que o próprio indivíduo está sendo vítima de conspiração,
enganado, espionado, perseguido, envenenado ou drogado,
PERSECUTÓRIO difamado maliciosamente, assediado ou obstruído na busca de
objetivos de longo praz.

Esse subtipo aplica-se quando o tema central do delírio envolve


SOMÁTICO funções ou sensações corporais.
Esse subtipo aplica-se quando não há um tema delirante
MISTO predominante.
Esse subtipo aplica-se quando a crença delirante dominante não
pode ser determinada com clareza ou não está descrita nos tipos
NÃO específicos (p. ex., delírios referenciais sem um componente
ESPECIFICADO persecutório ou grandioso proeminente).

Fonte: APA (2014).

18
Whitbourne; Halgin (2015) apresentam um exemplo das pessoas
diagnosticadas com o tipo erotomaníaco. Assim, eles explicam que o alvo desse tipo
de delírio costuma ser alguém com posição superior. Por exemplo, uma mulher pode
estar certa de que um cantor famoso está apaixonado por ela e que ele lhe envia
mensagens de amor secretas em suas canções.
As pessoas que apresentam sintomas do tipo grandioso consideram que elas
são extremamente importantes. Por exemplo, um homem pode acreditar que é o
Messias aguardando um sinal do céu para iniciar sua pregação ativa. Já no tipo
ciumento de transtorno delirante, os indivíduos estão certos de que seu parceiro
romântico lhes seja infiel. Eles podem até armar um plano para apanhar seus
companheiros em uma armadilha que prove a infidelidade deles. As pessoas com o
tipo persecutório de transtorno delirante acreditam que alguém as está tratando de
maneira malévola. Elas podem, por exemplo, ficar convencidas de que seus vizinhos
estão deliberadamente envenenando sua água. Aquelas com o tipo somático de
transtorno delirante acreditam que tenham uma condição médica. Ao contrário das
pessoas com um transtorno de ansiedade, as crenças afetadas por um transtorno
delirante não são baseadas em ansiedade (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

4 TRANSTORNO BIPOLAR E DEPRESSIVOS

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O transtorno bipolar é uma combinação de transtornos de humor quanto de


transtornos psicóticos. Nessas alterações, o paciente passa por momentos de

19
profunda depressão e estados de extrema mania (transtorno bipolar tipo I) ou
depressão e hipomania bipolar II. A elevação do humor no transtorno bipolar tipo II é
mais branda quando comparada ao transtorno bipolar tipo I (GONÇALVES, 2021).
De acordo com o DSM-5 (APA, 2014, p. 123):

O transtorno bipolar e transtornos relacionados são separados dos


transtornos depressivos no DSM-5 e colocados entre os capítulos sobre
transtornos do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos e
transtornos depressivos em virtude do reconhecimento de seu lugar como
uma ponte entre as duas classes diagnósticas em termos de sintomatologia,
história familiar e genética. Os diagnósticos inclusos neste capítulo são
transtorno bipolar tipo I, transtorno bipolar tipo II, transtorno ciclotímico,
transtorno bipolar e transtorno relacionado induzido por
substância/medicamento, transtorno bipolar e transtorno relacionado devido
a outra condição médica, outro transtorno bipolar e transtorno relacionado
especificado e transtorno bipolar e outro transtorno relacionado não
especificado.

O diagnóstico de transtorno bipolar tipo I realizado com base no DSM-V (APA,


2014), indica que para diagnóstico da fase maníaca, o paciente precisa apresentar
três ou mais dos critérios relatados na Tabela 5, a seguir.

Tabela 5 – Diagnóstico para episódio maníaco


1. Autoestima inflada ou grandiosidade
2. Redução da necessidade de sono
3. Mais loquaz que o habitual ou pressão para
continuar falando.
4. Fuga de ideias ou experiência subjetiva de que os
pensamentos estão acelerados.
5. Distratibilidade.
6. Aumento da atividade dirigida a objetos.
7. Envolvimento excessivo em atividades com
elevado potencial para consequências dolorosas.
Fonte: Adaptado de APA (2014, p. 124).

O DSM-5 orienta que além dos critérios diagnósticos para a fase de mania, o
paciente precisa preencher critérios diagnósticos também para episódios de
depressão maior. Essa oscilação pode ter ciclo rápido, ou seja, o paciente oscila

20
rapidamente entre os episódios de mania e depressão ou os episódios podem ser
mais duradouros, demorando alguns meses para a oscilação (APA, 2014).

4.1 Transtornos depressivos

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De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2017), os


transtornos depressivos atingem cerca de 5,8% da população brasileira e cerca de
12% dos afastamentos por doenças no ambiente de trabalho estão relacionados a
casos incapacitantes de quadros depressivos. Assim como os transtornos de
ansiedade, este número pode estar subnotificado devido à resistência de algumas
pessoas em procurarem ajuda, ou mesmo a desinformação que afeta uma parte da
população. Ainda segundo a OMS (2017), cerca de 300 milhões de pessoas
apresentam diagnóstico de depressão no mundo, atualmente. Prevê-se que estes
números podem sofrer um aumento nos próximos anos, devido à pandemia de
COVID-19. Os estudos apontam que essa origem pode ter diversos fatores, tais como:

 Biológicos estão associados com a predisposição genética, ou


desregulação hormonal;
 Psicológicos estão relacionados com a autocrítica e os traços de
personalidade;
 Sociais referem-se aos relacionamentos e a aceitação social (FRIED;
NESSE, 2015).

21
Os transtornos depressivos têm como característica comum a presença de
humor deprimido, sentimentos de vazio e de irritação, além de sintomas somáticos e
cognitivos. O DSM-V (APA, 2014) traz sete diferentes formas de diagnóstico de
depressão. Neste tópico apresentaremos três transtornos depressivos, o transtorno
depressivo maior, o transtorno depressivo persistente e o transtorno disruptivo da
desregulação do humor.

4.1.1 O transtorno depressivo maior

O transtorno depressivo maior é a condição mais clássica e com maior número


de diagnósticos dentro dessa categoria. Sua configuração se realiza a partir de
episódios depressivos recorrentemente, ou seja, a pessoa precisa necessariamente
ter passado por mais de um episódio depressivo. Em caso de primeiro ou único
episódio, caracteriza-se o episódio depressivo maior. Para o diagnóstico de transtorno
depressivo maior, segundo o DSM-V, o paciente precisa apresentar, necessariamente
humor deprimido e/ou perda de prazer em atividades que antes dava prazer
(GONÇALVES, 2021). Além disso, precisa apresentar mais quatro outros sintomas
que estão relatados na Tabela 6, a seguir:

Tabela 6 – Critérios diagnósticos para transtorno depressivo maior


1. Perda ou ganho significativo de peso sem estar fazendo dieta.
2. Insônia ou hipersonia.
3. Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias.
4. Fadiga ou perda de energia quase todos os dias.
5. Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva ou
inapropriada.
6. Capacidade diminuída para pensar ou se concentrar, ou
indecisão, quase todos os dias.
7. Pensamentos recorrentes de morte, ideação suicida
recorrente.
Fonte: Adaptada de APA (2014, p. 214).

22
4.1.2 Transtorno depressivo persistente (distimia)

Os estudos realizados por Gonçalves (2021) nos explicam que outra forma de
depressão é a distimia. Caracteriza-se, principalmente, por um humor deprimido por
pelo menos dois anos além de dois outros critérios dentre os apresentados na Tabela
7. Além disso, conforme a APA (2014), nestes dois anos o paciente não pode
apresentar uma janela sem sintomas de mais de dois meses. Trata-se de uma forma
mais longa e crônica da depressão que pode atingir entre 3 e 6 % da população.
A perturbação do humor que ocorre com o transtorno depressivo maior pode
assumir uma forma crônica e contínua. Pessoas adultas com transtorno depressivo
persistente ou distimia têm, por pelo menos 2, um conjunto mais limitado dos sintomas
que ocorrem com o transtorno depressivo maior, incluindo distúrbios do sono e do
apetite, energia baixa ou fadiga, autoestima baixa, dificuldade com concentração e
tomada de decisão e sentimentos de desesperança. Apesar de não vivenciarem todos
os sintomas de um episódio depressivo maior, as pessoas com transtorno depressivo
persistente nunca estão livres de seus sintomas por mais de 2 meses. Além disso,
elas tendem a apresentar outros transtornos psicológicos sérios, incluindo um risco
aumentado para desenvolver transtorno depressivo maior, transtorno da
personalidade e transtorno por uso de substância (GONÇALVES, 2021).

Tabela 7 – Critérios diagnósticos para distimia


1. Apetite diminuído ou alimentação em
excesso.
2. Insônia ou hipersonia.
3. Baixa energia ou fadiga.
4. Baixa autoestima.
5. Concentração pobre ou dificuldade em
tomar decisões.
6. Sentimentos de desesperança.
Fonte: Adaptado de APA (2014, p. 168).

A intensidade dos sintomas é menor do que em outros quadros depressivos,


porém, a presença dos sintomas pode durar anos. Os pacientes com transtorno

23
distímico frequentemente são sarcásticos, niilistas, rabugentos, exigentes e
queixosos. Segundo o DSM-V, os critérios para diagnóstico de distimia são similares
ao diagnóstico de transtorno depressivo maior (GONÇALVES, 2021).

4.1.3 Transtorno disruptivo da desregulação do humor

De acordo com o DSM-5, o transtorno disruptivo da desregulação do humor é


comum entre:

as crianças que se apresentam nas clínicas pediátricas de saúde mental. As


estimativas da prevalência do transtorno na comunidade não são claras. Com
base nas taxas de irritabilidade persistente crônica e grave, que é a
característica principal do transtorno, a prevalência geral de seis meses a um
ano do transtorno disruptivo da desregulação do humor entre crianças e
adolescentes provavelmente está dentro da variação de 2 a 5%. No entanto,
são esperadas taxas mais elevadas em crianças do sexo masculino e em
idade escolar do que no sexo feminino e em adolescentes (APA, 2014, p.
157).

O diagnóstico de transtorno disruptivo da desregulação do humor é usado para


crianças que:

 Exibem irritabilidade crônica e grave e têm explosões de raiva


frequentes que ocorrem, em média, três ou mais vezes por semana
durante pelo menos um ano e em pelo menos duas situações.
 Esses acessos devem ser inadequados para o desenvolvimento. Entre
esses episódios, as crianças com esse transtorno são extremamente
irritáveis ou coléricas.
 Os critérios especificam que o diagnóstico não deve ser atribuído a
crianças cujo primeiro episódio ocorra em idade inferior a 6 anos ou
superior a 18 anos.
 O transtorno deve ter tido seu início antes dos 10 anos de idade.

Os autores do DSM-5 apontam que os dados de acompanhamento de crianças


que apresentam essas explosões de irritabilidade e raiva sugerem que, em vez de
desenvolver transtorno bipolar, elas correm o risco de desenvolver transtornos
depressivos e/ou de ansiedade quando chegam à idade adulta (APA, 2014).

24
5 TRANSTORNOS DE ANSIEDADE E DE PERSONALIDADE

Fonte: https://br.freepik.com/

No relatório elaborado pela Organização Mundial da Saúde (2017), o Brasil foi


considerado o país mais ansioso do mundo, com cerca e 9,3% de prevalência na
população. Apesar dessa identificação, o Brasil interpreta que esse número pode ser
ainda maior visto que ainda existe preconceito com questões relacionadas à saúde
mental, e muitas pessoas não buscam ajuda.
Os transtornos de ansiedade podem ser considerados medo e preocupação
excessivos frente a eventos futuros que podem sequer ocorrer (APA, 2014). A origem
desses transtornos, bem como a maioria deles, ainda é um tema a ser explorado, mas
a visão atual o considera de ordem biopsicossocial. O Manual de Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V, APA, 2014) distingue ao menos 17
classificações de transtornos de ansiedade. Destes 17, três serão apresentados a
seguir:

 Transtorno de ansiedade generalizada;


 Transtorno do pânico;
 Transtorno de ansiedade social.

5.1 Transtorno de ansiedade generalizada

Os estudos de Gonçalves (2021) explicam que o transtorno de ansiedade


generalizada é caracterizado, de acordo com o DSM-5, pela presença de ansiedade

25
e preocupações exageradas, sensação de incapacidade de controlar suas
preocupações, sendo estas relacionadas a diversos contextos e situações, juntamente
com sintomas fisiológicos e psicológicos.
Segundo o DSM-5, para diagnóstico de transtorno de ansiedade generalizada,
o paciente precisa apresentar os sintomas na maior parte dos dias nos últimos seis
meses. Além disso, o paciente precisa apresentar pelo menos três dos seis sintomas
relatados como característico desse transtorno. Os critérios diagnósticos estão
listados na Tabela 8.

Tabela 8 – Critérios diagnósticos para transtorno de ansiedade generalizada


1. Inquietação ou sensação de estar com os nervos à flor da pele.
2. Fatigabilidade
3. Dificuldade em concentra-se ou sensações de “branco” na mente.
4. Irritabilidade.
5. Tensão muscular.
6. Perturbação do sono (dificuldade em conciliar ou manter o sono, ou sono
insatisfatório.
Fonte: APA (2014, p. 222).

O transtorno de ansiedade generalizada pode vir associado a outros


transtornos psiquiátricos, tais como: o abuso de substâncias químicas e os transtornos
depressivos. Por isso, se faz necessária uma avaliação mais acurada, pois, ela
permite a identificação de outras psicopatologias e um prognóstico do paciente mais
objetivo (GONÇALVES, 2021).

5.2 Transtorno do pânico

O ataque de pânico é um surto repentino e inesperado de medo e preocupação


ou desconforto intenso que alcança um nível maior em poucos minutos (APA, 2014).
Os estudos indicam que em muitos casos, o evento desencadeador não é reconhecido
pelo paciente. Essa falta de reconhecimento faz com que o paciente apresente uma
preocupação excessiva que leva a pessoa a acreditar, por exemplo, que vá morrer
sem ao menos ter uma causa aparente. Em outros casos, o paciente sofre o ataque
de pânico diante de uma situação que precisa resolver. A preocupação com o evento

26
e o medo do fracasso é tanta, que o paciente tem um ataque de pânico (GONÇALVES,
2021).
O diagnóstico de transtorno do pânico, segundo o DSM-V, é feito quando o
paciente apresenta quatro ou mais sintomas característicos, sendo os critérios
diagnósticos apresentados na Tabela 9.

Tabela 9 – Critérios do diagnóstico do pânico


1.Palpitações, coração acelerado, taquicardia.
2.Sudorese.
3.Tremores ou abalos.
4.Sensações de falta de ar ou sufocamento.
5.Sensação de asfixia.
6.Dor ou desconforto torácico.
7.Náusea ou desconforto abdominal.
8.Sensação de tontura, instabilidade, vertigem ou desmaio.
9.Calafrios ou ondas de calor.
10. Parestesias (anestesia ou sensações de formigamento).
11. Desrealizações (sensações de irrealidade) ou despersonalização
(sensação de estar distanciado de si mesmo).
12. Medo de perder o controle ou “enlouquecer”.
13. Medo de morrer.
Fonte: APA (2014, p. 214).

5.3 Transtorno de ansiedade social

O transtorno de ansiedade social se caracteriza pela dificuldade de


relacionar-se com as pessoas em cenários de relacionamentos interpessoais. O
paciente apresenta medo e preocupação excessiva de ser julgado pelos outros (APA,
2014). Na Tabela 10 estão apresentados os critérios diagnósticos para transtorno de
ansiedade social.

Tabela 10 – Critérios para o transtorno de ansiedade social


1. Medo de ansiedade acentuados acerca de uma ou mais situações sociais
em que o indivíduo é exposto possível avaliação para outras pessoas.

2. O indivíduo teme agir de forma a demostrar sintomas de ansiedade que


serão avaliados negativamente.

27
3. As situações sociais geram quase sempre medo e ansiedade.

4. As situações sociais sãos suportadas com intenso medo ou ansiedade.


5. O medo ou ansiedade é desproporcional à ameaça.
6. O medo, ansiedade ou esquiva é persistente.
7. O medo, ansiedade ou esquiva causa sofrimento clinicamente significativo
ou prejuízo.
8. O medo, ansiedade ou esquiva não é consequência dos efeitos fisiológicos
de uma substância ou outra condição médica.
9. O medo, ansiedade ou esquiva não é mais bem explicados pelos sintomas
de outro transtorno mental.

10. Se outra condição médica está presente, o medo, ansiedade ou esquiva


é claramente não relacionado ou é excessivo.

Fonte: Adaptada de APA (2014, p. 202-203).

São por causa desses critérios que o paciente pode evitar eventos sociais,
comer e falar frente às outras pessoas por preocupação excessiva do julgamento de
terceiros (GONÇALVES, 2021).

5.4 Transtornos da personalidade

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Os transtornos da personalidade estão entre os transtornos mentais com maior


lacuna no diagnóstico. Estima-se que cerca de 10% da população apresente um

28
transtorno de personalidade. Este número é ainda maior em pessoas com algum outro
transtorno mental (ex.: depressão, ansiedade) chegando a quase 30% (SADOCK;
SADOCK; RUIZ, 2017).
No Brasil, o estudo de Santana et al. (2018) indicou que cerca de 7% da
população tem um diagnóstico de transtorno da personalidade. Considerando a
sessão II do DSM-V (APA, 2014), que tem como base para diagnóstico o modelo
categórico, existem dez Transtornos da Personalidade com características diferentes
e, consequentemente, dez possíveis diagnósticos, a saber:

1. Paranoide;
2. Esquizoide;
3. Esquizotípico;
4. Antissocial;
5. Borderline;
6. Histriônico;
7. Narcisista;
8. Evitativo;
9. Dependente;
10. Obsessivo compulsivo.

O modelo alternativo traz apenas seis destes transtornos: antissocial; evitativo;


borderline; narcisista; esquizotípica; obsessivo compulsivo. Os transtornos da
personalidade, de modo geral, são caracterizados por alterações crônicas da
percepção de si e das relações com os outros, comportamentos notadamente
desviantes dos padrões sociais e culturais que são difusos e pouco flexíveis,
acarretando prejuízos e sofrimento (APA, 2014).
O transtorno da personalidade Borderline é um dos mais estudados em todo
o mundo. Esse transtorno geralmente se manifesta no início da vida adulta, sendo
caracterizado por um severo e crônico padrão de funcionamento difuso de
instabilidade nas relações interpessoais, autoagressão e autoimagem negativa, além
de comportamentos impulsivos e arriscados para si e para os outros (GONÇALVES,
2021).

29
Segundo a APA (2014), para ser diagnosticado com transtorno da
personalidade borderline com base na sessão II do DSM-V, o paciente precisa
apresentar cinco dos noves critérios diagnósticos apresentados na Tabela 11.

Tabela 11 – Diagnóstico de transtorno da personalidade borderline

1. Esforços desesperados para evitar abandono real ou imaginado.


2. Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos
caracterizado pela alternância entre extremos de idealização e
desvalorização.
3. Perturbação da identidade: instabilidade acentuada e persistente da autoimagem
ou da percepção de si mesmo.
4. Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente
autodestrutivas.
5. Recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de
comportamento automutilante.
6. Instabilidade afetiva devida a uma acentuada reatividade de humor.
7. Sentimentos crônicos de vazio.
8. Raiva intensa e inapropriada ou dificuldade em controlá-la.
9. Ideação paranoide transitória associada a estresse ou sintomas
dissociativos intensos.
Fonte: Adaptado de APA (2014).

Pessoas com transtorno da personalidade borderline são geralmente sensíveis


às mudanças e apresentam alta excitação emocional, o que as deixam mais
vulneráveis às frustrações e, consequentemente, a comportamentos arriscados
(LEICHSENRING et al., 2011). Além disso, esse transtorno também é associado a
altas taxas de suicídio, abuso de álcool e outras drogas, compulsão alimentar,
compulsão por comprar e autolesões (APA, 2014).
O transtorno da personalidade dependente também é manifestado no início da
idade adulta, e se caracteriza como um padrão de comportamento submisso,
recorrente sentimento de inferioridade, além de busca para evitar a sensação de ser
abandonado pelo outro. Pessoas com transtorno da personalidade dependente são
potencialmente propensas a sofrer influências externas na tomada de decisão,

30
sentem-se inseguras e têm forte sentimento de incapacidade, acarretando
dificuldades na autonomia para planejamento e realização de atividades cotidianas
nos mais diversificados aspectos da vida (APA, 2014).
Para diagnóstico, com base no DSM-V, um paciente precisa apresentar pelo
menos cinco critérios dentre os oito listados como característicos desse transtorno.
Os critérios estão apresentados na Tabela 12, a seguir.

Tabela 12 – Critérios diagnósticos para transtorno da personalidade dependente


1. Dificuldades em tomar decisões cotidianas sem uma quantidade excessiva de
conselhos e respaldo do outro.

2. Precisa que outros assumam responsabilidade pela maior parte das principais
áreas de sua vida.

3. Dificuldades em manifestar desacordo com outros devido a medo de perder


apoio ou aprovação.

4. Dificuldade em iniciar projetos ou fazer coisas por conta própria.


5. Chega a atitudes extremas para obter carinho e apoio de outros, a ponto de
voluntariar-se para fazer coisas desagradáveis.
6. Sente desconfortável ou desamparado quando sozinho devido a temores
exagerados de ser incapaz de cuidar de si mesmo.
7. Busca com urgência outro relacionamento como fonte de cuidado e amparo
logo após o término de um relacionamento íntimo.
8. Experimenta preocupações irreais com medos de ser abandonado à própria
sorte.
Fonte: Adaptado de APA (2014).

Os estudos apresentados até aqui tiveram como objetivo apresentar a você um


conhecimento geral dos transtornos mentais que mais acometem pessoas no Brasil e
com os quais nos deparamos nos espaços educacionais, também. A seguir,
apresentamos a voce o grupo de transtorno do neurodesenvolvimento no qual o
Transtorno do Espectro do Autismo e outros que podem ou não estarem vinculados a
este.

31
6 TRANSTORNO DO NEURODESENVOLVIMENTO

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Os transtornos que iniciam cedo na infância e permanecem com o indivíduo


durante toda a vida são conhecidos como transtornos do neurodesenvolvimento. Eles
normalmente se tornam evidentes no início do desenvolvimento das crianças, com
frequência antes de elas alcançarem a idade escolar. Os déficits associados com
esses transtornos incluem prejuízos no funcionamento pessoal, social, acadêmico ou
ocupacional. Alguns transtornos têm especificadores para indicar, por exemplo, que
estão ligados a uma anormalidade genética ou a fatores ambientais que afetaram o
indivíduo durante o período pré-natal.
É importante não esquecer que, por definição, os transtornos do
neurodesenvolvimento podem apresentar mudanças importantes ao longo do tempo.
À medida que passam da infância para a adolescência e a idade adulta, os indivíduos
podem experimentar mudanças no amadurecimento que alteram a forma como seu
transtorno se manifesta em determinados comportamentos. Felizmente, com
intervenções adequa- das, os terapeutas podem ajudar as crianças a aprender a lidar
com seus sintomas ou a superá-los por completo (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

6.1 Transtorno do desenvolvimento intelectual

Os profissionais diagnosticam indivíduos com uma deficiência intelectual


quando apresentam déficits intelectuais e adaptativos que se tornam evidentes pela
primeira vez na infância. A CID usa o termo “transtorno do desenvolvimento

32
intelectual”, portanto o DSM-5 coloca essa expressão entre parênteses após
“deficiência intelectual”. O DSM-IV-TR usava o termo “retardo mental” para referir-se
a esse grupo de transtornos. Entretanto, de acordo com as recomendações da
American Association of Intelectual and Developmental Disabilities (Associação
Americana sobre Deficiências Intelectuais e do Desenvolvimento-AAIDD), entre outros
grupos, os autores do DSM-5 adotaram a terminologia de “deficiência intelectual”
(transtorno do desenvolvimento intelectual).
De acordo com o DSM-5 (2014), a Deficiência Intelectual é definida como:

A deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual)


caracteriza-se por déficits em capacidades mentais genéricas, como
raciocínio, solução de problemas, planejamento, pensamento abstrato, juízo,
aprendizagem acadêmica e aprendizagem pela experiência. Os déficits
resultam em prejuízos no funcionamento adaptativo, de modo que o indivíduo
não consegue atingir padrões de independência pessoal e responsabilidade
social em um ou mais aspectos da vida diária, incluindo comunicação,
participação social, funcionamento acadêmico ou profissional e
independência pessoal em casa ou na comunidade. O atraso global do
desenvolvimento, como o nome implica, é diagnosticado quando um indivíduo
não atinge os marcos do desenvolvimento esperados em várias áreas do
funcionamento intelectual. Esse diagnóstico é utilizado para indivíduos que
estão incapacitados de participar de avaliações sistemáticas do
funcionamento intelectual, incluindo crianças jovens demais para participar
de testes padronizados. A deficiência intelectual pode ser consequência de
uma lesão adquirida no período do desenvolvimento, decorrente, por
exemplo, de traumatismo craniano grave, situação na qual um transtorno
neurocognitivo também pode ser diagnosticado (APA, 2014, p. 31).

Para receber um diagnóstico de deficiência intelectual, o indivíduo deve


satisfazer condições que se enquadrem em três conjuntos de critérios. O primeiro
inclui déficits nas habilidades intelectuais gerais que um teste de inteligência poderia
medir, incluindo raciocínio, solução de problemas, julgamento, habilidade de aprender
com a experiência e aprendizagem em um contexto acadêmico. Para fazer essa
determinação, o clínico deve usar testes que sejam individualizados, padronizados e
psicometricamente sólidos. Além disso, os testes devem ser adequados à cultura. Isso
significa que indivíduos que não falem o inglês (o idioma local) como primeira língua,
por exemplo, e poderiam não ter boa pontuação em um teste de QI baseado na língua
inglesa (local), devendo, portanto, receber avaliação com um teste linguisticamente
adequado. Além da adequação linguística, o teste também deve considerar diferenças
culturais nas formas como as pessoas se comunicam, se movimentam, e se

33
comportam. Essas últimas considerações são congruentes com as da AAIDD. O ponto
de corte para satisfazer esse critério é uma medida de inteligência de
aproximadamente 70 ou abaixo (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
O segundo conjunto de critérios para um diagnóstico de deficiência intelectual
envolve prejuízos no funcionamento adaptativo, relativo à idade e ao grupo cultural de
uma pessoa, em uma variedade de atividades da vida diária, como comunicação,
participação social e vida independente. Algumas dessas dificuldades adaptativas, por
exemplo, incluem problemas para usar dinheiro, dizer as horas e se relacionar com
outras pessoas em situações sociais. Os terapeutas devem julgar se o comportamento
adaptativo de um indivíduo está ou não prejudicado por meio de testes que sejam
padronizados, individualizados, possuam solidez psicométrica e sejam culturalmente
adequados.
O terceiro critério diz respeito à idade de início. De maneira específica, o
transtorno deve começar antes da idade de 18 anos. Uma vez que o terapeuta
determine que o diagnóstico de deficiência intelectual é adequado, o próximo passo é
avaliar o grau de gravidade, que pode ser leve, moderado, grave e profundo. Os testes
são baseados em quão bem o indivíduo é capaz de se adaptar nas esferas conceitual,
social e prática. Ademais, o DSM-5 requer que os profissionais usem testes que
refletem sensibilidade cultural.
O DSM-5 baseia as esferas de comportamento adaptativo em áreas que
determinam melhor se um indivíduo está ou não prejudicado na vida diária, e elas são
delineadas de forma mais completa. Os pesquisadores acreditam que a combinação
de melhor especificidade nos critérios de comportamento adaptativo e inclusão de
testes culturalmente sensíveis resultarão em uma base mais precisa para o
diagnóstico e, em última análise, em melhor tratamento de indivíduos com transtornos
do desenvolvimento intelectual (APA, 2014).
O DSM-5 especifica quatro níveis de gravidade para deficiência intelectual em
cada uma de três esferas:

 Leve: Dificuldades na aprendizagem de habilidades acadêmicas,


funcionamento executivo limitado (em adultos) e memória prejudicada.
 Moderado: Atrasos significativos ao longo da infância em linguagem,
leitura e matemática. Os adultos permanecem no nível do ensino

34
fundamental e necessitam de assistência contínua para completar
tarefas da vida diária.
 Grave: Alcance limitado de habilidades conceituais, pouco
entendimento de linguagem, aritmética, tempo e dinheiro; necessita
apoio extensivo durante toda a vida.
 Profundo: Incapaz de pensar simbolicamente, entendimento limitado de
como usar objetos; prejuízos motores e sensoriais com frequência são
presentes neste nível, tornando impossível para o indivíduo o uso de
objetos de uma forma funcional (APA, 2014).

6.1.1 Esfera conceitual

Nesta esfera, as características de acordo com os níveis são:

 Leve: dificuldades em aprender habilidades acadêmicas que envolvam leitura,


escrita, matemática, tempo ou dinheiro, sendo necessário apoio em uma ou
mais áreas, para o alcance das expectativas associadas à idade. Nos adultos,
pensamento abstrato, função executiva e memória de curto prazo, bem como
uso funcional de habilidades acadêmicas, estão prejudicados.
 Moderado: lento progresso na leitura, na escrita, na matemática é na
compreensão do tempo e do dinheiro ao longo dos anos escolares, com
limitações marcadas na comparação com os colegas. Nos adultos, o
desenvolvimento de habilidades acadêmicas costuma mostrar-se em um nível
elementar, havendo necessidade de apoio para todo emprego de habilidades
acadêmicas no trabalho e na vida pessoal. Assistência contínua diária é
necessária para à realização de tarefas conceituais cotidianas.
 Grave: pouca compreensão da linguagem escrita ou de conceitos que
envolvam números, quantidade, tempo e dinheiro. Os cuidadores proporcionam
grande apoio para a solução de problemas ao longo da vida.
 Profundo: As habilidades conceituais costumam envolver mais o mundo físico
do que os processos simbólicos. A pessoa pode usar objetos de maneira
direcionada a metas para o autocuidado, o trabalho e a recreação. Algumas

35
habilidades visuoespaciais, como combinar e classificar, baseadas em
características físicas, podem ser adquiridas. À ocorrência concomitante de
prejuízos motores e sensoriais, porém, pode impedir o uso funcional dos
objetos (APA, 2014, p. 34-36).

6.1.2 Esfera Social

Nesta esfera, as características de acordo com os níveis são:

 Leve: Imaturo em interações sociais, dificuldades para regular as emoções e


para comportar-se de maneira adequada para a idade; ingenuidade.
 Moderado: Linguagem menos complexa do que a de seus pares, capaz de
vínculos sociais e emocionais com os outros, mas pode não ser capaz de ler
os sinais sociais das outras pessoas. Os cuidadores devem auxiliar na tomada
de decisão.
 Grave: Vocabulário e gramática limitados; fala e linguagem focadas no “aqui e
agora”; capaz de entender fala e gestos simples; entretanto, também é capaz
de relacionamentos interpessoais gratificantes.
 Profundo: Entendimento muito limitado de fala e gestos na comunicação
social; pode expressar desejos e emoções de formas não verbais; pode ter
relacionamentos gratificantes com os outros, contudo, se estiverem
familiarizados com o indivíduo. Prejuízos sensoriais e motores, entretanto,
podem impedir a participação em uma ampla variedade de atividades sociais
(APA, 2014, p. 34-36).

6.1.3 Esfera Prática

Nesta esfera, as características de acordo com os níveis são:

 Leve: Pode ser capaz de cuidar de si mesmo, mas necessita apoio com tarefas
complexas na vida diária, como fazer compras, transporte, cuidado de crianças
e manejo do dinheiro. Na idade adulta, pode ser empregado em funções que
não re- queiram habilidades conceituais.

36
 Moderado: Capaz de suprir uma variedade de necessidades pessoais, embora
considerável treinamento seja requerido a princípio. Pode ser empregado em
funções que requeiram habilidades conceituais limitadas; necessita apoio e
supervisão. Uma pequena minoria apresenta comportamento mal-adaptativo.
 Grave: Requer apoio e supervisão para atividades da vida diária; não pode
tomar decisões por si ou pelos outros; quando adulto, exige treinamento e apoio
de longo prazo para qualquer tipo de aquisição de habilidade. Muitas pessoas
neste nível podem apresentar comportamento mal-adaptativo, incluindo
autolesão.
 Profundo: Dependente de outras pessoas para todos os aspectos das
atividades diárias; pode ser capaz de ajudar em algumas tarefas em casa ou
no local de trabalho. Pode apreciar uma variedade de formas de
entretenimento, embora prejuízos físicos e sensoriais impeçam a participação
ativa. Uma minoria significativa apresenta comportamento mal-adaptativo
(APA, 2014, p. 34-36).

6.1.4 Tratamento de deficiência intelectual

As pessoas com deficiência intelectual podem se beneficiar da intervenção


precoce que visa fornecer treinamento em coordenação motora, uso da linguagem e
habilidades so- ciais. Os educadores podem combinar a inclusão, que as integra a
salas de aula comuns, com educação especial que lhes dá assistência voltada a suas
necessidades específicas.
Visto que têm compreensão limitada de situações sociais e de como realizar
suas atividades da vida diária, muitas pessoas com deficiência intelectual podem
requerer tratamento para essas dificuldades associadas. Portanto, o tratamento para
esses indivíduos frequentemente toma a forma de intervenções comportamentais ou
sociais que os treinam para lidar com as demandas da vida cotidiana. Isso inclui
cuidado coordena- do que integra tratamento comportamental, aproximação e
avaliação multidisciplinar, bem como tratamento de quaisquer condições relacionadas
que possam estar afetando o indivíduo, incluindo depressão, transtorno de ansiedade,
transtorno bipolar ou um transtorno do espectro autista (RICHINGS; COOK; ROY,
2011).

37
Quando possível, a prevenção é valiosa para reduzir o risco de Deficiências
intelectuais. No caso da SAF, educação e aconselhamento são de valor potencial.
Infelizmente, as evidências que demonstram que esses programas de fato reduzem o
consumo de álcool em mulheres grávidas ou, mais importante, produzem efeitos
benéficos nas crianças, são muito limitadas. Os clínicos podem usar testes genéticos
para detectar a presença ou o risco de síndrome de Down, PKU e síndrome do X frágil.
No caso específico da PKU, as crianças precisam aderir a dietas com restrição de
fenilalanina imediatamente após o teste mostrar que herdaram essa condição
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
As crianças nascidas com SAF podem se beneficiar de diversos fatores
protetores que reduzem o impacto do transtorno sobre sua adaptação e seu
desenvolvimento posteriores. O diagnóstico precoce pode ajudar os educadores a
colocá-las em classes adequadas, e elas podem receber os serviços sociais que
podem ajudá-las, assim como suas famílias. O envolvimento na educação especial
com foco específico nas necessidades e estilos de aprendizagem pode ser
particularmente benéfico. Quanto mais essas crianças puderem receber ajuda de uma
vida familiar amorosa e estável, maiores suas chances de evitar condições
secundárias como comportamento criminoso, desemprego e interrupções na
educação (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

6.2 Síndrome de Down

As anormalidades genéticas são uma causa significativa de deficiência


intelectual. As três causas genéticas mais importantes são síndrome de Down,
fenilcetonúria e síndrome do X frágil. A epigenética também parece desempenhar um
papel importante no aumento do risco de o indivíduo desenvolver uma deficiência
intelectual. Estilo de vida, dieta, condições de vida e idade podem afetar a expressão
de um gene por meio de mutações, deleções ou posições alteradas de genes nos
cromossomos (FRANKLIN; MANSUY, 2011).
A maioria das pessoas com síndrome de Down herdou uma cópia extra do
cromossomo 21 e, portanto, tem 47 cromossomos em vez dos 46 normais. Nesta
forma de síndrome de Down, denominada Trissomia 21, o cromossomo extra interfere
no desenvolvimento normal do corpo e do cérebro. Os sintomas da síndrome de Down
variam de leve a grave e podem variar de uma pessoa para outra. Essa síndrome é a

38
causa mais comum de defeitos de nascimento em seres humanos e quase sempre
está associada com deficiência intelectual, bem como com uma série de sinais físicos.
A face de um indivíduo com síndrome de Down é relativamente fácil de
reconhecer e inclui uma cabeça menor que o normal e de formato incomum. Alguns
dos aspectos característicos das pessoas com a síndrome incluem um nariz achatado,
orelhas pequenas, boca pequena, olhos inclinados para cima, excesso de pele na
nuca e pontos brancos na Íris do olho. Apresentando atrasos no desenvolvimento
físico, os indivíduos com síndrome de Down nunca alcançam a altura adulta total.
Também são propensos a sofrer de uma variedade de males físicos, incluindo defeitos
cardíacos, catarata dos olhos, problemas de audição, problemas de quadril, vômito
precoce e massivo, constipação crônica, apneia do sono, tireoide subativa e dentes
que aparecem mais tarde que o normal e em locais que podem levar a problemas de
mastigação (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
Além das pontuações de QI mais baixas, esses indivíduos são mais propensos
a apresentar comportamento impulsivo, julgamento pobre, intervalo de atenção curto
e tendência a frustração e irritação por suas limitações. Eles são muito mais inclinados
a desenvolver doença de Alzheimer, e isso acontece em uma idade muito mais
precoce do que seria esperado. Os altos níveis de estressores de vida que enfrentam
os tornam potencialmente vulneráveis a desenvolver transtornos depressivos
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

6.3 Fenilcetonúria (PKU)

Os bebês nascidos com fenilcetonúria (PKU) não possuem uma enzima


chamada fenilalanina-hidroxase, que decompõe a fenilalanina, um aminoácido
encontrado em alimentos que contêm proteínas. Quando a fenilalanina aumenta no
corpo, causa dano ao sistema nervoso central. Não tratada, a PKU leva a atrasos do
desenvolvimento, um tamanho da cabeça menor que o normal, hiperatividade,
movimentos espasmódicos do braço e da cabeça, convulsões, erupções cutâneas e
tremores. Felizmente, a administração de um teste sanguíneo simples a todos os
bebês logo após o nascimento pode diagnosticar PKU. As crianças que herdaram
essa condição precisam seguir uma dieta baixa em fenilalanina, particularmente no
início da vida (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

39
6.4 Síndrome do X frágil

Síndrome do X frágil: é o principal distúrbio genético que causa deficiência


intelectual de forma hereditária e a segunda maior causa genética, de
desenvolvimento, incluindo dificuldades de aprendizagem e deficiência cognitiva. O
cromossomo frágil apresenta uma distorção entre os demais cromossomos (Figura 1).
Geralmente, os indivíduos com essa condição apresentam atraso no desenvolvimento
da fala e da linguagem e também podem apresentar ansiedade e comportamento
hiperativo, como inquietação ou ações impulsivas. Além disso, podem ter transtorno
de déficit de atenção (TDAH) e apresentar características do transtorno do espectro
do autismo, que afetam a comunicação e a interação social (ARAÚJO, 2015).

Figura 1 – Cromossomo FMR1

Fonte: https://www.eudigox.com.br/

Os problemas de comportamento que exibem incluem atrasos para alcançar


marcos como engatinhar ou caminhar, comportamento hiperativo ou impulsivo, bater
palmas ou morder, atraso de fala e linguagem e tendência a evitar contato visual. As
meninas com esse transtorno podem não apresentar outros sintomas além de

40
menopausa prematura ou dificuldade para conceber um filho. Os terapeutas também
associam a síndrome do X frágil com hiperatividade e atenção pobre, bem como com
outros transtornos do neurodesenvolvimento, incluindo o do espectro do autismo. Um
levantamento de mais de mil famílias que tinham pelo menos um filho com a síndrome
do X frágil revelou que mais de metade vivenciava uma carga financeira relevante
como resultado direto do transtorno, e quase 60% tiveram que interromper ou mudar
significativamente seus horários de trabalho (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
Os riscos ambientais durante o desenvolvimento pré-natal são a segunda
categoria de causas de deficiência intelectual. Esses riscos, chamados de
“teratogênicos”, incluem drogas ou substâncias químicas tóxicas, subnutrição materna
e infecções na genitora durante fases essenciais do desenvolvimento fetal. As mães
que contraem rubéola (“sarampo alemão”) durante o primeiro trimestre da gravidez
são propensas a dar à luz um filho com deficiência intelectual. Infecções, privação de
oxigênio durante o parto (“anoxia”), parto prematuro e lesão cerebral durante o par- to
também podem levar a dano cerebral e a déficits intelectuais associados. Também
podemos associar parto prematuro com deficiência intelectual. Doenças,
traumatismos cranianos causados por acidentes ou abuso e exposição a substâncias
tóxicas, como chumbo ou monóxido de carbono, também podem levar crianças mais
velhas a sofrer perda da capacidade intelectual (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
O consumo materno de álcool durante a gravidez pode levar o infante a
desenvolver, antes do nascimento, síndrome alcoólica fetal (SAF), um conjunto de
anormalidades na aparência facial, padrões de crescimento mais lentos que a média
e, mais importante, amadurecimento do sistema nervoso que resulta em déficits
intelectuais. O uso materno de álcool durante todos os estágios da gravidez pode
causar dano ao desenvolvimento da criança. A profissão médica considera o nível de
consumo prejudicial mais de 80 gramas de álcool por dia. Quanto maior a quantidade
consumida pela gestante, maiores os efeitos sobre a criança.
Os déficits cognitivos de crianças com SAF parecem pronunciados sobretudo
na área de funcionamento executivo, levando-as a serem particularmente desafiadas
no processamento e integração de informação. Elas acham difícil efetuar tarefas que
requeiram a graduação do controle da atenção e a realização de manipulações
mentais. Embora a exposição ao álcool afete o cérebro inteiro, as crianças com SAF

41
apresentam volume cerebral reduzido e malformações do corpo caloso, o tecido que
conecta os dois hemisférios cerebrais.

6.5 Síndrome de Rett

Na síndrome de Rett, a criança desenvolve-se normalmente no início da vida


(até os 4 anos) e, então, começa a apresentar prejuízos neurológicos e cognitivos,
incluindo desaceleração do crescimento da cabeça e alguns dos sintomas de
transtorno do espectro autista. Embora não seja um diagnóstico separado no DSM-5,
a síndrome de Rett foi um tema de estudos clínicos e de pesquisa após sua introdução
no DSM-IV-TR. A síndrome ocorre quase exclusivamente em mulheres.
O gene para a síndrome de Rett foi identificado em 1999. Mutações nesse
gene, que tem o nome de MECP2, levam a anormalidades na produção de uma
proteína específica importante no funcionamento normal dos neurônios. Os
pesquisadores não sabem ainda como essas mutações estão ligadas aos sintomas
da criança. Entretanto, há sinais promissores de que pessoas com essa condição
podem se beneficiar se receberem logo após o nascimento tratamentos que
promovam o desenvolvimento saudável do cérebro (MATSUISHI et al., 2011).
Os profissionais que tinham diagnosticado jovens com síndrome de Rett antes
que esse diagnóstico fosse eliminado do DSM-5 usam agora o diagnóstico de
espectro autista. Todavia, ao especificar que as crianças têm uma condição genética
ou médica conhecida, eles são capazes de indicar que os sintomas estão relacionados
à síndrome de Rett.
Algumas crianças com transtorno do espectro autista parecem se desenvolver
normalmente pelos dois primeiros anos de vida, mas, em algum ponto antes dos 10
anos, começam a perder as habilidades de linguagem e motoras, bem como outras
funções adaptativas, incluindo controle do intestino e da bexiga. Essa condição rara
antes era chamada de transtorno desintegrativo da infância, porém o diagnóstico foi
eliminado do DSM-5 e é, agora, incorporado ao transtorno do espectro autista
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

42
6.6 Transtorno do espectro autista

O transtorno que conhecemos familiarmente como “autismo”, é chamado de


transtorno do espectro autista no DSM-5. Essa condição incorpora uma variedade de
distúrbios sérios nas formas como os indivíduos interagem e se comunicam com os
outros, bem como nos comportamentos que podem incluir os interesses e os padrões
de atividade de uma pessoa. O conjunto de critérios diagnósticos associados com
esse transtorno pode persistir até o fim da vida, mas, dependendo de sua gravidade,
o indivíduo pode receber ajuda para funcionar satisfatoriamente com tratamento.
O diagnóstico do DSM-5 substitui a categoria de transtorno autista do DSM-IV.
A principal razão para mudar o termo foi fornecer uma diferenciação mais confiável e
válida entre crianças que demonstram claramente “desenvolvimento típico” e aquelas
que demonstram uma variedade de déficits na comunicação e nos comportamentos
sociais. (Figura 2).

Figura 2 – Esferas afetadas pelos TEAs

Fonte: Whitbourne; Halgin (2015)

43
O termo transtorno do espectro autista reflete um consenso entre os cientistas
que redigiram o DSM-5 de que quatro transtornos antes considerados separados são,
na verdade, uma condição única com diferentes níveis de gravidade. Estes eram:

 Transtorno autista;
 Transtorno de Asperger;
 Transtorno desintegrativo da infância;
 Transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação.

Espectro autista é um conceito que facilita a compreensão de que o autismo é


uma condição muito variável de um caso para outro. Ele propõe que o transtorno seja
relacionado a uma linha de dificuldades e competências, compreendendo desde
quadros mais graves, com maior dependência de outras pessoas (autismo de baixo
funcionamento), até quadros mais leves, com alterações mais sutis, muitas vezes nem
identificadas ao longo da vida da pessoa (autismo de alto funcionamento).
Para diagnosticar transtorno do espectro autista, os clínicos avaliam crianças
ao longo de dois domínios centrais:

 O primeiro inclui distúrbios sociais e da comunicação.


 O segundo inclui uma variedade restrita de interesses e desempenho
de comportamentos e atividades repetitivas.

Em cada domínio, os profissionais especificam 1 de 3 níveis de gravidade:


requerendo apoio, requerendo apoio substancial e requerendo apoio muito
substancial (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
Na área da comunicação, as crianças com transtorno do espectro autista
podem apresentar atrasos do desenvolvimento no uso da linguagem e déficits nos
aspectos sociais da comunicação. Podem evitar o contato visual e suas expressões
faciais, seus gestos e mesmo sua postura podem chocar os outros como bizarros ou
incomuns. Por exemplo, eles podem achar difícil entender a linguagem corporal das
outras pessoas, e sua própria linguagem corporal pode parecer bizarra aos demais.
Outras alterações comuns são:

44
 falar de si na terceira pessoa, apresentar vocabulário muito sofisticado
para a idade, repetir muito palavras ou frases que ouviu (ecolalia),
inventar palavras novas (neologismos);
 falar frequentemente como um personagem da televisão;
 prejuízo da linguagem não verbal;
 usam menos mimicas ou gestos e não triangulam o olhar com o
interlocutor e o objeto de interesse (atenção compartilhada);
 parecem não gostar de brincar com as outras crianças, de compartilhar
experiências ou de se envolver em interações sociais de troca
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

Em casos extremos, elas podem evitar completamente interações sociais ou,


pelo menos, não tentam iniciá-las. O brinquedo imaginativo, um componente essencial
do desenvolvimento normal, apresenta desafios particulares a essas crianças. Elas
podem ser incapazes de participar do tipo de padrões de brinquedo imitativo que
caracterizam as interações sociais comuns de crianças pequenas.
Separados dos padrões sociais e de comunicação deficientes de pessoas com
transtorno do espectro do autismo estão os distúrbios de comportamento que
apresentam. Elas podem realizar comportamentos restritos ou repetitivos, tais como
tamborilar as mãos ou os dedos, ou mesmo contorcer seus corpos. Os
comportamentos repetitivos também podem tomar a forma do sintoma de ecolalia, que
é emitir os mesmos sons repetidas vezes. Repetir as mesmas rotinas sem quaisquer
mudanças pode ser outra manifestação do transtorno. Se alguém tenta mudar a ordem
na qual fazem alguma coisa, como comer, elas podem se tornar extremamente
angustiadas.
Os indivíduos com transtorno do espectro autista também podem desenvolver
interesses muito limitados e focalizados de forma específica, os quais vão além dos
brinquedos ou divertimentos típicos das outras pessoas. Eles podem se tornar
especialistas em uma área muito objetiva que envolva seu foco de atenção. Qualquer
desses sintomas isolados representaria um desafio para as famílias de pessoas com
esse transtorno, mas particularmente angustiantes são os distúrbios que esses
indivíduos podem apresentar em sua sensibilidade a estímulos em seu ambiente. Eles

45
podem parecer quase insensíveis a dor, calor ou frio, significando que podem se
colocar com facilidade em risco de lesões significativas. No entanto, suas
anormalidades sensoriais podem tomar a forma de hipersensibilidade a som, luz ou
cheiro (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).
Comportamentos e interesses restritos e estereotipados caracterizam-se pela
presença de movimentos repetitivos sem finalidade, como balançar para a frente e
para trás, andar na ponta dos pés, ficar girando em torno de si mesmo, movimentar
os dedos em frente aos olhos ou ficar fazendo movimentos repetitivos com objetos
sem um motivo definido. A criança pode apresentar obsessão por assuntos
específicos, como dinossauros, astronomia, números, bandeiras, personagens de
desenhos animados, etc. Geralmente, essa predileção é tão intensa que essas
crianças podem demonstrar muita dificuldade de falar ou brincar de outras coisas. Elas
podem ter também muito apego a rotinas, dificuldade em lidar com mudanças ou
imprevistos, podendo ficar muito agitadas ou irritadas quando há mudança nos
horários, no lugar de sentar na sala, na programação das aulas, etc.
As características incomuns do transtorno do espectro autista tornam-se mais
proeminentes quando o bebê chega à fase dos primeiros passos e à idade escolar.
Além disso, essa condição continua durante toda a vida do indivíduo, assumindo uma
de inúmeras formas, que variam em sintomas e gravidade. Entretanto, as áreas
particulares afetadas e a gravidade dos sintomas variam da infância à adolescência
e, novamente, da adolescência à idade adulta. Em um grande estudo transversal
comparando esses três grupos etários, a capacidade de interagir com os outros era
menos prejudicada entre os adolescentes do que entre os adultos, e os adultos eram
menos prejudicados na área de comportamentos restritos e repetitivos.
Pode haver alterações dos sentidos (tato, visão, audição, olfato), como:

 hipersensibilidade auditiva (incômodo desproporcional com alguns


tipos de barulho);
 hipersensibilidade tátil (incômodo com alguns tipos de tecido ou
contato físico),
 dificuldade em aceitar alguns tipos de alimento, etc.;
 alterações de sono (insônia, sono agitado),

46
 automutilação (comportamento autolesivo, como morder as mãos,
bater a cabeça na parede, dar socos da cabeça, principalmente em
situações de estresse ou quando há dificuldades para comunicar suas
necessidades e desejos);
 oscilações de calmaria e agitação, entre outros comportamentos.

Tais condições não são critérios obrigatórios para o diagnóstico, embora sejam
bastante frequentes (ESTANISLAU; BRASSAN, 2014).

6.6.1 Teorias e tratamento de transtorno do espectro autista

As evidências que apontam para padrões de herança familiar apoiam a teoria


de que o transtorno do espectro autista tem causas biológicas. Com base nessas
investigações, pesquisadores estimam a hereditariedade do transtorno em
aproximadamente 90%, com suspeitas de anormalidades genéticas nos
cromossomos 7, 2 e 15. Não existem evidências claras em relação a déficits
específicos na estrutura cerebral, mas os pesquisadores têm se concentrado no
cerebelo, no córtex frontal, no hipocampo e na amígdala. Além disso, pessoas com
esse transtorno parecem ter déficits nas áreas de associação do córtex. Há alguma
evidência de que o tamanho global do cérebro é aumentado em alguns indivíduos.
Existem anormalidades no circuito neural de pessoas com transtorno do espectro
autista, refletidas por sua particular dificuldade em processar estímulos visuais. Essas
alterações cerebrais podem explicar o fato de esses indivíduos serem menos
propensos a olhar dentro dos olhos das pessoas quando se comunicam com elas e
menos capazes de usar sinais emocionais quando processam informações das
expressões faciais dos outros (BATTY et al. 2011).
As crianças com transtorno do espectro autista apresentaM uma diminuição
nos comportamentos disruptivos e autoestimulantes se receberem reforço pelos
comportamentos adequados, tal como pedir ajuda ou opinião. Esse reforço pode
torná-las menos propensas a envolvimento em comportamentos autolesivos ou
agressivos. Nesse tipo de tratamento, os clínicos consideram mais útil focalizar a
mudança de comportamentos essenciais, com o objetivo de ocasionar melhoras em

47
outros comportamentos, em vez de se concentrar em mudar distúrbios
comportamentais isolados.
O terapeuta também pode ajudar a criança a desenvolver novas habilidades de
aprendizagem que lhe dê algumas experiências de sucesso na solução de problemas.
Por exemplo, ele poderia ensiná-la a dividir um problema grande, tal como se vestir,
em tarefas menores que possa realizar. Como resultado, a criança se sente menos
frustrada e, portanto, é menos propensa a regredir para comportamentos
problemáticos, como balançar e bater a cabeça. Os profissionais também se
concentram na necessidade de motivar a criança a comunicar-se mais efetivamente.
Ela então será motivada a responder a estímulos sociais e comportamentais, que é a
chave para o tratamento. Com o tempo, as crianças serão mais motivadas a regular e
iniciar comportamentos por contra própria. Mesmo mudanças simples podem ter esse
impacto, tal como deixá-las escolherem os materiais, os brinquedos e as atividades
para a intervenção, em vez de serem escolhidos pelo clínico (ESTANISLAU;
BRASSAN, 2014).
Outras estratégias comportamentais incluem procedimentos de autocontrole,
tal como automonitoração, treinamento do relaxamento e condicionamento encoberto.
As crianças também podem aprender a tocar uma imagem de uma face “carrancuda”
para indicar seu desprazer em vez de agir agressivamente quando estão aborrecidas
ou infelizes. Um fato importante a perceber é que, para esses programas
comportamentais serem eficazes, os terapeutas devem realizá-los intensivamente por
um longo período de tempo, começando cedo na vida da criança.
Estanislau e Brassan (2014) explicam em seus estudos que outra abordagem
de intervenção é ter iguais em vez de adultos interagindo com a criança. Essa situação
aproxima-se de um tipo mais normal de ambiente social, no qual as crianças assumem
um papel na modificação do comportamento das outras. Em comparação com as
intervenções nas quais os adultos fornecem o reforço, as mediadas por pares têm a
vantagem de permitir que os jovens realizem suas atividades comuns sem interrupção
dos adultos. A mais eficaz dessas intervenções envolve meninos pequenos cujos
irmãos mais velhos fornecem a intervenção, usa modelagem de pares, tenta
generalizar entre situações e envolve a colaboração entre os membros da família e o
pessoal da escola.

48
6.6.2 Transtorno do espectro autista de alto funcionamento

Uma vez considerado um transtorno separado do transtorno do espectro


autista, o diagnóstico de transtorno de Asperger era usado para caracterizar
indivíduos com sintomas de uma natureza menos extrema. O DSM-IV-TR diferenciava
os transtornos autista e de Asperger com base em se a criança apresenta ou não
atrasos no desenvolvimento intelectual e da linguagem. No DSM-5, o diagnóstico de
transtorno de Asperger foi removido, e os indivíduos com esses sintomas são
diagnosticados como um quadro de TEA de alto funcionamento, pois o
desenvolvimento da criança é próximo do esperado.
A criança como um quadro de TEA de alto funcionamento não apresenta atraso
para falar e tem inteligência normal. Geralmente, os problemas estão relacionados à
dificuldade de fazer amigos, a obsessões por alguns assuntos, comportamentos
inadequados e um jeito “concreto” de pensar (esses indivíduos levam as coisas ao pé
da letra, têm dificuldade de entender piadas). Nesses casos, o diagnóstico acontece
mais tarde, pois os sintomas são mais sutis (ESTANISLAU; BRASSAN, 2014).
As pessoas com TEA de alto funcionamento podem não apresentar sintomas
até́ chegar à idade pré-escolar. Nesse ponto, quando a maioria das crianças
desenvolve habilidades sociais e interativas, essas crianças têm dificuldade para ler
os sinais sociais dos outros e esperar sua vez de falar, bem como são incapazes de
interpretar sutilezas da linguagem. Elas podem evitar o contato visual ou,
alternativamente, podem manter o olhar fixo nos outros. Suas expressões faciais e
posturas podem parecer incomuns. Esses indivíduos de alto funcionamento com
transtorno do espectro autista tendem a se tornar preocupados com um conjunto
limitado de interesses. Podem falar de forma extensiva sobre esses interesses, sem
perceber que tais conversas unilaterais não são socialmente adequadas. Entretanto,
são mais propensos do que as crianças na extremidade de funcionamento mais baixo
do espectro do autismo a tentar fazer amizades (ESTANISLAU; BRASSAN, 2014).

49
7 INTERVENÇÕES COMPORTAMENTAIS PARA TEA NO AMBIENTE ESCOLAR

Fonte: https://br.freepik.com/

As dificuldades comportamentais no TEA podem assumir muitas formas


diferentes e ser incomuns ou frequentes. Elas incluem movimentos repetitivos, como
maneirismos com as mãos, estalar os dedos ou sacudir as mãos, ou movimentos
complicados de todo o corpo, como balanceio, como os descritos no capítulo anterior.
Algumas vezes, incluem ataques de birra ou comportamentos de autoagressão, como
bater com a cabeça. A criança pode buscar interesses muito incomuns, como, por
exemplo, alinhar os brinquedos ou bonecas em vez de brincar com eles, e não tolerar
perturbações.
Os problemas de comportamento tendem a mudar com o tempo, com
frequência se tornando mais problemáticos no início e no meio da adolescência.
Algumas vezes, os comportamentos persistem com o tempo, mas o que era um
comportamento pouco problemático em uma criança de 3 anos pode sê-lo muito mais
em um menino de 13 anos. Neste capítulo, discutimos alguns desses problemas
comportamentais e dificuldades emocionais vistos nos TEAs, de acordo com os
estudos de Volkmar e Wiesner (2018). Na tabela 13 apresenta os comportamentos
problemáticos e os problemas emocionais mais comuns em crianças com TEA.

Tabela 13 – Problema comportamentais e de humor comuns em pessoas com TEA


Tipos de comportamentos Exemplos específicos
Balanceio do corpo; sacudir as mãos ou
Comportamentos estereotipados estalar os dedos; outros comportamentos
repetitivos.

50
Agredir a si mesmo e aos outros;
Autoagressão e agressão
destruição de propriedade
Problemas com rigidez e Resistência à mudança; perseveração
perseveração compulsão; Interesses incomuns.
Hiperatividade e problemas de Altos níveis de atividade; dificuldade de
atenção atenção; impulsividade; correr ou fugir.
Depressão; ansiedade; transtorno bipolar
Problemas de humor
(mania).
Fonte: Volkmar e Wiesner (2018)

Volkmar e Wiesner (2018) relatam a dificuldade que, às vezes, se apresentam


para identificar os sintomas e traçar um possível tratamento, pois, mais de um
problema pode estar presente; por exemplo, problemas de atenção podem
acompanhar problemas de comportamentos estereotipados. Os autores explicam que
com frequência, o mesmo problema de comportamento é produto de vários fatores
diferentes.

7.1 Intervenções comportamentais: uma visão geral

Intervenções comportamentais e educacionais costumam ser a primeira linha


de tratamento para os problemas comportamentais observados no TEA e estão
baseadas em princípios de intervenção da Análise do Comportamento Aplicada
(ABA). Os pressupostos da ABA são de que outras crianças, assim como aquelas com
TEA, aprendem com a experiência. Desse modo, os acontecimentos que precedem
as dificuldades comportamentais (os antecedentes) e aqueles que os seguem (as
consequências) são importantes. Os antecedentes são as coisas que ativam o
comportamento. Por exemplo, se os pais pedem que a criança pare de balançar o
corpo e guarde seus brinquedos, e isso provoca uma crise de birra, está claro que ela
não quer parar de balançar o corpo ou guardar os brinquedos. Se a resposta à birra
for deixá-la continuar a balançar o corpo, os pais transmitem uma mensagem muito
forte de que ela não precisa ouvi-los (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
Uma vez que os pais (e, algumas vezes, os professores) lidam com muitas
coisas ao mesmo tempo, nem sempre é fácil ter uma visão mais geral dos problemas

51
de comportamento. Por isso, Volkmar e Wiesner (2018) apresentam alguns princípios
para que pais, tutores e professores possam terem em mente:

 Não preste atenção apenas à criança quando estão presentes


problemas de comportamento.
 Para encorajar os comportamentos desejados, não deixe de reconhecê-
los e elogiá-los de maneira específica.
 Um dos truques de lidar com problemas comportamentais é ter uma
visão dos tipos de comportamentos positivos que você quer que os
substituam.
 Procure regularidades no comportamento. Por exemplo, a atitude
problemática ocorre em apenas um contexto? Depois de uma
atividade?
 Observe o que vem antes e depois do comportamento: ele está sendo
(involuntariamente) recompensado (reforçado)?

Essa abordagem de avaliação é algumas vezes referida como “uma análise


ABC” (antecedente-comportamento-consequência, do inglês antecedent-behavior-
consequence). Com frequência, afirmam os supracitados autores, a solução para
reduzir determinado comportamento é fazer a criança aumentar bons
comportamentos para substituí-lo; por exemplo, se estamos tentando eliminar ou
reduzir um problema comportamental, devemos ter alguma coisa que desejamos que
aconteça. Às vezes, simples adaptações no ambiente da criança, como por exemplo,
mudar de um ambiente mais desorganizado para um mais simples e estruturado;
podem representar uma mudança importante.
As crianças com TEAs respondem bem a estrutura, previsibilidade e
consistência, e é importante assegurar-se de que o ambiente não está contribuindo
para os problemas. A função do comportamento também é importante; por exemplo,
se ele visa chamar atenção, então ignorá-lo pode ajudar. Tenha em mente que você
pode elogiar, recompensar e reforçar comportamentos desejados.
Algumas vezes, podem surgir problemas porque a criança está tentando evitar
o trabalho ou outras atividades. Lamentavelmente, se os pais cedem, isso mostra à
criança como escapar do trabalho. Em vez disso, eles devem, a princípio, fazer com

52
que ela se engaje na atividade por um tempo curto e, depois, elogiá-la ou deixá-la
fazer outra coisa por algum tempo. Alguns comportamentos sensoriais podem ser
tratados ajudando a criança a encontrar formas mais apropriadas de se engajar no
comportamento. Terapeutas ocupacionais podem ajudar (VOLKMAR; WIESNER,
2018).
Para indivíduos com dificuldades de comunicação importantes, os
comportamentos problemáticos podem ter uma função comunicativa; por exemplo, se
a criança não consegue dizer “não” ou “pare”, o comportamento problemático faz isso
por ela. Devemos tentar minimizar as dificuldades de comunicação ao lidar com esses
comportamentos. Os pais devem manter uma linguagem simples e precisa. Para
indivíduos não verbais, algumas formas básicas de comunicar não ou sim podem ser
úteis, como um cartão de ajuda para pedir auxílio, em vez de gritos ou alguns outros
sinais básicos. O fonoaudiólogo deve sugerir estratégias ou métodos de comunicação
para ajudar com isso e pode colaborar com o psicólogo da escola ou um especialista
em comportamento sobre como fazê-lo. Os prestadores de cuidados primários podem
ajudar os pais mostrando-lhes que existem opções e ajudando a equipe de tratamento
a ter uma boa comunicação entre si – por exemplo, se um cartão de ajuda estiver
funcionando na escola, os pais devem utilizá-lo em casa. A Tabela 14 resume alguns
dos erros comuns ao lidar com problemas de comportamento.

Tabela 14 – Erros comuns para lidar com problemas comportamentais


Problemas Solução
Manter linguagem simples e ir direto
ao ponto; não recorrera termos
Tornar a linguagem muito
complicados como “você poderia “,
complicada
etc.; isso parece ser educado, mas é
complexo de confuso.
Isso transmite uma forte mensagem
de que o que você quer é negativo.
Em vez disso, foque no que é
Focar apenas no negativo
desejado. Se quer que a pessoa pare
de fazer alguma coisa, dê algumas
alternativas.
Dê tempo suficiente e recursos
visuais, se necessário, para auxiliar o
Pressão do tempo processo individual; avançar com
muita rapidez desorganiza à
pessoa.

53
Mantenha um humor simples;
Humor complexo
sarcasmo e ironia são muito
(sarcasmo, ironia)
complicados de entender.
Dizer “está chovendo canivetes”
Linguagem figurativa
poder ser interpretado literalmente.
A ambiguidade pode ser muito difícil
Ambiguidade
de administrar
Introduza a mudança de forma
gradual; grandes mudanças e
Inconsistência
inconsistências são muito
perturbadoras para à aprendizagem.
Cuide para não estar reforçando um
comportamento problemático; por
Reforço involuntário do
exemplo, sua atenção aos gritos está
comportamento
aumentando porque o indivíduo
consegue mais atenção?
Fonte: Volkmar e Wiesner (2018).

7.2 Tipos de dificuldades comportamentais no TEA

Os especialistas apontam que as dificuldades comportamentais no autismo e


condições relacionadas podem assumir muitas formas diferentes, mas, de modo geral,
se enquadram em várias categorias que, algumas vezes, se sobrepõem. De maneira
ocasional, o indivíduo exibe tantas dificuldades que é difícil identificar exatamente o
que está acontecendo. Essa é uma das razões por que um consultor externo (um
psicólogo comportamental ou especialista em comportamento) pode ser benéfico, por
exemplo, para elaborar um plano sobre quais comportamentos priorizar. Vejamos a
seguir alguns desses comportamentos.

7.2.1 Comportamentos estereotipados, agitação e irritabilidade

Comportamentos estereotipados são movimentos repetitivos, aparentemente


sem propósito, comuns em crianças pequenas com autismo e condições relacionadas.
Com frequência, parecem surgir em torno dos 2 ou 3 anos e podem incluir balanceio
do corpo, estalar dos dedos, andar na ponta dos pés e outros movimentos complexos
do corpo inteiro. Os movimentos estereotipados com frequência estão associados a
outros problemas de comportamento, como autoagressão, agressão, rigidez
comportamental e dificuldades com mudanças. Às vezes, comportamentos similares

54
(balanceio do corpo e algumas vezes bater com a cabeça) são vistos em bebês com
desenvolvimento típico, mas desaparecem quando a criança cresce (VOLKMAR;
WIESNER, 2018).
Crianças com desenvolvimento típico em idade escolar e de ensino médio
também podem se engajar em níveis leves de movimentos de autoestimulação, como
movimentar as pernas com rapidez enquanto fazem uma prova, porque isso as ajuda
a se sentir menos ansiosas. Movimentos incomuns, como os tiques, podem ser vistos
em outras condições, como, por exemplo, na síndrome de Tourette. Os tiques diferem
de comportamentos estereotipados na medida em que tendem a ocorrer em
episódios, envolvem a cabeça e o pescoço (em particular no início), e a criança não
parece gostar de realizá-los. Assim, tendem a não envolver as mãos ou o estalar dos
dedos ou o giro e rodopio vistos com mais frequência em crianças com TEAs.
Problemas do movimento também podem ser observados em outros transtornos (p.
ex., algumas vezes depois de infecções por estreptococos); às vezes, pode ser difícil
diferenciar a natureza dos movimentos (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
Os movimentos estereotipados repetitivos variam no curto e no longo prazo.
Com frequência, parecem aumentar depois dos 3 anos de idade, podendo voltar a
aumentar em frequência ou intensidade (ou ambos) em torno dos 5 ou 6 anos, e então
decrescem, reaparecendo próximo ao início da puberdade, em geral alguns meses
antes dos primeiros sinais físicos da puberdade. Esses comportamentos podem surgir
em momentos nos quais a criança está entediada ou estressada e quando
hiperestimulada ou ansiosa. Também parecem servir como um modo de atividade
preferido pela criança, quase como um relaxamento (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
Os autores nos quais estamos nos referendando sinalizam que movimentos e
atividades físicas vigorosas podem ajudar a reduzir comportamentos estereotipados.
As crianças que se engajam em giro intenso podem se beneficiar de exercícios
regulares. Até mesmo fazê-las ficar em pé por curtos períodos na sala de aula para
fazer movimentos vigorosos como alongamento, salto ou bamboleio pode ajudar.
Algumas vezes, um dos problemas com ambientes de sala de aula mais inclusiva é
que as oportunidades para movimento físico e atividade vigorosa estão limitadas ao
ginásio e ao pátio no recreio. Os autores também problematizam que geralmente as
crianças com TEA são encorajadas a ficar sentadas no ambiente da sala de aula
regular. Eles propõem pensar no movimento como um aliado dentro do plano de aula,

55
de modo que se permita intervalos periódicos para movimento e outras atividades
físicas.
Outra situação comum de acontecer com crianças com TEA é que às vezes,
elas se engajam em autoestimulação auditiva, por exemplo, passando longos
períodos resmungando ou fazendo ruídos. Isso algumas vezes acontece quando a
criança é excessivamente estimulada (sobretudo por ruídos e sons). Nesse caso,
orienta-se o uso de aparelhos, desde simples fones de ouvido até música e aqueles
que produzem ruído branco ou determinados sons (como o som do oceano ou de
chuva caindo), principalmente, para crianças que são demasiadamente responsivas a
sons (VOLKMAR; WIESNER, 2018).

7.2.2 Agressão e autoagressão

Esses comportamentos estão entre os mais difíceis de lidar e os mais


problemáticos para pais, professores e profissionais. Felizmente, esse problema não
é tão comum, e, mesmo quando ocorre, existem inúmeras intervenções potenciais.
Agressão e autoagressão com frequência ocorrem associadas a outros problemas
(como movimentos estereotipados, rigidez ou perseveração).
A autoagressão pode assumir muitas formas diferentes, entre as quais bater
com a cabeça, beliscar-se, arrancar o cabelo, cutucar o olho, morder a mão ou o
braço, etc. A agressão contra outros pode incluir morder, arranhar ou bater. Com
frequência, o comportamento de destruir propriedades também está associado a essa
categoria de dificuldades. A autoagressão do indivíduo pode ser extremamente
penosa para pais e professores. Ela não é comum até a idade escolar, embora às
vezes ocorra em crianças menores com autismo (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
Os estudos indicam que o início abrupto de um comportamento autoagressivo,
em particular o de bater com a cabeça, deve motivar exame médico, porque pode ser
uma forma de a criança que não tem palavras conseguir se comunicar sobre sua dor
física. Assim, infecções auditivas são particularmente responsáveis em crianças
menores; já em adolescentes não verbais que começam a bater a cabeça, os
problemas dentários, como siso impactado; podem ser a causa desses
comportamentos. Crianças que começam a cutucar os olhos podem ter algum

56
problema físico ou até mesmo uma dificuldade visual da qual não conseguem se
queixar por meio de palavras (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
Com frequência, mas nem sempre, a agressão em relação a outras pessoas é
provocada de alguma forma; por exemplo, quando a criança é interrompida ou lhe
pedem para fazer alguma coisa mais desafiadora. Devido aos interesses e
preocupações incomuns, pode ser difícil saber o que desencadeia tais
comportamentos. Do mesmo modo, as maneiras incomuns como a pessoa verbal fala
podem algumas vezes dificultar a compreensão do que desencadeia a atitude. De
forma semelhante à autoagressão, a agressão pode ser um grande problema para
pais, professores e membros da equipe da escola. Ela pode assumir a forma de
comportamentos de morder, bater, chutar, arranhar ou dar cabeçadas.
Trata-se sobretudo de analisar as causas que podem desencadear o
comportamento. Os especialistas exemplificam com as seguintes perguntas:

 Esse comportamento é uma resposta à frustração, um comportamento


de escape ou uma maneira de a criança dizer “Não, eu não quero fazer
isso”?
 Ele acontece apenas na escola? Apenas com alguns prestadores de
cuidados? Somente durante algumas atividades ou situações? Apenas
em certas horas do dia?
 A autoagressão ocorre apenas durante momentos de inatividade ou com
certas pessoas ou situações? Ela está relacionada a níveis de
estimulação ambiental (para mais ou para menos)?
Em geral, essas informações fornecem pistas importantes quanto à motivação
do comportamento e ao que pode ser feito a respeito (VOLKMAR; WIESNER, 2018).

7.2.3 Rigidez e comportamentos perseverativos

Interesses incomuns, comportamentos ritualísticos e compulsivos e problemas


com transições são frequentes em crianças com TEAs. Por exemplo, uma criança
pode ter a preocupação de ligar e apagar luzes, abrir e fechar portas ou sentir a água
correr de torneiras. Algumas podem acumular objetos ou colocá-los em posições ou
lugares muito específicos (e ficam perturbadas se alguém altera isso). Embora

57
algumas vezes sejam difíceis de mensurar, esses comportamentos podem ser fonte
de grande dificuldade para crianças com funcionamento superior. Algumas vezes,
crianças de funcionamento inferior com autismo que em outros aspectos parecem ter
déficit de atenção podem passar um tempo longuíssimo em sua fixação particular.
Independentemente do nível de funcionamento da criança, esses interesses especiais
serão um problema se ela passar tanto tempo envolvida com eles que isso acabe
interferindo em seu funcionamento em outras áreas. Lamentavelmente, por ser tão
fixada em um objeto ou tema particular, a criança também evita ser exposta a novas
situações e à aprendizagem de coisas novas. (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
Os membros da equipe de ensino e os pais podem acabar tendo que
empreender grandes esforços para não provocar a criança e não permitir que ela
passe um tempo excessivo na busca de seu interesse à custa do tempo de
aprendizagem. As dificuldades que crianças com autismo têm para lidar com a
mudança realmente dizem muito sobre seus problemas com o processamento da
informação social e sua tendência a aprender as coisas em blocos (o que os
psicólogos chamam de aprendizagem em Gestalt) em vez de dividi-las em
fragmentos. Desde que as coisas permaneçam exatamente as mesmas, a criança não
tem que lidar com a complexidade imposta pela mudança. Esse problema também
revela as dificuldades que os jovens com autismo têm de obter uma visão ampla da
interação social. Ou seja, a interação social apresenta muitos obstáculos significativos
se a pessoa tem problemas para lidar com mudanças porque o significado está
sempre se alterando, dependendo de quem está falando e sobre o que se está
falando. Além disso, as múltiplas pistas concomitantes na interação (tom de voz,
expressão facial, gestos e conteúdo das palavras), que fornecem importante
significado para o resto das pessoas, são fontes potenciais de confusão e
desorganização para crianças com TEAs (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
Várias estratégias podem ser empregadas para ajudar a lidar com a resistência
à mudança. Para crianças que não têm muita linguagem falada, é importante utilizar
materiais visuais concretos a fim de ajudar a criança a ser mais comunicativa ou
organizada. Uma pequena câmera e um notebook ou cartões podem ser utilizados
para ajudar às a ver o que vem primeiro, o que está acontecendo agora e o que irá
acontecer no futuro. As programações visuais podem ser colocadas na geladeira de
casa ou no quadro de avisos na sala de aula, e periodicamente pode-se chamar a

58
atenção do aluno para elas. Um número cada vez maior de aplicativos está disponível
para ajudar com as programações, transições, horários, etc.
Uma segunda estratégia envolve ajudar a criança a tolerar a mudança por meio
de um processo mais gradual. Mais uma vez, pode-se usar todo um corpo de trabalho
baseado na teoria da aprendizagem para introduzir a mudança de modo gradual.
Pode-se experimentar a mudança planejada ou surpresas planejadas e, algumas
vezes, dar à criança a escolha entre três surpresas secretas, as quais podem ser
colocadas no verso de um cartão de fichário. Ela escolherá um, obviamente sem saber
do que se trata. No começo, será de grande ajuda fazer com que todas as opções
sejam coisas de que a criança irá gostar. Ajude-a a trabalhar com o tempo e
competências de organização. Dependendo do nível de habilidade da criança, estas
podem variar desde o uso de recursos visuais simples até listas (para aquelas que
sabem ler), organizadores e dispositivos de software mais sofisticados (VOLKMAR;
WIESNER, 2018).
Outra abordagem é tornar o comportamento mais funcional, isto é, ajudando a
criança a usar seu interesse de maneira mais normal ou típica. A ideia é que, ao ajudá-
la a aprender a usar os comportamentos de forma mais produtiva, ela poderá ser
ajudada a ser mais funcional na vida diária.
De acordo com Volkmar e Wiesner (2018), outras estratégias podem incluir o
uso dos seguintes recursos:

 Roteiros e rotinas verbais são basicamente um conjunto de orientações


verbalizadas que uma criança pode usar para falar com ela mesma em
situações específicas;
 Histórias sociais, tais como: histórias pré-escritas que as crianças podem
revisar a fim de ajudá-las a praticar e ensaiar estratégias para lidar com
situações potencialmente problemáticas;
 Regras, como por exemplo: você sempre deve pedir antes de pegar alguma
coisa. Devem ser simples, funcionais e possam ser anotadas para crianças que
leem.

As abordagens comportamentais podem ser úteis também para crianças com


funcionamento superior. Elas geralmente têm dificuldade em lidar com novidades

59
porque isso as deixa ansiosas. Além disso, podem ter problemas para reconhecer que
alguma coisa é nova e perceber que estão ansiosas. O ensino explícito e o
aconselhamento podem ser muito úteis para essas crianças.
Um problema relacionado tem a ver com comportamentos compulsivos e
ritualísticos. A criança pode ter que realizar uma série de ações ou comportamentos
quando se engaja em alguma atividade. Alguns comportamentos ritualísticos ou
compulsivos guardam certa semelhança com aqueles vistos no transtorno obsessivo-
compulsivo (TOC), uma condição na qual as pessoas são perturbadas por obsessões
(coisas sobre as quais não conseguem parar de pensar, como o pensamento de que
são más) e compulsões (a necessidade de realizar uma atividade de modo repetitivo,
como lavar as mãos devido ao temor de que estejam sujas). Algum grau de
obsessividade e compulsão é perfeitamente normal e pode ser adaptativo. No entanto,
não é normal que uma criança leve 50 minutos para lavar as mãos (às vezes até a
ponto de começarem a sangrar) ou esteja tão preocupada em não fazer algo ruim que
fique imobilizada (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
As semelhanças dos comportamentos mais típicos de TOC com alguns
daqueles vistos em autismo (rigidez e tendência a repetir as coisas) são muito
interessantes, e alguns dos mesmos tratamentos medicamentosos para esses
comportamentos são empregados para ambas as condições. Um importante ponto de
diferença é que com frequência crianças (ou adolescentes e adultos) com TOC lhe
dirão que não gostam de ter que realizar os comportamentos. Em contrapartida,
indivíduos com TEAs em geral acham que seus comportamentos compulsivos não
são penosos e, na verdade, são fonte de conforto e prazer (VOLKMAR; WIESNER,
2018).

7.2.4 Atenção e hiperatividade

Problemas de atenção e hiperatividade são muito comuns em crianças com


TEAs e podem incluir dificuldades de escutar, desorganização, altos níveis de
atividade e impulsividade. A criança pode ser inquieta e estar em atividade quase o
tempo todo. As dificuldades de escutar e o comportamento impulsivo podem ser a
fonte de muitos problemas, como sair correndo para a rua. Para crianças com
linguagem incipiente ou sem linguagem, é importante perceber que pelo menos

60
algumas das dificuldades podem estar relacionadas a problemas com a linguagem e
a comunicação. Para crianças com funcionamento cognitivo superior, os problemas
de atenção (e até certo ponto hiperatividade) podem sugerir transtorno de déficit de
atenção/hiperatividade (TDAH). A questão de diagnosticar formalmente o TDAH em
crianças com TEAs permanece indefinida (VOLKMAR; WIESNER, 2018).
Ao avaliar esses problemas, uma das primeiras perguntas a se fazer é se as
dificuldades da criança são vistas em todas as situações ou apenas na escola. Se
ocorrerem somente na escola, vale a pena indagar se são vistas em todas as aulas
ou ambientes ou apenas em alguns. Se ocorrerem apenas na escola e em alguns
ambientes, é recomendável prestar muita atenção ao que está acontecendo. Por
exemplo:

 As demandas de linguagem (ou sociocomunicativas) são muito altas para a


criança?
 O material acadêmico está além de sua capacidade?
 O ambiente da sala de aula pode ser modificado para ajudar a criança a ser
mais organizada?
 Recursos visuais ou sistemas de comunicação aumentativa ou outras
estratégias podem ser utilizados para ajudar a criança a ter um ambiente de
aprendizagem mais previsível? Por exemplo, uma revisão do cronograma ou
pré-ensino pode ser útil?
 A criança inicia o dia com bom desempenho e parece perder isso à medida que
o tempo passa? (Em caso afirmativo, fadiga pode ser um fator.)
 Abordagens diferentes parecem ser úteis (dando à criança períodos para
atividade intercalados com o trabalho escolar)?
 Que recompensas motivam a criança? Ela irá trabalhar para obter o quê?
 A sala de aula está hiperestimulando a criança (o que talvez seja adequado
para a criança com desenvolvimento típico pode ser um dificultador para aquela
com acentuada sensibilidade auditiva ou visual)? (VOLKMAR; WIESNER,
2018).

Se os problemas de atenção ou hiperatividade parecem estar acontecendo em


todas as áreas da vida da criança, algumas das mesmas considerações podem ser

61
aplicadas. Por exemplo, deve haver uma avaliação funcional e a consideração de
medidas (como pistas visuais) para ajudá-la a ser mais organizada. Para aquela com
ou autismo com alto funcionamento ou atípico, outros apoios organizacionais podem
ser úteis. Um programa comportamental pode ser útil na escola e em casa. Esse
esforço deve envolver pais e professores para que o sistema possa ser aplicado de
forma consistente durante todo o dia do indivíduo. Sabe-se que em alguns casos, os
tratamentos medicamentosos são necessários (VOLKMAR; WIESNER, 2018).

7.2.5 Ansiedade

Os transtornos de ansiedade ocorrem com bastante frequência no TEA, com


estudos indicando prevalências de até 40% (ZABOSKI; STORCH, 2018). Estudos que
examinaram os tipos de transtorno de ansiedade em indivíduos com TEA indicam que
fobias específicas, transtorno de ansiedade generalizada, fobia social, transtorno de
ansiedade de separação e transtorno obsessivo compulsivo são os mais frequentes.
Eles apresentam distribuição muito semelhante à encontrada na população que não
apresenta TEA, mas com uma ressalva: os comportamentos compulsivos são mais
prevalentes nos pacientes com TEA do que nos jovens com desenvolvimento típico
(KERNS et al., 2014).
A apresentação clínica dos transtornos de ansiedade em parte da população
com TEA (48%) assemelha-se bastante à apresentação em crianças neurotípicas.
Outra parte das crianças com TEA (46%), porém, apresentam sintomas de ansiedade
atípicos, diferentes dos critérios das categorias diagnósticas do DSM 5 (American
Psychiatric Association, 2013), não ficando ainda claro se estes sintomas representam
uma variação de ansiedade no TEA ou uma característica do próprio TEA (KERNS et
al., 2014).
De acordo com Kerns et al. (2018), são exemplos destes sintomas atípicos:

 Desconforto social como sintomas somáticos em situações sociais,


esforços para escapar ou evitar locais onde poderá encontrar-se com
pessoas, aumento de irritabilidade, comportamento autolesivo ou
agressivo em situações sociais; sem apresentar medo de uma avaliação
negativa, como ocorre no transtorno de ansiedade social.

62
 Fobias específicas não comuns, tais como: choro de criança, tosse,
certas músicas, parabéns, supermercado, balões, bolas de sabão, fogo,
teia de aranha. Devendo antes ter sido afastado hipersensibilidade a
barulho e estímulo sensorial.
 Preocupações com rotinas, novidades e interesses restritos, ou seja,
preocupação ou medo relacionados com pequenas mudanças de rotina,
mudanças na rotina de casa, preocupação excessiva em não poder
acessar objeto de interesse restrito ou que regras possam ser
quebradas.
 Comportamento compulsivo/ritualístico como rituais no horário de
refeições, rituais verbais, uso invasivo de certas frases ou palavras,
insistências em desligar ou ligar certo aparelho, fechar portas, deixar
manga de camisa abaixada, sapatos não poderem entrar em casa.

Apesar das dificuldades, este é um diagnóstico importante de ser realizado,


uma vez que a ansiedade pode exacerbar sintomas de TEA, interferir com as
intervenções terapêuticas, propiciar crises de irritabilidade e agressividade, afetar o
desempenho acadêmico e a inserção escolar (MONTENEGRO; CELERI, CASELLA,
2018).

7.2.6 Depressão

De acordo com os estudos de Montenegro, Celeri e Casella (2018), os sintomas


do TEA podem mascarar as características cardinais da depressão, já que o seu
diagnóstico se baseia no relato subjetivo de sentimento de tristeza, falta de esperança
e apatia, algo nem sempre é possível em função dos prejuízos sociais, cognitivos e
de comunicação típicos do TEA. Desta forma, a identificação e diagnóstico passam a
basear-se em comportamentos e mudanças do estado mental (tristeza, choro fácil,
labilidade do humor, apatia, irritabilidade, agressividade, distúrbios do sono e do
apetite, diminuição na funcionalidade ou regressão nas habilidades, diminuição do
autocuidado, comportamento autolesivo, além de sintomas catatônicos) referidos por
familiares.

63
7.2.7 Transtorno desafiador de oposição ou transtorno de oposição desafiante

O transtorno desafiador de oposição (TDO) caracteriza-se por um padrão


frequente e persistente de humor raivoso/irritado, comportamento desafiador,
questionador e antagonista, teimosia, resistência para obedecer a ordens e regras,
incomodando deliberadamente as pessoas e culpando os outros por seu mau
comportamento. Apesar de a literatura indicar o TDO como uma possível comorbidade
do TEA, este não é um diagnóstico fácil de ser realizado, recomendando-se uma
postura conservadora quando sintomas de desobediência, desafio e oposição
aparecem. É importante compreender que estes sintomas podem ser consequência
dos sintomas do TEA, como falta de percepção social, dificuldades em lidar com
mudanças ou com certas demandas específicas ou dificuldades no processamento
sensorial. Ou seja, muitas vezes os sintomas podem não ser um desafio proposital
(MONTENEGRO; CELERI, CASELLA, 2018).

7.2.8 Distúrbios do sono

Estudos realizados por Malow et al. (2016) atestam que as dificuldades de sono
são muito comuns em crianças e adolescentes com TEA, com prevalências variando
entre 50 e 80%. As pesquisas associam as dificuldades de sono a transtornos
internalizastes e externalizantes, pior capacidade adaptativa, maior prevalência de
dificuldades comportamentais durante o dia, incluindo hiperatividade,
hipersensibilidades, ansiedade e comportamentos autoestimulantes, agressividade.
Nesse sentido, Montenegro, Celeri e Casella (2018) explicam que investigar a
presença, avaliar e tratar dificuldades de sono é parte fundamental da atenção e
cuidado à criança e adolescente com TEA, pois muitas vezes estas queixas não são
referidas espontaneamente pelos pais, que tendem a acreditar que elas fazem parte
do TEA.
As causas destas dificuldades são complexas e multifatoriais, como por
exemplo:
 Higiene do sono inadequada (como ocorre em crianças com desen-
volvimento neurotípico).

64
 Associadas às condições médicas, como epilepsia ou refluxo
gastresofágico.
 Associada às dificuldades de comunicação próprias do autismo
(dificuldades com transições ou dificuldades de compreender as
expectativas dos pais em relação ao sono).
 Associadas às comorbidades psiquiátricas como depressão e
ansiedade.

7.3 Adaptação curricular para alunos com TEA

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Um dos maiores desafios no tratamento da criança com transtorno do espectro


autista (TEA) é a inclusão escolar. Inclusão é muito mais do que fazer uma rampa na
calçada ou na entrada de um prédio. Inclusão refere-se não só às atividades
pedagógicas, mas também às atividades sociais e de lazer. Na escola, inclusão deve
possibilitar que toda criança ou adolescente possa frequentar a sala de aula da rede
regular de ensino. Sem nenhuma exceção. A escolar deve permitir que o aluno
desenvolva não só suas habilidades pedagógicas, mas também deve prepará-lo para
que possa participar da sociedade como um todo (ARRUDA; ALMEIDA, 2014).
Em consonância com esses autores, Estanislau e Brassan (2014) apresentam
algumas estratégias básicas para a sala de aula, orientando:

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 Comparar cada aluno apenas com ele mesmo.
 Não inferir que o aluno não pode aprender.
 Utilizar linguagem adequada à criança.
 Certificar-se de que a criança esteja prestando atenção em você antes de
passar uma instrução.
 Monitorar o desempenho do aluno constantemente.
 Reforçar positivamente os bons comportamentos e aprendizagem adquirida.
 Promover rotinas: preparar uma cartolina com os horários das atividades
diárias; se possível, fazer essa construção em sala de aula, com a ajuda dos
alunos. Esse material dever ficar o mais próximo possível do aluno, para
orientá-lo.
 Evitar exposição do aluno a situações em que já se sabe ou se imagina que ele
terá mais dificuldades que os outros.
 Estar atento ao fato de que atividades ou eventos com muito barulho podem
desencadear comportamento de desorganização.
 Respeitar o limite do aluno em relação ao tempo das atividades. Às vezes, uma
simples volta no pátio ou no banheiro já é suficiente para que ele se reorganize
e volte para as atividades.
 Estabelecer prazos curtos e atividades com número reduzido de exercícios, a
fim de facilitar a execução.
 Utilizar recursos visuais como estratégia de ensino. Porém, observar que o
excesso de cartazes em sala de aula pode distrair demais.
 Organizar o material de forma que a criança saiba o que tem de fazer.
 Não oferecer muito material inicialmente (poucos lápis ou tintas, para começar).
 Se necessário, adaptar o material gráfico, por exemplo, com uso de letras de
tamanho maior, somente maiúsculas, maior espaço para registro, entre outras
adaptações.
 Fazer uso produtivo dos interesses especiais da criança para chamar atenção
e poder alfabetizá-la, ensinar cores, números, letras e outros conteúdos.
 Apresentar os conteúdos em ordem crescente de complexidade. Se preciso,
antecipar os assuntos com a ajuda dos terapeutas ou auxiliares. Lembrar-se

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sempre de que qualquer mudança repentina ou novidade pode causar
estranheza e rigidez no comportamento. A familiaridade traz segurança.
 Utilizar estratégias “passo a passo”.
 Elogiar: algumas crianças não se motivam com a forma corriqueira de elogiar.
Talvez seja interessante tentar métodos diferentes, como adesivos ou objetos
de que elas gostam (um livro ou um brinquedo, por exemplo).
 Ao término da atividade, demonstrar claramente que uma atividade chegou ao
fim e o que está por vir (para onde vão e o que vão fazer).
 Usar um termo de uma ou duas palavras significando uma orientação. Por
exemplo, “lanche” para o momento das refeições.
 Fornecer imagens que simbolizem opções de escolha para que o aluno
demonstre o que quer fazer.
 Facilitar a linguagem conectando palavras com gestos e objetos.
 Auxiliar a compreensão socioemocional, explicando de maneira acessível os
pensamentos ou sentimentos dos outros, esclarecendo piadas ou expressões
de duplo sentido, etc.
 Fornecer apoio e incentivo para a integração do aluno com as outras crianças
tanto nas atividades de aprendizado como nos horários de lazer e brincadeiras.
 Pedir auxílio para que os colegas de sala ajudem o aluno nas suas dificuldades
e necessidades quando puderem e se sentirem à vontade.
 Se a família permitir, conversar abertamente com os colegas de sala sobre a
condição especial do aluno, pois isso diminui a sensação de estranhamento e
o preconceito.
 Manter contato frequente com a família e com a equipe de profissionais que
cuidam do aluno, pois, ao trabalharem em conjunto, a compreensão e o manejo
dos comportamentos e do ensino dessa criança terão muito mais sucesso.

Adaptações pedagógicas fazem parte do tratamento da criança com TEA. Nem


sempre a existência do TEA é óbvia, principalmente para as outras crianças, e
comunicar aos colegas o que está acontecendo pode ajudar muito. É claro que isso
só poderá ser feito após a permissão dos pais da criança com TEA. Assim,
Montenegro; Celeri e Casella (2018) orientam aos professores que expliquem para a
classe quando uma criança tiver algum tipo de dificuldade e a justificar o tratamento

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diferenciado que ela recebe. Dessa forma, os educadores desenvolvem a empatia e
como resultado, as crianças terão mais paciência com o(a) amigo(a) (quando for
necessário) e também vão querer ajudá-lo(a) sempre que for preciso.
As autoras concluem que é mais fácil para uma criança entender que o(a)
colega tem direito a um tratamento diferenciado se ela está ciente de que existe um
problema de saúde e não só porque a professora protege ou gosta mais de
determinada criança. Por exemplo, muitas escolas têm uma ou duas carteiras
posicionadas ao lado da mesa da professora (geralmente destinadas às crianças que
precisam de mais ajuda). O(a) aluno(a) que não tem qualquer dificuldade pode sentir-
se injustiçado(a) por não ser convidado a sentar-se ao lado da professora. Mas se ele
souber que o(a) colega tem alguma dificuldade, é mais fácil entender que ele precisa
sentar-se perto da professora.
A declaração de Salamanca (1994) é uma resolução das Nações Unidas que
trata dos princípios, política e prática em educação especial que estabelece entre
outras coisas que:

 Toda criança tem direito fundamental à educação e deve ser dada a ela
a oportunidade de atingir e manter um nível adequado de aprendizagem.
 Toda criança possui características, interesses, habilidades e
necessidades de aprendizagem únicas. Sistemas e programas
educacionais devem ser designados e implantados para contemplar a
ampla diversidade dessas características e necessidades.
 Crianças com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à
escola regular, que deve acomodá-las através de uma pedagogia
centrada na criança, capaz de satisfazer tais necessidades.
 Escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os
meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se
comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e
alcançando a educação para todos”.

Fazer algumas adaptações curriculares para os alunos com necessidades


educacionais especiais deve fazer parte do plano de trabalho de toda escola. A Lei

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número 12.764, de 27 de dezembro de 2012, estabelece como direitos da pessoa com
TEA:
 Proteção contra qualquer forma de abuso e exploração.
 Acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às
suas necessidades de saúde, incluindo:
a. O diagnóstico precoce, ainda que não definitivo.
b. O atendimento multiprofissional.
c. A nutrição adequada e a terapia nutricional.
d. Os medicamentos.
e. Informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento.
 Acesso à educação e ao ensino profissionalizante.
 Acesso à moradia, inclusive à residência protegida.
 Acesso ao mercado de trabalho.
 Acesso à previdência social e à assistência social.
 Quando incluída nas classes comuns de ensino regular, terá direito a
acompanhante especializado (se for necessário).

Finalmente, a inclusão escolar bem-feita permite não só o desenvolvimento da


criança incluída, mas também permite que as outras crianças possam vivenciar a
diferença. Todos aprenderão que somos diferentes e ser diferente não significa ser
melhor nem pior do que ninguém. O primeiro passo é lembrar sempre que cada aluno
é diferente do outro, principalmente quando se trata de alunos com transtornos do
espectro autista. Nem sempre o que funciona para um irá funcionar para outro, mesmo
que ambos tenham o mesmo diagnóstico. O currículo precisa ser adaptado
individualmente, sempre levando em consideração as áreas de potencialidades e as
áreas de maior deficiência (MONTENEGRO; CELERI, CASELLA, 2018).

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8 BIBLIOGRAFIA BÁSICA

APA. American Psychiatric Association. Manual Diagnóstico e Estatístico de


Transtornos Mentais (DSM-V). 5. ed. Porto Alegre: Artmed. 2014.

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Escolar: inclusão baseada em evidências científicas. Ed. Instituto Glia, 2014.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do


Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

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Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista; e altera o § 3o
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