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SUMÁRIO

1 A SAÚDE MENTAL ..................................................................................... 2

2 A SAÚDE MENTAL INFANTIL .................................................................... 3

3 A Saúde Mental Infantil no Brasil ................................................................ 4

4 POLÍTICAS DE SAÚDE PÚBLICA NA SAÚDE MENTAL INFANTIL .......... 6

5 OS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL INFANTO-JUVENIS


(CAPSI) .................................................................................................................. 12

6 A POTÊNCIA DO ACOLHIMENTO ........................................................... 14

7 O PROFISSIONAL DE SAÚDE ................................................................ 15

8 FAMÍLIA E SOFRIMENTO PSÍQUICO: O DESAFIO DO PROTAGONISMO


FAMILIAR .................................................................................................................. 17

9 A Estratégia Saúde da Família ................................................................. 19

10 Abordagem Familiar: Ferramentas e Recomendações ......................... 20

11 Lei de Amparo à Criança e ao Adolescente .......................................... 22

11.1 O que diz a Lei 10.216/2001 ........................................................... 24

11.2 Lei de Amparo às pessoas portadoras de transtornos mentais ...... 24

12 INTERVENÇÃO EM SAÚDE MENTAL .................................................. 27

13 O cuidado que dá certo em saúde mental ............................................. 28

14 Quando uma criança deve fazer Psicoterapia ....................................... 29

15 LUDOTERAPIA ..................................................................................... 30

BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 36
1 A SAÚDE MENTAL

Fonte: ehealth.eletsonline.com

A Organização Mundial de Saúde afirma que não existe definição "oficial" de


saúde mental. Diferenças culturais, julgamentos subjetivos, e teorias relacionadas
concorrentes afetam o modo como a "saúde mental" é definida. Saúde mental é um
termo usado para descrever o nível de qualidade de vida cognitiva ou emocional.
A saúde Mental pode incluir a capacidade de um indivíduo de apreciar a vida e
procurar um equilíbrio entre as atividades e os esforços para atingir a resiliência
psicológica. Admite-se, entretanto, que o conceito de Saúde Mental é mais amplo que
a ausência de transtornos mentais"
Saúde Mental é o equilíbrio emocional entre o patrimônio interno e as
exigências ou vivências externas. É a capacidade de administrar a própria vida e as
suas emoções dentro de um amplo espectro de variações sem contudo perder o valor
do real e do precioso. É ser capaz de ser sujeito de suas próprias ações sem perder
a noção de tempo e espaço. É buscar viver a vida na sua plenitude máxima,
respeitando o legal e o outro. (Dr. Lorusso)
Saúde Mental é estar de bem consigo e com os outros. Aceitar as exigências
da vida. Saber lidar com as boas emoções e também com as desagradáveis:
alegria/tristeza; coragem/medo; amor/ódio; serenidade/raiva; ciúmes; culpa;
frustrações. Reconhecer seus limites e buscar ajuda quando necessário.
Os seguintes itens foram identificados como critérios de saúde mental:
Atitudes positivas em relação a si próprio
Crescimento, desenvolvimento e auto realização
Integração e resposta emocional
Autonomia e autodeterminação
Percepção apurada da realidade
Domínio ambiental e competência social
Problemas de saúde mental mais frequentes:
Ansiedade
Mal-estar psicológico ou stress continuado
Depressão
Dependência de álcool e outras drogas
Perturbações psicóticas, como a esquizofrenia
Atraso mental
Demências

Estima-se que em cada 100 pessoas 30 sofram, ou venham a sofrer, num ou


noutro momento da vida, de problemas de saúde mental e que cerca de 12 tenham
uma doença mental grave.
A depressão é a doença mental mais frequente, sendo uma causa importante
de incapacidade.

2 A SAÚDE MENTAL INFANTIL

A saúde mental tem se tornado o foco principal pra uma qualidade de vida,
fazendo com que os profissionais que trabalham nessa área tenham um olhar mais
atento. Para se falar de saúde mental infantil é necessário a compreensão das etapas
de desenvolvimento do ciclo vital, pois é nela que se estrutura o psiquismo. Dentro
deste âmbito é preciso percebermos que se tornaram comuns os problemas infantis
de foro psiquiátrico, que um número significativo destes problemas podem ter um mau
prognóstico e que muitas das perturbações da idade adulta têm as suas raízes em
fatores de risco da infância.
Uma intervenção inicial na promoção de competências que visem aumentar o
bem-estar pode ter efeitos preventivos importantes, como é o caso do aumento da
autoestima e da diminuição do comportamento antissocial.
O campo da psicopatologia desenvolvimental clarificou de que forma os
aspectos do comportamento normativo, tais como as relações com o grupo ou a
autoestima podem estar ligados à propensão para problemas posteriores, como, por
exemplo, a depressão e o comportamento antissocial. Os problemas com as relações
interpessoais entre iguais parecem aumentar o risco de ocorrência de perturbações
na infância e no início da adolescência.
Outros fatores de extrema importância são os fatores de risco familiar. As
crianças cujos progenitores sofrem de problemas de saúde física ou mental têm sido
foco de considerável atenção. Vários estudos de crianças cujos pais sofrem de
perturbação afetiva demonstram a importância das intervenções na família.
Os mecanismos psicossociais por meio dos quais o distúrbio nos pais influencia
o desenvolvimento das crianças parecem ser, principalmente, a discórdia familiar e a
interferência com as funções parentais.
A maior possibilidade que as crianças com problemas de conduta e
perturbações emocionais (especialmente as que foram diagnosticadas numa idade
precoce) têm de mudar o seu comportamento, reside principalmente na melhoria dos
fatores familiares, nas relações positivas de grupos de pares e nas boas experiências
escolares.

3 A SAÚDE MENTAL INFANTIL NO BRASIL

No início do século XX, o movimento higienista teve significativa influência na


psiquiatria infantil brasileira, pois, mesmo não voltando seu olhar para a patologia
mental propriamente dita, lançou bases para uma medicina que se preocupava com a
criança e seu desenvolvimento.
As crianças consideradas normais eram institucionalizadas através das escolas
e internatos. Já as crianças tidas como insanas, eram internadas nos manicômios
dividindo espaço com os adultos, pois não havia estudos ou instituições especificas
voltadas às crianças nesse período.
Dessa maneira, os primeiros estudiosos dos problemas infantis focaram suas
investigações nas desordens evidentes buscando remediá-las, investindo-se no
aperfeiçoamento da assistência pública em ambientes fechados, visando aos
delinquentes, aos retardados e às crianças abandonadas e maltratadas. Naquela
época, o saber médico deslocou sua intervenção também para a prevenção de
doenças, aumentando seu papel na sociedade, bem como sua importância como
apoio técnico-científico ao exercício de poder do Estado, a legitimação da psiquiatria
como uma das instâncias reguladoras do espaço social, extrapolou os limites do asilo
clássico, construindo um saber psiquiátrico preventivo ao qual se vincula o surgimento
da psiquiatria infantil.
No Brasil, é fato recente o reconhecimento, pelas instâncias governamentais,
de que a Saúde Mental de crianças e jovens é uma questão de saúde pública e deve
integrar o conjunto de ações do Sistema Único de Saúde (SUS). Historicamente, as
ações relacionadas à Saúde Mental da infância e adolescência foram, no país,
delegadas aos setores educacionais e de assistência social, com quase ausência de
proposições pela área da Saúde Mental (Couto, Duarte & Delgado 2008). Foucault
(1988) definiu que a biopolítica age na espécie. Ela se preocupa em cuidar de todo o
processo de vida desde o nascimento até a morte, enfim com a saúde da população.
A biopolítica cria técnicas de gestão da vida, nas quais o biológico é o centro
das discussões políticas, com o objetivo de modificá-la, transformá-la, aperfeiçoá-la
para melhor manejá-la. Para Foucault (1988), a valorização e o investimento sobre o
corpo vivo, bem como a gestão distributiva de suas forças foram indispensáveis para
o desenvolvimento do capitalismo.
Na infância esse processo de biologização ou medicalização ocorre na
educação, por intermédio, principalmente do diagnóstico do Transtorno de Distúrbio
de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Esse fenômeno da medicalização do social tão
em evidência no mundo contemporâneo não deixa escapar a população infanto-
juvenil. Podemos observar um aumento cada vez maior de consumo de psicotrópicos
pela infância, principalmente nas crianças em idade escolar. Se de um lado
observamos o avanço do processo da biologização da vida, e em especial da infância.
De outro lado, a atual Política Nacional de Saúde Mental tem definido diretrizes
importantes para a assistência à criança e adolescente. Como observadores mais
próximos da saúde e do bem-estar da criança, os pais devem atender às suas próprias
dúvidas e intuições.
Fonte: italofilosofia.blogspot.com.br

Se por algum motivo o aspecto do seu desenvolvimento, seja ele motor,


cognitivo, emocional ou comportamental os preocupa, deverão pedir ajuda.

4 POLÍTICAS DE SAÚDE PÚBLICA NA SAÚDE MENTAL INFANTIL

As políticas de saúde estão relacionadas, historicamente, com os processos de


urbanização e industrialização. É no século XIX, como já citamos anteriormente, com
as grandes aglomerações populacionais, que nascem medidas de cunho higienista
buscando mudar hábitos alimentares, de moradia, vestimentas que eram, até então,
os principais responsáveis pelos altos índices de mortalidade da população,
notadamente da população infantil. A Saúde Mental Infantil no Brasil, enquanto campo
de intervenção, cuidados e estudos sobre a criança, não teve nada estruturado ou
sistematizado até o século XIX, quando surgiram as primeiras teses em psicologia e
em psiquiatria, especialmente a partir da criação do primeiro hospital psiquiátrico
brasileiro o Hospício D. Pedro II, em 1852 (Ribeiro, 2006).
Na esfera das políticas públicas de saúde tem uma história muito recente.
Podemos tomar como marco a III Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada
em 2001, quando, pela primeira vez, o campo da reforma psiquiátrica brasileira
assumiu publicamente o atraso no enfrentamento da saúde pública com o sofrimento
psíquico na infância. Até então, quem vinha se ocupando das questões específicas
desta parcela da população brasileira era o campo da educação e da assistência
social, com forte tendência à institucionalização das crianças e adolescentes e com
uma expressiva presença de entidades filantrópicas na gestão destas ações. O
relatório final da III Conferência indicou que a construção de uma rede de atenção à
saúde mental infantil começaria pela criação dos Centros de Atenção Psicossocial
para a infância, os CAPSi.
As políticas de saúde mental existentes estão relacionadas aos problemas da
população adulta. Na população de crianças e adolescentes, os tipos de transtorno,
principais fatores de risco e de proteção, estratégias de intervenção e organização do
sistema de serviços têm especificidades que não podem ser contempladas pela
simples extensão das estratégias de cuidado da população adulta à população infantil
e juvenil. Tais especificidades tendem a permanecer invisíveis na agenda mais geral
das políticas de saúde mental, requerendo, assim, a proposição de uma agenda
política específica. A inexistência de políticas de saúde mental infantil em quase todas
as partes do mundo torna o desenvolvimento de políticas nacionais de saúde mental
para infância e adolescência um empreendimento não apenas necessário, como
urgente. Uma política de saúde mental específica para este segmento auxiliaria
substancialmente a ampliação do sistema de serviços, daria institucionalidade à
construção de dados e de informações culturalmente relevantes acerca das questões
que lhe são próprias, e contribuiria para o avanço das pesquisas nesta área.
Com o objetivo de superar esta delegação silenciosa e os problemas
assistenciais que lhe são inerentes, existem hoje ações em direção à implantação de
uma política de saúde mental para infância e adolescência como um plano específico,
integrado à política geral de saúde mental do SUS. A principal finalidade desta política
é a construção de uma rede de cuidados capaz de responder com efetividade às
necessidades de crianças e adolescentes. Duas ações principais estão em curso nos
últimos anos:
1) a implantação pelo SUS de novos serviços de saúde mental para crianças e
adolescentes, os Centros de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil (CAPSi); e
2) a construção de estratégias para articulação intersetorial da saúde mental
com setores historicamente envolvidos na assistência à infância e adolescência:
saúde geral, educação, assistência social, justiça e direitos, com vistas à integralidade
do cuidado. Esta última ação será denominada ao longo deste artigo como 'rede
intersetorial potencial'.
Profundas mudanças vêm se operando a partir das invenções de fazeres para
além da clínica. O abandono, a violência e a segregação destinados à loucura ao
longo da história, vêm gradativamente sendo substituídos por outros recursos e
dispositivos que permitam ao portador de sofrimento mental a retomada ou a
manutenção dos laços sociais, minimizando assim os riscos de sua exclusão
(AMARANTE, 1995). É inegável que os avanços alcançados pela Reforma
Psiquiátrica, se devem à contribuição da Lei Federal 10.216, de 06 de abril de 2001,
que dispõe sobre a proteção e os direitos dos portadores de sofrimento mental grave
e redimensiona o modelo de assistência no campo da saúde mental no Brasil, e da
portaria 336/02 (BRASIL, 2002) que cria uma linha de financiamento para a instalação
e manutenção de Centros de Atenção Psicossociais, como locais prioritários para o
tratamento dos portadores de sofrimento mental. Nesse contexto, devemos considerar
que a Reforma Psiquiátrica tem avançado, mas também tem convocado à invenção
de um “novo” que suporte o real da loucura, chamado aqui de imperativo à construção,
como aponta Couto (2004, p. 61):

[...] a Reforma Psiquiátrica Brasileira vem constituindo nesses 20 anos um


movimento pendular caracterizado por um lado, pelo reconhecimento de
avanços significativos e, por outro, pela imposição permanente de novos de-
safios como se cada conquista festejada fosse acompanhada da evidência
de que ainda há muito a ser feito em direção à construção efetiva de um novo
modo de cuidar e tratar sujeitos atravessados pela radicalidade de certos so-
frimentos psíquicos [...].

À medida que a Reforma Psiquiátrica avança, produz novas demandas para


além da clínica fazendo-se necessária a criação de novas respostas para lidar com a
loucura. Amparada sob o pensamento de que a desinstitucionalização não deve ser
considerada mera extinção de hospitais psiquiátricos, mas como a retomada do
domínio público pela loucura e o restabelecimento dos vínculos sociais pelo paciente
(BASAGLIA, 1985, ROTELLI, 1990; LOBOSQUE, 1997), questões referentes ao que
fazer para os pacientes egressos de hospitais psiquiátricos, como tratá-los a fim de
que os cuidados a eles destinados não redundem novamente em exclusão social
(preconceitos, estigmas), como superar as associações da figura do louco como um
ser incapaz, perigoso e não-cidadão proporcionando o estabelecimento e a
manutenção de seus laços sociais; apontaram para a necessidade de um fazer
coletivo e político no que se refere ao campo da saúde mental. Como dito inicialmente,
avanços têm sido alcançados no campo da saúde mental, mas se pensarmos nas
crianças e adolescentes, podemos nos perguntar sobre o que foi feito ou pensado,
pelos trabalhadores da saúde mental, para as crianças e adolescentes que foram
internadas em instituições totais e excluídas do convívio sócio familiar?
Quando retornam de seu período de internação, assim como os adultos, não
carregam consigo o estigma do internato, as marcas da violência, o apagamento do
sujeito? Sabemos que o regime de exclusão também se impôs a elas ao longo da
história nas mais diversas instituições e manicômios.

Crianças que ainda insistem em ser crianças tem as pernas pequenas, e os


braços ágeis. Crianças que também sabem seu nome, sua idade, seus so-
nhos. Correm para lá e para cá, rente aos muros, na divisa das grades, da
insensibilidade humana. Vivendo no pátio, corredores e portões de ferro...
grades e celas, um quarto de contenção, de choque elétrico. (FIRMINO,
1980).

A partir da verificação dos horrores e a exclusão exercida sobre as crianças,


pôde-se perguntar sobre o lugar destinado a elas no contexto da Reforma Psiquiátrica,
e assim, caminhar rumo a construção de novos dispositivos de atenção a crianças e
adolescentes no campo da saúde mental, amparados por uma política sustentada em
princípios de cidadania. Segundo Bezerra (1994), a cidadania não é um atributo
formal, algo dado aprioristicamente, mas um projeto aberto a ser construído. Para ele,
a construção do lugar do louco na cidade é condição “sine qua non” para cidadania.
Contudo, o cenário da atenção a crianças e adolescentes no campo da saúde mental
testemunha que ainda coexistem intactas, ao lado da Reforma Psiquiátrica, práticas
manicomiais capazes de produzir efeitos tão devastadores quanto os produzidos
pelos hospícios. Para muitas crianças, o campo da saúde mental é ainda cercado,
senão por um silêncio, por uma discrição no tratamento de questões relativas à
loucura, operando-se aí uma sutil exclusão, um sutil confinamento.
A Atenção Primária à Saúde tem se sido foco das discussões em saúde em
todo o mundo. Várias Conferências e Relatórios internacionais1 têm apontado o
investimento na Atenção Primária como a forma mais eficaz na produção de um
sistema de saúde resolutivo (Buss, 2000).
A Conferência Internacional em Alma-Ata (1978), promovida pela Organização
Mundial de Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF),
declarou que a APS é fundamental à assistência sanitária. Isto porque a APS coloca
a assistência em saúde ao alcance de todos os indivíduos e famílias da comunidade,
com sua plena participação e a um custo que a comunidade e o país possam suportar.
A APS, uma vez que constitui o núcleo do sistema nacional de saúde, faz parte do
conjunto do desenvolvimento econômico e social da comunidade.

Fonte: www.mynewshub.cc

A Conferência de Alma-Ata afirmou também que a APS é chave para alcançar


em todo o mundo um nível aceitável de saúde que fizesse parte do desenvolvimento
social e se inspirasse em um espírito de justiça. A meta foi proposta para o ano 2000.
A Declaração de Alma-Ata definiu ainda que a APS devesse se orientar de acordo
com os principais problemas sanitários da comunidade e prestar atenção preventiva,
curativa, de reabilitação e de promoção de saúde. Portanto, a APS não se restringiria
a um programa específico ou à prestação de serviços por meio de pacotes básicos.
Deveria estar interligado com os outros níveis de atenção (Andrade, Barreto &
Bezerra, 2009).
De acordo com o Ministério da Saúde, a Atenção Básica:

[...] caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual


e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de
agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos e a
manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver uma atenção integral
que impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas e nos determi-
nantes e condicionantes de saúde das coletividades.
(Brasil, 2012, p.19).

Sendo assim, APS se constitui como a porta de entrada preferencial do SUS e


também para as ações em Saúde Mental. Ao ser considerada a organizadora dos
demais pontos contínuos de atenção, a APS imprime o caráter de estratégia, podendo
ser capaz de resolver em torno de 90% dos problemas de saúde dos usuários.
(Mendes, 2001).
No ano de 2011 o Ministério da Saúde aprova a Portaria n 2.488 que estabelece
“a revisão de diretrizes e normas para a organização da atenção básica, para a
Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde
(PACS)” e revoga a Portaria n 648 de 2006 (Brasil, 2012, p.13).
A Estratégia da Saúde da Família (ESF) configura-se como principal
modalidade de atuação da atenção básica. Seus princípios são: atuação no território
através do diagnóstico situacional, enfrentamento dos problemas de saúde de
maneira pactuada com a comunidade, buscando o cuidado dos indivíduos e das
famílias ao longo do tempo; buscar a integração com instituições e organizações
sociais e ser espaço de construção da cidadania.
É na Atenção Primária que deveriam chegar todos os tipos de queixa referentes
à Saúde Mental Infantil. Desta forma, acentua-se a importância do conhecimento e da
atenção que os profissionais dos serviços públicos de saúde dão às queixas e
sintomas de Saúde Mental. A escuta cuidadosa das queixas pode possibilitar uma
intervenção efetiva por parte da equipe local. Por outro lado, um encaminhamento
adequado das crianças com problemas mentais para serviços especializados pode
permitir intervenção terapêutica precisa e oportuna. (Brasil, 2005).
De acordo com a pesquisa realizada por Boarini e Borges (1998) a maioria dos
casos atendidos nos serviços de saúde mental da rede pública se refere aos
problemas de aprendizagem ou escolares, questões estas que não necessariamente
necessitam de intervenções especificas de um profissional de saúde mental. Para as
autoras, esse dado pode sugerir que

[...] além de não existir suficiente oferta de serviços para atender àquelas cri-
anças que, provavelmente, necessitam de atendimento especializado em sa-
úde mental, a maior parte do tempo do profissional é absorvida em atendi-
mentos, muitas vezes, dispensáveis. (Boarini; Borges, 1998, p.85).

De acordo com a atual Política Nacional de Saúde Mental, as ações de saúde


mental devem ser desenvolvidas em articulação com a Atenção Básica pela
convergência de princípios entre elas. Mas, para que a saúde mental seja
concretizada na Atenção Básica, é preciso que os princípios do SUS se tornem
práticas cotidianas.
Nesse sentido, ações que envolvam conceitos como acolhimento e vínculo,
atuação em equipe e no território, integralidade do cuidado e responsabilização pelas
ações, trabalho em rede, desinstitucionalização e reabilitação psicossocial, são
condições para a construção de cuidados comuns entre estas políticas. (Borges,
2012).

5 OS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL INFANTO-JUVENIS (CAPSI)

Fonte: 1pjpalhoca.blogspot.com.br

Os CAPSi foram propostos a partir de 2002, sob os mesmos princípios que


regem as demais tipologias de CAPS no país. São serviços territoriais, de natureza
pública, financiados integralmente com recursos do SUS, com a função de prover
atenção em saúde mental baseados na integralidade do cuidado. Foram planejados
inicialmente para as cidades com 200.000 habitantes ou mais, com a finalidade de
atender casos de maior gravidade, conforme deliberação da III Conferência Nacional
de Saúde Mental realizada em 2001, e ordenar a demanda em saúde mental infantil
e juvenil no seu território de abrangência.
Compostos por equipes multiprofissionais - contendo no mínimo um psiquiatra,
neurologista ou pediatra com formação em saúde mental infantil, um enfermeiro,
quatro profissionais de nível superior (entre: psicólogo, assistente social, terapeuta
ocupacional, fonoaudiólogo, pedagogo) e cinco profissionais de nível médio - os
CAPSi devem se responsabilizar pelo atendimento regular de um número limitado de
pacientes e de suas famílias, em regimes diferenciados de tratamento, segundo as
necessidades de cada caso (intensivo, semi-intensivo e não intensivo),
desenvolvendo um elenco diversificado de atividades terapêuticas. São prioritários os
atendimentos para autistas, psicóticos e para todos aqueles cuja problemática incida
diretamente em prejuízos psicossociais severos (na socialização, inclusão escolar,
familiar/comunitária etc.).
Os CAPSi são também encarregados de desenvolver ações para conhecimento
e ordenação das diferentes demandas que concernem à saúde mental da infância e
adolescência no território sob sua responsabilidade. Esta inflexão para o território,
conjugada ao atendimento dos casos, imputa a estes serviços um duplo mandato:
terapêutico e gestor. Este último deve ser realizado por meio:
1) do levantamento das reais necessidades em saúde mental presentes no
contexto social específico onde está inserido e nos equipamentos públicos locais
como, por exemplo, escolas, conselhos tutelares, abrigos, postos de saúde e demais,
por intermédio de reuniões regulares e/ou outras estratégias pertinentes;
2) da pactuação de fluxos pelos diferentes serviços/setores, visando à melhor
cobertura das demandas que, mesmo não requerendo tratamento diário e intensivo,
exigem cuidado e tratamento.

Fonte: www.ibamendes.com
As demandas para o tratamento de crianças, não raramente, convocam os
psicólogos à conversão dos comportamentos “anormais” em “normais”, na tentativa
de restabelecer a ordem para aquilo que vai à contramão dos valores dominantes
sobre a normalidade. Caso os psicólogos respondam a esta demanda, também
contribuirão como parcela significativa para a desassistência à crianças no campo da
saúde mental, pois como avançar e pensar na loucura da criança, se os profissionais
responsáveis pelo seu cuidado se assentarem sob o imperativo de restaurá-las de
acordo com os ideais sociais de normalidade? Ao ser considerada como anormal e
passível de conserto, não estaria sendo retirada da criança a possibilidade de
subjetivar suas questões e criar saídas singulares para lidar com seu mal-estar,
mesmo que uma dessas saídas seja a loucura?
Segundo Ferreira (2004) se o campo da saúde mental do adulto toma a loucura
como uma questão do sujeito, no que concerne à criança, não raro ela se encontra
sob o manto da deficiência; e estando “a loucura” da criança encoberta sob o manto
da deficiência e considerada como algo momentâneo a ser ajustado em um momento
posterior há um caminho “natural” sinalizado, que substitui o tratamento, que é o
encaminhamento à educação especial em instituições, não raramente, com
semblantes bastante parecidos aos hospícios para adultos. Sendo assim, se todas as
vezes que uma criança tornar-se refratária ao ideal de “normalidade” for engendrada
numa noção de deficiência e raramente reconhecida como “louca”, a assistência à
criança no campo da saúde mental permanecerá em um marasmo, se comparado à
saúde mental do adulto.

6 A POTÊNCIA DO ACOLHIMENTO

O acolhimento realizado nas unidades de Saúde é um dispositivo para a


formação de vínculo e a prática de cuidado entre o profissional e o usuário. Em uma
primeira conversa, por meio do acolhimento, a equipe da unidade de Saúde já pode
oferecer um espaço de escuta a usuários e a famílias, de modo que eles se sintam
seguros e tranquilos para expressar suas aflições, dúvidas e angústias, sabendo
então que a UBS está disponível para acolher, acompanhar e se o caso exigir, cuidar
de forma compartilhada com outros serviços.
Estes encontros com os usuários oferecem ao profissional a possibilidade de
conhecer as demandas de saúde da população de seu território. Com este
conhecimento, a equipe de Saúde tem como criar recursos coletivos e individuais de
cuidado avaliados como os mais necessários ao acompanhamento e ao suporte de
seus usuários e de sua comunidade.
No campo da Saúde Mental, temos como principais dispositivos comunitários
os grupos terapêuticos, os grupos operativos, a abordagem familiar, as redes de apoio
social e/ou pessoal do indivíduo, os grupos de convivência, os grupos de artesanato
ou de geração de renda, entre outros. Estes dispositivos também podem ser úteis na
abordagem de problemas de saúde de outros campos e, neste caderno, alguns
capítulos serão dedicados a abordar a especificidade de cada um destes recursos no
campo da Saúde Mental, com olhar específico para a Atenção Básica.

7 O PROFISSIONAL DE SAÚDE

Pois bem, vamos falar sobre essa sensação de insegurança que permeia as
intervenções de saúde mental. Boa parte da formação dos profissionais de Saúde tem
orientado o seu foco de trabalho na doença. Por essa razão, entre outras, muitas das
expectativas que temos acerca de como lidar com os casos de saúde mental são de
acabar com os sintomas que os usuários nos expõem.
No âmbito da Saúde Mental, muitas vezes não conseguiremos corresponder a
esta tradição e expectativa. E devemos realmente perguntar se os sintomas
manifestados pelos usuários são as causas dos seus problemas ou se tais sintomas
também não estão realizando uma função de indicar que algo não vai bem com aquele
usuário.
Alguns dos medos revelados pelos profissionais de Saúde sobre o manejo das
demandas de saúde mental são justificados por essa expectativa de cura. Os
profissionais alegam não saber o que falar ou perguntar, tem receios de piorar o
quadro dos pacientes de saúde mental, ou entendem que este campo do saber não
lhes é acessível.
Quando um trabalhador de Saúde conta a um colega sobre uma situação de
saúde mental é comum, virem à cabeça de ambos, questionamentos sobre como lidar
com o caso. Pois bem, sabemos que no contexto da Atenção Básica vivenciamos
diferentes sensações, emoções e sentimentos no convívio com usuários e colegas de
equipe.
Neste contexto, é pertinente que questionemos os conhecimentos que temos,
as técnicas que utilizamos, as atitudes e intervenções que realizamos em combinação
com usuários e colegas. E se aprofundamos tais questionamentos, acabamos por
refletir acerca do que iremos perguntar quando estivermos frente a frente com aquele
usuário.
Este exercício de reflexão deve ser feito tendo no horizonte que nem sempre
haverá como definir perguntas ou afirmações corretas. Já mencionamos neste
capítulo que o trabalho na Atenção Básica é longitudinal, ou seja, que o cuidado à
saúde das pessoas deve acontecer ao longo do tempo, independentemente do
usuário estar com alguma doença.
Portanto, trata-se de um acompanhamento processual. A proximidade com o
usuário, seu território e sua realidade vão auxiliar a construção deste processo de
cuidado em que se espera uma fortificação do vínculo entre profissional de Saúde e
usuário.
Por tratar-se de um processo, mesmo que o profissional se sinta na obrigação
de orientar algo ao paciente em resposta àquilo que este, por sua vez demanda, nem
sempre haverá necessidade da pressa. Por vezes, a sensação de não saber o que se
está fazendo pode causar um sentimento de desconforto, impotência, auto
depreciação e até mesmo de culpa nos trabalhadores de Saúde.
Não é nada incomum escutar o relato de um usuário sobre alguma situação
comovente e procurar um colega de trabalho para desabafar ou pedir uma orientação.
No entanto, não há nada de errado nesta atitude. Ela apenas demonstra claramente
que os trabalhadores de Saúde não são insensíveis às situações ocorridas nos
encontros com os usuários. O profissional também tem a necessidade de desabafar
e conseguir visualizar sob outras perspectivas as emoções que o encontro com um
usuário lhe suscitou.
A dificuldade de lidar emocionalmente com estes encontros pode propiciar
distanciamento ou resistência ao trabalho com a saúde mental. Portanto, é preciso
que o profissional realize um esforço de separar emocionalmente as suas vivências:
os valores pessoais das vivências e os valores pessoais dos usuários que
acompanha.
Por vezes, pode ocorrer ao trabalhador de Saúde desejar que o usuário mude
aspectos da vida em função de valores pessoais do profissional, os quais podem não
estar em sintonia com a autonomia e os valores pessoais dos usuários. No entanto,
para lidar com isso, é preciso discutir os casos em equipe em espaços protegidos, ou
procurar suporte com equipes de apoio matricial.
É preciso cuidado para que as intervenções de saúde não se transformem em
regras rígidas, sob a consequência de que estas ações estejam apenas baseadas na
remissão dos sintomas, descontextualizadas da vida do usuário e do território em que
ele vive. É preciso que o usuário possa se perguntar sobre a relação do seu sofrimento
com a manifestação sintomática que está acontecendo. Ainda que necessárias para
alguns casos, nem sempre intervenções que se orientem diretamente à supressão
dos sintomas estarão aliadas a uma intervenção positiva na vida do usuário.
Procuraremos discutir de que formas podemos enfrentar os desafios que se
colocam para a realização do cuidado em saúde mental na Atenção Básica.
Terminamos este capítulo propondo um exercício de reflexão, para que o leitor possa
refletir acerca de como está lidando diante das demandas de saúde mental.

8 FAMÍLIA E SOFRIMENTO PSÍQUICO: O DESAFIO DO PROTAGONISMO FA-


MILIAR

Fonte: www.eusemfronteiras.com.
A reforma psiquiátrica brasileira traz imensas contribuições na forma de
conceber e perceber a família no contexto do cuidado em saúde mental. Antes de sua
implementação, a forma de tratamento disponível para as pessoas em sofrimento
psíquico era baseada no isolamento e na exclusão, sendo os sujeitos privados do
contato com sua família e com a sociedade.
Não havia investimentos na mobilização das famílias como participantes
importantes no tratamento, já que o indivíduo era visto de maneira isolada e como
doente. A principal diretriz da Política Nacional de Saúde Mental, inspirada na reforma
psiquiátrica brasileira, consiste na redução gradual e planejada de leitos em hospitais
psiquiátricos, priorizando concomitantemente a implantação de serviços e ações de
saúde mental de base comunitária, capazes de atender com resolubilidade os
pacientes que necessitem de atenção (BRASIL, 2005).
Dentro dessa perspectiva, a família é requisitada como parceira dos novos
serviços e reafirmada como um dos possíveis espaços do provimento de cuidado
(ROSA, 2004), passando a ser concebida como necessária e aliada no cuidado de
seu familiar em sofrimento psíquico.
Dessa forma, o que se almeja não é simplesmente a transferência da pessoa
com sofrimento mental para fora dos muros do hospital, entregando-o aos cuidados
de quem puder assisti-lo ou largando-o à própria sorte. Espera-se o resgate ou o
estabelecimento da sua cidadania, “o respeito a sua singularidade e subjetividade,
tornando-o como sujeito de seu próprio tratamento sem a ideia de cura como o único
horizonte.
Espera-se, assim, a autonomia e a reintegração do sujeito à família e à
sociedade” (GONÇALVES; SENA, 2001, p. 51). Os profissionais de Saúde, em muitas
situações, esperam que a família aceite e cuide da pessoa em sofrimento psíquico
intenso sem se dar conta de que não estão lhe oferecendo suporte nem orientações
(KOGA, 1997); ou percebem o familiar como um simples informante das alterações
apresentadas pela pessoa em tratamento, que deve seguir passivamente suas
prescrições de tratamento.
Considerar a família como protagonista do cuidado reabilitador é um verdadeiro
desafio. Ao acolher suas demandas e dificuldades de convívio com um familiar em
sofrimento psíquico intenso, o profissional promove o suporte possível para as
solicitações manifestas (COLVERO et. al., 2004).
Essas famílias possuem demandas das mais variadas ordens, entre elas: a
dificuldade de lidar com as situações de crise, com os conflitos familiares emergentes,
com a culpa, com o pessimismo por não conseguir vislumbrar saídas para os
problemas, pelo isolamento social a que ficam sujeitos, pelas dificuldades materiais
da vida cotidiana, pelas complexidades do relacionamento com esse familiar, pela
expectativa frustrada de cura e pelo desconhecimento da doença propriamente dita
(COLVERO et. al., 2004).
Torna-se fundamental considerar que o provimento de cuidado doméstico à
pessoa com sofrimento psíquico é um trabalho complexo, historicamente retirado da
família e que agora lhe está sendo restituído. Esse cuidado requer disponibilidade,
esforço, compreensão, capacitação mínima, inclusive para que os cuidadores
encontrem estratégias para lidar com frustrações, sentimentos de impotência e culpa,
ou seja, com suas próprias emoções.

9 A ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA

Fonte: www.snpcultura.org

A Estratégia Saúde da Família (ESF), concebe a família de forma integral e


sistêmica, como espaço de desenvolvimento individual e grupal, dinâmico e passível
de crises, inseparável de seu contexto de relações sociais no território em que vive.
A família é, ao mesmo tempo, objeto e sujeito do processo de cuidado e de
promoção da saúde pelas equipes de Saúde da Família. Na ESF o vínculo entre os
profissionais de Saúde, a família e a comunidade é concebido como fundamental para
que as ações da equipe tenham impacto positivo na saúde da população.
Esse vínculo de confiança vai sendo fortalecido por meio da escuta, do
acolhimento, da garantia da participação da família na construção do Projeto
Terapêutico Singular (PTS), da valorização da família enquanto participante ativa do
tratamento etc.
Na metodologia de trabalho das equipes de SF, o cadastramento das famílias
e o diagnóstico da situação de saúde da população permitem que os profissionais
prestem atenção diferenciada às famílias em situação de risco, vulnerabilidade e/ou
isolamento social.
As famílias com pessoas em sofrimento psíquico intenso e usuárias de álcool
e outras drogas necessitam de atenção especial, e um primeiro passo nesse sentido
é instrumentalizar os agentes comunitários de Saúde (ACS) na identificação dessas
situações.
Vecchia e Martins (2009) ressaltam que a estratégia de atender prioritariamente
as famílias com maiores dificuldades psicossociais é importante, desde que tal
priorização não produza estigmatizações, levando em consideração o dinamismo e a
complexidade da vida de cada família.
A Estratégia Saúde da Família, por ter como ação as visitas mensais aos
moradores de uma determinada área, possibilita que pessoas e famílias em situação
de maior risco sejam atendidas. Podem ser pessoas que não comparecem às
consultas, que não solicitam ajuda (por exemplo, as que fazem uso prejudicial de
drogas), que sofrem atos de violência, que estão em risco de suicídio ou em cárcere
privado.

10 ABORDAGEM FAMILIAR: FERRAMENTAS E RECOMENDAÇÕES

Para uma abordagem familiar é importante aliar conhecimentos científicos e


tecnológicos às habilidades de observação, comunicação, empatia e intervenção, o
que requer aperfeiçoamento de competências profissionais.
Na abordagem familiar, considera-se que a saúde da família vai além da soma
da saúde dos indivíduos.
Sendo assim, espera-se que a equipe de Atenção Básica à Saúde seja capaz
de identificar e desenvolver as seguintes especificidades:
– Conceituar família e considerar sua complexidade.
– Cuidar com base na experiência da família ao longo do tempo, ou seja, sua
história pregressa, atual e perspectivas futuras.
– Trabalhar com todos da família, tanto doentes como sadios.
– Que a família enquanto um sistema é afetada pela mudança de qualquer um
de seus membros.
– Reconhecer que a pessoa mais sintomática (doente) da família também pode
mudar com o tempo.
– Promover apoio mútuo e compreensão entre os membros da família sempre
que possível.
– Levar em conta o contexto social e cultural da família na facilitação de suas
relações com a comunidade.
Outro aspecto importante é a contradição família pensada versus família vivida
e a sua outra face família estruturada versus família desestruturada, apoiada em uma
visão sistêmica inclusiva e não conservadora que reconhece múltiplas estruturas
familiares que nada mais são do que formas diferentes de ser família e que vão
ganhando contornos específicos por intermédio do tempo e das peculiaridades do
espaço geográfico, social e cultural (SOARES; PAGANI; OLIVEIRA, 2005).
Consolidada tal compreensão, os profissionais terão critérios para avaliar o
enredo, a estrutura e a dinâmica do sistema familiar, elaborando um plano de trabalho
multidisciplinar com as estratégias mais adequadas e possíveis.
Sugerem-se formas de atuação da equipe que fortaleçam:
1) a competência da família em garantir a sobrevivência material dos seus
membros utilizando sua rede social primária (parentes, amigos e vizinhos), as
instituições e as redes sociais comunitárias;
2) suas relações afetivas e novas possibilidades de agir, pensar e conviver;
3) sua participação social e comunitária enquanto exercício de cidadania.
Essa atuação pode ser realizada de diferentes maneiras, como:
– Oferecimento de acolhimento, escuta regulares e periódicas;
– Grupos de orientação aos familiares;
– Grupos de cuidado aos cuidadores;
– Intervenções domiciliares que diminuam a sobrecarga da família cuidadora;
– Oferecimento de dispositivos da rede social de apoio onde os familiares,
cuidadores de pessoas com sofrimento psíquico possam ter garantido também
espaços de produção de sentido para sua vida, vinculadas a atividades prazerosas e
significativas a cada um.
Aqui exemplificamos algumas ferramentas úteis para o trabalho com família.
Vale ressaltar que devido às diversidades e às singularidades, muitas vezes será
necessário buscar outras ferramentas ou até mesmo criar sua própria ferramenta de
trabalho com família.

11 LEI DE AMPARO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE

O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8069/1990, aprovada em 13 de


Julho e sancionada e em vigor a partir de Outubro de 1990, foi o marco legal e social
na proteção e no atendimento de crianças e adolescentes a partir do artigo 227 da
Constituição Federal de 1988, que aborda a prioridade absoluta e a proteção como
Dever da Família, da Sociedade e do Estado.
As raízes e bases de sustentação dos vários artigos têm origem na
efervescente mobilização nacional e o trabalho desenvolvido por inúmeros
especialistas durante a campanha brasileira Criança e Constituinte e com reflexos
internacionais, pois a Convenção dos Direitos da Criança. Trata-se de uma Lei que é
o fruto do esforço conjunto de milhares de pessoas e comunidades empenhadas na
defesa da democracia e no reconhecimento das crianças e adolescentes como
sujeitos de direitos! O respeito à Lei assegura que a opressão e o abandono se
transformem em justiça, dignidade e promoção à vida dos milhões de crianças e
adolescentes, agora considerados cidadãos do Brasil.
São 8 artigos dos direitos fundamentais dedicados ao Direito à Vida e à Saúde,
artigos 7o ao 14o, mas todos os demais artigos interagem com estes para garantir os
direitos à liberdade, ao respeito, à dignidade, à convivência familiar e comunitária, à
educação, à cultura, ao esporte e ao lazer, incluindo o direito de brincar e de não ser
explorado, abusado, maltratado ou traumatizado pela violência de quaisquer pessoas,
serviços ou instituições.
Desde mesmo antes do nascimento, pois nos artigos 7 o e 8o estão assegurados
à gestante e assim ao seu recém-nato os atendimentos pré e peri-natal mediante a
efetivação de políticas sociais, gratuitas e públicas que permitam o nascimento sadio
e harmonioso, em condições dignas de existência. É o estabelecimento do binômio
mãe-filho, e a seguir família-criança, como determinantes do processo crítico e
dinâmico para o crescimento, desenvolvimento e maturação cerebral, mental e
corporal e que serão marcantes na trajetória de vida das pessoas, como brasileiros
em suas expressões no meio ambiente e no contexto social.
A importância da proteção legal ao alojamento conjunto, à amamentação, ao
registro do recém-nascido, ao acesso universal e igualitário às ações e serviços de
assistência médica e odontológica e ações de promoção, proteção e recuperação da
saúde, incluindo tratamentos, medicamentos, próteses e vacinações e o atendimento
especializado às crianças com deficiências, além de assegurar as condições
necessárias para o acompanhamento e permanência em tempo integral de um dos
pais ou responsável, nos casos de hospitalização da criança ou adolescente, são
artigos que garantem os direitos à saúde e ao bem-estar de todos brasileirinhos e
brasileirinhas, como um investimento prioritário, sem favores ou esmolas, no
orçamento público.
Também a importância do artigo 13 que determina que todos os casos de
suspeita ou confirmação de maus-tratos ou violência, abusos ou exploração contra a
criança ou adolescente serão notificados e obrigatoriamente comunicados ao
Conselho Tutelar da respectiva localidade, inovando assim o conceito de “maus tratos”
da violência como problema de saúde. Atualmente, o ECA já recebeu várias
modificações, incluindo a Lei 13010/2014 mais conhecida como Lei Menino Bernardo
que prevê adoção de políticas públicas e medidas que permitam a educação
preventiva contra a violência do castigo e tratamento cruel e degradante de crianças.
E a Lei 12.594/2012 que institui o SINASE, Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo.
Os artigos 240 e 241 também foram atualizados em relação aos crimes de
exploração sexual de crianças e adolescentes através da rede mundial de
computadores ou internet. Protocolos opcionais das Nações Unidas também foram
assinados em 2000 e ratificados em 2004, pelo Brasil, como os sobre a prevenção de
conflitos armados e a exploração sexual e pornografia envolvendo crianças e
adolescentes.
11.1 O que diz a Lei 10.216/2001

O Governo Federal, procurando atender a Saúde Mental da população, editou


a Lei nº 10.216/2001, que tem por finalidade proteger e garantir os direitos das
pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em
saúde mental. Conforme esta lei, todos os pacientes que padecem de transtornos
mentais têm direito a ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, adequado
às suas necessidades, bem como ser tratado com humanidade e respeito, e no
interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela
inserção na família, no trabalho e na comunidade.
Além disso, estes pacientes deverão ser protegidos contra qualquer forma de
abuso e exploração, tendo garantia de sigilo nas informações prestadas a respeito de
sua doença e com direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a
necessidade ou não de uma possível hospitalização involuntária.
Os pacientes podem ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis e
devem receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu
tratamento.

11.2 Lei de Amparo às pessoas portadoras de transtornos mentais

LEI No 10.216, DE 6 DE ABRIL DE 2001


Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos
mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental
Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental,
de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto
à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade,
família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu
transtorno, ou qualquer outra.
Art. 2o Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e
seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos
enumerados no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:
I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas
necessidades;
II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de
beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no
trabalho e na comunidade;
III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;
IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas;
V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a
necessidade ou não de sua hospitalização involuntária;
VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;
VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de
seu tratamento;
VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos
possíveis;
IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Art. 3o É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde
mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos
mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada
em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades
que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.
Art. 4o A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada
quando os recursos extra hospitalares se mostrarem insuficientes.
§ 1o O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do
paciente em seu meio.
§ 2o O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a
oferecer assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo
serviços médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros.
§ 3o É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em
instituições com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos recursos
mencionados no § 2o e que não assegurem aos pacientes os direitos enumerados no
parágrafo único do art. 2o.
Art. 5o O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize
situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de
ausência de suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e
reabilitação psicossocial assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária
competente e supervisão de instância a ser definida pelo Poder Executivo,
assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário.
Art. 6o A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico
circunstanciado que caracterize os seus motivos.
Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação
psiquiátrica:
I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;
II - internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário
e a pedido de terceiro; e
III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça.
Art. 7o A pessoa que solicita voluntariamente sua internação, ou que a
consente, deve assinar, no momento da admissão, uma declaração de que optou por
esse regime de tratamento.
Parágrafo único. O término da internação voluntária dar-se-á por solicitação
escrita do paciente ou por determinação do médico assistente.
Art. 8o A internação voluntária ou involuntária somente será autorizada por
médico devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina - CRM do Estado
onde se localize o estabelecimento.
§ 1o A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas
horas, ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do
estabelecimento no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser
adotado quando da respectiva alta.
§ 2o O término da internação involuntária dar-se-á por solicitação escrita do
familiar, ou responsável legal, ou quando estabelecido pelo especialista responsável
pelo tratamento.
Art. 9o A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação
vigente, pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do
estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e
funcionários.
Art. 10. Evasão, transferência, acidente, intercorrência clínica grave e
falecimento serão comunicados pela direção do estabelecimento de saúde mental aos
familiares, ou ao representante legal do paciente, bem como à autoridade sanitária
responsável, no prazo máximo de vinte e quatro horas da data da ocorrência.
Art. 11. Pesquisas científicas para fins diagnósticos ou terapêuticos não
poderão ser realizadas sem o consentimento expresso do paciente, ou de seu
representante legal, e sem a devida comunicação aos conselhos profissionais
competentes e ao Conselho Nacional de Saúde.
Art. 12. O Conselho Nacional de Saúde, no âmbito de sua atuação, criará
comissão nacional para acompanhar a implementação desta Lei.
Art. 13. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 6 de abril de 2001; 180o da Independência e 113o da República.

12 INTERVENÇÃO EM SAÚDE MENTAL

Os profissionais de Saúde costumam refletir consigo e por vezes ficam em


dúvida sobre quais situações de sua realidade cotidiana necessitam de intervenções
em saúde mental. Imaginamos que, algumas vezes todo profissional de Saúde já
tenha se sentido inseguro, surpreso ou sem saber como agir assim que identificou
uma demanda de saúde mental.
Também acreditamos ser provável que em algumas destas situações o
profissional se sente improvisando, ou usando a intuição e o bom senso. Pois bem,
para início de conversa, podemos dizer que estas reflexões e sensações são comuns
à prática em saúde. Contudo, sentir-se sem chão ou sem um saber técnico específico
não é indicativo suficiente para definir que uma intervenção em saúde mental possa
estar equivocada.
Entendemos que as práticas em saúde mental na Atenção Básica podem e
devem ser realizadas por todos os profissionais de Saúde. O que unifica o objetivo
dos profissionais para o cuidado em saúde mental devem ser o entendimento do
território e a relação de vínculo da equipe de Saúde com os usuários, mais do que a
escolha entre uma das diferentes compreensões sobre a saúde mental que uma
equipe venha a se identificar.
Mesmo os profissionais especialistas em saúde mental elaboram suas
intervenções a partir das vivências nos territórios. Ou seja, o cuidado em saúde mental
não é algo de outro mundo ou para além do trabalho cotidiano na Atenção Básica.
Pelo contrário, as intervenções são concebidas na realidade do dia a dia do território,
com as singularidades dos pacientes e de suas comunidades.
Portanto, para uma maior aproximação do tema e do entendimento sobre quais
intervenções podem se configurar como de saúde mental, é necessário refletir sobre
o que já se realiza cotidianamente e o que o território tem a oferecer como recurso
aos profissionais de Saúde para contribuir no manejo dessas questões. Algumas
ações de saúde mental são realizadas sem mesmo que os profissionais as percebam
em sua prática.

13 O CUIDADO QUE DÁ CERTO EM SAÚDE MENTAL

As intervenções em saúde mental devem promover novas possibilidades de


modificar e qualificar as condições e modos de vida, orientando-se pela produção de
vida e de saúde e não se restringindo à cura de doenças.
Isso significa acreditar que a vida pode ter várias formas de ser percebida,
experimentada e vivida. Para tanto, é necessário olhar o sujeito em suas múltiplas
dimensões, com seus desejos, anseios, valores e escolhas. Na Atenção Básica, o
desenvolvimento de intervenções em saúde mental é construído no cotidiano dos
encontros entre profissionais e usuários, em que ambos criam novas ferramentas e
estratégias para compartilhar e construir juntos o cuidado em saúde.
Os profissionais de Saúde realizam diariamente, por meio de intervenções e
ações próprias do processo de trabalho das equipes, atitudes que possibilitam suporte
emocional aos pacientes em situação de sofrimento. Serão apresentadas e
desenvolvidas ao longo deste caderno algumas destas atitudes.
14 QUANDO UMA CRIANÇA DEVE FAZER PSICOTERAPIA

Fonte: avaliacaoneuropsico.com.br

Às vezes as crianças, tal como os adultos, podem necessitar ou beneficiar de


uma Psicoterapia. Os Psicoterapeutas ajudam as crianças e as famílias a lidarem com
situações de stress e com uma grande variedade de problemas emocionais e
comportamentais, ajudando a criança a desenvolver habilidades para reso ver
problemas e também ensiná-los a procurar ajuda.
Muitas vezes os pais recorrem a ajuda especializada quando as crianças
passam por dificuldades na escola, como ansiedade aos testes, dificuldades de
aprendizagem, de atenção ou concentração. Estes são sintomas manifestos de algo
que se passa e muitas vezes são a maneira que a criança encontra para demonstrar
o seu sofrimento. Grande parte das crianças precisa de ajuda para pensar e organizar
os seus sentimentos sobre as suas relações familiares, especialmente se há eventos
de vida significativos, tais como a morte de um familiar, amigo ou animal de estimação,
divórcio ou uma mudança, um abuso ou uma doença grave na família que podem
causar estresse e levar a problemas com comportamento, humor, sono, apetite etc.
Mas outras situações menos evidentes podem também surtir um efeito
desorganizador e apesar de não ser tão claro o que causou sofrimento à criança, de
repente esta parece retirada, ansiosa, preocupada, zangada ou chorosa. Quando
buscar ajuda:
Atraso do desenvolvimento da fala e linguagem
Dificuldades de aprendizagem ou problemas de atenção e concentração
Dificuldades em estar só ou elaborar tarefas sozinho
Problemas de comportamento
Queda significativa dos resultados escolares
Episódios de tristeza, depressão, choro ou retraimento social e isolamento
Ser vítima de bullying ou exercê-lo sobre outras crianças
Diminuição do interesse em atividades antes apreciadas
Comportamento excessivamente agressivo
Questões relacionadas com o luto
Problemas com as mudanças (separação, divórcio, recolocação)
Abuso sexual, físico, emocional ou outros eventos traumáticos etc.

15 LUDOTERAPIA

Fonte: psicoter.com.br

Psicoterapia infantil consiste na relação de cooperação entre o terapeuta e a


criança. O terapeuta clínico exerce o papel de facilitador do autoconhecimento,
possibilitando à criança vivenciar e experienciar a liberdade e o poder de decisão por
meio de espaço, escuta, nominação de seus desejos e respeito pela sua
singularidade. Auxilia a criança ao reencontro consigo mesma e a ressignificar
sofrimento psíquico em forma de sintomas.
O trabalho terapêutico com criança ocorre através de técnicas lúdicas, é por
meio do brincar que a criança vive, revive e sente as experiências de sua relação com
ela mesma e com o mundo exterior. Consequentemente, cria-se o espaço do
simbólico (imaginário) possibilitando a elaborar as partes do mundo” faz-de-conta”. No
lúdico a criança vivencia situações de ameaças, perigos, medos, e prazeres que
conduzem a fatos de sua vida real através do simbólico.
O terapeuta acessa a criança por meio do brincar, onde ela elabora situações
traumáticas psiquicamente através da transformação do que foi vivido passivamente
em algo ativo, bem como expressa fantasias e desejos de forma simbólica. Os
brinquedos são de suma importância na vida das crianças, pois é através deles que a
criança interage socialmente, aprende a importância da negociação e da divisão, das
regras, a argumentar na resolução de conflitos que surgem, melhoram aprendizagem
e desenvolve habilidade.
Em primeiro lugar a criança encontra-se com um ludoterapeuta que está
treinado para promover durante a sessão um ambiente de aceitação, empatia e
compreensão. Depois, o brincar de que aqui falamos não é semelhante ao brincar em
que geralmente observamos as crianças, uma vez que a ludoterapia simplesmente se
apropria do brincar enquanto gesto natural da criança para exprimir as suas
preocupações em reação a situações de vida, utilizando objetos familiares à sua volta
para compreender situações de stress ou novas aprendizagens.
Na sala de ludoterapia, é a criança que conduz a brincadeira, quando quer e
como quer, escolhendo os brinquedos. Não se parte do princípio de que se vai
transformar a criança ou fazer coisas para ela. O ludoterapeuta está com a criança
plenamente, utilizando os seus conhecimentos e técnicas para compreender a
criança, através do seu próprio olhar. Será como perguntar: “Como sente as coisas
aquela criança?” Não tentará resolver os seus problemas, mas sim compreender a
criança. Assim, podemos encarar a ludoterapia para as crianças como a psicoterapia
para os adultos.
As crianças poderão sentir dificuldades na expressão das suas emoções e em
compreender o impacto que estas têm na sua vida. É frequente não saberem o que
sentem nem como as controlar, uma vez que ainda não estão suficientemente
desenvolvidas ao nível emocional, cognitivo e linguístico. No entanto, estando na
presença de um adulto que as tenta compreender de forma empática, proporcionando
segurança e utilizando brinquedos selecionados e que possibilitam a sua expressão
emocional criativa, dá-se um passo para a expressão e exploração do seu self –
sentimentos, pensamentos, experiências, comportamentos, dificuldades, que vão
potenciar a mudança terapêutica.
Nesta exploração, a criança enfrenta os seus sentimentos de frustração,
agressividade, medo, insegurança, confusão, entre tantos outros, aprendendo a
controlá-los ou a abandoná-los, ao mesmo tempo que vai percebendo que é uma
pessoa autónoma e com direito a sentir todas essas emoções. Assim, o brincar é a
forma natural de a criança se expressar, tal como falar é a forma natural de o adulto
se expressar. Na sala dos brinquedos, estes são usados como palavras e o brincar é
a linguagem da criança. Percebemos a importância do brincar para a criança, não só
pela sua utilização num contexto terapêutico, mas também pela importância da
brincadeira em todas as dimensões da vida da criança. Mas em que consiste, de fato,
o brincar? Uma ideia difundida popularmente limita o ato de brincar a um simples
passatempo, sem funções mais importantes que entreter uma criança com atividades
divertidas. Sabe-se atualmente que esta ideia está completamente errada.
Bergman (1998) afirma que o brincar é uma forma de linguagem. A maior parte
das características desta linguagem pode ser constatada logo nos primeiros contatos
das crianças com os seus pais ou com aqueles que cuidam delas. As mães ou as
pessoas responsáveis pelos cuidados dos bebés ajudam-nos a brincar, desde muito
pequenos, quando interagem com eles. Através de uma atitude e de uma linguagem
segura, esses adultos estabelecem com os bebés laços de confiança que possibilitam
o início do brincar.
Este é considerado como uma linguagem, uma vez que permite às crianças
comunicar com as outras pessoas e iniciar a compreensão, desde muito cedo, de que
podem suportar e representar a ausência temporária das pessoas que amam,
substituindo-as pelas primeiras brincadeiras. O processo do brincar é apreciado tal
como é pela criança e o produto final do brincar não é o mais importante desta
atividade. A maioria dos adultos é capaz de expressar sob a forma verbal os seus
sentimentos, frustrações e angústias; no entanto, a criança, por ainda não ter
facilidade cognitiva e verbal, utiliza os brinquedos como palavras. Podemos mesmo
dizer que quando a criança brinca, o seu ser está totalmente presente. Entende-se
então que o brincar é realmente uma forma de atividade complexa, que envolve a
criança física, mental, social e emocionalmente, revelando os seus sentimentos,
experiências e reações a essas mesmas experiências (desejos, receios, percepção
de si própria, entre outros).
Através do brincar, a criança conhece o Mundo, e com ele, conhece as
pessoas, as relações e regras sociais; pode imitar o adulto, expressando conflitos,
além de, ao brincar, serem transmitidos conhecimentos educacionais e este ser
igualmente um indicativo do desenvolvimento da criança: as brincadeiras duma
criança podem ser indicativas de alguma dificuldade ou desenvolvimento tardio em
determinado aspecto, visível aos pais e outros adultos que contatam diariamente com
a criança. O brincar está muito presente no dia-a-dia de uma educadora de infância.
É o instrumento principal pelo qual as crianças aprendem coisas novas e crescem a
cada dia, a todos os níveis: cognitivo, emocional, linguístico, social e motor.
É imprescindível haver este espaço para que as crianças se possam
desenvolver. Além de fonte de lazer, o brincar é simultaneamente fonte de
conhecimento. É esta dupla natureza que nos leva a considerar o brincar como parte
integrante da atividade educativa, sobretudo no pré-escolar. Infelizmente, a
brincadeira começa a ganhar cada vez menos importância, à medida que as crianças
crescem, começando a haver cada vez mais exigências a nível intelectual. No dia-a-
dia da sala de aula, o brincar, para além de possibilitar o exercício daquilo que é
próprio no processo de desenvolvimento e aprendizagem, possibilita situações em
que a criança constitui significados, sendo uma forma de assimilação dos papéis
sociais e de compreensão das relações afetivas que ocorrem no seu meio, assim
como para a construção do conhecimento.
Fonte: almeidadeinha1978.blogspot.com.br

O jogo e a brincadeira são sempre situações em que a criança realiza, constrói


e se apropria de conhecimentos das mais diversas ordens. Eles possibilitam,
igualmente, a construção de categorias e a ampliação dos conceitos das várias áreas
do conhecimento. Num contexto de creche (neste caso, 2 e 3 anos), as crianças
brincam imenso ao longo do dia, tanto mais quanto lhes for dado espaço para isso. É
também curioso perceber que, num grupo alargado de crianças, há algumas que
procuram bastante a atenção do adulto e brincar com ele, enquanto outras se
envolvem completamente nas brincadeiras, individualmente e em grupo. Cabe ao
educador mediar estas situações, aproveitando para interagir e transmitir
conhecimentos através da brincadeira que ali se desenrola, uma vez que o lúdico
possibilita uma das atividades mais significativas para a aprendizagem. Diríamos até
a mais significativa!
Nesta faixa etária, as crianças já desenvolveram capacidades emocionais e
cognitivas para incluir outras pessoas nas suas brincadeiras. Anteriormente,
brincavam ao lado do outro, mas não com o outro. E é percebendo a presença do
outro que começam a ser criadas e respeitadas as regras. Conviver com outra pessoa
exige que se respeitem limites: os limites impostos pelo outro. Surgem por isso alguns
conflitos, sendo que é nesta fase que cresce nas famílias a preocupação com a
possibilidade de o seu filho ser uma criança violenta.
Normalmente não há motivo para preocupação, as crianças estão apenas a
crescer e a aprender cada vez mais sobre o comportamento humano! A imaginação
começa a dominar e brincam muito o faz-de-conta. Representam papéis, recriam
situações, agradáveis ou não. Quando a criança recria estas situações, faz de uma
forma que ela é capaz de suportar, não correndo riscos reais. É comum ver, por
exemplo, uma criança que é a “mãe” ralhar com o bebê – “Senta na cadeira! E come
a papa toda!” –, à semelhança do que ela experimenta na realidade. Através do faz-
de-conta, a criança traz para perto de si uma situação vivida, adaptando-a à sua
realidade e necessidades emocionais. Percebemos então a importância das
brincadeiras na casinha e na garagem, como os “pais e as mães”, o “médico”, o
“supermercado”, “a oficina”, entre tantas outras.
Portanto, a brincadeira e as situações de jogos são fundamentais para a vida
saudável da criança e, por que não dizê-lo, para o adulto também. Pode-se em relação
a isto acrescentar que, envolvidos em brincadeiras com as crianças, os adultos
sentem-se igualmente divertidos, mais descontraídos e felizes, o que é benéfico para
o clima e ambiente na sala, onde deve existir cumplicidade e harmonia. E é igualmente
benéfico para os adultos como pessoas, se pensarmos no conceito de playfulness,
associado, entre outros, ao bom humor, capacidade lúdica e descontração. Algo que
deveríamos manter como seres humanos depois da infância! Como forma de
conclusão, é importante salientar mais uma vez a importância do brincar e do lúdico,
que começam a ter cada vez mais relevância, apesar de ainda haver um grande
caminho a percorrer. Não só educadores e outros profissionais que trabalham com
crianças, mas também os pais ajudariam bastante os seus filhos ao serem
esclarecidos e orientados sobre a necessidade de brincar com as crianças.
Como educadores de infância, é importante contribuirmos para esta mudança,
alertando os pais e os outros profissionais sobre estas questões, começando a
construir um caminho para que, cada vez mais, as crianças possam ser
compreendidas da forma que elas melhor são capazes de se expressar: através do
brincar.
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