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FINANÇAS CORPORATIVAS

Atualmente, os gestores atuam em um ecossistema de


negócios cada vez mais complexo, conectado e hostil. Isso faz
com que as relações entre clientes e consumidores ocorram
em um ambiente cada vez mais difícil, o que elimina, na
maioria dos casos, a capacidade de repasse dos custos aos
preços de seus produtos e/ou serviços, gerados por decisões
incorretas. A crescente conscientização dos consumidores e
a velocidade com que a informação, nem sempre verdadeira,
trafega no mercado transforma o trabalho do gestor em uma
atividade cada vez mais desafiadora.
Apesar de toda a dificuldade e complexidade envolvida em sua
atividade, o gestor financeiro não pode, em momento algum,
perder de vista o entendimento de que todas as decisões
tomadas têm como objetivo a maximização do retorno dos
proprietários, refletida no Passivo da empresa. Essas questões
se tornam ainda mais importantes quando se sabe que todas as
decisões dos gestores têm efeito imediato sobre a liquidez e a
rentabilidade de qualquer tipo de negócio.
Tomando essas questões como um grande desafio, este
livro objetiva apresentar, no campo de estudos de Finanças,

AGNALDO SANTOS PEREIRA


de maneira prática e objetiva, o entendimento de técnicas
que permitam a compreensão dos conceitos financeiros
necessários para a gestão de qualquer tipo de negócio,
independentemente de seu tamanho.

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6600-1

59251 9 788538 766001


Finanças Corporativas

Agnaldo Santos Pereira

IESDE BRASIL
2020
© 2020 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do
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Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Sushiman/Shutterstock

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
P489f

Pereira, Agnaldo Santos


Finanças corporativas / Agnaldo Santos Pereira. - 1. ed. - Curitiba
[PR] : IESDE, 2020.
206 p.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6600-1

1. Empresas - Finanças. 2. Sociedades comerciais - Finanças. 3. Admi-


nistração financeira. I. Título.
CDD: 658.15
20-62930
CDU: 658.15

Todos os direitos reservados.

IESDE BRASIL S/A.


Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Agnaldo Santos PhD em Finanças pela Florida Christian University.
Mestre em Administração com especialização em
Pereira Finanças pelo Instituto Brasileiro de Mercado de
Capitais (IBMEC). Pós-graduado em Engenharia
Econômica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ). Professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Conselheiro de Administração e executivo.
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SUMÁRIO
1 Introdução a finanças corporativas 9
1.1 Importância de finanças nas organizações 10
1.2 Oportunidades de trabalho na área financeira 12
1.3 Responsabilidades da área de finanças 16
1.4 Stakeholders da empresa 20
1.5 Relações de agência 23

2 Custo de capital 29
2.1 Definição do custo de capital 30
2.2 Cálculo do custo de capital dos terceiros 34
2.3 Cálculo do custo de capital dos sócios 39
2.4 Cálculo do custo médio ponderado de capital 53

3 Retorno de projetos 59
3.1 Fontes de recursos 59
3.2 Investimentos 66
3.3 Métodos de avaliação 70
3.4 Valor Presente Líquido (VPL) 74
3.5 Taxa Interna de Retorno (TIR) 80
3.6 Payback simples e Payback descontado 88
3.7 Risco 90

4 Administração da liquidez 97
4.1 Liquidez 98
4.2 Demonstração do fluxo financeiro 100
4.3 Fluxo de caixa 105
4.4 Ciclos da empresa 123

5 Capital de giro 132


5.1 Capital de giro 133
5.2 Tipos de contas na perspectiva gerencial 142
5.3 Necessidade de capital de giro 150
5.4 Saldo de Tesouraria 159
6 Alavancagem e risco 171
6.1 Custos Fixos, Variáveis e Ponto de Equilíbrio 172
6.2 Tipos de alavancagem 180
6.3 Avaliação do risco 193
APRESENTAÇÃO
Atualmente, os gestores atuam em um ecossistema de negócios cada
vez mais complexo, conectado e hostil. Isso faz com que as relações entre
clientes e consumidores ocorram em um ambiente cada vez mais difícil, o que
elimina, na maioria dos casos, a capacidade de repasse dos custos aos preços
de seus produtos e/ou serviços, gerados por decisões incorretas. A crescente
conscientização dos consumidores e a velocidade com que a informação, nem
sempre verdadeira, trafega no mercado, transforma o trabalho do gestor em
uma atividade cada vez mais desafiadora.
Além dessas questões, exceto para empresas que fazem parte de
monopólios e oligopólios, o gestor trabalha constantemente enfrentando
pressão para reduções cada vez mais significativas nas margens de lucro
de suas empresas. Essas pressões são geradas, entre outros aspectos, pela
velocidade da informação, que permite aos consumidores compararem preços
de produtos e/ou serviços, o que influencia os preços e, consequentemente,
as margens de lucro. Além da velocidade da informação, a globalização dos
mercados atrai concorrentes para negócios que atuam com margens de
lucro elevadas.
Apesar de toda a dificuldade e complexidade envolvida em sua atividade,
o gestor financeiro não pode, em momento algum, perder de vista o
entendimento de que todas as decisões tomadas têm como objetivo a
maximização do retorno dos proprietários, refletida no Passivo da empresa.
Essas questões se tornam ainda mais importantes quando lembramos que
todas as decisões dos gestores têm efeito imediato sobre a liquidez e a
rentabilidade de qualquer tipo de negócio.
Tomando essas questões como um grande desafio, este livro objetiva
apresentar, no campo de estudos de Finanças, de maneira prática e
objetiva, o entendimento de técnicas que permitem a compreensão dos
conceitos financeiros necessários para a gestão de qualquer tipo de negócio,
independentemente de seu tamanho.
Os capítulos que compõem esta obra foram pensados com o objetivo de
aumentar o conhecimento conceitual e prático do leitor à medida que sua
leitura se desenvolve. No primeiro capítulo, apresentamos conhecimentos
técnicos básicos para que o gestor financeiro possa desempenhar suas
funções de maneira adequada.
No segundo capítulo, vemos a estrutura dos recursos captados no Passivo
e seus respectivos custos em função do grau de risco associado. Esse cálculo,
chamado de custo de capital, custo médio ponderado de capital ou taxa mínima
de atratividade, reflete um elemento fundamental para a determinação do
valor da empresa.
Partindo do cálculo do custo de capital, buscamos entender como o gestor
financeiro deve calcular o retorno de uma alternativa de investimento de
acordo com as várias possibilidades existentes. Além disso, entender o que o
resultado do valor obtido realmente significa, com base nos vários métodos
de cálculo, definindo a melhor alternativa e suas implicações para o valor da
empresa, foram os objetivos seguidos no terceiro capítulo.
No quarto capítulo, aprofundamos e detalhamos a importância dos
prazos de aplicação de recursos no Ativo e de captação de financiamento
dos terceiros e sócios no Passivo para a gestão de qualquer tipo de empresa,
demonstrando a consequência desse processo no fluxo de caixa.
O volume de recursos resultante da necessidade de conciliar os fluxos
financeiros e operacionais da empresa e, principalmente, de obter de modo
adequado os recursos para o financiamento das atividades operacionais, por
meio dos conceitos da necessidade de capital de giro e do saldo de Tesouraria,
são detalhados no quinto capítulo.
No sexto e último capítulo, apresentamos o alicerce existente na relação
entre o risco e o retorno, base fundamental para o conceito da alavancagem
e sua relação com os custos fixos existentes nas relações operacionais
e financeiras da empresa e para o efeito no ponto de equilíbrio, elemento
importante para entendermos graficamente o risco operacional, financeiro e
combinado da organização.
Esperamos que aproveite bem os conhecimentos desta obra.
Bons estudos!
1
Introdução a finanças
corporativas
Uma das grandes preocupações dos gestores das empresas, in-
dependente do tamanho e segmento de atuação, é fazer com que
elas cresçam continuamente. Isso seria absolutamente correto não
fosse por um pequeno detalhe: a velocidade de crescimento pode
ser uma das formas mais eficazes de levar uma empresa à falência.
Isso normalmente ocorre devido ao desconhecimento, por par-
te de muitos gestores, dos aspectos básicos de Finanças – uma
das áreas mais importantes de qualquer organização –, indicando
a necessidade premente de seu entendimento e, principalmente,
utilização nas decisões cotidianas das empresas.
Lamentavelmente, em muitas organizações, com ou sem fina-
lidade lucrativa, a administração financeira é vista apenas como
uma atividade primária, relacionada unicamente:
•• à realização de pagamentos, quando existem recursos finan-
ceiros em disponibilidade;
•• à captação de empréstimos, quando não existem disponibi-
lidades para fazer frente aos pagamentos em seus respecti-
vos vencimentos;
•• às aplicações de sobras de caixa nas várias alternativas exis-
tentes no mercado financeiro, normalmente, naquelas que
oferecem as menores taxas; e
•• à cobrança de clientes inadimplentes.

Na realidade, essa atividade é muito mais complexa e sofistica-


da do que normalmente se acredita, demandando do responsável
inúmeros conhecimentos técnicos. As seções a seguir apresentam
alguns desafios enfrentados pelo profissional de finanças.

Introdução a finanças corporativas 9


1.1 Importância de finanças nas organizações
Vídeo Para exemplificar alguns desafios enfrentados cotidianamente pelo
profissional de finanças, enfatizando sua importância nas empresas,
vamos utilizar três políticas governamentais básicas: política monetá-
ria, política cambial e política fiscal.

Com base nessas políticas, postas em prática pelo governo federal e,


no caso da política fiscal, alteradas e implantadas também pelos estados
e municípios para os tributos estaduais e municipais, surgem algumas
questões de extrema importância que o gestor precisa, com base no seu
entendimento, utilizar como fundamento para tomar uma série de de-
cisões que poderão trazer consequências muito sérias para a empresa.

Dentre essas questões de fundamental importância para o gestor


em cada uma das políticas, destacamos:
a. Política monetária: qual é o efeito das taxas de juros na
1 1
economia, a partir da fixação da taxa Selic , sobre a inflação
A sigla Selic significa Sistema
e o consequente efeito nos preços dos produtos, no custo dos
Especial de Liquidação e Custódia
e expressa a taxa básica de insumos e, por extensão, nos resultados da empresa?
juros da economia, fixada pelo
b. Política cambial: qual é o efeito da taxa de câmbio sobre as
Comitê de Política Monetária do
Banco Central (Copom), para um receitas e os custos das empresas que mantêm transações com
determinado período de tempo. comércio exterior e o respectivo efeito nos preços internos de
Essa taxa serve de piso para as
venda dos produtos, no custo dos insumos, por meio do canal da
operações de empréstimos reali-
zadas no mercado financeiro. inflação, e nos resultados da empresa?
c. Política fiscal: quais alíquotas e base de cálculo de cada imposto
afetam a empresa e seu respectivo efeito no preço dos produtos,
no custo dos insumos e, consequentemente, na inflação e nos
Livro resultados esperados pela empresa?
No livro Administração
financeira: teoria e prática,
É importante lembrar que os efeitos de todas essas políticas afetam os
são apresentados os resultados da empresa tanto positiva quanto negativamente, sendo, por-
conceitos básicos para o
entendimento das ativi-
tanto, fundamental o entendimento das consequências pelo gestor finan-
dades da área financeira, ceiro, para que possa tomar as medidas protetivas, corretivas e proativas
em especial as questões
relativas aos custos de
necessárias a fim de maximizar o retorno dos proprietários.
agência. Vale a leitura!
A essa altura, todos devem concordar que o conhecimento necessá-
BRIGHAM, E. F.; GAPENSKI, L. C.;
rio para atuar na área financeira de modo eficaz não se esgota nessas
EHRHARDT, M. C. São Paulo: Atlas,
2001. questões. Elas servem apenas para enfatizar a importância dessa área do
conhecimento na gestão de qualquer tipo de organização, com finalidade
lucrativa ou não, e os desafios enfrentados pelo gestor financeiro.

10 Finanças Corporativas
Antes de prosseguirmos com a demonstração da importância da
área financeira em qualquer tipo de organização, uma pergunta impor-
tante surge de imediato: qual é o significado de finanças?

Segundo Gitman (2010, p. 3), o termo finanças pode ser definido


como “a arte e a ciência de administrar dinheiro”. Essa definição tem
como fundamento o fato de todas as pessoas físicas ou jurídicas, de
uma forma ou de outra, em suas relações com outras pessoas físicas
e jurídicas e com o Estado, serem impactadas direta ou indiretamente
pelo dinheiro.

Portanto, entender os elementos que podem afetar o fluxo de re-


cursos atuais e a serem disponibilizados, seja de uma empresa ou de
uma pessoa física, é de fundamental importância e precisamos estudá-
-los em todas as suas vertentes e consequências, permitindo a tomada
de decisões que permitirão o crescimento sustentado do patrimônio
de uma pessoa física ou jurídica.

No caso de uma pessoa jurídica, a utilização de conceitos financei-


ros serve para empresas atuantes no mercado financeiro ou não, de
capital aberto (com ações negociadas em bolsa de valores) ou fechado,
por responsabilidade limitada (Ltda.), firma individual, microempreen-
dedor individual (MEI), empresas grandes, médias ou pequenas, com
ou sem finalidade lucrativa e de qualquer segmento de atuação.

É sempre oportuno lembrar que uma empresa sem finalidade


lucrativa não tem como objetivo final a maximização do retorno de
seus proprietários, mas sim do corpo social em que está inserida,
provendo mais serviços e/ou mais produtos, com mais qualidade e
para mais pessoas.

Mesmo para o profissional que não atua na área financeira de uma


empresa, os conceitos financeiros são de extrema relevância. Em pri-
meiro lugar, todo profissional toma decisões que direta ou indireta-
mente estão relacionadas à geração, à manutenção e ao crescimento
de seu patrimônio pessoal até sua aposentadoria, sendo todas deci-
sões de cunho eminentemente financeiro. Em segundo lugar, as deci-
sões tomadas em todas as áreas da empresa (por exemplo, Marketing,
Recursos Humanos, Logística, Tecnologia da Informação, Jurídico e
Operações) trazem consequências financeiras e, por conseguinte, im-
pactarão os resultados da empresa positiva ou negativamente.

Introdução a finanças corporativas 11


Por esse motivo, fica cada vez mais claro para todos os profissionais
que o sucesso em suas carreiras depende não só do conhecimento espe-
cífico para o desempenho de sua função, mas também do entendimento
das consequências financeiras das decisões tomadas em suas áreas de
origem, tendo esse último elemento um peso cada vez mais importante.

Além disso, não podemos esquecer que todos os gestores da em-


presa, independente de sua posição hierárquica, interagem de alguma
forma com a área financeira, por exemplo, justificando despesas acima
do que foi orçado, defendendo propostas de investimento e negocian-
Atividade 1
do valores do orçamento.
Explique por que todas as
decisões gerenciais são essen- É por esse motivo que podemos afirmar que todas as decisões to-
cialmente decisões financeiras. madas pelos gestores em todas as áreas da empresa são fundamental-
mente decisões financeiras.

1.2 Oportunidades de trabalho


Vídeo na área financeira
Normalmente, a administração financeira de uma empresa é com-
posta por três grandes áreas. Na maioria das empresas, cada uma des-
sas áreas tem um gestor responsável com seu respectivo staff, ambos
se reportando a um diretor financeiro. Em algumas, principalmente nas
2
multinacionais e nas de grande porte , o diretor financeiro é chamado
2
de CFO (Chief Financial Officer).
De acordo com a Lei n. 11.638,
de 28 de dezembro de 2007, A estrutura organizacional mais comum da área financeira apresen-
empresas de grande porte são ta a seguinte configuração:
organizações, ou o conjunto
delas sob o mesmo controle – DIRETOR
independente de sua forma de FINANCEIRO
constituição –, que apresentam
anualmente receita bruta STAFF
mínima de 300 milhões de reais
ou ativo total superior a 240
CONTROLADORIA TESOURARIA
milhões de reais.

As principais funções de cada área são apresentadas a seguir.


a. Tesouraria

•• Pagamentos a fornecedores, salários e encargos sociais,


impostos e empréstimos captados para qualquer modalidade
(investimento ou giro).

12 Finanças Corporativas
•• Recebimentos das vendas a prazo realizadas para os clientes
da empresa, incluindo a cobrança de clientes inadimplentes.
•• Operacionalização das transações relacionadas à captação
de empréstimos para investimento ou para financiamento do
giro da atividade.
•• Aplicação de sobras de caixa no mercado financeiro na
alternativa de melhor relação risco versus retorno.
•• Nas empresas que não têm um staff específico, a área da
Tesouraria também é responsável pela negociação e cálculo
do custo efetivo das operações de financiamento.
b. Controladoria

•• Geração e publicação de informações econômico-financeiras


(no caso das sociedades anônimas de capital aberto e
empresas de grande porte) para o público interno e externo,
por meio da Contabilidade Financeira.
•• Geração de informações econômico-financeiras para a
tomada de decisões de planejamento e controle com base na
Contabilidade Gerencial.
•• Consolidação e acompanhamento do orçamento empresarial,
indicando as razões para as variações ocorridas.
•• Cálculo do preço de venda dos produtos e/ou serviços
ofertados ao mercado, com base nas informações geradas
pela Contabilidade de Custos.
•• Contabilização das informações, cálculo e análise das
possibilidades permitidas pela legislação em vigor para a
redução da carga tributária, com base na Contabilidade Fiscal.
c. Staff da Diretoria Financeira
3
3
•• Cálculo do valor a ser pago aos sócios a título de remuneração É normalmente composto por
pelo investimento realizado, normalmente denominado uma quantidade pequena de
colaboradores, atuando com
de dividendos, juros sobre capital próprio e retirada (o termo base em informações recebidas
pró-labore não deve ser utilizado para essa finalidade por da Tesouraria, da Controladoria,
representar a remuneração do sócio pelo trabalho realizado de outras áreas da empresa e do
mercado.
e não pelo investimento). Esse valor é uma sugestão devendo
ser aprovado pelos sócios.
•• Definição da melhor forma de financiamento para as
atividades e expansão da empresa, entre recursos dos sócios
e empréstimos (bancários, mútuos etc.).

Introdução a finanças corporativas 13


•• Cálculo do custo efetivo das operações de empréstimo,
computando todos os custos envolvidos na operação
(impostos, taxas, reciprocidades etc.).
•• Elaboração de estudos para a determinação do retorno do
investimento a ser realizado em projetos para expansão,
4 redução de custos e manutenção.
Também chamado de wheighted •• Cálculo e revisão do custo médio ponderado de capital ou
4

average cost of capital (WACC).


custo de capital, parâmetro que define a taxa mínima de
atratividade, utilizada como retorno mínimo para todos os
projetos da empresa.
•• Elaboração de estudos de engenharia financeira, buscando
formas não tradicionais de captação de recursos para o
financiamento dos projetos da empresa.
•• Outros estudos por demanda.
Uma questão extremamente importante sobre o trabalho na área
financeira está relacionada à forma de tratamento das informações
pela Tesouraria e pela Controladoria. Essa última trabalha com base
nas informações geradas pelo regime de competência, que é o regis-
tro da informação sempre que determinado evento ocorre, indepen-
dente de seu efeito no caixa da empresa.

Para ilustrar esse regime, vamos utilizar como exemplo a venda de


determinado produto ou serviço. No momento em que o faturamento
é efetivado, essa transação é contabilizada, independente da venda ter
sido realizada à vista ou a prazo. Se, nesse exemplo, a venda tivesse
sido feita para pagamento daqui a noventa dias, ainda assim, a receita
seria contabilizada na data do faturamento.

Da mesma forma, uma compra realizada para pagamento daqui a


sessenta dias seria contabilizada hoje, mesmo que o pagamento tenha
sido negociado para ocorrer somente ao final desse prazo. Alguns au-
tores denominam os demonstrativos contábeis como sendo a expres-
são da situação econômica da empresa.

Na Tesouraria, por outro lado, as informações são baseadas no re-


gime de caixa, ou seja, são demonstradas quando os recursos efetiva-
mente entram no caixa, no caso do recebimento das receitas, ou saem,
quando há o pagamento de despesas, impostos e insumos. Essas infor-
mações são refletidas no fluxo de caixa.

14 Finanças Corporativas
Diferente da Controladoria, o gestor da Tesouraria está sempre en-
fatizando o momento da entrada e da saída dos recursos financeiros,
independente do resultado econômico demonstrado. Esse conceito de
extrema importância demonstra por que uma empresa pode ter um
resultado econômico favorável (lucro) e não possuir recursos em caixa
para fazer frente a seus compromissos.

Vamos ilustrar essa questão com um exemplo. A empresa Alfa ven-


deu produtos no valor de R$150.000,00, oferecendo a seus clientes um
prazo para pagamento de 90 dias. Os custos incorridos para produção
do produto vendido foram de R$110.000,00, todos pagos à vista.

Essa transação, nos demonstrativos da Controladoria e da Tesoura-


ria, apresentaria os seguintes valores:

Visão da Controladoria Visão da Tesouraria


Receitas $150.000,00 Entradas de caixa $ 0,00
(–) Custos $110.000,00 Saídas de caixa $110.000,00
____________ ____________

= Lucro líquido $ 40.000,00 Resultado de caixa – $110.000,00

O exemplo demonstra claramente que a visão da Controladoria não


espelha a real situação financeira da empresa. Isso significa que o ges-
tor financeiro precisa ir além das informações contábeis para embasar
suas decisões, buscando fundamentação no fluxo de caixa e não nos
demonstrativos contábeis tradicionais (Balanço e Demonstrativo de Re-
sultados do Exercício – DRE).

Outra diferença fundamental está relacionada ao tempo. As informa-


ções geradas pela Controladoria dizem respeito ao passado, ou seja, a
coleta e a elaboração dos demonstrativos contábeis comprovam o que já
aconteceu. A Tesouraria, por outro lado, com base nessas informações,
tenta inferir o que deverá acontecer, tendo como prioridade identificar
quando os recursos deverão entrar no caixa e quando terão que sair.

Essa é a grande dificuldade dos profissionais da Tesouraria: identi- Atividade 2


ficar o futuro de curto, médio e longo prazo, mesmo sabendo que uma Qual é a principal diferença
parcela substancial das informações está disponibilizada nas vendas já entre a informação utilizada pela
Tesouraria e pela Controladoria?
realizadas, nos respectivos prazos concedidos, nas despesas já incorri-
das e naquelas que são recorrentes, com seus prazos para pagamento.

Introdução a finanças corporativas 15


1.3 Responsabilidades da área de finanças
Como o resultado de uma empresa é obtido pela diferença entre as
Vídeo
receitas e as despesas, podemos dizer que o gestor da área financeira
é o responsável final pelos resultados obtidos. Vamos entender o signi-
ficado dessa frase considerando inicialmente as receitas.

É parte do trabalho do gestor financeiro assegurar que o preço de


um produto e/ou serviço ofertado ao mercado reflita não só os custos
diretos e indiretos envolvidos e a margem de lucro desejada (dados
oriundos da Controladoria), mas também a inclusão do conceito do
valor do dinheiro no tempo, nas vendas a prazo. Afinal, devemos con-
siderar o fato de que o dinheiro perde valor ao longo do tempo como
consequência da inflação, por menor que seja seu patamar.

Além da perda de valor gerado pela inflação, o preço de um produ-


to e/ou serviço, quando vendido a prazo, precisa refletir também outros
elementos extremamente importantes. O primeiro deles é custo de opor-
tunidade dos recursos investidos no financiamento do cliente. Esse cus-
to, chamado de Taxa Mínima de Atratividade, Custo de Capital ou Custo
Médio Ponderado de Capital representa o retorno mínimo que a empresa
precisa gerar de ganho para cobrir os custos de financiamento do cliente.

O segundo elemento é o risco de inadimplência do cliente. Como sa-


bemos que mesmo o melhor cliente da empresa pode atrasar o paga-
mento, esse risco precisa ser quantificado e incluído no preço. Por final,
o terceiro e último refere-se aos impostos incidentes sobre a operação
e que precisam ser de alguma forma, incluídos no preço.

Isso significa que, quando se oferta aos clientes a possibilidade de


pagamento por serviços e/ou produtos em condições diferentes do
“à vista”, é necessário que as parcelas a serem recebidas reflitam a per-
da de valor financeiro gerada pela inflação, o custo de oportunidade da
empresa, o risco de eventual inadimplência do cliente e, no pior cená-
rio, o não pagamento de uma ou de todas as parcelas.

Entendemos perfeitamente que a definição do preço final de venda


de um produto e/ou serviço é estabelecida pelo mercado, em função
do valor percebido. Apesar disso, o gestor financeiro não pode deixar,
sempre que possível, de incluir esses elementos na formação do preço
de venda a prazo. É preciso também fazer a gestão diária dos prazos de
pagamento de obrigações junto a fornecedores de insumos e impos-

16 Finanças Corporativas
tos, dos produtos prontos e mão de obra (colaboradores e terceiriza-
dos, se houver), do prazo de recebimento relativo à venda de produtos
e/ou serviços, do prazo (giro) dos estoques de insumos, produtos em
processo e produtos acabados, e do volume de recursos necessários
ao financiamento do giro da atividade da empresa, conceito denomina-
do necessidade de capital de giro.

Com relação às despesas, além de reportá-las de maneira adequada


e transparente, para que os responsáveis pelas demais áreas da em-
presa possam sempre buscar formas de reduzi-las, sem, no entanto,
diminuir a percepção de valor da empresa para seus clientes externos
e internos (colaboradores), o gestor deve acompanhar os gastos reais
versus os orçados e gerar informações para a tomada de decisões.

Ele precisa também monitorar todos os gastos, não só os relaciona-


dos aos volumes, mas também aos prazos de pagamento, buscando
sempre todas as formas possíveis para que os pagamentos idealmente
ocorram após os recebimentos, reduzindo, dessa forma, a necessidade
de financiamento para o giro da atividade.

Além dessas temáticas de extrema relevância, o gestor financeiro


da empresa também precisa estar atento a algumas questões básicas,
relacionadas a qualquer tipo de organização. Essas indagações são:
•• globalização das empresas e dos mercados;
•• crescente utilização de recursos oriundos das novas tecnologias
da informação (TI); e
•• necessidade de implantação de políticas relacionadas à gover-
nança corporativa e compliance na empresa.

Vamos analisar cada uma dessas questões e sua relação com a área
financeira. Com a globalização, as empresas não podem mais ficar res-
tritas a um mercado apenas, ou seja, elas também têm que se globalizar.
O ganho de escala gerado pela globalização dos mercados quanto aos
produtos e serviços passou a ser um fator fundamental para maximizar
o retorno de qualquer tipo de negócio. Nenhuma empresa consegue so-
breviver sem escalabilidade para seus produtos ou serviços.

Aqui, cabe um esclarecimento. Nosso conceito de escala não sig-


nifica a necessidade de oferecer ao mercado milhões ou milhares de
unidades de um produto. Escala, no nosso conceito, significa a maior
quantidade que determinado mercado absorve.

Introdução a finanças corporativas 17


Por exemplo, se considerarmos um pequeno restaurante com ape-
nas cinco mesas e que atua em um nicho de mercado, ou seja, um
segmento bem específico, a escala, para ele, significa manter sempre
as cinco mesas ocupadas. Se o proprietário percebe uma demanda adi-
cional de duas mesas, por exemplo, deverá rapidamente providenciar
uma alternativa para o atendimento dessas duas mesas adicionais.
Caso não o faça, alguém poderá fazê-lo e, se o mercado perceber que
essa alternativa oferece uma relação custo-benefício mais favorável, o
atual proprietário do negócio correrá o risco de, até mesmo, perder a
demanda para as cinco mesas que já atende.

Outra questão importante com relação à globalização diz respeito aos


efeitos gerados por eventos totalmente fora do controle da empresa.
Por exemplo, caso uma crise no Oriente Médio provoque um aumento
no preço do petróleo, esse aumento poderá trazer várias consequências
dependendo de sua magnitude, como: aumento da inflação e da taxa de
juros, aumento no desemprego e redução do crescimento econômico,
o que certamente impactará todas as empresas, mesmo aquelas que
atuam em cidades muito pequenas e afastadas dos grandes centros.

O gestor financeiro deverá estar sempre preparado para essas pos-


síveis situações, procurando ser proativo, no sentido de antecipar as
prováveis consequências desses eventos, tomando as medidas correti-
5
vas necessárias para devolver a empresa ao seu objetivo maior: maxi-
Segundo Clayton Christensen, no
livro O dilema da inovação, ino- mizar o retorno dos proprietários.
vações chamadas de disruptivas Outra questão de extrema relevância para o gestor financeiro de
não refletem necessariamente
avanços tecnológicos, mas sim qualquer tipo de organização é fazer com que a empresa possa acom-
o desenvolvimento de produtos panhar a velocidade de evolução da tecnologia da informação. Essa
considerados superiores pelo
velocidade tem deixado várias empresas pelo caminho, inclusive al-
mercado, tornando-os em
função da escala mais acessíveis gumas que foram líderes de mercado em suas épocas áureas, como
e baratos e como consequência, Kodak e Xerox.
aumentando o mercado de con-
5
sumidores , gerando um círculo Empresas e negócios chamados de disruptivos são a tônica do mer-
virtuoso. É por esse motivo que cado. Nossa dependência da internet hoje é tão grande que é muito co-
essas inovações são consideradas
como uma força positiva para a mum ouvirmos colaboradores mencionando que “se a internet cair, a
sociedade como um todo. rotina de trabalhos será bastante prejudicada”. Tudo isso revela vários
aspectos que o gestor financeiro tem que levar em consideração em
seu processo de tomada de decisão. Dentre eles, destacamos:
•• A forma como os produtos e/ou serviços são disponibilizados
para o consumidor final mudou completamente.

18 Finanças Corporativas
•• A percepção do valor intrínseco também é completamente dife-
rente. Um bom exemplo disso é a rede de cafés Starbucks. Quan-
do, por exemplo, um consumidor vai a uma loja para tomar café,
o que de fato ele deseja? Café? Internet grátis? Ambiente social?
Tudo isso? Claro que o preço do café refletirá todas essas questões.
•• Com as mídias sociais, um problema ocorrido com um produto
e/ou serviço é imediatamente repassado para milhares e, em al-
guns casos, milhões de consumidores a uma velocidade inimagi-
nável, sem que a empresa tenha qualquer controle.
•• A velocidade com que a informação flui faz com que um pequeno
evento em um país pouco expressivo do ponto de vista econômi-
co tenha repercussão imediata nas bolsas de valores mundiais,
nas taxas de juros, no crescimento econômico e, claro, nos resul-
tados da empresa.
•• O gestor financeiro tem acesso, praticamente em tempo real, a
informações que podem afetar os resultados da empresa a curto, Livro
médio e longo prazo, podendo, no caso de multinacionais, reali-
Christensen apresenta,
zar reuniões virtuais com seus pares em qualquer lugar do mun- na obra O dilema da
do por vídeo via internet para tomar as providências cabíveis. inovação, conceitos sobre
inovações disruptivas
•• A contratação ou a demissão de um presidente de uma grande e a importância dessas
verdadeiras quebras
empresa pode, imediatamente, ser refletida no preço de suas
de paradigma para a
ações nos mercados mundiais. expansão dos negócios e
o crescimento econômico
Tudo isso significa que o gestor financeiro precisa desenvolver a ca- dos países.

pacidade de acessar e analisar uma quantidade cada vez maior de in- CHRISTENSEN, C. M. São Paulo:
MBooks, 2016.
formações em tempo real, a chamada big data, e imediatamente tomar
decisões, tornando-se cada vez mais analítico e menos intuitivo.

O sucesso de um gestor financeiro estará cada vez mais associado


a sua capacidade de realizar análises qualitativas mais rapidamente,
com base em informação progressivamente maiores e mais comple-
xas, utilizando ferramentas de computação como suporte para o pro-
cessamento cada vez mais veloz dos dados.

Outra responsabilidade fundamental do gestor financeiro está re-


lacionada à governança corporativa. Segundo Pereira e Bispo (2019,
p. 24), a governança corporativa “trata-se do sistema pelo qual as
empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incen-
tivadas, o que envolve os relacionamentos entre sócios, conselho de
administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais
partes interessadas, tendo por base os dados contábeis”.

Introdução a finanças corporativas 19


Ainda segundo Pereira e Bispo (2019), a governança é baseada em
três pilares básicos:

ACCOUNTABILITY TRANSPARÊNCIA (DISCLOSURE) ÉTICA EMPRESARIAL

Prestação de contas vo- É destinada aos sócios minoritários Visa determinar mecanismos de controle efe-
luntária da atuação como de qualquer tipo de empresa, acio- tivos a fim de evitar que preconceitos, vieses
gestor, em todos os níveis, nistas preferenciais, investidores de ou conflitos de interesse tenham influência
mercado, em especial os institucio- sobre decisões e ações de membros dos con-
assumindo integralmente as
selhos, da alta administração e de gerentes.
consequências de seus atos nais, financiadores e fornecedores
Auxilia a agir segundo padrões de compor-
e omissões perante a institui- de bens e de serviços. Tem como
tamento baseados nos valores e princípios
ção contratante dos seus ser- objetivo garantir acesso rápido e
constitucionais, legais e institucionais, e no
viços, sob a confiança de gerir seguro às informações relevantes código de ética e conduta adotado. Serve de
parte do ativo da empresa. sobre fatos, atos e negócios jurí- exemplo para todos e contribui para a boa
dicos realizados pelas sociedades reputação da organização por meio de boas
empresárias. relações com outras pessoas e instituições.

Esse conjunto de pilares sustenta a relação entre o gestor financei-


ro, os gestores das demais áreas e os proprietários da empresa, tor-
nando ágil o processo da informação relativa aos resultados, processos
e estratégias praticados, favorecendo a tomada de decisão.

1.4 Stakeholders da empresa


Vídeo Antes de definirmos quem são os stakeholders da empresa, precisa-
mos estabelecer uma questão de extrema importância: qual é o objeti-
vo do gestor de qualquer tipo de organização empresarial?

Normalmente, a resposta a essa pergunta é maximizar o lucro


para seus proprietários (acionistas, cotistas ou proprietário de firma
individual), lembrando que o investimento dos proprietários, além da
aplicação inicial feita, também é composto dos novos investimentos
realizados (reinvestimentos), por meio de aumentos de capital e/ou re-
investimentos dos lucros de um período.

Para começar nossa análise, precisamos lembrar que a maximiza-


ção do lucro pode ocorrer por práticas ilícitas relacionadas, por exem-
plo, ao descumprimento de normas ambientais. Nesse caso, ela será
obtida em detrimento da sociedade. Quando isso for percebido, certa-
mente o mercado penalizará essa prática, reduzindo a demanda pelos
produtos e serviços da empresa.

Aqui, já temos uma definição fundamental. Seja qual for o objetivo


do gestor de qualquer tipo de empresa, ele tem que ser aderente tam-
bém aos objetivos da sociedade.

20 Finanças Corporativas
Além dessa questão de fundamental importância, demonstramos
na Seção 1.2, que a existência de lucro não é garantia de solvabilidade
para a organização, ou seja, uma empresa pode ter lucros e não pos-
suir recursos em caixa para fazer frente a seus compromissos, o que
pode levá-la a uma situação de falência.

Qual seria então o objetivo do gestor? Segundo Pereira e Bispo (2019),


o investidor, independente do tipo de negócio em que esteja aplicando
seus recursos, espera que as ações tomadas pelo gestor da empresa
produzam não o maior lucro, mas sim a maior riqueza possível.

A percepção sobre a diferença entre esses objetivos, que podem ser


conflitantes entre si e podem ser atingidos utilizando vários instrumen-
tos gerenciais existentes, é de extrema relevância. Essa questão é ainda
mais importante quando lembramos que, como forma de motivação
para os gestores, o investidor deve estar sempre insatisfeito, esperan-
do que seu ganho seja cada vez maior, com base na competência de-
monstrada pelos administradores da empresa em suas decisões.

Então, antes de definirmos o verdadeiro objetivo do gestor, pre-


cisamos contextualizar o conceito de valor da empresa, com base na
seguinte pergunta: uma empresa tem seu valor definido pelo seu pas-
sado ou seu futuro?

Se for pelo passado, como justificar que várias empresas muito gran-
des e lucrativas no passado não existam mais em função, por exemplo,
de processos falimentares? Isso significa que o fato de uma organização
ter sido lucrativa no passado não garante sua existência no presente.

Além dessa indagação, precisamos lembrar que o presente de uma


empresa é consequência de decisões tomadas no passado, mesmo
que esse passado tenha ocorrido há cinco minutos. Da mesma forma,
as decisões tomadas no presente trarão efeitos para o futuro, mes-
mo que esse futuro seja daqui a cinco minutos. Portanto, o valor da
empresa está relacionado ao futuro e não ao passado. Partindo desse
conceito, podemos dizer que o valor da empresa é o futuro trazido a
valor presente.

Com base nessas indagações, vamos apresentar algumas diferenças


entre geração de lucro e de riqueza. Lucro é o resultado da atividade
econômica relativa a determinado período passado. Por ser uma foto-
grafia do passado, o objetivo do gestor não pode ser a geração de lucro.

Introdução a finanças corporativas 21


Geração de riqueza, por outro lado, é a projeção da diferença entre
as entradas e saídas operacionais de caixa, também chamada de gera-
ção de caixa, trazida a valor presente pela taxa mínima de atratividade
da empresa (essa taxa é representada pelo custo médio ponderado de
capital ou custo de capital).

Portanto, podemos dizer que o objetivo de todo gestor é sistema-


ticamente gerar caixa, que, ao ser trazido a valor presente, indica a
geração de riqueza para os proprietários. Com base nesses conceitos,
podemos definir os stakeholders da empresa.

Toda organização empresarial tem, no seu entorno, diferentes ins-


tituições e interesses que precisam ser atendidos para que ela possa
continuar a existir. Dentre esses participantes, podemos elencar:
•• sócios (acionistas, cotistas ou proprietários de firmas individuais);
•• clientes;
•• colaboradores (próprios ou terceirizados);
•• fornecedores de insumos, produtos prontos ou serviços (colabo-
radores registrados na empresa e/ou terceirizados);
•• instituições financeiras de qualquer tipo;
•• governo em seus vários níveis (federal, estadual e municipal);
•• sociedade de uma forma geral.

Em inglês, a palavra stakeholder é a junção de duas outras palavras:


stake e holder. Stake, em tradução livre, significa “interesse, participa-
ção, pedaço”. Já holder pode ser traduzido por “aquele que possui”. Ao
juntarmos essas duas palavras, podemos considerar seu significado
como sendo pessoas ou grupos de pessoas que têm algum tipo de in-
teresse em uma organização, seja com ou sem finalidade lucrativa.

Essa definição fica ainda mais intuitiva ao analisarmos os partici-


pantes elencados. Assim, fica claro que stakeholders são participantes
da sociedade que, direta ou indiretamente, podem ser afetados pela
atividade desempenhada por uma organização em seu(s) mercado(s)
de atuação.

Segundo Pereira e Bispo (2019), os stakeholders são afetados por di-


ferentes aspectos que influenciam o desempenho de uma organização.
Dentre eles, destacamos os aspectos:
•• Político: todos os planos empresariais são, de alguma forma,
afetados pelas decisões governamentais (como governo enten-

22 Finanças Corporativas
de-se os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário em nível fe-
deral, estadual e municipal) e, portanto, devem ser levados em
consideração.
•• Econômico e financeiro: a consequência de todas as decisões to-
madas pelos gestores é refletida nos resultados econômicos e fi-
nanceiros da empresa, o que impacta diretamente os stakeholders.
•• Social: a satisfação e o bem-estar de colaboradores, clientes, for-
necedores, financiadores e de todos os membros da sociedade
em que a organização se insere devem ser uma preocupação
constante dos gestores.
•• Demográfico: o foco dos processos de comunicação da empresa
não pode deixar de levar em consideração a “idade” de seu pú-
blico-alvo, devendo ser totalmente adaptados para se comunicar
diretamente com ele.
•• Tecnológico: essa é uma questão cada vez mais importante, uma
vez que cada nova tecnologia tem potencial para gerar novos ne-
gócios e destruir toda uma cadeia de negócios, obrigando os ges-
tores a estarem totalmente conectados a esse tópico.

Com base na abrangência do conceito de stakeholder, pelo papel Atividade 3


fundamental que desempenha, afetando a empresa de todas as ma- Quem são os stakeholders da
neiras possíveis e imagináveis, precisamos incluí-lo quando definimos empresa?
o papel básico da atividade gerencial, até porque os sócios da empresa
também são stakeholders.

Na realidade, podemos inferir que o grande papel de todo gestor é


maximizar a riqueza de todos os stakeholders da empresa.

1.5 Relações de agência


Vídeo As relações de agência têm como origem uma questão muito im-
portante e que fundamenta as relações entre os gestores e os pro-
prietários. Todos os gestores podem ser considerados agentes dos
proprietários ao receberem autoridade para tomar todas as decisões
necessárias, do ponto de vista gerencial, para maximizar a riqueza dos
sócios da empresa.
Do ponto de vista da Ciência Contábil, os proprietários da empresa
(proprietário é todo aquele que detém participação no capital social da
empresa, independente do percentual de participação) são representa-
dos no balanço no item patrimônio líquido.

Introdução a finanças corporativas 23


Esse mesmo conceito pode ser utilizado para os profissionais que
atuam como gestores ao mesmo tempo que detêm participação no ca-
pital da empresa. Se essa participação no capital for inferior a 100%,
o gestor também pode ser considerado um agente, uma vez que sua
função básica é maximizar sua riqueza e a dos demais sócios.
Esse deveria ser o fundamento básico para as relações entre os gesto-
res e os proprietários. No entanto, nem sempre esses objetivos são ade-
rentes, pelo contrário, em vários momentos são conflitantes, rivalizando
com o objetivo maior de maximização da riqueza dos proprietários.

Segundo Brigham, Gapenski e Ehrhardt (2001), uma relação de


agência ocorre quando um ou mais profissionais, chamados de agen-
tes, são contratados por uma organização empresarial, denominada
principal, para realizar algum tipo de serviço, recebendo delegação de
autoridade para tomarem decisões em nome dos proprietários.

Ainda segundo os mesmos autores, dentro do contexto da adminis-


tração financeira, existem relações de agência entre os proprietários e
gestores (agentes) e entre os sócios da empresa por meio dos agentes
e dos credores. Essas relações, pela forma como são postas em prática,
podem gerar consequências muito boas ou muito ruins para todos os
stakeholders da empresa.

Teoricamente, os interesses dos proprietários e dos gestores (agen-


tes) deveriam ser similares, ou seja, maximizar a riqueza dos proprietá-
rios. No entanto, como já dissemos, isso nem sempre ocorre. É muito
comum encontrarmos, nas empresas, vários agentes preocupados, por
exemplo, com a maximização da sua própria riqueza, com a segurança
de seus empregos e com os benefícios recebidos.

A questão é que essas preocupações podem não estar alinhadas ao


objetivo maior da empresa, gerando decisões que podem aumentar o ris-
co operacional, impactando o risco total e o valor econômico do patrimô-
nio dos sócios ou, por outro lado, fazendo com que os gestores evitem
assumir determinado patamar de risco, reduzindo, por consequência, as
possibilidades de maximização da riqueza dos proprietários da empresa.

Desse potencial conflito, surge o chamado problema de agência, de-


finido como a possibilidade de os gestores priorizarem seus propósitos
pessoais em detrimento daqueles definidos pelos proprietários. Segun-
do Gitman (2010), os problemas de agência podem ser potencialmente

24 Finanças Corporativas
evitados ou atenuados por meio de dois fatores: forças de mercado e
custos de agency.

O que são as forças de mercado no contexto das relações de agên-


cia? São os grandes proprietários de ações ou cotas, principalmente no
caso das sociedades anônimas de capital aberto representadas pelos
investidores institucionais, como os fundos de pensão, as seguradoras
e os fundos de investimento.

Esses grandes investidores exercem uma pressão enorme sobre os


gestores na busca da maximização de sua riqueza, chegando ao ponto
de destituir toda a diretoria da empresa, caso as metas estabelecidas
não sejam cumpridas e não existam fatores atenuantes provenientes
de causas externas.

Outra forma de esses investidores pressionarem por melhores resul- Livro


tados é por meio de operações de fusões e aquisições (M&A – Mergers
O livro Custos e formação
and Acquisitions). O problema para os gestores é que, caso essas opera- de preços apresenta, de
maneira detalhada e
ções ocorram, seus empregos não são garantidos, principalmente se a
didática, conceitos rela-
empresa para a qual trabalham for a comprada e não a compradora. cionados à Governança
e Compliance, áreas que
Portanto, para evitar isso, buscam no mínimo gerar os resultados todas as empresas preci-
sam desenvolver/implan-
esperados ou manobram suas empresas para que estejam sempre na
tar nas suas estruturas
ponta compradora de novas empresas ou negócios. de gestão, independente
do tamanho e área de
Ao apresentarem minimamente os resultados esperados e, no me- atuação.
lhor dos mundos, estarem na ponta compradora de empresas, têm PEREIRA, A. S.; BISPO, P. L. Curitiba:
seu status aumentado, refletindo em maiores remunerações e maior IESDE Brasil, 2019.

poder e segurança de emprego. A constante ameaça de terem a em-


presa comprada, caso não entreguem os resultados esperados, tende 6
a motivar os gestores a utilizarem todos os seus esforços para atuar de
Compliance compreende todos
acordo com os objetivos dos proprietários da empresa. os procedimentos implantados
na empresa para que seus ges-
A outra forma de evitar ou atenuar os problemas de agência obri-
tores atuem em conformidade
ga os proprietários da empresa a incorrerem em custos de agência ou com as leis e regulamentos
custos de agency. Esses custos, incorridos pelos proprietários para que internos e, principalmente,
externos. O objetivo final é evitar
seus interesses e os dos gestores sejam aderentes, são normalmente que a empresa seja punida pelo
realizados de duas formas distintas. mercado por conta de decisões
tomadas que possam afetar sua
A primeira diz respeito aos gastos necessários à implantação, na em- imagem e sua credibilidade,
6
presa, de uma estrutura de governança corporativa e compliance , ca- além da aplicação de penalida-
des legais e financeiras pelo não
paz de monitorar e acompanhar a atuação dos gestores, evitando, dessa
cumprimento da lei em qualquer
forma, que decisões implementadas e atitudes tomadas possam afetar uma de suas esferas.

Introdução a finanças corporativas 25


negativamente os resultados da empresa e/ou reduzir o potencial de
crescimento da riqueza dos proprietários.

Outra maneira de implantar políticas que geram custos de agên-


cia está relacionada à forma de remuneração dos gestores, principal-
mente daqueles que exercem os cargos mais importantes. O objetivo
é incentivar os gestores a tomarem decisões que possam aumentar a
riqueza dos proprietários, permitindo a eles ganhos também cada vez
maiores à medida que o mesmo efeito ocorre com os proprietários.

Além disso, essas políticas permitem às empresas que utilizam essas


práticas reterem os melhores profissionais, ao mesmo tempo em que
concorrem pelos melhores talentos do mercado.

Usualmente, essas políticas incluem:

OPÇÕES DE COMPRA BONIFICAÇÃO


PLANOS DE METAS
DE AÇÕES EM ESPÉCIE

Permitem aos gestores, Vinculam a remunera- Pagamento vinculado


a compra de ações da ção do gestor ao atingi- à obtenção de metas
empresa por um preço mento de determinadas previamente definidas.
estabelecido no mo- metas. Os pagamentos
mento da concessão. podem ser feitos em
espécie ou em ações.

É importante frisar que, se os objetivos dos proprietários e dos ges-


tores fossem sempre os mesmos, não haveria a necessidade de a em-
presa incorrer em custos de agência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O gestor financeiro de qualquer tipo de empresa tem um papel fun-
damental no crescimento sustentado da organização. Em primeiro lugar,
ele precisa sempre lembrar que seu objetivo é maximizar a riqueza dos
proprietários e não o lucro do período.
Em segundo, precisa ser capaz de entender as consequências das de-
cisões econômico-financeiras, sociais e políticas do governo e os eventos
ocorridos nos mercados externos, sob esses mesmos pontos de vista,
sobre os resultados futuros da empresa, procurando sempre implantar
medidas proativas a todos esses eventos, lembrando que o conhecimento
necessário para isso não se limita apenas a essas questões.

26 Finanças Corporativas
Uma indagação importante que o gestor não pode esquecer é a es-
sência da sua função: a gestão do dinheiro dos stakeholders. Isso fica ainda
mais claro quando lembramos que todas as decisões tomadas pelos ges-
tores de qualquer área da empresa afetarão de alguma forma a geração
de caixa da empresa. Por esse motivo, insistimos mais uma vez que todos
os profissionais precisam do entendimento financeiro para desempenhar
de maneira eficaz suas atividades.
Na área financeira, normalmente composta pela Controladoria, Tesou-
raria e o staff da diretoria financeira, temos o coração das informações
pretéritas geridas pela Controladoria, com base nos demonstrativos con-
tábeis, e futuras, administradas pela Tesouraria com base no fluxo de cai-
xa. Essas áreas, com foco no tratamento da informação e nos objetivos,
representam a base das informações fundamentais para o processo de
tomada de decisão.
Toda essa geração, administração e tomada de decisões, com base
nas informações produzidas na empresa, precisa estar associada aos efei-
tos da globalização dos mercados e das empresas, à velocidade da evolu-
ção das novas tecnologias em todas as áreas, principalmente na forma de
comunicação entre os mercados, e à necessidade de transparência nas
atitudes e decisões dos gestores para com seus stakeholders.
Finalmente, uma última questão, mas não menos importante para o
gestor, são as relações de agência, que são recorrentes. Ocorrem com
frequência quando os administradores da empresa (agentes) não têm
participação no capital da empresa ou, quando têm, são minoritárias, o
que pode gerar objetivos, perspectivas e necessidades diferentes entre
os gestores e os sócios.
Essas mesmas relações podem ocorrer também entre os investido-
res da empresa (pessoas físicas ou jurídicas com qualquer percentual de
participação no capital social e que emprestam recursos sem prazo para
devolução/pagamento, ficando com todo o risco final do negócio), por
meio da atuação dos agentes e financiadores, fornecedores, colaborado-
res, governo e bancos, ou seja, pessoas físicas ou jurídicas que não detêm
qualquer percentual de participação no capital da empresa, incorrendo
em um risco menor do que os proprietários, sendo essas relações de ex-
trema relevância para a atuação dos gestores.
Se os interesses de todos os stakeholders (investidores, financiadores,
clientes e gestores da empresa) não estiverem alinhados de maneira ade-
quada, ou seja, se estiverem apontando para direções opostas, certamen-
te a empresa não maximizará sua riqueza.

Introdução a finanças corporativas 27


REFERÊNCIAS
BRIGHAM, E. F.; GAPENSKI, L. C.; EHRHARDT, M. C. Administração Financeira: teoria e
prática. São Paulo: Atlas, 2001.
GITMAN, L. J. Princípios de administração financeira. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010.
PEREIRA, A. S.; BISPO, P. L. Custos e formação de preços. Curitiba: IESDE Brasil, 2019.

GABARITO
1. Todas as decisões tomadas em todas as áreas da empresa trazem algum tipo de efeito
sobre o caixa, impactando os saldos disponíveis para utilização. Por esse motivo, po-
demos dizer que todas as decisões gerenciais são decisões financeiras.

2. A Controladoria trabalha com informações com base no regime de competência, ou


seja, as informações são demonstradas no momento em que ocorrem, independente
do prazo em que afetarão o caixa. A Tesouraria trabalha com informações com base
no caixa, ou seja, o fundamento da informação é o momento em que o dinheiro afe-
tará o caixa da empresa.

3. Stakeholders são todas as pessoas físicas ou jurídicas, afetadas de alguma forma pela
atuação da empresa em determinado mercado.

28 Finanças Corporativas
2
Custo de capital
Nas organizações, com ou sem fins lucrativos, todos os investi-
mentos realizados, expressos no Ativo da empresa, precisam ser
financiados pelo Passivo, de acordo com seus respectivos prazos
de maturação e da rentabilidade projetada e, principalmente, com
base nos prazos de pagamento e nos custos incorridos na capta-
ção dos recursos investidos.
Para que esse processo ocorra de maneira saudável, é funda-
mental que os gestores consigam calcular o custo dos recursos
captados para financiar as atividades. Sem o cálculo do custo mé-
dio dos recursos obtidos no Passivo, para financiar os investimen-
tos realizados no Ativo, a empresa perde um referencial da maior
importância: a taxa de retorno necessária à cobertura do custo
dos recursos passivos, ou seja, sua taxa mínima de atratividade.
A estrutura dos recursos passivos é composta pelo capital de
terceiros, constituído pelos créditos de curto e longo prazo (em-
préstimos financeiros e financiamentos diretos) e pelos recursos
captados junto a sócios, por meio da emissão de ações ou de cotas
de capital e lucros reinvestidos, isto é, pela parcela dos lucros não
distribuídos aos seus proprietários ou patrocinadores. Cada uma
dessas fontes tem um custo específico, em função do grau de risco
a ela associado.
Entender como calcular esses custos, chamados de custo de ca-
pital ou custo médio ponderado de capital, e suas implicações para o
valor da empresa é o objetivo deste capítulo.

Custo de capital 29
2.1 Definição do custo de capital
Vídeo A atividade empresarial é totalmente suportada por meio da capta-
ção de recursos oriundos de diferentes tipos de fundos, os quais são
obtidos junto a financiadores e investidores ou gerados no curso nor-
mal das atividades operacionais da empresa. Numa classificação mais
ampla, esses fundos são subdivididos em duas categorias:
•• capital dos sócios, captado quando da abertura da empresa, dos
aumentos de capital subsequentes e do reinvestimento de lucros
realizado pelos sócios da empresa, sejam eles acionistas, cotistas
ou proprietários de firmas individuais;
1 •• capital de terceiros, representado por recursos captados e obtidos

Os sócios também são


independentes do prazo de pagamento, junto a financiadores que
1
financiadores da empresa, mas não têm qualquer tipo de participação no capital da empresa .
sem prazo para devolução dos
recursos emprestados e, no caso Todos esses recursos são obtidos no Passivo e têm como objetivo fi-
das grandes corporações, com nanciar as aplicações da empresa. Como apresentam custos de captação
pouca ou nenhuma participação
diferentes, é necessário calcular, do ponto de vista percentual, o quanto
nas decisões estratégicas ou
operacionais. representam em média para a empresa. Por representar o custo médio
dos recursos captados no Passivo, são chamados de custo de capital ou
custo médio ponderado de capital, podendo ser definido como:

a taxa mínima de retorno que o gestor precisa obter em todas as aplicações realiza-
das no Ativo para cobrir o custo médio das fontes de recursos captadas no Passivo
junto a sócios e terceiros.

Sendo o custo de capital a taxa mínima de retorno para todas as apli-


cações realizadas no Ativo, podemos também definir esse conceito como
sendo a taxa mínima de atratividade para qualquer projeto de investi-
mento. Essa definição é muito importante, uma vez que, em várias situa-
ções, o gestor utiliza como taxa mínima de atratividade a rentabilidade
das aplicações financeiras, esquecendo que, a não ser em situações ex-
cepcionais, aplicações financeiras não geram retorno líquido, deduzidos
impostos e custos operacionais superiores ao custo médio das fontes de
recursos passivos.

Portanto, a verdadeira taxa mínima de atratividade, representada


pelo retorno mínimo a ser obtido nas aplicações no Ativo, precisa ser,
no mínimo, igual ao custo médio dos recursos captados no Passivo, ou
seja, igual ao custo de capital. É por esse motivo que podemos afirmar

30 Finanças Corporativas
que a verdadeira taxa mínima de atratividade da empresa é o custo de
capital ou custo médio ponderado de capital.

Essa definição inicial já deixa implícito que a determinação do custo


de capital é fundamental para qualquer decisão de investimento, seja
por meio da compra ou do aluguel de um bem, seja para a definição da
estrutura de capital que maximize o valor da empresa.

Essa taxa e, consequentemente, o valor atual dos retornos futuros


dependem diretamente da percepção dos sócios e dos terceiros sobre 2
o grau de risco não controlável pela empresa, também chamado de
2
O risco sistemático ou não
risco sistemático ou não diversificável . diversificável inclui todos os
tipos de risco sobre os quais o
Importante gestor não tem qualquer tipo
1. Se o custo de capital ou o seu custo médio ponderado reflete a taxa mínima de retor- de controle, por exemplo, os
eventos econômicos, políticos,
no necessária em qualquer investimento no Ativo, então quaisquer investimentos que
pandemias etc. Esses eventos
gerem retornos superiores ao custo médio ponderado de capital aumentam a rentabi- impactam a empresa de alguma
lidade da empresa. forma, sem que os gestores
tenham qualquer domínio sobre
2. O valor da empresa reflete o valor presente do fluxo de caixa gerado pela empresa por
seus efeitos.
um período. A taxa utilizada para trazer o fluxo de caixa ao valor presente é o custo de
capital. Portanto, todo projeto que apresente um retorno superior a esse custo aumenta
o valor da empresa.
3. Na literatura técnica, o custo de capital também é chamado de:
• custo de oportunidade de capital;
• custo médio ponderado de capital (os livros norte-americanos utilizam a expres-
são WACC, significando Weighted Average Cost of Capital);
• custo do Passivo;
• custo do Ativo.
Livro
Cada uma das fontes de financiamento utilizadas tem um custo dife- No livro Administração
rente por apresentar riscos distintos. O custo de capital reflete a pondera- Financeira, os conceitos
necessários ao cálculo
ção entre cada fonte de recursos utilizada pela empresa e seu respectivo
do custo de capital ou
custo efetivo, devendo ser empregado como um parâmetro comparativo custo médio de capital
para todas as decisões de investimento tomadas pelas empresas. são apresentados de ma-
neira bastante didática,
Esse conceito significa, na prática, que qualquer projeto que apre- contendo demonstrações
bastante intuitivas dos
sente uma rentabilidade superior ao custo médio ponderado de capital,
conceitos fundamentais
isto é, ao custo médio dos recursos passivos utilizados pela empresa, de risco e retorno.
resultará em retornos positivos adicionais para seus proprietários, BRIGHAM, E. F.; GAPENSKI, L.
oriundos da diferença entre o custo das fontes utilizadas e da rentabili- C.; EHRHARDT, M. C. São Paulo:
Atlas, 2001.
dade gerada pelo emprego desses recursos.

Custo de capital 31
3 De acordo com esse conceito, podemos definir duas regras bási-
cas de investimento para todo administrador. Primeiramente, investi-
Refere-se ao valor na data da
decisão (data zero) de uma mentos com rentabilidade superior ao custo das fontes de recursos
alternativa de investimentos. passivos utilizados agregam valor para a empresa. Em segundo lugar,
3
investimentos com Valor Presente Líquido (VPL) positivo, calculado
Atividade 1 com base em uma taxa que reflita o custo médio ponderado dos recur-
sos passivos (custo de capital), agregam valor para a empresa.
Explique por que o custo de
capital é a verdadeira taxa
mínima de atratividade de uma
empresa. 2.1.1 Risco
Uma questão fundamental que o gestor deve sempre considerar
em suas decisões é que a determinação do custo médio ponderado
de capital é totalmente dependente do aspecto risco, uma vez que a
percepção de risco do investidor e do financiador altera completamen-
te sua expectativa de rentabilidade e, consequentemente, o custo de
utilização desses recursos.

Do ponto de vista das alternativas de fontes de recursos passivos


utilizadas pelas empresas, o gestor tem como opção:

Figura 1
Representação do Ativo de um Balanço Patrimonial
BALANÇO

PASSIVOS CIRCULANTES

EMPRÉSTIMOS DE LONGO PRAZO (a)


ATIVOS
Fontes de
PATRIMÔNIO LÍQUIDO
longo prazo
Ações ordinárias (b)
Ações preferenciais (b)
Lucros acumulados (c)

4
Essa Lei, de 28 de dezembro
de 2007, compatibilizou a 4
(a) As empresas enquadradas na Lei n. 11.638/2007 denominam esse
forma de contabilização das
grupamento de contas de passivo não exigível.
empresas brasileiras às Normas
Internacionais de Contabilidade. (b) Cotas no caso de uma empresa Ltda.
O objetivo da lei é permitir a (c) As empresas enquadradas na Lei n. 11.638/2007 não apresentam essa conta.
comparação dos dados contábeis
de empresas domiciliadas em
Fonte: Elaborada pelo autor.
países diferentes.

32 Finanças Corporativas
Os recursos captados no Passivo têm seu custo básico expresso com
base no efeito imediato de dois tipos básicos de risco: o operacional e o
financeiro. Ambos afetam a percepção relativa dos financiadores e dos
investidores e o custo financeiro dos recursos para a empresa. Esses ris-
cos são de fundamental importância para o cálculo do custo de capital.

Risco operacional

O risco operacional, também chamado de risco da operação ou risco


do negócio, decorre do tipo de aplicação realizada pelo gestor no Ativo 5
5
da empresa. Isso acontece porque quanto maior a geração de caixa da Geração de caixa representa a
alternativa de investimento no Ativo, menor é o risco gerado por essa diferença entre as entradas e
saídas de caixa em um determi-
aplicação. Por meio desse conceito, podemos dizer que aumentar a ge- nado período. Quanto maior a
ração de caixa diminuirá o risco operacional da alternativa em análise. geração de caixa, mais recursos o
gestor tem disponível para fazer
Generalizando, quanto maior for a geração de caixa do Ativo, me- frente, de modo tempestivo, aos
nor será o risco operacional da empresa. Assim, sempre que o risco compromissos assumidos junto
a terceiros e para reaplicá-los em
operacional aumentar, financiadores (terceiros) e investidores (sócios)
novas alternativas, que também
demandarão uma taxa de juros maior ou um retorno superior para gerem caixa, resultando em um
compensar o risco igualmente crescido. Como consequência, esse cus- círculo virtuoso para a empresa.
to maior ocasionará o aumento do custo total das fontes de recursos
passivos e uma redução no valor da empresa. O risco operacional pode
ser visualizado no Ativo operacional da empresa.

Risco financeiro

O risco financeiro é definido como aquele gerado pela possibilidade Importante


de não pagamento dos credores sem participação no capital social da Como o risco operacional pode
empresa, ou seja, pela maior ou menor geração de caixa. Em outras ser traduzido pela geração de
caixa, sempre que ele aumenta
palavras, o risco financeiro é consequência do risco operacional. Ele é
e a geração de caixa reduz,
afetado pela qualidade (custo e prazo) das fontes empregadas no fi- a percepção sobre o risco da
nanciamento do Ativo (aplicações). empresa cresce, trazendo como
consequência maior risco
Ele é representado, também, pelo risco de a empresa não fazer fren- financeiro e maior risco total,
te aos compromissos assumidos junto a financiadores e não a investi- afetando diretamente o valor da
empresa.
dores (sócios). Isso ocorre porque somente os financiadores que não
participam no capital da empresa, na prática, solicitariam sua falência
(embora não seja impossível, dificilmente um sócio pediria a falência de Atividade 2
seu próprio negócio por algum tipo de inadimplência com ele mesmo). Com base nas definições de risco
operacional e risco financeiro,
O risco financeiro pode ser visualizado por meio da soma do Passivo explique qual desses riscos é
circulante e do exigível a longo prazo ou Passivo não circulante, para as causa e qual é consequência.
empresas enquadradas na Lei n. 11.638/2007.

Custo de capital 33
2.2 Cálculo do custo de capital dos terceiros
Vídeo Ao tomar a decisão de captar recursos para investimentos em Ati-
vos permanentes ou capital de giro, o gestor, focado na sua principal
função de maximizar o retorno dos proprietários da empresa, precisa
levar em consideração o custo dos recursos captados no Passivo, ade-
quando-o à rentabilidade esperada nas aplicações no Ativo.

Sempre antes de a empresa realizar qualquer captação de recursos


6
para o financiamento de suas operações, é de fundamental importância
As garantias estabelecidas
para o gestor entender que o custo de utilização de recursos dos finan-
nos contratos de crédito são
legalmente constituídas por bens ciadores sem participação no capital social da empresa (terceiros) é me-
patrimoniais oferecidos pela em- nor do que o custo do capital próprio. Algumas questões importantes
presa tomadora do crédito ou, até
justificam essa afirmação, conforme demonstramos no Quadro 1.
mesmo, por bens de propriedade
dos sócios da empresa. Quadro 1
Relação de custos e riscos de captação de recursos

7 Os proprietários de qualquer tipo de empresa, por investirem seus recursos


sem um prazo predeterminado, ou seja, sem um vencimento definido, incorrem
As despesas financeiras originá- 1 em um risco maior do que os credores. Por outro lado, os recursos captados
rias das operações de crédito são
junto aos terceiros apresentam prazo de vencimento determinado.
consideradas custos fixos, porque
independem das variações dos Os compromissos decorrentes dessas operações (despesas financeiras e amor-
resultados produzidos pela ati- tizações da dívida) têm ressarcimento prioritário em relação aos interesses dos
vidade operacional da empresa, 2 proprietários (acionistas, cotistas ou proprietários de firmas individuais). Em
ou seja, existe a obrigação de caso de liquidação da empresa, no que diz respeito à prioridade de recebimen-
pagamento independente- to, os sócios são os últimos a receber.
mente do volume de vendas ou
produção da empresa no período A grande maioria das operações de financiamento com capital de terceiros está
3
6
de quitação da dívida. protegida por garantias reais ou financeiras (fiança, aval dos sócios, garantias
reais, penhor de estoques, caução de duplicatas etc.).

8 7
Recursos de terceiros têm custos fixos estabelecidos contratualmente (mes-
Se a empresa estiver enquadrada mo quando definidos por taxas pós-fixadas), os quais, para efeito de tributação,
no regime de lucro real para 4 são dedutíveis na determinação do lucro tributável, proporcionando benefícios
apuração do Imposto de Renda e fiscais para a empresa e seus proprietários por meio da redução do recolhimen-
8
da Contribuição Social, todas as to do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) .
despesas incorridas com finan-
O capital de terceiros torna-se mais protegido das oscilações dos fluxos de caixa
ciadores sem participação no ca-
gerados pelos negócios empresariais, oferecendo menor risco para seus titulares
pital são consideradas dedutíveis 5 se comparado com o capital próprio, que não tem nenhuma garantia e se encon-
para efeito da determinação da
tra completamente vulnerável às oscilações de retorno dos referidos negócios.
base de cálculo do Imposto de
Renda e da Contribuição Social, Fonte: Elaborado pelo autor.
de acordo com as regras fixadas
atualmente pela Receita Federal.

34 Finanças Corporativas
Todos esses elementos nos permitem concluir que o capital dos sócios
tem um custo superior ao custo do de terceiros; isso sem contar, é claro,
que o risco a que os sócios ficam expostos é muito superior ao dos tercei-
ros. É, portanto, bastante razoável supor que a remuneração exigida pelos
proprietários seja maior do que aquela demandada pelos credores.

Além dos elementos mencionados acima, por serem fixos e propor-


cionarem benefícios fiscais, os custos financeiros alavancam o retorno
dos sócios ou acionistas da empresa, desde que se mantenham em
patamares inferiores à lucratividade do Ativo. Em outras palavras, o
capital de terceiros é capaz de promover alavancagem financeira para
o capital próprio investido na empresa, aumentando o valor das ações
ou cotas de capital por ela emitidas.

No entanto, existe outro lado dessa questão que não podemos


deixar de levar em consideração: a utilização das operações de crédi-
to no financiamento dos projetos empresariais eleva o risco dos pro-
prietários. Esse acontecimento deriva das oscilações de lucratividade
inerentes aos mercados de atuação da empresa – refletindo no risco
sistemático ou não diversificável, isto é, naqueles que a empresa não
controla – e da prioridade de pagamento dos compromissos financei-
ros vinculados às operações com os financiadores.

Desse modo, o benefício proporcionado pela alavancagem financei-


ra surge como contrapartida ao risco adicional a que os proprietários
estão expostos. Por essa razão, o capital próprio investido na atividade
empresarial é também denominado capital de risco. Devido ao fato de
ser mais arriscado, o capital próprio tem custo superior ao do capital
de terceiros. 9
Antes de calcularmos o custo do capital de terceiros, precisamos Recursos onerosos ou
lembrar de um conceito muito importante. No cálculo do custo de ca- financiamentos onerosos são
9
aqueles que trazem algum
pital, somente são considerados os recursos onerosos . Esses recur- tipo de remuneração explícita
sos são captados para o financiamento das operações provenientes de para o financiador, ou seja, são
recursos em que o valor obtido
dois tipos de financiadores:
é devolvido com o acréscimo
•• sócios representados no Patrimônio Líquido; de algum tipo de ganho para o
emprestador.
•• empréstimos e financiamentos bancários de qualquer tipo.

Custo de capital 35
Sendo assim, dentre os recursos captados junto a terceiros, de-
10
vemos, inicialmente, excluir todo o grupo de recursos que financiam
São os impostos federais,
estaduais e municipais gerados
as operações da empresa, as quais denominamos, genericamente,
10
com base no objetivo social da de contas a pagar ou fornecedores, as obrigações fiscais e as obri-
empresa. gações sociais .
11

Essas contas representam, no sentido amplo, todos os credores


11 que, de alguma forma, alocam fatores de produção (matérias-primas,
Compreendem todos os produtos acabados e mão de obra) para viabilizar a oferta de produtos
gastos incorridos pela empresa
e/ou serviços ao mercado pela empresa. De fato, esses fornecedores
originários de seus colabora-
dores. Por exemplo: salários, “financiam” as atividades normais, correntes ou do giro natural, tais
encargos sociais, 13º salário, como comprar, produzir e vender.
vale-refeição etc.
Cabe aos sócios, por meio do capital próprio e do reinvestimento
dos lucros, por emprestarem recursos de longo prazo, financiar as apli-
cações de longo prazo. Já aos bancos, compete financiar, em caráter
complementar, as aplicações de longo prazo e do giro natural, o qual,
exclusivamente, refere-se ao capital de terceiros.

Por esse motivo, é necessário reclassificar os dados do Passivo para


deixar em evidência os Ativos operacionais líquidos, as fontes não one-
rosas de recursos e, ao mesmo tempo, demonstrar, como capital de ter-
ceiros, os empréstimos e financiamentos obtidos no mercado financeiro.

As contas a pagar ou fornecedores, as obrigações sociais e as obri-


gações fiscais (contas mais comuns, embora possam existir outras de
financiamento ligadas à atividade operacional da empresa) são apresen-
tadas no Ativo com sinal negativo, pois visam demonstrar o investimento
líquido da empresa no capital de giro. No Passivo, ficam demonstradas
as duas fontes de financiamento oneroso da empresa: dívidas com ban-
cos (capital de terceiros) e Patrimônio Líquido (capital próprio).

O Quadro 2 ilustra como ficariam as contas da empresa refletidas


no Balanço, antes e depois dos ajustes.

36 Finanças Corporativas
Quadro 2
Exemplo de Balanço Patrimonial após ajustes

BALANÇO PATRIMONIAL - R$ MILHÕES 19X1 19X2


Contas a receber 210 230
Estoques 140 145
Total Ativo circulante 350 375
Total Ativo não circulante 655 670
TOTAL ATIVO 1.005 1.045
Contas a pagar 130 150
Empréstimos 335 270
Total Passivo circulante 465 420
Total Patrimônio Líquido 540 625
TOTAL PASSIVO 1.005 1.045

BALANÇO PATRIMONIAL - R$ MILHÕES 19X1 19X2


Contas a receber 210 230
Estoques 140 145
Contas a pagar –130 –150
Total Ativo circulante ajustado 220 225
Total Ativo não circulante 655 670
TOTAL ATIVO 875 895
Empréstimos 335 270
Total Patrimônio Líquido 540 625
TOTAL PASSIVO 875 895

Fonte: Elaborado pelo autor.

Com base na separação das contas onerosas no Passivo da empre-


sa, a determinação do custo dos recursos de financiamento de tercei-
12
ros é realizada por meio do custo explícito dessas fontes, compostas
12
Tarifas cobradas pelas institui-
de juros, impostos, comissões (flat fees ) e demais encargos cobrados. ções financeiras nas operações
de financiamento, como TAC
Esse custo, no entanto, deve considerar os benefícios fiscais atribuí-
(taxa de abertura de crédito),
dos às despesas financeiras, que, segundo a legislação, são dedutíveis seguros e reciprocidades.
para as empresas que fazem a apuração do Imposto de Renda e da
Contribuição Social pelo regime de apuração do lucro real.

Custo de capital 37
Importante
Atualmente, o pagamento de Imposto de Renda e Contribuição Social da pessoa ju-
rídica pode ser feito de quatro formas diferentes: simples, lucro presumido, lucro real
e lucro arbitrado. No regime de apuração pelo simples, as empresas enquadradas
nessa modalidade recolhem um valor calculado por meio da incidência de uma alí-
quota, a qual é obtida em função do faturamento dos últimos doze meses e do tipo
13 de serviço prestado (existe uma tabela de enquadramento), sobre o total das receitas
do mês. O pagamento é feito no mês subsequênte.
Esse percentual é diferente para
o cálculo do Imposto de Renda No regime do lucro presumido, é definido um percentual que varia em função do
e para o cálculo da Contribuição segmento da empresa, demonstrando a estimativa do lucro sobre o faturamento 13 .
Social sobre o Lucro Líquido Com esse percentual, o imposto é calculado pela alíquota do imposto, multiplicado
(CSLL).
pelo percentual de lucro presumido e pela receita da empresa do mês. O recolhi-
mento do imposto é trimestral.
14 Já no regime do lucro real, o imposto é calculado sobre o lucro tributável calculado
pela diferença entre a receita e as despesas consideradas dedutíveis 14 . Esse regime
Nem todas as despesas são
permite a apuração trimestral e anual, dependendo dos enquadramentos definidos
dedutíveis para efeito de cálculo
do lucro tributável, existindo pela lei.
limites de dedução mesmo para A quarta e última forma de tributação é o lucro arbitrado. Esse regime é utilizado
aquelas que são consideradas em alguns casos reconhecidos na legislação, desde que a receita bruta seja notória.
como tal.
Dentre esses casos, estão o extravio e perda de documentos contábeis e fiscais, fata-
lidades e fraudes. O cálculo é realizado de modo similar ao do lucro presumido, mas
com um acréscimo de 20%. A apuração é feita trimestralmente.

O custo pago por uma empresa para captar recursos junto a ter-
ceiros pode ser calculado com base no conceito da taxa interna de
retorno (TIR) do fluxo de caixa gerado pelo financiamento. Do ponto de
vista da empresa tomadora, o valor calculado representa o custo ocor-
rido até o vencimento dos fluxos de caixa associados ao débito, antes
do benefício gerado pela dedução dos custos financeiros do Imposto
de Renda a pagar.

Já o custo efetivo do financiamento, esse sim relevante para o cálcu-


lo do custo que a empresa efetivamente pagará, calculado com base na
redução gerada pelas despesas financeiras observadas no Imposto de
Renda, pode ser definido por meio da seguinte relação:

kd = i (1 – %IR)

Onde:
kd = Custo efetivo do financiamento
i = Custo efetivo cobrado pela instituição financeira (TIR)
%IR = Alíquota de Imposto de Renda

38 Finanças Corporativas
É importante lembrar que essa equação somente deve ser utilizada
no cálculo do custo dos financiamentos bancários para empresas en-
quadradas no regime do lucro real, para efeito do Imposto de Renda e
da Contribuição Social. Para as demais empresas, o custo final de qual-
quer alternativa de financiamento oneroso é obtido com esta equação:

kd = i

A título de exemplo, para uma empresa enquadrada no regime de


apuração pelo lucro real, consideremos uma operação de crédito de
valor nominal igual a R$100.000,00, sujeita à taxa de juros de 25% ao
ano e com prazo de vencimento igual a um ano. A despesa financeira J
incorrida nesse período será:

J = R$100.000,00 × 0,25 = R$25.000,00

Entretanto, admitindo-se uma alíquota do Imposto Renda e da Con-


tribuição Social de 25%, o benefício ou economia fiscal proporcionado
por essa despesa será igual a R$6.250,00 (25% × R$25.000,00). Portan-
to, a empresa tomadora do crédito arcará com uma despesa líquida de
R$18.750,00.

kd = (1 – 0,25) × $25.000,00 = 0,75 × R$25.000,00 = R$18.750,00

Em termos de taxa de juros, o custo líquido ie da operação é igual a


18,75% ao ano, conforme demonstrado a seguir:

ie = R$18.750,00 ÷ R$100.000,00 = 0,1875 = 18,75%

ou

ie = 25% × (1 – 0,25) = 18,75%

Nessa mesma situação, se a empresa não estivesse enquadrada no


regime do lucro real, o custo seria de 25%.

2.3 Cálculo do custo de capital dos sócios


Vídeo O risco da atividade operacional, também chamado de risco do ne-
gócio ou risco da operação, é percebido de modo completamente dife-
rente na empresa, mesmo entre os financiadores com participação no
capital social. Assim sendo, o sócio com participação ativa na gestão da
empresa tem uma percepção do risco do negócio totalmente distinta

Custo de capital 39
daquele que é meramente um investidor, sem participação nas deci-
sões operacionais e estratégicas do negócio.

Fica evidente, pelas diversas percepções de risco, que a remune-


ração desejada por cada financiador deve ser diferente, por exemplo,
daquela oferecida pelos depósitos em caderneta de poupança ou pelos
depósitos e demais aplicações de curto prazo efetuados junto às insti-
tuições financeiras.

Algumas questões justificam esse argumento. Em primeiro lugar, a


remuneração deve refletir os efeitos das restrições de liquidez próprias
das operações de financiamento dos projetos empresariais, que, em
geral, têm prazo longo ou indeterminado. Em segundo, qualquer proje-
to ou negócio empresarial é, normalmente, mais arriscado do que uma
aplicação financeira oferecida por uma instituição do mercado, embora
sempre possam haver exceções ditadas pelo risco de crédito da insti-
tuição e pelo tipo de aplicação oferecido.

Como ele ocorre com a rentabilidade esperada em qualquer aplica-


ção, o retorno que o investidor deseja obter é representado por dois
componentes conceitualmente distintos, chamados de prêmio de liqui-
dez e prêmio de risco ou spread.

Prêmio de liquidez

Toda vez que aplicamos recursos, ficamos, durante o tempo em que


estão sendo investidos, sem a liquidez imediata que teríamos se eles
15
estivessem, por exemplo, disponibilizados em nossa conta bancária.
Algumas aplicações permitem Para abrir mão dessa liquidez, todo investidor deseja um prêmio, de-
ao investidor resgatar a aplicação
antes do vencimento, mediante nominado prêmio de liquidez. Ele reflete a renúncia à liquidez imediata,
um desconto na rentabilidade durante o tempo em que ficaremos impossibilitados de usar os recur-
final. Quanto mais rápido e fácil sos. Esse prêmio é definido em função do tempo e das condições em
for o mecanismo de resgate 15
antes desse vencimento, menor que podemos resgatar a aplicação realizada .
será o prêmio de liquidez. Da
O prêmio de liquidez é definido, na literatura técnica, como taxa li-
mesma forma, quanto menor for
o prazo da aplicação, menor será vre de risco ou taxa prime. Como exemplo de prêmio de liquidez para o
o prêmio de liquidez. investidor no país, podemos citar as taxas de rentabilidade oferecidas
pelos títulos do Tesouro Nacional e pelos Certificados de Depósito In-
terbancário (CDI).

Prêmio de risco ou spread

O prêmio de risco ou spread, por outro lado, refere-se à remunera-


ção adicional, a qual é exigida pelo investidor para compensar o risco

40 Finanças Corporativas
intrínseco associado ao investimento realizado, ou seja, o recebimento
de um retorno maior ou menor do que o esperado (ou, até mesmo, o
não recebimento da devolução do valor aplicado).

Ao analisarmos essa definição, não podemos esquecer de uma re-


gra básica de investimento:

Quanto maior for o risco a que o capital estiver exposto, maior deverá ser o prêmio
de risco ou spread.

Toda vez que uma empresa capta recursos, independente de seu


objetivo, deve oferecer uma rentabilidade ao proprietário dos recursos,
a qual será maior ou menor em função do risco percebido por ele na
alternativa oferecida.

Se, para o investidor, a taxa esperada pelo investimento representa


seu retorno, para a empresa, ela caracteriza o percentual mínimo que
deverá ser remunerado aos detentores dos recursos empregados, re-
presentando, portanto, o seu custo de utilização. Esse custo para a em-
presa é chamado de custo de capital ou custo de oportunidade de capital.

Assim, independente da fonte ou estrutura de capital utilizada pela


empresa, o custo de oportunidade ou, simplesmente, custo do capi-
tal associado a uma operação de investimento pode ser definido pela
soma de dois prêmios ou componentes de retorno:

Custo do capital do sócio = Prêmio de liquidez + Prêmio de risco ou spread

Embora os prêmios de risco sejam de fácil conceituação, enten-


dendo que se encontram implícitos em todas as operações financei-
ras, sejam elas de crédito ou de investimento com capital próprio, nem
sempre será tão simples reconhecê-los ou estimá-los.

A determinação desses prêmios será desnecessária, em muitos


casos, devido à possibilidade de estabelecer o custo de capital de um
Ativo ou de um projeto por meio da sua comparação com outros inves-
timentos observados no mercado, que apresentem riscos semelhan-
tes. Em outros casos, o prêmio de risco poderá ser estimado com base
na teoria do mercado de capitais, com a utilização de modelos de ajus-
tamento de retorno versus risco.

Custo de capital 41
Entretanto, existem Ativos ou projetos que não encontram corres-
pondentes com riscos semelhantes no mercado ou cujo risco é difícil de
estimar. Isso ocorre, por exemplo, nos investimentos em novos produ-
tos ou em inovações tecnológicas. Nesses casos, o custo de capital não
pode ser determinado com precisão, devendo ser estimado de acordo
com critérios bastante subjetivos.

Ao contrário do capital de terceiros, o capital próprio é investido por


prazo indeterminado. Seu retorno provém dos fluxos de caixa líquidos
gerados pela empresa, após a dedução de todas as despesas, impostos
e amortizações de dívidas, essas criadas pelos recursos dos financiado-
res sem participação no capital da empresa.

Além disso, os direitos dos proprietários sobre o patrimônio total


do negócio são reivindicados somente após terem sido atendidos os
interesses dos credores. Esse capital, portanto, tem custo variável na
medida em que proporciona retornos incertos para os seus titulares
(sócios ou acionistas) e está sujeito a riscos maiores do que os suporta-
dos pelos credores.

Importante
Os conceitos de custo fixo e variável, quando relacionados a aplicações financeiras,
são diferentes daqueles utilizados apenas para desembolsos, lembrando que uma
taxa de retorno para quem aplica significa rentabilidade, já para quem captou os
recursos, significa custo.
Renda fixa ou custo fixo, quando relacionado a aplicações financeiras, compreende
todas as aplicações nas quais sabemos as regras do jogo. Por exemplo, quando apli-
camos em um título que vai nos remunerar com IGP-M acrescido de uma taxa de
juros, ou quando a aplicação é remunerada por uma taxa fixa de juros, sabemos a
regra da aplicação.
Por outro lado, quando aplicamos recursos em bolsa de valores, não sabemos a regra
de remuneração. Assim sendo, podemos receber dividendos e/ou juros sobre capital
próprio sem que saibamos, na data da compra da ação, qual valor será pago pela em-
presa. Podemos, também, receber valorização (diferença entre o preço de aquisição
da ação e preço na data da venda) ou, até mesmo, receber dividendos ou juros sobre
capital próprio e valorização, isso tudo sem que saibamos a priori o que acontecerá.
Esse atributo caracteriza a renda variável

De maneira geral, o capital próprio proporciona ganhos tanto cor-


rentes quanto de capital para os seus titulares. Os primeiros são re-
presentados pelos rendimentos ou ganhos de caixa, periodicamente

42 Finanças Corporativas
distribuídos pela empresa na forma de dividendos ou juros sobre ca-
pital próprio (no caso das sociedades por ações) ou de retiradas (no
contexto das sociedades por cotas). Os ganhos de capital, por sua vez,
são representados pelas taxas de valorização ou desvalorização das
ações ou das cotas de capital em cada período (aumento de valor no
investimento realizado pelos proprietários, resultante do aumento na
geração de caixa da empresa). Portanto, o retorno proporcionado pelo
capital próprio, a cada período, é igual à soma desses dois ganhos:

Retorno do capital próprio = Ganho corrente + Ganho de capital

Por outro lado, ambos os ganhos oscilam ao longo do tempo em


função dos riscos assumidos pelos gestores e dos riscos existentes no
mercado, não controláveis pela empresa. As expectativas ou tendências
de longo prazo associadas aos dois tipos de ganho compõem o custo do
capital próprio, constituído por: 16
16
Essa é outra forma de definir
Custo do capital próprio = Expectativa de ganho corrente + Expectativa o custo do capital dos sócios,
de ganho de capital embora igual em essência à que
já apresentamos.
Entendido como expectativa de retorno a longo prazo, o custo do
capital próprio é superior ao do capital de terceiros, devido ao fato de
estar submetido a um nível de risco mais elevado se comparado ao
outro. Além disso, sua determinação é bem mais complexa na medida
em que envolve maiores incertezas, sujeitando-se a certo grau de
subjetividade do analista.

Apesar da complexidade envolvida na estimação do custo do capital


próprio de uma empresa, a sua conceituação é bastante simples. Para
isso, precisamos recorrer ao critério geral de avaliação de Ativos. Se-
gundo esse critério, podemos afirmar que o preço ou valor das ações
de determinada empresa, negociadas no mercado de capitais em dado
momento, é igual ao valor atual dos fluxos de caixa esperados pelos
investidores, durante um período indeterminado.

Esse conceito também serve para uma empresa constituída sob a


forma de cotas. Em outras palavras, esse preço é igual ao valor dos
rendimentos futuros (retiradas, no caso de uma limitada), descontados
do custo do capital próprio. Esse conceito é traduzido do ponto de vista
matemático pela equação a seguir:

Custo de capital 43
D1 D D D D D D D D D Dt
P0  P  + 1 2+ + 2 3+ + 3 4+ 4 + 4 5+ 5 + 5 + 
(1 0k ) (1 (1k) k )2(1  (k1)2 k )3(1 (k
1)3k ) (1  k 4
(1) k ) (1  k )5 (1 + k)t

Onde:
P0 = Preço da ação ou cota no mercado na data zero
Dt = Rendimentos por ação ou retiradas por cota esperados para a data zero
k = Custo do capital próprio na data zero

Evidentemente, é de se esperar que os rendimentos e as retiradas


apresentem tendência crescente a longo prazo, apesar de oscilarem de
um período para outro. Vale lembrar que se o investidor não percebe
uma tendência de crescimento em seu retorno, do ponto de vista estrita-
mente racional, deveria vender sua participação no capital da empresa.
Outra questão importante é que o crescimento dos rendimentos dos
sócios está associado ao aumento da geração de caixa da empresa e, como
consequência dos lucros, incentivando os sócios a reinvesti-los periodica-
mente, gerando um círculo virtuoso para a gestão financeira da empresa.
Por outro lado, o preço de mercado de uma ação ou cota reflete não
apenas as expectativas de lucratividade e crescimento dos dividendos/
retiradas, mas também o risco associado a essas expectativas. Quanto
maior for esse risco, na opinião dos investidores, menor será o preço
que eles estarão dispostos a pagar pela ação/cota e vice-versa.
Desse modo, o custo do capital próprio pode ser definido pela taxa
de desconto (k), que torna o valor atual dos dividendos e/ou juros sobre
capital próprio ou das retiradas futuras, no caso de empresas não cons-
tituídas sob a forma de sociedades anônimas, igual ao preço ou valor
de mercado das ações ou cotas de uma empresa.
Como vimos há pouco, formar expectativas, tanto sobre o valor dos
dividendos e/ou juros em relação ao capital próprio a ser recebido quanto
sobre as retiradas futuras e suas taxas de crescimento, não é uma tarefa
Atividade 3
simples. Para que possamos operacionalizar o conceito apresentado em
Explique por que o custo de nossa vida prática, é necessário lançar mão de hipóteses capazes de tra-
capital dos sócios é mais elevado
do que o custo de capital dos duzir a tendência desses fluxos de caixa com razoável nível de confiança.
financiadores sem participação Essas hipóteses, apesar de simplificadoras em certo grau, permi-
no capital social da empresa.
tem o desenvolvimento de modelos matemáticos realizados com base
nas variáveis que mais influenciam aquela tendência. Os modelos mais
comumente utilizados para o cálculo do custo do capital próprio são
apresentados a seguir.

44 Finanças Corporativas
2.3.1 Modelo de Gordon-Shapiro
O modelo de Gordon-Shapiro é fundamentado na premissa de que
a tendência de crescimento dos lucros e dos dividendos a longo prazo
pode ser expressa por uma taxa de crescimento constante. De acordo
com esse modelo, o preço de uma ação é definido pela seguinte relação:

D1
P0 =
(ke – g)

Onde:
P0 = Preço líquido de uma ação, na data de sua avaliação (t = 0)
D1= Dividendo por ação esperado para o primeiro período
g = Taxa de crescimento esperada
ke = Taxa de desconto ou custo do capital próprio

Com base na relação acima, alterando seus elementos, obtemos a


expressão do custo do capital próprio, representado por ke, definido
pelo modelo de Gordon-Shapiro por meio da seguinte relação:

ke = (D1 ÷ P0) + g

O quociente D1 ÷ P0 é chamado de dividend-yield, cash-yield ou, sim-


plesmente, yield. Ele representa a expectativa de ganho corrente, pro-
porcionada pelo investimento nas ações da empresa.

A variável g, representada por uma taxa, indica a expectativa de ga-


nho de capital, isto é, a perspectiva de valorização das ações ou das
cotas da empresa a longo prazo. A taxa de crescimento pode ser esti-
mada calculando-se a média geométrica das taxas de crescimento his-
toricamente observadas.

Alternativas adicionais, utilizadas pelo mercado, compreendem o


uso de previsões de analistas de mercado, modelos de simulação, mo-
delos estocásticos (por exemplo: simulação de Monte Carlo, algoritmos 17
17
genéticos etc.) e outras técnicas especializadas . Informações adicionais sobre
Assim, o custo do capital próprio estimado por esse modelo é muito essas técnicas podem ser encon-
tradas em Damodaran (2010).
sensível às estimativas da taxa yield e da taxa g. Por isso, essas estimati-
vas requerem cuidados especiais por parte dos analistas.

Custo de capital 45
Repare que o modelo de Gordon-Shapiro demonstra como podemos
estimar o custo do capital próprio sem explicitar o prêmio de risco nele
incluído. Essa abordagem torna desnecessária a medição do risco do in-
vestimento, considerando que essa avaliação está implícita no processo
de negociação dos Ativos e na formação do seu valor de mercado.

Para exemplificar a utilização do modelo de Gordon-Shapiro no cál-


culo do custo do capital dos sócios, suponha uma empresa em que as
ações ordinárias apresentem: valor unitário de mercado de $65,00, di-
videndo projetado para ser pago ao final do corrente ano de $4,29 por
ação, e expectativa dos investidores para o crescimento dos dividendos
de 8%. Segundo essas informações, o custo do capital dos sócios seria:

Ke = (D1 ÷ P0) + g

Ke = (4,29 ÷ 65,00) + 0,08 = 0,146 × 100 = 14,6%

Esse valor, expresso sob a forma percentual, representa o quanto os


investidores da empresa desejam obter de retorno sobre o capital inves-
tido. Se, para os sócios, esse valor representa retorno, para os gestores,
indica o custo que terão que “pagar” pela utilização desse investimento.

2.3.2 Modelo CAPM


Sabemos que o preço dos Ativos no mercado financeiro nem sempre
corresponde ao seu valor justo ou intrínseco. Teoricamente, esse preço
tende a oscilar em torno do preço justo do Ativo, ditado pelas condições
de equilíbrio do mercado. Da mesma maneira, o custo do capital próprio
tende a variar em torno de uma taxa de equilíbrio, definida como expec-
tativa de retorno ou custo de capital em condições de equilíbrio.

O CAPM (Capital Asset Pricing Model) parte da hipótese de que os


mercados financeiros são eficientes do ponto de vista da geração de in-
formações, ou seja, todos têm o mesmo nível de informação ao mesmo
tempo. De acordo com essa hipótese, as informações que interferem
de modo relevante na formação dos preços dos Ativos são rapidamen-
te processadas pelos agentes econômicos.

Nessas circunstâncias, será praticamente impossível para um indi-


víduo, em particular, realizar retornos extraordinários em relação aos
demais, posto que todos possuem as mesmas informações e as mes-
mas incertezas, quase que simultaneamente.

46 Finanças Corporativas
Mesmo reconhecendo a inexistência de mercados perfeitos, para os
quais essa hipótese estaria plenamente justificada, é preciso lembrar
que o desenvolvimento da tecnologia e a velocidade com que as in-
formações são difundidas vêm tornando os mercados mais eficientes,
trazendo as premissas básicas de utilização do modelo CAPM cada vez
mais próximas da realidade.

Essa observação permite aceitar uma premissa básica do modelo:


os investidores tenderão a constituir carteiras de Ativos ou de projetos
com o objetivo de diversificação do risco. Com isso, parte do risco é
diluído na carteira dos investidores, tornando-o irrelevante para a de-
terminação dos prêmios de risco.

Com base nessa premissa, os investidores passam a se preocupar


apenas com o componente de risco não diversificável (fora de seu con-
trole), também conhecido como risco sistemático, uma vez que:
a. O risco diversificável representa a parcela de risco do Ativo
que pode ser eliminada pela diversificação dos investimentos.
Esse risco decorre de eventos que afetam cada um dos Ativos
isoladamente, isto é, de maneira específica.
b. O risco sistemático ou risco não diversificável decorre
dos fatores que afetam todos os Ativos em conjunto
simultaneamente. Esse risco está correlacionado com o risco
da carteira do mercado, cujo desempenho pode ser observado
por meio da evolução dos índices de bolsas de valores.

É importante lembrar que a diversificação será benéfica ao inves-


tidor sempre que as variações de retorno específicas de um Ativo,
causadas por eventos que o afetam isoladamente, tenderem a ser
compensadas pelas variações de retorno dos outros Ativos, os quais
compõem a carteira do investidor. Já os efeitos das variações do mer-
cado tendem a afetar todos os Ativos integrantes da carteira no mesmo
sentido, embora alguns deles possam ser mais afetados do que outros.

Como premissa básica do modelo, qualquer investidor poderá for-


mar uma carteira diversificada de Ativos, anulando o efeito dos seus
riscos específicos ou não sistemáticos. Entretanto, ele deverá arcar
com os riscos sistemáticos ou não diversificáveis desses Ativos, repre-
sentados, no modelo, pela sensibilidade de cada um em relação às os-
cilações do mercado.

Custo de capital 47
Por esse motivo, fica implícito, no desenvolvimento do modelo, que
o investidor desejará ser recompensado apenas por esse componente
não diversificável do risco do investimento, ou seja, pela parcela sobre
a qual ele não tem qualquer tipo de controle, almejando um retorno
crescente à medida que perceba o crescimento desse risco.

Em outras palavras, segundo esse modelo, somente os riscos sis-


temáticos serão relevantes na estimação dos prêmios de risco, isto é,
aqueles associados à perspectiva de retornos maiores ou menores do
que o esperado. Esse risco contempla também a possibilidade de o in-
vestidor não receber o valor aplicado de volta.

O risco sistemático de um Ativo pode ser estimado por um indica-


dor conhecido como coeficiente beta ( ), que constitui-se num fator de
proporcionalidade entre as variações percentuais de retorno do Ativo
e do mercado, medindo a volatilidade dos retornos desse primeiro em
relação ao segundo. Desse modo, ele quantifica o grau de reação de
um Ativo ao comportamento do mercado. Por essa razão, é também
denominado coeficiente de volatilidade.

Teoricamente, poderão existir Ativos cujo coeficiente seja negativo,


indicando que tenderão a oscilar em sentido oposto ao do movimento
do mercado. Esses Ativos, no entanto, não são comumente encontra-
dos na prática. Sua ocorrência tem sido observada esporadicamente e,
em alguns casos, em períodos atípicos.

Supondo, por exemplo, que a carteira do mercado venha a regis-


trar uma oscilação de 10%, para mais ou para menos, em dado perío-
do, um Ativo com:
•• = 1,50 terá uma oscilação estimada em 1,50 × 10% = 15%, para
mais ou para menos, no mesmo período;
•• = 0,80 terá uma oscilação estimada em 0,80 × 10% = 8%, para
mais ou para menos, no mesmo período;
•• = 1 terá como expectativa um comportamento igual ao do mer-
cado, isto é, uma oscilação de 10%, para mais ou para menos, no
mesmo período;
•• = 0 terá como expectativa uma oscilação nula, não sendo, por-
tanto, influenciado pela oscilação da carteira de mercado. Um Ati-
vo com = 0 pode ser considerado de renda fixa.

48 Finanças Corporativas
O coeficiente de volatilidade beta, atribuído à carteira de mercado
( m), será sempre igual à unidade, isto é, m = 1. Isso permite que os
Ativos sejam classificados em função de sua medida relevante de risco.
Assim, Ativos que apresentam:
•• > 1 são considerados mais arriscados do que o mercado;
•• < 1 são considerados menos arriscados do que o mercado;
•• = 1 são considerados tão arriscados quanto o mercado.
Saiba mais
Aceitando esse coeficiente de volatilidade como medida relevante
O termo original para a linha
do risco, o custo do capital próprio poderá ser estimado pela expressão
de mercado de título é security
a seguir, denominada linha de mercado do título ou linha de mercado do market line (SML). A discussão
investimento. completa desse modelo pode ser
encontrada em Sharpe (2000).

kd = r0 + (rm – r0) j

Onde:
kd = Custo do capital próprio investido no Ativo j
r0 = Prêmio de liquidez ou taxa livre de risco
rm = Expectativa de retorno associada a um índice de mercado

j
= Coeficiente de risco sistemático do Ativo j

Para ilustrar o cálculo do custo do capital próprio utilizando o modelo


CAPM, tomemos o seguinte exemplo:

Um investidor está analisando o comportamento do mercado para de-


finir a compra de um Ativo. Verificando que a remuneração hoje oferecida
por um título público (livre de risco) é de 4% ao ano e que, nesse momen-
to, a expectativa de rentabilidade média associada ao Ativo que pretende
adquirir é de 10,5% ao ano, sendo o beta desse Ativo de 0,90, determine o
retorno esperado.

kd = r0 + (rm – r0) j

kd = 4% + (10,5% – 4%) × 0,90 = 9,85%

O modelo CAPM também pode ser entendido por meio dos compo-
nentes da fórmula com base na seguinte interpretação:

Prêmio pelo tempo ou Qualidade do


prêmio de liquidez Preço do risco risco

kd = r0 + (rm – r0) j

Custo de capital 49
De acordo com essa forma de interpretação, um investimento
qualquer terá um preço de risco maior ou menor do que a diferença
(rm – r0), conforme o seu risco sistemático ( j) seja maior ou menor do
18 que o risco do mercado, isto é, tenha > 1 ou < 1, respectivamente.
Os Treasury Bonds são títulos de
Os elementos que compõem o modelo CAPM apresentam algumas
dívida emitidos pelo governo
americano, com pagamento definições importantes. Vejamos cada uma delas.
periódico de juros, chamados de
cupons, e devolução do principal Ativo sem risco = rf
no vencimento do título. Os Trea- É considerado um Ativo sem risco aquele que não tem o perigo de
sury Bonds podem ser negociados
livremente antes do vencimento inadimplência do emitente do título representativo do investimento, ou
nos mercados secundários por seja, não há o risco de o emissor não honrar o compromisso no seu
meio de uma taxa de desconto. 18
respectivo vencimento. Regra geral: adota-se a taxa do Treasury Bond
Seus valores de negociação
podem ser encontrados no site: americano, de prazo de 10 anos.
https://www.bloomberg.com/
Taxa de retorno do portfólio de mercado = rm
markets/rates-bonds/govern-
ment-bonds/us. Acesso em: 29 Usualmente, é utilizado como a taxa de retorno do portfólio de mer-
maio 2020.
cado, a rentabilidade das ações pertencentes ao índice medido pelo
19
Standard & Poor’s Composite Index (S&P 500) .
19
20
Risco sistemático = β
Mais informações sobre o S&P
500 podem ser vistas em: O beta é um coeficiente estatístico e representa uma medida da vo-
https://portugues.spindices.
com/indices/equity/sp-500. latilidade do preço da ação quando comparado ao mercado. O que se
Acesso em: 29 maio 2020. quer determinar, por meio do cálculo do beta, é o quanto varia, para
mais ou para menos, a rentabilidade de um investimento, com base na
20 variação do retorno de um indicador que represente o comportamento
O beta indica a inclinação da reta desse tipo de investimento, considerado como o beta do mercado para
21
de regressão entre rm e re. aquele investimento específico . O beta médio ou beta do mercado
tem valor igual a 1,0 (um).
21 A estimativa do risco sistemático β leva em conta o fato de que as
O indicador considerado como ações da empresa avaliada sejam cotadas nas bolsas de valores. Caso
representativo do mercado contrário, é necessária uma pesquisa dentre as empresas do mesmo
é chamado de portfólio de
mercado. setor de atividade, com ações negociadas publicamente, para obter o
beta médio do setor ou o beta específico de alguma delas, que tenha um
modelo de negócio e desempenho semelhante à empresa em análise.

Prêmio de risco do portfólio de mercado

Representa a diferença expressa em percentagem entre a taxa de


retorno esperada para o portfólio de mercado (rm) e a taxa de retorno
do Ativo sem risco (rf). Essa diferença é chamada de prêmio de risco do
portfólio de mercado.

50 Finanças Corporativas
2.3.3 O modelo CAPM no Brasil
Ao ser usado no Brasil, o modelo CAPM deve ser adaptado. Isso
ocorre face à falta de disponibilidade de dados consistentes devido à
elevada inflação passada e ao tamanho e à concentração da bolsa de
valores em nosso país. Para o cálculo do CAPM no Brasil, utilizamos a
seguinte fórmula:

ke = rf + β (rm – rf) + Pp + YBr + D Inf

Onde:
ke = Custo de capital próprio
rf = Taxa de retorno de um Ativo sem risco
β = Risco sistemático das ações da empresa
rm = Taxa de retorno do portfólio de mercado
Pp = Prêmio pelo porte
YBr = Prêmio de risco Brasil
D Inf = Diferencial de inflação entre Brasil e EUA

Assim, vejamos algumas questões importantes sobre as variáveis


utilizadas no modelo.

Prêmio pelo porte = Pp

Apesar de haver uma forte percepção de que empresas de menor


porte têm maior risco, não há consenso nas pesquisas empíricas sobre
essa suposição. Porém, a maioria das avaliações inclui, na fórmula do Saiba mais
CAPM, um prêmio ao investidor pelo menor porte da empresa. Índices como o da família
EMBI servem de referên-
Prêmio de risco Brasil = YBr cia aos investidores para
calcular os riscos para
Representa o risco país (quando se usa o modelo ampliado) e re- seus investimentos. Hoje,
além do Brasil, compõem
fere-se à possibilidade de que mudanças no ambiente político e eco- o EMBI+ países como
nômico do país impactem negativamente o valor dos Ativos. Em geral, África do Sul, Argentina,
Colômbia, Egito, Filipinas
esse prêmio é calculado pela taxa de remuneração dos títulos EMBI+ e Malásia. Para saber
Brasil (Emerging Markets Bond Index, de J. P. Morgan). mais sobre esse assunto
e ter acesso a toda a série
Diferencial de inflação Brasil x EUA = D Inf histórica de índices de
risco Brasil, acesse o site:
Trata-se do valor estabelecido com base na diferença entre a infla- http://www.ipeadata.gov.
br/ExibeSerie.aspx?se-
ção projetada para o Brasil e a estimada para os Estados Unidos.
rid=40940&module=M.
Acesso em: 29 maio 2020.

Custo de capital 51
2.3.4 Cálculo do beta
Idealmente, os betas devem ser obtidos por meio das projeções dos
retornos dos Ativos em análise e do indicador utilizado como retorno
do mercado. No entanto, é importante levarmos em conta que, usual-
mente, os betas do mercado se baseiam em dados passados, embora
sejam utilizados para decisões relacionadas ao futuro.

Para demonstrarmos o cálculo do beta, vamos utilizar os dados de


Livro um Ativo (pode ser o retorno de uma empresa, um título de uma empre-
O livro Portfolio theory sa, um fundo de investimento, ou seja, qualquer tipo de investimento) e
and capital markets, o indicador utilizado como representativo do retorno do mercado para
considerado um clássico
na literatura de finanças, o mesmo tipo de investimento analisado. Os dados são os seguintes:
descreve os conceitos
fundamentais para a
•• Período de 10 anos;
formação de carteiras de •• re = % retorno da empresa;
investimento e fala sobre
risco e retorno, além de •• rm = % retorno do mercado = Taxa de retorno do portfólio do
detalhar o modelo CAPM.
mercado;
SHARPE, W. F. Nova York: McGraw-
•• Mre = Média dos retornos da empresa;
-Hill, 2000.
•• Mrm = Média dos retornos do mercado;
•• re – Mre = Para cada ano, mostra o valor de re menos a média dos
re nos 10 anos;
•• rm – Mrm = Para cada ano, mostra o valor de rm menos a média
dos rm nos 10 anos.

(re – Mre ) ×
ANOS re rm re – Mre rm – Mrm (rm – Mrm)2
(rm – Mrm)
1 40,00 25,00 20,00 10,00 200,00 100,00

2 33,00 22,00 13,00 7,00 91,00 49,00

3 10,00 16,00 – 10,00 1,00 – 10,00 1,00

4 5,00 2,00 – 15,00 – 13,00 195,00 169,00

5 1,00 – 3,00 – 19,00 – 18,00 342,00 324,00

(Continua)

52 Finanças Corporativas
(re – Mre ) ×
ANOS re rm re – Mre rm – Mrm (rm – Mrm)2
(rm – Mrm)
6 10,00 10,00 – 10,00 – 5,00 50,00 25,00

7 12,00 15,00 – 8,00 – – –

8 16,00 18,00 – 4,00 3,00 – 12,00 9,00

9 40,00 25,00 20,00 10,00 200,00 100,00

10 33,00 20,00 13,00 5,00 65,00 25,00

MÉDIA 20,00 15,00 SOMA 1.121,00 802,00

Beta = SOMA coluna 3 ÷ SOMA coluna 4 = 1.121,00 ÷ 802,00 = 1,40.

Esse resultado indica que o retorno esperado para o investimento


oscilará 1,4 vezes acima ou abaixo da rentabilidade também esperada
para o indicador utilizado como retorno do mercado.

2.4 Cálculo do custo médio ponderado de capital


Vídeo Matematicamente, o custo médio ponderado de capital, ou custo de
capital, corresponde à média ponderada das diversas taxas pagas pela
empresa aos financiadores de recursos (contabilmente representados
no Passivo exigível) e aos investidores (representados em todas suas
formas no Patrimônio Líquido: cotas, ações ordinárias, ações preferen-
ciais) para fazer frente às suas necessidades totais de recursos.

Por ser uma média ponderada, é necessário calcular, primeiramente,


o custo individual de cada fonte de recursos passivos e suas respectivas
participações ou pesos na estrutura de recursos. Feito isso, podemos de-
terminar o custo médio ponderado, isto é, o custo incorrido pela empresa
para financiar suas necessidades de financiamento do Ativo.

Antes de apresentarmos a forma de cálculo do custo de capital,


precisamos relembrar um conceito extremamente relevante. O valor
da empresa é calculado com base no fluxo de caixa projetado por um
intervalo de tempo relevante, trazido a valor presente pelo custo de
capital ou custo médio ponderado de capital.

Como o custo de capital é consequência dos riscos operacionais e


financeiros observados na empresa, quanto maiores forem esses ris-
cos, maior será o custo de capital e, por extensão, menor será o valor
da empresa. Obviamente, o contrário também é verdadeiro, ou seja,

Custo de capital 53
quanto menor o risco operacional, menor serão o risco financeiro e o
Livro
custo de capital e, consequentemente, maior será o valor da empresa.
O livro Administração
Financeira apresenta, no A relação básica utilizada para a determinação do custo médio pon-
Capítulo 5, uma aprofun-
dada discussão sobre
derado de capital, baseada na definição demonstrada por Copeland,
os conceitos de risco Koller e Murrin (2001), é obtida pela relação:
e retorno, detalhando
o entendimento sobre
coeficiente de correlação CMPC (WACC) = ke [E ÷ (D + E)] + kd [D ÷ (D + E)]
(medida da linearidade
Onde:
de duas variáveis) e a
covariância (medida da CMPC (WACC) = Custo médio ponderado de capital
força da correlação).
ke = Custo do Patrimônio Líquido
Esses conceitos são ex-
tremamente importantes E ÷ (D + E) = Participação % do Patrimônio Líquido no total do Ativo
para compreender as
técnicas utilizadas na kd = Custo da dívida (líquido do Imposto de Renda)
elaboração de carteiras D ÷ (D + E) = Participação % da dívida no Ativo total
de investimento, também
chamadas de portfólio. O conceito por trás da fórmula do custo médio ponderado de capital
BRIGHAM, E. F.; EHRHARDT, M. C. é simples e intuitivamente atrativo. Se um novo investimento qualquer
São Paulo: Cengage Learning, 2016.
utilizar recursos próprios e de terceiros e for suficientemente lucrativo
para suportar o pagamento dos juros do financiamento – já incluído o
benefício gerado pela dedução das despesas financeiras no Imposto de
Renda (IR) se a empresa estiver enquadrada no regime de tributação
do lucro real – e para gerar uma elevada taxa de rentabilidade para os
investidores, então ele é uma alternativa de investimento que criará
valor para a empresa.

Para ilustrar o cálculo do custo médio ponderado de capital, vamos


supor as seguintes informações sobre a Companhia Alfa:
3. Custo dos financiamentos antes do benefício fiscal:
•• Curto prazo: 18%
•• Longo prazo: 20%
4. A empresa apresenta uma alíquota efetiva de IR e CSLL de 25% e
está enquadrada no regime do lucro real.
5. Custo do Patrimônio Líquido:
•• Taxa livre de risco: 5%
•• Retorno esperado da carteira de mercado: 15%
•• Beta: 1,25
•• Risco Brasil = 3%
•• Diferencial de inflação = 4%
6. O Passivo da companhia Alfa é apresentado a seguir:

54 Finanças Corporativas
PASSIVO VALOR (R$)
Fornecedores 200.000,00
Salários a pagar 40.000,00

Impostos a pagar 60.000,00

Financiamentos de curto prazo 100.000,00

Financiamentos de longo prazo 200.000,00


Livro
Patrimônio Líquido 400.000,00
O livro Avaliação de
TOTAL 1.000.000,00 investimentos apresenta
conceitos de cálculo do
Com base nessas informações, vamos determinar o custo de ca- valor de empresas para
os chamados estrategistas
pital da Companhia Alfa. Esse cálculo é realizado de acordo com as
internos e os profissionais
seguintes etapas: externos, detalhando
o cálculo do custo de
1. Reclassificação para o Ativo das contas não operacionais: capital, fundamental para
qualquer decisão de
Nesse ponto, precisamos reclassificar no Ativo da empresa, como investimento empresarial.
contas redutoras, as contas não operacionais, que, no exemplo, seriam Isso porque o valor de
uma empresa é represen-
tanto os salários quanto os impostos a pagar e os fornecedores. tado pelo cálculo do valor
presente do seu fluxo de
Com base nessa reclassificação, o Passivo da empresa seria com- caixa, utilizando uma taxa
posto pelas seguintes contas: de desconto, chamada
de custo de capital ou
custo médio ponderado de
PASSIVO VALOR (R$) capital.
Financiamentos de curto prazo 100.000,00 DAMODARAN, A. Rio de Janeiro:
Qualitymark, 2010.
Financiamentos de longo prazo 200.000,00

Patrimônio Líquido 400.000,00

TOTAL 700.000,00

2. Cálculo do custo dos financiamentos onerosos:

Esse calculado é realizado determinando o custo líquido, já consi-


derando o benefício das despesas financeiras no cálculo do IR e CSLL.
Assim, ele é feito da seguinte forma:
•• Financiamento de curto prazo: 18% × (1 – 0,25) = 13,5%
•• Financiamento de longo prazo: 20% × (1 – 0,25) = 15,0%
3. Cálculo do custo do capital dos sócios:

Pode ser realizado utilizando o modelo de Gordon-Shapiro ou o CAPM.


No exemplo, temos as informações para a utilização do CAPM no Brasil:

Custo de capital 55
ke = rf + β × (rm – rf) + Pp + YBr + D Inf

ke = 5% + 1,25 (15% – 5%) + 0% + 3% + 4%

ke = 24,5%
4. Cálculo do custo de capital ou custo médio ponderado de capital:

CMPC (WACC) = ke [E ÷ (D + E)] + kd [D ÷ (D + E)]

CMPC (WACC) = 24,5% [400.000 ÷ (300.000 + 400.000)] + 13,5%


[100.000 ÷ (300.000 + 400.000)]+ 15% [200.000 ÷ (300.000 + 400.000)]

CMPC (WACC) = (24,5% × 57,14%) + (13,5% × 14,29%)


+ (15% × 28,57%)

CMPC (WACC) = 20,21%

Embora a relação matemática para o cálculo do custo de capital seja


bastante simples, uma alternativa ao emprego da fórmula apresenta-
da, lembrando que o cálculo do custo médio ponderado de capital é
realizado por média ponderada, é a utilização desse conceito por meio
do seguinte cálculo:

PASSIVO VALOR ($) PESO (%) CUSTOS (%) CMPC (%)


Financiamentos de curto prazo 100.000 14,29 13,5 1,93

Financiamentos de longo prazo 200.000 28,57 15,0 4,29


x =
Patrimônio Líquido 400.000 57,14 24,5 13,99

TOTAL 700.000 100,00 - = 20,21%

A coluna peso é calculada com base no resultado da divisão de cada


fonte de financiamento oneroso pelo valor total do Passivo (lembran-
do que, se a soma total dos pesos não for igual a 100%, o cálculo foi
22 feito incorretamente).
A necessidade de capital de giro
indica o volume de recursos A coluna custos tem seus valores alcançados por meio dos cálculos
necessários para o financia- realizados com as fórmulas indicadas nas Etapas 1, 2 e 3. Lembrando,
mento do giro da atividade mais uma vez, que fornecedores, salários a pagar e impostos a pagar,
fim da empresa. Fornecedores, 22
salários e encargos sociais, bem que são componentes da necessidade de capital de giro , não têm
como impostos e encargos custo financeiro, ou seja, são fontes de financiamento não onerosas e,
fiscais representam, do lado do
portanto, precisam ser reclassificadas no Ativo como contas redutoras.
Passivo, as fontes de recursos
mais comuns para o financia- Na determinação do custo médio ponderado de capital, a grande di-
mento da atividade operacional
ficuldade consiste em obter dados fundamentados para a maioria das
da empresa.
empresas, principalmente as médias, pequenas e aquelas que não têm

56 Finanças Corporativas
ações negociadas na bolsa de valores. Sem informações consistentes, fica
praticamente impossível realizar esse cálculo, já que não podemos de-
terminar corretamente os custos das fontes passivas e os valores dessas
fontes, a fim de que sejam utilizados como pesos para o cálculo da média.

Nesses casos, quando os dados da empresa não apresentam con-


sistência contábil, devemos usar os valores reais de mercado como
pesos para a determinação do custo ponderado, na medida em que
estejam disponíveis. Não havendo essa informação, podemos utilizar
informações de empresas com características semelhantes para efe-
tuar o cálculo do custo de capital.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Toda atividade empresarial, para ser executada, precisa, primeiramente,
da captação de fontes de recursos para suportar as atividades operacionais
e o crescimento da empresa. Essas fontes são obtidas originalmente no Pas-
sivo da empresa, por meio de fundos captados a curto e a longo prazo, de
financiadores sem participação no capital da empresa ou junto a sócios e
oriundos dos investimentos e da reaplicação de lucros adquiridos no período.
Para que os gestores da empresa, conforme suas decisões do dia a dia,
possam atender a seu objetivo maior, que é a maximização da riqueza dos
proprietários, eles precisam investir no Ativo os recursos captados no Pas-
sivo a uma taxa superior à da captação. Essa é uma das etapas primordiais
para a maximização da riqueza dos proprietários da empresa.
Isso significa que, para determinar a rentabilidade das aplicações reali-
zadas no Ativo, o gestor precisa calcular o custo médio dos recursos cap-
tados no Passivo (lembrando que os recursos captados no Passivo são
aplicados no Ativo), tomando esse valor como base para a determinação
da rentabilidade mínima desejada no Ativo.
Chamado de custo de capital, custo médio ponderado de capital ou WACC,
esse cálculo representa a taxa mínima de atratividade para todas as aplica-
ções realizadas no Passivo. Sem ele, a empresa não tem referencial para o
cálculo da efetiva rentabilidade mínima necessária no Ativo.
Esse custo é obtido pelo cálculo do custo dos recursos onerosos –
definidos como os financiamentos obtidos no Passivo, em que o valor
captado é devolvido, acrescido de uma remuneração, para o titular do
recurso – e dos recursos obtidos junto a sócios da empresa, por meio de
investimentos e reinvestimentos de lucros.

Custo de capital 57
Portanto, com a determinação do custo de capital ou custo médio pon-
derado de capital e sua comparação à rentabilidade esperada para os in-
vestimentos realizados no Ativo, os gestores, de qualquer tipo de empresa
e de qualquer segmento de atuação ou tamanho, podem tomar decisões
de investimento voltadas à maximização da riqueza dos proprietários.

REFERÊNCIAS
COPELAND T.; KOLLER T.; MURRIN J. Avaliação de empresas: calculando e gerenciando o
valor das empresas. 3. ed. São Paulo: Pearson, 2001.
DAMODARAN, A. Avaliação de investimentos: ferramentas e técnicas para a determinação
do valor de qualquer ativo. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2010.
SHARPE, W. F. Portfolio theory and capital markets. Nova York: McGraw-Hill, 2000.

GABARITO
1. Para aplicar recursos no Ativo, é necessário primeiramente captar recursos no Passivo.
Sem saber o custo desses recursos passivos, o gestor não tem como verificar se a ren-
tabilidade esperada da aplicação cobre ou não o custo médio dos recursos passivos. Ao
efetuar esse cálculo, chamado de custo de capital ou custo médio ponderado de capital, o
gestor está, em essência, determinando a taxa mínima de atratividade da empresa, ou
seja, o mínimo que ela precisa buscar de rentabilidade em suas aplicações ativas.

2. O risco operacional deriva das aplicações realizadas na operação da empresa, refleti-


das no Ativo operacional. Já o risco financeiro está ligado ao custo dos financiamentos
obtidos no Passivo para suportar as aplicações no Ativo. Se as aplicações operacionais
indicam, para os financiadores, que o risco da aplicação de seus recursos é baixo, ou
seja, apresentam uma geração de caixa elevada, eles cobram uma taxa menor por sua
utilização e vice-versa. Isso significa que o custo de captação mais elevado ou mais
baixo é consequência do risco percebido no Ativo, isto é, o risco financeiro resulta do
risco operacional constatado no Ativo.

3. Existem vários motivos para justificar o custo mais elevado para o capital dos sócios.
Dentre eles, destacamos:

a. O capital dos sócios não tem um prazo predeterminado para sua devolução.

b. Em caso de falência da empresa, o Ativo é alienado para quitar as dívidas do Pas-


sivo. Quando isso ocorre, os sócios são os últimos a receber recursos oriundos
da venda do Ativo.

c. Os financiadores sem participação no capital da empresa normalmente têm ga-


rantias de Ativos da empresa e, em muitos casos, garantias dos sócios, que po-
dem ser utilizadas para casos de inadimplência da empresa. Os sócios não têm
qualquer tipo de garantia de que receberão os recursos investidos.

d. Caso a empresa esteja enquadrada, para efeito de tributação do IR e da CSLL, no


regime do lucro real, a remuneração dos financiadores é dedutível para o cálculo
do lucro tributável. Recursos dos sócios não apresentam esse benefício.

58 Finanças Corporativas
3
Retorno de projetos
O gestor financeiro, em qualquer tipo de organização, indepen-
dente de seu tamanho e segmento de atuação, tem a tomada de
decisões como parte fundamental de sua rotina de trabalho. Os
impactos futuros dessas decisões ocorrem a curto, médio e a lon-
go prazo, relacionados ao crescimento dos negócios e à manuten-
ção do giro das atividades. Trata-se de deliberações fundamentais
para gerar crescimento sustentado aos negócios, tornando mais
perene sua existência no mercado.
Dentre as inúmeras atividades da área financeira, uma das mais
importantes, sem dúvida, é oferecer suporte às decisões organi-
zacionais de todas as demais áreas da empresa, afinal todas as
decisões gerenciais afetam a geração de caixa. Por esse motivo,
o gestor da área financeira precisa dominar os conhecimentos
necessários e estar preparado o tempo inteiro para responder a
dois tipos básicos de decisões que afetarão a própria existência
da empresa. Essas deliberações estão relacionadas às decisões de
investimento e financiamento.
Entender como calcular o retorno de uma alternativa de inves-
timento, entre as várias possibilidades que se apresentam para o
gestor da empresa, descobrir o que significa o resultado obtido
com base nos vários métodos que serão demonstrados, e definir
a prioridade para a melhor alternativa e suas implicações para o
valor da empresa são os objetivos do presente capítulo.

3.1 Fontes de recursos


Vídeo O gestor financeiro, de qualquer tipo de empresa, precisa estar sem-
pre preparado para responder às questões relacionadas aos investimen-
tos que devem ser aprovados e como obter os recursos necessários para
financiá-los. Segundo Casaroto Filho e Kopttke (2010), a escolha da melhor
alternativa de investimentos é feita sem que o custo do capital empregado

Retorno de projetos 59
seja levado em consideração no processo de tomada de decisão, descon-
siderando esse elemento de fundamental importância.

Nesse contexto, as decisões de investimento objetivam determi-


nar a rentabilidade das opções de aplicação de recursos dentro das
alternativas definidas no planejamento estratégico e mercadológico
da empresa. Já as decisões de financiamento buscam analisar todas
as opções existentes de captação dos recursos necessários, para apli-
car nas alternativas definidas no planejamento da empresa, sempre
nas condições mais vantajosas de custo (mais barato) e prazo (mais
longo) aderentes aos investimentos existentes.

As decisões de investimento e financiamento, consolidadas no


fluxo de caixa da opção de investimento de recursos em análise,
permitem que a empresa explore alternativas a fim de maximizar a
rentabilidade dos investimentos realizados por seus sócios e pelos
financiadores, sem participação no capital social, buscando, como
consequência final, aumentar seu valor.

Isso ocorre porque as decisões de investimentos tomadas hoje de-


terminarão o excedente a ser adicionado (ou reduzido) ao estoque de
capital da empresa, permitindo, por sua vez, seu emprego no futuro
para a produção de novos bens e/ou serviços, o que pode resultar
em um círculo virtuoso de crescimento e rentabilidade ou um círculo
vicioso, levando à quebra da empresa.

Dentre as alternativas em análise, o gestor optará por aquela que,


1 segundo o método de avaliação utilizado para analisar o fluxo de cai-
Custos incorridos pelos sócios xa, resultar no maior retorno aos seus financiadores e investidores,
da empresa para que seus assumindo que seus administradores estarão sempre tomando deci-
interesses e os dos gestores
sejam aderentes. sões visando atingir esse objetivo, não metas pessoais, ou seja, assu-
1
mindo a inexistência de custos de agência .

Ao longo de sua existência profissional, os gestores são confrontados


com questões que necessitam de respostas precisas, sob o risco de com-
prometerem a continuidade da empresa. Para começar, é necessário
definir os investimentos de longo prazo que a empresa precisa efetivar
a fim de maximizar a riqueza de seus proprietários. Precisa, também,
definir como serão obtidas as fontes de recursos para financiar esses
investimentos. A continuidade e o crescimento sustentado da empresa
serão função direta do sucesso obtido pelo gestor nessas decisões.

Com base na decisão estratégica, tática ou operacional que fun-


damenta cada opção de investimento existente para os recursos dos
60 Finanças Corporativas
sócios e dos financiadores sem participação no capital social (terceiros),
o gestor financeiro passa a analisar como cada possibilidade será finan-
ciada, podendo optar pelas alternativas a seguir:
•• utilização de recursos próprios, oriundos de reinvestimento;
•• novos aportes de capital por parte dos sócios;
•• capital de terceiros, obtido com a compra a prazo de bens e ser-
viços, ou do financiamento bancário;
•• uma parte de cada uma dessas alternativas.

Outra questão importante para o gestor financeiro, ao focar as de- Importante


cisões de investimento e financiamento, é a necessidade de definir as Lembre-se sempre de que não
alternativas necessárias para tornar possível a gestão operacional da é possível aplicar recursos em
uma alternativa qualquer de
empresa, de modo a possibilitar a efetivação do planejamento formu- investimento sem antes captar
lado para os investimentos aprovados. uma fonte, ou seja, o Ativo não
aumenta se não houver, primei-
Independente da alternativa selecionada, o gestor financeiro não ramente, a captação de uma
poderá deixar de levar em consideração seu efeito para a estrutura fonte de recursos no Passivo.
de capital, os níveis de risco, a alavancagem operacional e financeira
no custo de capital, e o resultante efeito no fluxo de caixa e no valor
da empresa. Todas essas decisões e os demonstrativos em que serão
visualizadas podem ser sintetizados da seguinte forma:

Previsão de vendas Figura 1


Síntese de decisões e seus demonstrativos

Plano de produção

Estimativas de compras de
matéria-prima e gastos com
mão de obra

Plano de financiamento
a longo prazo
Estimativas de consumo de
matéria-prima e contratação
de mão de obra Financiamento a
Custos dos produtos/ longo prazo
serviços disponibilizados Plano de investimento
aos clientes de capital
Estimativas de despesas
operacionais Investimentos
de capital

Financiamentos
Demonstrativo de resultado
de longo prazo
projetado
Balanço Patrimonial do Orçamento de caixa
período corrente

Disponível
Duplicatas a receber Investimentos
Balanço Patrimonial
projetado Fornecedores de capital

Impostos a pagar

Fonte: Elaborada pelo autor.

Retorno de projetos 61
Diante da decisão sobre em qual alternativa deverão ser investidos
os recursos da empresa, o gestor, sempre buscando maximizar o re-
torno dos proprietários, sob o ponto de vista estritamente financeiro,
estará, na realidade, à procura de respostas a algumas questões bási-
cas vistas a seguir:
a. Como obter os recursos necessários para financiar os dispêndios
de capital relativos aos investimentos requeridos por sua
expansão ou pela manutenção de sua participação de mercado?
2 b. Qual é o custo efetivo total
2
das alternativas de financiamento
O custo efetivo total nas que a empresa pode captar?
operações de financiamento
c. Qual é a rentabilidade líquida, já deduzido o custo efetivo total
bancário é composto da taxa de
juros, cobrada pelo financiador, do financiamento, a ser obtida no projeto?
acrescida de impostos e demais
encargos cobrados (por exem- Exceto quando gerados por reinvestimento ou novos aportes dos
plo: taxa de abertura de crédito, sócios, os recursos para o financiamento de projetos vêm do mercado
seguro, reciprocidades etc.). financeiro. Esse mercado existe para permitir o ajuste de padrões e
preferências temporais de consumo e investimento pelos indivíduos
e empresas. Tal ajuste é realizado por meio da tomada de emprésti-
mos e da aplicação de sobras de caixa pelas pessoas físicas e jurídicas,
explicitado pelas taxas de juros de captação de empréstimos (custo) e
inversão de sobras de caixa (aplicação).

Além de ajustar preferências temporais, o mercado financeiro também


permite o estabelecimento de parâmetros de comparação e avaliação
para as várias alternativas de investimento com que uma empresa se de-
para ao longo de sua existência, permitindo, pela implementação dessas
alternativas, maximizar o valor do investimento de seus proprietários.

Outra importante vantagem propiciada por um mercado financei-


ro eficiente é permitir o aumento das possibilidades de consumo no
presente e no futuro e, ao mesmo tempo, expandir as oportunidades
de investimento. Para melhor entender esse mecanismo, vejamos o se-
guinte exemplo:

Uma empresa projeta uma geração de caixa de $5 milhões para


o ano em curso e de $6 milhões para o próximo ano. Analisando a
possibilidade de investir $3 milhões em uma nova fábrica, verificou
que, se procedesse assim, poderia obter um retorno de $1 milhão
sobre o capital investido e que a taxa de juros seria de 7% para
aplicação de sobras de caixa e 18% para tomada de empréstimos.

62 Finanças Corporativas
Desconsiderando, por um instante, a alternativa de investi-
mento para seus recursos, mas levando em consideração as op-
ções oferecidas pelo mercado financeiro (tomar empréstimo e
emprestar recursos), a empresa teria três alternativas básicas:
a. Consumir os valores previstos de caixa para o atual e
próximo período nos respectivos exercícios.
b. Aplicar o valor previsto para o período atual e consumir
no próximo exercício, juntamente ao fluxo do segundo
período. Nesse caso, o saldo final de caixa seria:
3
$5 (1 + 0,07)1 + $6 = $11,35 Para consumir no presente, a
empresa precisaria tomar um
c. Utilizar, no período atual, o valor previsto para esse recurso emprestado no período
3
exercício e antecipar o consumo previsto para o próximo atual a uma taxa de juros de
18% que no vencimento fosse
período, obtendo o seguinte saldo de caixa:
igual à previsão de caixa do
$5 + $6 (1 + 0,18)-1 = $10,08 período, ou seja, precisaria
trazer o valor presente pela taxa
de juros, o valor disponível no
Importante
segundo momento.
No regime de juros compostos, utilizamos duas equações básicas:
(1) M = P (1 + i)n
Calcula um valor no futuro (M) com base em um valor no presente (P).
M
(2) P = ou P = M (1 + i)-n
(1 + i)n
Calcula um valor no presente (P) com base um valor no futuro (M).

Podemos representar as opções disponíveis para a empresa


nesse momento da seguinte forma:
Figura 2
Relação entre consumo futuro e consumo corrente
Consumo futuro
$11,35 B

Aplicar
recursos Inclinação: – (1 + i)
$6,00

Tomar empréstimo

A
Consumo corrente
$ 5,00 $ 10,08
Fonte: Elaborada pelo autor.

Retorno de projetos 63
É importante notar que a empresa pode escolher qualquer combi-
nação de consumo e investimento para os exercícios atual e próximo
ao longo da reta AB, respeitados os limites de seu fluxo de caixa e man-
tidos os níveis das taxas de juros no período.

Repare que se a decisão da empresa for pela realização do in-


vestimento existente (investimento de $3 milhões com retorno de
$1 milhão), o gestor financeiro estará diante das seguintes alternativas
para sua geração de caixa:
a. Exercício atual:

$5,00 – $3,00 = $2,00 (saldo de caixa para utilização no ano


4 corrente caso realize o investimento).
Como o ganho no investimento
é de R$1 milhão, a empresa terá b. Próximo exercício:
de volta, ao término do projeto,
$6,00 + $4,00
4
o valor investido acrescido do = $10,00 (saldo final do ano seguinte, incluído o
ganho. retorno do investimento).

Por outro lado, a existência do mercado financeiro possibilita à em-


5 presa, mesmo após investir, duas opções adicionais (mantivemos, para
Para que isso seja possível, a efeito de comparação, as taxas de juros iniciais, ou seja, 7% para apli-
empresa precisa captar recursos cação de sobras de caixa e 18% para empréstimos). Essas opções são:
no mercado, antecipando a
entrada de caixa futura, ou seja, a. Consumir, no exercício atual, todos os recursos gerados pelo
captar, no primeiro período, um 5
caixa do período atual e antecipar a geração de caixa do período
empréstimo à taxa de juros de
18%, que seja igual ao valor de seguinte, gerando um saldo de:
caixa previsto para o segundo $2 + $10 (1 + 0,18)-1 = $10,47
período no vencimento.
b. Consumir, no segundo período , os recursos de caixa gerados no
6

período atual, acrescidos da geração de caixa do segundo ano.


6
Diante disso, seria obtido o seguinte saldo:
Nesse caso, a empresa aplica a so-
$2 (1 + 0,07) + $10 = $12,14
bra de caixa do primeiro período
a uma taxa de 7% e resgata no
segundo período. Repare que a existência do mercado financeiro e a decisão de reali-
zar o investimento trazem um ganho para a empresa de:
•• No ano corrente: alternativa com o investimento – alternativa
sem o investimento = $10,47 – $10,08 = $0,39
•• No ano seguinte: alternativa com o investimento – alternativa
sem o investimento = $12,14 – $11,35 = $0,79

64 Finanças Corporativas
Importante

As diferenças existentes para os ganhos no presente e no futuro dependerão do spread


bancário (diferença entre as taxas de empréstimo e as taxas de captação dos bancos).
Quanto menor for o spread bancário, maiores serão os ganhos proporcionados pelo
mercado financeiro, tanto no presente quanto no futuro.

O gráfico a seguir ilustra as alternativas de consumo para a empresa


com base na existência de oportunidades de investimento e financia-
mento no mercado financeiro.

Figura 3
Alternativas de consumo

Consumo futuro

$12,14

$11,35

$6,00
Livro
No livro Avaliação de inves-
timentos, encontramos
$ 10,47 de maneira didática as
principais ferramentas
Consumo corrente de cálculo do retorno
$ 5,00 $ 10,08
de uma alternativa de
investimento, inclusive
Fonte: Elaborada pelo autor.
o cálculo do valor da
Ao analisarmos o gráfico, fica claro que a existência do mercado fi- empresa, que nada mais
é do que a soma de
nanceiro permite aos proprietários da empresa ajustarem suas prefe- vários projetos ocorrendo
rências de fluxo de caixa entre consumo presente e consumo futuro, simultaneamente.

independente do critério utilizado para analisar e, por extensão, apro- DAMODARAN, A. Rio de Janeiro:
Qualitymark, 2010.
var ou negar a implementação de um projeto.

Quando feito de maneira correta, esse ajuste é quantificado pela


variação para mais no valor da empresa, refletido em sua cotação na
bolsa de valores no caso das sociedades anônimas de capital aberto.
Atividade 1
Nos demais tipos de organizações, é refletido pelo valor que o mer-
cado atribui à sociedade, pela qualidade de sua carteira de clientes, Em relação aos investimentos,
qual é a principal função do
da qualidade e da formação de seus colaboradores, do portfólio de mercado financeiro?
fornecedores e das instituições financeiras com que opera, entre ou-
tras variáveis.

Retorno de projetos 65
3.2 Investimentos
Vídeo Até o momento, analisamos alguns conceitos importantes. Em pri-
meiro lugar, vimos que não podemos realizar aplicações sem primeiro
obter uma fonte de recursos. Em segundo, vimos que a existência do
mercado financeiro nos permite aumentar o consumo no futuro ou no
presente. Vale lembrar que esse último conceito está diretamente liga-
do ao spread bancário no momento da decisão gerencial.

Com base nesses conceitos, antes de analisarmos os métodos


para a determinação da viabilidade de um projeto de investimen-
to, precisamos ter claro, do ponto de vista gerencial, o que é inves-
timento. Numa concepção mais abrangente, considerando toda a
aplicação de recursos realizada pela empresa, investimento pode
ser definido como toda inversão de recursos que tenha como ob-
jetivo aumentar a geração de caixa. Isso pode ser obtido aplicando
recursos no Ativo, para aumentar a geração de caixa, ou reduzindo
o Passivo por meio do pagamento da dívida com terceiros nos seus
7 respectivos vencimentos
7
e/ou substituindo por outra em melhores
É fundamental para manter condições de custo e prazo de pagamento.
a credibilidade da empresa e,
consequentemente, seu crédito. Normalmente, não entendemos a redução da dívida como uma apli-
cação ou investimento. No entanto, observe que, no caso de redução
do Passivo por pagamento de obrigações contraídas no vencimento ou
pela substituição por outra dívida em melhores condições, o efeito final
será aumentar a geração de caixa.

Dentre as alternativas mais comuns consideradas como investimen-


to, podemos destacar:
•• Substituição de equipamentos para manutenção da empresa:
gastos com a substituição de equipamentos danificados e/ou
desgastados, necessários para manter o nível atual de produção
e produtividade da empresa.
•• Substituição de equipamentos com o objetivo de reduzir custos:
gastos com a substituição de equipamentos em uso por novos
mais avançados, mais econômicos e que reduzam custos de mão
de obra, manutenção, energia e/ou matéria-prima.

66 Finanças Corporativas
•• Novas imobilizações com o objetivo de reduzir custos de
produção: investimentos em edificações, instalações e equipa-
mentos novos para reduzir custos de produção. Nessa alternati-
va, não existe a substituição de equipamento já existente.
•• Ampliação da capacidade produtiva para expandir produtos
e mercados existentes: investimentos em edificações, instala-
ções e equipamentos novos para ampliar a capacidade instalada,
visando atender ao crescimento esperado da demanda no atual
mercado da empresa.
•• Ampliação da capacidade produtiva a fim de expandir para
novos mercados e produtos: investimentos em edificações,
instalações e equipamentos novos com o objetivo de criar uma
nova linha de produtos ou expandir a atual para uma nova re-
gião geográfica.
•• Aquisição de empresas: uma das formas de crescimento mais
rápidas existente. Uma questão fundamental nessa alternativa é
o cálculo das sinergias que possam ser geradas a partir da com-
pra da empresa-alvo. Um exemplo da sinergia gerada por esse
processo está relacionado à redução dos gastos com pessoal
e suporte administrativo. As duas empresas juntas, além de
dispensarem as funções superpostas (contabilidade, finanças,
recursos humanos etc.), permitem a utilização dos sistemas e
métodos mais modernos, entre os utilizados pelas empresas, e
a permanência dos melhores colaboradores para cada função
com superposição.
•• Projetos ambientais: não necessariamente geram receitas di-
retas, mas visam adequar as instalações da empresa às novas
exigências do mercado consumidor, cada vez mais preocupado
e consciente das questões relacionadas ao meio ambiente. Es-
ses projetos procuram, também, atender à legislação ambien-
tal vigente.
Ao analisarmos uma alternativa de investimento, antes de utilizar-
mos qualquer tipo de método para mensuração do possível retorno,
precisamos elaborar um estudo de viabilidade do projeto.

Dependendo do porte do projeto, algumas questões extremamente


importantes são detalhadas nesse estudo, como:

Retorno de projetos 67
•• tecnologia empregada;
•• escala de produção;
•• prazo de construção das instalações e riscos de atraso no crono-
grama (quando o projeto envolver novas instalações);
•• estimativa dos gastos de capital (edificações, instalações, equipa-
mentos, veículos etc.); e
•• localização das matérias-primas, mão de obra, infraestrutura
(energia, comunicação, transporte etc.), logística, impacto am-
biental e mercado cliente.

Esse estudo de viabilidade do projeto é uma ferramenta de planeja-


mento elaborada com base em um conjunto de informações, em que
são destacados os aspectos mais importantes do negócio.

3.2.1 Princípios básicos para investimentos


A necessidade de adotar critérios específicos para escolher os pro-
jetos de investimento que devem ser selecionados tem origem na li-
mitação provisória ou permanente dos recursos de capital dos quais a
empresa dispõe. Por esse motivo, as organizações nem sempre poderão
aproveitar todas as oportunidades de investimento disponíveis.

Dessa forma, é necessário adotar critérios que permitam escolher,


em meio as muitas alternativas existentes, aquelas que maximizem o
valor da empresa para os seus proprietários e rejeitar as demais. Essa
análise quantitativa tem como base alguns princípios qualitativos mui-
to importantes que podem ser vistos a seguir.
1. Determinar as alternativas viáveis
O primeiro passo é definir quais alternativas são inicialmente viá-
veis do ponto de vista político, técnico e econômico. Não há decisão a
ser tomada a menos que haja dois ou mais cursos de ação possíveis.
Podem ocorrer também erros de decisão caso alguma alternativa viá-
vel não seja levada em conta, se não houver recursos para investir na
alternativa escolhida ou se ela for inviável devido às considerações tec-
nológicas, sociais, econômicas ou ambientais.

68 Finanças Corporativas
2. Converter os resultados das alternativas em um
denominador comum
Para podermos comparar corretamente alternativas distintas, é ne-
cessário quantificar todos os resultados em unidades monetárias, já con-
siderando o valor do dinheiro no tempo (Princípio 4, a seguir), para que
possam ser refletidas no fluxo de caixa da(s) alternativa(s) em estudo.
3. Somente as diferenças entre as alternativas são relevantes
As consequências futuras, comuns a todas as alternativas em ques-
tão, não precisam ser consideradas na análise, pois sua inclusão pode
resultar somente no fato de todas as alternativas estarem igualmente
afetadas. Isso equivaleria a somar ou subtrair o mesmo número em
ambos os lados de uma equação. Assim, a igualdade não se altera.
Como consequência direta desse princípio, deduz-se que os custos
passados ou futuros e comuns a todas as alternativas não são relevan-
tes para a escolha de uma delas.

Nesse caso, um custo passado é definido como uma despesa (ou re-
ceita) que já ocorreu antes da decisão atual. Visto que influi igualmente
em todas as alternativas em análise, essa informação não é relevante
para a decisão a ser tomada e pode, portanto, ser ignorada.
4. O valor do dinheiro no tempo deve ser sempre considerado
O dinheiro perde valor ao longo do tempo devido, entre outros mo-
tivos, à inflação. Por isso, ao analisarmos o fluxo de caixa da alternativa
em análise, precisamos refletir sobre as entradas e saídas de caixa ge-
radas, no exato momento em que podem ocorrer e com o valor daque-
la época, sempre de acordo com nossa melhor estimativa. Incorreções
nesse processo podem resultar em erros de avaliação nos projetos ex-
tremamente prejudiciais à empresa.
5. Decisões separáveis devem ser tomadas isoladamente
Separe as decisões sempre que uma possa ser tomada isolada
de outra, visando facilitar a análise e organizar o raciocínio. Isso se
aplica especialmente às decisões de investimento e de financiamen-
to, que devem ser consideradas isoladamente, exceto em alguns
casos particulares.

Por exemplo, comprar um imóvel é uma decisão de investimento.


Por outro lado, a forma como esse bem será adquirido é uma decisão
de financiamento, que somente deve ser analisada depois de esgotada

Retorno de projetos 69
a do investimento. No exemplo, analisaremos a forma como o imó-
vel será adquirido (financiado) apenas após decidirmos pela compra.
Em outras palavras, se não desejamos comprar um imóvel, o modo que
ele pode ser pago é irrelevante.
6. Considerar a incerteza associada às previsões
Todas as decisões de investimento de capital baseiam-se em esti-
mativas do futuro. Como essas estimativas são previsões de eventos
ainda por ocorrer, é possível, e até mesmo provável, que os resulta-
dos reais sejam distintos daqueles previstos inicialmente. O futuro é
incerto e qualquer análise que falhe em levar isso em consideração
está fadada ao erro.

Por outro lado, não se deve inferir que qualquer previsão


8 seja inválida ou inútil devido à incerteza associada aos dados.
Ao final do capítulo, incluímos Considere a possibilidade das previsões não ocorrerem conforme o
alguns comentários sobre o risco
esperado e analise as consequências desse fato em relação à deci-
associado às previsões no fluxo de 8
caixa da alternativa em estudo. são a ser tomada .
7. Levar em conta também os efeitos não monetários do projeto
Projetos podem apresentar vantagens reais, mas intangíveis, e,
por isso mesmo, difíceis de quantificar, como conforto, conveniência,
qualidade, imagem etc. Mesmo que não haja vantagens econômicas
imediatas, podem haver vantagens estratégicas inegáveis, fazen-
do com que o projeto seja atraente mesmo com retorno negativo.
Em todo caso, quaisquer vantagens intangíveis devem ser claramente
relacionadas para que o responsável pela análise possa ter dados que
balizem sua decisão final.

3.3 Métodos de avaliação


Vídeo O fluxo de caixa é, talvez, o instrumento de maior importância
na área financeira. É por meio desse demonstrativo que podemos
analisar corretamente a capacidade de pagamento atual e futura de
uma empresa. Com base nele, podemos tomar uma série de deci-
sões com relação à rentabilidade de um investimento, aprovando
os lucrativos e negando aqueles que não geram o retorno líquido
esperado pela empresa.

Existem vários métodos determinísticos para o cálculo do retorno


a ser obtido em investimentos. Todos eles são baseados no fluxo de

70 Finanças Corporativas
caixa do projeto, elaborado para trazer todas as variáveis quantitativas
a um mesmo denominador comum.

Há quatro características básicas e não igualmente exclusivas nos


fluxos de caixa utilizados na representação de projetos de investimento:
1. Valores constantes do fluxo
Glossário
•• Variáveis: os valores projetados para as entradas e saídas de
superavit: diferença a mais
caixa, em determinado período (superavit ou deficit), refletem
entre as entradas e as saídas de
a existência de variações nos índices de preços. caixa no período de apuração.
•• Constantes: as projeções para os valores das entradas e deficit: excesso de saídas de
caixa em relação às entradas no
saídas de caixa são realizadas em moeda constante, ou seja,
período de apuração.
desconsideram a inflação do período.
2. Periodicidade
•• Periódicos: os intervalos de tempo entre cada período
(mensal, trimestral, anual etc.) são iguais ao longo da vida
útil do projeto.
•• Não periódicos: intervalos de tempo irregulares. Isso significa
que, em determinado mês, por exemplo, podemos ter
entradas e/ou saídas de caixa e isso pode não ocorrer no mês
subsequente, isto é, os intervalos de tempo entre os eventos
não são constantes.
3. Período de ocorrência dos eventos
•• Postecipados: o primeiro evento caixa, pagamento ou
recebimento, ocorre no final do primeiro período do fluxo de 9
caixa e a partir daí sucessivamente. Esse tipo de fluxo é utilizado na
•• Antecipados: o primeiro evento caixa, pagamento determinação do valor de uma
empresa, chamado de valuation.
ou recebimento, ocorre no período zero e a partir Ao realizarmos esse tipo de cál-
daí sucessivamente. culo, utilizamos como premissa
que uma empresa não tem data
•• Diferido: o primeiro pagamento ou recebimento ocorre apenas
para ser fechada, podendo gerar
após determinado intervalo de tempo, chamado de período de fluxos de caixa indefinidamente.
carência ou diferimento e periodicamente a partir daí. A exceção a essa regra são as
empresas chamadas de Special
4. Duração do fluxo Purpose Company (SPC) ou So-
•• Finito: existe uma definição predeterminada para o término ciedade de Propósito Específico
do projeto. (SPE). Esse tipo de empresa já
nasce com um objetivo predeter-
•• Infinito: não existe um momento determinado para o final minado, que, ao ser alcançado,
do fluxo, apresentando, por isso, uma característica de descontinua a empresa.
9
indeterminação .

Retorno de projetos 71
Normalmente, os fluxos de caixa estudados, a fim de representar
projetos de investimento, podem ser:
10 10
•• variáveis ;
Quando constantes, são expressos
normalmente em uma moeda •• periódicos;
forte, por exemplo, o dólar.
•• postecipados;
•• finitos.

Figura 4
Representação de fluxo de caixa

0 1 2 3 4 n

+ Entradas de
- Saídas de recursos
recursos

Investimento
inicial

Fonte: Elaborada pelo autor.

A tarefa mais importante e difícil, quando analisarmos uma al-


ternativa qualquer de inversão dos recursos da empresa, é a pro-
jeção dos fluxos de entrada e saída de caixa. As muitas variáveis
envolvidas na avaliação tornam, normalmente, necessário o envolvi-
mento de diferentes áreas da empresa para alimentar as principais
premissas do estudo.
Livro
O livro Análise de Investi-
Geralmente, as previsões de receitas são realizadas pela área de
mentos traz conceitos de marketing e/ou vendas e levam em consideração uma série de fa-
Matemática Financeira
como fundamento para
tores, tais como: sensibilidade das vendas em relação à variação do
a Engenharia Econômica, nível de atividade, previsão do PIB, efeitos de gastos com propagan-
apresentando soluções
para problemas de Análi-
da e publicidade, gosto dos consumidores, elasticidade de preços,
se de Investimento. sazonalidade das vendas, e crescimento econômico mundial e do
CASAROTO FILHO, N., KOPITTKE, B. país. Essas informações são posteriormente incluídas no fluxo, pela
H. São Paulo: Atlas, 2010.
área financeira, com base nas projeções de prazo médio de vendas
e de inadimplência.

Os custos operacionais são estimados pela área de Contabilidade


de Custos, pelo pessoal da área de Suprimentos e por especialistas em
produção, também responsáveis pelas projeções de gastos relaciona-
dos às edificações, instalações e compras de equipamentos.

72 Finanças Corporativas
Existem vários métodos para cálculo do retorno a ser obtido em
projetos de investimentos. Eles são baseados no fluxo de caixa do pro-
jeto, elaborado para trazer a um mesmo denominador comum todas
as suas variáveis quantitativas. Antes de apresentarmos esses méto-
dos, precisamos de alguns conceitos básicos:
•• Custo de oportunidade de capital
Sempre que um investidor decide por uma alternativa de investi-
mento, em detrimento das demais opções existentes naquele momen-
to, utiliza implicitamente o critério de optar por aquela que lhe gerará
o maior retorno.

O retorno dessa alternativa, medida por determinado método de


avaliação, passa a ser, então, o piso que o investidor deseja obter na-
quele momento dentre as opções disponíveis no mercado para aplica-
ção de suas disponibilidades financeiras, isto é, passa a ser seu custo
de oportunidade de capital.
•• Taxa mínima de atratividade (TMA)
Trata-se do custo de oportunidade de capital, apresentado sob a
forma de taxa de juros. A taxa mínima é utilizada no cálculo e nos pro-
cessos comparativos dos fluxos de caixa, gerados pelas alternativas
de investimento existentes, permitindo, com base na sua utilização,
determinar a melhor alternativa de investimento, mesmo que seja a
sua não realização.

Com base no mesmo conceito do custo de oportunidade de capital,


a TMA passa a ser o piso, expresso sob a forma de taxa de juros, que
o investidor deseja obter em qualquer tipo de investimento no qual
aplique seus recursos.
Importante

A TMA e o custo de capital ou custo médio ponderado de capital são sinônimos para
o mesmo conceito. Representam a taxa mínima de retorno necessária à cobertura dos
custos médios dos recursos passivos, utilizados para financiar os investimentos reali-
zados no Ativo, de modo a manter inalterado o valor da empresa.

Tomando como base os conceitos trabalhados até aqui, apresenta-


remos a seguir os métodos mais importantes para o cálculo do retorno
de um projeto de investimento.

Retorno de projetos 73
3.4 Valor Presente Líquido (VPL)
Vídeo O VPL de um investimento ou financiamento é o valor equivalente,
na data de sua decisão, de todas as entradas e saídas projetadas, cal-
culadas com base em uma taxa representativa do custo de capital da
empresa. Esse método compara todas as entradas e saídas existentes,
projetadas no fluxo de caixa na data em que o projeto teria seu início.
Esses valores futuros são trazidos para a data inicial como se cada en-
trada ou saída do fluxo fosse um montante e quiséssemos calcular o
respectivo valor atual, utilizando para tanto a TMA definida.

O resultado desse cálculo é expresso na mesma unidade monetária


utilizada para a projeção das entradas e saídas de caixa, relativas à al-
ternativa de investimento em análise. Conceitualmente, o VPL pode ser
definido da seguinte forma:
•• Somatório do valor atual de cada componente do fluxo de caixa
(entradas e saídas) descontado pela TMA.
•• Valor na data de hoje de uma alternativa de investimentos, já
considerando o retorno mínimo que deseja ganhar, expresso
pela TMA.

O VPL pode ser representado com o seguinte gráfico:

Figura 5
Representação de valor presente líquido

E
E E E

tempo
0 1 2 3 4 5 n

S
Qual é o valor hoje dos fluxos
de entradas e saídas de caixa?
I

Fonte: Elaborada pelo autor.


Onde:
I = Investimento inicial
n = Vida útil do projeto
E = Entradas (receitas)
S = Saídas (despesas)

74 Finanças Corporativas
O critério econômico de aceitação de um projeto, por meio desse
método, tem como base o resultado calculado. Por ser expresso na
mesma unidade monetária utilizada no fluxo de caixa, o valor encon-
trado no cálculo do VPL poderá apresentar três alternativas:
•• VPL positivo (VPL > 0)

Significa que a soma do valor atual das entradas de caixa pro-


jetadas, descontadas pela TMA, é maior que a soma do valor atual
das saídas de caixa, descontadas pela mesma taxa, já incluído, nesse
cálculo, o valor do desembolso de caixa inicial no projeto, se houver.

Esse tipo de resultado indica que a alternativa de investimento


apresenta um ganho superior ao mínimo desejado, expresso pela
TMA, ou seja, o valor encontrado demonstra, em unidades monetá-
rias, o valor excedente à TMA. Por esse motivo, dizemos que o VPL
positivo é uma medida de valor adicionado.
•• VPL negativo (VPL < 0)

Significa que a soma do valor atual das entradas de caixa projeta-


das, descontadas pela TMA, é menor que o valor atual da soma das
saídas de caixa projetadas, descontadas pela mesma taxa, já incluí-
do, nesse cálculo, o valor do desembolso de caixa inicial no projeto,
se houver.

O resultado obtido quando o VPL é menor que zero indica que,


mesmo se houver um ganho, ele é certamente menor que o mínimo
desejado expresso pela TMA.

Embora, tecnicamente, não exista um fundamento robusto em


função do conceito do valor do dinheiro no tempo (não podemos
comparar ou realizar operações aritméticas com valores em tempos
diferentes), se a soma de todas as entradas de caixa projetadas for
superior à soma das saídas, já incluído o valor do investimento inicial
nas saídas, podemos afirmar que existe um ganho no projeto. Esse
ganho, no entanto, não gera, necessariamente, uma rentabilidade
superior ao mínimo desejado. Os fluxos de caixa a seguir ilustram
esse conceito.

Retorno de projetos 75
200 200
150
110
100

500

200 200
150
110
100

1.500

Repare que, no primeiro fluxo, existe um ganho. No entanto, de-


pendendo da TMA, esse ganho, medido por uma taxa de retorno, pode
ser maior, menor ou igual à TMA. Já no segundo fluxo, com certeza,
a rentabilidade do projeto é negativa, dispensando qualquer tipo de
comparação com a TMA, ou seja, para qualquer TMA, o VPL é negativo.

Importante
VPL menor que zero não significa necessariamente uma perda, mas sim um ganho in-
ferior ao mínimo desejado. No entanto, quando essa linear soma das entradas e saídas
de caixa, incluído o valor do desembolso inicial, for negativa, podemos afirmar que o
projeto gera uma rentabilidade negativa.

•• VPL zero (VPL = 0)

Significa que a soma do valor atual das entradas de caixa, descon-


tadas pela TMA, é igual à soma do valor atual das saídas de caixa,
descontadas pela mesma taxa, já incluído, nesse cálculo, o valor do
desembolso inicial do projeto, se houver.

Projetos com VPL igual a zero indicam a existência de um ganho


exatamente igual ao mínimo desejado expresso pela taxa mínima,
ou seja, o valor encontrado demonstra, em unidades monetárias, a
TMA desejada. Projetos com VPL igual a zero não são indiferentes
e devem ser aprovados, exceto em situações em que existem dois
projetos, um com VPL >0 e outro com VPL = 0. Nesse caso, o projeto
com VPL>0 deve ser selecionado.

76 Finanças Corporativas
Importante

1. Ao analisarmos vários projetos com seus respectivos VPL positivos, o escolhido sob
o ponto de vista econômico será o de maior relação VPL ÷ Investimento inicial (esse
indicador é chamado de índice de lucratividade).
2. Sempre que o VPL for maior que zero, a taxa efetiva de rentabilidade do projeto é
maior que a TMA. Consequentemente, quanto maior a relação VPL ÷ Investimento
inicial, maior será a taxa de retorno do projeto.
3. O VPL de um projeto não permite a mensuração direta da taxa de rentabilidade
do investimento, mas sim o seu resultado em termos de valor monetário na data
de origem.
4. Se um projeto for aprovado pela regra do VPL, ou seja, se tiver VPL positivo e a em-
presa fizer o investimento, seu valor deverá subir pelo VPL do projeto, beneficiando
todos os proprietários.

Na representação do VPL de um projeto, podemos observar a exis-


tência de uma relação direta entre o VPL e a TMA. Essa relação é de-
monstrada no seguinte gráfico:

Figura 6
Relação direta entre VPL e TMA

VPL

VPL para o qual i = 0%

i para a qual VPL = 0

i
-1 0

Projeto de investimento simples

Fonte: Pereira, Aboim e Aboim, 2010.

Observe que o VPL é determinado em função da TMA. Sempre que


a taxa mínima (eixo horizontal) diminui, o VPL aumenta (eixo vertical) e
vice-versa. Para um projeto de investimento qualquer, quanto maior a
TMA, menor será o VPL. Essa relação ocorre para qualquer alternativa
de investimento.

Com base na definição conceitual do VPL, podemos definir uma


relação matemática para a determinação de seu valor. Essa relação é
obtida com a seguinte fórmula:

Retorno de projetos 77
n E -S
VPL=  (1+i)
j j
j
I
j=1

Onde:
VPL = Valor presente líquido
I = Investimento inicial
E = Entradas de caixa
Dica
S = Saídas de caixa
Caso você não disponha de i = Taxa mínima de atratividade (TMA)
uma calculadora financeira no j = Número de entradas e saídas (fluxos), variando de 1 até n
momento, alguns sites disponi-
bilizam emuladores dela on-line. Por essa relação, o cálculo do VPL se faz trazendo as entradas de cai-
Acesse este link para ter acesso xa a valor presente, deduzidas das saídas de cada período, dividido pela
a uma calculadora financeira e
realizar seus cálculos: http:// TMA mais um elevado ao número de entradas e saídas, somando os va-
www.vichinsky.com.br/hp12c/ lores obtidos e subtraindo o valor do investimento inicial. Outra forma
hp12c.php. Acesso em: 29 maio bastante usual de realização desse cálculo é por meio da calculadora fi-
2020.
nanceira HP-12C. Com ela, o cálculo é feito seguindo estas etapas:
1. Pressione f CLX para apagar os registradores financeiros e de
11 armazenamento de dados.
2. Digite o valor do investimento inicial pressionando CHS
11
Essa tecla chamada de e, em
change sign altera o sinal de seguida, g CFo. Se não houver investimento inicial, pressione 0 g CFo.
um número.
3. Digite o saldo de caixa de cada período. Não se esqueça de, em
caso de saldo negativo, pressionar CHS antes de digitar o valor,
12 12
pressionando a seguir g CFj . Se não houver entrada ou saída no
Havendo entradas e saídas próximo período, pressione 0 g CFj.
no mesmo período, devemos 4. Repita a etapa 3 para o saldo de cada período, até que todos os
digitar a diferença.
fluxos estejam introduzidos.
5. Digite a TMA em percentagem pressionando i.
6. Pressione f NPV (essa função calcula o VPL).
Importante

Se houver, no fluxo de caixa a ser utilizado no cálculo do VPL, entradas ou saídas iguais e
consecutivas, podemos utilizar o seguinte atalho:
1. Digite a primeira repetição do número e, em seguida, pressione g CFj.
2. Digite o número de repetições consecutivas e pressione g Nj (até no máximo 99 repetições).
3. Digite o primeiro número após as repetições consecutivas e pressione g CFj.
4. Terminada a digitação dos saldos de caixa do fluxo, insira a TMA na tecla i e pres-
sione f NPV.

78 Finanças Corporativas
Os exemplos a seguir ilustram o cálculo do VPL utilizando a fórmu-
la de cálculo (Exercício 1), a calculadora financeira sem repetições no
fluxo de caixa (Exercício 2) e com repetições no fluxo (Exercício 3).
1. Vamos supor um projeto com os fluxos de caixa a seguir. Sabendo
que a TMA da empresa é de 10%, vamos calcular o VPL do projeto.

CFo = $– 50.000,00 CF3 = $10.000,00


CF1 = $20.000,00 CF4 = $15.000,00
CF2 = $10.000,00 CF5 = $15.000,00

Solução:
20.000 10.000 10.000 15.000 15.000
VPL = – 50.000 + 1
+ 2
+ 3
+ 4
+
(1+0,1) (1+0,1) (1+0,1) (1+0,1) (1+0,1)5

= – 50.000 + 53.518 = $ 3.518,00

Como o VPL é positivo, o projeto deve ser aprovado.


2. Determinada organização deseja adquirir um equipamento
com valor de $1.000,00. Devido ao tipo de equipamento, é
possível vendê-lo após 5 anos por $500,00. Sabendo que a
TMA dessa empresa é de 13% a.a. e que estão previstos fluxos
de entrada e saída relativos à utilização do equipamento,
vamos calcular o VPL do projeto, verificando se a compra é
economicamente justificável.

Ano Valores ($)


01 50,00
02 450,00
03 550,00
04 450,00

Teclas Visor
f CLEAR REG 0 Todos os registradores são apagados
1000 CHS g CFo 1.000 Introduz o investimento inicial
50 CHS g CFj 50 Introduz o primeiro fluxo de caixa
450 g CFj 450 Introduz o segundo fluxo de caixa
550 g CFj 550 Introduz o terceiro fluxo de caixa
450 g CFj 450 Introduz o quarto fluxo de caixa
500 g CFj 500 Introduz o último fluxo de caixa (valor da venda)
13 i 13 Introduz a TMA
f NPV 236,72 Valor do VPL

Como o VPL é positivo, o projeto deve ser aprovado.

Retorno de projetos 79
3. Vamos considerar que uma empresa planeja construir uma
13 13
nova planta industrial a um custo de $5.900,00. Estudos de
Todos os dados apresentados a mercado indicam a possibilidade de venda da nova fábrica
seguir estão e milhares de reais.
de hoje a 10 anos por $1.000,00. Sabendo que o projeto
de construção prevê o fluxo de caixa a seguir e que a TMA
dessa empresa é de 13,5% a.a., vamos verificar se o projeto é
economicamente aceitável.

Ano Valores ($) Ano Valores ($)


01 300,00 06 – 90,00
02 200,00 07 900,00
03 1.000,00 08 900,00
04 1.000,00 09 – 400,00
05 1.000,00

Teclas Visor
f CLEAR REG 0 Todos os registradores são apagados
5900 CHS g CFo 5.900 Introduz o investimento inicial
300 g CFj 300 Introduz o primeiro fluxo de caixa
200 g CFj 200 Introduz o segundo fluxo de caixa
1000 g CFj 3 g Nj 3 Introduz do terceiro ao quinto fluxo de caixa
90 CHS g CFj – 90 Introduz o sexto fluxo de caixa
900 g CFj 2 g Nj 2 Introduz o sétimo e o oitavo fluxo de caixa
Atividade 2
400 CHS g CFj – 400 Introduz o nono fluxo de caixa
Considere vários projetos, todos 1000 g CFj 1.000 Introduz o décimo fluxo de caixa (valor revenda)
com VPL positivo e de mesmo
13,5 i 13,50 Introduz a TMA
prazo. No caso de só podermos
escolher um deles, qual deverá f NPV – 2.853,50 Valor do VPL em milhares de reais
ser o escolhido?
Como o VPL é negativo, o projeto não deve ser aprovado.

3.5 Taxa Interna de Retorno (TIR)


Vídeo Por meio dessa metodologia, chegamos à taxa que iguala o valor
atual de todas as entradas de caixa ao valor atual de todas as saídas de
recursos, inclusive o investimento inicial. Para isso, calculamos como se
cada entrada ou saída fosse trazida para a data inicial do fluxo de caixa,
representativo de uma alternativa de inversão de valores por essa taxa.

O valor encontrado, expresso em taxa, deve ser comparado com a TMA,


podendo levar a três conclusões diferentes para um projeto em análise:

80 Finanças Corporativas
• TIR > TMA: qualquer alternativa de investimento que apresente
essa característica indica que a rentabilidade efetiva do projeto
(TIR) é maior que o mínimo estabelecido pela empresa como
referencial de ganho (TMA). Projetos com essa característica de-
vem ser aprovados.

• TIR < TMA: alternativas de investimento com essa característica


indicam que a rentabilidade efetiva do projeto (TIR) é menor
que o mínimo estabelecido pela empresa (TMA).

• TIR = TMA: projetos de investimentos com esse resultado indi-


cam que a rentabilidade efetiva da alternativa em estudo (TIR) é
igual à rentabilidade mínima desejada (TMA).

Importante

1. A comparação da TIR com a TMA somente faz sentido se a TIR for positiva. Caso a TIR
seja um número negativo, indica que a alternativa apresenta um retorno negativo,
não sendo necessário fazer qualquer tipo de comparação com a TMA.
2. Como a comparação somente faz sentido quando a TIR for positiva, projetos com
TIR < TMA indicam que o retorno é inferior à TMA e não que o retorno é negativo.
3. Projetos com TIR = TMA não são indiferentes. Indicam que o retorno esperado é
exatamente igual ao retorno mínimo desejado, devendo ser aprovados, exceto em
situações em que existem dois projetos, um com TIR >TMA e outro com TIR = TMA.
Nesse caso, o projeto com TIR >TMA deve ser selecionado.
4. Analisando várias alternativas de inversão de recursos, entre as que produzirem uma
TIR maior que a TMA, a melhor opção, sob o ponto de vista financeiro, será a de
maior TIR. Economicamente, no entanto, aspectos relativos à macro estratégia po-
derão alterar completamente o ranking das alternativas estudadas por meio da TIR.

Do ponto de vista matemático, a TIR pode ser calculada com a se-


guinte equação:

n E -S
VPL=  (1+i)
j j
j
I = 0
j=1

Onde:
I = Investimento inicial
E = Entradas de caixa
S = Saídas de caixa
j = Número de entradas e saídas (fluxos), variando de 1 até n
i = Taxa interna de retorno (incógnita da equação)

Retorno de projetos 81
Podemos verificar, analisando a fórmula anterior, que a sua aplica-
ção não fornece um resultado direto. Para calcularmos o valor da TIR,
devemos realizar várias tentativas, com aproximações sucessivas, até
obtermos a igualdade acima definida. Esse processo de aproximações
sucessivas é utilizado por todas as ferramentas de cálculo da TIR (calcu-
ladoras financeiras e Excel).

Ao analisarmos a fórmula de cálculo do VPL e compararmos com a


fórmula da TIR, percebemos claramente que a diferença entre elas é a
definição do valor do VPL na fórmula da TIR como zero. Partindo dessa
diferença nas equações, podemos definir a TIR como:
•• Taxa que deixa o valor atual das entradas igual ao valor atual das
saídas no fluxo de caixa, ou seja, taxa que iguala o VPL a zero.
•• Taxa efetiva de rentabilidade do projeto.

Livro Uma forma simples de interpretação do significado da TIR é imagi-


No livro Investimentos no nar que uma empresa tem seu custo de capital (TMA) definido como
Mercado Financeiro, são
10% e um projeto com a TIR calculada em 14,8%. Para a empresa, é
tratados os conceitos ne-
cessários à análise de in- como se existissem duas alternativas de investimentos. A primeira é a
vestimentos e aplicações
aplicação do investimento inicial pelo custo de capital, nesse caso, 10%.
no mercado financeiro,
ilustrados por meio da A segunda é o próprio projeto de investimentos obtendo, nesse caso,
utilização da calculadora
um retorno de 14,8%.
HP-12C.

ASSAF NETO A.; GUASTIAN A. F. São Assim, a decisão de investir no projeto acarretaria um adicional de 4,8
Paulo: Atlas, 2019. pontos percentuais (14,8% – 10%) sobre aquilo que já se teria, isto é, a
própria TMA. Para que essa explicação faça sentido, a hipótese básica no
cálculo da TIR é que os recursos liberados pelo projeto possam ser rein-
vestidos a uma taxa igual à TIR, o que, na prática, nem sempre acontece.

Conceitualmente, a taxa interna de retorno pode ser utilizada para


o cálculo do retorno de projetos e a fim de determinar o custo efetivo
de uma operação de captação de empréstimos. Para projetos de in-
vestimento (operações ativas), a taxa interna (ou implícita) de retorno
representa o retorno previsto para essa alternativa de aplicação de re-
cursos. Para operações de captação de financiamentos onerosos, a TIR
representa o custo efetivo para o tomador. Isso ocorre porque a taxa
interna é aquela que torna o valor presente das entradas igual ao das
saídas de caixa, conceito utilizado nas operações tanto de investimento
quanto de captação de financiamentos onerosos.

82 Finanças Corporativas
Graficamente, a taxa interna de retorno pode ser visualizada da se-
guinte forma:

E
E E
E

tempo
0 1 2 3 4 5 n

S
Qual é a taxa que iguala os
fluxos de entradas aos fluxos
de saídas?
I

Fonte: Elaborada pelo autor.

Como o cálculo da TIR somente é feito por aproximações sucessivas,


vamos demonstrar como podemos obter esse indicador utilizando a
calculadora HP-12C.

Os passos necessários para esse cálculo são os seguintes:


1. Pressione f CLX para apagar os registradores financeiros e de
armazenamento de dados.
2. Digite o valor do investimento inicial pressionando CHS e, em
seguida, g CFo. Se não houver investimento inicial, pressione
0 g CFo.
3. Digite o saldo de caixa de cada período. Não se esqueça, caso o
saldo seja negativo, de pressionar CHS antes de digitar o valor,
pressionando a seguir g CFj. Se não houver entrada ou saída no
próximo período, pressione 0 g CFj.
4. Repita a Etapa 3 para o saldo de cada período até que todos
os fluxos estejam digitados, utilizando g Nj sempre que houver
repetições consecutivas.
5. Pressione f IRR (calcula a TIR).

Importante

1. O valor da TIR é calculado para a frequência de entradas e saídas de caixa, explicita-


das no fluxo de caixa (mensal, semestral, anual etc.).
2. O cálculo da TIR é baseado em tentativa e erro, ou seja, busca-se uma taxa para
zerar o VPL. Por esse motivo, o cálculo da TIR pode demorar vários segundos ou, até
mesmo, vários minutos.
(Continua)

Retorno de projetos 83
3. Por sua própria definição, não existe TIR para um projeto que não tenha investi-
mento inicial.
4. Como o cálculo da TIR é baseado em tentativa e erro, sem auxílio de uma planilha
eletrônica ou calculadora financeira, a determinação da TIR pode se tornar um traba-
lho bastante cansativo.

Do ponto de vista matemático, devido à determinação da TIR ser feita


por aproximações sucessivas, vamos utilizar a calculadora HP-12C para
demonstrar um exemplo com o cálculo de um projeto de investimento.
1. Uma empresa planeja adquirir um novo equipamento
para aumentar sua capacidade de produção a um custo de
$8.900.000,00. O projeto apresenta as seguintes características:

•• A TMA dessa empresa é de 13,5% a.a.


•• Existe a possibilidade de venda do equipamento ao final de 10
anos por $500.000,00.
•• O projeto de construção prevê o fluxo de caixa adiante
(apresentado em milhares de reais).
Com base nesse fluxo de caixa e nas características apresentadas,
determine se o projeto é economicamente aceitável, tendo como base
o cálculo da TIR.

Ano Valores ($) Ano Valores ($)


01 3.400,00 06 2.710,00
02 2.600,00 07 900,00
03 2.000,00 08 900,00
04 300,00 09 – 350,00
05 1.000,00

Teclas Visor
f CLEAR REG 0 Todos os registradores são apagados
8900 CHS g CFo – 8.900 Introduz o investimento inicial
3400 g CFj 3.400 Introduz o primeiro fluxo de caixa
2600 g CFj 2.600 Introduz o segundo fluxo de caixa
2000 g CFj 2.000 Introduz o terceiro fluxo de caixa
300 g CFj 300 Introduz o quarto fluxo de caixa
1000 g CFj 1.000 Introduz o quinto fluxo de caixa
(Continua)

84 Finanças Corporativas
Teclas Visor
2710 g CFj 2.710 Introduz o sexto fluxo de caixa
900 g CFj 2 g Nj 2 Introduz o sétimo e o oitavo fluxo de caixa
350 CHS g CFj – 350 Introduz o nono fluxo de caixa
500 g CFj 500 Introduz o décimo fluxo de caixa (valor de revenda)
f IRR 14,28 Valor da TIR (expresso em percentagem)

Como a TIR é maior que a TMA, o projeto deve ser aprovado.

3.5.1 Limitações da Taxa Interna de Retorno


Embora seja um método largamente utilizado, a TIR apresenta
algumas limitações. Em primeiro lugar, essa taxa pressupõe que os
saldos projetados no fluxo de caixa sejam reinvestidos pela própria
taxa interna de retorno. Quando utilizamos o critério do VPL, a pre-
missa implícita é que os fluxos de caixa do projeto estão sendo re-
investidos pela TMA (custo de capital). Se for possível saber a taxa
de reaplicação futura dos fluxos de caixa do projeto, a escolha entre
os projetos deve favorecer aquele que tiver maior valor futuro e não
o fato de a TIR ser maior que a TMA. O exemplo a seguir ilustra
essa questão.
10.900
8.500
5.500

1 2 3

Taxa mínima de atratividade = 23%


15.500

Ao calcularmos a TIR para esse projeto, obteríamos 24,69%. Como


a taxa mínima é de 23%, o projeto deveria ser aprovado. Se, no en-
tanto, pudéssemos aplicar os saldos de caixa no primeiro período a
uma taxa de 10% e no segundo a 15%, o valor futuro do projeto no
terceiro período seria:

VF = 5.500 (1 + 0,10)2 + 8.500 (1 + 0,15)1 + 10.900

VF = $27.330,00

Se, com base nesse valor futuro, calcularmos a taxa média efetiva de
rentabilidade obtida utilizando a HP-12C, obteremos o seguinte valor:

Retorno de projetos 85
•• n=3
•• PV = $– 15.500,00 (o valor negativo, nesse caso, indica uma
saída de caixa referente ao investimento inicial)
•• FV = $ 27.330,00
•• i = ?? = 20,81%

Como a TMA do projeto é 23%, nesse caso, o projeto não deveria ser
aprovado, apesar de apresentar uma TIR maior que a TMA.

A segunda limitação está relacionada ao número de taxas internas


possíveis de serem calculadas. Essa quantidade é função do número
de vezes em que o fluxo de caixa apresenta saldos finais positivos e
negativos. Se, por exemplo, o saldo final do primeiro período apre-
senta um superavit de caixa projetado e o saldo final do segundo pe-
ríodo apresenta um deficit, isso é considerado uma mudança de sinal.
Cada mudança de sinal, ao longo da linha do tempo, indica a existência
de uma taxa interna de retorno. Não podemos esquecer também que
um projeto pode não apresentar TIR. Isso ocorre quando um projeto
14 não tem investimento inicial .
14

Como a TIR é a taxa que iguala


Outra limitação está relacionada à utilização, para projetos de lon-
todos os valores do fluxo de
caixa ao investimento inicial, ga maturação, de mais de uma TMA. Se a taxa mínima for diferente
se esse valor inexiste, não é ao longo do projeto, o critério da taxa interna de retorno torna-se in-
possível fazer a comparação e,
consequentemente, o cálculo é viável pela impossibilidade de compararmos apenas uma taxa interna
impossível. de retorno com taxas mínimas diferentes. Essa limitação, no entanto,
deixa de existir se todas as taxas mínimas de atratividade forem infe-
riores à TIR calculada.

Uma última limitação da taxa interna de retorno está relacionada


15 15
a projetos mutuamente excludentes e que podem indicar decisões
A aprovação de um implica,
diferentes em função do método utilizado. Para ilustrar essa ques-
necessariamente, a desaprova-
ção do outro. tão, utilizaremos dois projetos com os respectivos fluxos de caixa. A
TMA, nesse caso, é de 15%.

Projeto A Projeto B

Período Saldo caixa ($) Período Saldo caixa ($)

0 – 1.000.000,00 0 – 500.000,00

1 350.000,00 1 180.000,00

2 400.000,00 2 250.000,00

(Continua)

86 Finanças Corporativas
Projeto A Projeto B

Período Saldo caixa ($) Período Saldo caixa ($)

3 480.000,00 3 290.000,00

4 590.000,00 4 380.000,00

5 550.000,00 5 350.000,00

TIR = 33,69% TIR = 42,65%

VPL = $533.194,70 VPL = $427.515,45

Analisando os dois projetos, ao utilizarmos o método da TIR, o Pro-


jeto B é melhor. No entanto, pelo método do VPL, o Projeto A é melhor.
Esse exemplo ilustra uma questão muito importante: podemos ter dois
ou mais projetos com escolhas diferentes, dependendo do critério de
avaliação utilizado.

Se, apesar de todas as limitações demonstradas, ainda quisermos


utilizar a TIR, uma forma segura de definir o melhor projeto é calcular a
TIR da diferença dos fluxos de caixa dos projetos, como se essa diferen-
ça fosse um projeto. Esse cálculo é apresentado a seguir:

Período Projeto A Projeto B Projeto A – Projeto B


0 – 1.000.000,00 – 500.000,00 – 500.000,00

1 350.000,00 180.000,00 170.000,00

2 400.000,00 250.000,00 150.000,00

3 480.000,00 290.000,00 190.000,00

4 590.000,00 380.000,00 210.000,00

5 550.000,00 350.000,00 200.000,00

TIR Projeto A – Projeto B = 23,20%

Como regra de decisão, se:


TIR Projeto A – Projeto B > TMA → Projeto A é melhor.
TIR Projeto A – Projeto B < TMA → Projeto B é melhor.
Atividade 3
Nesse caso, o Projeto A é melhor (23,20% > 15%), o que poderia ser Todo projeto com TIR superior à
confirmado desde o início pela regra do VPL (VPLA > VPLB). TMA tem VPL positivo?

Retorno de projetos 87
3.6 Payback Simples e Payback Descontado
Vídeo O Payback Simples é um dos métodos mais populares para realizar
análise de alternativas de investimento. Consiste em determinar em
qual momento, na linha do tempo, a soma das entradas de caixa é
igual à soma das saídas de caixa, já incluído o investimento inicial.

Para facilitar o entendimento do Payback Simples, tomemos o se-


guinte exemplo: uma empresa pretende investir $100.000,00 em um
equipamento que, segundo estudos, proporcionará uma economia
de $30.000,00 no primeiro ano, $50.000,00 no terceiro, $20.000,00 no
quarto e $30.000,00 no quinto.

Para chegarmos ao Payback Simples, basta calcularmos a soma acu-


mulada nos fluxos de caixa ao longo do tempo. O período de Payback
Simples será aquele em que os valores acumulados chegarem a zero.
O quadro a seguir demonstra esse cálculo para os dados do projeto
descritos anteriormente.

Ano Fluxo do período ($) Fluxo acumulado ($)


0 – 100.000,00 – 100.000,00

1 30.000,00 – 70.000,00

2 50.000,00 – 20.000,00

3 20.000,00 0

4 30.000,00 30.000,00

Pela regra do Payback Simples, analisando o projeto, podemos veri-


ficar que, ao final do terceiro ano, a empresa recuperará o investimen-
to realizado. Nesse caso, o período de Payback Simples é de 3 anos.

Como regra de decisão, a empresa fixa um determinado limite


de tempo, comparando o Payback Simples de todos os projetos com
esse limite. Todos aqueles que apresentarem um período de Payback
Simples inferior são aprovados.

Esse método, de extrema simplicidade de cálculo, apresenta algu-


mas limitações muito importantes e que serão demonstradas com a
análise dos projetos apresentados a seguir:

88 Finanças Corporativas
Período Projeto 1 Projeto 2 Projeto 3
0 – 160 – 160 – 160

1 20 60 60

2 30 50 50

3 50 20 20

4 60 30 30

5 40 15 150

Analisando esses três projetos, observe que:


1. O cálculo do Payback Simples não se baseia no conceito do
valor do dinheiro ao longo do tempo.

Por esse conceito, não podemos somar, subtrair, dividir ou multi-


plicar valores em tempos diferentes e muito menos compará-los,
premissa básica desse método. Além dessa questão, se calcular-
mos o Payback Simples nos fluxos apresentados, encontraremos
o mesmo período (Período 4), indicando que os três projetos são
iguais de acordo com esse método.

2. Não leva em consideração os fluxos de caixa posteriores


ao período.

Repare que os Projetos 2 e 3 apresentam os mesmos valores


no fluxo de caixa até o período de Payback e, por conseguinte,
mesmo Payback Simples. Por essa regra, eles são absolutamen-
te iguais. No entanto, o Projeto 3 apresenta, no quinto período,
uma entrada de caixa de $150,00, enquanto o Projeto 2 de ape-
nas $15,00, tornando-o muito melhor que o Projeto 2.

Algumas empresas, ao entenderem as deficiências do método tradi-


cional de Payback Simples, acrescentam uma variante a essa metodolo-
gia, descontando o fluxo de caixa do projeto, isto é, trazendo cada valor
projetado para a data zero pela TMA (custo de capital) e, em seguida,
calculando o período de Payback. Essa forma de cálculo do momen-
to em que o projeto se paga passou a ser chamada de Payback Des-
contado. Tomando como base o Projeto 1 e assumindo uma TMA de
10% para a empresa, teríamos:

Retorno de projetos 89
16
Período Projeto 1 Valor atual
16

Os valores são calculados pela


FV 0 – 160 – 160,00
equação PV=
(1 +TMA)n
1 20 18,18
ou utilizando calculadoras
financeiras. 2 30 24,79

3 50 37,57

4 60 40,98

5 40 24,84

Repare que, por esse método, o período de Payback Descontado


subiria de 4 para mais de 5 anos, refletindo o valor atual dos fluxos de
caixa do projeto descontado pelo custo de oportunidade. Pela regra do
Payback Descontado, esse projeto não se pagaria ao longo de sua vida
útil e deveria ser reprovado, embora pela regra do Payback Simples ti-
vesse sido aprovado.

3.7 Risco
Vídeo Em várias situações, nos deparamos com determinadas decisões
em que fatores determinísticos (baseados em fatos já ocorridos) não
necessariamente fundamentarão nosso processo decisório. Nossas
decisões, nesses casos, serão baseadas em fatos que ainda ocorre-
rão. Como não sabemos, com certeza, como e de que forma esses
fatores acontecerão, teremos que fundamentar nosso processo de-
cisório nas chances mais prováveis de ocorrência desses fatos e no
respectivo grau de incerteza associado.

Processos decisórios, fundamentados em fatos dessa natureza, são


definidos como probabilísticos ou estocásticos, uma vez que, devido à
incerteza associada ao futuro, o máximo que nos será possível é esti-
mar as chances ou probabilidades de ocorrências desses fatores.

O estudo da teoria da probabilidade, como forma de explicação


da ocorrência futura de fatores não conhecidos no presente, data do
século XVI e foi relacionado, inicialmente, aos jogos de azar. Mesmo
hoje, são inúmeras as aplicações da probabilidade nesse campo a jul-
gar pela enorme quantidade de loterias, concursos e planos de capita-
lização existentes.

90 Finanças Corporativas
Com o passar do tempo, a teoria da probabilidade ultrapassou o res-
trito limite dos jogos de azar, passando a analisar um horizonte maior
de aplicações. Hoje, é utilizada como uma forma de explicação para
praticamente quase tudo em que exista incerteza associada ao futuro.

Aplicações na área de Marketing com relação ao provável sucesso


de um novo produto baseadas no estudo de uma amostra da popu-
lação, o planejamento financeiro de uma empresa e o impacto futuro
nos resultados da empresa em decorrência de determinados cenários
projetados são exemplos extremamente comuns nos dias de hoje da
aplicação da teoria da probabilidade.

Na realidade, por ser impossível definirmos com certeza o que ocorrerá


em determinada situação, o que se busca com a utilização das probabi-
lidades é determinar o que poderá ocorrer e, principalmente, quais as
chances de que esse evento efetivamente ocorra. Resumidamente, po-
demos dizer que a probabilidade é utilizada na determinação das possi-
bilidades de ocorrência de um determinado evento.

A teoria das probabilidades é fundamentada em alguns conceitos


básicos formadores de sua base teórica, dentre os quais destacamos
que a probabilidade de um evento ocorrer é um número entre 0 e 1, ou
seja, entre 0% e 100%. Isso significa que a possibilidade de um evento
ocorrer é medida por um número decimal maior que zero e menor
que um ou alternativamente um número percentual maior que zero e
menor que cem.

Desse conceito, podemos extrair duas relações importantes:

0 ≤ Pr(ei) ≤ 1
17
Pr(e1) + Pr(e2) + .... + Pr(en) = 1
17
Essa relação indica que a soma
de todas as possibilidades
Onde: previsíveis no presente é igual
Pr(ei) = Resultado possível de um evento à certeza no futuro, ou seja, a
soma de todas as probabilidades

3.7.1 Cálculo do VPL em condições de risco


é igual a 100%.

Na determinação do VPL discutida anteriormente, não levamos


em consideração o aspecto risco que abrange a principal variável en-
volvida no cálculo: a incerteza associada ao fluxo de caixa do projeto.
Representando o fluxo de caixa por uma sequência de valores futuros,

Retorno de projetos 91
precisaremos associar a cada valor futuro do fluxo do projeto uma me-
dida de risco para determinação de seu VPL.

Para obtermos o risco associado, precisaremos determinar a


distribuição de probabilidades, média e desvio padrão, do fluxo de
caixa da alternativa em análise. A determinação da distribuição de
probabilidades do VPL é obtida por meio da probabilidade do VPL de
cada possível alternativa para cada período do fluxo de caixa.

O cálculo do VPL e do risco associado será dado pelas


seguintes relações:

n FC
VPL=  (1+i)j j  I
j=1

P (VPLj) = P(FC1, FC2, ......, FCn)

n
E(VPL)= ∑ VPL j × P(VPL j )
j=1

1/ 2
 n  
 2
 2
  VPL j × P(VPL j )   E(VPL) 
 
  j=1 

Onde:
E (VPL) = Valor esperado do VPL
S (VPL) = Desvio padrão do VPL
P (VPL) = Probabilidade de cada valor do fluxo de caixa
FC = Fluxo de caixa de cada período
i = TMA
j = Número de entradas e saídas (fluxos), variando de 1 até n

Para entendermos melhor o conceito, imaginemos o seguinte


exemplo: uma empresa, analisando o fluxo de caixa de determinado
projeto, associou a incerteza a esse fluxo pela distribuição de probabili-
dades a seguir. Sabendo que seu custo de capital é de 10% e o valor do
investimento inicial é de $200,00, vamos determinar o VPL esperado e
o risco associado referentes a esse projeto.

92 Finanças Corporativas
FC1 P (FC1) FC2 P (FC2)
140 0,65 200 0,55

130 0,35 180 0,25

175 0,20

Diferentemente dos outros exemplos apresentados, o projeto em


análise programa, para o primeiro período, a possibilidade de geração
de dois valores diferentes com as respectivas probabilidades que acon-
teçam. Para o segundo período, entendemos que é possível ocorrer
três valores diferentes com as respectivas probabilidades. Com base na
combinação de todas as possibilidades em que os valores previstos ocor-
ram, podemos calcular o VPL e a respectiva probabilidade. Os valores
calculados seriam os seguintes:
140 200
VPL1 = + = 292,56 – 200 = $92,56
(1+0,10) (1+0,10)2
1

P (VPL1) = 0,65 × 0,55 = 0,3575

140 180
VPL2 = + = $276,03 – 200 = $76,03
(1+0,10)1 (1+0,10)2
P (VPL2) = 0,65 × 0,25 = 0,1625

140 175
VPL3 = 1
+ = $271,90 – 200 = $71,90
(1+0,10) (1+0,10)2
P (VPL3) = 0,65 × 0,20 = 0,13

130 200
VPL4 = 1
+ = $283,47 – 200 = $83,47
(1+0,10) (1+0,10)2
P (VPL4) = 0,35 × 0,55 = 0,1925

130 180
VPL5 = 1
+ = $266,94 – 200 = $66,94
(1+0,10) (1+0,10)2
P (VPL5) = 0,35 × 0,25 = 0,0875

130 175
VPL6 = 1
+ = $262,81 – 200 = $62,81
(1+0,10) (1+0,10)2
P (VPL6) = 0,35 × 0,20 = 0,07

Retorno de projetos 93
Utilizando as informações calculadas anteriormente (VPL de cada
18 possibilidade e a respectiva probabilidade) e as fórmulas demonstra-
O VPL esperado leva em consi- das, podemos calcular o VPL combinado de todas as possibilidades,
18
deração todas as possibilidades chamado de VPL esperado , e o respectivo desvio padrão.
para os valores projetados para
cada período do fluxo de caixa. VPLj P (VPLj) E (VPL) ∑VPL2j × P (VPLj)
92,56 0,3575 33,09 3.062,83

76,03 0,1625 12,35 939,34

71,90 0,1300 9,35 672,05

83,47 0,1925 16,07 1.341,19

66,94 0,0875 5,86 392,08

62,81 0,0700 4,40 276,16

∑=1 ∑ = 81,11 ∑ = 6.683,65

E (VPL) = $81,11

S (VPL) = [6.683,65 – (81,11)2 ]1/2 = $10,24

Esses resultados significam que, para o projeto em análise, todas as


possíveis combinações de valores para os períodos projetados geram
um VPL esperado de $81,11 com um desvio padrão, ou seja, uma varia-
ção monetária para mais ou para menos de $10,24.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O gestor financeiro de uma empresa, de qualquer tamanho e segmen-
to de atuação, precisa estar sempre preparado para enfrentar o desafio
trazido rotineiramente pelas decisões de investimento e de financiamento,
decisões estas que permitirão à empresa um crescimento de maneira
sustentada ou alcançar o estágio que nenhum gestor ou proprietário de-
seja: a falência do negócio.
Nas decisões de investimento, o gestor precisa determinar os projetos
que serão aprovados, tomando como base o custo dos recursos utilizados
para financiar essa alternativa. Para isso, é necessário determinar a renta-
bilidade das possibilidades de inversão de recursos definidas no planeja-
mento estratégico e mercadológico da empresa, buscando sempre aquelas
com rentabilidade superior ao custo dos recursos empregados, permitindo,
dessa forma, maximizar a rentabilidade dos proprietários da empresa.

94 Finanças Corporativas
É fundamental ter sempre em mente que não é possível aplicar recur-
sos em uma alternativa qualquer de investimento sem, primeiro, captar
uma fonte, ou seja, o Ativo de qualquer tipo de empresa não aumenta
se não houver, primeiramente, a captação de uma fonte de recursos.
E, nessa questão, o mercado financeiro tem um papel fundamental. Além
de ajustar os padrões e preferências temporais de consumo e investimen-
to, por meio da tomada de empréstimos e da aplicação em novos projetos
dependendo do spread bancário, podem ser propiciadas alternativas de
aumento de consumo e investimento no presente e no futuro.
Uma questão muito importante para o gestor nas decisões de inves-
timento é entender seu significado. Investimento, para o processo de
tomada de decisão, pode ser definido como toda aplicação realizada na
empresa que tenha por objetivo aumentar a geração de caixa. Isso pode
ser obtido aplicando recursos no Ativo para aumentar a geração ou redu-
zindo o Passivo, por meio do pagamento da dívida com terceiros nos seus
respectivos vencimentos, pagando essa dívida antes do vencimento e/ou
alterando por outra em melhores condições de custo e prazo de paga-
mento, alternativas que, ao final, aumentarão a geração de caixa.
Ao analisar um projeto, a base da partida, independente do método de
avaliação que será utilizado, é o fluxo de caixa, instrumento que permite
analisar de maneira correta a capacidade de geração de caixa do projeto.
Essa projeção é uma das etapas mais difíceis no processo de tomada de
decisão, demandando, em várias ocasiões, em função da complexidade
do projeto, a participação de especialistas de várias áreas da empresa
para alimentar as premissas necessárias às projeções.
Com base no fluxo de caixa da alternativa e com a TMA (custo de
capital) calculada, o gestor pode utilizar quatro métodos para determinar
o melhor projeto. Esses métodos, como vimos ao longo do capítulo, são:
VPL, taxa interna de retorno, Payback Simples e Payback Descontado.
Ao analisar as decisões de investimento, em muitos momentos, o gestor
se depara com incertezas relacionadas às entradas e saídas de caixa e que
podem alterar totalmente o retorno do projeto, independente do método
utilizado. Por não termos certeza de quais são os fatores e da profundidade
que impactarão o fluxo de caixa, precisamos recorrer a métodos probabilís-
ticos para estimar as chances de esses eventos projetados ocorrerem, cal-
culando valores esperados e a respectiva variabilidade do valor calculado,
medida pelo desvio padrão dos fluxos de caixa.
É a partir dos impactos futuros, a curto e a longo prazo, gerados com
base nas decisões de investimento tomadas pelo gestor, que a empresa
pode crescer de maneira sustentada, com maior ou menor velocidade,
tornando mais perene e rentável sua existência no mercado.

Retorno de projetos 95
REFERÊNCIAS
CASAROTO FILHO, N., KOPITTKE, B. H. Análise de investimentos. São Paulo: Atlas, 2010.
COSTA, L. G. T. A.; PEREIRA, A. S.; COSTA, L. R. T. A. Análise de investimentos. Curitiba: IESDE,
2012.
PEREIRA, A. S. Finanças corporativas. Curitiba: IESDE, 2009.
PEREIRA, A. S.; ABOIM, L. G.; ABOIM, L. R. Cálculo Financeiro e Análise de Projetos. Curitiba:
IESDE, 2010.

GABARITO
1. O mercado financeiro permite ajustar as preferências temporais entre o gasto corren-
te (consumo) e o investimento, tanto no presente quanto no futuro. Além de ajustar
essas preferências temporais, permite também o estabelecimento de parâmetros de
comparação e avaliação para as várias alternativas de investimento com as quais uma
empresa se depara ao longo de sua existência, buscando, por meio da implementação
dessas alternativas, maximizar o valor do investimento de seus proprietários.

2. Sempre que o gestor se encontra frente à decisão de escolha entre vários projetos,
todos com seus respectivos VPL positivos e mesmo prazo de maturidade, a decisão
será realizada com base no projeto de maior índice de lucratividade, calculado com
base na divisão do VPL pelo investimento inicial. Quanto maior o índice de lucrati-
vidade, maior o retorno do projeto.

3. Qualquer alternativa de investimento que apresente TIR > TMA indica que a renta-
bilidade efetiva do projeto (TIR) é maior que o mínimo estabelecido pela empresa
como referencial de ganho, chamado de TMA ou custo de capital. Por outro lado,
projetos com VPL > 0 indicam que a alternativa de investimento apresenta um ga-
nho superior ao mínimo desejado, expresso pela TMA, ou seja, o valor encontrado
demonstra, em unidades monetárias, o valor excedente à TMA. Portanto, podemos
afirmar que projetos com TIR > TMA têm VPL > 0.

96 Finanças Corporativas
4
Administração da liquidez
As empresas precisam investir em seus Ativos para gerar ven-
das, estando ou não em um processo de crescimento. Quando
estão em fase de expansão, também necessitam de mais inves-
timentos para financiar o giro de sua atividade, que resulta, prin-
cipalmente, do aumento de estoques e das contas a receber e,
a depender do grau de utilização de sua estrutura, de novas ad-
missões de colaboradores e novos investimentos em máquinas,
equipamentos e instalações.
O gestor financeiro não pode esquecer que esses novos inves-
timentos no Ativo precisam ser financiados com recursos captados
no Passivo, sejam próprios ou de terceiros, vindo a gerar novas
obrigações em relação ao capital utilizado. Dependendo do custo,
do prazo e da forma como os recursos são captados e investidos,
é possível que esse processo resulte em problemas de liquidez, os
quais podem levar a empresa à falência.
Por isso, uma das atividades mais importantes do administra-
dor financeiro é justamente administrar a liquidez das empresas.
Para que essa função seja desempenhada de modo adequado, o
profissional de finanças dispõe de um dos principais instrumentos
de análise e controle financeiro: o fluxo de caixa.
Entender a importância dos prazos de captação de recursos
para o financiamento das operações da empresa com os prazos
de aplicação nos Ativos é de fundamental importância, além de ser
essencial compreender esse reflexo no fluxo de caixa. O aprofun-
damento, detalhamento e compreensão desse relacionamento e
seu respectivo efeito no fluxo de caixa é o que se objetiva com o
presente capítulo.

Administração da liquidez 97
4.1 Liquidez
Vídeo A palavra liquidez é largamente utilizada pelos gestores das empre-
sas. Dependendo do contexto, várias definições associadas a ela são
empregadas, existindo, inclusive, um grupo de indicadores para men-
surá-la: os índices ou indicadores de liquidez.

Esses índices têm base no conceito econômico de liquidez, repre-


sentado pela velocidade em que um Ativo pode ser vendido e recebido,
Glossário
ou utilizado como forma de pagamento, sem, no entanto, a existência
deságio: depreciação do valor
nominal de um título ou do
de qualquer deságio na sua venda. Por esse conceito, qualquer Ativo
preço de uma mercadoria em que possa ser vendido sem nenhuma dificuldade e sem perda quando
relação ao seu valor de mercado. comparado ao seu valor de compra é considerado de alta liquidez. O
melhor exemplo é o caixa.

Esse conceito é utilizado por uma grande parcela dos analistas de


bancos, de empresas que realizam vendas a prazo e de executivos ao
analisar o desempenho de suas empresas. O entendimento desses
profissionais é de que a empresa tem liquidez quando o seu Ativo de
curto prazo é superior ao seu Passivo de curto prazo, indicando que o
valor do Ativo é suficiente para o pagamento do Passivo.

Se analisarmos detidamente esse conceito, fica claro que ele so-


mente é verdadeiro se a empresa fechar. No curso normal das opera-
ções, se os prazos médios ativos forem superiores aos prazos médios
passivos, a empresa pode se ver diante de uma situação em que os
recursos necessários para fazer frente às obrigações passivas ainda es-
tão imobilizados nos estoques e nas contas a receber, ou seja, embora
1 1
o indicador de liquidez corrente seja superior à unidade , a empresa
O índice de liquidez corrente é não tem os recursos necessários para fazer frente aos compromissos
calculado pela divisão do Ativo correntes. Na realidade a empresa não dispõe de liquidez.
circulante pelo Passivo circulan-
te. Se o resultado for superior Existem situações em que esse indicador é inferior à unidade. Nesse
à unidade, indica que o Ativo
caso, diríamos que a empresa não tem liquidez. Na realidade, isso pode
circulante é superior ao Passivo
circulante e, por esse conceito, a estar ocorrendo, por exemplo, porque a empresa tem prazos para o
empresa tem mais a receber do pagamento de suas obrigações operacionais superiores aos prazos
que a pagar.
médios de estoques e das contas a receber. Se for esse o motivo, a em-
presa, na realidade, estará gerando caixa suficiente para honrar com as
suas obrigações operacionais e com sobras para reinvestimento.

Mas então o que significa liquidez do ponto de vista gerencial? Para


responder a essa pergunta, precisamos lembrar que todo o Passivo da

98 Finanças Corporativas
empresa representa uma dívida com os sócios e os financiadores sem
participação no capital social. Essas dívidas em sua totalidade são in-
vestidas no Ativo, o que nos permite concluir que o Ativo é pertencente
ao Passivo. Em outras palavras:

O Ativo é uma dívida com o Passivo!

Partindo desse conceito, podemos definir liquidez como a capacida-


de da empresa em fazer novas dívidas que permitam:
•• reduzir o custo de capital;
•• aumentar a rentabilidade dos ativos;
2
2
•• reduzir o ciclo operacional ;
Esse conceito é apresentado na
•• aumentar os prazos médios de pagamento. Seção 4.4.

A análise do conceito da liquidez expresso dessa forma tem dois


pré-requisitos. Em primeiro lugar, todas as dívidas existentes no Passi-
vo da empresa têm que ser a vencer e não vencidas. Se a empresa apre-
senta dívidas vencidas, os financiadores, se já não estiverem reduzindo,
certamente começarão a reduzir sua liquidez por meio de créditos cada
vez mais caros e com prazos cada vez menores. Em segundo lugar, é
necessário que a empresa tenha geração de caixa, condição fundamen-
tal para que o gestor possa maximizar o retorno de seus proprietários.

Uma pergunta que surge a partir daí é: como verificar se isso está
acontecendo, ou seja, como podemos saber se a empresa tem liquidez?
A resposta a essa pergunta é alcançada analisando o fluxo de caixa.

O fluxo de caixa é um dos instrumentos mais importantes para a


administração eficaz da relação entre a rentabilidade e a liquidez, re-
fletida nos níveis das disponibilidades financeiras (nos demonstrativos
contábeis gerados por meio das contas caixa, bancos e aplicações de
curto prazo). Trata-se da área considerada como a mais sensível e deli-
cada entre as que fazem parte da chamada área financeira da empresa.

Gestores que possuem bastante experiência no setor financeiro de-


finem o fluxo de caixa em geral como um demonstrativo no qual estão
previstos os recursos que deverão entrar no caixa da empresa e as saí-
das de recursos que deverão ocorrer.

Tal definição, utilizada por esses gestores, tem base em uma ques-
tão importante. Normalmente, eles são pessimistas com relação às
entradas de caixa e otimistas quanto às saídas, ou seja, as entradas

Administração da liquidez 99
sempre têm uma grande possibilidade de não acontecer, ou ocorrer
em valores menores do que o previsto, devido à inadimplência. Já com
relação às saídas, elas sempre acontecerão nos vencimentos previstos
e, em muitos casos, em valores superiores ao que foi planejado. Essa
maneira de entender o fluxo de caixa é uma forma de proteção para a
gestão financeira da empresa.

Os gestores financeiros precisam sempre lembrar que defasagens


entre entradas e saídas do fluxo de caixa indicam a necessidade de
captação de financiamentos para a manutenção da empresa. Se capta-
dos em níveis inadequados de prazos e taxas, podem gerar defasagens
que têm a possibilidade de comprometer, em um primeiro momento,
a liquidez da empresa. Na hipótese de serem mantidos sem as devidas
correções, a ausência de liquidez pode gerar problemas de solvência e
como consequência, levar a organização à falência.

Atividade 1 Com a utilização do fluxo de caixa, o administrador pode fazer uso


de um poderoso instrumento visando à maximização do retorno dos
O que é o fluxo de caixa? Qual é
a sua utilidade fundamental? proprietários, que é seu principal objetivo, sem comprometer a liquidez,
reduzindo, dessa forma, o risco incorrido pelos stakeholders da empresa.

4.2 Demonstração do fluxo financeiro


Vídeo O fluxo financeiro passado de uma empresa também pode ser de-
monstrado por meio do fluxo de caixa. Nesse demonstrativo, todas as
variações ocorridas no caixa da empresa são refletidas, havendo, em
alguns países, uma tendência a utilizá-lo ao invés do Demonstrativo de
Origens e Aplicações de Recursos (DOAR).
3
Do ponto de vista contábil , as formas de apresentação do fluxo
3 financeiro são as mesmas utilizadas nas projeções, denominadas mé-
Ao contrário do ponto de vista todo direto e método indireto. Por meio do método indireto, os recur-
contábil, que se volta para o sos originários das atividades operacionais são demonstrados a partir
passado, ou seja, para os eventos do lucro líquido, ajustado pelos itens constantes do Demonstrativo de
já ocorridos na empresa, ao
conceituarmos fluxo de caixa, Resultados que não afetam o caixa da empresa. Esse método nada
estamos sempre nos remetendo mais é do que o DOAR apresentado com uma formatação um pouco
ao futuro, ou seja, à projeção das
diferente, atentando-se para o fato de que esse demonstrativo difi-
entradas e das saídas de caixa.
culta o perfeito entendimento das transações que efetivamente afe-
taram o caixa.

100 Finanças Corporativas


Já no método direto, são demonstrados os recebimentos e paga-
mentos que foram derivados das atividades operacionais da empresa.
Sendo assim, a diferença entre os dois métodos é baseada na apresen-
tação dos recursos provenientes das operações.

Apresentaremos um modelo básico do fluxo financeiro passado


pelo método indireto. Repare que, por se tratar de um modelo básico,
não pode ser empregado de maneira direta e imediata em qualquer
organização. As contas componentes do modelo devem ser customi-
zadas à realidade da empresa em análise, assim como a formatação
do demonstrativo.
Livro
A necessidade de adaptação do modelo enseja uma grande van-
De maneira didática, o
tagem gerada por esse método na elaboração do fluxo financeiro de livro Princípios de adminis-
uma empresa. Para que possamos adaptá-lo às necessidades da or- tração financeira aprofun-
da vários conceitos muito
ganização, precisamos conhecer, em detalhes, a estrutura financeira importantes sobre a
dela, fato que possibilita, sem qualquer sombra de dúvida, um aumen- gestão da liquidez da em-
presa, utilizando o fluxo
to substancial na qualidade da análise. de caixa como referência
de gestão.
No entanto, é fundamental entendermos que essa metodologia
somente pode ser utilizada para que possamos entender como o flu- GITMAN, L. J.; ZUTTER, C. J. São
Paulo: Pearson Education do Brasil,
xo financeiro passado de uma empresa foi administrado, isto é, como 2010.
foram gerados os recursos financeiros, analisados com base nos de-
monstrativos contábeis e como foram utilizados na realização das apli-
cações efetivadas no período em estudo.
4
Para deixar esse entendimento claro, precisamos compreender cor- Lembrando sempre que todo
retamente os conceitos das origens de recursos e suas respectivas apli- modelo deve ser adaptado ao
plano de contas da empresa e
cações na empresa, obtidos e analisados com base nos demonstrativos
4
suas disponibilidade e necessi-
contábeis para o período em análise. O exemplo da demonstração do dade de informação.
fluxo financeiro pelo método indireto é apresentado a seguir.

Ingresso de recursos
Recebimento de clientes (1)
(–) Pagamento a fornecedores (2)
(–) Pagamento de despesas (3)
(–) Imposto de Renda (4)
= Recursos provenientes das operações
(+) Dividendos recebidos (*)
(+) Resgate de investimentos temporários
(Continua)

Administração da liquidez 101


(+) Venda de investimentos
(+) Venda de imobilizado
(+) Ingresso de novos empréstimos
(+) Integralização de capital
= Total de ingressos de recursos financeiros (A)
Importante Destinação dos recursos
Observe que a subtração entre Integralização de investimentos
os ingressos e a destinação de
(+) Aquisição de imobilizado
recursos é igual à diferença entre
o saldo de caixa demonstrado (+) Aplicações no diferido (**)
no balanço entre dois períodos (+) Pagamento de empréstimos bancários (5)
consecutivos.
(+) Pagamento de despesas financeiras
(+) Pagamento de dividendos (*)
= Total de saídas de recursos (B)
Variação líquida de caixa (A) – (B)

(*) Somente para Sociedades Anônimas.


(**) Esta conta não existe nos demonstrativos contábeis das empresas enquadradas na
Lei n. 11.638/2007.

Na elaboração do fluxo financeiro, obtém-se as informações do mo-


delo apresentado por meio das relações apresentadas a seguir. Os de-
mais valores são retirados diretamente dos demonstrativos contábeis
da empresa.

(1) Saldo inicial de contas a receber


(+) Vendas no período
(–) Saldo final de contas a receber
= Recebimento de clientes

(2) Saldo inicial de fornecedores


(+) Compras no período (*)
(–) Saldo final de fornecedores
(=) Pagamento a fornecedores

(*) Obtido por meio da relação:


Custo da mercadoria vendida = Estoque inicial + Compras – Estoque final.
Logo,
Compras = Custo da mercadoria vendida – Estoque inicial + Estoque final.
5 (3) 5
Despesas do exercício (Retiradas do DRE )
Sigla utilizada para Demonstrati- (–) Saldo inicial de contas a pagar
vo de Resultados do Exercício.
(+) Saldo final de contas a pagar
(Continua)

102 Finanças Corporativas


(+) Saldo inicial de despesas antecipadas
(–) Saldo final de despesas antecipadas
(+) Despesas administrativas
(+) Despesas comerciais
(+) Despesas gerais
(=) Pagamento de despesas

(4) Saldo inicial de Imposto de Renda a pagar


(+) Imposto de Renda do período (DRE)
(–) Saldo final de Imposto de Renda a pagar
= Imposto de Renda pago

(5) Saldo inicial de empréstimos bancários de curto prazo


(+) Despesas financeiras do período
(–) Saldo final de empréstimos bancários de curto prazo
(=) Pagamento de empréstimos bancários

Para ilustrar a utilização do modelo do fluxo financeiro pelo método


indireto, vamos utilizar os dados do Balanço e do DRE de uma empresa,
apresentados a seguir.

Balanço (em R$000)


Ativo Ano 0 Ano 1
Disponível 60 100
Duplicatas a receber líquidas 200 300
Estoques 300 530
Despesas antecipadas 40 70
Total Ativo circulante 600 1.000
Realizável a longo prazo 100 50
Investimentos 300 300
Ativo imobilizado 2.340 4.100
Depreciação acumulada – 100 – 400
Total Ativo permanente 2.540 4.000
Total do Ativo 3.240 5.050

Passivo Ano 0 Ano 1


Empréstimos 120 180
Fornecedores 100 150
Contas a pagar 80 120
Provisão para Imposto de Renda 60 100
Total Passivo circulante 360 550
Empréstimos e financiamentos 1.670 2.590
Total exigível a longo prazo 1.670 2.590
Capital 800 1.200
Lucros acumulados 410 710
Total Patrimônio Líquido 1.210 1.910
Total Passivo 3.240 5.050

Administração da liquidez 103


Demonstrativo de resultados (em R$000)
Contas Ano 1
Vendas 2.430
Custo da mercadoria vendida – 790
Lucro bruto 1.640
Despesas administrativas – 250
Despesas comerciais – 200
Despesas gerais – 100
Depreciações e amortizações – 300
Despesas financeiras – 415
Lucro operacional 375
Provisão para Imposto de Renda – 75
Lucro líquido do exercício 300

Antes de apresentar o modelo do fluxo financeiro, vejamos como


alguns valores componentes do fluxo seriam calculados.
1. Saldo inicial de contas a receber 200
(+) Vendas no período 2.430
(–) Saldo final de contas a receber – 300
(=) Recebimento de Clientes 2.330

2. Saldo inicial de fornecedores 100


6 (+) Compras no período 1.020
6

(–) Saldo final de fornecedores – 150


Cálculo utilizado para chegar
(=) Pagamento a fornecedores 970
a esse valor: CMV – EI + EF =
790 + 530 – 300
3. Despesas do exercício (retiradas do DRE)
(–) Saldo inicial de contas a pagar – 80
(+) Saldo final de contas a pagar 120
(+) Saldo inicial de despesas antecipadas 40
(–) Saldo final de despesas antecipadas – 70
(+) Despesas administrativas 250
(+) Despesas comerciais 200
(+) Despesas gerais 100
(=) Pagamento de despesas 560

4. Saldo inicial de Imposto de Renda a pagar 60


(+) Imposto de Renda do período 75
(–) Saldo final de Imposto de Renda a pagar – 100
= Imposto de Renda pago 35

5. Saldo inicial de empréstimos de curto prazo 120


(+) Despesas financeiras do período 415
(–) Saldo final de empréstimos bancários de curto prazo – 180
(=) Pagamento de empréstimos bancários 355

Com base nessas informações, o fluxo financeiro da empresa apre-


sentaria os seguintes valores:

104 Finanças Corporativas


Ingresso de recursos
Recebimento de clientes (1) 2.330
Pagamento a fornecedores (2) – 970
Pagamento de despesas (3) – 560
Imposto de Renda (4) 35
Recursos provenientes das operações 835
Dividendos recebidos 0
Resgate de investimentos temporários 0
Venda de investimentos 0
Venda de imobilizado 0
Ingresso de novos empréstimos 920
Integralização de capital 400
Total de ingressos de recursos financeiros (A) 2.155
Destinação dos recursos
Integralização de investimentos 0
Aquisição de imobilizado – 1.760
Aplicações no diferido 0
Pagamento de empréstimos bancários (5) 355
Pagamento de dividendos 0
Total de saídas de recursos (B) – 2.115
Variação líquida de caixa (A) – (B) 40

Ao analisarmos o fluxo financeiro da empresa, podemos perceber


que a geração de caixa operacional ocorrida no período, no total de
835 mil reais, e a captação de recursos de longo prazo, obtidos por
meio do aumento de capital (400 mil reais) e do ingresso líquido de
empréstimos de longo prazo (920 mil reais), permitiram à empresa a
aplicação desses recursos na compra de novos imobilizados (1.760 mil
reais) e o pagamento de dívidas bancárias de curto prazo (355 mil reais).

4.3 Fluxo de caixa


Vídeo Existem três etapas necessárias à elaboração do fluxo de caixa:
obtenção das informações, escolha da metodologia e análise dos re-
sultados. Elas seguem uma ordem cronológica, necessária para que o
gestor tenha o fluxo de caixa disponível para o processo de tomada de
decisão. No entanto, é importante que essas etapas sejam definidas
também do ponto de vista da importância de cada uma.

Ao analisarmos esses estágios pelo ângulo de prioridade, entende-


mos que a obtenção das informações é a etapa mais importante. Se os
dados utilizados não tiverem como características qualidade e fidedigni-
dade, todo o processo de elaboração a partir daí estará comprometido.

Administração da liquidez 105


A capacidade de análise do gestor, por sua vez, é a segunda prio-
ridade no processo de elaboração do fluxo de caixa. Em muitas situa-
ções, um superavit de caixa pode ser muito ruim para a empresa. Se
essa sobra de caixa apresentada no demonstrativo tiver como origem,
por exemplo, a falta de investimentos operacionais, um nível de insatis-
fação crescente entre os colaboradores em função dos salários pratica-
dos e das condições de trabalho, gerando consequentemente um clima
organizacional muito ruim, não é um fator favorável à sustentação da
empresa a longo prazo.
Esses comentários são importantes porque, em nossa experiência,
existe uma preocupação muito grande com a escolha da metodologia,
a qual entendemos como menos relevante que as demais. Essa etapa
é a famosa compra do software, que pode ser implantado sem para-
metrização para suportar os dados existentes e, principalmente, sem
o que se deseja obter de informação para efeito de análise e tomada
de decisão. A consequência é o corpo gestor trabalhar com planilhas
eletrônicas com dados normalmente copiados para esses aplicativos,
utilizando essa forma de trabalho como um atalho para obter os dados
de que necessitam para desempenhar suas funções.

Mesmo sabendo que a ordem de elaboração do fluxo de caixa por


importância não é a mesma que a cronológica, vamos seguir essa última
para detalhar cada uma das etapas necessárias a essa elaboração.

4.3.1 Obtenção das informações


Tradicionalmente, ao estudarmos como elaborar um fluxo de caixa,
toda a importância que o assunto merece fica condicionada quase que
exclusivamente à análise do modelo de fluxo a ser utilizado. Outros
pontos relacionados à tecnologia envolvida em sua elaboração, como
o input automático das informações geradas pelas áreas da empresa
no fluxo, principalmente as áreas de contas a pagar, compras, contas a
receber e contabilidade, acabam tendo um peso primordial no estudo
das questões relativas ao fluxo de caixa.

Apesar de serem importantes, não podemos deixar de considerar


que, independente do modelo utilizado pela empresa, do mais sofisti-
cado em termos de elaboração e interligação com as demais áreas ao
mais simples possível, a importância das informações demonstradas
no fluxo de caixa está diretamente ligada à qualidade dos dados rece-
bidos das várias áreas supridoras de dados para a elaboração do fluxo.

106 Finanças Corporativas


Isso significa que se as informações obtidas por meio das várias
áreas da empresa, necessárias à montagem do fluxo de caixa, não fo-
rem previamente analisadas, principalmente considerando a qualidade
e fidedignidade, poderemos estar meramente fazendo um trabalho de
compilação de números e não de elaboração do fluxo de caixa.

Por esse motivo, é fundamental que a informação tenha a sua


qualidade analisada anteriormente ao lançamento, automático ou
não, no fluxo de caixa da empresa, antes de definirmos a forma
7 7
como este será elaborado .
Com a utilização de uma
A sistematização e a análise constantes relacionadas à qualidade planilha eletrônica, por
e, sobretudo, à confiabilidade das informações recebidas podem fazer exemplo, ou de um programa
interligado com as demais áreas
toda a diferença entre a elaboração de um fluxo de caixa que possa ser
da empresa, sempre que uma
utilizado pelos administradores como instrumento para agir de modo mercadoria for adquirida, uma
antecipado ou um mero exercício burocrático sem qualquer valor. provisão de pagamento pode
ser efetuada, ou quando houver
Outro fator importante, relacionado à qualidade e confiabilidade das a recepção física do material, os
informações, diz respeito à definição da quantidade de informações es- dados da nota fiscal podem ser
automaticamente lançados.
senciais para projetar as necessidades futuras de recursos. Toda pro-
jeção está sujeita a riscos por se tratar de um horizonte de tempo não
conhecido. Também é preciso lembrar que a única forma de reduzir o
risco é com informação. No entanto, de nada adianta agregar mais infor-
mação se a quantidade não estiver diretamente vinculada à qualidade.

4.3.2 Escolha da metodologia de elaboração


O fluxo de caixa é considerado um dos principais instrumentos
de análise e avaliação, auxiliando a percepção sobre a movimenta-
ção dos recursos em determinado período. Nele, ficam refletidas
as decisões relacionadas a compra, vendas, investimentos, aportes
de capital pelos sócios, captação ou pagamento de empréstimos e
desinvestimentos, constituindo um fluxo contínuo entre as fontes e
as aplicações de recursos.

Projetar o fluxo de caixa possibilita a avaliação da capacidade de a em-


presa constituir recursos a fim de suprir o aumento das necessidades de
financiamento para o giro de sua atividade (formada pelo nível de ativida-
des), remunerar os proprietários da empresa, pagar impostos e reembol-
sar fundos oriundos de terceiros. Nessa projeção, indicamos não apenas
o valor dos financiamentos que a empresa necessitará para manter suas
atividades, mas também quando será utilizado e a que custo financeiro.

Administração da liquidez 107


A elaboração do fluxo de caixa pode ser realizada considerando
vários períodos. A projeção pode ser realizada dia a dia, mês a mês,
trimestre a trimestre ou, até mesmo, em bases anuais. Normalmen-
te, as empresas projetam, para as decisões operacionais, o fluxo diá-
rio, as táticas considerando trimestres e semestres e as estratégicas
por ano. Para a realização das projeções, como já aprendemos, as
duas metodologias mais importantes e mais utilizadas são o método
direto e o indireto. Essas metodologias de elaboração do fluxo de
caixa são detalhadas a seguir.

4.3.2.1 Método direto


O fluxo de caixa é construído com base nas informações relativas
a todos os pagamentos e recebimentos projetados, assim como os
dados já conhecidos da empresa, como o valor de um aluguel ou
de um recebimento confirmado. Geralmente, nele, as informações
geradas nas diferentes áreas da empresa são detalhadas, em mapas
auxiliares, por tipo de pagamento e respectivo vencimento e, depois,
organizadas por categoria, por exemplo, fornecedores, salários, im-
postos, empréstimos etc., e representadas no fluxo por categoria e
respectivo vencimento.

Mapas auxiliares também são utilizados para projetar o recebi-


mento das vendas a prazo. Neles, devemos encontrar não somente
a previsão de recebimento de cada cliente a vencer no futuro, por
valor e data de pagamento, mas também a previsão de atrasos por
cliente, distribuídos por vencimento e valor, além das previsões de
perdas por cliente, valor e vencimento.

Para representação no fluxo de caixa, podem ser resumidos em


uma única linha com a denominação, por exemplo, de vendas a pra-
zo, os valores a receber relativos às vendas a prazo e os valores das
vendas realizadas a clientes que não efetuaram o pagamento de
seus débitos no vencimento, mas que não são considerados perdas,
sendo projetados para a data em que o gestor acredita que o paga-
mento será feito.

No entanto, é comum empresas que apresentam, no fluxo de cai-


xa, os recebimentos relativos aos valores das vendas a prazo que
ainda vencerão separados daqueles relacionados a valores venci-

108 Finanças Corporativas


dos. As vendas à vista projetadas também podem ser separadas das
vendas a prazo com a finalidade de apresentação.

Independente da formatação e conteúdo, todos os mapas auxi-


liares servirão para o fechamento final do fluxo de caixa. A forma,
consistência, periodicidade e relevância deles dependem do tipo de
empresa e da complexidade operacional.

Apesar de ser a metodologia de elaboração de fluxo de caixa mais


comum, o método direto apresenta uma grande limitação: sua uti-
lização não permite que o administrador observe as variações que
podem estar ocorrendo nos saldos das duplicatas a receber e nos
estoques, cujo acúmulo gradual poderá ser causa de uma redução
nas disponibilidades futuras de caixa.

Se as variações dos saldos das duplicatas a receber e estoques


não estiverem sendo adequadamente financiadas, elas elevarão as
necessidades de capital de giro. Isso resultará em incrementos na
utilização de recursos de fontes onerosas (com custo financeiro),
aumentando as necessidades de novos recursos para realizar paga-
mentos de principal e juros, o que pode reduzir a liquidez e a renta-
bilidade da empresa.

Utilizar fontes de recursos inadequadas ao financiamento das


necessidades de giro, considerando tanto custo quanto prazo, pode
comprometer, de modo irreversível, a estrutura financeira da em-
presa, levando-a a uma situação de iliquidez com possibilidade de 8
evoluir para uma posição de insolvência. A empresa pode optar, por
exemplo, por separar as entradas
Apenas para ilustrar, apresentamos a seguir um exemplo de ela-
e as saídas de caixa em itens
boração de fluxo de caixa pelo método direto. Como todo modelo, ele operacionais e não operacionais,
deve ser adaptado para a realidade da empresa, sua disponibilidade quantificando superavit e deficit
8 operacionais e não operacionais.
de informação e finalidade (operacional, tática ou estratégica) . To-
das essas questões influenciarão o formato utilizado na empresa.

Fluxo de caixa
Itens Dia 1 Dia 2 ...... Dia 30
Saldo inicial
Recebimentos à vista
Recebimentos a prazo
Resgate de aplicações
Recebimento de clientes com atraso
Total de entradas
(Continua)

Administração da liquidez 109


Despesas comerciais
Despesas de marketing
Despesas administrativas
Pagamento de aluguel
Pagamento a fornecedores
Pagamento de impostos
Pagamento de empréstimos
Pagamento de água
Despesas de telefone e internet
Total de saídas
Superavit / <Deficit>
<Aplicação> / Captação
Saldo final

Alguns comentários sobre o modelo:


1. O item “Saldo inicial” representa a soma dos valores obtidos
nos extratos das contas bancárias mantidas pela empresa. No
entanto, o valor constante dos saldos não deve ser utilizado sem
antes realizarmos a conciliação bancária, que consiste em verificar
se todos os recebimentos e pagamentos constam no extrato.
2. A linha “Total de entradas” não deve conter o saldo inicial. Embora
matematicamente não vá alterar a linha “Superavit / <Deficit>”,
é importante para que o gestor, ao comparar o total das
entradas e o total das saídas de cada período, perceba se a
empresa gerou ou destruiu caixa naquele intervalo de tempo.
3. “Superavit / <Deficit>” representa a soma do saldo inicial de cada
período com o total das entradas, menos o das saídas. Esse
valor indica se a projeção para o período é de sobra ou falta de
caixa, indicando, a partir daí, um curso de ação para o gestor.
4. Já “<Aplicação> / Captação” representa o quanto foi aplicado ou
tomado emprestado respectivamente. Sempre que a empresa
gerar superavit de caixa, ela pode aplicar o saldo no mercado
financeiro, indicando uma saída de caixa. O tempo da aplicação
dependerá de quando esses recursos serão necessários, o que
será indicado no próprio fluxo.
Por outro lado, sempre que houver deficit de caixa e a empresa
captar recursos onerosos via financiamentos, deverá registrar
esse valor como uma captação, indicando o pagamento do va-
lor obtido, acrescido dos encargos, nas saídas de caixa no pe-
ríodo em que o fluxo indicar um volume de sobras suficiente

110 Finanças Corporativas


para cobrir esse valor. Isso significa que o gestor financeiro
não deve captar recursos sem antes verificar detalhadamente,
no fluxo de caixa, a projeção de sobras suficientes para efetuar
o pagamento dos recursos captados.

5. O item “Saldo final” a cada período representa a soma da linha


“Superavit / <Deficit>” com a linha “<Aplicação> / Captação”.
O saldo final de um período passa a ser o saldo inicial do
período subsequente. A empresa pode, também, determinar
níveis mínimos para o saldo final de caixa, utilizando as linhas
“<Aplicação> /Captação” para ajustar o valor final desejado.

Agora, a fim de ilustrar a utilização do método direto na elabora-


ção do fluxo de caixa, vamos analisar o exemplo a seguir.

Em processo de expansão, uma sapataria abriu recentemente


sua primeira filial em uma das principais ruas de sua localidade. A
empresa, atualmente, apresenta as seguintes características:
•• Todas as vendas realizadas são feitas por cartão de crédito e
pagas pela administradora no mesmo dia, mas com um des-
conto de 7%.
•• O prazo de pagamento dos fornecedores é de 30 dias.
•• O valor do aluguel das lojas é de R$21.000,00 mensais, pago no
dia 5 do mês subsequente.
•• As despesas administrativas mensais são de R$250.000,00, pa-
gas dentro do mês.
•• Os vendedores recebem uma comissão de venda de 10% sobre
o faturamento, paga no mês subsequente à venda.
•• Os impostos representam 16% e são pagos no mês subsequen-
te ao faturamento.
•• Os dois sócios da empresa fazem uma retirada mensal de
R$20.000,00 cada um, paga no dia 5 do mês subsequente. Glossário
•• Está previsto o pagamento de uma parcela de luvas, referente luvas: pagamento comum no
à negociação do aluguel da loja, no valor de R$80.000,00. O ramo imobiliário como adianta-
mento para garantir a locação.
pagamento ocorrerá no primeiro mês da projeção.

A receita do mês em curso foi de R$950.000,00. As vendas em


pares de sapato projetadas para cada mês do próximo trimestre
são de 20.000, 28.000 e 30.000 enquanto as compras, também em
pares, foram de 10.000 no mês, estando previstas compras adicio-

Administração da liquidez 111


nais de 12.000, 30.000 e 30.000 pares para os próximos três meses.
O preço de compra de cada par de sapato é R$40,00 e o de venda,
R$60,00.

Além dessas projeções, os sócios da empresa definiram em


R$2.000,00 o nível mínimo para o saldo final de caixa a ser mantido.
O saldo final de caixa no fechamento do mês atual foi de R$4.500,00,
valor mantido sem aplicação. No momento, a taxa mensal líquida para
aplicação é de 1% ao mês e o custo efetivo para tomada de emprésti-
mos é de 3% ao mês. Valores captados por meio de empréstimos ou
aplicados no mercado financeiro são pagos ou resgatados em sua tota-
Importante
lidade no mês subsequente.
No regime de competência, as
informações são demonstradas Com base nas informações apresentadas, vamos apresentar o fluxo
no momento em que ocorrem, de caixa da empresa para os próximos três meses, utilizando o método
independente de quando serão direto. Como primeiro passo, vamos construir mapas auxiliares para
recebidas ou pagas. Já no regime
de caixa, as informações são nos ajudar com as informações, levando em consideração que várias
demonstradas somente no mo- delas foram expressas no regime de competência e, portanto, precisa-
mento em que afetam o caixa.
mos, primeiramente, passá-las para o regime de caixa.

O quadro a seguir sistematiza as informações fornecidas, facilitan-


do a compreensão sobre a conversão do regime de competência das
informações para o regime de caixa.

Itens Mês atual Mês 1 Mês 2 Mês 3 Mês 4


Vendas (Qde.) 20.000 28.000 30.000
Preço de venda 60 60 60
Receita do mês 950.000 1.200.000 1.680.000 1.800.000
Pagamento cartão (7%) 66.500 84.000 117.600 126.000
Imposto gerado no mês (16%) 152.000 192.000 268.800 288.000
Pagamento imposto (mês seguinte) 152.000 192.000 268.800 288.000
Comissão de vendas (10%) 95.000 120.000 168.000 180.000
Pagamento comissão de vendas 95.000 120.000 168.000 180.000
Compras (Qde.) 10.000 12.000 30.000 30.000
Preço de compra 40 40 40 40
Compras (R$) 400.00 480.000 1.200.000 1.200.000
Pagamento compras (30 dias) 400.000 480.000 1.200.000 1.200.000

Embora não faça parte do fluxo de caixa, estruturado apenas para


os três primeiros meses, se os valores projetados de fato ocorrerem, já
existem valores de entradas e saídas para o Mês 4. Com base no mapa
auxiliar apresentado, podemos projetar o fluxo de caixa pelo método
direto. A estrutura do fluxo seria conforme representado a seguir.

112 Finanças Corporativas


Itens Mês 1 Mês 2 Mês 3
Saldo inicial 4.500 2.000 2.000
Recebimento de vendas 1.200.000 1.680.000 1.800.000
Pagamento cartão de crédito – 84.000 – 117.600 – 126.000
Resgate de aplicações 0 81.305 546.112
Total de entradas 1.116.000 1.643.705 2.220.112
Pagamento comissão de vendas 95.000 120.000 168.000
Pagamento de impostos 152.000 192.000 268.800
Despesas administrativas 250.000 250.000 250.000
Pagamento de aluguel 21.000 21.000 21.000
Retirada dos sócios 40.000 40.000 40.000
Pagamento de luvas do aluguel 80.000 0 0
Total de saídas 1.038.000 1.103.000 1.947.800
Superavit / <Deficit> 82.500 542.705 274.312
<Aplicação> / Captação 80.500 540.705 272.312
Saldo final 2.000 2.000 2.000

A movimentação das aplicações financeiras também compõe um


mapa auxiliar para controlar as aplicações, os juros e os valores de res-
gate. Um exemplo, sintético e muito simples, desse tipo de controle
para as aplicações é apresentado a seguir.

Itens Mês 1 Mês 2 Mês 3


Juros aplicação (1%) 805 5.407
Valor resgatado 81.305 546.112
Valor aplicado 80.500 540.705 272.312

4.3.2.2 Método indireto


O fluxo de caixa pelo método indireto é amplamente utilizado para
determinação do valor de uma empresa, chamado de valuation, e da
rentabilidade de um projeto. Ao contrário do direto, em que informa-
ções financeiras são projetadas diretamente como entradas e saídas
de caixa, que deverão ocorrer em função dos prazos de recebimento e
pagamento, no indireto, as informações são obtidas por meio da pro-
jeção do Balanço e do DRE. Todas essas informações são econômicas e
ajustadas para financeiras por meio da necessidade de capital de giro.

O modelo de projeção do fluxo de caixa pelo método indireto pode


apresentar pequenas diferenças (SÁ, 2012), dependendo do objetivo da
empresa, embora, em essência, todos os modelos sejam muito pareci-
dos. Apenas para ilustrar, apresentamos a seguir um modelo de fluxo
de caixa utilizando essa metodologia.

Administração da liquidez 113


Contas Período 0 Período 1 Período 2 Período 3 Período 4 Período 5
Vendas
Impostos sobre vendas
Vendas líquidas incrementais
Depreciação do período
Custos fixos incrementais
Custos variáveis incrementais
Despesas financeiras do projeto
Lucro incremental da atividade
Imposto de Renda (34%)
Lucro incremental depois IR
Depreciação do período
Variação NCG (necessidade de capital de giro)
Investimento de capital
Novos financiamentos
Amortização de financiamentos
Venda de ativos
Fluxo de caixa incremental

Algumas características importantes do método indireto são apre-


Importante
sentadas a seguir:
• Período representa o intervalo
de tempo da projeção (mês, 1. Os impostos (Imposto de Renda e Contribuição Social sobre
ano etc.). o Lucro Líquido – CSLL) considerados no cálculo apresentado
• Período 0 representa os eventos correspondem à provisão do Imposto de Renda mais a
que ocorrem no período atual. Contribuição Social que a empresa pagaria.
2. Os impostos calculados não consideram o benefício fiscal das
despesas financeiras, pois ele já está contemplado no cálculo da
taxa de desconto utilizada como parâmetro mínimo de retorno,
chamada de custo de capital ou taxa mínima de atratividade (TMA).
3. As alíquotas do Imposto de Renda e da CSLL somente são
utilizadas para as empresas que trabalham no regime de apuração
pelo lucro real. Para as empresas que não estão enquadradas
nessa modalidade, utiliza-se como partida as vendas líquidas já
descontados os impostos sobre faturamento.
4. A depreciação do Ativo imobilizado é adicionada ao lucro
operacional para se chegar ao fluxo de caixa incremental. Isso
porque o modelo de fluxo de caixa utilizado é o indireto (parte do
lucro da atividade para chegar ao fluxo de caixa) e essa despesa
não representa desembolso de caixa.
5. Para a projeção da variação da necessidade de capital de giro,
precisamos projetar cada uma das contas cíclicas ou operacionais

114 Finanças Corporativas


do Ativo e do Passivo, especialmente estoques, duplicatas a receber,
fornecedores e obrigações fiscais. Para isso, comumente estimamos
prazos médios de estocagem (PME), prazos médios de recebimento
de vendas (PMR), prazos de pagamentos a fornecedores (PMP) e
9
9
prazos médios de recolhimento das obrigações fiscais (PMOF) .
Esses indicadores estão detalha-
6. Os investimentos de capital correspondem aos gastos com novas dos na etapa de análise do fluxo
imobilizações (investimentos estratégicos e de manutenção) para de caixa.
a geração de caixa no futuro.
Para melhor entendermos a utilização dessa metodologia, vamos
utilizar o exemplo a seguir.

Vamos supor um projeto com investimento inicial de R$18 milhões,


sendo R$2 milhões na compra de terreno, R$6 milhões na construção
de edifícios, R$ 7milhões na compra de máquinas e equipamentos,
e R$3 milhões em capital de giro inicial. As vendas projetadas são de
R$40 milhões para o primeiro ano e R$50 milhões para os demais anos.

Os impostos sobre vendas correspondem a 20% das vendas brutas e


os custos se dividem em fixos desembolsáveis (mão de obra e manuten-
ção), que correspondem a R$5 milhões por ano, e variáveis (matéria-pri-
ma), representando 25% das vendas brutas.

No final de cada ano, a necessidade de capital de giro corresponde a


10% das vendas brutas. A vida útil contábil das edificações é de 25 anos
e dos equipamentos é de 10 anos.

Com base nas informações fornecidas e sabendo que a alíquota do


Imposto de Renda e CSLL da empresa é de 34%, vamos elaborar o flu- Atividade 2
xo de caixa incremental do projeto referente aos cinco primeiros anos. Qual é o melhor método de
elaboração do fluxo de caixa?
O fluxo de caixa do projeto pelo método indireto apresentaria a se-
guinte estrutura.

Contas Período 0 Período 1 Período 2 Período 3 Período 4 Período 5


Vendas 40.000 50.000 50.000 50.000 50.000
– Impostos sobre vendas – 8.000 – 10.000 – 10.000 – 10.000 – 10.000
= Vendas líquidas incrementais 32.000 40.000 40.000 40.000 40.000
– Depreciação do período - 940 - 940 – 940 – 940 – 940
– Custos fixos incrementais – 5.000 – 5.000 – 5.000 – 5.000 – 5.000
– Custos variáveis incrementais –10.000 – 12.500 – 12.500 – 12.500 – 12.500
– Despesas financeiras do projeto 0 0 0 0 0
= Lucro incremental da atividade 16.060 21.560 21.560 21.560 21.560
– Imposto de renda (34%) – 5.540 – 7.330 – 7.330 – 7.330 – 7.330
= Lucro incremental depois IR 10.600 14.230 14.230 14.230 14.230
(Continua)

Administração da liquidez 115


Contas Período 0 Período 1 Período 2 Período 3 Período 4 Período 5
+ Depreciação do período 940 940 940 940 940
- Variação N.C.G. – 3.000 – 1.000 – 1.000 0 0 5.000
- Investimento de capital – 15.000 0 0 0 0 0
+ Novos financiamentos 0 0 0 0 0
- Amortização de financiamentos 0 0 0 0 0
+ Venda de Ativos 0 0 0 0 0
= Fluxo de caixa incremental – 18.000 10.540 14.170 15.170 15.170 20.170

Uma vez feita a análise da qualidade das informações geradas pelas


Importante várias áreas da empresa, passo fundamental para a confiabilidade dos
A análise do fluxo de caixa da dados contidos no fluxo de caixa, e com o fluxo elaborado fundamen-
empresa demonstra que o cres-
tado na utilização de uma das metodologias de projeção apresentadas,
cimento do caixa nem sempre é
feito da maneira apropriada. É podemos iniciar uma das etapas mais importantes no processo de ela-
preciso sempre fazer essa análise boração do fluxo de caixa: a análise dos resultados obtidos.
para verificar os motivos de seu
aumento ou decréscimo. É com
base nela que podemos concluir
se essa variação foi ou não
4.3.3 Análise dos resultados
obtida de modo adequado. Nessa fase, o que estudamos até aqui sobre as relações de causa e
efeito da estrutura financeira da empresa é de fundamental importân-
cia. Isso significa que o gestor financeiro precisa ter o conhecimento
necessário para responder a duas questões básicas. Elas são geradas
por situações que podem ocorrer como resultado do processo de ela-
boração do fluxo e pela análise dos números. Essas perguntas são:
1. Quando o fluxo de caixa apresentar uma situação de superávit
de caixa:
Por que só isso?
2. Quando o fluxo de caixa apresentar déficits de caixa:
Por que tudo isso? (PEREIRA, 2013, p. 31, grifos do original)

Ao procurar respostas para essas questões, o gestor perceberá que


uma empresa pode apresentar saldo negativo no fluxo de caixa em um
determinado momento, apesar de manter saldo positivo na geração
operacional de caixa (entradas menos saídas de caixa originadas pela
atividade fim da empresa). Esse fato pode ser causado, por exemplo,
pelo pagamento de despesa não prevista. O mesmo pode acontecer
quando a empresa está em processo de expansão de sua unidade fa-
bril. Se os efeitos dessa expansão não forem refletidos adequadamen-
te no fluxo de caixa, poderemos chegar a conclusões completamente
equivocadas com relação ao seu nível de liquidez.

116 Finanças Corporativas


Por meio desses exemplos, podemos perceber a importância de co-
nhecermos profundamente a origem das fontes e aplicações de recursos.
Assim, saberemos se as relações entre elas estão adequadas, consideran-
do a conformidade entre os prazos ativos e passivos bem como de custo
entre as fontes passivas e rentabilidade das aplicações ativas.

Sabemos que todos os recursos utilizados por uma empresa em


seus Ativos (financeiramente definidos como as aplicações de recur-
sos) têm sua origem nos Passivos (representados, sob o ponto de vista
financeiro, como as fontes de recursos), compostos de fundos perten-
centes a seus proprietários e a terceiros.

O significado disso é que o total das aplicações de recursos, incluin-


do o caixa, também contabilizado no Ativo, pertence aos titulares das
fontes de recursos, que é composto de fundos pertencentes aos pro-
prietários e a terceiros. É preciso saber também que, salvo em situa-
ções pontuais, a rentabilidade líquida de impostos e comissões obtida
nas aplicações financeiras, item pertencente ao grupo das disponibili-
dades financeiras da empresa, não é superior ao custo dos recursos
provenientes das fontes dos sócios e dos terceiros, custo que é conhe-
cido como custo de capital ou custo médio ponderado de capital.

Esses dois conceitos básicos – o entendimento do caixa como uma


dívida para com as fontes de recursos passivos e da rentabilidade líqui-
da obtida com sua aplicação como inferior ao custo das fontes passivas
(custo de capital) – são fundamentais para determinarmos em quais
situações a empresa deve ou não manter elevados os saldos de caixa.

Claro que, da perspectiva da maximização de resultados, uma em-


presa deveria, idealmente, manter um saldo de caixa nulo, buscando
financiamento junto a fontes de recursos toda vez que precisasse efe-
tuar pagamentos, devolvendo juntamente com sua respectiva remune-
ração, sempre que dele não mais necessitasse.

Para que possamos entender por que então isso não ocorre, busca-
mos, na literatura econômica, os três motivos básicos que justificam a
manutenção de recursos financeiros disponíveis (CARVALHO et al., 2015):
1. Transação

Toda empresa precisa manter um determinado volume de reservas


monetárias para fazer frente a seus compromissos, sem buscar novos
recursos no mercado, visando preservar a percepção do mercado com
relação à sua liquidez.

Administração da liquidez 117


2. Precaução

A ocorrência de desembolsos não previstos e inesperados aumen-


ta o risco de comprometimento da liquidez, obrigando as empresas a
manterem um volume de recursos disponíveis além do necessário.
3. Especulação

A existência de oportunidades financeiras pontuais e de crescimento


de suas atividades no mercado obriga as empresas a manterem um vo-
lume de recursos disponíveis além do que seria estritamente necessário.

A manutenção de saldos positivos de caixa, gerados devido a es-


ses três motivos econômicos, faz com que as empresas se obriguem a
desenvolver políticas para aumentar a rentabilidade dos recursos dos
proprietários, ao mesmo tempo em que procuram manter determi-
nado nível de liquidez como parte de sua estratégia global, podendo,
assim, sobreviver ao mesmo tempo em que se mantêm competitivas.

Não podemos esquecer que quanto maior o saldo de caixa mantido


pela empresa, maior será o nível de liquidez imediato e menor o grau
de rentabilidade apresentado, sendo a recíproca também verdadeira,
ou seja, quanto menor o nível do caixa, menor a liquidez imediata e
maior a rentabilidade, uma vez que esses recursos estão aplicados na
atividade operacional da empresa. É importante destacar que essa re-
gra pode não prevalecer em situações muito particulares.

De qualquer modo, além de ser função das entradas e saídas de


recursos resultantes da atividade da empresa, o nível final do caixa leva
em consideração o perfil de risco dos gestores. Empresas com políticas
operacionais conservadoras tendem a manter um nível de caixa maior
do que as operacionalmente mais agressivas.

Outro aspecto muito importante relacionado ao nível de liquidez é o


grau de relacionamento bancário estabelecido pela organização. A depen-
der da qualidade dessa relação, será possível viabilizar, em condições mui-
to competitivas, a captação de recursos para enfrentar as necessidades de
desembolsos, a aplicação das sobras de recursos gerados pela diferença
entre as entradas e saídas de caixa, e a utilização de serviços proporciona-
dos pelas instituições financeiras, como a atividade de cobrança.

Além da qualidade de seus ativos, da sua administração, do seu de-


sempenho (tanto individual como do setor em que atua), do nível de
endividamento de recursos de terceiros em comparação com a utiliza-

118 Finanças Corporativas


ção de recursos próprios, e do histórico de resultados obtidos e de re-
lacionamento – todos aspectos que serão analisados pelas instituições
financeiras –, é preciso que a empresa defina qual tipo de necessida-
de (recursos e serviços) pretende suprir e as instituições existentes no
mercado que podem atendê-la.

Apesar de diferentes em alguns aspectos, a definição das instituições


com que a empresa irá operar é muito semelhante ao estabelecimento de
uma política de vendas a crédito. Mesmo havendo possibilidade de variar
de empresa para empresa, alguns aspectos gerais (descritos a seguir) de-
vem ser priorizados na definição da política de relacionamento bancário.

Agilidade e criatividade no processo decisório

Com a globalização dos mercados, a velocidade passou a ser um


fator de fundamental importância. Soluções burocráticas e lentas,
da parte de uma instituição financeira, podem trazer sérios proble-
mas ao atendimento das necessidades de recursos da empresa.

Existência de sistemas de informações eficazes

A velocidade na obtenção de informações por meio de siste-


mas computadorizados aumenta muito a qualidade das decisões
financeiras, além de agilizar o processo decisório.

Disponibilidade de serviços

Instituições com leque diversificado de serviços facilitam a con-


centração de atividades, aumentando o grau de reciprocidade ban-
cária gerado pela concentração de serviços em uma única instituição.

Existência de parcerias no exterior

Instituições financeiras multinacionais ou nacionais com par-


cerias no exterior têm a possibilidade de captação de recursos a
custos mais competitivos, podendo, por extensão, também em-
prestar a custos mais baixos. Além disso, podem oferecer uma
gama de serviços mais diversificada e a custos menores.

Definidas, então, as políticas operacionais da empresa e, por exten-


são, se os saldos de caixa tenderão a ser mantidos em níveis altos ou
baixos, precisamos entender o chamado “miolo” do fluxo, ou seja, os fa-
tores que tornam possível a ocorrência de acréscimos ou decréscimos
no saldo final.

Administração da liquidez 119


Para entendermos as causas dos aumentos e reduções dos saldos
finais do caixa, a compreensão de alguns conceitos básicos é de funda-
mental importância. O primeiro deles está relacionado aos indicadores
de desempenho da empresa calculados com base nos demonstrativos
contábeis. Essas medidas de desempenho representam, tanto para os
gestores quanto para o chamado público externo (fornecedores, cre-
dores, bancos) e interno (gestores e proprietários), o ponto de partida
para a análise operacional e financeira da empresa. Existem, basica-
mente, as duas formas a seguir de analisarmos indicadores financeiros.

1. Análise comparativa

Comparação entre diversos tipos de índices de diferentes em-


presas no mesmo intervalo de tempo. O objetivo da análise com-
parativa é verificar o posicionamento econômico-financeiro da
empresa analisada relativamente às demais empresas utilizadas
na análise.

2. Análise temporal

Compreende a análise de diferentes tipos de índices de uma


mesma empresa ao longo do tempo, buscando quantificar, com
base nesses indicadores, a evolução ou involução da empresa em
questão, no intervalo de tempo considerado.

10 Para analisarmos o fluxo de caixa, existem vários tipos de índices,


todos com um grau de importância relativa ao objetivo da análise. Den-
Ativos e passivos cíclicos
são gerados pela atividade tre os padrões de mensuração existentes, vamos analisar a seguir os
contínua da empresa, ou seja, que medem o grau de eficiência da empresa em administrar seus ati-
enquanto a empresa estiver em 10
vos e passivos cíclicos .
funcionamento, eles existirão.
Como exemplo de ativo cíclico, Giro do estoque
podemos citar os estoques e as
conta a receber, enquanto, no O índice de giro ou rotação do estoque mede o número de vezes em
passivo cíclico, fornecedores e que os estoques completam o ciclo entre produção/fabricação e venda.
obrigações sociais e fiscais.
A forma de cálculo do índice é a seguinte:

Custo da mercadoria vendida


Giro do estoque =
Estoque

Por meio do índice de rotação do estoque, podemos quantificar o


prazo de duração desse ciclo. Esse índice, conhecido como período mé-
dio de estoques, é calculado da seguinte forma:

120 Finanças Corporativas


360
11
Período médio de estoques (PME) = 11
Giro
Embora a literatura técnica
sempre indique o número 360
Giro das contas a receber
no numerador das fórmulas de
A rotação ou giro das contas a receber revela o número de vezes prazo médio, mesma terminolo-
gia que utilizamos, esse número
em que as vendas se transformaram em duplicatas a receber e, a se- somente deve ser utilizado
guir, em disponibilidade. A relação básica para o cálculo desse índice quando os dados que estivermos
é a seguinte: utilizando forem anuais. Quando
forem semestrais, utilizamos
Vendas 180, trimestrais, 90, mensais, 30,
Giro das contas a receber = e assim sucessivamente.
Duplicatas a receber

Com base no giro das contas a receber, podemos calcular o prazo


médio de recebimento, medido em número de dias ou meses, em que
as vendas a prazo são recebidas:

360
Período médio de recebimento (PMR) =
Giro

O período médio de recebimento só faz sentido quando comparado


12
com o prazo médio de vendas (PMV) . Sempre que o PMR for maior do 12
que o PMV, significa que existe inadimplência. O prazo médio de vendas repre-
senta o tempo médio concedido
Giro das contas a pagar para os clientes efetuarem os
pagamentos pelas compras a
O índice de rotação, ou giro das contas a pagar, reflete o número de
prazo.
vezes em que as compras se transformaram em duplicatas a pagar. A
relação para o cálculo desse índice é obtida da seguinte forma:

Compras
Giro das contas a pagar =
Duplicatas a pagar

Por meio do índice de rotação, podemos determinar o prazo médio


de pagamento, expresso em dias ou meses, que a empresa leva para
pagar seus compromissos com os fornecedores. A relação básica para
esse índice é a seguinte:

360
Período médio de pagamento (PMP) =
Giro

Da mesma forma que o período médio de recebimento, esse resul-


tado só faz sentido quando comparado com o prazo médio de compra
(PMC). Toda vez que o PMP for maior do que o PMC significa que exis-
tem atrasos nos pagamentos aos fornecedores da empresa.

Administração da liquidez 121


Giro das obrigações sociais e fiscais

O índice de rotação ou giro das obrigações fiscais reflete o número


de vezes em que as vendas e os salários geraram impostos e obriga-
ções sociais a pagar. A relação para o cálculo desse índice é obtida da
seguinte forma:
Impostos s/faturamento + Impostos s/folha
Giro das obrigações =
Impostos e obrigações sociais a pagar

Podemos, com base no giro, determinar o prazo médio de paga-


mento das obrigações sociais e fiscais, expresso em dias ou meses. A
relação básica para esse índice é a seguinte:

360
Período médio das obrigações (PMO) =
Giro

Para utilizar o resultado dessa fórmula, precisamos comparar o re-


sultado obtido com o prazo médio de pagamento de impostos e contri-
buições sociais. Esse prazo médio deve ser calculado utilizando a média
ponderada dos prazos de pagamento de impostos e contribuições so-
ciais, prazo este concedido pelos governos federal, estadual e municipal.

Giro do ativo fixo

O índice de rotação ou giro do ativo fixo mede o número de vezes


em que os ativos fixos da empresa (máquinas e equipamentos) gera-
ram vendas. Quanto maior esse índice, melhor para a empresa. A rela-
ção básica de cálculo é a seguinte:

Vendas
Giro do ativo fixo =
Ativo fixo

Da mesma forma que os demais índices de rotação ou giro, pode-


mos transformar essa relação em número de dias ou meses. No caso
específico desse índice, o prazo calculado refletirá o ciclo de produção
da empresa. Podemos calcular essa relação da seguinte forma:

360
Período médio de produção =
Giro
Giro do ativo total

O índice de giro ou rotação do ativo total mede o número de vezes


em que os ativos totais da empresa geraram vendas. A relação básica
de cálculo é a seguinte:

122 Finanças Corporativas


Vendas
Giro do ativo total =
Ativo total

Com base nessa relação, é possível determinar o número de dias ou


meses que os ativos da empresa levam para gerar vendas. Nesse caso,
o prazo obtido representará o ciclo operacional total da empresa. A
relação de cálculo é a seguinte:
360
Ciclo operacional total =
Giro
Vimos, assim, vários índices, cada um deles com sua importância
para analisarmos o fluxo de caixa, e analisamos índices utilizados para
medir o grau de eficiência da empresa em administrar seus Ativos e
Passivos cíclicos. Veremos em seguida a combinação e o efeito desses
prazos reunidos em um conceito chamado de ciclos da empresa.

4.4 Ciclos da empresa


Vídeo Além dos indicadores demonstrados, que permitem analisar os re-
sultados observados no fluxo de caixa, conceitos adicionais extrema-
mente importantes para nos ajudar a evitar que uma empresa tenha
problemas de liquidez são os ciclos da empresa. Esses ciclos refletem
as diferenças temporais existentes na operação da empresa e são re-
presentados da seguinte forma (GITMAN; ZUTTER, 2010):

Compra Recebimento da
matéria-prima (*) venda

Ciclo operacional
Período médio de estoques
Período médio de recebimento

Venda
Período médio
de pagamento (faturamento)

Pagamento de
Ciclo de caixa ou financeiro 13
duplicadas
É importante lembrar que todo
segmento tem produção, mas
Ciclo econômico não necessariamente fabricação,
ou seja, do ponto de vista geren-
Ciclo de cial, produção e fabricação não
produção são necessariamente sinônimos.
13
(*) Início do processo de produção .

Administração da liquidez 123


Conceito fundamental com relação aos ciclos da empresa é o ci-
clo de caixa, ou ciclo financeiro, definido como a diferença temporal
entre a operação da empresa (ciclo operacional) e o prazo médio de
pagamento. Outra forma de definirmos o ciclo de caixa é por meio
do conceito do giro. Por esse modo, esse ciclo é definido como o
tempo necessário para que a rotação do Ativo cíclico possa fazer
frente aos pagamentos relativos ao Passivo cíclico, nas respectivas
datas de pagamento.
Como cada empresa tem uma relação de rotação de pagamentos,
de estoques e de recebimentos distinta, o nível de recursos necessários
para o financiamento do giro da operação também será diferente. De
modo geral, o nível suficiente de capital de giro depende diretamente
14 do grau de liquidez dos Ativos operacionais da empresa (principalmen-
Inclui pagamento de fornecedo- te as duplicatas a receber e os estoques). Em resumo, podemos definir
res, salários, encargos sociais e
o ciclo de caixa conforme a seguir:
impostos.

Ciclo de caixa = Ciclo operacional – Data de pagamento da compra


14

Importante
1. Prazo médio de estoques, ciclo
Repare que, ao determinar o ciclo de caixa, implicitamente estamos
econômico e ciclo de produção verificando também os prazos médios de estoques, de pagamento de
têm o mesmo significado e duplicatas e demais encargos operacionais, e de recebimento de ven-
definição.
das a prazo, daí a importância desse conceito.
2. Se, ao calcularmos o
ciclo de caixa ou financeiro, Para tornar claro esse conceito, imaginemos que o gestor financei-
encontrarmos um resultado ro levantou as informações a seguir, com o objetivo de aprofundar a
positivo, isso significa que a
empresa paga suas obrigações análise do fluxo de caixa da empresa. Essas informações foram obtidas
operacionais primeiro e só utilizando as fórmulas demonstradas.
depois recebe o produto de suas
vendas. Se ocorrer o contrário, •• Prazo médio de estoques (PME) = 30 dias
ou seja, o resultado do ciclo de •• Prazo médio de recebimento (PMR) = 40 dias
caixa for negativo, significa que a
empresa recebe antes de efetuar
•• Prazo médio de pagamento (PMP) = 45 dias
o pagamento de suas obrigações
Partindo dessas informações, podemos calcular:
operacionais.
3. Sempre que o ciclo de caixa •• Ciclo operacional = PME + PMR = 30 + 40 = 70 dias (1)
ou financeiro for positivo, os •• Ciclo de caixa = PME + PMR – PMP = 30 + 40 – 45 = 25 dias (2)
gestores precisam tomar medi-
das corretivas imediatamente, (1) Esse valor indica que a operação da empresa (sua atividade fim) demora 70 dias, isto é, a
para evitar o risco de falência da operação precisa ser financiada por esse prazo.
empresa. Isso só não ocorrerá se (2) O resultado obtido para o ciclo de caixa ou financeiro indica que a empresa paga suas
a margem de lucro do negócio obrigações operacionais (fornecedores, salários, encargos sociais e impostos) e somente recebe o
for muito alta e os proprietários produto de suas vendas 25 dias depois.
reinvestirem automaticamente Uma questão importante ao analisarmos o ciclo de caixa de uma
esse valor.
organização é que os conceitos de ciclo de produção, ciclo econômico

124 Finanças Corporativas


ou prazo médio de estoques podem ser adaptados para qualquer tipo
de empresa, mesmo aquelas que não têm atividade fabril. Por ciclo de
produção, ciclo econômico ou prazo médio de estoques, podemos con-
ceituar o tempo necessário para:
a. Indústria Atividade 3

Tempo que decorre desde a produção física de um produto, come- Qual seria o ciclo de caixa ou
financeiro ideal: positivo ou
çando com a compra da matéria-prima, sua transformação em pro- negativo?
duto acabado, até a posterior venda (emissão da nota fiscal de venda)
no mercado.
b. Comércio
Livro
Tempo decorrido entre a compra de um produto e estocagem até
O livro Análise financeira
sua posterior revenda no mercado (emissão da nota fiscal de venda). das empresas apresenta,
de modo detalhado e
c. Empresas de prestação de serviço
bastante aprofundado,
conceitos extremamen-
Tempo que decorre desde o momento em que um ou mais colabo- te importantes para o
radores são alocados para realizar um serviço até o momento em que o gestor financeiro, princi-
palmente aqueles rela-
serviço está pronto ou já foi entregue (realizado) e, consequentemente, cionados aos efeitos de
a empresa emite a nota fiscal de prestação de serviço. suas decisões no capital
de giro e o consequente
Partindo do ciclo de caixa, podemos calcular também um indica- efeito no fluxo de caixa.

dor importante derivado dele: o giro do caixa. Ele representa o nú- SILVA, J. P. São Paulo: Atlas, 2016.
mero de vezes em que o caixa girou no período em análise, utilizando
a mesma conceituação teórica do giro do estoque, das contas a re-
ceber, das contas a pagar e das obrigações sociais e fiscais. Definido
com base no conceito do ciclo de caixa, o giro de caixa é representado
pela seguinte relação:

Período em análise
15
15
Giro do caixa =
Ciclo de caixa Quando os dados utilizados
forem anuais, utilizamos 360,
Quanto maior for o giro do caixa, menor será a necessidade de caixa semestrais, 180, trimestrais,
90, mensais, 30, e assim
para suportar as operações. Do mesmo modo que ocorre com o giro
sucessivamente.
do estoque, o giro do caixa deve ser maximizado, no entanto, sem in-
correr no risco da falta de recursos. Embora precisem ser customizadas
para cada empresa, há algumas formas de maximizar o giro do caixa,
minimizando as necessidades de recursos. Essas alternativas são:
1. Aumentar o giro do estoque por meio de:

a. aumento do giro das matérias-primas;

Administração da liquidez 125


b. diminuição do ciclo de produção;
c. aumento do giro de produtos acabados.

2. Acelerar o processo de recebimento, revisando sistematicamente


os processos de concessão de crédito e atuando fortemente na
cobrança.
3. Reduzir o prazo concedido nas vendas a prazo sempre que
possível, utilizando ferramentas de marketing que permitam
expressar os diferenciais existentes no produto e/ou serviço
oferecido ao mercado.
4. Negociar prazos de pagamento cada vez maiores com seus
fornecedores. Repare que aqui estamos falando em comprar
com mais prazo e não comprar em maiores quantidades. Essa
última alternativa reduz o giro dos estoques, indo na direção
contrária ao desejado para aumentar o giro do caixa.

Além do cálculo de indicadores e dos ciclos da empresa, o gestor fi-


nanceiro precisa ficar muito atento a alguns fatores internos e externos
que afetam o fluxo de caixa, procurando agir de maneira antecipada a
eles. Dentre os fatores internos mais importantes, destacamos:

Expansão descontrolada das vendas

Quando as vendas crescem aceleradamente e sem controle, a em-


presa também deixa de fazer os ajustes necessários relacionados a
prazo e a custos na captação dos recursos necessários ao financiamen-
to dos estoques e das contas a receber, trazendo mudanças normal-
mente desfavoráveis no ciclo de caixa ou financeiro.

Aumento no prazo de vendas concedido pela empresa

Em muitas situações, para aumentar seu market share, enfrentar


concorrentes em seu mercado de atuação, aumentar seu grau de com-
petitividade ou mesmo quando são obrigadas pelo mercado, as empre-
sas aumentam o prazo concedido nas vendas a prazo. Esse incremento
no prazo vai aumentar o prazo médio de recebimento, impactando di-
retamente o ciclo de caixa ou financeiro na direção errada.

Utilização excessiva de capitais onerosos

Capital de terceiros é fundamental para o crescimento das empre-


sas. O problema ocorre quando os custos e o prazo não são compatíveis
com os prazos e a rentabilidade das aplicações no Ativo. A consequên-

126 Finanças Corporativas


cia desse desbalanceamento é o aumento do risco, do custo de capital
e, por extensão, a redução do valor da empresa.

Compras em volume incompatíveis com as projeções de vendas

Mesmo sabendo que é uma atividade extremamente complexa, o


gestor deve buscar, diuturnamente, formas de manter os estoques no
menor nível possível de acordo com o mercado de atuação da empre-
sa, utilizando as compras de produtos prontos e/ou matérias-primas
para essa finalidade. Quando isso não ocorre, a consequência é o au-
mento do prazo médio do estoque e do ciclo de caixa ou financeiro.

Diferenças acentuadas no giro das contas a pagar e a receber


Curiosidade
Sempre que os prazos de pagamento são inferiores aos de recebi- Existe um dito popular que diz:
mento e aos estoques, certamente a empresa vai enfrentar períodos de “venda à vista e pague a perder
iliquidez. Quando esses períodos viram uma constante, bancos e forne- de vista”.

cedores começam a reduzir e, no limite, a cortar suas linhas de crédito.


Isso só não ocorre quando a margem de lucro da empresa for elevada.
No entanto, o gestor não pode esquecer que margens elevadas atraem
concorrentes, principalmente se não houver barreiras de entrada.

Ciclos de produção incompatíveis com o prazo médio de


pagamento

O ciclo de produção, ou ciclo econômico, ou prazo médio de esto-


ques, reflete o prazo que vai do início do processo de produção até o
faturamento. Se antes de faturar, a empresa já está fazendo pagamen-
tos, certamente sua liquidez será impactada, exceto quando sua mar-
gem for elevada. Nesse caso, valem os comentários anteriores.

Giro do estoque lento

Em qualquer segmento de atuação, o estoque precisa girar o mais


rapidamente possível. Quando isso não ocorre, além do aumento no
prazo médio de estoques, a empresa pode ter de manter produtos ob-
soletos ou de difícil venda, imobilizando recursos da empresa no es-
toque. Se os prazos e custos dos recursos captados no Passivo para o
financiamento dos estoques não forem compatíveis com os prazos e a
rentabilidade do estoque, a empresa pode ir à falência.

Baixa ocupação do Ativo fixo

Isso significa capacidade ociosa, ou seja, custos que são gerados sem
a contrapartida de receitas, resultando em margens negativas, em au-

Administração da liquidez 127


mento do ciclo operacional, do risco operacional, do risco financeiro e do
custo de capital, e, como consequência, na redução do valor da empresa.

Distribuição de lucros em volumes incompatíveis com a capaci-


dade de geração de caixa

Sabemos que lucro não é, necessariamente, igual a recursos dispo-


níveis no caixa. Sempre que o gestor esquece essa máxima e distribui
lucros sem olhar as disponibilidades demonstradas no fluxo de caixa
no momento previsto para o pagamento da distribuição, pode colocar
a empresa em uma situação de dificuldade financeira.

Custos financeiros elevados

Podemos dizer que o tamanho da dívida não é problema, mas sim


a qualidade da dívida, a qual é expressa pelo prazo de pagamento e o
custo de captação. Isso significa que custos financeiros elevados são
consequência do risco operacional percebido pelos financiadores e aí
é que está o verdadeiro problema, devendo ser o foco de atuação do
gestor financeiro. Normalmente, custos financeiros elevados traduzem
prazos médios ativos superiores aos prazos médios passivos.

Aumento do nível de inadimplência

Esse é um problema muito sério enfrentado pela maioria das em-


presas. Isso ocorre porque, se a empresa não recebe, terá dificuldades
em manter seu fluxo de pagamento em situação de normalidade. Ge-
ralmente, o remédio para isso é a contratação de mais colaboradores
para o setor de cobrança, quando, na realidade, na maioria dos casos,
o problema está no processo de concessão de crédito. O aumento da
inadimplência, de fato, é uma consequência da aprovação de créditos
que não deveria ter ocorrido. Por esse motivo, a empresa deve focar na
constante revisão dos processos de concessão de crédito, para depois,
se for necessário, aumentar o efetivo da cobrança.

Entendidos alguns dos fatores internos que afetam a gestão do cai-


16 xa da empresa, vamos analisar a seguir alguns fatores externos que
também trazem efeitos significativos sobre o fluxo de caixa.
Representam os custos operacio-
nais e financeiros que a empresa Redução nas vendas causada por retração do mercado
precisa desembolsar, indepen-
dente da quantidade produzida Como todas as empresas têm custos operacionais e financeiros
ou vendida de seu produto e/ou 16
fixos , toda retração de vendas pode trazer problemas financeiros
serviço no período.
para a empresa, causados pela redução na geração de caixa.

128 Finanças Corporativas


Aumento da concorrência em decorrência da entrada de novos
concorrentes no mercado

Exceto em situações de cartel, normalmente, a entrada de novos Glossário


concorrentes gera pressão sobre o preço e o prazo dos produtos para cartel: acordo comercial,
os participantes do mercado. Se esses efeitos significarem redução de explícito ou implícito, entre em-
presas concorrentes, visando à
preço e/ou aumento de prazo, o efeito sobre a geração de caixa é ime- distribuição entre elas das cotas
diato, podendo trazer sérios problemas financeiros para a empresa. de produção e do mercado, com
a finalidade de determinar os
Aumento geral do nível de inadimplência causado por fatores preços e limitar a concorrência.
como o aumento das taxas de juros

Sempre que a inadimplência no mercado aumenta, é só uma


questão de tempo para gerar impacto na organização também. Isso
ocorre porque uma empresa é sempre cliente de outra, que é cliente
de outra e assim sucessivamente. Se, na ponta, alguém não paga, é
só uma questão de tempo para chegar até a nossa empresa. Como
consequência direta, o prazo médio de recebimento aumenta, impac-
tando diretamente para o lado errado, o ciclo de caixa ou financeiro.
Por esse motivo, é muito importante que o gestor financeiro esteja
sempre acompanhando os níveis de inadimplência do mercado de
atuação da empresa.

O cadastro dos clientes e suas informações é outra fonte muito im-


portante para o gestor analisar o fluxo de caixa. Analisando essas infor-
mações, o gestor pode antecipar situações de desequilíbrio financeiro.
Isso pode ser feito das três formas a seguir:
1. Pelo número de passagens, que indica quantas empresas estão
pesquisando informações de cadastro em dado momento. Se esse
número cresce subitamente, pode significar que os fornecedores
estão reduzindo ou, até mesmo, cortando suas linhas de crédito
obrigando a empresa a buscar novas fontes de fornecimento.
2. Quando a empresa, sistematicamente, abre novas linhas de crédito
bancário. Isso pode significar que os bancos estão reduzindo as
linhas atuais e a empresa vem aumentando sua necessidade de
novos recursos, ou seja, sua geração de caixa está diminuindo.
3. A terceira, e uma das mais importantes, é quando a ficha
cadastral apresenta linhas de crédito captadas junto a bancos
desconhecidos. Exceto em situações excepcionais, os bancos

Administração da liquidez 129


menos conhecidos captam recursos com taxas mais elevadas
e, consequentemente, operam com custos também mais altos.
Quando isso ocorre, ou o gestor não tem os conhecimentos
mínimos de cálculo financeiro ou, o que é mais provável, os
bancos com linhas de crédito mais baratas já reduziram os limites
de crédito da empresa.

É importante frisar que essas conclusões precisam ser checadas em


detalhes. No entanto, são indícios preocupantes para qualquer tipo de
empresa. Confirmadas essas conclusões, as consequências mais ime-
diatas são grau de vulnerabilidade maior diante das flutuações nas
condições do mercado em que a empresa atua e atrasos nos pagamen-
tos, o que leva ao aumento das perspectivas de recuperação judicial ou
extrajudicial e, no limite, falência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para crescer, todas as empresas precisam investir em ativos. Ao ter
que decidir sobre a aplicação de recursos, a grande questão é como finan-
ciar esse investimento. Devemos utilizar recursos dos sócios ou daque-
les que emprestam fundos para a empresa sem participação no capital,
sabendo que, se esses recursos captados não forem compatíveis, em
termos de prazos e de custos versus rentabilidade, a empresa pode, no
limite, chegar à falência.
Para evitar que isso ocorra e a empresa possa sempre crescer de ma-
neira sustentada, o gestor financeiro precisa administrar adequadamente
a sua liquidez, utilizando, nesse trabalho fundamental, uma das ferramen-
tas mais importantes de gestão: o fluxo de caixa.
Além de ser essencialmente um instrumento de planejamento, o fluxo
de caixa é a ferramenta utilizada pelo gestor para administrar eficazmente
a relação entre a rentabilidade e a liquidez, pois reflete, sob o ponto de
vista financeiro, as entradas de caixa e os pagamentos em seus respecti-
vos vencimentos.
Utilizando essa importantíssima ferramenta, o gestor tem um suporte
fundamental para suas decisões, permitindo que possa, por meio da re-
dução da incerteza e, consequentemente do risco, para os stakeholders,
cumprir seu principal objetivo: a maximização do retorno dos proprietá-
rios da empresa.
Para isso, é necessário que sua administração não seja dissociada das
demais áreas da empresa, o que pode comprometer irremediavelmente

130 Finanças Corporativas


a qualidade do processo decisório. É importante, também, que o gestor
esteja consciente de que o fluxo de caixa não é um instrumento da área
financeira, embora seja elaborado por ela, mais sim da organização como
um todo, uma vez que as consequências de todas as decisões tomadas
nas várias áreas da empresa estarão refletidas nele.

REFERÊNCIAS
CARVALHO, F. J. C. de. et al. Economia monetária e financeira. Rio de Janeiro: Campus, 2015.
GITMAN, L. J.; ZUTTER, C. J. Princípios de administração financeira. São Paulo: Pearson, 2010.
PEREIRA, A. S. Finanças corporativas. Curitiba: IESDE, 2013.
SÁ, A. Fluxo de caixa: a visão da tesouraria e da controladoria. São Paulo: Atlas, 2012.

GABARITO
1. O fluxo de caixa é, essencialmente, uma ferramenta de planejamento, a qual permite
ao gestor a análise da relação entre a rentabilidade da empresa e a sua liquidez. No
fluxo de caixa, estão previstos os recursos financeiros que deverão entrar no caixa
da empresa (sempre incertos) e aqueles que terão que sair, esses últimos com um
grau de incerteza muito menor. Por meio do fluxo de caixa, o gestor financeiro pode
levantar prognósticos das necessidades de captação (quando e quanto) e as sobras de
recursos que permitirão o reinvestimento na operação da empresa para que ela possa
crescer de maneira sustentada.

2. Os dois métodos de elaboração do fluxo de caixa, direto e indireto, apresentam van-


tagens e desvantagens. Normalmente, o direto é utilizado para as decisões cotidianas
da empresa e o indireto para as de prazos mais longos. Qualquer que seja o método
que a empresa pretenda utilizar, o gestor financeiro deve, antes de decidir por uma
das alternativas, analisar detidamente aquela que propicie a melhor relação entre o
custo da obtenção das informações necessárias e o benefício da informação resultan-
te para análise.

3. Ciclo de caixa ou financeiro positivo indica que a empresa efetua seus pagamentos
operacionais antes de receber o produto de suas vendas de produtos e/ou serviços.
Por outro lado, se esse ciclo for negativo, representa que os recursos oriundos das
vendas entram no caixa antes do pagamento dos gastos relacionados à operação.
Portanto, o ideal, para qualquer tipo de empresa, é a busca incessante dos gestores
para fazer com que suas empresas tenham ciclo de caixa ou financeiro negativos.

Administração da liquidez 131


5
Capital de giro
Conciliar os fluxos financeiros e operacionais da empresa e,
principalmente, obter adequadamente os recursos necessários ao
financiamento de suas atividades operacionais são atividades es-
senciais do gestor financeiro no desempenho de suas funções. Para
ocorrerem, é preciso entender a inter-relação entre esses fluxos,
principalmente por meio do crescimento operacional da empresa e,
por consequência, da maior complexidade de sua atividade.
Ao quantificarmos os efeitos financeiros de todas essas ques-
tões, refletidas na perfeita combinação entre os prazos passivos
e os prazos ativos, temos o que costumeiramente chamamos de
administração do capital de giro. Na realidade, como apresentare-
mos ao logo deste capítulo, todas essas relações que costumamos
chamar de capital de giro são quantificadas em um conceito deno-
minado necessidade de capital de giro (NCG) ou investimento opera-
cional em giro (IOG).
Ele é de fundamental importância para qualquer empresa, in-
dependente de seu tamanho e segmento de atuação, e explica a
quebra de vários negócios, principalmente em momentos de rá-
pido crescimento em suas vendas. A compreensão dessa formu-
lação torna ainda mais fácil o entendimento de vários problemas
financeiros existentes quando associamos os conceitos de capital
de giro e NCG em um terceiro indicador gerencial de fundamental
importância, chamado de Saldo de Tesouraria.
Aprofundar e detalhar a importância do capital de giro, da NCG
e do Saldo de Tesouraria (os três conceitos calculados em unida-
des monetárias) e suas inter-relações com os ciclos da empresa
(expressos em prazos médios) são os objetivos deste capítulo.

132 Finanças Corporativas


5.1 Capital de giro
Vídeo O Balanço é constituído, em sentido amplo, pelas contas do Ativo e do
Passivo. No Ativo, encontramos todas as aplicações de recursos realizadas
pela empresa e que, no momento de sua divulgação, ainda demonstram
algum valor econômico, representando as aplicações ou uso de fundos.

No Passivo, constam todos os financiamentos


obtidos junto aos sócios e aos financiadores sem 1
participação no capital social. Esses recursos repre- Como sabemos, todas as em-
sentam as origens ou fontes de recursos utilizados presas estão permanentemente
endividadas. Um pré-requisito
pela empresa durante determinado período e que importante para que as dívidas
1
ainda não foram pagos . Do ponto de vista de sua sejam consideradas saudáveis
é que todas sejam sempre a
estrutura, o Balanço pode ser representado da se-
vencer e nunca vencidas.
guinte forma:

Figura 1
Estrutura do Balanço

Balanço Patrimonial
Passivo exigível
• Passivo circulante
Aplicações Ativo • Passivo não circulante Fontes
de de
recursos recursos
Patrimônio Líquido

Fonte: Elaborada pelo autor.

Analisando o Balanço de qualquer tipo de empresa, independente-


mente de seu tamanho e do segmento de mercado em que atua, sua
representação é vista pelo gestor da seguinte forma:

Figura 2
Balanço da perspectiva do gestor

Ativo Passivo

Aplicações Fontes

Fonte: Elaborada pelo autor.

Capital de giro 133


Para entender a representação do Balanço sob o ponto de vista da
geração e aplicação de recursos, precisamos lembrar que:
•• No Ativo, ficam representados todos os bens e direitos da empre-
sa, isto é, as aplicações realizadas com os recursos do Passivo.
•• O Passivo representa, por sua vez, o total da dívida da empresa,
isto é, as obrigações com sócios e terceiros. As fontes de recursos
utilizados são originárias do Passivo, sendo, portanto, represen-
tadas pelo lado direito do Balanço.

Ativo Passivo
• Bens
• Obrigações
• Direitos

Esses aspectos nos levam às seguintes conclusões:


1. Sempre que uma conta do Passivo aumenta, a empresa está
gerando uma fonte de recursos.
2. Sempre que uma conta do Ativo aumenta, a empresa está
gerando uma aplicação de recursos.

As fontes e aplicações de recursos não se limitam, no entanto, a


essa definição, pois tanto as contas do Ativo quanto as do Passivo po-
dem diminuir de tamanho. Analisando esses aumentos e diminuições
no Ativo e no Passivo, podemos concluir o seguinte:

Figura 3
Fontes e aplicações de recursos

Aumento de Aumento de
Ativo Passivo
= Ativo Passivo =
Aplicação Fonte

Aplicações Fontes
Redução de Redução de
Ativo Passivo
= =
Fonte Aplicação

Fonte: Elaborada pelo autor.

Para ilustrar esse conceito, vejamos alguns exemplos de fontes e


aplicações de recursos observadas no Ativo e no Passivo da empresa.

134 Finanças Corporativas


Para o perfeito entendimento, é necessário analisar cada uma isolada- 2
2
mente, sem empregar, na análise, o sistema de partidas dobradas .
Método criado pelo Frei Luca
1. Fontes do Passivo: Pacioli em 1494 e que até hoje
é a base dos sistemas contábeis.
•• obtenção de um novo financiamento;
Por esse método, as contas
•• aumento de capital; recebem lançamentos a débito
e a crédito, não podendo haver
•• aumento das compras de fornecedores.
lançamento a crédito em uma
2. Fontes do Ativo: conta sem o correspondente
•• venda de uma máquina; lançamento a débito em outra.

•• recebimento de uma duplicata;


•• venda de estoque.
3. Aplicações do Passivo:
•• pagamento de um financiamento;
•• pagamento de dividendos;
•• pagamento de débitos com fornecedores.
4. Aplicações do Ativo:
•• compra de matéria-prima;
•• compra de uma nova máquina;
•• aplicação de recursos no mercado financeiro.
Em sua estrutura de Ativos e Passivos, o Balanço de uma empre-
sa pode conter no máximo cinco grandes grupos de contas. A inter-
pretação econômica desses agrupamentos do Balanço, definida de
acordo com a visão econômica de sua estrutura, é interpretada da
seguinte forma:

Figura 4
Grupos de contas do Balanço
ATIVO PASSIVO
Aplicações com Captações com
Passivos prazo inferior a
prazo inferior a
Ativos circulantes circulantes 360 dias
360 dias

Aplicações com Captações com


Passivo não
prazo superior a prazo superior a
circulante
360 dias 360 dias
Ativo não
circulante Patrimônio Captações sem
Aplicações sem
prazo definido (*) Líquido prazo definido

(*) As aplicações sem prazo definido dentro do Ativo não circulante são compostas basicamente
dos investimentos em máquinas, equipamentos, instalações e investimentos em outras empresas.
Conceitualmente, esses investimentos não têm prazo predefinido para resgate.
Fonte: Elaborada pelo autor.

Capital de giro 135


Importante
As estruturas de Balanço apresentadas, que obedecem à normatização da Lei
3 11.638/2007, são aplicadas às chamadas empresas de grande porte 3 . As empresas
que não estão enquadradas nessa lei apresentam, no Ativo e no Passivo, os seguintes
São consideradas empresas de
grande porte quaisquer tipos grupos de contas:
de negócio ou conjunto de so- • Ativo
ciedades que tenham o mesmo • Ativo circulante;
controle societário e apresentem,
no último exercício social, receita
• Realizável a longo prazo;
bruta anual superior a R$300 • Ativo permanente.
milhões ou a soma total de seu • Passivo
Ativo superior a R$240 milhões. • Passivo circulante;
• Exigível a longo prazo;
• Patrimônio Líquido.

Devido ao fato de revelar um conceito econômico-financeiro, e não


uma definição legal, o cálculo ou a análise do capital de giro pode ser
feito de duas maneiras distintas, apesar de os resultados quantifica-
dos por meio dessas definições apresentarem os mesmos resultados.
A primeira forma tem como base a conceituação tradicional, refletida
na apresentação do Balanço. Essa conceituação alternativa do capital
de giro é definida como a diferença entre:
Ativo circulante ⇒ Representa os bens e direitos a receber em até
360 dias, contados da data da publicação.
(–) Passivo circulante ⇒ Constituído das dívidas a pagar em até 360 dias,
contados da data da publicação.
___________________________
= Capital de giro

Ao calcularmos o valor do capital de giro utilizando essa metodologia,


podemos encontrar três possibilidades. Vejamos a seguir cada uma delas:
•• Capital de giro positivo: nesse caso, o valor do Ativo circulante é
superior ao do Passivo circulante, indicando que a empresa tem
valores a receber com prazos de até 360 dias em volumes supe-
riores às dívidas de mesmo prazo. Empresas com capital de giro
positivo apresentam índice de liquidez corrente – calculado com
base na divisão do Ativo circulante pelo Passivo circulante – maior
do que um, indicando que a empresa tem liquidez. Do ponto de
vista da estrutura de seu Balanço, empresas nessa situação apre-
sentam a seguinte disposição:

136 Finanças Corporativas


Figura 5
Balanço com capital de giro positivo

Passivos
Ativos circulantes circulantes
Capital de giro
positivo

Passivo não
circulante
Ativo não
circulante
Patrimônio
Líquido

Fonte: Elaborada pelo autor.

•• Capital de giro negativo: empresas com capital de giro negati-


vo apresentam o valor do Ativo circulante inferior ao do Passivo
circulante, indicando que a soma dos valores a receber até em
360 dias é inferior à soma das dívidas de mesmo prazo. Nesse
caso, o índice de liquidez corrente é menor do que 1, demons-
trando que a empresa não dispõe de liquidez. Analisando o
Balanço de uma empresa com capital de giro negativo, encon-
traremos a seguinte estrutura:

Figura 6
Balanço com capital de giro negativo

Ativos circulantes Passivos


circulantes
Capital de giro
negativo
Passivo não
Ativo não circulante
circulante
Patrimônio
Líquido

Fonte: Elaborada pelo autor.

•• Capital de giro nulo: empresas com capital de giro nulo apresen-


tam o valor do Ativo circulante igual ao valor do Passivo circulante,
indicando que a soma de tudo que elas têm a receber com prazo
de até 360 dias é igual à soma das dívidas com o mesmo prazo. Se
calcularmos o índice de liquidez corrente para esse tipo de empre-
sa, encontraremos um resultado igual à unidade, demonstrando
que a liquidez da empresa está extremamente sensível a qualquer

Capital de giro 137


alteração nos prazos médios passivos. Empresas com capital de
giro nulo apresentam a seguinte estrutura de balanço:

Figura 7
Balanço com capital de giro nulo

Passivos
Ativos circulantes
circulantes
Capital de giro
nulo
Passivo não
circulante
Ativo não
circulante
Patrimônio
Líquido

Fonte: Elaborada pelo autor.

A segunda maneira de se calcular o capital de giro, a qual não afeta


seu valor, leva em consideração dois conceitos fundamentais para que
possa ser realizada a gestão financeira:
•• uma empresa está 100% de seu tempo endividada junto a tercei-
ros e/ou seus sócios;
•• para poder realizar aplicações no Ativo, qualquer tipo de empre-
sa precisa primeiramente captar fontes de recursos com tercei-
ros e/ou junto aos sócios.

Considerando esses conceitos, podemos chegar à segunda forma


de definição do capital de giro, com base na avaliação das fontes e ori-
gens do Balanço. Nesse sentido, definimos capital de giro como:

Figura 8
Capital de giro pela avaliação das fontes e origens do Balanço

Passivo não circulante

+
Fontes de longo
prazo
Patrimônio Líquido

-
-
Aplicações de
Ativo não circulante longo prazo

= =
Capital de giro
Fonte: Elaborada pelo autor.

138 Finanças Corporativas


Essa forma de cálculo do capital de giro, embora não altere mate-
maticamente o valor calculado, conforme veremos a seguir, muda mui-
to o conceito. Dessa perspectiva, o capital de giro reflete a diferença
entre o valor dos fundos obtidos a longo prazo com os proprietários da
empresa (independente de sua forma de constituição) e financiadores
e o total das aplicações realizadas também a longo prazo.

Se for positiva, essa diferença demonstra uma sobra de recursos de


longo prazo, pois, nessa forma de cálculo, tanto a captação de recursos
(fontes) quanto as aplicações realizadas são a longo prazo. Entretanto,
caso a diferença seja negativa, significa que faltam recursos de longo
prazo para financiamento das aplicações tradicionais de longo prazo
existentes na estrutura de aplicações realizadas pela empresa. Essa
forma de cálculo, importantíssima para compreender como funciona o
capital de giro, é ilustrada no diagrama a seguir:

Figura 9
Visão gerencia do capital de giro

VISÃO GERENCIAL

Ativo circulante Passivo circulante


100 60

Capital de giro Passivo não


140 – 100 = 40 circulante
40

Ativo não circulante Patrimônio Líquido


100
100

Total 200 Total 200


Fonte: Elaborada pelo autor.

Importante
Repare que o capital de giro calculado das duas formas indicadas chega ao mesmo
valor, conforme demonstrado a seguir:
1. Ativo circulante – Passivo circulante = 100 – 60 = 40
2. Exigível a longo prazo + Patrimônio Líquido – Ativo não circulante = 40 +
100 – 100 = 40

Capital de giro 139


Por meio dessa segunda forma de cálculo do capital de giro, todas as
transações que afetam as fontes e as aplicações de longo prazo em valo-
res diferentes impactam o capital de giro, enquanto todas as transações
de igual valor entre as fontes e as aplicações de longo prazo, ou entre o
Ativo e o Passivo circulante, não têm qualquer efeito no capital de giro.

O capital de giro normalmente apresenta uma estabilidade bastante


razoável ao longo do tempo. Seu valor diminui quando a empresa realiza
novos investimentos operacionais, como as aplicações no Ativo perma-
nente. No entanto, normalmente esses investimentos são realizados por
meio da captação de recursos obtidos junto aos sócios (dinheiro novo
oriundo de aumento de capital ou reaplicação de lucros) e aos terceiros
captados de fontes de longo prazo. Essa captação de recursos, por outro
lado, aumenta o capital de giro, compensando aproximadamente a re-
dução gerada pelos novos investimentos.

Da mesma forma que o valor do capital de giro pode apresentar saldo


positivo, também pode indicar saldo negativo. Nesse caso, geralmente a
leitura inicial desse valor, com base na segunda forma de entendimento
do capital de giro, indica que as aplicações de longo prazo estão sendo
financiadas com recursos de fontes demonstradas no Passivo circulante.

Muito embora seja comumente dito que empresas com capital de


giro negativo estejam à beira da insolvência, isso não é necessariamen-
te verdadeiro. Ao estudarmos o conceito da NCG, veremos que este
sim é um indicador da maior importância para a solvabilidade de qual-
quer tipo de empreendimento.

Com base nessa conceituação da estrutura do Balanço, podemos


dizer que o capital de giro representa o montante de recursos captados
4
a longo prazo junto aos sócios e aos terceiros e investidos no finan-
Essas contas, do ponto de vista
contábil, são classificadas como ciamento das aplicações de longo prazo refletidas no Ativo não circu-
4
de curto prazo e fazem parte do lante e das necessidades operacionais permanentes de recursos da
Ativo circulante, mas, do ponto empresa. Ou seja, o capital de giro mede o nível de sucesso alcançado
de vista da necessidade de recur-
sos para seu financiamento, são pelas empresas na obtenção de recursos de longo prazo para o finan-
analisadas como de longo prazo. ciamento das aplicações também de longo prazo e das necessidades
Chamado de contas cíclicas, operacionais permanentes de financiamento.
esse conceito será detalhado
e aprofundado ao longo deste
capítulo.

140 Finanças Corporativas


Importante
1. Aumentando o capital de giro, cresce também o custo financeiro. Esse efeito pode
ocorrer por dois motivos:
b. Aumento na captação de fontes de financiamento de longo prazo provenien-
te dos sócios ou de terceiros, o que aumenta o custo financeiro relacionado
a esses recursos.
c. Redução das aplicações de longo prazo, especialmente aquelas relacionadas ao
Ativo permanente, o que pode sugerir, aos financiadores, uma redução na geração
futura de caixa, aumentando o risco operacional, o risco financeiro e, consequen-
temente, o custo de capital.
2. O aumento do capital de giro reduz o risco, aumenta a liquidez e reduz a lucratividade.
c. Ao aumentar o capital de giro por meio do incremento da captação de recursos adi-
cionais de longo prazo, a empresa promove um casamento mais adequado entre suas
necessidades de fontes e as aplicações de longo prazo, o que pode reduzir o risco
financeiro e, por consequência, aumentar sua liquidez e reduzir o custo de capital.
d. Por outro lado, ao promover uma captação adicional de recursos, haverá a neces-
sidade de remunerar os detentores desses financiamentos, o que poderá, depen-
dendo do tipo de aplicação realizada com esses recursos, reduzir a lucratividade
da empresa.

Uma questão fundamental relacionada à análise do capital de giro


tem sua importância gerada pela existência de uma possibilidade de
arbitragem entre as obrigações correntes e a realização dos Ativos
circulantes. Por exemplo, ao efetuar uma compra para pagamento a
prazo, a empresa pode determinar com precisão valores e datas de pa-
gamento. Caso consiga minimizar o grau de risco das entradas de caixa,
com a diminuição dos prazos de recebimento e o aumento dos prazos
de pagamento, as necessidades de recursos de longo prazo para o fi-
nanciamento das contas com características permanentes serão redu-
zidas significativamente.

É exatamente por isso que as empresas com alto grau de incerteza


nas suas entradas de caixa precisam manter elevados níveis de dispo-
nibilidade. Assim, podem suportar as obrigações correntes, necessitan-
do também de um volume maior de recursos para o financiamento do
giro de sua atividade operacional.

Um exemplo é o caso de uma organização com atividade industrial


que, para maximizar sua rentabilidade, deverá reduzir ao máximo seu
capital de giro e, em paralelo, procurar aumentar os investimentos em

Capital de giro 141


Ativo permanente. Isso ocorre devido ao Ativo circulante ser, na verda-
de, uma forma de gerar liquidez, enquanto o Ativo permanente repre-
senta geração de lucro.

Concluído o estudo do conceito do capital de giro sob o ponto de


vista das fontes e aplicações de recursos, ou seja, sob a ótica dos fluxos
de recursos na empresa, podemos ver as principais aplicações compo-
nentes do capital de giro (contas a receber e os estoques) e das fontes
tradicionalmente utilizadas no seu financiamento.

5.2 Tipos de contas na perspectiva gerencial


Vídeo Para o gestor financeiro, a análise da estrutura das contas do Balan-
ço da empresa tem uma conotação diferente da que embasa a avaliação
contábil usual. Partindo da estruturação tradicional, composta do Ativo
circulante e Ativo não circulante (do lado do Ativo) e do Passivo circulante,
5
Passivo não circulante e Patrimônio Líquido (do lado do Passivo), o gestor
precisa analisar as contas, classificando-as em contas cíclicas, não cíclicas
5
e erráticas.
Para as empresas não enqua-
dradas na Lei 11.638/2007, a Cada conta existente no Ativo e no Passivo da empresa é classifi-
estrutura do Balanço é composta cada de acordo com essa especificação, facilitando bastante a análise
do Ativo circulante, exigível a e a gestão do capital de giro da empresa e, principalmente, o entendi-
longo prazo e Ativo imobilizado
(do lado do Ativo) e do Passivo mento do que de fato representa a gestão operacional da empresa do
circulante, exigível a longo prazo ponto de vista das fontes de recursos necessárias ao financiamento da
e Patrimônio Líquido (do lado
atividade operacional de qualquer tipo de negócio.
do Passivo).
Essas definições fazem parte do chamado modelo dinâmico ou
6 6
modelo Fleuriet , que é baseado na análise e na quantificação finan-
Esse modelo foi criado por ceira dos efeitos do tempo necessário para que o giro das contas do
Michel Fleuriet no livro O Modelo Ativo e do Passivo da empresa produzam os resultados esperados
Fleuriet: a dinâmica financeira
das empresas brasileiras, por seus stakeholders. Esse modelo classifica as contas do Ativo e do
considerado um dos mais im- Passivo, com base na realidade dinâmica da empresa, fundamentada
portantes no assunto. em sua dinâmica operacional e por seu fluxo de produção.

Esse modo de classificar as contas, conforme veremos a seguir,


subverte a classificação contábil utilizada tradicionalmente na análi-
se e avaliação de empresas. Na forma tradicional de análise, os itens
componentes do Balanço são classificados entre contas de curto e de
longo prazo. Na que utilizaremos, baseada no modelo dinâmico de

142 Finanças Corporativas


Fleuriet, cada um desses grupos de contas apresenta definições di- Livro
ferentes. Esse modo de entendimento das contas do Balanço é apre- O livro O Modelo Fleuriet:
a dinâmica financeira das
sentado a seguir. empresas brasileiras apre-
senta o modelo dinâmico

5.2.1 Contas cíclicas


de análise de empresas,
também chamado de
modelo Fleuriet, uma das
Um aspecto fundamental, do qual não podemos nos esquecer ao formas mais importantes
para a análise econômica
analisar a estrutura de Ativos de uma empresa, diz respeito às aplica- e financeira de qualquer
ções realizadas continuamente em função de sua atividade. Essas con- tipo de empresa,
independente de seu
tas, em decorrência de sua existência contínua, geram, por outro lado, tamanho e segmento de
uma necessidade de financiamentos também contínua. atuação.

FLEURIET, M.; KEHDY, R.; BLANC, G.


Do ponto de vista financeiro, todas as necessidades de recursos contí- Rio de Janeiro: Elsevier, 2003.
nuos possuem uma característica de permanência devido à continuidade
de sua existência, independente dos saldos, que constantemente estão au-
mentando e diminuindo, dos respectivos prazos médios ativos e passivos e
da classificação contábil tradicional entre curto e longo prazo.

Do ponto de vista do financiamento da atividade empresarial, as


necessidades operacionais permanentes de recursos são consideradas
valores que precisam ser financiados com recursos também perma-
nentes, captados de fontes de longo prazo. Essas necessidades de in-
vestimento operacionais, refletidas no Ativo da empresa, por adotarem
como atributo a existência de saldos a todo o momento, assumem ca-
racterísticas permanentes, podendo o gestor caracterizá-las como ne- 7
7
cessidades de financiamento de longo prazo .
Esse é um conceito gerencial, e
Apesar de várias outras contas poderem existir, dependendo das não contábil.

características do mercado de atuação da empresa, as aplicações de


recursos que mais comumente apresentam essa propriedade são:
•• contas a receber;
•• estoques.

Para que esse conceito fique bem claro, vamos tomar como exemplo
as contas a receber. Em qualquer tipo de empresa, só não existirão valo-
res a receber gerados pelas vendas a prazo em duas situações. A primei-
ra ocorre quando, por definição estratégica e mercadológica, a empresa
somente efetua vendas à vista, situação de absoluta excepcionalidade
atualmente. Nesse caso, ao realizar uma venda, o valor recebido iria para
o caixa da empresa e não seria reconhecido como um valor a receber.

Capital de giro 143


A segunda situação em que não haveria valores a receber ocorre
quando uma empresa é fechada, por decisão própria – momento em
que os sócios decidem pela descontinuidade de suas operações – ou
de maneira forçada, devido a um pedido de falência. Nesse caso, todos
os valores a receber existentes são recebidos em sua totalidade ou em
parte (sempre existe a possibilidade de inadimplência entre os devedo-
res da empresa) e a conta desaparece.

Exceto nessas situações, uma empresa em operação sempre terá


um saldo de valores a receber. Ainda que esse saldo aumente e dimi-
nua ao longo do tempo, sempre há um valor que deverá ser financiado
de maneira adequada pelas fontes de recursos do Passivo, indepen-
dente da composição dos valores, ou seja, dos clientes que estiverem
representados nos valores a receber.

Para que isso fique mais claro, suponha que exista nas contas a re-
ceber uma venda feita para o cliente A. Enquanto esse cliente não qui-
tar sua dívida com a empresa, por representar um Ativo, esse valor terá
que ser financiado por um Passivo. Assim que ele fizer o pagamento,
deixa de existir a necessidade de financiá-lo. Se, no entanto, no mesmo
dia, a empresa fizer uma venda a prazo para o cliente B (para simplifi-
car o exemplo, vamos imaginar que seja no mesmo valor), a empresa
terá que “transferir” os recursos captados no Passivo para o financia-
mento do cliente A para, agora, financiar o cliente B.

O mesmo raciocínio acontece com os estoques. Uma empresa só não


terá que financiar seus estoques em duas situações. A primeira é quando
os estoques são consignados, nesse caso, os estoques, independente de
serem de matéria-prima ou de produtos acabados, não são de proprie-
dade da empresa, mas sim de seu fornecedor, portanto não precisam
ser financiados. A segunda ocorre quando a empresa descontinua suas
atividades por decisão dos sócios ou é forçada por um processo falimen-
tar, nesse caso, o estoque é vendido ou baixado como perda, eliminando
a necessidade de financiamento do Passivo.

Uma pergunta que pode ser feita sobre os estoques está relacio-
nada às empresas de prestação de serviços. Nesse tipo de empresa,
o valor dos estoques é muito pequeno e, dependendo do tamanho e do
valor, pode não ser reconhecido como um Ativo, mas sim diretamente
como uma despesa, lembrando que o enfoque utilizado aqui é geren-
cial e não contábil. Ao analisarmos, do ponto de vista gerencial, uma

144 Finanças Corporativas


empresa prestadora de serviços, precisamos reconhecer que a mão de Importante
obra operacional, ou seja, os colaboradores empregados na atividade Inclui-se nas contas que deman-
dam financiamento permanente,
fim da empresa, tem a mesma conotação do estoque e, como tal, deve
além das contas a receber e dos
ser considerada do ponto de vista da necessidade de financiamento do estoques, todas aquelas que
Passivo. É importante frisar que esse conceito prescinde de qualquer contabilmente são classificadas
como de curto prazo no Ativo
alteração na sua classificação contábil.
circulante, mas que, em função
Do mesmo modo que no Ativo, existem, no Passivo circulante, algu- de sua existência basicamente
contínua, adotam a característica
mas contas com a mesma característica de existência contínua, repre- de permanentes.
sentando formas de financiamento permanentes para as operações da
empresa. Essas contas que sempre existem permitem que as empresas
disponham de recursos para financiar suas operações em condições de
prazo e custo muito interessantes. As contas mais comuns são:
•• fornecedores;
8 8
•• obrigações fiscais ;
9 Inclui todos os impostos federais,
•• obrigações sociais . estaduais e municipais dos
quais a empresa tem prazo para
Da mesma forma que as contas cíclicas do Ativo, as contas do Pas-
efetuar seu recolhimento.
sivo também sempre existirão, exceto em situações bem específicas.
Vamos tomar os fornecedores para, inicialmente, ilustrar esse con- 9
ceito. Uma empresa só não utiliza financiamento de fornecedores em
Inclui todos os gastos relativos a
duas situações. A primeira acontece ocorre por decisão estratégica ou salários, 13º salário, férias e de-
mercadológica, em que a empresa somente supre suas demandas de mais encargos sociais incidentes
sobre a folha de pagamento.
matéria-prima ou de produtos acabados por meio da compra à vis-
ta, e a segunda, por descontinuidade voluntária ou judicial de suas
atividades. Nesse último caso, enquanto mantiver dívidas não pagas,
vencidas ou a vencer, ela terá financiamento de seus fornecedores. Ex-
ceto nesses dois casos, a empresa sempre contará com financiamento
10
de seus fornecedores, representando esses valores em aberto, venci-
10 Lembrando que o pré-requisito
dos ou a vencer, uma fonte permanente de recursos. para que uma dívida seja consi-
O mesmo acontece com o financiamento existente nas obrigações derada boa é que seja a vencer, e
não vencida.
fiscais e nas obrigações sociais, geradas pelos prazos de recolhimento
existentes. Diferentemente dos fornecedores, essas fontes de financia-
mento permanentes somente deixarão de existir se os sócios decidirem
interromper suas atividades, se sua descontinuidade judicial for decre-
tada ou se os prazos para o pagamento dos salários e dos encargos
sociais e de recolhimento dos impostos federais, estaduais e municipais
forem abolidos. Caso contrário, a empresa poderá utilizar esses recur-
sos como forma de financiamento permanente (lembrando que quan-

Capital de giro 145


do uma empresa efetiva o recolhimento de uma guia de impostos, em
função do prazo de pagamento, normalmente já está devendo outra).

Além de representarem fontes de financiamento permanentes,


esses recursos contabilizados como Passivo circulante apresentam
outra particularidade extremamente importante e que fundamenta
a prioridade que devemos dar a eles. Essas fontes de financiamento
não têm custo financeiro associado. Para entendermos esse conceito,
precisamos lembrar que o custo financeiro associado a uma fonte de
recursos está relacionado a um determinado valor captado e que, ao
ser devolvido na data pactuada, será acrescido de uma remuneração
para seu proprietário.

Utilizando esse conceito, se efetuarmos os pagamentos referentes


aos fornecedores, às obrigações sociais e às obrigações fiscais tempes-
tivamente (lembrando que esse é um pré-requisito para que uma dívi-
da seja considerada saudável), o valor a ser pago será semelhante ao
da data em que a dívida foi incorrida, não resultando daí qualquer tipo
de aumento que caracterize custo financeiro.

Para tornar ainda mais claro esse conceito, vamos lembrar que, nas
compras a prazo, é muito comum a existência de condições comerciais
de preço diferentes. Normalmente, encontramos um preço para paga-
mento à vista e outro a prazo. Essas distinções conceitualmente repre-
sentam diferenças relacionadas às características do produto, e não ao
custo financeiro.

Em outras palavras, um produto com pagamento à vista é diferente de


um com pagamento a prazo. As características de pagamento represen-
tam uma diferença de produto, exceto para as pessoas físicas ou jurídi-
cas que só efetuam compras à vista. Essas pessoas e empresas enxergam
Importante apenas um tipo de produto: aquele com pagamento à vista. No entanto,
Além dos valores contabilizados é importante frisar que se as compras a prazo forem pagas fora de seu
nas contas fornecedores, obriga-
vencimento original, haverá a incidência de encargos moratórios, desca-
ções sociais e obrigações fiscais,
devem ser consideradas fontes racterizando-os como fontes de financiamento a custo financeiro zero.
de financiamento permanentes
Essas fontes de financiamento permanentes do Passivo, contabili-
e sem custo financeiro todas
aquelas que contabilmente são zadas no Ativo circulante e consideradas pela classificação contábil tra-
classificadas como de curto dicional como dívidas de curto prazo, na realidade, do ponto de vista
prazo no Passivo circulante, mas
que adotam a característica de gerencial, representam fontes de financiamento permanentes e que
permanentes em função de sua devem ser utilizadas e priorizadas para o financiamento das aplicações
existência basicamente contínua. operacionais permanentes, refletidas fundamentalmente nas contas a
receber e nos estoques.

146 Finanças Corporativas


As contas cíclicas do Ativo, em seu conjunto, também são chama-
das de Ativo circulante operacional, e as cíclicas do Passivo, de Pas-
Atividade 1
sivo circulante operacional, “representando as obrigações de curto
O que são contas cíclicas?
prazo identificadas diretamente com o ciclo operacional da empresa”
(ASSAF NETO, 2010, p. 63).

5.2.2 Contas não cíclicas


Em nosso entendimento, toda empresa pode ser representada
como um nadador que fica o tempo inteiro no meio de um rio com
uma correnteza muito forte. Frente a essa situação, o nadador tem três
alternativas:
1. nadar com mais velocidade do que a da correnteza e avançar ao
longo do rio;
2. nadar com velocidade igual à da correnteza para ficar no mesmo
lugar, pois, caso não o faça, lentamente, a correnteza vai arrastá-lo;
3. não nadar ou fazê-lo em velocidade inferior à da correnteza,
sendo arrastado por ela.

Nessa analogia, o nadador é o gestor da empresa, o rio é o merca-


do e a correnteza, a velocidade de entrada de novos concorrentes. O
que faz o nadador vencer a correnteza é treinamento e preparo físico
e, para chegar a esse ponto, leva tempo.

O mesmo acontece nas empresas. Existem investimentos que le-


vam um tempo muito superior ao das contas cíclicas para começarem a
dar retorno, portanto têm que ser financiados com prazos adequados.
As contas que refletem esse prazo maior, tanto do lado da fonte quanto
da aplicação, são as contas não cíclicas.

Do lado das fontes de recurso, ou seja, do Passivo, as contas não


cíclicas representam os financiamentos obtidos para o crescimento da
empresa, captados junto aos sócios e aos financiadores de longo prazo
sem participação no capital social; do lado da aplicação, ou seja, do Ati- Importante
vo, representam os investimentos, principalmente em máquinas, equi-
Se a empresa realizar vendas
pamentos e instalações, e as vendas a prazo realizadas a longo prazo. para recebimento a longo prazo,
com prazo superior a um ano,
Repare que essas contas, diferentemente das contas cíclicas, não como parte de sua política de
apresentam característica de permanentes. Para ilustrar, basta lembrar- vendas, esses valores a receber
mos alguns aspectos importantes e que diferenciam a essência dessas são considerados contas cíclicas.

contas quando as comparamos com as contas cíclicas. Olhando pelo

Capital de giro 147


lado do Passivo, nenhuma empresa tem aumentos ou reduções no ca-
pital social todos os dias ou capta e paga empréstimos de longo prazo o
tempo inteiro, ou seja, esses valores não refletem movimentos de entra-
das (captação) e saídas (pagamentos) continuamente, não apresentan-
do, dessa forma, a principal característica das contas cíclicas.

Se essa mesma avaliação for feita no lado do Ativo, nenhuma em-


presa, em geral, compra e vende máquinas, equipamentos e instala-
ções o tempo inteiro. Se isso ocorrer, estamos, na realidade, frente
a uma empresa que tem como atividade operacional a compra e/ou
produção e venda de máquinas e equipamentos, portanto esses Ativos
estão registrados no seu estoque, e não no Ativo não circulante (Ativo
permanente para empresas não enquadradas na Lei n. 11.638/2007).
Por não apresentarem a característica de movimentação contínua, es-
sas contas são consideradas contas não cíclicas.

A grande importância das contas não cíclicas está relacionada à sua


natureza. Ao analisarmos essas contas do Ativo, é fácil perceber que é
por meio da efetivação dessas aplicações que a empresa pode crescer,
gerando, por meio de suas máquinas, equipamentos e instalações, mais
produtos e serviços para venda. Como o retorno dessas aplicações não
ocorre em prazos curtos, o gestor que deseja crescimento sustentado
Atividade 2 de sua empresa utiliza as contas não cíclicas do Passivo para financiar

O que são contas não cíclicas? adequadamente, tanto do ponto de vista do tempo quanto do prazo,
as aplicações de longo prazo da empresa, expressas nas contas não
cíclicas do Ativo.

5.2.3 Contas erráticas


Para Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003, p. 27), as contas erráticas do Ativo
“são contas de curto prazo não necessariamente renováveis ou ligadas
à atividade operacional da empresa”. Essas contas, também chamadas
de circulante financeiro ou Ativo circulante errático, representam a re-
sultante final da atividade financeira da empresa, expressas nas con-
tas caixa, bancos e aplicações financeiras de curto prazo. Uma questão
importante referente às contas erráticas do Ativo é a inexistência de
uma relação direta com a atividade operacional, ou seja, essas contas
refletem, como consequência, a operação da empresa.

Do lado do Passivo, também existem contas com as mesmas caracte-


rísticas, chamadas de Passivo circulante errático ou simplesmente de circu-

148 Finanças Corporativas


lante financeiro, representadas pelos empréstimos de curto prazo e pelas
operações de antecipação de recebíveis. Essas contas, além de não es-
tarem diretamente ligadas às operações, ocorrendo como consequência
da atividade operacional da empresa, não apresentam as mesmas carac-
terísticas das contas cíclicas, não sendo renovadas permanentemente.

Lembramos que as empresas que se financiam sistematicamente por


meio de empréstimos de curto prazo e/ou da antecipação de recebíveis,
exceto por alguma motivação estratégica ou mercadológica momentâ-
nea, apresentam como característica ciclo de caixa ou financeiro positi-
vo, ou seja, efetuam pagamentos de suas contas antes do recebimento
das vendas de seus produtos e/ou serviços ligados a sua atividade fim.

Além disso, a existência de saldos em valores expressivos nessas con-


tas do Passivo indica que a empresa financia as contas cíclicas, que de-
mandam financiamento permanente, com recursos onerosos e de curto
prazo. Se essa estratégia de financiamento não for revertida rapidamen-
te, certamente a empresa enfrentará problemas financeiros, na medida
em que os financiadores, ao perceberem o risco financeiro existente na
empresa, aumentem os custos financeiros das operações, reduzam os
prazos e, por fim, deixem de continuar financiando a empresa.

Uma alternativa que várias empresas utilizam para eliminar as contas


erráticas do Passivo, especialmente aquelas que atuam na venda de bens
de consumo duráveis, é buscar parcerias com operadoras de cartão de
crédito. O objetivo com essa parceria é permitir que seus clientes sejam
financiados diretamente pela administradora de cartões e que a empresa
receba o valor da venda em poucos dias, com algum tipo de desconto.

Para a empresa que realiza a operação, a grande vantagem é, além


da reduzir (ou, idealmente, eliminar) a existência de contas erráticas do
Passivo, transferir o risco de inadimplência de seus clientes e a neces-
sidade de financiamento de suas contas a receber para a operadora de
cartões. Essa mesma operação também tem sido realizada diretamen-
te com bancos (em alguns casos, em sociedade), criando uma empresa
específica para financiar diretamente seus clientes, sem a interveniên-
cia da empresa que faz a venda, gerando os mesmos benefícios, ou
seja, a redução/eliminação das contas erráticas do Passivo e da neces-
sidade de financiamento permanente para as contas cíclicas do Ativo.

É a partir do entendimento da movimentação das contas do Balan-


ço da empresa, por meio da classificação de suas contas cíclicas, não

Capital de giro 149


cíclicas e erráticas, que podemos entender a gestão do capital de giro.
O conceito que nos permite entender como fazer de modo eficiente
essa administração é apresentado a seguir.

5.3 Necessidade de capital de giro


Vídeo Normalmente definido como administração do capital de giro, po-
demos, com base no entendimento da fundamentação gerencial do
capital de giro e das contas componentes do Balanço da empresa, ana-
lisar um dos conceitos mais importantes para a gestão financeira de
qualquer tipo de organização, independente do tamanho ou segmento
de atuação. Esse conceito é chamado de necessidade de capital de giro
(NCG) ou investimento operacional em giro (IOG).

Para entendermos esse conceito, precisamos, primeiramente, re-


classificar as contas do Balanço, do ponto de vista estritamente geren-
cial, conforme vimos anteriormente, em contas cíclicas, não cíclicas
e erráticas. Com base nessa reclassificação, o Balanço da empresa
apresenta a seguinte estrutura:

Figura 10
Estrutura do Balaço do ponto de vista gerencial

ATIVO CIRCULANTE PASSIVO CIRCULANTE


Contas Circulante financeiro: Circulante financeiro: Contas
erráticas • Caixa • Duplicatas descontadas erráticas
• Bancos • Empréstimos de curto prazo
• Aplicações a curto prazo
Circulante não financeiro:
Circulante não financeiro: • Fornecedores Contas
Contas • Contas a receber • Obrigações fiscais cíclicas
cíclicas • Estoques • Obrigações trabalhistas

PASSIVO NÃO CIRCULANTE


Contas não
• Empréstimos cíclicas
ATIVO NÃO CIRCULANTE • Financiamentos
Contas não • Contas a receber
cíclicas • Títulos a receber PATRIMÔNIO LÍQUIDO
• Investimentos • Capital Contas não
• Máquinas e equipamentos • Reservas cíclicas

Fonte: Elaborada pelo autor.

150 Finanças Corporativas


Lembrando que o circulante não financeiro representa as contas
cíclicas, ao descrevermos a classificação das contas de acordo com o
modelo dinâmico, enquanto gestores, nos preocupamos com o grupa-
mento das contas cíclicas, que representam os itens encontrados em
qualquer tipo de empresa e, por isso, devem sempre ser objeto de nos-
sa gestão. Duas questões de fundamental importância já mencionadas
surgem quando nos lembramos que uma das condições para que uma
dívida seja saudável é a constante necessidade de adequação entre os
prazos ativos e passivos.
1. Toda empresa, independentemente do tamanho e do tipo de
mercado em que atua e do produto/serviço que oferece, está
permanentemente endividada.
2. Para que se realize qualquer tipo de aplicação no Ativo, primeiro
é preciso obter uma fonte de recursos no Passivo, ou seja, é
necessário criar, antes de tudo, uma dívida.

Com base nessas questões, surgem duas outras perguntas funda-


mentais para as quais o gestor precisa encontrar respostas adequadas
a todo o momento.
1. Como financiar as contas do Ativo que existem o tempo todo
(contas cíclicas) e, por isso mesmo, adquirem uma característica
de permanência?
2. Esse financiamento deve ser constituído com recursos captados
de fontes de curto prazo ou de longo prazo?
11
Do ponto de vista unicamente do prazo e levando em considera-
11 Exceto nas situações demons-
ção as características das contas cíclicas , seu financiamento somente
tradas, em decorrência de
deve ser feito com recursos de longo prazo ou permanentes (contas sua existência contínua, essas
cíclicas do Passivo), de modo a adequar os prazos passivos e ativos. contas geram uma necessidade
de financiamentos também
Ao buscar recursos no Passivo compatíveis com as características da contínua.
aplicação realizada nas contas cíclicas do Ativo, podemos, analisando
todas as opções, utilizar as seguintes alternativas:

Capital de giro 151


Figura 11
Alternativas de contas cíclicas do Balanço

ATIVO CIRCULANTE PASSIVO CIRCULANTE


Circulante financeiro: Circulante financeiro:
• Caixa • Duplicatas descontadas
• Bancos • Empréstimos de curto prazo
• Aplicações a curto prazo
Circulante não financeiro:
Circulante não financeiro: • Fornecedores
• Contas a receber • Obrigações fiscais
• Estoques • Obrigações trabalhistas

PASSIVO NÃO CIRCULANTE


• Empréstimos
ATIVO NÃO CIRCULANTE • Financiamentos
• Contas a receber
• Títulos a receber PATRIMÔNIO LÍQUIDO
• Investimentos • Capital
• Máquinas e equipamentos • Reservas

Fonte: Elaborada pelo autor.

Repare que, do ponto de vista do prazo das fontes de recursos,


à exceção das contas erráticas, para as quais não existe nenhum tipo
de garantia de sua renovação, não apresentando o atributo de ser
permanente e, por esse motivo, caracterizando-se como fontes de
recurso de curto prazo, qualquer das demais pode, em tese, ser utili-
zada. A questão para o gestor financeiro passa a ser: entre as que so-
braram, qual fonte utilizar? A ilustração a seguir demonstra as opções
para o gestor:

Figura 12
Opções restantes de contas cíclicas do Balanço

ATIVO CIRCULANTE PASSIVO CIRCULANTE


Circulante financeiro: Circulante financeiro:
• Caixa • Duplicatas descontadas
• Bancos • Empréstimos de curto prazo
• Aplicações a curto prazo
Circulante não financeiro:
Circulante não financeiro: • Fornecedores
• Contas a receber • Obrigações fiscais
• Estoques • Obrigações trabalhistas

PASSIVO NÃO CIRCULANTE


• Empréstimos
ATIVO NÃO CIRCULANTE • Financiamentos
• Contas a receber
• Títulos a receber PATRIMÔNIO LÍQUIDO
• Investimentos • Capital
• Máquinas e equipamentos • Reservas

Fonte: Elaborada pelo autor.

152 Finanças Corporativas


Ao analisarmos as fontes de recursos do Passivo, fica claro que a res-
posta a essa pergunta é muito simples. O gestor deve utilizar a fonte de
menor custo financeiro. Vamos então analisar as fontes de recursos com
base na variável custo, começando pelo Patrimônio Líquido. Sabemos
que essa é a fonte de recursos de custo mais elevado, em função do ris-
co existente para os sócios na utilização de seus recursos, embora esse
custo não seja refletido na contabilidade, o que, para muitos gestores,
representa incorretamente uma alternativa sem custo financeiro.

As alternativas de captação de empréstimos e financiamentos de


longo prazo apresentam custos financeiros refletidos nas taxas de ju-
ros e nos demais custos incluídos, como taxa de abertura de crédito,
impostos, seguros e reciprocidades, cobrados nos empréstimos ban-
cários. Essa é uma alternativa que, por ter esses custos registrados nos
demonstrativos contábeis, traz a concordância unânime de todos os
gestores sobre sua característica de fonte onerosa, embora de custo
inferior às fontes captadas juntos aos sócios.

Sobram dentro da estrutura das fontes de recursos do Passivo as


contas cíclicas, que, como demonstramos, não trazem custos financei-
ros, além de apresentarem a mesma característica das contas cíclicas
do Ativo, ou seja, ambas têm o atributo de serem permanentes, deven-
do, por isso, ser consideradas como a opção primária do gestor para o
financiamento das contas cíclicas do Ativo.

5.3.1 Determinação da necessidade de capital de giro


Os processos que definem os ciclos nas empresas se renovam pe-
riodicamente. Ao mesmo tempo em que se recebe uma venda realizada
anteriormente, realizam-se novas vendas. Quando a matéria-prima é
utilizada na elaboração de um produto, o estoque é recomposto para
não haver interrupção de produção. Do lado do Passivo, a quitação de
uma dívida com os fornecedores dificilmente eliminará o saldo devedor
total, sem contar que, no dia do pagamento, a empresa pode estar reali-
zando uma nova compra com esse mesmo fornecedor ou com outro de
sua carteira de abastecedores de matéria-prima ou produtos prontos.

Esse processo é dinâmico e, por isso, para avaliação do desempe-


nho de qualquer tipo de empresa, devemos verificar a existência de
defasagem entre os prazos que fazem parte dos ciclos operacionais

Capital de giro 153


e financeiros. Se não estiverem adequados, podem comprometer sua
liquidez e rentabilidade, considerando-se a dinâmica de sua atividade.

Conforme já mencionamos, todas as contas do Balanço apresentam


relação com o tempo. Existem contas que apresentam uma movimenta-
ção mais lenta quando comparadas com determinadas rubricas, como o
caixa. Essas contas, quando analisadas do ponto de vista gerencial, apre-
sentam um caráter quase permanente. Já as contas com movimentação
mais acentuada apresentam características de giro.

Ao calcularmos a diferença entre as contas cíclicas do Ativo e as con-


tas cíclicas do Passivo, estamos, em essência, obtendo o valor de NCG.
Esse cálculo é feito da seguinte forma:

NCG = Ativo cíclico – Passivo cíclico

A NCG é influenciada por alguns fatores importantes. Para entendê-los,


precisamos relembrar o conceito gerencial de movimentação das contas
(fontes e aplicações), e não utilizar a formulação contábil baseada no siste-
ma de partidas dobradas. Entre esses fatores, destacamos:
1. Variação no volume de vendas

Sempre que as vendas sofrem algum tipo de variação para mais


ou para menos, o saldo dos estoques pode aumentar ou dimi-
nuir. Isso não acontece se o volume de vendas em determinado
período for exatamente igual à quantidade produzida ou com-
prada e o preço de venda for igual ao de compra. Sendo dife-
rente, como acontece na maioria das vezes, o saldo do estoque
aumentará ou diminuirá, e qualquer uma dessas variações im-
pacta o saldo da conta estoques e, consequentemente, a NCG.

2. Variação no prazo de vendas

Variações no prazo negociado com os clientes para o pagamento


dos produtos e/ou serviços ofertados pela empresa no mercado
afetam diretamente o saldo das contas a receber para mais ou
para menos, dependendo se a variação foi de aumento ou re-
dução do prazo. Essas variações no saldo das contas a receber
afetam diretamente as contas cíclicas do Ativo e, como conse-
quência, o valor de NCG.

3. Variação no prazo de compras

O prazo negociado com os fornecedores é uma questão crucial


para a manutenção da liquidez de qualquer tipo de empresa. Além

154 Finanças Corporativas


de representar uma forma de financiamento compatível com as
contas cíclicas do Ativo, o prazo recebido dos fornecedores, como
já indicamos, não tem custo financeiro associado. Sempre que esse
prazo varia para mais ou para menos, o saldo da conta fornecedo-
res, utilizada para refletir essa fonte de financiamento, também se
altera, impactando diretamente o saldo de NCG.

4. Variação no giro dos estoques

É bastante comum a percepção de que estoque representa di-


nheiro parado, conceito totalmente verdadeiro. Mas existe outra
questão igualmente importante. O saldo dos estoques, indepen-
dente de sua composição (matérias-primas, produtos em pro-
cesso ou produtos acabados), representa uma necessidade de
financiamento permanente. Isso significa que qualquer variação
no saldo dos estoques impacta diretamente a NCG, devendo ser
uma preocupação constante dos gestores da empresa.

Nesse ponto, é importante que tenhamos bem claras as diferenças


entre os conceitos de capital de giro e de NCG. O primeiro apresen-
ta uma situação de fato, refletindo como a empresa atendeu às suas
necessidades de crescimento, resultando numa estrutura na qual fo-
ram investidos recursos próprios ou de terceiros, adequados ou não.
O total de recursos necessários para manter a organização em funcio-
namento, de acordo com determinado fluxo financeiro e volume de
atividades, é definido pela NCG.

Além disso, não podemos esquecer que quanto mais a empresa cres-
ce, mais aumentam suas necessidades de recursos para financiar o giro
das contas operacionais, refletidas nas contas cíclicas do Ativo. É a partir
desse momento que começam as dificuldades das organizações, prin-
cipalmente das pequenas e médias, geralmente incapazes de calcular
quanto realmente necessitam para cobrir seus investimentos no giro.

5.3.2 Relação com os ciclos da empresa


Quaisquer modificações no macro ambiente econômico de atuação
da empresa acabam influenciando a NCG, que é extremamente sensí-
vel a esses fatores. Assim, a NCG a curto prazo para o lado certo (re-
dução) ou para o lado errado (aumento) sofre influência de alterações,
por exemplo, no prazo concedido pelos fornecedores, no aumento nos
estoques, nos prazos de venda, no nível de inadimplência etc.

Capital de giro 155


Sua estrutura, no entanto, depende essencialmente da natureza e
do ciclo de atividade dos negócios, afinal a característica operacional
da organização define o ciclo financeiro, enquanto o ciclo de atividade
é determinado pela cadeia de valor das vendas.

Para definirmos de modo correto qual deveria ser o nível adequado


de NCG de uma empresa, precisamos analisar alguns aspectos impor-
tantes relacionados às aplicações, que representam os maiores volu-
mes de investimento no giro dos negócios.

Considerando, entretanto, o conceito de NCG e sua formulação ma-


temática, percebemos com facilidade que o volume ideal sempre deve
ser negativo, representando uma sobra de recursos a custo financeiro
zero, o que permite a aplicação por parte da empresa para maximizar
seu retorno. Quanto mais negativo for o saldo de NCG, mais recursos
de financiamento a custo financeiro zero existem para a empresa apli-
car visando aumentar o retorno de seus proprietários.

Além disso, uma NCG com saldo negativo revela que os recursos
estão entrando no caixa da organização antes de sair, ou seja, o ciclo de
caixa ou financeiro da empresa é negativo. Isso representa a situação
ideal da gestão financeira, na qual primeiro recebe e depois paga.

Para que esse conceito fique bem claro, basta lembrar que tudo que
fazemos para reduzir o prazo dos estoques e das contas a receber e
Importante aumentar o prazo de pagamento, objetivando tornar o ciclo de caixa
negativo, significa reduzir o volume financeiro das contas a receber e
Toda empresa que tem ciclo de
caixa negativo (primeiro recebe dos estoques e aumentar o volume das fontes de financiamento obti-
e depois paga) apresenta NCG das junto aos fornecedores, colaboradores e impostos.
negativa (sobram recursos per-
manentes e com custo financeiro Para que entendermos a relação existente entre o conceito do ciclo
zero para o financiamento de sua de caixa ou financeiro e a NCG, vamos utilizar o exemplo a seguir.
operação).
Uma empresa está iniciando seu processo de planejamento finan-
ceiro para o próximo exercício, procurando, nessa fase, determinar
suas necessidades de capital de giro para o primeiro trimestre do ano.
Com base nas informações já projetadas, refletidas a seguir, e sabendo
que o estoque final projetado será igual ao estoque inicial, determine
qual será a NCG necessária ao suporte das atividades previstas para
o primeiro trimestre do próximo exercício social e o ciclo de caixa ou
financeiro para o período.

156 Finanças Corporativas


Figura 13
Exemplo de projeções para trimestre

Projeções para o próximo trimestre

Informações financeiras:
Vendas = $25.000
Custo dos produtos vendidos = $10.000
Consumo de matéria-prima = $ 8.000
Mão de obra = $ 2.000

Prazos médios:
Estoques = 60 dias
Recebimento = 90 dias
Pagamento compras = 45 dias
Pagamento mão de obra = 30 dias

Fonte: Elaborada pelo autor.

Vamos inicialmente calcular a NCG, com base na definição dos va-


lores para as contas cíclicas do Ativo e do Passivo. Para o exemplo,
os dados fornecidos permitem calcular os seguintes valores:
1. Contas a receber

Prazo médio de recebimento (PMR) = 90


Giro das contas a receber = Vendas ÷ Contas a receber
Giro das contas a receber = 25.000 ÷ Contas a receber
Período médio de recebimento (PMR) = 90 ÷ Giro das contas a
receber
90 = 90 ÷ (25.000 ÷ Contas a receber)
Contas a receber = $25.000,00

2. Estoques

Período médio de estoques (PME) = 60


Giro de estoques = Custo da mercadoria vendida ÷ Estoque
Giro dos estoques = 10.000 ÷ Estoque 12
Período médio de estoques (PME) = 90 ÷ Giro O custo da mercadoria vendida
12 representa a baixa dos estoques
60 = 90 ÷ (10.000 ÷ Estoque)
pela venda.
Estoques = $6.666,67

3. Fornecedores

Período médio de pagamento a fornecedores (PMP) = 45


Giro de fornecedores = Compras ÷ Fornecedores

Capital de giro 157


Período médio de pagamento a fornecedores (PMP) = 90 ÷ Giro
45 = 90 ÷ (8.000 ÷ Fornecedores)
Fornecedores = $4.000,00

4. Obrigações trabalhistas

Prazo médio de obrigações trabalhistas (PMOT) = 30


Giro de obrigações trabalhistas = Despesa com obrigações traba-
lhistas ÷ Obrigações trabalhistas a pagar
Giro de obrigações trabalhistas = 2.000 ÷ Obrigações trabalhistas
a pagar
Período médio de obrigações trabalhistas = 90 ÷ Giro
30 = 90 ÷ (2.000 ÷ Obrigações trabalhistas a pagar)
Obrigações trabalhistas a pagar = $666,67

Cálculo da NCG Valor ($)


Contas a receber 25.000,00
( + ) Estoques 6.666,67
( – ) Fornecedores <4.000,00>
( – ) Obrigações trabalhistas < 666,67>
Total 27.000,00

Ciclo de Caixa = Prazo médio de estoques (PME) + Prazo médio de


recebimento (PMR) – prazo médio de pagamento (PMP).

Como a empresa tem prazos de pagamentos diferentes, vamos pri-


meiramente calcular o prazo médio de pagamento (PMP) através de
uma média ponderada:

PMP = [(45 × 4.000) + (30 × 666,67)] ÷ (4.000 + 666,67) = 42,86 dias

A partir do cálculo do PMP, podemos determinar o Ciclo de Caixa


para o período:

Ciclo de Caixa = 60 + 90 – 42,86 = 107,14 dias

Repare que a NCG é positiva assim como o Ciclo de Caixa, compro-


vando que esses conceitos sempre indicam o mesmo sentido, ou seja,
quando um é positivo, o outro também.

158 Finanças Corporativas


5.4 Saldo de Tesouraria
Vídeo O retorno e os ganhos de uma empresa resultam, a priori, dos inves-
timentos realizados em Ativos permanentes. Por
essa perspectiva, pode-se considerar o capital de 13
13
giro como um preço pago para que a organização Não podemos esquecer que
o Passivo não circulante e o
possa investir no crescimento de seus negócios. Ele Patrimônio Líquido têm custos
deve ser conservado em um nível mínimo necessá- financeiros associados a sua
rio para suportar as operações e reduzir o risco de utilização.

iliquidez da empresa.

Já a NCG, quando negativa, indica a sobra de recursos permanen-


tes e sem custo financeiro associado que a empresa pode utilizar para
acelerar seu crescimento, por meio de investimento em capacidade de
produção. Por outro lado, quando o valor da necessidade é positivo,
a empresa está financiando suas necessidades permanentes de finan-
ciamento para o giro de sua atividade, com recursos onerosos de longo
prazo (empréstimos de longo prazo ou recursos dos sócios) ou de curto
prazo (empréstimos de curto prazo ou antecipação de recebíveis).

Quando uma empresa apresenta saldo positivo para a NCG, indi-


cando a necessidade de recursos de financiamento para as contas cí-
clicas do Ativo, e o saldo do capital de giro, embora positivo, é inferior
ao saldo da necessidade, dizemos que a empresa tem Saldo de Tesou-
raria negativo.
14
O Saldo de Tesouraria negativo indica que a em- 14
presa está financiando as necessidades de financia- Saldo de Tesouraria é o nome
de um conceito. Esse valor
mento para as contas cíclicas do Ativo com capitais não representa o saldo das
onerosos e de curto prazo, alternativa que pode tra- disponibilidades financeiras da
zer sérios riscos para sua continuidade no mercado, empresa.

caso não seja rapidamente alterada. Esse conceito,


de extrema importância, é calculado de duas formas
diferentes, mas que produzem resultados idênticos.

ST = CDG – NCG
ou

ST = Ativo errático – Passivo errático


Onde:
ST = Saldo de Tesouraria
CDG = Capital de giro
NCG = Necessidade de capital de giro

Capital de giro 159


Analisando a definição do Saldo de Tesouraria, podemos tomar em-
prestada a representação gráfica utilizada para ilustrar a NCG de modo
a exemplificar o que significa esse conceito.

Figura 14
Contas cíclicas, não cíclicas e erráticas

ATIVO CIRCULANTE PASSIVO CIRCULANTE


Contas Circulante financeiro: Circulante financeiro: Contas
erráticas • Caixa • Duplicatas descontadas erráticas
• Bancos • Empréstimos de curto prazo
• Aplicações a curto prazo
Circulante não financeiro:
Circulante não financeiro: • Fornecedores Contas
Contas • Contas a receber • Obrigações fiscais cíclicas
cíclicas • Estoques • Obrigações trabalhistas

PASSIVO NÃO CIRCULANTE


Contas não
• Empréstimos cíclicas
ATIVO NÃO CIRCULANTE • Financiamentos
Contas não • Contas a receber
cíclicas • Títulos a receber PATRIMÔNIO LÍQUIDO
• Investimentos • Capital Contas não
• Máquinas e equipamentos • Reservas cíclicas

Fonte: Elaborada pelo autor.


Lembrando mais uma vez que o circulante financeiro representa as
contas erráticas e o circulante não financeiro, as contas cíclicas, com
base nas formas de cálculo demonstradas para a determinação do va-
lor do Saldo de Tesouraria e analisando a estrutura de Balanço da Figu-
ra 14, algumas situações práticas que podem ocorrer no cotidiano das
empresas são representadas a seguir:
Figura 15
Cálculo do Saldo de ATIVO CIRCULANTE PASSIVO CIRCULANTE Capital de giro (CG)
Tesouraria Circulante financeiro: Circulante financeiro: CG = Patrimônio Líquido + Passivo não
circulante – Ativo não circulante
40 20
CG = 110 + 40 – 110 = 40

Circulante não financeiro: Necessidade de capital de giro (NCG)


Circulante não financeiro: NCG = Ativo cíclico – Passivo cíclico
30 NCG = 50 – 30 = 20
50
Saldo de Tesouraria (ST)
PASSIVO NÃO CIRCULANTE
ST = CG – NCG
ATIVO NÃO CIRCULANTE 40 ST = 40 – 20 = 20

PATRIMÔNIO LÍQUIDO Saldo de Tesouraria = AE – PE


110 ST = Circulante financeiro do Ativo –
110
Circulante financeiro do Passivo
ST = 40 – 20 = 20
Fonte: Elaborada pelo autor.

160 Finanças Corporativas


A análise da estrutura do Balanço da Figura 15 indica algumas
questões muito interessantes e que são muito comuns. Repare que a
empresa apresenta capital de giro positivo, o que, de acordo com o
conceito gerencial apresentado, reflete uma sobra de recursos de lon-
go prazo para o financiamento da operação dessa empresa, embora
com custos financeiros associados.

Já a NCG positiva indica que a empresa não consegue financiamento


das fontes permanentes de recursos e sem custo financeiro associado,
incluídas no circulante não financeiro (contas cíclicas do Passivo), para
suportar suas necessidades também permanentes refletidas nas con-
tas cíclicas do Ativo. O saldo positivo para a NCG aponta também que
o ciclo de caixa ou financeiro é positivo, refletindo um descasamento
entre os prazos passivos e ativos, ou seja, a empresa está efetuando
seus pagamentos antes do recebimento do produto de suas vendas.

No exemplo, ao associarmos os dois conceitos, ou seja, os saldos


do capital de giro e da NCG, refletidos no Saldo de Tesouraria, encon-
tramos um valor positivo. Em uma análise inicial, a existência de um
saldo positivo pode indicar que a empresa está em uma boa situação
financeira. No entanto, ao analisarmos os saldos das contas erráticas
que compõem o Saldo de Tesouraria e são refletidas no circulante fi-
nanceiro, podemos observar algumas questões muito importantes.

Em primeiro lugar, ao lembrarmos que todos os recursos obtidos


no Passivo e que apresentam custos financeiros têm esses custos re-
fletidos no custo de capital e que os recursos obtidos no Passivo estão
aplicados no Ativo, é fácil percebermos que a existência de saldos de
caixa implica custos financeiros associados. A não ser em situações ex-
cepcionais, a rentabilidade líquida de impostos e custos de administra-
ção, obtida nas aplicações financeiras, não excede o custo de capital
associado aos recursos existentes nas disponibilidades da empresa,
indicando que essas aplicações geram taxas de retorno inferiores ao
custo de capital. Essas disponibilidades, do ponto de vista contábil, são
refletidas nas contas caixa, bancos e aplicações financeiras.

Em segundo lugar, a existência de disponibilidades financeiras com


retorno inferior ao custo de capital, ao mesmo tempo em que a empre-
sa apresenta dívidas bancárias de curto prazo, demonstra uma situa-
ção muito comum, mas que traz perdas associadas significativas. Essas
perdas são geradas não só devido à aplicação de recursos a uma taxa

Capital de giro 161


inferior ao custo de capital, mas também pela manutenção de dívidas
bancárias que certamente apresentam um custo financeiro muito su-
perior às taxas de aplicação dos recursos existentes nas disponibilida-
des bancárias.

Isso ocorre com mais frequência do que deveria. É muito comum en-
contrarmos empresas com dívidas bancárias de curto prazo, ao mesmo
tempo que mantêm aplicações financeiras em volumes superiores às dí-
vidas. Certamente, nesses casos, os gestores financeiros estão esquecen-
do esses conceitos básicos. Caso se lembrassem deles, não temos dúvida
de que utilizariam as disponibilidades financeiras para quitar as dívidas
bancárias de curto prazo, e não para aplicá-las no mercado financeiro.

Outra situação muito comum, principalmente entre pequenas empre-


sas, é refletida a seguir, lembrando que não se trata de uma regra para esse
tipo de empresa, mas sim o reflexo de uma situação bastante comum.
Figura 16
Cálculo do Saldo de Tesouraria

ATIVO CIRCULANTE PASSIVO CIRCULANTE Capital de giro (CG)


Circulante financeiro: Circulante financeiro: CG = Patrimônio Líquido + Passivo não
50 circulante – Ativo não circulante
10
CG = 110 + 30 – 110 = 30

Circulante não financeiro:


Necessidade de capital de giro (NCG)
Circulante não financeiro:
10 NCG = Ativo cíclico – Passivo cíclico
80 NCG = 80 – 10 = 70
Saldo de Tesouraria (ST)
PASSIVO NÃO CIRCULANTE
ST = CG – NCG =
ATIVO NÃO CIRCULANTE
30 ST = 30 – 70 = –40

110 PATRIMÔNIO LÍQUIDO Saldo de Tesouraria (ST)


ST = Circulante financeiro do Ativo –
110 Circulante financeiro do Passivo
ST = 10 – 50 = –40
Fonte: Elaborada pelo autor.

Na estrutura dessa empresa, embora o capital de giro apresente um


resultado positivo, demonstrando uma sobra de recursos, essa sobra
tem custos financeiros associados, refletidos nos custos dos financia-
mentos de longo prazo e dos recursos investidos pelos sócios. Repare
que, conforme já explicamos, toda empresa que apresenta capital de
giro positivo também tem índice de liquidez corrente positivo, indican-
do que a empresa possui liquidez. No entanto, ao analisarmos a NCG e
o Saldo de Tesouraria, podemos chegar a conclusões totalmente dife-
rentes, conforme demonstramos a seguir.

162 Finanças Corporativas


A NCG também positiva demonstra o insucesso da empresa em ob-
ter financiamentos permanentes, idealmente, sem custos financeiros
associados, para o financiamento das aplicações permanentes do Ati-
vo refletidas nas contas cíclicas, indicando, como na estrutura anterior,
que a empresa apresenta ciclo de caixa ou financeiro igualmente posi-
tivo, efetuando pagamentos antes do recebimento.

Repare que, até agora, a situação dessa empresa é similar à anterior,


apresentando capital de giro e NCG igualmente positivos. O problema
ocorre quando associamos os dois conceitos e calculamos o Saldo de
Tesouraria. Ao realizarmos esse cálculo, encontramos um valor negati-
vo, o que muda completamente o entendimento sobre as duas empre-
sas com relação à sua liquidez.

Ao apresentar um valor negativo para o Saldo de Tesouraria, a se-


gunda empresa indica que o volume de suas disponibilidades é inferior
às suas dívidas bancárias de curto prazo, demonstrando que, se o ven-
cimento dessas obrigações fosse hoje, não haveria como liquidá-las.

Além disso, para tornar a situação ainda pior, uma das condições
fundamentais para que uma dívida seja saudável não está sendo aten-
dida, pois suas necessidades permanentes de financiamento refletidas
nas contas cíclicas do Ativo (circulante não financeiro) estão sendo fi-
nanciadas com recursos bancários de curto prazo, sendo que o prazo
médio dos financiamentos do Passivo não é superior ao prazo médio
das aplicações refletidas no Passivo, ou seja, a empresa está financian-
do necessidades permanentes de recursos com empréstimos de curto
prazo, situação muito comum em pequenas empresas.

Generalizando, na medida em que o capital de giro for menor do


que a diferença entre Ativos cíclicos e Passivos cíclicos, indicando insufi-
ciência de fundos para financiar a NCG a longo prazo, o Passivo errático
Livro
será maior do que o Ativo errático, refletindo que a empresa financia
O livro Administração do
parte da NCG com fundos onerosos de curto prazo, sinal claro de iliqui- capital de giro apresenta
dez, caso esse cenário não sofra alteração em prazo muito curto. de maneira conceitual,
com inúmeros exemplos
Se, ao contrário, essa diferença for positiva, a empresa disporá de práticos, a dinâmica do
capital de giro e os con-
fundos para aplicação em instrumentos de liquidez no mercado finan- ceitos da NCG e do Saldo
ceiro como forma de aumentar a margem de segurança financeira e de Tesouraria.

reduzir o risco financeiro. É importante frisar que, se o saldo de Tesou- ASSAF NETO, A.; SILVA, C. A. T. São
Paulo: Atlas, 2010.
raria for positivo e elevado, embora a empresa disponha de fundos
que possam ser aplicados momentaneamente no mercado financeiro,

Capital de giro 163


aumentando sua margem de segurança financeira, isso não significa
necessariamente que ela esteja em uma situação desejável, em função
da diferença entre a taxa de retorno das aplicações financeiras e o cus-
to de capital da empresa.

Além desse ponto muito importante, ao analisar a organização,


o mercado pode interpretar que os gestores, na verdade, não estão
aproveitando as oportunidades de investimento na atividade opera-
cional da empresa, oportunizadas por sua estrutura financeira. Nesse
caso, o Saldo de Tesouraria é aumentado devido à falta de uma estra-
tégia dinâmica de investimentos.

O Saldo de Tesouraria positivo, negativo ou igual a zero deve sem-


pre ser analisado com base nos saldos das contas erráticas. Analisando
esses saldos, podemos ter uma visão correta. Mesmo quando o saldo
for positivo, ainda assim o resultado pode não ser um sinalizador de
que a situação econômico-financeira da empresa é saudável.

Sempre que a empresa apresentar Saldo de Tesouraria negativo


(BRASIL; BRASIL, 2001), ela estará sob o Efeito Tesoura, consequên-
cia do descontrole no crescimento da dependência de empréstimos de
curto prazo, captados para financiar a NCG. Graficamente, o Efeito Te-
soura pode ser representado da seguinte forma:

Figura 17
Representação do Efeito Tesoura

$
Necessidade de
capital de giro

EFEITO TESOURA

Capital de
ciro

Tempo
Fonte: Elaborada pelo autor.

A excessiva dependência de empréstimos de curto prazo torna a


liquidez da empresa um fator crítico para a continuidade de suas ope-
rações. Qualquer redução no limite de crédito da empresa, como con-

164 Finanças Corporativas


sequência da redução do crescimento econômico ou do aumento das
taxas de juros, por exemplo, pode levá-la a uma situação de insolvência
pelo atraso no pagamento de suas obrigações refletidas no Passivo.

O Efeito Tesoura, segundo Fleuriet e Zeidan (2015), é consequência


de um Saldo de Tesouraria crescentemente negativo e percebido quan-
do a empresa está operando com capital de giro insuficiente para fi-
nanciar a NCG. Por esse motivo, é preciso financiar essa diferença com
empréstimos onerosos e de curto prazo.

Generalizando, podemos dizer que o Efeito Tesoura ocorre sempre


que uma empresa apresentar capital de giro menor do que a NCG. O
gestor financeiro deve sempre ficar atento a isso, uma vez que, com
o crescimento das atividades, a tendência é aumentar essa diferença.

Deve ficar muito claro ao gestor financeiro que, para reduzir o risco
de insolvência da empresa, é necessário, em primeiro lugar, empregar
todas as possibilidades existentes para tornar a NCG e, consequente-
mente, o ciclo de caixa ou financeiro negativos. Se isso não for possí- Atividade 3
vel, o gestor deve evitar a dependência de empréstimos de curto prazo
O que é o Efeito Tesoura?
para financiar o saldo positivo da NCG.

A dependência de financiamentos a curto prazo para financiar a


NCG é ainda mais grave quando o governo, por meio do Banco Central,
restringe os níveis de crédito no mercado, levando os bancos a não re-
novarem os empréstimos e/ou fazê-los a custos financeiros crescentes,
tornando crítica, como consequência, a liquidez da empresa.

Outra forma de entendimento para o Efeito Tesoura é lembrarmos


que ele ocorre quando a empresa financia a maior parte de sua NCG
por meio de recursos onerosos e de curto prazo. É muito comum ob-
servarmos a existência desse Efeito Tesoura em decorrência de:
1. Crescimento muito rápido nas vendas, sendo que aumentos nas
vendas podem ocorrer por redução de preço, aumento de preço,
aumento no prazo de vendas ou pela ocorrência simultânea de
todas essas condições. Qualquer que seja o motivo, o efeito desse
aumento afetará o nível de estoques e das contas a receber,
impactando a NCG e o ciclo de caixa ou financeiro.

Esses efeitos só não ocorrerão se todas as vendas realizadas pela


empresa ocorrerem à vista e os estoques forem consignados,
modalidade em que os estoques não pertencem à empresa, mas

Capital de giro 165


sim aos fornecedores, portanto não precisam ser financiados por
seu Passivo.

2. Descompasso entre as relações:

15 •• Custo de capital × (NCG ÷ Vendas);


15
Esses indicadores devem ser •• Lucro líquido ÷ Vendas .
expressos em percentagem.
Para sabermos por que esse descompasso é um problema, va-
mos primeiramente entender o significado dessas relações. A
primeira indica, para cada R$1,00 de crescimento nas vendas,
o quanto aumentará a NCG. Ao multiplicarmos esse valor pelo
custo de capital, temos uma aproximação do custo financeiro
desse crescimento. A segunda reflete a rentabilidade líquida so-
bre vendas da empresa, demonstrando, para cada R$1,00 de ven-
das, qual foi a rentabilidade final para os sócios.
Sempre que a empresa apresentar NCG positiva, uma forma de
financiá-la sem gerar efeitos sobre as disponibilidades e, conse-
quentemente, sobre a liquidez é por meio da utilização de recursos
dos sócios. Para que isso aconteça, é necessário que a rentabilida-
de líquida sobre vendas seja superior ao custo financeiro associa-
do ao aumento da NCG, com base no crescimento das vendas.

3. Utilização de recursos para expansão do Ativo permanente ou


aquisição de outros negócios por meio de recursos captados de
fontes de curto prazo.

Sem dúvida, essa é uma alternativa que o gestor jamais deveria


utilizar. O crescimento vegetativo da empresa, por meio da ex-
pansão de seus Ativos permanentes ou em maior velocidade e
da aquisição de outras empresas, deve ser financiado com recur-
sos de longo prazo, oriundos de financiamento bancário de longo
prazo e/ou aumento de capital adquirido junto aos sócios.
Uma das regras fundamentais para que uma empresa cresça de
maneira sustentável é manter seu prazo médio de pagamento
inferior ao prazo médio de recebimento. Compras de máquinas,
equipamentos, instalações e novas empresas são aplicações em
que o retorno acontece em velocidade mais lenta do que as apli-
cações realizadas no giro da operação e, por esse motivo, devem
ser financiadas com prazos compatíveis. Contudo, essa regra
nem sempre é seguida e essa situação é muito mais comum do
que deveria, com os resultados que todos nós conhecemos.

166 Finanças Corporativas


Normalmente, o Efeito Tesoura ocorre com maior frequência du-
rante a fase inicial dos negócios, quando as empresas crescem rapi-
damente e demandam um volume significativo de recursos para o
financiamento das suas contas a receber e do crescimento dos esto-
ques, fruto da maior reposição, em função do crescimento das ven-
das. Em períodos de recessão, quando os estoques atingem patamares
mais elevados, decorrentes de quedas nas vendas, o Efeito Tesoura
também se faz presente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O crescimento de qualquer tipo de empresa depende do aumento de
seu endividamento junto aos sócios e aos financiadores sem participação
no capital social. Uma das regras básicas para esse crescimento ocorrer
de maneira saudável é que o prazo médio do Passivo seja superior ao
prazo médio do Ativo, permitindo que a empresa receba o resultado da
venda de seus produtos e/ou serviços antes de efetuar o pagamento das
obrigações assumidas junto ao Passivo.
Para que possa confirmar se esse crescimento está sendo feito da
maneira correta, a empresa tradicionalmente utiliza o conceito do capital
de giro, definido como a diferença entre o Ativo circulante (recebimentos
de curto prazo) e o Passivo circulante (obrigações de curto prazo). Utiliza
também um indicador chamado índice de liquidez corrente, calculado com
base na divisão do Ativo circulante pelo Passivo circulante. Se esse resul-
tado gerar um valor superior à unidade, isso significa que a empresa é
detentora de liquidez.
Normalmente, empresas que apresentam capital de giro superior à
unidade são utilizadas como exemplo de organizações com uma situação
financeira boa. Por essa análise, a recíproca também é verdadeira, ou seja,
se o capital de giro for inferior à unidade, essa empresa seria caracteriza-
da como um exemplo de má situação financeira. Ainda dentro desse tipo
de análise, não devemos esquecer que se o capital de giro for positivo,
o índice de liquidez corrente será superior à unidade. Portanto, se enten-
dermos essa análise como correta, não há necessidade de calcularmos os
dois indicadores, bastando apenas o cálculo de um deles.
A questão fundamental é que a gestão da operação da empresa não
se faz pelo capital de giro, e sim pela NCG. Para utilizar esse conceito, vi-
mos que precisamos primeiramente entender o Balanço da empresa de

Capital de giro 167


modo diferente. Nesse sentido, transformamos as contas expressas no
grupamento tradicional entre Ativo circulante e não circulante, no Ativo, e
Passivo circulante, Passivo não circulante e Patrimônio Líquido, no Passi-
vo, em contas cíclicas, não cíclicas e erráticas.
As contas cíclicas do Ativo representam o resultado da atividade ope-
racional da empresa e são expressas nas contas a receber, refletindo a
atividade comercial do negócio e os estoques, resultado de toda a mo-
vimentação de matérias-primas, produtos em processo, produtos aca-
bados para a indústria, produtos acabados para o comércio e mão de
obra operacional, no caso das empresas de prestação de serviços. Cla-
ro que o entendimento da mão de obra operacional, ou seja, dos gas-
tos com salários e encargos, como item de estoque para as empresas
de prestação de serviços é feito com base em um conceito gerencial, e
não contábil. É importante frisar que se houver outras contas com a ca-
racterística de permanência, elas também devem ser consideradas como
contas cíclicas do Ativo.
No Passivo, utilizando essa mesma classificação, temos as contas ca-
racterizadas como fontes permanentes de recursos e que, além desse
atributo, não apresentam custos financeiros associados. Essas contas
refletem os financiamentos recebidos dos fornecedores em função das
compras a prazo, dos valores dos salários e dos encargos sociais – que,
por não serem pagos todos os dias, caracterizam-se como fontes de fi-
nanciamento – e impostos federais, estaduais e municipais. Todas essas
contas representam financiamentos espontâneos recebidos pela em-
presa, embora não se limitem apenas a esses exemplos. Em função das
características da empresa e de seu mercado de atuação, podem existir
outros itens de financiamento com as mesmas características.
A diferença entre as contas cíclicas do Ativo e do Passivo representa
a NCG, indicador que demonstra efetivamente o valor das necessidades
de financiamento para o giro da atividade quando positivo, ou a sobra de
recursos permanentes e sem custo financeiro, disponíveis para a empre-
sa reinvestir nas alternativas de crescimento do negócio, refletidas nas
máquinas, nos equipamentos e nas instalações.
Esse conceito, da maior importância, reflete, do ponto de vista de valor, o
ciclo de caixa ou financeiro, expresso em tempo. Sempre que uma empresa
apresentar NCG negativa, indicando que existe uma sobra de recursos per-
manentes e sem custo financeiro associado, o ciclo de caixa ou financeiro
também será negativo, demonstrando que a empresa recebe o valor das
vendas de produtos e/ou serviços realizados antes de efetuar o pagamento
das obrigações assumidas para financiar suas operações. Do ponto de vis-

168 Finanças Corporativas


ta financeiro, além de refletir uma vantagem estratégica fundamental para
qualquer tipo de empresa, esse fato é uma condição para que a empresa
possa maximizar a geração de caixa, condição básica para que o gestor
maximize o retorno do investimento de seus proprietários.
O resultado da administração do capital de giro e da NCG é quantifi-
cado no Saldo de Tesouraria, indicador que deve sempre ser analisado
com muito cuidado, com base no saldo das contas erráticas do Ativo e do
Passivo. No entanto, sempre que o saldo for negativo, a empresa estará
sob Efeito Tesoura, indicador que demonstra que as contas permanentes
do Ativo estão sendo financiadas com recursos financeiros onerosos e de
curto prazo.

REFERÊNCIAS
ASSAF NETO, A.; SILVA, C. A. T. Administração do capital de giro. São Paulo: Atlas, 2010.
BRASIL, H. V.; BRASIL, H. G. Gestão financeira das empresas: um modelo dinâmico. Rio de
Janeiro: QualityMark, 2001.
FLEURIET, M.; KEHDY, R.; BLANC, G. O Modelo Fleuriet: a dinâmica financeira das empresas
brasileiras. 6. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003.
FLEURIET, M.; ZEIDAN, R. O modelo dinâmico de gestão financeira. Rio de Janeiro: Alta Books,
2015.

GABARITO
1. São contas existentes no Ativo e no Passivo da empresa que apresentam característica
de existência contínua. As contas cíclicas do Ativo representam aplicações realizadas
continuamente em função de sua atividade, independente dos saldos, que constan-
temente estão aumentando e diminuindo devido aos prazos e que, por esse motivo,
precisam ser consideradas pelo gestor como itens que devem ser financiados com re-
cursos também permanentes. As aplicações de recursos que mais comumente apre-
sentam essa característica são as contas a receber e os estoques.

As contas cíclicas do Passivo representam formas de financiamento permanentes


para as operações da empresa. Essas contas que sempre existem permitem dispor
de recursos para financiar suas operações em condições de prazo e custo muito in-
teressantes. As contas mais comuns são fornecedores, salários e encargos sociais,
bem como os impostos. Essas contas, além de apresentarem característica de per-
manência, não envolvem custos financeiros onerosos, devendo ser priorizadas para o
financiamento das contas cíclicas do Passivo.

2. As contas não cíclicas refletem, do lado do Ativo, os investimentos que, para come-
çar a dar retorno, levam um tempo muito superior ao das contas cíclicas e, portanto,
têm que ser financiados com prazos adequados. Do lado do Passivo, representam os
financiamentos obtidos para o crescimento da empresa, captados junto aos sócios e
aos financiadores de longo prazo sem participação no capital social. Do lado da apli-
cação, ou seja, do Ativo, representam os investimentos, principalmente em máquinas,
equipamentos e instalações, e as vendas realizadas a longo prazo.

Capital de giro 169


Diferentemente das contas cíclicas, as não cíclicas não se renovam o tempo todo,
apresentando retornos mais longos. As contas do Ativo representam as aplicações em
máquinas, equipamentos e instalações que a empresa utiliza para gerar mais produ-
tos e serviços para venda. As contas não cíclicas do Passivo são utilizadas para finan-
ciar de maneira adequada, do ponto de vista do prazo, as aplicações de longo prazo
da empresa, expressas nas contas não cíclicas do Ativo.

3. O Efeito Tesoura acontece sempre que ocorre descontrole no crescimento da depen-


dência de empréstimos de curto prazo, captados para financiar a necessidade de in-
vestimento permanente na atividade operacional da empresa, refletida na NCG. É con-
sequência de um Saldo de Tesouraria crescentemente negativo, ou seja, a empresa
está operando com capital de giro insuficiente para financiar a NCG. Por esse motivo,
precisa financiar essa diferença com empréstimos onerosos e de curto prazo. Sempre
que uma empresa apresentar capital de giro menor do que a NCG, o Efeito Tesoura
ocorrerá. O gestor financeiro deve sempre ficar atento a isso, uma vez que, com o
crescimento das atividades, a tendência é aumentar essa diferença.

170 Finanças Corporativas


6
Alavancagem e risco
Alavancas são tipos de máquinas normalmente muito simples, usa-
das para ampliar a força aplicada sobre um objeto qualquer, com base
na relação entre o ponto no qual a força foi empregada e o apoio da
alavanca. Sua origem, segundo historiadores, data do século III a.C. e é
1
atribuída a Arquimedes , assim como a famosa frase: “deem-me uma
alavanca e um ponto de apoio e eu deslocarei o mundo”.
Essa ideia também pode ser aplicada nas empresas por meio de
elementos que, na prática, funcionam como verdadeiras alavancas,
muitas vezes, sem que o gestor sequer perceba. Assim como no con-
ceito, o efeito da alavancagem pode multiplicar os ganhos e as perdas,
com base nas decisões tomadas pelos gestores no processo de admi-
nistração de qualquer tipo de negócio.
Visto que a alavancagem permite multiplicar o ganho ou a perda
da empresa (lembrando que risco e retorno caminham sempre na
mesma direção, ou seja, quanto maior o retorno, maior o risco, e vice-
-versa), sua utilização funciona como uma espécie de barganha entre
o retorno desejado pelo gestor para maximizar o retorno dos proprie-
tários da empresa e o risco necessário para alcançar essa finalidade.
Para o gestor, a administração de qualquer tipo de negócio significa
que, se a empresa deseja um retorno maior, terá que incorrer em riscos
maiores. Uma das formas para atingir esse objetivo é baseada no aumen-
to do grau de alavancagem da empresa. No entanto, uma questão que o
gestor não pode, em nenhum momento, esquecer é que alavancagens
maiores significam uma incerteza igualmente maior quanto ao futuro.
Significam também, por outro lado, a possibilidade de um retorno maior.
Entender o fundamento na relação entre o risco e o retorno (base
para entender o conceito da alavancagem), sua ligação com os custos
fixos e variáveis existentes nas relações operacionais e financeiras da
empresa e o efeito no ponto de equilíbrio (elemento muito importante
para entendermos graficamente o risco operacional, financeiro e com-
binado da empresa) é o objetivo deste capítulo.

1
Frequentemente considerado um dos maiores matemáticos de todos os tempos, Arquimedes nasceu na Sicília,
Itália, em 287 a.C. Foi matemático, físico, engenheiro, inventor e astrônomo.

Alavancagem e risco 171


6.1 Custos Fixos, Variáveis e Ponto de Equilíbrio
Vídeo Toda atividade, nas mais diversas áreas em qualquer tipo de negó-
cio, requer recursos para financiar sua execução. Esses recursos são
utilizados para cobrir os gastos com todas as atividades destinadas à
fabricação, elaboração ou obtenção de bens e serviços que a empre-
sa oferece aos clientes, desde matéria-prima, mão de obra, insumos
e outros gastos para a sua produção até os impostos sobre a venda,
bem como os demais gastos necessários à entrega efetiva do que foi
adquirido pelo cliente.

Partindo dos gastos incorridos para ofertar um produto e/ou servi-


ço ao mercado, as empresas, no passado, definiam o preço com base
nos custos apurados, agregando a esses valores a margem de lucro que
pretendiam obter como forma de remuneração para seus proprietários.

Hoje em dia, com a globalização dos mercados, a velocidade da in-


formação, que tornou possível a comparação instantânea de preços e
a redução das taxas inflacionárias, permitindo o estabelecimento de
padrões de comparação entre produtos e serviços, mudou completa-
mente a forma utilizada para a determinação dos preços de venda de
produtos ou serviços, a ponto de não haver mais qualquer semelhança
com os processos antigamente empregados.

Os preços hoje são definidos, na realidade, com base na percepção


de valor atribuído pelo mercado. Se uma empresa deseja obter uma
determinada margem de ganho, deverá, partindo do preço que o mer-
cado concorda em pagar e da margem que pretende obter, determinar
qual deverá ser o custo do produto que permitirá obter a margem de
lucro desejada. Essa regra só não é percebida para as empresas que
atuam de maneira monopolista ou como oligopólio.

Caso a empresa não esteja enquadrada em uma dessas categorias,


o gestor terá que optar pelas seguintes alternativas:
•• reduzir o custo do produto para poder praticar a margem de lu-
cro pretendida;
•• reduzir a margem de lucro, caso não possa reduzir o custo do
produto ou serviço;
•• utilizar, ao mesmo tempo, as duas alternativas anteriores;
•• modificar o produto para torná-lo não comparável;

172 Finanças Corporativas


•• praticar a maior margem que o mercado aceitar;
•• retirar o produto do mercado.

Por esse motivo, os custos passaram a ter uma importância funda-


mental para o sucesso de qualquer negócio, fazendo com que os admi-
nistradores passassem a analisar essa questão com bastante atenção. A
área da contabilidade responsável por esse estudo é denominada Con-
tabilidade de Custos, a qual apresenta, nos últimos tempos, importância
crescente no processo de administração dos negócios de uma empresa.

Além disso, o custo incorrido pela empresa para a disponibilização de


um produto ou serviço no mercado impacta diretamente a qualidade per-
cebida pelo cliente, cada vez mais exigente e com mais informação para
fazer comparações, o que afeta diretamente seus resultados operacionais.

Considera-se como ideal que a empresa opere sempre com o menor


nível de custos possível. No entanto, toda vez que tiver que cortar cus-
tos, o gestor deve refletir profundamente sobre o que eliminar. A análise
mais importante não é necessariamente cortar o item mais caro, de
maior peso na estrutura, mas sim reduzir todo e qualquer custo que não
afete a percepção de valor do produto ou serviço para o cliente.

Uma questão importante, com relação ao conceito de custos, se-


gundo Pereira e Bispo (2019), é que custo somente é reconhecido no
momento de sua utilização, ou seja, quando é consumido no proces-
so de produção de outro bem ou serviço ou entregue ao cliente final.
Em termos conceituais, os principais tipos de custos existentes na es-
trutura de qualquer empresa podem ser classificados em custos fixos e
custos variáveis, os quais são descritos a seguir.

6.1.1 Custos variáveis


Os custos variáveis compreendem todos os valores que podem ser
identificados diretamente com a atividade operacional da empresa ou
a venda de bens e/ou serviços ligados à sua atividade fim. Por definição
contábil, eles só existem quando a empresa está atuando em seu mer-
cado, ou seja, quando apresenta atividade operacional.

Uma medida muito utilizada na avaliação econômico-financeira de


uma empresa é a margem de lucro gerada por meio da dedução dos
custos variáveis sobre as vendas. Essa métrica, chamada de margem de
contribuição, é definida pela seguinte equação:

Alavancagem e risco 173


MC = RT – CV

Onde:
MC = Margem de contribuição
RT = Receita total líquida
CV = Custo variável total

Lembrando que, com base na margem de contribuição, ainda é ne-


cessário deduzir os custos fixos para chegar ao resultado final da em-
presa. Do ponto de vista econômico, podemos afirmar que qualquer
tipo de organização define sua viabilidade operacional com base no
cálculo da margem de contribuição. Uma empresa que apresente sis-
tematicamente uma margem de contribuição menor do que os custos
fixos não tem possibilidade de ser viável do ponto de vista econômico.

A análise da margem de contribuição apresenta questões muito


importantes e que podem ser entendidas como vantagens e desvan-
tagens. Para muitos analistas, margens de contribuição elevadas só
apresentam vantagens. Entre os gestores, é muito comum o entendi-
mento a seguir:
•• Quanto maior a margem de contribuição:

•• maior a capacidade da empresa em bancar seus custos fixos


operacionais e financeiros;
•• maior a capacidade de investir no desenvolvimento de seu
processo produtivo;
•• menor o risco relacionado a flutuações nos preços de venda,
queda de demanda e aumento nos custos variáveis.
No nosso entender, no entanto, também existe uma desvantagem
importante, que deve ser levada em consideração pelos gestores.
•• Quanto maior a margem de contribuição:

•• maior o risco relacionado à entrada de novos concorrentes


2 no mercado de atuação da empresa, atraídos pela margem
Não por outro motivo, muitas elevada, resultando em pressões de redução sobre os preços
empresas trabalham com mar- e, consequentemente, sobre as margens 2 .
gens de lucro unitárias muito
reduzidas, mas com grandes vo- Por essa razão, em uma primeira análise dos custos da empresa,
lumes de vendas, utilizando esse podemos dizer que o risco de qualquer tipo de negócio aumenta ou
volume como uma barreira de
entrada para seus concorrentes
diminui em função da capacidade de a empresa administrar adequa-
damente seu nível operacional e, a partir daí, gerar maior ou menor
margem de contribuição.

174 Finanças Corporativas


O aumento da margem de contribuição ocorre por meio da melho-
ria do processo produtivo da empresa. Investir permanentemente no
desenvolvimento ou na aplicação de novas tecnologias de produção e
no melhoramento da tecnologia dos processos utilizados é uma ques-
tão muito importante para o gestor e que garante o crescimento da em-
presa na atualidade.

Hoje, os processos são aperfeiçoados e se modificam constante-


mente, com velocidade cada vez maior. Se a empresa não estiver aten-
ta, poderá ser surpreendida pelo concorrente com produto melhor Importante
e mais barato, fruto de novos processos logísticos e de produção, os
Conceitualmente, os custos
quais geram mais valor para o comprador. variáveis se alteram no total,
e não por unidade, ou seja, os
Por apresentarem, como característica, saldos que variam em fun-
custos variáveis são fixos por
ção do nível de produção ou da venda, do ponto de vista econômico, unidade.
os custos variáveis são constantes quando analisados por unidade.
Em sua totalidade, os custos variáveis podem aumentar ou diminuir
em relação ao custo total.

6.1.2 Custos fixos


Os custos fixos são resultantes da qualidade da administração das
atividades de suporte da empresa, entre as quais destacamos: finanças,
contabilidade, vendas, marketing e recursos humanos. Representam os
gastos com atividades não relacionadas diretamente com a produção,
ou a venda, ocorrendo independente do nível de atividade da empresa.

Esses custos são gastos que podem oscilar, mas não em função do Importante
volume de produção ou de vendas. Como exemplos desses gastos, po-
Conceitualmente, os custos fixos
demos incluir o aluguel de instalações, os juros e os salários da área não se alteram no total, mas sim
administrativa, itens que ocorrem independente do volume de vendas por unidade, ou seja, os custos
fixos são variáveis por unidade.
ou de produção.

Os custos fixos apresentam características muito importantes. Em pri-


meiro lugar, esse tipo de custo não varia no total, sendo função da estrutura
existente na empresa. Repare que essa afirmativa fornece a falsa ideia de
que o custo fixo é sempre igual. Na realidade, essa modalidade de custos
somente é fixa em um intervalo de tempo relevante, podendo aumentar ou
diminuir com base em uma série de fatores que impactarão seu volume.

Para ilustrar essa questão, vamos utilizar como exemplo o aluguel.


Ao longo do mês, esse valor não se altera, ou seja, é fixo, igual em todos

Alavancagem e risco 175


os dias do mês. No entanto, ao terminar um mês e começar o seguinte,
o valor do aluguel pode se manter igual ou aumentar em função do
Importante reajuste pactuado com o proprietário do bem que está sendo alugado.

Quanto maior o volume de Uma segunda característica muito importante relacionada aos custos
custos fixos, maior o nível de fixos diz respeito à sua importância com relação à obtenção do resultado
vendas necessário para cobri-los,
uma vez que sua cobertura se final da empresa. Se pensarmos nesse resultado como a diferença entre
faz por meio da margem de a margem de contribuição e os custos fixos, podemos dizer que eles re-
contribuição, diferença entre as presentam o custo mais importante na estrutura da empresa, definindo
receitas totais e o custo variável
total. a capacidade de ela atingir ou não resultados positivos.

Os gastos totais existentes na estrutura de uma empresa são defini-


dos pelos custos variáveis, dependentes do grau de tecnologia e qualida-
de da gestão da produção, e pelos custos fixos, resultantes da qualidade
da administração das atividades de suporte à atividade fim da empresa.

6.1.3 Ponto de equilíbrio


O risco econômico de qualquer empresa está intimamente ligado
ao nível em que atinge o equilíbrio entre os gastos totais e as receitas
totais, o qual é chamado de ponto de equilíbrio. O cálculo do ponto de
equilíbrio demonstra o nível de faturamento necessário para que a em-
presa cubra os seus gastos e comece a gerar lucros.

Empresas com ponto de equilíbrio baixo são mais seguras, con-


seguem enfrentar queda de vendas e aumento de custos sem atingir
situação de prejuízo. Já aquelas com ponto de equilíbrio elevado são
bastante sensíveis a flutuações nas condições de mercado.

O ponto de equilíbrio é obtido por meio da seguinte equação:

PE = CF ÷ (MC ÷ RT)

Onde:
PE = Ponto de equilíbrio
CF = Custo fixo
MC = Margem de contribuição
RT = Receita total

Se não tivermos acesso às informações de uma empresa relaciona-


das aos seus custos fixos e variáveis, a determinação do ponto de equi-
líbrio pode ser obtida por meio do demonstrativo de lucros e perdas,
utilizando como premissa básica o custo da mercadoria vendida como
custo variável e as despesas operacionais como custos fixos.

176 Finanças Corporativas


Do ponto de vista gráfico, o ponto de equilíbrio é representado da
seguinte forma:

Figura 1
Representação do ponto de equilíbrio
Vendas totais
Vendas

Custos totais

PE

$Y

Custos fixos

X
Capacidade de produção
Fonte: Elaborada pelo autor.

Analisando o gráfico da Figura 1, podemos verificar que, se a em-


presa estiver produzindo a quantidade X e obtendo o faturamento $Y,
estará no ponto de equilíbrio, ou seja, no ponto em que as receitas
totais são iguais aos custos totais, indicando que, nesse ponto, o lucro
é zero. Por outro lado, o prejuízo também é zero.

Repare que, se a quantidade produzida for superior a X ou o volume de


vendas for maior do que $Y, a empresa estará em uma zona de lucro, pois
qualquer ponto superior à quantidade X e ao faturamento $Y é uma zona
de lucro. Da mesma forma, para quantidades produzidas inferiores a X e
volumes de vendas menores do que $Y, a empresa apresentará prejuízo.

Por esse conceito, quanto maior a diferença para os pontos X e Y


marcados no gráfico, maior o lucro que a empresa pode obter. O con-
trário também vale, isto é, quanto menor for o volume de produção
quando comparado com o ponto X e o montante das vendas quando
comparado ao ponto Y, maior o prejuízo da empresa.

Apesar de ser um instrumento de análise muito importante, tanto


pela simplicidade dos conceitos utilizados quanto pela facilidade de vi-
sualização gráfica, a análise do desempenho de uma empresa por meio
do ponto de equilíbrio deve levar em consideração a existência de algu-
mas limitações importantes.

Alavancagem e risco 177


1. Suposição de linearidade

A primeira limitação diz respeito à suposição de linearidade na re-


presentação dos custos e da receita. Normalmente, a partir de cer-
to ponto, aumentos de receita ocorrem com base em reduções no
preço unitário do produto, que significa a representação gráfica da
receita por meio de uma curva, e não de uma reta, retirando dessa
variável a suposição de linearidade.
Da mesma forma, o custo operacional por unidade tende a crescer
à medida que a empresa se aproxima do limite de sua capacidade
de produção. Isso pode resultar em reduções na eficiência da mão
de obra e, por extensão, em aumentos de horas extras, o que eli-
mina a suposição de linearidade também nos custos operacionais.

2. Natureza do curto prazo

A análise do ponto de equilíbrio não leva em consideração os


custos incorridos, que beneficiarão períodos futuros. Assim, uma
despesa elevada em propaganda ou em pesquisa e desenvolvi-
mento, por exemplo, afetará negativamente o ponto de equilíbrio
no exercício em que incorrer, sem demonstrar, no entanto, os be-
nefícios que poderão existir no futuro em termos de crescimento
das receitas e/ou redução de custos, o que poderá reduzir o nível
de equilíbrio.

3. Classificação dos custos operacionais

Entre os custos classificados como variáveis, existem alguns que, na


realidade, têm um comportamento fixo ao longo de certas faixas
de volume de produção ou de vendas, embora variem entre elas.
Essa dificuldade pode distorcer o cálculo do ponto de equilíbrio ao
classificarmos incorretamente os custos entre fixos e variáveis.

Outra questão importante sobre o cálculo do ponto de equilíbrio


está relacionada ao crescimento desse indicador. Normalmente, dize-
mos que quanto maior o volume do ponto de equilíbrio, maior o risco
da empresa. Isso ocorre porque o aumento desse índice reflete a ne-
cessidade de aumento nas vendas, garantia que não existe para ne-
nhuma empresa, à exceção dos monopólios.

No entanto, ao compararmos o valor do ponto de equilíbrio com


o valor das vendas efetivadas, podemos verificar em qual patamar
de vendas está ocorrendo o equilíbrio entre as despesas totais e

178 Finanças Corporativas


as vendas. Quanto maior esse indicador, em patamar mais elevado
ocorrerá o equilíbrio entre despesas e receitas quando comparado
às vendas ocorridas.

O contrário também é verdadeiro, ou seja, se esse indicador diminui


de um período para o outro, mesmo em um cenário de aumento do
ponto de equilíbrio, essa redução indica que a empresa está melhoran-
do, e não piorando. Esse indicador é calculado da seguinte forma:
Atividade 1
Ponto de equilíbrio ÷ Vendas brutas Por que o aumento do ponto de
equilíbrio pode ser entendido
Para tornar ainda mais claro o conceito do ponto de equilíbrio, va- como o aumento do risco da
mos utilizar o seguinte exemplo: uma empresa em fase inicial de pro- empresa?
cesso de planejamento financeiro para o próximo exercício resolveu,
como primeiro passo, analisar o desempenho apresentado nos últimos
três anos, conforme apresentado a seguir:

Tabela 1
Desempenho da empresa nos últimos três anos

Itens Ano 1 Ano 2 Ano 3


Vendas (unidades) 12.540 14.450 17.250

Preço unitário de venda ($) 2,30 2,45 2,90

Custo variável unitário ($) 1,20 1,30 1,45

Custos fixos ($) 12.200,00 17.200,00 19.500,00

Fonte: Elaborada pelo autor.

Sendo você o responsável pela análise e utilizando os conceitos de


custos fixos, variáveis, margem de contribuição e ponto de equilíbrio,
com base nas informações apresentadas, determine o valor dessas va-
riáveis, analisando os resultados apresentados.

Tabela 2
Resultados da empresa nos últimos três anos

Itens Ano 1 Ano 2 Ano 3


Receita total (1) 28.842,00 35.402,50 50.025,00

– Custo variável total (2) 15.048,00 18.785,00 25.012,50


(1) Vendas em unidades ×
= Margem de contribuição 13.794,00 16.617,50 25.012,50 Preço unitário de venda
Ponto de equilíbrio (3) 25.509,09 36.643,48 39.000,00 (2) Vendas em unidades ×
Custo variável unitário
Ponto de equilíbrio ÷ (3) PE = CF ÷ (MC ÷ RT)
88,4% 103,5% 78,0% >
Receita total
Fonte: Elaborada pelo autor.

Alavancagem e risco 179


Importante
Repare que ,apesar do aumento do ponto de equilíbrio do Ano 2 para
É possível calcular o volume de o Ano 3, a empresa teve um desempenho melhor. Isso pode ser facil-
vendas necessário à cobertura
mente percebido por meio da relação Ponto de equilíbrio ÷ Receita to-
dos custos variáveis e fixos e
ainda gerar um determinado tal, que passou de 103,5% para 78%. Esse percentual demonstra que, no
volume de lucro. Para isso, basta último ano, para cobrir todos os custos (ponto de equilíbrio), a empresa
somar aos custos fixos o valor
dos lucros desejado e aplicar a precisaria obter 78% da receita total obtida, o que indica que ela apre-
fórmula do ponto de equilíbrio. sentou lucro no último ano, apesar do aumento do ponto de equilíbrio.

6.2 Tipos de alavancagem


Segundo Gitman (2010, p. 468), “a alavancagem resulta do uso de
Vídeo
ativos ou fundos a custo fixo para multiplicar os retornos aos proprietá-
rios da empresa. De modo geral, aumentá-la resulta em maior retorno
e risco, ao passo que reduzi-la, diminui ambos”. Ainda segundo Gitman,
o grau de alavancagem pode alterar o valor da empresa ao afetar o
retorno e o risco.

Trazendo para o contexto empresarial, alavancagem significa a ca-


pacidade de utilizar as aplicações realizadas em Ativos e os recursos
onerosos captados junto aos financiadores sem participação no capital
social da empresa, de modo a maximizar o retorno de seus proprie-
tários. Existem dois itens de extrema importância que o gestor pode
utilizar como alavanca nas empresas. Esses elementos são os custos
fixos e as despesas financeiras.

Ao investir em Ativos operacionais, o gestor não pode esquecer


que esse investimento gerará alterações, para mais ou para menos,
no patamar de custos fixos já existentes. Da mesma forma, ao captar
recursos onerosos junto aos terceiros, os custos financeiros da empre-
sa também sofrerão alterações.

O conceito da alavancagem significa a capacidade de qualquer tipo


de empresa, independente de seu tamanho e do segmento de merca-
do em que atua, de maximizar o retorno dos proprietários a partir da
existência dos custos fixos gerados por sua atividade operacional e dos
custos financeiros gerados pelas fontes de financiamento onerosas.

No entanto, como existe uma relação direta entre risco e rentabilida-


de, quanto maior o risco, maior o retorno que se deseja obter. A questão
fundamental que o gestor não pode esquecer é que o inverso também é
verdadeiro. Portanto, alavancagens crescentes significam, para a empre-

180 Finanças Corporativas


sa, um grau de incerteza cada vez maior quanto à rentabilidade projeta-
Livro
da e, por extensão, um retorno esperado igualmente maior.
O livro Análise financeira
A alavancagem ocorre em diferentes graus em função das carac- das empresas apresenta
conceitos extremamente
terísticas da empresa, sem comprometer, no entanto, a relação risco importantes para o ges-
versus retorno existente. Nesse contexto, o termo risco significa o nível tor financeiro, principal-
mente relacionados aos
de incerteza associado à capacidade que a empresa possui de cobrir os efeitos das relações risco
custos fixos operacionais e os custos financeiros. O grau de alavanca- versus retorno, expressos
no grau de alavancagem
gem observado na estrutura de uma organização reflete a “barganha” das empresas.
feita por ela entre risco e retorno.
SILVA, J. P. São Paulo: Cengage
Learning, 2016.
Podemos encontrar três tipos diferentes de alavancagem, como ve-
remos a seguir, lembrando que a existência de um não garante que
todos os demais estejam acontecendo ao mesmo tempo na empresa.

As categorias de alavancagem existentes são: alavancagem opera-


cional, financeira e combinada, as quais descrevemos na sequência.

6.2.1 Alavancagem operacional


Da relação entre as receitas operacionais e o lucro antes de juros e
Imposto de Renda, conhecido como LAJIR (conceito que se confunde
com o lucro operacional), é determinada a alavancagem operacional.
O volume dos custos operacionais fixos, por sua vez, define em conjun-
to o nível de alavancagem operacional atingido pela empresa.

A alavancagem operacional existe como resultado das despesas


operacionais fixas na estrutura de custos da empresa. Esses custos
precisam ser cobertos porque seu valor não sofre os mesmos percen-
tuais de alteração em função de variações nas vendas, independente
do valor das receitas obtidas pela empresa.

Para demonstrar o conceito da alavancagem operacional, vamos


utilizar uma empresa com os seguintes dados:

Premissas Atual
Vendas (unidades) 10.000
Preço unitário $ 2,00
Vendas totais $20.000,00
(–) Custos variáveis operacionais $ 8.000,00
(–) Custos fixos operacionais $ 5.000,00

(=) LAJIR $ 7.000,00

Alavancagem e risco 181


Considerando a situação atual da empresa, vamos imaginar que as
vendas pudessem aumentar em 10%. Com base nesse crescimento,
vamos simular o que aconteceria com os resultados dela. A Tabela 3
demonstra esse efeito.

Tabela 3
Variação em 10% nas vendas para a alavancagem operacional

Premissas Atual +∆ 10%


Vendas (unidades) 10.000 11.000
Preço unitário $ 2,00 $ 2,00
Vendas totais $20.000,00 $22.000,00
(–) Custos variáveis operacionais (1) $ 8.000,00 $ 8.800,00
(–) Custos fixos operacionais (2) $ 5.000,00 $ 5.000,00
(=) LAJIR $ 7.000,00 $ 8.200,00
∆% no LAJIR + 17,1%
∆% nas Vendas + 10,0%
(1) Como os custos variáveis variam em função das vendas, a premissa utilizada é que esses
custos subam na mesma proporção do crescimento das vendas.
(2) Por definição, os custos fixos não variam em função do crescimento nas vendas.
Importante
Fonte: Elaborada pelo autor.
Repare que, no exemplo, as ven-
O exemplo visto apresenta o impacto no LAJIR decorrente de varia-
das aumentaram sem nenhum
tipo de acréscimo nos custos ções ocorridas nas quantidades vendidas. Na coluna +∆ 10%, fica de-
fixos. Na prática, para que isso monstrado que o resultado operacional da empresa, mensurado pelo
ocorresse, seria necessário que
LAJIR, cresceu em percentual superior ao crescimento percentual re-
a empresa tivesse capacidade
ociosa de produção .
3
gistrado nas vendas, indicando que variações nas vendas resultam em
variações superiores no LAJIR.

Repare que esse crescimento superior no LAJIR só ocorreu em fun-


3
ção da existência de custos fixos na estrutura operacional da empresa.
Aqui o conceito utilizado para
Do contrário, o crescimento no LAJIR seria exatamente igual ao aumen-
produção não é o de fabricação,
mas sim dos gastos necessários to realizado nas vendas. A seguir, demonstramos esse efeito.
para a disponibilização de um
produto ou a prestação de um Tabela 4
serviço. Efeito de alavancagem operacional

Premissas Atual +∆ 10%


Vendas (unidades) 10.000 11.000
Preço unitário $ 2,00 $ 2,00
Vendas totais $20.000,00 $22.000,00
(–) Custos variáveis operacionais $ 8.000,00 $ 8.800,00
(=) LAJIR $12.000,00 $13.200,00
∆% no LAJIR + 10,0%
∆% nas Vendas + 10,0%
Fonte: Elaborada pelo autor.

182 Finanças Corporativas


A Tabela 4 apresenta claramente que o custo fixo funcionou como
alavanca para o aumento do LAJIR. Uma questão muito importante, na
qual o gestor financeiro deve prestar muita atenção, lembrando sem-
pre da relação risco versus retorno, é que se os custos fixos da empre-
sa fossem superiores ao patamar utilizado, o aumento percentual do
LAJIR seria maior do que o apresentado, demonstrando que a empresa
estaria mais alavancada. A Tabela 5 demonstra esse efeito, partindo
do pressuposto de que a situação atual da empresa foi alterada para a
demonstrada a seguir.

Tabela 5
Efeito de alavancagem operacional

Premissas Atual +∆ 10%


Vendas (unidades) 10.000 11.000
Preço unitário $ 2,00 $ 2,00
Vendas totais $20.000,00 $22.000,00
(–) Custos variáveis operacionais $ 8.000,00 $ 8.800,00
(–) Custos fixos operacionais (1) $ 6.000,00 $ 6.000,00
(=) LAJIR $ 6.000,00 $ 7.200,00
∆% no LAJIR + 20,0%
∆% nas Vendas + 10,0%
(1) Aumento do custo fixo de $5.000 para $6.000
Fonte: Elaborada pelo autor.

Com base no exemplo da Tabela 5, podemos calcular uma métrica


extremamente importante para a análise do desempenho econômico
financeiro de uma empresa, quando utilizamos o conceito da alavanca-
Importante
gem. Esse indicador é o grau de alavancagem operacional (GAO), que
pode ser mensurado com a seguinte equação: 1. O resultado obtido com a
equação para calcular o GAO
indica a variação que pode
∆ Percentual no LAJIR ocorrer no LAJIR para cada
GAO =
∆ Percentual nas Vendas aumento percentual nas vendas.
Para transformar o resultado em
uma relação percentual, basta
Para o exemplo inicial, o grau de alavancagem seria calculado da subtrair o resultado por um e
multiplicá-lo por cem.
seguinte forma:
2. Sempre que existirem custos
GAO = 17,1% ÷ 10,0% = 1,71 ou fixos em uma empresa, haverá
alavancagem operacional.
GAO = 17,1% ÷ 10,0% = 1,71 – 1 = 0,71 × 100 = 71%

Alavancagem e risco 183


O resultado indica que, para cada ponto percentual de crescimento
nas vendas, o LAJIR deverá crescer 1,71 vezes mais, ou, para cada 1% de
aumento das vendas, o LAJIR aumentará 71%.

Uma questão fundamental que o gestor financeiro precisa ter sempre


em mente é que, considerando a situação atual, o percentual de cresci-
mento para as vendas pode ser qualquer um, sem, no entanto, afetar
o grau de alavancagem. O exemplo a seguir demonstra esse conceito,
partindo dos dados do exemplo inicial.

Tabela 6
Grau de alavancagem operacional

Premissas Atual +∆ 20%


Vendas (unidades) 10.000 12.000
Preço unitário $ 2,00 $ 2,00
Vendas totais $20.000,00 $24.000,00
(–) Custos variáveis operacionais $ 8.000,00 $ 9.600,00
(–) Custos fixos operacionais (1) $ 5.000,00 $ 5.000,00

(=) LAJIR $ 7.000,00 $ 9.400,00

∆% no LAJIR + 34,3%

∆% nas Vendas + 20,0%


Fonte: Elaborada pelo autor.

GAO = 34,3% ÷ 20% = 1,71 ou

GAO = 34,3% ÷ 20% = 1,71 – 1 = 0,71 × 100 = 71%


Atividade 2
Vemos que, para o cálculo do grau de alavancagem, não é preciso
Se o GAO aumenta, o risco realizar qualquer tipo de estudo mercadológico. O percentual de cres-
operacional da empresa também
cimento pode ser qualquer valor, sem que isso altere o grau de alavan-
cresce?
cagem, ou seja, se o percentual de crescimento fosse diferente, para a
mesma situação atual da empresa, o GAO seria exatamente o mesmo.

6.2.2 Alavancagem financeira


A alavancagem financeira é definida como a capacidade de a em-
presa maximizar o lucro líquido por unidade de cotas ou por ações, por
meio da utilização de recursos onerosos de terceiros, geradores de en-
cargos financeiros.

A alavancagem financeira resulta da existência de encargos finan-


ceiros na estrutura de custos de qualquer tipo de empresa e de qual-

184 Finanças Corporativas


quer tamanho. Esses encargos, como os juros sobre empréstimos,
independente do tipo de juros cobrados (prefixados ou pós-fixados) e
da lucratividade operacional da empresa, devem ser quitados, caracte-
rizando um custo fixo para a empresa.

Por meio dessa definição, podemos concluir que empresas com


despesas financeiras fixas em volume elevado possuem alto grau de
alavancagem financeira, podendo obter aumentos substanciais no lu-
cro, como decorrência de aumentos nas vendas, de redução nos custos
ou do efeito combinado desses dois fatores.

Para ilustrar o efeito da alavancagem financeira em uma empresa,


vamos utilizar os dados a seguir, demonstrando sua situação econô-
mica atual.

Premissas Atual
Empréstimos a pagar $80.000,00
Taxa de juros 3%
LAJIR $16.000,00
(–) Despesa com juros $ 2.400,00
(=) Lucro antes do Imposto de Renda $13.600,00
(–) Imposto de Renda (alíquota de 25%) $ 3.400,00

(=) Lucro líquido $10.200,00

Partindo dos resultados demonstrados, vamos calcular o que aconte-


ceria com a situação econômica da empresa caso fosse possível aumen-
tar o LAJIR em 10%. A tabela a seguir demonstra esse efeito.

Tabela 7
Variação em 10% nas vendas para a alavancagem financeira

Premissas Atual +∆ 10%


Empréstimos a pagar $80.000,00 $80.000,00
Taxa de juros 3% 3%
LAJIR $16.000,00 $17.600,00
(–) Despesa com juros $ 2.400,00 $ 2.400,00
(=) Lucro antes do I.R. $13.600,00 $15.200,00
(–) I.R. (alíquota de 25%) $ 3.400,00 $ 3.800,00

(=) Lucro líquido $10.200,00 $11.400,00

∆% no LAJIR + 10,0%

∆% no Lucro líquido + 11,8%


Fonte: Elaborada pelo autor.

Alavancagem e risco 185


Importante O exemplo mostra que, com base no aumento percentual demons-
1. No exemplo, utilizamos trado para o LAJIR, o crescimento também percentual que seria obtido
como premissa que as no lucro líquido ocorre em patamares mais elevados, indicando o efeito
vendas aumentaram sem a
necessidade de acréscimo no alavanca nos ganhos da empresa gerados pelos custos financeiros.
montante de financiamento
Esse efeito, assim como acontece na alavancagem operacional, so-
oneroso existente no Passivo
da empresa. Na prática, para mente ocorreu pela existência dos custos financeiros. Se a empresa
que isso ocorresse, seria preciso fosse financiada unicamente por recursos não onerosos e/ou recursos
que a empresa conseguisse
dos sócios, o crescimento do lucro líquido seria exatamente o mesmo.
financiar o crescimento de suas
necessidades de financiamento A tabela a seguir demonstra esse efeito.
operacional (principalmente das
contas a receber e dos estoques) Tabela 8
por meio de recursos não Efeito de alavancagem financeira
onerosos, ou seja, que estivesse
Premissas Atual +∆ 10%
em uma situação em que a
Necessidade de Capital de Giro Empréstimos a pagar $ 0,00 $ 0,00
fosse negativa.
LAJIR $16.000,00 $17.600,00
2. Sabemos que os recursos dos
sócios apresentam custos finan- (–) I.R. (alíquota de 25%) $ 4.000,00 $ 4.400,00
ceiros. No entanto, para efeito (=) Lucro líquido $12.000,00 $13.200,00
do conceito da alavancagem
financeira, somente os custos ∆% no LAJIR + 10,0%
contabilizados são reconhecidos,
e, como sabemos, os custos ∆% no Lucro líquido + 10,0%
financeiros associados ao finan- Fonte: Elaborada pelo autor.
ciamento dos sócios não são
registrados na contabilidade. A Tabela 8 demonstra um conceito muito importante. Se a empresa
não apresentar financiamentos onerosos e, consequentemente, des-
pesas financeiras, não haverá alavancagem financeira. Por outro lado,
sem esquecer a relação risco versus retorno, se o volume de juros e en-
cargos financeiros pagos pela empresa em determinado período fosse
superior ao que utilizamos no exemplo, o crescimento percentual no
lucro líquido também seria superior, demonstrando que a empresa es-
taria mais alavancada. A Tabela 9 demonstra esse efeito, partindo do
pressuposto de que a situação atual da empresa foi alterada para a
demonstrada a seguir.

186 Finanças Corporativas


Tabela 9
Efeito de alavancagem financeira

Premissas Atual +∆ 10%


Empréstimos a pagar $100.000,00 $100.000,00
Taxa de juros 3% 3%
LAJIR $16.000,00 $17.600,00
(–) Despesa com juros $ 3.000,00 $ 3.000,00
(=) Lucro antes do I.R. $13.000,00 $14.600,00
(–) I.R. (alíquota de 25%) $ 3.250,00 $ 3.650,00

(=) Lucro líquido $ 9.750,00 $10.950,00

∆% no LAJIR + 10,0%

∆% no Lucro líquido + 12,3%


Fonte: Elaborada pelo autor.

Assim como no cálculo para a alavancagem operacional, também


podemos utilizar um indicador extremamente importante para a ala-
vancagem financeira. Esse indicador, chamado de grau de alavancagem Importante
financeira (GAF), é obtido com base na seguinte equação: 1. O resultado obtido na equação
de cálculo do GAF indica a
∆ Percentual no Lucro líquido variação que pode ocorrer no
GAF = lucro líquido para cada aumento
∆ Percentual no LAJIR percentual no LAJIR. Para
transformar o resultado em
uma relação percentual, basta
No exemplo inicial, o GAF seria obtido da seguinte forma: subtrair o resultado por um e
GAF = 11,8% ÷ 10% = 1,18 ou multiplicá-lo por cem.
2. Existe alavancagem financeira
GAF = 11,8% ÷ 10% = 1,18 – 1 = 0,18 × 100 = 18%
sempre que a empresa utiliza
A leitura do grau de alavancagem para o exemplo utilizado indica que, recursos de terceiros onerosos.

para cada ponto percentual de aumento no LAJIR, o lucro líquido aumenta-


rá 1,18 vezes. O mesmo pode ser expresso utilizando percentagens: para
cada 1% de aumento no LAJIR, o lucro líquido aumentará em 18%. Por
serem os encargos financeiros conceitualmente classificados como custos
fixos, variações no LAJIR resultam em variações maiores no lucro líquido.

Uma questão importante referente à fórmula é que não existe a


necessidade de o gestor elaborar projeções complexas com relação ao
possível aumento do LAJIR. Qualquer percentual de crescimento utili-
zado não alterará o resultado obtido para o GAF. O exemplo a seguir
detalha esse conceito.

Alavancagem e risco 187


Tabela 10
Grau de alavancagem financeira

Premissas Atual +∆ 30%


Empréstimos a pagar $80.000,00 $80.000,00
Taxa de juros 3% 3%
LAJIR $16.000,00 $20.800,00
(–) Despesa com juros $ 2.400,00 $ 2.400,00
(=) Lucro antes do I.R. $13.600,00 $18.400,00
(–) I.R. (alíquota de 25%) $ 3.400,00 $ 4.600,00

(=) Lucro líquido $10.200,00 $13.800,00

∆% no LAJIR + 30,0%

∆% no Lucro líquido + 35,3%


Fonte: Elaborada pelo autor.

GAF = 35,3% ÷ 30% = 1,18

GAF = 35,3% ÷ 30% = 1,18 – 1 = 0,18 × 100 = 18%

O exemplo demonstra que qualquer percentual de aumento em-


pregado para o LAJIR resultará no mesmo grau de alavancagem.

6.2.3 Alavancagem combinada


A alavancagem total ou combinada mede o efeito simultâneo da
alavancagem operacional e da alavancagem financeira. Esse efeito é a
capacidade de a empresa utilizar custos fixos operacionais e financei-
ros para aumentar o efeito de variações nas vendas e no lucro líquido.
Pode ser também considerada como o impacto total dos custos fixos
operacionais e financeiros na estrutura da empresa.

Uma questão muito importante para a gestão de qualquer tipo de


empresa está relacionada à questão de causa e efeito. Ao lembrarmos
os conceitos da alavancagem operacional e da alavancagem financeira,
fica claro que, como todas as empresas possuem custos fixos, pode-
mos dizer que todas têm alavancagem operacional.

Por outro lado, como nem todas as empresas são financiadas com
recursos onerosos de terceiros, sempre que isso ocorrer, a organização
não apresentará alavancagem financeira. Como a alavancagem combi-
nada só é percebida nas empresas quando a operacional e a financeira
existem, podemos dizer que nem todas as organizações apresentam
alavancagem combinada.

188 Finanças Corporativas


Com base na definição de alavancagem combinada, empresas com
custos fixos operacionais e despesas financeiras em patamares ele-
vados têm a possibilidade de obter incrementos no lucro líquido. Isso
ocorre por meio de redução nos custos variáveis operacionais e de au-
mentos obtidos no volume de vendas ou por meio do efeito combina-
do desses fatores, ambos trazendo como consequência aumentos no
Lucro Líquido.

Para entendermos o conceito da alavancagem combinada, vamos


utilizar os dados reproduzidos a seguir:

Premissas Atual
Vendas (unidades) 35.000
Preço unitário R$ 2,00
Empréstimos a pagar R$ 100.000
Taxa de juros 2,5%
Vendas totais R$ 70.000
(–) Custos variáveis operacionais R$ 42.000
(–) Custos fixos operacionais R$ 20.000
(=) LAJIR R$ 8.000
(–) Despesa com juros R$ 2.500
(=) Lucro antes do Imposto de Renda R$ 5.500
(–) I.R. (alíquota de 25%) R$ 1.375
(=) Lucro líquido R$ 4.125

∆% nas Vendas

∆% no Lucro líquido

Com base nos dados da situação atual da empresa, vamos calcu-


lar o que aconteceria se ela conseguisse aumentar seu faturamento
em 10%. A partir desse crescimento, a organização apresentaria as se-
guintes informações:

Tabela 11
Variação de 10% nas vendas para a alavancagem combinada

Premissas Atual +∆ 10%


Vendas (unidades) 35.000 38.500
Preço unitário R$ 2,00 R$ 2,00
Empréstimos a pagar R$ 100.000 R$ 100.000
Taxa de juros 2,5% 2,5%
(Continua)

Alavancagem e risco 189


Premissas Atual +∆ 10%
Vendas totais R$ 70.000 R$ 77.000
(–) Custos variáveis operacionais R$ 42.000 R$ 46.200
(–) Custos fixos operacionais R$ 20.000 R$ 20.000
(=) LAJIR R$ 8.000 R$ 10.800
(–) Despesa com juros R$ 2.500 R$ 2.500
(=) Lucro antes do Imposto de Renda R$ 5.500 R$ 8.300
(–) I.R. (alíquota de 25%) R$ 1.375 R$ 2.075
(=) Lucro líquido R$ 4.125 R$ 6.225

∆% nas Vendas 10,0%

∆% no Lucro líquido 50,9%


Importante
Fonte: Elaborada pelo autor.
Repare que, no exemplo, as ven- O exemplo demonstra que a empresa pode gerar crescimento para
das aumentaram sem nenhum
o lucro líquido em percentuais superiores ao aumento na quantidade
tipo de acréscimo nos custos
fixos e nas despesas financeiras. vendida, caso consiga manter os custos fixos operacionais e financeiros
Para que isso ocorra na prática, no mesmo patamar da situação atual. Da mesma forma que na alavan-
é preciso que a empresa tenha cagem operacional e financeira, esse crescimento só foi possível pela
capacidade ociosa de produção e
existência dos custos fixos operacionais e financeiros. Na hipótese de
que o crescimento da necessida-
de de financiamento das contas a empresa não apresentar custos fixos na sua operação, nem dívidas
operacionais seja realizado por onerosas, o crescimento no lucro líquido seria exatamente igual ao au-
meio da captação de fontes não mento das vendas. A tabela a seguir demonstra esse efeito.
onerosas.
Tabela 12
Efeito de alavancagem combinada

Premissas Atual +∆ 10%


Vendas (unidades) 35.000 38.500
Preço unitário R$ 2,00 R$ 2,00
Vendas totais R$ 70.000 R$ 77.000
(–) Custos variáveis operacionais R$ 42.000 R$ 46.200
(=) LAJIR R$ 28.000 R$ 30.800
(–) I.R. (alíquota de 25%) R$ 7.000 R$ 7.700
(=) Lucro líquido R$ 21.000 R$ 23.100
∆% nas Vendas 10,0%
∆% no Lucro líquido 10,0%
Fonte: Elaborada pelo autor.

Essa tabela indica claramente que os custos fixos operacionais e as


despesas financeiras funcionaram como alavancas para gerar cresci-
mento no lucro líquido. Isso significa, lembrando sempre da relação
risco versus retorno, que se esses itens fossem maiores, o crescimento

190 Finanças Corporativas


do lucro líquido poderia ser igualmente maior, indicando que, da pers-
pectiva da alavancagem combinada ou total, a empresa estaria mais
alavancada tanto do ponto de vista operacional quanto do financeiro.
A Tabela 13 indica esse efeito, partindo do pressuposto de que a situa-
ção atual da empresa foi alterada para a demonstrada a seguir.

Tabela 13
Efeito de alavancagem combinada

Premissas Atual +∆ 10%


Vendas (unidades) 35.000 38.500
Preço unitário R$ 2,00 R$ 2,00
Empréstimos a pagar R$ 110.000 R$ 110.000
Taxa de juros 2,5% 2,5%
Vendas Totais R$ 70.000 R$ 77.000
(–) Custos variáveis operacionais R$ 42.000 R$ 46.200
(–) Custos fixos operacionais R$ 23.000 R$ 23.000
(=) LAJIR R$ 5.000 R$ 7.800
(–) Despesa com juros R$ 2.750 R$ 2.750
(=) Lucro antes do Imposto de Renda R$ 2.250 R$ 5.050
(–) I.R. (alíquota de 25%) R$ 563 R$ 1.263
(=) Lucro líquido R$ 1.688 R$ 3.787

∆% nas Vendas 10,0%

∆% no Lucro líquido 124,4%

Fonte: Elaborada pelo autor.

Partindo do conceito da alavancagem combinada ou total, também


podemos definir uma relação matemática para o cálculo do grau de
alavancagem da empresa. Esse indicador, chamado de grau de alavan- Importante
cagem combinado (GAC), é calculado da seguinte forma:
A alavancagem combinada re-
flete a combinação dos impactos
∆ Percentual no Lucro líquido existentes entre a alavancagem
GAC = operacional e a alavancagem
∆ Percentual nas Vendas
financeira por meio de uma
relação multiplicativa, que pode
Utilizando o exemplo inicial para a demonstração da alavancagem ser calculada da seguinte forma:
GAC = GAO × GAF
combinada, o grau de alavancagem pode ser obtido assim:

GAC = 50,9% ÷ 10,0% = 5,09 ou

GAC = 50,9% ÷ 10,0% = 5,09 – 1 = 4,09 × 100 = 409%

Alavancagem e risco 191


Esse resultado indica que, para cada ponto percentual de aumento
nas vendas, o lucro líquido crescerá 5,09 vezes, ou, para cada 1% de
crescimento nas vendas, o lucro líquido crescerá 409%.

Da mesma forma que ocorre na alavancagem operacional e na ala-


vancagem financeira, a empresa pode utilizar qualquer percentual de
crescimento para as vendas. O resultado do grau de alavancagem não
sofrerá qualquer variação. Para demonstrar esse conceito, vamos uti-
lizar os dados a seguir, com base na situação inicial da empresa, mas
utilizando um percentual diferente para o crescimento das vendas.

Tabela 14
Grau de alavancagem combinada

Premissas Atual +∆ 20%


Vendas (unidades) 35.000 42.000
Preço unitário R$ 2,00 R$ 2,00
Empréstimos a pagar R$ 100.000 R$ 100.000
Taxa de juros 2,5% 2,5%
Vendas totais R$ 70.000 R$ 84.000
(–) Custos variáveis operacionais R$ 42.000 R$ 50.400
(–) Custos fixos operacionais R$ 20.000 R$ 20.000
(=) LAJIR R$ 8.000 R$ 13.600
(–) Despesa com juros R$ 2.500 R$ 2.500
(=) Lucro antes do Imposto de Renda R$ 5.500 R$ 11.100
(–) I.R. (alíquota de 25%) R$ 1.375 R$ 2.775
(=) Lucro líquido R$ 4.125 R$ 8.325

∆% nas Vendas 20,0%

∆% no Lucro líquido 101,8%


Fonte: Elaborada pelo autor.

GAC = 101,8% ÷ 20,0% = 5,09 ou

GAC = 101,8% ÷ 20,0% = 5,09 – 1 = 4,09 × 100 = 409%

Como explicado anteriormente, qualquer percentual de crescimento


pode ser utilizado para as vendas. Não decorrerá disso nenhuma alteração
no resultado do GAC, portanto o resultado alcançado foi o mesmo, apesar
de o percentual para o crescimento das vendas ser diferente do anterior.

192 Finanças Corporativas


6.3 Avaliação do risco
Vídeo Sempre que uma empresa apresenta custos operacionais fixos e/ou
despesas financeiras, ela tem a possibilidade de alavancar seus resulta-
dos caso haja aumentos em suas vendas ou no LAJIR. Caso isso aconte-
ça, o lucro líquido da empresa e, consequentemente, seus indicadores
de lucratividade e rentabilidade aumentarão.

O efeito do aumento do lucro por meio dos elementos que atuam


como alavancas nas empresas foi demonstrado na conceituação e nos
cálculos do grau de alavancagem operacional, financeira e combina-
da. Nas demonstrações, sempre utilizamos aumentos nas vendas e no
LAJIR para ilustrar esse conceito e as vantagens para as empresas em
apresentar custos fixos e despesas financeiras em suas estruturas. De-
monstramos também que quanto maior o saldo desses itens utilizados
como alavancas, maior o efeito no crescimento do lucro.

O que não demonstramos é o efeito contrário, ou seja, o que acon-


teceria com os resultados da empresa se as vendas tomassem o senti-
do inverso, isto é, se, ao invés de subirem, caíssem, em um cenário no
qual existem custos fixos operacionais. O que ocorreria na utilização de
recursos de terceiros onerosos (gerando despesas financeiras, um dos
itens utilizados como alavanca) se acontecesse exatamente o contrário
com o LAJIR, ou seja, se caíssem, e não subissem?
São eventos que podem ocorrer a todo o momento, com qualquer
tipo de empresa. Se a organização apresentar custos fixos operacionais
e/ou financeiros, e não ocorrerem aumentos nas vendas e no LAJIR,
a existência desses itens que não variam em função da quantidade pro-
duzida ou vendida trará uma pressão muito elevada sobre o fluxo de
4
caixa e um aumento substancial para o risco da empresa.
Essa possibilidade pode ser analisada em termos
do risco inerente ao aumento dos custos fixos ope- 4
racionais, sem a contrapartida de crescimentos nas O conceito de risco aqui
empregado não é sinônimo
vendas, e/ou do incremento nos custos financeiros, apenas de perda, mas também da
sem que ocorram variações positivas no LAJIR. Essas variação para mais ou para menos,
duas possibilidades, individualmente analisadas ou com base em um valor esperado.
Esse conceito contempla o quanto
em conjunto, significam aumento de riscos definidos
a empresa pode ganhar acima ou
como risco operacional, risco financeiro e risco total abaixo de um parâmetro quantita-
resultante da combinação dos dois efeitos operacio- tivo qualquer, utilizado para definir
nais e financeiros. o resultado mais provável.

Alavancagem e risco 193


6.3.1 Risco operacional
Uma vez que o retorno sobre os Ativos permanentes, exceto em
situações excepcionais, é superior aos retornos sobre os Ativos circu-
lantes e que a principal função do administrador é maximizar o retorno
dos proprietários da empresa, uma das formas de se atingir esse obje-
tivo é por meio do aumento do investimento em Ativos permanentes.

À medida que as aplicações em Ativos permanentes aumentam,


Importante os custos operacionais fixos da empresa gerados por esses investimen-
À medida que a empresa investe tos crescem junto. Esse incremento nos custos fixos significa que aumen-
em Ativos permanentes, geran- ta também o volume de vendas necessário à cobertura dessas despesas,
do encargos operacionais fixos,
aumenta, por extensão, o GAO, resultando em níveis mais elevados para o ponto de equilíbrio.
o risco operacional associado e É nessa condição que os problemas da empresa começam a surgir.
o grau de variação do LAJIR, ou
seja, aumenta a probabilidade Aumentando o nível do ponto de equilíbrio operacional, consequência
de retorno, mas também de do incremento nos custos fixos, cresce também o risco que a empresa
risco. É fundamental para o
passa a incorrer. Isso ocorre devido à probabilidade de não se gerar
administrador conhecer essas
relações, de modo a determinar o montante de vendas nos volumes necessários à cobertura de seus
o nível de risco operacional custos totais. Esse risco, muito importante para a gestão da empresa,
suportável pela empresa.
é chamado de risco operacional.

O exemplo a seguir reproduz os dados apresentados para a análise


da alavancagem operacional e do cálculo do grau de alavancagem. Para
ilustrar esse risco, incluímos uma nova coluna demonstrando, dessa vez,
o que aconteceria com o resultado da empresa medido pelo LAJIR caso
houvesse uma redução nas vendas de mesmo percentual de variação.

Tabela 15
Análise da alavancagem operacional

Premissas Atual +∆ 10% –∆ 10%


Vendas (unidades) 10.000 11.000 9.000
Preço unitário $ 2,00 $ 2,00 $ 2,00
Vendas totais $20.000,00 $22.000,00 $18.000,00
(–) Custos variáveis operacionais $ 8.000,00 $ 8.800,00 $ 7.200,00
(–) Custos fixos operacionais $ 5.000,00 $ 5.000,00 $ 5.000,00

(=) LAJIR $ 7.000,00 $ 8.200,00 $ 5.800,00

∆% no LAJIR + 17,1% – 17,1%

∆% nas Vendas + 10,0% – 10%


Fonte: Elaborada pelo autor.

194 Finanças Corporativas


A análise dos dados permite verificar que a existência de custos fixos
operacionais na estrutura da empresa, alavanca geradora da viabilida-
de de alavancagem, traz a possibilidade de aumentos substanciais nos
ganhos da empresa, mas também a perspectiva de perdas igualmen-
te significativas caso as estimativas de crescimento não se confirmem.
Como essa possibilidade sempre existe, toda vez que a empresa estiver
alavancada, sempre existirá também a perspectiva da perda. Por esse
motivo, podemos afirmar que o risco operacional se faz presente toda
vez que a empresa estiver alavancada operacionalmente.

Observe que, ao calcularmos o GAO para uma situação em que as


vendas diminuem, obtemos a mesma variação percentual no LAJIR, só
que com o sinal contrário, ou seja, os percentuais são os mesmos, mas
com sinal invertido. Se a variação é idêntica, o que aconteceria com o
GAO? O resultado dessa pergunta é demonstrado a seguir.
•• Cálculo do GAO quando as vendas aumentam:

GAO = 17,1% ÷ 10,0% = 1,71 ou

GAO = 17,1% ÷ 10,0% = 1,71 – 1 = 0,71 × 100 = 71%


•• Cálculo do GAO quando as vendas diminuem:

GAO = < 17,1% > ÷ < 10,0% > = 1,71 ou

GAO = < 17,1% > ÷ < 10,0% > = 1,71 – 1 = 0,71 × 100 = 71%

Ao analisarmos o grau de alavancagem, podemos dizer que, para


cada um ponto percentual que a venda subir, o LAJIR subirá 1,71 ve-
zes. O problema é que a recíproca também é verdadeira, ou seja, para
cada ponto percentual que as vendas diminuírem, o LAJIR diminuirá
1,71 vezes. Isso indica que quanto maior o grau de alavancagem, maior Importante
a possibilidade de ganho e de perda, isto é, quanto maior o GAO, maior Ao calcularmos o grau de ala-
também o risco operacional. Essa questão demonstra o comentário fei- vancagem, só é preciso realizar
os cálculos para a perspectiva
to anteriormente, no início da Seção 6.2: a alavancagem mede o grau do crescimento. Ao simularmos
de “barganha” entre o risco e o retorno. o resultado no LAJIR para um
mesmo percentual de aumento
O risco operacional pode ser visualizado graficamente, utilizando o ou redução nas vendas, o grau
conceito do ponto de equilíbrio. A Figura 2 demonstra em gráfico o efei- de alavancagem será o mesmo.
to no risco operacional da empresa, com base no incremento verificado
no ponto de equilíbrio.

Alavancagem e risco 195


Figura 2
Efeito no risco operacional com base no ponto de equilíbrio

RISCO OPERACIONAL

Vendas ($) Vendas totais

PE 2 Custos totais
B

PE 1

A
Custos fixos

Capacidade de produção
Fonte: Elaborada pelo autor.

Para entender o conceito do risco graficamente, vamos imaginar


que essa empresa, para cobrir todos os custos fixos e variáveis, ne-
cessitasse de um faturamento representado pela letra A. Para chegar
a uma rentabilidade maior, o gestor resolveu elevar o nível da alavan-
cagem da empresa, aumentando seus custos fixos. Repare que o cres-
cimento dos custos fixos no exemplo faz com que o volume de vendas
necessário para cobrir o novo patamar dos custos totais passe do Pon-
to A para o Ponto B. Como não existe garantia de que o faturamento
sofrerá o aumento necessário para cobrir o novo patamar dos custos
totais, podemos dizer que o risco operacional da empresa aumentou.

Por outro lado, qualquer crescimento percentual obtido nas vendas


em patamar superior ao aumento necessário para o novo volume de fa-
turamento no equilíbrio (novo ponto de equilíbrio após o aumento dos
custos fixos) permitirá alavancar o ganho da empresa medido pelo LAJIR.
Claro que o contrário também é válido, uma vez que o grau de alavanca-
gem resulta no mesmo número de vezes que o LAJIR aumenta ou diminui.

6.3.2 Risco financeiro


As empresas estão sempre buscando formas de expandir suas ati-
vidades, investindo cada vez mais na sua atividade operacional. Uma
questão muito importante e que o gestor precisa considerar sistema-
ticamente nesse processo é como financiar esse crescimento entre as
alternativas existentes para a empresa.

196 Finanças Corporativas


Sempre que os recursos onerosos pertencentes aos financiadores
sem participação no capital social da empresa forem a alternativa uti-
lizada, existe como contrapartida o pagamento de custos financeiros.
Isso pode ser uma vantagem importante para a empresa, pois esse
item se constitui como uma das alavancas que o gestor pode utilizar
para aumentar a rentabilidade da empresa.

Outra questão pertinente, que o gestor financeiro não pode esque-


cer, é que à medida que aumenta o volume de investimentos, financia-
dos por meio da utilização de fontes de recursos onerosas, os encargos
financeiros também aumentam, crescendo o nível do LAJIR necessário
à cobertura dessas despesas. Nesse momento, a grande questão para
o gestor é verificar até que ponto vale a pena arriscar a saúde financei-
ra da empresa, uma vez que ele não tem total controle sobre o com-
portamento do LAJIR.

Mais um conceito que o gestor financeiro com certeza precisa sem-


pre ter em mente é que um GAF maior exige que a empresa obtenha
um valor para o LAJIR também maior, caso contrário, o risco de inadim-
plência passa a acompanhar sua atividade. O risco de a empresa não
conseguir gerar um nível maior de lucratividade necessário à cobertura
das despesas financeiras crescentes em função da maior utilização de
recursos onerosos é chamado de risco financeiro. Esse risco, fruto do
grau de alavancagem, indica que quanto maior o GAF, maior será o
risco financeiro associado.

Os investimentos em Ativos permanentes, da mesma forma que au-


mentam a alavancagem e o risco operacional, também aumentam a
alavancagem e o risco financeiro. Por isso, o grau suportável de alavan-
cagem e risco financeiro da empresa deve ser intensamente analisado
antes da tomada de decisão de investimentos em Ativos permanentes.
5
5
As relações de endividamento e cobertura de juros são frequente-
Esse indicador é calculado com
mente utilizadas como forma de medição da alavancagem financeira. base na divisão do LAJIR pelo
Conceitualmente, quanto maior esse indicador, mais a empresa gera total de despesas financeiras.
Conceitualmente, quanto maior
excedentes de recursos para a cobertura dos encargos financeiros.
esse indicador, mais recursos a
Nesse caso, a alavancagem financeira gera aumento no lucro líquido. empresa terá disponível para
cobrir o pagamento de despesas
A grande questão para o gestor é a inexistência de total controle financeiras.
sobre o comportamento do LAJIR. Se este aumentar percentualmen-
te acima do crescimento das despesas financeiras, a empresa estará
alavancando para o lado certo. Se acontecer o contrário, ou seja, se as

Alavancagem e risco 197


despesas financeiras crescerem percentualmente mais do que o LAJIR,
a empresa estará alavancando perdas. Como a possibilidade de aumen-
to e de redução sempre vai existir, toda vez que uma empresa apresen-
tar a alavancagem financeira, também apresentará risco financeiro.

O exemplo a seguir apresenta os dados utilizados para demonstrar


a alavancagem financeira. Acrescentamos uma coluna para indicar o
que pode acontecer se houver igual redução no crescimento do LAJIR.

Tabela 16
Análise de alavancagem financeira

Premissas Atual +∆ 10% –∆ 10%


Empréstimos a pagar $ 80.000,00 $ 80.000,00 $ 80.000,00
Taxa de juros 3% 3% 3%
LAJIR $16.000,00 $17.600,00 $14.400,00
(–) Despesa com juros $ 2.400,00 $ 2.400,00 $ 2.400,00
(=) Lucro antes do I.R. $13.600,00 $15.200,00 $12.000,00
(–) I.R. (alíquota de 25%) $ 3.400,00 $ 3.800,00 $ 3.000,00

(=) Lucro líquido $10.200,00 $11.400,00 $ 9.000,00

∆% no LAJIR + 10,0% – 10,0%

∆% no Lucro líquido + 11,8% – 11,8%

Fonte: Elaborada pelo autor.

Analisando os dados da alavancagem financeira, podemos verificar


que a existência das despesas financeiras, item que funciona como
uma alavanca para gerar maiores ganhos para a organização, também
funciona para aumentar as perdas se as premissas de aumento no
LAJIR não se materializarem. Sabemos que essa é uma possibilidade
efetiva para todas as empresas, consequência da impossibilidade de
controle dos gestores sobre o comportamento do LAJIR. Essa dificulda-
de intransponível, em que todas as empresas devem controlar a evolu-
ção do LAJIR, resulta no que chamamos de risco financeiro.

Similar ao que demonstramos no caso do risco operacional, ao cal-


cularmos o GAF para uma perspectiva qualquer de aumento do LAJIR,
encontraremos o mesmo grau de alavancagem para uma redução no
mesmo percentual. Isso significa que, para variações iguais, o GAF tam-
bém será o mesmo. Os resultados a seguir demonstram esse conceito:

198 Finanças Corporativas


•• Cálculo do GAF quando o LAJIR aumenta:

GAF = 11,8% ÷ 10% = 1,18 ou

GAF = 11,8% ÷ 10% = 1,18 – 1 = 0,18 × 100 = 18%


•• Cálculo do GAF quando o LAJIR diminui:

GAF = < 11,8% > ÷ < 10% > = 1,18 ou

GAF = < 11,8% > ÷ < 10% > = 1,18 – 1 = 0,18 × 100 = 18%

Analisando os resultados, podemos perceber que, para cada ponto


percentual que o LAJIR aumentar, o lucro líquido aumentará 1,18 vezes, Importante
acontecendo o efeito oposto para cada ponto percentual de redução. Da mesma forma que ocorre no
Isso significa que quanto maior o volume de empréstimos onerosos, cálculo do GAO, só precisamos
calcular a variação para a
maior será o custo financeiro associado e maior o grau de alavanca- perspectiva de crescimento. Ao
gem. O problema é que quanto maior o GAF, maior o risco financeiro. simularmos o resultado no lucro
líquido para um mesmo percen-
Isso significa que o gestor precisa ponderar, com muito cuidado, todas
tual de aumento ou redução no
as vantagens e desvantagens relacionadas à utilização de recursos de LAJIR, o grau de alavancagem
terceiros onerosos. será o mesmo.

Para visualizarmos graficamente o risco financeiro, vamos nova-


mente utilizar o conceito de ponto de equilíbrio, verificando o efeito do
aumento dos custos financeiros.

Figura 3
Efeito do aumento dos custos financeiros no risco operacional

RISCO FINANCEIRO

Vendas Vendas totais

PE 2 Custos totais (*)

PE 1

Despesas
financeiras

Capacidade de produção
(*) Custos variáveis operacionais + Despesas financeiras
Fonte: Elaborada pelo autor.

O gráfico da Figura 3 demonstra o volume de vendas em equilíbrio,


representado pelo Ponto A, que a empresa precisa obter hoje. Aumen-

Alavancagem e risco 199


tando sua necessidade de utilização de recursos onerosos de terceiros,
a consequência será um volume maior de despesas financeiras para se
chegar ao equilíbrio, ou seja, a cobertura dos custos financeiros e ope-
racionais (fixos e variáveis), fazendo com que a empresa desloque seu
volume de faturamento no equilíbrio para o Ponto B. A grande questão,
então, é saber se a empresa tem condições de aumentar o faturamento
do Ponto A para o Ponto B.

Se isso for possível e se esse crescimento representar um aumento


Atividade 3 no LAJIR em percentuais superiores ao aumento das vendas, a empre-
Quanto maior o volume de sa terá aumentado sua alavancagem para o lado certo, amplificando
despesas financeiras, mais a seus ganhos refletidos no lucro líquido. O grande problema para o
empresa pode aumentar sua
gestor é que, se isso não acontecer, ele estará alavancando as perdas,
rentabilidade e lucratividade?
demonstrando mais uma vez a barganha entre risco e retorno exis-
tente na alavancagem.

6.3.3 Risco total ou combinado


Para crescerem, as empresas precisam investir cada vez mais. Ex-
ceto em algumas situações, aumentos de investimento operacional re-
sultam em incremento nos custos fixos operacionais. Além disso, para
investirem mais, as empresas precisam buscar novas fontes de recur-
sos para financiar o crescimento, normalmente de fontes onerosas.

Da perspectiva econômico-financeira, um dos graves problemas do


crescimento para qualquer tipo de empresa é a possibilidade de cres-
cimento dos custos fixos e das despesas financeiras, a partir dos novos
investimentos necessários e da fonte de recursos para o financiar o
crescimento.

Como já vimos, a existência de custos fixos operacionais e finan-


ceiros funciona como alavanca para o crescimento dos resultados de
Livro
qualquer organização. Demonstramos também que quanto maior o
O livro Estrutura e aná-
lise de balanços aborda nível de custos fixos, maior a possibilidade de aumento no LAJIR, e que
conceitos de análise de sempre que as despesas financeiras ficam maiores, a possibilidade de
balanço extremamente
úteis para o entendi- aumento do lucro líquido também ocorre.
mento da alavancagem
operacional, financeira e
Para o gestor financeiro, o grande problema é que esse aumento,
combinada. tanto no LAJIR como nas vendas, pode não ocorrer, mas o aumento nos
ASSAF NETO, A. São Paulo: Atlas, custos fixos e nas despesas financeiras aumentará o volume de vendas
2020.
necessário à cobertura desses custos, agora majorados, resultando na
necessidade de níveis mais elevados para o ponto de equilíbrio. Isso

200 Finanças Corporativas


significa que quanto maior o volume de custos fixos operacionais e de
despesas financeiras, mais a empresa pode ganhar. O problema é que
o oposto também ocorre, isto é, quanto maior for o valor desses itens,
mais a empresa pode perder.

A probabilidade de a empresa não atingir os níveis de faturamento


Importante
necessários para a cobertura dos novos patamares de custos fixos ope-
Sempre que uma organização
racionais e financeiros define o risco total ou combinado. O risco total
aumenta seus custos fixos
mede o resultado da combinação dos riscos operacionais e financeiros operacionais com base em novos
existentes na estrutura organizacional e pode ser definido como sendo investimentos em Ativos per-
manentes e financia esse cresci-
o risco relativo à capacidade que a empresa tem de gerar recursos para mento com recursos de terceiros
cobrir seus custos operacionais e financeiros. onerosos, aumentando o volume
de despesas financeiras, o GAC
Não podemos esquecer que custos maiores significam riscos igual- também cresce, aumentando a
mente maiores, uma vez que a empresa terá que atingir um nível de probabilidade de retorno, mas
também de risco. Por esse mo-
vendas mais elevado para operar no nível de equilíbrio entre seus cus-
tivo, o gestor financeiro precisa
tos operacionais e financeiros totais e as receitas líquidas totais. conhecer detalhadamente essas
relações para determinar o nível
O exemplo a seguir retrata o efeito combinado nos resultados da
de risco total que a empresa
empresa, decorrentes de aumentos e reduções nas vendas, com base pode suportar.
no GAC.

Tabela 17
Efeito combinado com base no grau de alavancagem combinado (GAC)

Premissas Atual +∆ 10% –∆ 10%


Vendas (unidades) 35.000 38.500 31.500
Preço unitário R$ 2,00 R$ 2,00 R$ 2,00
Empréstimos a pagar R$100.000 R$100.000 R$100.000
Taxa de juros 2,5% 2,5% 2,5%
Vendas totais
R$ 70.000 R$ 77.000 R$ 63.000
(–) Custos variáveis operacionais
R$ 42.000 R$ 46.200 R$ 37.800
(–) Custos fixos operacionais
R$ 20.000 R$ 20.000 R$ 20.000
(=) LAJIR
R$ 8.000 R$ 10.800 R$ 5.200
(–) Despesa com juros
R$ 2.500 R$ 2.500 R$ 2.500
(=) Lucro antes do I. R.
R$ 5.500 R$ 8.300 R$ 2.700
(–) I.R. (alíquota de 25%)
R$ 1.375 R$ 2.075 R$ 675

(=) Lucro líquido R$ 4.125 R$ 6.225 R$ 2.025

∆% nas Vendas 10,0% 10,0%

∆% no Lucro líquido 50,9% 50,9%

Fonte: Elaborada pelo autor.

Alavancagem e risco 201


O exemplo ilustra um conceito muito importante. Quanto maior for
o volume de custos fixos operacionais e de despesas financeiras exis-
tente na estrutura da empresa, maior a possibilidade de ganho e de
perdas. Isso indica que quanto maior a variação, maior o GAC e, conse-
quentemente, o risco combinado existente na empresa.

Da mesma forma que ocorre nos demais tipos de alavancagem,


o cálculo do GAC para uma situação em que as vendas diminuem resul-
ta na mesma variação percentual no lucro líquido, só que negativa, ou
seja, os percentuais sempre são os mesmos, mas com sinal invertido.
Se a variação é idêntica, o que aconteceria com o grau de alavancagem?
O resultado dessa pergunta é demonstrado a seguir, a partir do exem-
plo acima.
•• Cálculo do GAC quando as vendas aumentam:

GAC = 50,9% ÷ 10,0% = 5,09 ou

GAC = 50,9% ÷ 10,0% = 5,09 – 1 = 4,09 × 100 = 409%


•• Cálculo do GAC quando as vendas diminuem:

GAC = < 50,9% > ÷ < 10,0% > = 5,09 ou

GAC = < 50,9% > ÷ < 10,0% > = 5,09 – 1 = 4,09 × 100 = 409%

Importante Os cálculos indicam o mesmo resultado para uma situação em que


as vendas aumentam ou diminuem, demonstrando que quanto maior
Como existe a possibilidade
de a empresa financiar seus o grau de alavancagem, maior a possibilidade de ganhos e de perdas,
investimentos com recursos de o que nos permite concluir que quanto maior o GAC, maior o risco total
terceiros não onerosos, uma
da empresa.
empresa pode ter alavancagem
operacional, mas não alavan- A ilustração a seguir demonstra graficamente o efeito no risco com-
cagem financeira. Nesse caso,
o GAC será igual ao GAO. binado da empresa, com base no incremento verificado no ponto de
equilíbrio. É importante frisar que, assim como nas demais ilustrações
utilizadas para traduzir graficamente os riscos operacional e financeiro,
os efeitos demonstrados ocorrem em qualquer tipo de empresa, inde-
pendente do seu tamanho, da sua forma de constituição e do segmen-
to em que atua.

202 Finanças Corporativas


Figura 4
Efeito no risco combinado

RISCO COMBINADO

Vendas totais
Vendas
Custos totais
com despesas
PE 2 financeiras

B
Custos totais
sem despesas
PE 1 financeiras

A Custos fixos
+
Despesas financeiras
Custos fixos

Fonte: Elaborada pelo autor.

À medida que os custos fixos crescem (operacionais, financeiros ou


ambos), o volume de vendas no equilíbrio igualmente aumenta, fazendo
com que o risco da empresa também se desloque na mesma direção.

Quanto mais elevado for o ponto de equilíbrio, maior será o volume de


vendas/produção necessário para não gerar lucro nem prejuízo. Como a
empresa normalmente não tem controle sobre o volume de vendas neces-
sário ao equilíbrio, quanto maior for o nível de faturamento requerido para
chegar a ele, maior também será o risco combinado, gerado pela existência
dos custos fixos operacionais, financeiros ou ambos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O crescimento de qualquer tipo de negócio ocorre com base nos in-
vestimentos realizados na sua operação. Normalmente, as novas aplica-
ções de recursos na atividade operacional trazem alterações sobre os
custos fixos operacionais. Além disso, para investir, é preciso usar fontes
de recursos dos sócios e dos financiadores sem participação no capital
social. Se a opção utilizada pelo gestor for uma fonte de recursos captada
junto ao capital de terceiros onerosos, essa captação afetará o volume
das despesas financeiras.
Uma consequência do investimento na atividade operacional é a varia-
ção nos custos fixos. Do lado da captação de recursos para financiar os in-

Alavancagem e risco 203


vestimentos operacionais, o efeito é o aumento das despesas financeiras.
No entanto, esses itens (custos fixos operacionais e despesas financeiras)
podem ser utilizados como alavancas para aumentar a lucratividade e a
rentabilidade da empresa, podendo representar uma grande vantagem
para a gestão de qualquer tipo de negócio.
Visto que essas alavancas são cada vez mais utilizadas, a empresa po-
derá multiplicar o ganho para seus proprietários. Por outro lado, como ris-
co e retorno caminham sempre na mesma direção (ou seja, quanto maior
o retorno, maior o risco, e vice-versa), a utilização das alavancas resulta
em uma “barganha” entre o retorno que o gestor deseja obter para ma-
ximizar o retorno dos proprietários da empresa e o risco necessário para
alcançar essa finalidade.
Analisando pelo lado do investimento e do respectivo efeito nos custos
fixos operacionais, ao utilizar esse item como alavanca, a empresa pode
gerar ganhos muito superiores ao aumento dos custos fixos. Esse efeito,
conhecido como alavancagem operacional, é determinado com base na
relação que há entre as receitas operacionais e o LAJIR.
Quanto maior o GAO, maior a possibilidade de ganhos para os proprie-
tários, medida pelo LAJIR. Por outro lado, é maior também a possibilidade
de perdas, mensurada pelo mesmo indicador. Isso significa que quanto
maior o GAO, maior o risco operacional da organização. Por esse motivo,
o gestor precisa entender essas relações para determinar o nível de risco
operacional suportável pela empresa.
O mesmo ocorre com o outro lado da equação do investimento, o da
captação de recursos para o financiamento do crescimento das aplica-
ções operacionais. Se as fontes captadas forem de terceiros e onerosas,
as despesas financeiras subirão. Como esse item é uma das alavancas
existentes nas empresas, a perspectiva de ganho também subirá. Essa
possibilidade de ganhos superiores é calculada pelo GAF.
Sempre que essa alavancagem aumentar, como consequência do
maior volume de despesas financeiras, se o crescimento do LAJIR for su-
perior ao dos custos financeiros, a variação do lucro líquido será também
maior, aumentando a lucratividade e a rentabilidade da empresa. Por ou-
tro lado, se isso não ocorrer, a redução do lucro líquido será muito maior,
diminuindo, por sua vez, a lucratividade e a rentabilidade.
Esse risco, fruto do grau de alavancagem, indica que quanto maior o
GAF, maior será o risco financeiro associado. Nesse caso, o gestor deve
analisar detidamente o grau suportável de alavancagem e risco financeiro
da empresa antes da tomada de decisão de investimentos para a expan-
são da empresa.

204 Finanças Corporativas


Uma questão que o gestor financeiro não pode esquecer, a qual é
consequência dos investimentos realizados para suportar o crescimento
da empresa e da forma de financiamento dessas aplicações, está relacio-
nada ao efeito conjunto da variação dos custos fixos operacionais e das
despesas financeiras. Quanto maior o volume desses itens, maior a possi-
bilidade de ganhos para os proprietários da empresa.
A questão é que a condição para isso acontecer está relacionada ao au-
mento das vendas, variável sobre a qual a empresa não tem controle. Para
dado volume de custos fixos e despesas financeiras, aumentos nas vendas
gerarão incrementos na lucratividade e na rentabilidade, alavancando os ga-
nhos para os proprietários, conceito chamado de alavancagem combinada.
Por outro lado, se as vendas caírem, as perdas também serão alavan-
cadas, indicando que quanto maior o volume de custos fixos operacionais
e de despesas financeiras, maior a possibilidade de ganho, mas também
de perda. Portanto, quanto maior o GAC, maior o risco total da empresa.
Por esse motivo, o gestor financeiro precisa conhecer detalhadamente
essas relações a fim de determinar o nível de risco total que a organização
pode suportar.

REFERÊNCIAS
GITMAN, L. J. Princípios de administração financeira. São Paulo: Pearson, 2010.
PEREIRA, A. S.; BISPO, P. L. Custos e formação de preços. Curitiba: Iesde, 2019.
SILVA, J. P. Análise financeira das empresas. São Paulo: Cengage Learning, 2016.

GABARITO
1. O ponto de equilíbrio indica a quantidade vendida ou o faturamento, dependendo da
forma de cálculo, necessário à cobertura dos custos fixos e dos custos variáveis exis-
tentes na estrutura da empresa. Sempre que o ponto de equilíbrio aumenta, o valor
do faturamento ou a quantidade vendida fica maior, o que significa que a empresa
precisa vender mais para poder cobrir os custos fixos e variáveis.

O risco deriva da ausência de controle da empresa com relação às vendas. Aumen-


tos no ponto de equilíbrio não necessariamente corresponderão a aumentos de ven-
das. Pode ocorrer, inclusive, o contrário, ou seja, é possível que o ponto de equilíbrio
aumente, demandando um faturamento maior, e a empresa apresente redução nas
vendas, o que torna mais distante a cobertura de seus custos totais. O risco é gerado,
portanto, por essa possibilidade.

2. O GAO mede o quanto o LAJIR pode aumentar, com base em determinado percentual
de crescimento nas receitas, indicando que quanto maior o GAO, maior a possibilida-
de de aumento para o LAJIR.

Alavancagem e risco 205


Ocorre que o grau de alavancagem é simétrico, ou seja, para um GAO igual a 2, a em-
presa tem a possibilidade de dobrar o valor do LAJIR. A questão para o gestor é que o
grau de alavancagem também funciona quando ocorre o contrário. Para um grau de
alavancagem igual a 2 e a cada ponto percentual de queda nas vendas, o LAJIR cairá o
dobro. Dessa possibilidade existente na empresa de ganhar mais, mas também per-
der mais, deriva o risco operacional.

3. Classificados conceitualmente como custos fixos, as despesas financeiras são utiliza-


das como alavancas para o crescimento dos resultados. Quanto maior o volume de
despesas financeiras, maior o grau de alavancagem financeira, indicando que a orga-
nização pode aumentar o lucro líquido em percentuais de crescimento superiores, a
partir do aumento do LAJIR, gerando aumento em sua lucratividade e rentabilidade.

Por outro lado, se o aumento das despesas financeiras não for acompanhado do cres-
cimento do LAJIR, ocorrerá o oposto. Nesse caso, a empresa alavancará suas perdas,
o que irá impactar diretamente a lucratividade e a rentabilidade. Por esse motivo,
quanto maior o crescimento das despesas financeiras, mais a empresa pode ganhar
se houver um crescimento superior do LAJIR. Mas se isso não ocorrer, a empresa terá
alavancado suas perdas.

206 Finanças Corporativas


FINANÇAS CORPORATIVAS
Atualmente, os gestores atuam em um ecossistema de
negócios cada vez mais complexo, conectado e hostil. Isso faz
com que as relações entre clientes e consumidores ocorram
em um ambiente cada vez mais difícil, o que elimina, na
maioria dos casos, a capacidade de repasse dos custos aos
preços de seus produtos e/ou serviços, gerados por decisões
incorretas. A crescente conscientização dos consumidores e
a velocidade com que a informação, nem sempre verdadeira,
trafega no mercado transforma o trabalho do gestor em uma
atividade cada vez mais desafiadora.
Apesar de toda a dificuldade e complexidade envolvida em sua
atividade, o gestor financeiro não pode, em momento algum,
perder de vista o entendimento de que todas as decisões
tomadas têm como objetivo a maximização do retorno dos
proprietários, refletida no Passivo da empresa. Essas questões
se tornam ainda mais importantes quando se sabe que todas as
decisões dos gestores têm efeito imediato sobre a liquidez e a
rentabilidade de qualquer tipo de negócio.
Tomando essas questões como um grande desafio, este
livro objetiva apresentar, no campo de estudos de Finanças,

AGNALDO SANTOS PEREIRA


de maneira prática e objetiva, o entendimento de técnicas
que permitam a compreensão dos conceitos financeiros
necessários para a gestão de qualquer tipo de negócio,
independentemente de seu tamanho.

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6600-1

59251 9 788538 766001

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