Você está na página 1de 21

5 Fisiologia respiratória

Gláucia Helena Fortes

Introdução
A respiração celular, em que nutriente orgânicos notadamente a glicose são queimados pelo
oxigênio, é uma via metabólica fundamental como fonte energética e essencial para a manutenção
da vida de inúmeros seres vivos. Nos seres vivos unicelulares, a respiração celular se faz pela
captação direta do oxigênio dissolvido no meio líquido extracelular e o CO2 liberado é diretamente
levado também para este meio líquido. Porém, com o surgimento há milhões de anos dos seres
pluricelulares, a troca gasosa pela superfície no organismo passou a ser ineficiente, tão mais quanto
maior o tamanho do organismo, visto que nos pluricelulares a troca pela superfície não garante a
chegada de oxigênio e a remoção do gás carbônico das regiões mais profundas do corpo. A
evolução a partir daí promoveu a seleção de sistemas corporais que levam os gases para e das
regiões mais profundas, possibilitando o acesso das células mais internas à troca gasosa. E neste
sentido, o papel do sistema circulatório, ao transportar os gases dissolvidos no plasma ou ligados a
pigmentos respiratórios, é fundamental. E em associação ao sistema circulatório, um outro sistema
orgânico que promove a captação e remoção eficiente dos gases respiratórios, levando-os até as
células surgiu. Este sistema orgânico capaz de captar e/ou remover os gases respiratórios é o
sistema respiratório, o qual se organiza em diferentes modos nos animais, desde o sistema traqueal
dos artrópodes ao branquial e cutâneo dos vertebrados inferiores, como os peixes e anfíbios, até o
sistema respiratório pulmonar dos répteis, aves e mamíferos. Tal sistema, junto ao circulatório (veja
capítulo 4) é vital para o adequado funcionamento do organismo.

Objetivos
Esperamos que ao final do estudo deste capítulo, você seja capaz de:
• descrever os componentes do sistema respiratório, as funções desempenhadas pelos mesmos
e o funcionamento detalhado das vias aéreas condutoras e dos pulmões na realização da
hematose, a troca gasosa alveolar;
• entender a circulação sanguínea pulmonar, o transporte de gases no sangue e o controle da
respiração

Esquema

5.1 O sistema respiratório


5.2 Vias aéreas condutoras
5.3 Mecânica ventilatória
5.3.1 Complacência Pulmonar
5.3.2 Volumes e Capacidades Pulmonares
5.3.3 Ventilação Alveolar e Espaço Morto
5.3.4 Fluxo de Ar e Resistência das Vias Aéreas
5.3.5-Composição dos Gases Respiratórios
5.4 Circulação pulmonar
5.5 Difusão dos gases pela membrana respiratória
5.6 Transporte de gases no sangue
5.7 Controle da respiração
5.8 Conclusão
5.1 O sistema respiratório
O sistema respiratório pulmonar dos vertebrados superiores, e em especial dos mamíferos,
incluindo os seres humanos, é comporto por um conjunto de estruturas ocas, em geral tubulares,
que conduzem o ar (via área condutora) até a porção realizadora das trocas gasosas com o sangue
circulante (via área respiratória). A via área condutora nos serres humanos é composta pela
cavidade nasal, faringe, laringe, traqueia, brônquios fontes e porção condutora dos pulmões
(formada pelos brônquios lobares, segmentares, subsegmentares, bronquíolos de diversas ordens
até os bronquíolos terminais nas porções mais profundas dos pulmões) (Figura 1). Já a via área
trocadora de gás (respiratória), é inteiramente contida nas porções mais profundas dos pulmões,
sendo constituída pelos bronquíolos respiratórios, ductos e sacos alveolares, todos os quais se
caracterizam por conter em suas paredes estruturas semicirculares microscópicas (os alvéolos) em
íntimo contato com os capilares pulmonares, onde as trocas gasosas com o sangue circulante
(hematose) são efetuadas (Figura1).

Figura 1: (A) Visão geral do sistema respiratório. (B) Ramificação dos brônquios a partir da traquéia até os
alvéolos. Fonte: Silverthorn, 2016.

5.2. Vias aéreas condutoras


Como acima descrito, as vias áreas condutoras são a porção do sistema respiratório que
conduz o ar das cavidades nasais até os bronquíolos terminais dentro dos pulmões. Ao conjunto
formado pela cavidade nasal, passando pela faringe até a laringe, damos o nome de vias aéreas
superiores, onde os órgãos acima são todos extratorácico. Já, da traqueia até os bronquíolos
terminais temos as vias aéreas condutoras inferiores. Ao longo de todo o trajeto condutor de ar das
narinas até bronquíolos terminais, o ar atmosférico inalado durante a inspirações sofre algumas
modificações importantes, preparando-o para sofrer as trocas nos alvéolos. Estas modificações são
processadas principalmente pela mucosa das vias aéreas condutoras, a qual é revestida por um
epitélio próprio com características comuns ao longo de toda a sua extensão até os brônquios
menores (Figura 2). Na cavidade nasal, laringe, traqueia e brônquios, o epitélio da mucosa é do tipo
prismático simples pseudoestratificado, contendo células caliciformes, secretoras de muco
respiratório e células ciliadas, responsáveis pelo movimento do muco respiratório em direção à
orofaringe, graças ao intenso batimento ciliar na membrana luminal destas células (Figura 2). Já
nos bronquíolos, o epitélio da mucosa é um pouco mais baixo, cúbico simples, contendo as células
claras, secretora de muco e as células ciliadas promotora de batimento ciliar, à semelhança do
epitélio prismático pseudoestratificado acima descrito (Figura 2).

Figura 2: Visão microscópica da parede das vias aéreas condutoras e respiratórias em diferentes trechos a
partir da traquéia até os alvéolos. O epitélio da cavidade nasal, não mostrado, é similar ao da traquéia e
brônquios. Fonte: Ganong, 2014.

O muco secretado pelas células caliciformes e claras é rico em proteoglicanos e


glicosaminoglicanos, como a mucina, e também em água, tornando-o bastante pegajoso e úmido.
Além das secreções de muco pelas células caliciformes da mucosa, da cavidade nasal até os
brônquios, glândulas exócrinas submucosas secretoras de muco também estão presentes,
auxiliando na secreção de muco. Além disso, a camada submucosa é rica em vasos sanguíneos,
os quais levam os componentes necessários à síntese de muco, além de água e calor até a mucosa.
Estas características são importantes para a execução de três funções fundamentais das vias
aéreas condutoras: 1) a limpeza; 2) a umidificação e 3) o aquecimento do ar inalado até os alvéolos.
A limpeza do ar envolve a retirada de partículas sólidas, gotículas e aerossóis suspensos no
ar respirado, os quais podem veicular microrganismos patogênicos, alérgenos e substâncias
tóxicas, de modo que o ar chega relativamente limpo nos alvéolos. Este processo inicia-se já na
cavidade nasal, onde a presença de pelos nas narinas já resulta em filtração de partículas
suspensas maiores. E ao adentrar na cavidade nasal, a presença dos cornetos nasais projetando-
se para dentro da cavidade promove um aumento de superfície mucosa, bem como o
turbilhonamento do ar, o que favorece a adesão ao muco presente na superfície epitelial. O
batimento ciliar ali presente, em direção à faringe, leva então tais partículas em direção à orofaringe
e hipofaringe, sendo então eliminadas ou deglutidas. A mucosa nasal possui ainda em sua porção
superior na base do osso etmoidal uma região específica em que seu epitélio é acrescido de
neurônios sensoriais olfatórios, cujos processos dendríticos se estendem até a camada de muco na
superfície. Estes neurônios são responsáveis pela olfação, a sensação de odores gerados por
substâncias presentes no ar respirado. Além disso, a cavidade nasal recebe secreção mucosa do
epitélio que reveste os seios aéreos paranasais, os quais estão presentes nos ossos do crânio e
cuja função reside em reduzir o peso do crânio e auxiliar na fonação. Auxiliando ainda no processo
de remoção de partículas estranhas, na camada submucosa da nasofaringe e na abertura da
cavidade oral para a orofaringe, lateralmente e na base da língua, encontram-se estrategicamente
dispostas as tonsilas faríngea (adenóide), palatinas e lingual, as quais são agregados de células
imunes, cujo objetivo é gerar uma resposta imune contra eventuais patógenos presentes no ar
atmosférico ou nos alimentos.
Depois de passar pela faringe o ar é levado até à laringe, onde o epitélio mucossecretor
ciliado também executa o mesmo procedimento de limpeza, porém com o fluxo de muco voltado
para cima em direção à faringe. A laringe, possui ainda a função auxiliar de executar a fonação,
gerada pela ação contrátil de um conjunto de músculos e cartilagem, principalmente presentes na
glote, os quais ao contraírem de forma repetitiva promovem a abertura e fechamento muito rápido
das cordas vocais e a vibração do ar emitindo sons. Após a atingir a traqueia até os brônquios
menores (por volta da 10ª a 11ª bifurcação dos brônquios), o epitélio pseudoestratificado ciliado
mucossecretor continua a exercer seu papel protetor, com o batimento ciliar levando o muco com
impurezas aderidas para cima até a hipofaringe. Este mesmo batimento ciliar é também observado
pelas células ciliadas do epitélio dos bronquíolos até bronquíolo terminal.
Além do batimento ciliar, ao longo de toda a via área da laringe até bronquíolos, a presença
de corpos estranhos, patógenos, alérgenos, a o irritar a mucosa, pode desencadear o reflexo da
tosse, onde terminação sensoriais vagais presentes na mucosa e submucosa são estimuladas e via
vago no bulbo raquidiano podem desencadear uma resposta reflexa complexa que envolve um
inspiração profunda, fechamento da glote, contração da parede abdominal, contração forte da
musculatura expiratório, que com a glote fechada leva a um grande aumento na pressão
intratorácica e intrapulmonar. No auge do pico pressórico intratorácico, a glote é então subitamente
aberta, levando a um fluxo expiratório explosivo de ar turbilhonado (ruidoso), cujo objetivo é eliminar
o excesso de muco presente na via aérea condutora repleta de partículas estranhas aderidas. Aqui
vale a menção de que se as partículas estranhas estiverem na cavidade nasal, um reflexo parecido
é acionado, porém acompanhado de elevação da base da língua com fechamento a abertura da
cavidade oral, direcionando o fluxo explosivo de ar expirado para a cavidade nasal agredida,
resultando na eliminação de ar turbilhonado e ruidoso pelos narizes, um reflexo conhecido como
reflexo do espirro.
As vias aéreas condutoras também executam a humidificação do ar, o qual envolve a
evaporação da água contida no muco superficial elevando a umidade do ar dentro das vias aéreas.
Este processo inicia-se já na cavidade nasal e se continua por toda a extensão da via área condutora
e também respiratória, até os alvéolos. E resulta na elevação da umidade do ar inalado até atingir
uma saturação de água ou umidade relativa de 100%, que corresponde em termos de pressão
atmosférica a cerca de 40mmHg, do total da pressão atmosférica de 760mmHg em nível do mar.
Esta umidificação é muito importante em nível alveolar para evitar o ressecamento da superfície de
troca alveolar, que poderia comprometer a eficiência da hematose e dos mecanismos de defesa
alveolares. A água presente no muco é secretada pelas células ciliares, principalmente via um
conjunto de proteínas transportadoras de membrana presentes tanto na membrana basolateral
quanto na membrana luminal do epitélio ciliado, as quais secretam cloreto de sódio para a superfície
do epitélio e por meio de osmose pela via paracelular a água então chega ao muco. Aqui vale
ressaltar que uma mutação genética no canal de cloreto da membrana luminal, o canal CFTR,
dificulta a secreção de sal e consequentemente de água, tornando o muco muito espesso e com
dificuldade de se movimentar pela mucosa, tornando sua função protetora muito dificultada e
levando a um sério quadro de doença respiratória e em outras vísceras também, conhecida como
fibrose cística ou mucoviscidose. A chegada da água na mucosa se deve à presença na lâmina
própria da mucosa e da submucosa de uma extensa rede microvascular altamente capilarizada,
que leva o plasma até quase a membrana basal do epitélio ciliado.
Esta mesma extensa rede microvascular na mucosa e submucosa também leva o calor para
a superfície do epitélio das vias aéreas, o qual então aquece o ar inalado. Este aquecimento é
importante pois um ar frio ao chegar nas vias áreas mais profundas e alvéolos poderia lesar as
células epiteliais alveolares e dificultar a troca gasosa, já que a difusão de partículas fluída é um
processo extremamente dependente da temperatura, a qual deve se manter nos alvéolos a mais
constante possível (em torno de 37oC).

5.3 Mecânica ventilatória


Após a condução do ar pelas vias áreas condutoras, o mesmo adentra a via aérea
respiratória, constituída pelos bronquíolos alveolares, ductos alveolares e sacos alveolares, os
quais possuem em sua parede os alvéolos, as unidades trocadoras de ar com os capilares
pulmonares, responsáveis pela hematose, a troca gasosa objetivo último de todo o sistema
respiratório. Para que o ar chegue até os alvéolos durante sua inalação (inspiração) trazendo o
oxigênio atmosférico e para que saia dos alvéolos em direção ao meio externo durante a exalação
(expiração), a caixa torácica exerce um conjunto de movimentos musculares fundamentais para o
funcionamento do sistema.
A partir da traqueia até os alvéolos, os pulmões estão contidos dentro da caixa torácica em
um local fechado, tendo a traqueia e as vias aéreas superiores como as únicas comunicações do
ar intrapulmonar com o meio ambiente externo. Dentro da caixa torácica, entre a parede da caixa
torácica e a superfície dos pulmões, existe um epitélio de revestimento pavimento simples
(mesotelial) chamado de pleura, a qual reveste a superfície externa dos pulmões (pleura visceral).
Esta, em continuidade, reveste também a superfície interna da cavidade torácica (pleura parietal).
Entre as duas pleuras um espaço fechado e pequeno surge, o espaço pleural, preenchido por uma
fina película de líquido extracelular, denominado de líquido pleural, o qual mantém as duas pleuras
muito próximas entre si. Na situação de pulmões vazios, ao final de uma expiração quieta, de
repouso, momento este em que a caixa torácica e os pulmões encontram-se em equilíbrio mecânico
estático, duas forças opostas atuam no espaço pleural: a força de recolhimento ou retração elástica
dos pulmões, que tende a fazer os pulmões encolherem expulsando o ar e a força elástica de
expansão da caixa torácica, que tendem neste ponto a uma leve expansão elástica de seu
arcabouço musculoesquelético. Estas duas forças opostas, atuando no espaço pleural acaba
gerando uma pressão intrapleural negativa, da ordem de 3-5mmHg, ou seja, a pressão intrapleural
é 3-5 mmHg mais baixa que a pressão atmosférica. E esta espécie de vácuo relativo intrapleural
mantém assim os pulmões expandidos e cheios de ar (Figura 3). A perda desta pressão intrapleural
negativa, via uma solução de continuidade pela pleural parietal ou visceral (uma abertura do espaço
pleural comunicando-o diretamente como ar atmosférico, uma abertura da cavidade pleural
normalmente completamente fechada, é conhecida como pneumotórax, e resulta em imediata
retração pulmonar, com sério comprometimento da função respiratória, pois a capacidade
continente de ar dos pulmões é seriamente prejudicada pela retração pulmonar.

Figura 3: (A) Forças elásticas atuantes no espaço pleural na situação de equilíbrio respiratório em repouso.
(B): Movimentos da caixa torácica e diafragma durante a inspiração na situação de respiração quieta de
repouso. (C): Retração elástica passiva da caixa torácica e diafragma durante a expiração na situação de
respiração quieta de repouso. Fonte: Silverthorn, 2016.
A partir do ponto de equilíbrio respiratório, no final da expiração quieta de repouso, para que
o ar entre nos pulmões levando o oxigênio, a caixa torácica se movimenta em todos os eixos do
espação tridimensional via 1) contração do diafragma, que reveste inferiormente a caixa torácica,
que ao abaixar em direção ao abdômen, aumenta a distância vertical da cavidade torácica e 2) via
contração dos músculos intercostais externos, que ao se elevarem e abrirem as costelas promovem
um aumento nas distâncias latero-lateral e anteroposterior da cavidade torácica (Figura 3). O
resultado destes movimentos é uma expansão da pleura parietal e um aumento adicional na
pressão negativa intrapleural (para valores em torno de -7mmHg), o qual distende ainda mais a
pleura visceral e promove então uma expansão adicional dos pulmões. Esta expansão dos pulmões
acaba por reduzir a pressão de ar nos alvéolos que também fica negativa, abaixo da pressão
atmosférica. E assim acontecendo, cria-se pelas vias áreas de seu início nas narinas até os
alvéolos, uma diferença de pressão, que pela lei de Poiseuille da hidráulica (ver capítulo 4), gera
um fluxo de entrada de ar pelas vias aéreas, um mecanismo conhecido como inspiração (Figura 3).
Ao final da expansão da caixa torácica, ao final da inspiração, com o relaxamento da musculatura
inspiratória, os pulmões e o tórax elasticamente distendidos retraem-se passiva e espontaneamente
comprimindo o espação pleural, elevando a pressão intrapleural em direção ao valor inicial de -
5mmHg e comprimindo os alvéolos que ao elevar a pressão intra-alveolar acima da atmosférica
gera um fluxo de saída de ar conhecido como expiração (Figura 3). Note que o volume de ar que
entra na inspiração, cerca de 500mL num indivíduo adulto normal é igual ao volume de ar que sai
na expiração. Este volume na respiração quieta de repouso é conhecido como volume corrente. O
volume de ar inspirado/expirado pode aumentar consideravelmente (respiração forçada –
hiperventilação), de acordo com o esforço muscular inspiratório. Neste caso, um aumento da força
muscular dos intercostais externos e do diafragma é associado ao acionamento de músculos
inspiratórios secundários ou acessórios, tais como os escalenos, esternoclidomastóides, serráteis
anteriores, etc. E na sequência, a expiração forçada é auxiliada pela ação de músculos expiratório
secundários, tais como os intercostais externos e os músculos da parede abdominal, que ao se
contraírem elevam a pressão intra-abdominal e forçam o diafragma para cima, ajudando no
aumento do ar expirado (Figura 4).

Figura 4: Participação dos músculos intercostais e retos abdominais nas duas fases da respiração: a
inspiração e a expiração, durante uma respiração forçada. Fonte: Guyton e Hall, 2021.
O comando neural para a atividade dos músculos respiratórios surge de uma rede neural
presente no bulbo raquidiano composta por neurônios do grupo respiratório dorsal (GRD)
localizados principalmente no núcleo do trato solitário e que se projetam para os neurônios motores
primários da medula espinhal de C3 a C5, a origem do nervo frênico e para os segmentos torácicos
da medula espinhal para inervar os músculos intercostais externos (Figura 5). Estes neurônios do
GRD controlam a respiração quieta de repouso. Havendo necessidade de uma respiração forçada
(hiperventilação), neurônios presentes na formação reticular bulbar ventral lateral (grupo respiratório
ventral – GRV) principalmente localizados nos núcleos retrofacial, Botzinger, Pré-Botzinger,
Ambíguo e Retro-ambíguo são acionados e projetam potenciais de ação para neurônios motores
primários cranianos no glossofaríngeo, vago, acessório e hipoglosso, controladores da língua,
laringe e faringe e neurônios motores primários torácicos, controladores dos músculos inspiratórios
secundários (escalenos, esternoclidomastóides e serráteis anteriores) e expiratórios secundários
(músculos intercostais internos), bem como para neurônio motores primários lombares
controladores da parede abdominal. Ambos os grupos neuronais GRD e GRV bulbares sofrem
influência do núcleo pontinho de Kolliker-Fuse (núcleo pneumotáxico), o qual inibe a rampa
excitatória neuronal no GRD limitando a expansão pulmonar e determinando a frequência
ventilatória (Figura 5). Os detalhes do controle neural da ventilação serão melhor descritos na seção
5.7 abaixo.

Figura 5: Organização dos centros respiratórios controladores da respiração no bulbo raquidiano e ponte do
Tronco Encefálico. Fonte: Guyton e Hall, 2021.

5.3.1. Complacência Pulmonar


A expansão dos pulmões desencadeada pelos músculos inspiratórios se faz contra a
elevada tendência de retração elástica do tecido pulmonar, o qual permanece aberto preenchido
por ar nos alvéolos, graças à pressão negativa intrapleural. Esta retração elástica reduz a
capacidade pulmonar de conter o ar, conhecida como complacência pulmonar. Quanto maior a
retração elástica pulmonar, menor a complacência dos pulmões. Na determinação desta
complacência pulmonar, além do conteúdo de matriz elástica (elastina) extracelular, responsável
por cerca de 1/3 da retração elástica pulmonar, verifica-se uma participação importante da tensão
elástica superficial da interface ar-líquido presente nos alvéolos pulmonares, a qual é responsável
por aproximadamente 2/3 da retração elástica pulmonar (Figura 6). A tensão superficial na interface
ar-líquido alveolar decorre da intensa interação ar-ar e água-água na superfície alveolar e da
baixíssima interação ar-água, o que força a superfície líquida a se juntar, reduzindo assim o
diâmetro alveolar e a capacidade dele (complacência) de conter o ar, retraindo e esvaziando os
alvéolos (Figura 6). A fim de minimizar os efeitos da elevada tensão superficial nos alvéolos, um
tipo especial de células está presente no epitélio alveolar, o pneumócito tipo II, secretor do
surfactante alveolar. O surfactante alveolar é uma mistura complexa de fosfolípides e proteínas, que
uma vez secretado pelo pneumócito tipo II, dirige-se à superfície da interface ar-líquido alveolar e
lá chegando facilita a interação molecular ar-líquido (em virtude da natureza dual polar e apolar dos
fosfolípides), reduzindo assim a tensão superficial e diminuindo a tendência de retração elástica dos
alvéolos (aumentado a complacência pulmonar) e reduzindo o esforço mecânico muscular para
encher os pulmões (Figura 6).

Figura 6: Papel do surfactante pulmonar na interface ar-água. Fonte: https://homomedicus.com/que-es-el-


surfactante/).

Aqui vale destacar que o surfactante alveolar é sintetizado continuamente ao longo de toda
a vida, iniciando sua produção após o amadurecimento dos pneumócitos tipo II, que ocorre por volta
da 35ª semana de gestação intraútero. Bebês nascidos prematuros antes da 35ª semana de vida
fetal não possuem níveis adequados de surfactante alveolar e por conta da elevada tensão
superficial nos alvéolos, a complacência pulmonar é bastante reduzida, com grande retração
elástica pulmonar e dificuldade de enchimento de ar nos alvéolos, acionado de forma intensa a
musculatura acessória respiratório e promovendo um grande sofrimento respiratório, um quadro
conhecido com síndrome da angústia respiratória do recém-nascido. Injúria pulmonar alveolar com
lesão ou destruição dos pneumócitos tipo II na vida adulta pode provocar um quadro semelhante, a
síndrome da angústia respiratória do adulto (SARA).
5.3.2. Volumes e Capacidades Pulmonares
Como descrito acima, o volume de ar inalado durante a inspiração e exalado durante a
expiração quieta de repouso (cerca de 500mL num adulto normal) é conhecido como volume
corrente. A medida deste volume pode ser feita clinicamente por meio do uso de um aparelho
conhecido como espirômetro. Além do volume corrente, tal equipamento também permite a medida
do volume de reserva inspiratório (VRI - volume a mais inspirado durante uma inspiração forçada
máxima, valendo em condições normais cerca de 3000mL) e do volume de reserva expiratório (VRE
- volume a mais que pode ser eliminado dos pulmões ao acionarmos a musculatura expiratória ao
seu máximo durante uma expiração forçada máxima, valendo cerca de 1100mL num homem adulto)
(Figura 7). Note que, mesmo usando a musculatura expiratória (músculos intercostais internos e da
parede abdominal) em seu máximo, um certo volume de ar jamais escapa dos pulmões, o que é
conhecido então por volume residual. Como este volume de ar residual jamais escapa dos pulmões
para encher o reservatório de ar do espirômetro, tal volume não pode ser medido pela espirometria
convencional. A somatória do VRI com o VC define a capacidade inspiratória (CI). Já a somatória
dos VRI, VC e VRE define a capacidade vital (CV) e representa a máxima variação de volume
possível durante uma inspiração/expiração forçada máxima numa hiperventilação (Figura 7). Como
o volume residual não pode ser medido pela espirometria convencional, capacidades pulmonares,
tais como a capacidade residual funcional (VRE+VR) e capacidade pulmonar total
(VR+VRE+VC+VRI) que dependem do volume residual não podem por consequência serem
também medidas pela espirometria (Figura 7). O volume residual e suas capacidades derivadas
podem ser medidas com o emprego do método de diluição do gás Hélio. Os volumes e capacidades
pulmonares são em geral maiores nos homens do que nas mulheres e isto é decorrente
principalmente da maior compleição e maior massa muscular esquelética respiratória em homens
do que em mulheres. A multiplicação do volume corrente pela frequência respiratória permite que
se calcule o volume minuto respiratório, o qual vale cerca de 6000mL/min para homens e um pouco
menos (cerca de 5.200mL/min) para mulheres.

Figura 7: Volumes e capacidades pulmonares durante um respiração normal quieta de repouso (volume
corrente) e durante um respiração forçada máxima. Fonte: Guyton e Hall, 2021.
5.3.3 Ventilação Alveolar e Espaço Morto
Numa respiração tranquila de repouso, o volume corrente num homem normal é da ordem
de 500mL Este volume de ar inalado durante a inspiração entra pela via área em direção ao alvéolo.
Dos ~500mL inspirados, cerca de 150mL, porém, jamais atingem os alvéolos, pois preenchem os
espaços reservados à via área condutora da cavidade nasal até bronquíolos terminais. Do total de
500mL do volume corrente, apenas 350ml de fato atingem os alvéolos e este volume é conhecido
como volume de ar alveolar. Estes 150mL que não atingem os alvéolos por preencherem o volume
das vias aéreas condutora não sofrem a hematose e são, portanto, conhecidos como volume de
espaço morto anatômico. A multiplicação do volume de ar alveolar (cerca de 350mL) pela frequência
respiratória (~12 rpm) leva ao valor do volume de ar que chega e sai dos alvéolos por minuto,
também conhecido como ventilação alveolar. Seu valor em homens normais é da ordem de
4200mL/min, sendo ligeiramente menor nas mulheres.
Em situações de má perfusão sanguínea aos alvéolos, como na embolia pulmonar, por
exemplo, o contingente de alvéolos não perfundidos, pela falta de sangue, não poderá realizar a
hematose, de modo que este ar alveolar não sendo trocado, passa a se comportar como o volume
de ar de espaço morto. Nesta condição, ao volume de ar do espaço morto anatômico soma-se o
volume de ar nos alvéolos não perfundidos (espaço morto alveolar), gerando um volume de espaço
morto maior que o anatômico e denominado de espaço morto fisiológico. Um volume de espaço
morto fisiológico maior reduz a ventilação alveolar, podendo levar a insuficiência respiratória.
Na posição supina (decúbito dorsal) a ventilação alveolar é mais ou menos homogênea
acontecendo quase igualmente em todos os alvéolos. Porém, ao assumir a posição de pé
(ortostática), o peso dos pulmões sobre a base pulmonar acaba por colapsar parcialmente os
alvéolos da base e a expandir parcialmente os alvéolos do ápice pulmonar. Durante uma inspiração
normal, os alvéolos do ápice já previamente expandidos, se expandem menos enquanto os alvéolos
da base previamente encolhido podem se expandir mais durante a inspiração, levando a uma
melhor ventilação nas bases em comparação aos ápices pulmonares quando o indivíduo encontra-
se de pé.

5.3.4 Fluxo de Ar e Resistência das Vias Aéreas


As vias aéreas até os alvéolos possuem formato em geral tubular. E o ar dentro delas se
movimenta quando uma diferença de pressão acontece entre as suas extremidades (Lei de
Poiseuille). Assim, durante a inspiração, com a pressão alveolar negativa menor que a pressão
atmosférica na narina, o ar entra (inspiração). Já na expiração, a retração da caixa torácica com
aumento da pressão intrapleural e por consequência da alveolar, cria uma diferença de pressão
positiva entre os alvéolos (pressão maior) que a pressão atmosférica nas narinas, gerando assim
um fluxo de ar de saída (expiração). Este fluxo de ar ao passar pelas vias aéreas superiores,
traquéia e grandes brônquios, em decorrência de seus grandes raios torna-se turbilhonado (gerando
um ruído típico auscultável pelo estetoscópio aplicado na superfície torácica, conhecido como som
claro pulmonar). Com a redução do raio luminal, nos brônquios menores, bronquíolos e alvéolos, o
fluxo de nestes trechos é do tipo laminar.
A trafegar pela via áreas, o fluxo de ar sofre resistência hidráulica decorrente do atrito do ar
com as paredes e entre as próprias moléculas do ar. Esta resistência das vias aéreas, calculada
pelas equações de Poiseuille, sofre influência do comprimento dos tubos aéreos, da viscosidade do
ar e do raio das vias aéreas. Como num indivíduo adulto, o comprimento das vias aéreas não mais
se altera e a viscosidade do ar é bastante estável, o principal determinante da resistência das vias
áreas é o raio dos brônquios e bronquíolos. Considerando o raio em tubos individuais, quanto maior
o raio menor a resistência hidráulica. Porém, como os brônquios e bronquíolos vão se ramificando
e a disposição deles em paralelo promove um número crescente de tubos que facilitam a passagem
do ar para a frente, a resistência hidráulica coletiva de um conjunto grande de brônquios menores
e bronquíolos é a menor dos pulmões em comparação com a elevada resistência dos grandes
brônquios.
O raios das vias aéreas e a consequente resistência hidráulica sofre a influência de uma
série de fatores, dos quais pode-se destacar: 1) o volume de ar pulmonar, o qual quanto maior, com
os pulmões mais expandidos, acaba por expandir também os pequenos brônquios e bronquíolos
dentro dos pulmões, aumentado seus raios e consequentemente reduzindo a resistência hidráulica,
facilitando a inspiração do ar; 2) a quantidade de muco secretor presente na luz dos brônquios e
bronquíolos, o qual reduz o calibre luminal ocupado pelo ar e eleva a resistência das vias aéreas.
Este é um fator importante na elevação da resistência das vias aéreas observada mas bronquites,
bronquiolites e broncopneumonias; 3) o edema da mucosa, em geral de natureza inflamatória ou
alérgica, que leva a vasodilatação na microcirculação da mucosa e submucosa brônquicas, levando
ao espessamente da mucosa e redução do calibre luminal com consequente obstrução e elevação
das resistência, como nos quadros inflamatórios acima mencionados; e 4) a broncomotricidade,
determinada pelo estado contrátil da musculatura lisa brônquica e bronquiolar. A broncoconstricção
eleva a resistência hidráulica enquanto a broncodilatação reduz a resistência e facilita a ventilação.
A musculatura lisa brônquica pode sofrer influência da inervação autonômica simpática,
principalmente em grandes brônquios, onde a noradrenalina via receptores beta2 adrenérgicos
promove grande broncodilatação, como a observada durante o exercício físico. Também o sistema
nervoso parassimpático vagal, o qual através da acetilcolina liberada na junção neuroefetora, atua
nos pulmões promovendo broncoconstricção e elevação da resistência das vias aéreas e dificuldade
respiratória. Em adição, hormônios circulantes também promovem broncodilatação, como a
adrenalina circulante, que atua intensamente em receptores beta2 adrenérgicos brônquicos e
bronquiolares, auxiliando na broncodilatação brônquica promovida pelo simpático e como o cortisol
da suprarrenal, o qual possui também um intenso efeito broncodilatador. Por outro lado, substâncias
de ação parácrina local, como a histamina liberada de mastócitos sob estimulação alergênica,
prostaglandinas, bradicinina, serotonina e citocinas pro-inflamatórias liberadas na mucosa em
decorrência de um processo inflamatório local promovem intensa broncoconstricção com elevação
da resistência das vias aéreas e uma consequente síndrome respiratória obstrutiva. Os três últimos
fatores acima descritos afetando ao raio brônquico/bronquiolar (excesso de muco, edema da
mucosa e broncoconstricção) estão intensamente presentes na asma brônquica, um quadro
obstrutivo inflamatório agudo, de origem em geral alérgica que promove intensa broncoconstricção
e dificuldade respiratória (dispnéia), principalmente expiratória, já que o raio reduzido, diminui ainda
mais com a retração pulmonar durante a expiração. A consequência final deste quadro é uma
importante hipóxia no sangue arterial que pode comprometer as funções gerais do organismo. Um
quadro similar de evolução crônica também é observado em um percentual elevado de fumantes
acometido por uma bronquite crônica, em que sinais e sintomas clínicos semelhantes são
observados, sendo a causa, porém, de origem irritativa inflamatória provocada pela lesão crônica
do cigarro na mucosa brônquica.
Na avaliação clínica destes casos de síndrome pulmonar obstrutiva (com aumento da
resistência das vias aéreas) pode-se utilizar a avaliação por espirometria, em que após uma intensa
inspiração (inspiração máxima), solicita-se ao paciente que expire de modo forçado o máximo de ar
possível. O total de ar expirado corresponde à capacidade vital forçada e o volume de ar expirado
no primeiro segundo da expiração (VEF1) é usado como uma estimativa indireta da elevação da
resistência hidráulica das vias aéreas. Um VEF1 baixo, significa menos volume expirado no primeiro
segundo, o que quer dizer que o ar está com dificuldade de sair pelas vias aéreas em consequência
do aumento de sua resistência.

5.3.5-Composição dos Gases Respiratórios


Durante a inspiração, o ar atmosférico sofre algumas modificações importantes ao longo de
seu trajeto até os alvéolos (Ver tabela 1). Enquanto o ar atmosférico, dependendo da região e das
condições climática possui quantidades variáveis de vapor d’água, o ar que chega aos bronquíolos
terminais está completamente umidificado atingindo cerca de 6,2% (47mmHg) da composição do
ar. A inclusão do vapor d’água ao longo das vias aéreas condutoras, acaba por diluir em parte os
outros componentes do ar atmosférico, de modo que a concentração de oxigênio neste ar
umidificado e aquecido no bronquíolo terminais é de aproximadamente 19,7% (~149mmHg) e a de
CO2, pobre no ar atmosférico é de cerca de 0,04% (0,3mmHg). Este ar quente e umidificado, ao
entrar nos alvéolos, começa a sofrer a hematose, o que leva à redução do oxigênio nele presente,
captado pelas hemácias sanguíneas, e ao aumento do CO2, liberado pelo sangue para dentro dos
alvéolos. Por conta então da hematose, as concentrações de O2 e CO2 no ar alveolar são então
da ordem de 13,6% (~104mmHg) e de 5,3% (40mmHg), respectivamente (Tabela1). No ar expirado
do volume corrente, onde ~350mL de ar alveolar se mistura com os cerca de 150mL de ar
umidificado do espaço morto anatômico das vias aéreas condutoras, o conteúdo de oxigênio é de
~120mmHg e de CO2 é de ~27mmHg (Tabela 1).
Tabela 1: Composição dos gases respiratórios (expressa como pressão parcial em mmHg e
como percentual) do ar que entra e sai dos pulmões (ao nível do mar).

Fonte: Guyton e Hall, 2021.

A composição do ar alveolar acima descrita é aquela observada durante a ventilação alveolar


de uma respiração quieta tranquila de repouso com frequência respiratória de ~12rpm e volume de
ar alveolar (volume corrente menos volume de espaço morto anatômico) de 350mL, ou seja, uma
ventilação alveolar normal de cerca de 4200mL/min. Esta composição de gases expressa em
pressões parciais de O2 e de CO2 é extremamente sensível ao nível de ventilação alveolar
presente. Em situações de hiperventilação, o oxigênio alveolar aumenta e o CO2 alveolar diminui.
E o contrário também é verdadeiro em situações de hipoventilação alveolar, a qual provoca uma
hipóxia e uma hipercapnia alveolares. Estas mudanças na composição do ar alveolar, de acordo
com a intensidade da ventilação pulmonar, têm impacto tremendo na intensidade das trocas
gasosas com o sangue que perfunde os capilares pulmonares.

5.4. Circulação pulmonar


Para que a hematose ocorra de forma adequada entre o ar alveolar e o sangue do capilar
pulmonar, o sangue precisa chegar em quantidades adequadas aos pulmões. E para tal o sistema
circulatório reservou aos pulmões uma circulação sanguínea exclusiva, denominada de circulação
pulmonar ou pequena circulação. Ela se inicia no ventrículo direito, com o sangue sendo ejetado
durante a sístole para o tronco pulmonar. Este grande vaso é curto e logo se bifurca nas artérias
pulmonares direita e esquerda, as quais levam o sangue aos respectivos pulmões. No hilo
pulmonar, elas iniciam um processo de ramificação intensa seguindo em direção às artérias
pulmonares de médio e pequeno calibre, até as arteríolas pulmonares. Estas, na proximidade dos
alvéolos, se ramificam amplamente nos capilares pulmonares, os quais são extremamente
numerosos, e fazem íntimo contato com os alvéolos pulmonares, formando a base morfológica para
a membrana alvéolo-capilar, por onde a hematose vai acontecer. Após um trajeto curto, os capilares
começam a se juntar formando vênulas, pequenas e médias veias até originar as veias pulmonares
que do hilo pulmonar, dirigem-se para o átrio esquerdo do coração, onde encerra-se assim a
circulação pulmonar. Por apresentar um trajeto bastante curto em comparação com circulação
sistêmica, a circulação pulmonar possui uma resistência hidráulica ao fluxo de sangue bastante
pequena (cerca de seis vezes menor que a resistência hidráulica da circulação sistêmica). O volume
total de sangue recebido pela circulação pulmonar, ejetado pelo ventrículo direito corresponde ao
débito cardíaco direito, sendo ~5L/min num indivíduo adulto normal. Por conta da baixa resistência
hidráulica desta circulação, para que os 5L/min de sangue fluam bem, não há a necessidade de
uma pressão inicial na circulação tão alta, de modo que as pressões arteriais no tronco pulmonar
são baixas da ordem de 25 x 8mmHg de pressão sistólica e diastólica, respectivamente, com uma
pressão média em torno de 15mmHg. Esta pressão média na artéria pulmonar, ao passar pelas
arteríolas pulmonares, as quais exercem a maior parte da resistência hidráulica pulmonar, sofre
uma queda significativa, chegando ao capilar pulmonar com valores em torno de 7mmHg de pressão
hidrostática capilar.
As arteríolas pulmonares são o principal determinante da resistência vascular pulmonar. O
controle da vasomotricidade arteriolar pulmonar regula não somente os níveis de pressão arterial
pulmonar, como também o fluxo de sangue regional nas diferentes partes dos pulmões. Este
controle é exercido principalmente pelo sistema nervosos autonômico, o qual por meio de fibras
simpáticas inervando o músculo liso da camada média, promove vasodilatação beta2 adrenérgica,
que eleva o fluxo sanguíneo pulmonar auxiliando na hematose. Este efeito vasodilatador simpático
pulmonar é importante durante a execução de um exercício físico. Além dos nervos autonômicos
simpáticos, fatores hormonais também atuam nas arteríolas pulmonares modulando a resistência
vascular pulmonar. Neste quesito, pode-se de destacar o papel da adrenalina da medula da
suprarrenal, que atuando também sobre receptores beta2 adrenérgicos musculares promove
vasodilatação e aumento do fluxo sanguíneo pulmonar, melhorando a hematose.
Fatos humorais locais também atuam na resistência dos vasos arteriolares pulmonares. Aqui
pode-se destacar o papel direto do oxigênio alveolar sobre o estado contrátil vascular. Em situações
de hipóxia alveolar, as arteríolas fornecedoras de sangue aos capilares alveolares hipóxicos sofrem
vasoconstricção (vasoconstrição hipóxica). Isso favorece a redistribuição de sangue para os
alvéolos mais bem ventilados, evitando assim o efeito de mistura arteriovenosa de sangue, que
poderia reduzir a pressão de oxigênio no sangue arterial (Figura 8). Esta vasoconstricção hipóxica,
também conhecida como fenômeno de Von Euler-Liljestrand, é um evento particular e exclusivo dos
pulmões, pois notadamente a falta de oxigênio nos demais tecidos do corpo promove vasodilatação,
e não vasoconstricção. Ela parece ser mediada pela liberação local de endotelina durante a hipóxia
alveolar, endotelina esta que é um potente vasoconstrictor. Além disso, durante a hipóxia alveolar,
a produção local endotelial de óxido nítrico e prostaciclina, ambos vasodilatadores, sofre redução,
contribuindo assim também para a vasoconstricção hipóxica.

Figura 8: (A) Relação entre a ventilação alveolar e a perfusão capilar pulmonar em condições normais. Note
ambos os alvéolos e vasos permeáveis com boa relação ventilação perfusão. (B) Uma redução da ventilação
no alvéolo da direita, com hipóxia alveolar e PO2 tecidual reduzida resulta em vasoconstricção arteriolar e
redução da perfusão neste alvéolo hipoventilado. Fonte: Silverthorn, 2016.
Além da vasomotricidade arteriolar, o fluxo sanguíneo pulmonar pode sofrer influência da
força da gravidade, em situações em que o indivíduo se encontra de pé. Nesta posição, o fluxo de
sangue para as bases, favorecido pela gravidade, é maior que na região central dos pulmões,
enquanto nos ápices pulmonares, o fluxo sanguíneo se reduz, uma vez que para subir até os ápices,
ele tem que vencer a força gravitacional em sentido contrário. Esta distribuição desigual do fluxo
sanguíneo pulmonar durante o ortostatismo se assemelha à distribuição da ventilação pulmonar
também desigual durante o ortostatismo, maior nas bases e menor nãos ápices (ver secção 5.3.3
acima), ainda que os efeitos da gravidade sobre o fluxo sanguíneo sejam mais marcados e intensos
do que sobre a ventilação alveolar. A relação entre ventilação alveolar (V) e perfusão pulmonar (Q)
deve ser a mais equilibrada possível, atingindo em posição supina valores em torno de 1
aproximadamente. Porém, ao fica de pé, a intensa queda da perfusão mais do que a ventilação nos
ápices pulmonares acaba por gerar neste local um certo grau de espaço morto alveolar e
consequentemente um espaço morto fisiológico maior que o anatômico (relação V/Q > 1). Já nas
bases pulmonares, durante a posição ortostática, o maior aumento da perfusão do que da ventilação
faz com que a relação V/Q seja menor que 1, denotando um desvio (shunt arteriovenoso direita-
esquerda, com sangue mal ventilado e, portanto, venoso se misturando com sangue arterial rico em
O2 oriundo das porções médias e ápices melhor ventilados (desvio arteriovenoso fisiológico). Aqui
vale ressaltar que um leve desvio arteriovenoso anatômico acontece entre as duas circulações, a
pulmonar e a sistêmica, decorrente da drenagem venosa dos vasos brônquicos (sangue venoso)
em parte para as veias pulmonares (sangue arterial) e das veias cardíacas mínimas (sangue
venoso) para dentro das cavidades atrais e ventriculares esquerdas, as quais contém sangue
arterial.
Uma vez atingindo os capilares pulmonares, componentes solúveis do plasma exceto as
proteínas plasmática podem sofrer algum tipo de transporte de fluído pela membrana alvéolo-capilar
até o interstício. As forças atuantes sobre os fluídos dos dois lados da membrana alvéolo-capilar
são as pressões hidrostáticas capilar e intersticial e as pressões coloidosmóticas exercidas pelas
proteínas também dos dois lados, a pressão coloidosmótica plasmática e a pressão coloidosmotica
intersticial (Figura 9). Note na figura 9 que a interação destas quatro forças atuantes sobre a
superfície da membrana alvéolo-capilar determina um leve extravasamento de líquido do plasma
para o interstício pulmonar, e este excesso de liquido acaba por ser drenado como linfa pelos vasos
linfáticos, tanto hilares quanto subpleurais.

Figura 9: Forças hidrostáticas e coloidosmóticas (expressas como pressão em mmHg) atuantes no capilar (à
esquerda) e no interstício pulmonar (à direita), resultando em uma pressão efetiva de filtração de líquido de
cerca de +1mmHg. O excesso de líquido acumulado no longo prazo é drenado pelos vasos linfáticos
pulmonares (em amarelo). Fonte: Guyton e Hall, 2021.
Situações que promovem elevação na pressão hidrostática capilar, sendo a mais frequente
a insuficiência do ventrículo esquerdo ou o aumento da permeabilidade do capilar decorrente de
lesão ou injúria do endotélio capilar por agentes patogênicos ou tóxicos, com extravasamento
adicional de proteínas para o interstício e consequente aumento da pressão coloidosmótica
intersticial, levam a uma filtração de líquido aumentada para o interstício, o qual é prontamente
drenado pelos linfáticos pulmonares. Porém, atingido o limite de drenagem pelos linfáticos, o liquido
intersticial se acumula e promove o edema pulmonar (cardiogênico no caso da insuficiência
cardíaca ou não-cardiogênico, no caso da injúria do endotélio capilar), o qual é uma condição muito
grave, pois ao aumentar a distância difusional dos gases respiratório provoca intensa dispnéia e
insuficiência respiratória, a qual dependendo de sua intensidade pode levar ao extravasamento de
líquido para dentro dos alvéolos, com agravamento da hipóxia e inclusive morte por hipóxia
generalizada.
Valores similares de pressões hidrostáticas e coloidosmóticas podem ser verificados nas
proximidades da pleura visceral. E o extravasamento aumentado de líquidos nesta região pode
resultar em coleção deste líquido dentro do espaço pleural, resultando em derrame pleural, o que
dependendo de sua intensidade pode dificultar a expansão elástica pulmonar durante a inspiração,
agravando ainda mais a dispnéia.

5.5 Difusão dos gases pela membrana respiratória


Nos alvéolos em condições normais, bem ventilados e bem perfundidos, a hematose ocorre
a partir da difusão dos gases oxigênio e gás carbônico através da fina membrana alvéolo-capilar
(Figura 10). Para que a difusão dos gases respiratórios aconteça é necessária uma diferença de
concentração entre os dois lados da membrana. E de fato, esta diferença de concentração existe,
sendo expressa em mmHg de pressão parcial de gás dissolvido na água do plasma (Figura 14). O
oxigênio apresenta-se com pressão parcial de cerca de 100mHg no ar alveolar, enquanto no plasma
sanguíneo venoso sua concentração plasmática é de 40mmHg. É este gradiente de concentração
o responsável pela captação de oxigênio do ar para o sangue através da membrana alveolar. Em
relação ao gás carbônico, a concentração sanguínea dele no sangue venoso que atinge o capilar é
da ordem de 46mmHg enquanto no alvéolo sua concentração é de 40mmHg. Este gradiente
difusional mais baixo de apenas 6mmHg é suficiente para que o CO2 por difusão simples deixe o
sangue e dirija-se ao ar alveolar (Figura 10). Obstruções das vias aéreas, como na asma brônquica
ou na bronquite crônica da doença pulmonar obstrutiva crônica, principalmente causada pelo
cigarro, levam à hipoventilação alveolar, com redução dos gradientes difusionais tanto de O2 como
de CO2, reduzindo intensamente a hematose e provocando intensa dispnéia.
Além da diferença de pressão parcial (P), outro fator a afetar a difusão gasosa é a
solubilidade do gás (S) na água do plasma ou do interstício, onde maiores solubilidades facilitam o
processo difusional por aumentar a concentração do gás em solução. Assim, o CO2, cujo coeficiente
de solubilidade relativa é de 0,57, difunde-se de forma mais rápida que o oxigênio (coeficiente de
solubilidade de 0,0024) em um gradiente de pressão bem menor.
Figura 10: Gradientes difusionais dos gases respiratórios através da membrana alvéolo-capilar.
Fonte: Guyton e Hall, 2021.

Conforme descrito na equação abaixo, a velocidade de difusão (D) também é influenciada


pela 1) área da superfície alveolar (A), onde quanto menor a área menos eficiente o processo
difusional, como pode ser observado no enfisema pulmonar, onde liberação de enzimas
proteolíticas no interstício reduz a matriz intercelular e a septação intra-alvelolar, reduzindo a
arborização alveolar e sua superfície de troca, com intensa dispnéia; 2) distância difusional (d) entre
a superfície luminal do capilar até a superfície luminal do alvéolo, onde aumentos desta distância
como na fibrose pulmonar ou no edema pulmonar compromete sobremaneira a troca gasosa
causando intensa dispnéia; e 3) o peso molecular (PM) do gás, sendo o gás carbônico
(PM=44daltons) ligeiramente mais pesado que o oxigênio (PM=32daltons):
Conforme descrito na equação acima, a velocidade difusional do CO2 para cada dada
diferença de pressão parcial é cerca de 20x maior que a capacidade difusional do O2.

5.6. Transporte de gases no sangue


Ocorrida a hematose, os gases precisam ser transportados em quantidades elevadas no
sangue até os tecidos (O2) e dos tecidos para os pulmões (CO2). Por conta da natureza apolar do
O2 e do CO2, ambos possuem solubilidade muito baixa na água do plasma e do interstício, ainda
que a solubilidade do CO2 seja mais de 20 vezes superior à do oxigênio. De modo a aumentar a
captação dos gases pelo sangue, uma série de mecanismos são empregados tanto pelo O2 quanto
pelo CO2 para aumentar a quantidade transportada deles no sangue, aumentando assim a
eficiência do processo respiratório como um todos.
O O2 imediatamente capturado pelo plasma sanguíneo nos alvéolos rapidamente se
equilibra com o oxigênio alveolar, atingindo pressões parciais de cerca de 100mmHg em seu estado
livre dissolvido. Porém, mais de 98% do oxigênio presente no sangue acaba por se difundir em
direção às hemácias, as quais possuem o pigmento respiratório hemoglobina, capaz de se ligar
com alta afinidade ao O2. A molécula de hemoglobina possui 04 sítios de ligação de alta afinidade
pelo O2 (04 grupamentos heme contendo íons ferro +2), aumentando muito a quantidade de
oxigênio no sangue arterial que sai do alvéolo. A quantidade de oxigênio que se liga à hemoglobina
é proporcional à pressão parcial de oxigênio no sangue e pode ser expressa pela curva de saturação
da hemoglobina (Figura 11), onde pode se notar que no sangue arterial, onde a PO2 é de 100mHg
a saturação da hemoglobina é de praticamente 100%. Já no sangue venoso com um PO2 média
de 40mmHg, a saturação da hemoglobina é de cerca de 70%. A capacidade da hemoglobina de se
ligar ao oxigênio sofre influência de alguns fatores, como a temperatura, a PCO2, o pH e os níveis
de 2,3difosfoglicetato no interior das hemácias. Aumentos da temperatura, da PCO2 e do
2,3difosfoglicertato e queda do pH (acidose) levam a uma menor afinidade da hemoglobina pelo
oxigênio, traduzida como um deslocamento da curva para a direita. (Figura 11). Este efeito do CO2
elevado e do pH reduzido nos tecidos periféricos, deslocando a curva para a direita e reduzindo a
afinidade da hemoglobina, resulta na liberação do oxigênio para os tecidos. Um efeito denominado
de efeito Bohr.
Figura 11: (A) Transporte de Oxigênio (O2) no sangue dos alvéolos até as células. Fonte: Silverthorn, 2016.
(B): Curva de saturação da hemoglobina e os fatores que a desviam para a direita, reduzindo a a afinidade e
liberando o oxigênio. Fonte: Guyton e Hall, 2021.

O gás carbônico, por sua vez, produzido pelo metabolismo aeróbico dos tecidos, sai das
células livremente para se dissolver no líquido intersticial e então por diferença de concentração
atinge o sangue dos capilares teciduais. No sangue cerca de 7% do CO2 permanece dissolvido na
água do plasma, sendo o restante dirigido às hemácias, onde aproximadamente 23 dele liga-se a
resíduos de aminoácidos da hemoglobina formado a carbamino-hemoglobina e os demais 70% são
combinados com a água numa reação catalisada pela anidrase carbônica dentro do citossol da
hemácia, formando ácido carbônico, o qual sofre imediata ionização em H+ e HCO3-. O H+ é
tamponado por resíduos de aminoácidos da molécula de hemoglobina, enquanto o HCO3- é levado
para o plasma, trocado pelo cloreto na membrana da hemácia pelo transportador antiporte Cl-
/HCO3- (Figura 12). O bicarbonato plasmático representa assim a principal forma de transporte de
CO2 no sangue, cerca de 70%. Este bicarbonato também é usado pelo plasma como um sistema
tampão de controle do pH plasmático. A quantidade de CO2 dissolvido no sangue nas diferentes
formas acima descritas é diretamente proporcional à pressão parcial de CO2 no sangue. Assim, no
sangue venoso que sai dos tecidos, com uma PCO2 de cerca de 46mmHg a concentração de CO2
é de cerca de 52mL%, enquanto no sangue arterial onde a PCO2 é de cerca de 40mmHg, a
concentração é da ordem de 48mL%. A quantidade de CO2 dissolvido no sangue sofre influência
de alguns fatores como a temperatura e a PO2. Elevações da temperatura e da PO2 reduzem a
quantidade de CO2 dissolvida no sangue. Em particular, o efeito da PO2 é muito importante pois
nos alvéolos, onde a PO2 é muito alta dada a grande quantidade de oxigênio nos alvéolos (PO2
alveolar de cerca de 100mmHg), a ligação do O2 à hemoglobina torna hemoglobina um ácido forte,
liberando os H+ tamponados para o citossol. Estes hidrogênios ligam-se ao HCO3- originado então
o ácido carbônico, que catalisado pela anidrase carbônica libera o CO2 para o ar alveolar. A ligação
do oxigênio à hemoglobina também reduz a formação de carbamino-hemoglobna, liberando o CO2
para o alvéolo. Este efeito do oxigênio alveolar aumentando a liberação de CO2 do sangue para
dentro do espaço alveolar é denominado de efeito Haldane, e é um importante mecanismo a
contribuir para uma eficiente hematose.
Figura 12: Transporte de Gás Carbônico (CO2) no sangue dos tecidos até os alvéolos. Fonte: Silverthorn,
2016.

5.7. Controle da respiração


Como descrito inicialmente na seção 5.3, o comando para a ação dos músculos respiratórios
primários e secundários parte de neurônios respiratórios localizados no bulbo raquidiano, os quais
projetam-se para os neurônios motores primários no corno anterior da medula espinhal cervical e
torácica (músculos respiratórios primários) e núcleos bulbares motores dos nervos cranianos
glossofaríngeo, vago, acessório e hipoglosso, bem como neurônios motores espinhais lombares
(músculos respiratórios secundários) usados na respiração forçada (Figura 5). Estes centros
bulbares se localizam em duas regiões, o grupo respiratório dorsal (GRD) incluindo o Núcleo do
Trato Solitário (NTS), controlando os músculos respiratórios primários (inspiratórios) e o grupo
respiratório ventral (GRV), situado no bulbo ventrolateral. Os neurônios do GRD trabalham gerando
uma série de potenciais de ação em frequência progressivamente maiores de disparo (em rampa),
os quais acionam o diafragma e os intercostais externos e a inspiração ocorre. Estes mesmos
neurônios projetam-se também para núcleos pontinos, o núcleo pneumotáxico, o qual projeta-se
para o núcleo apnêustico, um núcleo inibitório, que retroage sobre os neurônios do GRD (Figura 5),
promovendo uma posterior inibição dos mesmos e interrompendo a rampa inspiratório, o que leva
então ao relaxamento da musculatura e à expiração. Em situações de respiração forçada, os
neurônios do GRD provocam excitação nos neurônios do GRV levando a uma intensificação da
rampa respiratória e a um acionamento dos músculos respiratório inspiratório e expiratórios
secundários. A maior excitação do GRD e agora do GRV, projetando -se ao núcleo pneumotáxico
e depois ao apnêustico (Figura 5) acaba por promover maiores inibições no final da rampa
respiratória, interrompendo-a mais cedo, o que resulta em aumento da frequência respiratória.
Estes núcleos bulbares e pontinos centrais recebem influência de projeções corticais que
podem levar ao aumento da amplitude da rampa e da frequência respiratória. Estas estruturas
corticais, localizadas principalmente no córtex motor primário são acionadas durante a execução de
um exercício físico (comando central do exercício), o qual aumentando da excitação do GRD e GRV,
levam à hiperventilação do exercício físico. O estresse emocional também é capaz de ativar estas
estruturas bulbares e pontinas, uma vez que o sistema límbico ativado pelo estresse se projeta
diretamente aos núcleos respiratórios do tronco encefálico. Projeções corticais motoras direta
também são enviadas pelo trato cortico-espinhal para os neurônios motores medulares, o que
provoca um efeito voluntário sobre os movimentos respiratórios.
A maquinaria neuronal central do tronco encefálico (bulbo e ponte) também recebe influência
de neurônios sensoriais periféricos, que atingem o bulbo via nervos glossofaríngeo e vago. Uma
destas influências é mediada por fibras sensoriais mecânicas (estiramento) do nervo vago.
Neurônios vagais sensoriais mecânicos de estiramento cujas terminações estão presentes no
interstício pulmonar disparam potenciais de ação com a expansão dos pulmões durante a inspiração
e seus potenciais de ação são levados até o GDR (NTS) e aos núcleos pneumotáxico e apnêustico,
os quais acionados promovem a interrupção precoce da rampa respiratória, um mecanismo reflexo
conhecido como reflexo de Hering-Breuer, o qual funciona como um mecanismo protetor contra
inspirações excessivas e profundas. Secções vagais cervicais, por exemplo, interrompem o efeito
inibitório vagal sobre a rampa inspiratória e o indivíduo passa a respirar mais amplamente e em
menor frequência respiratória, um padrão respiratório conhecido como respiração apnêustica.
Neurônios centrais bulbares localizados próximo à superfície ventral lateral bulbar também
se projetam para o GRD e o GRV. Estes neurônios são sensíveis ao pH ácido intersticial e ao nível
de CO2 intersticial local, sendo ativados em aumentos locais do CO2 e/ou reduções locais do pH.
Como o CO2 sanguíneo atravessa a barreira hematoencefálica, estes neurônios funcionam como
sensores do CO2 arterial e funcionam como neurônios quimiorreceptores centrais, regulando a
ventilação (Figura 13). Elevações nos níveis de CO2 arterial, ao cruzar a barreira hematoencefálica,
atingem os quimiorreceptores centrais e lá, pela presença de anidrase carbônica, o CO2 sofre
reação com a água originando ácido carbônico, que ao se ionizar reduz o pH local ativando
potenciais de ação nestes neurônios. Estes potenciais de ação projetados aos neurônios GRD e
GRV promovem um aumento na amplitude e frequência respiratória. Esta hiperventilação então
promove a maior eliminação respiratória do CO2, fechando uma alça de feedback negativa
regulatória dos níveis de CO2 no sangue arterial (Figura 13).

Figura 13: Controle da ventilação pulmonar pelos quimiorreceptores centrais (sensíveis principalmente ao
CO2 no sangue arterial) e pelos quimiorreceptores periféricos (sensíveis principalmente ao O2 no sangue
arterial). (AC = Anidrase Carbônica). Fonte: Silverthorn, 2016.
Concomitante aos quimiorreceptores centrais, terminações sensoriais especializadas
localizadas na adventícia dos seios carotídeos e da crossa da aorta, denominadas de corpúsculo
carotídeos e aórticos, respectivamente, são capazes de detectar os níveis de oxigênio no sangue
arterial e informar os neurônios respiratórios bulbares, a fim de integrar uma resposta regulatória
reflexa da ventilação. Estes corpúsculos são denominados de quimiorreceptores periféricos, pois
conseguem fazer a leitura dos níveis de O2 e em menor grau dos níveis de CO2 e pH plasmático
(Figura 13). Quando o oxigênio arterial cai, ou o fluxo sanguíneo para os corpúsculos é reduzido,
eles são estimulados e, via sinais conduzidos pelos nervos glossofaríngeo e vago, potenciais de
ação atingem o bulbo, na região do NTS. Daí, estes estímulos se projetam para o GRD e o GRV,
bem como para o núcleo pneumotáxico pontino, aumentado o estímulo respiratório para que uma
hiperventilação aconteça a fim de aumentar os níveis de O2 baixos no sangue arterial, formando
uma alça de feedback negativa muito eficiente no controle da respiração. Os dois sistemas
quimiorreceptores, o central e o periférico, atuam simultaneamente e de forma recíproca
controlando de forma muito eficiente os níveis dos gases respiratórios presentes no sangue arterial.
Um exemplo de atuação deste quimiorreceptores é durante a execução de um exercício
físico. O comando central do exercício, que controla os músculos esqueléticos usados no exercício,
ao passar pelo bubo deixa estímulos para os GRD e GRV, que são estimulados em proporção aos
músculos acionados durante o exercício. Isso faz com que a respiração seja mais ou menos
pareada com as necessidades de troca gasosa aumentada durante exercício, onde mais oxigênio
precisa ser captado e mais CO2 precisa ser eliminado. Durante este pareamento entre o consumo
de oxigênio e a oferta respiratória pela hiperventilação, qualquer desajuste que implique em maior
ou menor oxigênio arterial, os quimiorreceptores periféricos entram em ação para regular a
ventilação, de modo a manter constante os níveis de oxigênio arterial, mesmo numa situação de
elevado consumo muscular. Este mecanismo de ajuste fino da ventilação garante que a respiração
seja exatamente adequada às necessidades de consumo efetuadas pelos músculos em atividade
durante o exercício físico.

5.8. Conclusões
Ao término deste capítulo podemos concluir que o funcionamento harmonioso do sistema
respiratório junto ao circulatório, com expansões (inspiração) e retrações (expiração) periódicas dos
pulmões, garante a entrada de ar até os alvéolos, possibilitando assim a troca gasosa na membrana
alvéolo-capilar. Uma vez o oxigênio sendo capturado pela hemoglobina e o CO2 liberado para o
espaço alveolar, o sangue circula até os tecidos periféricos, onde as trocas gasosas ocorrem em
sentido contrário, ou seja, o oxigênio é liberado da hemoglobina em direção aos tecidos e o gás
carbônico de dissolve no sangue principalmente na forma de bicarbonato. Este processo todo
possibilita a homeostasia respiratória nos tecidos e garante a sobrevivência celular.

Referências
1. GUYTON & HALL. Tratado de fisiología médica. 14ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan,
2021.
2. SILVERTHORN, DU. Fisiologia humana: Uma abordagem integrada. 7ª ed. Porto Alegre.
Artmed Editora Ltda., 2017.
3. BERNE & LEVI. Fisiologia. 6ª ed. Rio de Janeiro. Elsevier Editora Ltda., 2009.
4. GANONG. Fisiologia médica. 24ª ed. Porto Alegre. Artmed Editora Ltda., 2014.

Você também pode gostar