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Rio de Janeiro
abr./jun. 2015
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IV – DOCUMENTOS
DOCUMENTS
Resumo Abstract
O documento transcrito contém petição de certo The document transcribed here contains a pe-
Delfino, supostamente liberto, contra prisão ile- tition by someone whose first name was Del-
gal. Estão anexadas cópias da ação de escravi- fino, supposed to be a freedman, who claimed
dão movida pelo Coronel João Carneiro da Silva against an illegal imprisonment. Attached, there
contra Joaquim José Gomes de Castro por tomar are copies of the lawsuit filed by Colonel João
Delfino como seu cativo e carta de alforria. Con- Carneiro da Silva against Joaquim José Gomes
tém ainda o relatório da Comissão de Legisla- de Castro’s taking Delfino as his slave; there is
ção Civil e Criminal da Câmara dos Deputados also a copy of a carta de alforria (a certificate
com o indeferimento da súplica. A petição foi of freedom issued to an ex-slave). The document
apresentada aos representantes legislativos em contains a report by the House of Common’s
1826, ano de reabertura da Câmara dos Depu- Civil and Criminal Law Commission, which re-
tados. O pardo Delfino residia na Vila de Cam- jected the request. The petition was submitted
pos de Goytacazes, naquela época pertencente to the legislative representatives in 1826, when
à Província do Espírito Santo, e encontrava-se the House of Commons was reopened. Delfino
preso no calabouço da Corte, fato contra o qual lived in Campos dos Goytacazes, a village that
dirigia seus protestos. Escravo no momento da belonged to the province of Espírito Santo. He
prisão e durante boa parte do processo, Delfino was jailed in the dungeon of the court city, and
empregara os recursos judiciais possíveis para this was what he protested against. A slave when
reclamar da injustiça da situação e da privação he was arrested and during a long part of his
de seus direitos. A petição e os documentos ane- lawsuit, Delfino used all possible legal devices
xos permitem ao leitor acompanhar os caminhos to appeal against his unfair situation and the
judiciais percorridos pelo liberto e atentar para deprival of his rights. The petition and the docu-
os significados dessa ação que o inserem nos ments attached enable the reader to follow the
debates acerca da Escravidão e do Direito no freedman’s judicial paths and to consider the
Brasil Império. meanings of this lawsuit, a subject for discus-
sions on slavery and law in Brazil Empire.
Palavras-chave: Escravidão; Brasil Império; Keywords: Slavery; Brazil’s Empire; History of
História do Direito. Law.
RUMO AO CONGRESSO
Oferecemos ao leitor da Revista do IHGB a transcrição de uma peti-
ção remetida à Assembleia Geral do Império no ano de 1826, cujo signatá-
rio era um liberto. Documentos desse tipo eram previstos na Constituição
do Império, em seu título 8º das disposições transitórias e das garantias
dos direitos civis e políticos dos cidadão brasileiros. Em seu artigo 179
constava a normatização da inviolabilidade dos direitos civis e políticos,
cuja premissa era a liberdade, a segurança individual e a propriedade.
No parágrafo 30, previa-se particularmente que: “Todo o Cidadão poderá
apresentar por escrito ao Poder Legislativo, e ao Executivo reclamações,
queixas, ou petições, e até expôr qualquer infração da Constituição, re-
querendo perante a competente Autoridade a efetiva responsabilidade dos
infractores.” Esse direito de petição foi assimilado pela Constituição de
1824 a partir de longa tradição, cujas raízes se colocaram no alvorecer da
Idade Moderna, em especial, no right of petition, instituto que permitiu
aos súditos ingleses dirigirem representações diretamente ao rei. Segundo
Vantuil Pereira,3 o Brasil independente herdou o dispositivo da antiga me-
trópole. Os portugueses eram autorizados a denunciar atos excessivos e
desconhecidos do monarca enviando-lhe diretamente uma representação.
O direito de petição também foi consagrado na Declaração de Direitos da
Pensilvânia, de 1776, e na Constituição Francesa de 1791.
condições legais da ordem de prisão, sob pena de tornar nulo o ato. Com
efeito legal, qualquer cidadão tinha o direito de saber o motivo de sua
prisão e os nomes de seus acusadores no prazo de 24 horas.
TRANSCRIÇÃO
Fl. 1
Indeferido
Em 7 de maio de 1827.
Fl. 1v
Fl.2
Fl.2v
E.R.M.
Fl.2
Fl.2v
E.R.M.
Fl.3
Diz Delfino pardo forro que ele precisa se lhe dê certidão dos Autos
de registros que correm no Juizo do Crime do Bairo de S. José de vários
documentos que se acham juntos aqueles Autos, os quais o Suplicante
apontará ao Escrivão, e como este o não faz sem despacho.
E.R.M
Fl.3v
Fl.4
Fl.4v
Fl. 5
Fl.5v
fora preso no Caminho para esta Corte para onde o mesmo Gomes man-
dava com o Passaporte a folhas sete se passado a quinze de março deste
ano, julgo esta prova feita bastante para em virtude dela ser o Embargado
mantido a face da Lei na posse do Seu Escravo = Nem obtida a punição
que dispora dos Requerimentos e alegados do Embargante, o Tenente Co-
ronel João Carneiro, por isso que deles e mesmo das testemunhas que lhe
foram tomadas ao perpetuam [Reu?] nem [sam?] que se acham no apenso
apenas se conclui que o mencionado pardo é pertencente ao Vínculo de
que é ele Administrador a questão que é toda de domínio e que disse ser
tratada e provada com Juízo competente, isto é em Juízo Cível, ainda
disse convencer ao
Fl.6
Fl. 6v
te onde o Embargante [issar?] de sua Ação que lhe fica salva pois que
não é bastante para detenção do mesmo Escravo digo pardo na prisão a
cuja alegação de [posse?] da pessoa do Embargante Tenente Coronel João
Carneiro pareceu que este tem para tal caso os Recursos e mais apontados
pela Lei e pague o mesmo Embargante as custas em que o condeno pelo
processo de
Fl.7
Fl.7v
Fl.8
Fl. 8v
Fl. 9
da lei estando por agravo. Rio quatro de julho de mil oitocentos vinte
e seis = [Garces?] = É o que o continha a dita Petição de agravo [outro?]
[Sirva?] diz [nos mais] autos se era e mostrava estar a folhas cento e
sessenta cinco o Acordão que me fez [apensado] qual é do teor seguinte:
Acordão em Relação et cetera. Não fez agravado o Agravo pelo Juíz Su-
brogado no Despacho de que se agrava porquanto não se tendo tratado do
Recebimento da apellação. Sobre os efeitos em que deve ser recebido não
podia ser deferido de outro modo. Portanto vistos os autos lhe não dão
provimento. Rio oito de julho de mil oitocentos e vinte e seis = [Garces?]
Rocha = Doutor Figueredo = Nada mais continha a dita carta de Liberda-
de, Sentença, Petição de Agravo, e Acordão que bem e fielmente aqui fez
copiar dos próprios autos a que me dá parte em fé de o que vai esta por
mim certas conferida subscrita e
Fl. 9v
D _____1589
C. ____ 80
1669
60
Antonio Nogueira
Fl. 10
Em branco
Fl. 10v
Fl. 11
Referências Bibliográficas
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