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APOSTILA SOBRE PODER

Site: Ambiente Virtual de Aprendizagem do NEaD/UFRR Impresso por: Lyan Gustavo


DIR-101 - Teoria Geral do Estado e Ciência Política Data: terça, 18 abr 2023, 18:35
Curso:
(2023.1)
Livro: APOSTILA SOBRE PODER
Índice

1. CONCEITO DE PODER
1.1. Relação comando-obediência: diferencial biológico, psicológico e sociológico

2. ORIGEM DO PODER: NECESSIDADES E INTERESSES


2.1. Necessidades vitais e convivenciais
2.2. Interesses

3. ELEMENTOS DO PODER: VONTADE E CAPACIDADE


3.1. Elemento subjetivo do poder: vontade
3.2. Elemento objetivo do poder: capacidade

4. CLASSIFICAÇÃO DO PODER
4.1. Poder individual
4.2. Poder coletivo

5. CLASSIFICAÇÃO DO PODER COLETIVO


5.1. Poder difuso, personificado e institucionalizado
5.2. Poder grupal, nacional e transnacional
5.3. Poder transnacional: multinacional, internacional e transnacional genérico

6. QUALIDADES DO PODER
6.1. Licitude: qualidade moral do poder
6.2. Legitimidade: qualidade política do poder
6.3. Legalidade: qualidade jurídica do poder
1. CONCEITO DE PODER

Poder é o conceito central de toda a Ciência Política, uma vez que toda teoria política parte necessariamente da análise do
fenômeno poder. 

Desde os fenômenos sociais mais básicos, como a família, até os mais complexos, como o Estado, podem ser compreendidos a
partir das relações de poder. 

Por isso, é fundamental, para que possamos compreender o fenômeno da política e do próprio Estado, o estudo do conceito de
poder, bem como de seus principais elementos, origem e formas de expressão.
1.1. Relação comando-obediência: diferencial biológico, psicológico e
sociológico

O poder pode ser entendido como um fenômeno inerente à existência das sociedades humanas, construindo-se com o objetivo de
satisfazer as necessidades dos seus membros.

Assim, a partir da necessidade de se relacionar em sociedade para poder sobreviver, foram sendo forjados diferenciais entre os
seres humanos que irão promover relações de poder entre aqueles que definem as regras de organização da sociedade e as formas
como essas regras serão impostas e aqueles que devem se submeter a essas regras. São essas formas específicas de estruturação
das relações de poder que vão definir as formas como a sociedade, a política e o Estado vão ser organizar em cada momento e lugar
históricos.

Essas formas de estruturação das relações de poder, vão sempre levar em consideração um desequilíbrio decorrente de algum
diferencial de poder, que pode ser a força física, a raça, o gênero, a classe social, dentre outros.

Dessa maneira, é possível dizer que, numa relação entre duas pessoas, o poder se origina de um desses diferenciais que, acionado
pela vontade (pessoal, política, social, econômica etc.) possibilita a produção dos efeitos desejados pela parte detentora desse
potencial. Por isso, sejam quais forem os poderes individuais considerados, o poder é sempre relacional, ou seja, ele exige uma
relação entre duas ou mais pessoas, pois ele só se exerce e se manifesta no diferencial que existe entre elas.

Seja qual for esse diferencial, é necessário que exista a consciência (individual e/ou coletiva) e a vontade de seus detentores para
que eles possam obter resultados que espontaneamente não ocorreriam, principalmente se esse resultado for o comportamento de
outras pessoas.

Quando essa consciência se expande para todas as relações entre as pessoas de um determinado grupo, comunidade ou sociedade,
essa estrutura de poder acaba por abarcar todas as modalidades de autoridade institucionalizada, tais como as econômicas,
políticas e sociais.  

O poder passa a depender, então, das vantagens relativas decorrentes dos vários papéis desempenhados por cada membro da
sociedade.
2. ORIGEM DO PODER: NECESSIDADES E INTERESSES
2.1. Necessidades vitais e convivenciais

O poder surge das necessidades, que podem ser vitais ou convivenciais.

As necessidades vitais são exigências elementares da vida dos seres vivos, sejam eles humanos ou não humanos. Além das
necessidades vitais, entretanto, os seres humanos também possuem necessidades convivenciais que, por derivarem da
convivência, só podem ser satisfeitas por outros seres humanos e em sociedade.

Assim, dentre os seres humanos, as necessidades vitais se derivam para criar necessidades convivenciais, que podem assumir as
mais diferentes formas, conforme forem as exigências da vida cultural, já que, em cada sociedade, as necessidades vitais e
convivenciais são reconsideradas conforme as suas exigências culturais específicas. Por exemplo, uma necessidade vital, por
exemplo a necessidade de se alimentar para sobreviver, quando passa para o contexto cultural se transforma em uma necessidade
convivencial, na medida em que passa a exigir a preparação do alimento através de técnicas de culinária, passa a exigir a sua
apresentação em recipientes adequados, com um tipo de talher para cada prato, e em locais apropriados, enfim, há uma criação
cultural ilimitada de necessidades convivenciais que derivam da necessidade vital de se alimentar.

Muitas vezes, o processo cultural chega até a criar falsas necessidades ou até mesmo anti-necessidades, como é o caso, por
exemplo, o ato de jejuar, seja como preceito religioso ou como forma de protesto ou mesmo por imposições estéticas, de modo que
a necessidade cultural de jejuar acaba se sobrepondo à própria necessidade vital de se alimentar.

Assim, dentro do processo cultural, e o poder é um deles, as necessidades se derivam e acabam gerando os interesses.
2.2. Interesses

É a consciência das necessidades, sejam essas necessidades reais ou criadas, o que gera o interesse. Ou seja, interesse é a
necessidade que se torna consciente e cuja satisfação passa a ser desejada.

Os interesses são, portanto, projeções conscientes de necessidades e não necessariamente reproduções fiéis das necessidades.

O interesse não pressupõe, assim, o necessitar. Pressupõe o querer, a intenção de agir para satisfazer esse querer e, por isso, gera
a vontade. Em sociedade, os interesses individuais convertem-se em interesses coletivos e nesse processo vai adquirindo
características próprias até se transformar num padrão social de exigências e de expectativas de satisfação.
3. ELEMENTOS DO PODER: VONTADE E CAPACIDADE
3.1. Elemento subjetivo do poder: vontade

Como o interesse pressupõe o querer, é evidente que a vontade é o elemento que necessariamente deverá existir para a sua
satisfação.

Na verdade, são dois passos até chegar à vontade:

1º) a consciência do interesse, que é o querer;

2º) a consciência do querer, que é a vontade.

Portanto, para termos vontade, nós precisamos primeiro saber que queremos.

Por isso, a vontade é o primeiro elemento do poder, o elemento subjetivo do poder, aquele que o torna um fenômeno absolutamente
humano.

Entretanto, mesmo após deflagrado o mecanismo psicológico da vontade, sua tradução em ação eficaz necessita de um
complemento externo: um elemento que dote o agente de algum tipo de aptidão, de um diferencial em relação ao meio, que lhe
atribua alguma espécie de vantagem, que é justamente o segundo elemento do poder: a capacidade.
3.2. Elemento objetivo do poder: capacidade

A capacidade é, portanto, o elemento objetivo do poder, uma vantagem, que pode ser biológica, psicológica ou sociológica, ou
combinações entre elas, como vimos quando tratamos dos diferentes diferenciais de poder, graças à qual um agente tem condições
de impor sua vontade.

Em sociedade, quanto maior a complexidade de relações entre as pessoas, maior a possibilidade de combinações de capacidade
com potencial gerar inúmeras e peculiares relações de poder.

Dessa maneira, portanto, a vontade mobiliza o querer, mas só a capacidade integra o poder.

É possível observar, portanto, que há dois elementos essenciais que sempre concorrem para que exista o poder: a capacidade, que
lhe garante os meios, e a vontade que lhe impõe um fim. E, por isso, o poder surge sempre das combinações entre esses dois
elementos, nunca de um deles separadamente, pois a vontade sem capacidade é simples querer e a capacidade sem vontade, é
mero potencial.
4. CLASSIFICAÇÃO DO PODER

Para realizar uma classificação do fenômeno poder, partiremos de uma grande divisão entre poder individual, originário, e poder
coletivo, derivado.
4.1. Poder individual

O poder individual é a expressão mais simples do poder, pois ele surge no plano psicológico, apenas como uma identificação de
necessidades individuais. Seus componentes essenciais são a vontade e a capacidade do agente.
4.2. Poder coletivo

Apesar de sempre se originar de uma relação desequilibrada entre quem manda e quem obedece, o poder tem uma vocação
fortemente integrativa. O meio social é o seu universo e nele qualquer forma de poder tende a se expandir, combinando-se nas mais
variadas modalidades, até se estabilizar em indivíduos ou em instituições.

Essa integração de poderes individuais para constituir as diversas modalidades de poder derivado é denominada de concentração
de poder.     

A concentração do poder pode ocorrer em vários níveis de associação, mas não é possível explicá-la somente pelo critério
quantitativo, pois o poder coletivo não surge apenas do fato de existir um grupo de pessoas.

Como o poder parte do interesse, torna-se necessário que nesse grupo se desenvolva a consciência de um interesse comum entre
seus membros, que é justamente o que vai gerar uma motivação coletiva no grupo. Neste caso, os interesses comuns tornam-se
interesses coletivos quando evidenciados pela consciência de sua existência e pela vontade de satisfazê-los, pois enquanto o grupo
não desenvolve a consciência acerca desses interesses coletivos, o poder fica difuso e acaba sendo utilizado para satisfazer
somente interesses individuais. Entretanto, quando o grupo desenvolve a consciência acerca desses interesses coletivos,
desenvolve-se um poder coletivo para satisfazer tais interesse.

Assim, o interesse coletivo não é a justaposição de interesses individuais comuns, da mesma maneira que o poder coletivo não é a
mera somatória de poderes individuais coincidentes. Acima da vontade individual deve surgir uma vontade coletiva nova, que é a de
compor as vontades de cada um para atingir o objetivo coletivo. Dessa maneira, o poder coletivo surge quando o grupo consegue
polarizar os interesses que estão difusos, gerando o interesse coletivo e a vontade coletiva de satisfazê-lo.   

A concentração de poder dependerá dos graus e formas de agregação dos indivíduos, sendo a mera agregação física insuficiente.
Por exemplo, um grupo de pessoas na praia num dia de sol, apesar de estarem reunidos fisicamente e terem interesses comuns, tais
elementos, por si só, não geram poder em circunstâncias comuns, pois além da agregação deve existir um fator capaz de evidenciar
a consciência de um interesse coletivo. Mas se, usando o mesmo exemplo, acontecer de algum banhista estar se afogando, o
interesse comum de garantir a segurança de todos na praia, pode converter-se no interesse coletivo de salvar o banhista, produzindo
um poder coletivo que permita satisfazer esse interesse.

Assim, embora a concentração de poder seja um fenômeno espontâneo, não é um fenômeno automático. Por isso, é fundamental a
comunicação como forma de despertar a consciência coletiva do interesse comum e da possibilidade de se alcançar um objetivo
coletivo.

Sempre que uma determinada concentração de vontades passa a se repetir de forma reiterada, mostrando-se eficiente para atender
a interesses comuns que se tornaram interesses coletivos, poderá surgir um costume que, uma vez estabelecido numa coletividade,
leva seus membros a concentrar poder sem reexame crítico das circunstâncias. Com isso, o costume acaba ganhando uma
sedimentação própria que só vai poder ser desfeita se surgir uma nova consciência da sua desnecessidade e inutilidade.
5. CLASSIFICAÇÃO DO PODER COLETIVO
5.1. Poder difuso, personificado e institucionalizado

À medida em que se expandem suas consciências acerca do coletivo, os indivíduos vão se associando em níveis cada vez mais
complexos

 Quando ainda não existem formas associativas efetivas, o poder coletivo se apresenta de forma difusa entre seus membros, sendo
concebido como um poder difuso.

Com a concentração do poder, o poder deixa de ser um poder difuso e torna-se um poder personificado, concentrando-se na pessoa
de um líder que, além dos seus interesses individuais, passa a personificar também os interesses coletivos do grupo.

Com a estabilidade cada vez maior do poder coletivo, este se torna um poder institucionalizado, no qual é possível observar a
concentração de todo o poder coletivo numa instituição, como é o caso do Estado.
5.2. Poder grupal, nacional e transnacional

Tomando a ideia de nação como referência, é possível distinguir três categorias de poder coletivo: o poder grupal, o poder nacional e
o poder transnacional.

O poder grupal é o que se produz nas associações secundárias dentro de uma nação, tais como ONGs, associações corporativas e
profissionais (OAB, CRM, etc), sindicatos, etc., que se apresentam como grupos que se reúnem em torno de objetivos específicos e
quase sempre bem definidos.

O poder nacional é uma espécie de poder coletivo que se expressa como a forma de poder mais abrangente que pode existir dentro
de uma nação. Seus objetivos são genéricos, referidos à toda a nação e definidos a partir de um processo histórico, político e
cultural.

Já o poder transnacional é a categoria de poder coletivo que reúne interesses que se realizam para além do contexto nacional,
podendo, inclusive, englobar interesses de várias nações.

No plano político, o poder transnacional pode se revelar como um poder paralelo aos poderes nacionais, podendo estabelecer com
eles uma relação de cooperação ou de antagonismo no âmbito internacional. Como exemplos dessa espécie de poder, podem ser
citadas as grandes empresas e corporações transnacionais ou mesmo organizações terroristas e de narcotráfico transnacionais. 

Sobre o poder transnacional, ver o texto “Organizações transnacionais na política mundial”, de Samuel P. Huntington, que se encontra
na Pasta Leitura Complementar.
5.3. Poder transnacional: multinacional, internacional e transnacional
genérico

O poder transnacional pode se subdividir em três categorias: poder multinacional, poder internacional e poder transnacional
genérico.

No poder multinacional há contribuições por parte de diversas nações interessadas na realização de um objetivo comum, podendo
tal poder resultar, inclusive, na institucionalização de órgãos multinacionais.

Já no poder internacional não existe uma somatória de contribuições, mas uma composição de interesses, onde nem sempre fica
nítido o interesse de cada nação. Por isso, a institucionalização do poder internacional exige um espaço político próprio, revestido de
uma precisa formalidade político-jurídica, como por exemplo a ONU.

O poder transnacional genérico encontra sua expressão em instituições não-oficiais que visam os mais diferentes interesses, desde
a proteção dos direitos humanos, religiosos e filosóficos até a preservação do meio-ambiente, como é o caso, por exemplo, de ONGs
internacionais como Greenpeace, WWF-Brasil, Médicos sem Fronteiras, dentre outras.
6. QUALIDADES DO PODER

As qualidades do poder estabelecem diferentes juízos de valor acerca do fenômeno do poder ao contrastá-lo com determinados
padrões de referência, tais como a moral, a política e o direito.
6.1. Licitude: qualidade moral do poder

A licitude tem como padrão de referência a moral, decorrente dos costumes gerais dominantes numa sociedade. 

Fundamenta-se, portanto, nos modelos de comportamento produzidos no processo histórico-cultural de desenvolvimento de um


determinado grupo social. 

O que interessa na licitude, portanto, são os valores que são produzidos no meio social.
6.2. Legitimidade: qualidade política do poder

A legitimidade tem como padrão de referência a política.

Diz respeito à aceitação consensual, por parte da sociedade, de um comportamento, decisão ou ideia que, direta ou indiretamente,
diga respeito à direção do grupo.

Aqui já não são mais os valores que importam, mas sim os interesses. O que importa é o que a sociedade espera do poder, o porquê
a sociedade aceita uma determinada decisão do poder político.

Nesse sentido, é possível dizer que o poder político só vai existir se ocorrer essa aceitação, pois se não ocorrer tal aceitação não
será possível a dominação. 

Por isso, a base de todo poder político é a legitimidade.

Se uma sociedade não aceitar determinado governo ou determinadas decisões desse governo, o poder político não conseguirá se
efetivar e, dessa maneira, não existirá poder político.

Poder legítimo, portanto, é poder consentido. A sociedade deve reconhecer a sua ligação com o poder político através do
consentimento. Por isso, é indispensável que exista uma convergência entre os objetivos do poder e as aspirações da sociedade.   
6.3. Legalidade: qualidade jurídica do poder

A legalidade tem como padrão de referência o Direito.

Necessita, portanto, de uma sedimentação institucionalizada da vontade social em forma de normas jurídicas.

Dessa maneira, a legalidade é o juízo de valor que decorre do contraste do poder político com as leis, na medida em que essas leis
serão responsáveis por determinar se o poder político é ou não satisfatório para a sociedade.

Na estrutura de Estado em que vivemos hoje, que é a de um Estado Democrático de Direito, o poder político deve ser, ao mesmo
tempo, legítimo, legal e lícito, pois além de estar de acordo com as leis vigentes (legalidade), atuando estritamente dentro das
barreiras e restrições estabelecidas pelas normas jurídicas, também deve ser aceito consensual e democraticamente por seu povo
(legitimidade), através dos mecanismos jurídico-democráticos de participação política, além de estar de acordo com os valores
éticos e morais desse povo (licitude).

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