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Relações de poder e sociedade

A vida em sociedade, para ocorrer de forma harmoniosa, requer algumas normas e tipos
comportamentais ideais. Com o advento da modernidade, diferentes grupos humanos ambicionaram
definir novas práticas e modelos de interpretação da realidade. As matrizes do saber, antes fundadas no
princípio religioso católico, passaram a ser questiona- das, gerando, por consequência, a perda do poder
hegemônico da Igreja. Ao longo de toda a Idade Média, a Igreja se posicionou como uma das principais
instituições de saber e de poder na Europa, definindo por meio da vigilância e da punição, o ordenamento
da vida cotidiana e os princípios de moralidade e disciplina.
Como contraponto às estruturas de poder medievais, a sociedade moderna legitimou novas bases
de organização do meio social e da moral. O homem moderno, assim, constituiu a sua identidade fundada
em uma nova ordem econômica, política e social. Com a ascensão do capitalismo, as relações cotidianas
passaram a ser pautadas por novos valores; influenciados por esses valores, os indivíduos receberam de
forma mais amena, ou até mesmo questionaram, os preceitos ditados pela Igreja. Posicionando-se como
fomentadora desse processo dinâmico e contraditório, a sociedade moderna redefiniu as relações de força
e de poder. Enquanto a tradição medieval passava por questionamentos, as aventuras da modernidade
eram criadas, o que permitiu, por exemplo, a realização das grandes navegações e um diálogo
intercultural e comercial mais intenso, definindo a racionalidade e a reflexão como fontes de
desenvolvimento do homem. Ou seja, as bases da organização social foram erguidas pela chamada
práxis, um modelo referencial que permitiu a observação e a formulação de explicações fundadas na
experiência prática, pautada pelo uso da razão, e não mais na crença religiosa.
As transformações que se seguiram impulsionaram processos revolucionários que trouxeram à
tona novas relações de poder, as quais, uma vez institucionalizadas, ganharam força e condições de
autoafirmação. Dessa forma, os poderes que se definiram foram pautados pelo uso da estrutura colonial e
imperial; pela dominação e uso das chamadas violência material e violência simbólica; pela coerção e,
ainda, por pactos firmados entre grupos com mais poder económico. O desejo de poder, assim como a
conquista da capacidade de disciplinar o saber, orientaram as ações desses grupos e impulsionou
conflitos. Pierre Bourdieu, a violência simbólica é exercida por meio da coação social.
De acordo com o sociólogo francês Pierre Bourdieu, a violência simbólica é exercida por meio da
coação social, sendo muitas das vezes praticada no âmbito dos sistemas de ensino e de poder, e
veiculada, de forma sistemática, pelos meios de comunicação. A violência simbólica resulta, como
referência Pierre Bourdieu, do exercício de um poder simbólico, pelo qual se que quer fazer com que
determinado grupo de indivíduos veja como "naturais" as coisas do mundo, as estruturas sociais, as
diferenças de classe, as representações e ideias dominantes.
A violência simbólica, nessa medida, se define no campo das relações sociais, sendo
rotineiramente desenvolvida por instituições e agentes de poder que exercem a autoridade de saber e
conformam a aceitação de regras, sanções, padrões de moralidade e costumes. Mas, afinal, o que é o
poder? Quem o regula? Como ele se estrutura? O que ele ordena e pretende disciplinar? Quem são os
agenciadores do poder? Quem é alvo de sua ação? Quais as estruturas de poder, e como elas se
relacionam com os micropoderes? A fim de que se possa buscar respostas para essas questões, é preciso
ter em vista que o poder é, por excelência, uma estrutura ordenadora, disciplinadora, e que pretende
conformar a unidade e legitimar as condições de mando, sendo regulado por instituições e atores sociais
diferenciados. As relações de poder tencionam estabelecer o consenso, ainda que, para tanto, seja
necessário o exercício da coerção, por meio da violência material ou simbólica.
As relações de poder estão presentes em toda sociedade e apresentam-se de formas múltiplas,
seja no âmbito privado (vida doméstica e familiar), seja, principalmente, nos espaços públicos (articulado
por instituições de saber e por estruturas políticas). Dessa forma, é preciso compreender o poder como
objeto histórico, pois é possível perceber sua formação cronológica ao longo da história, e como uma força
móvel e plural, pois pode atuar em várias esferas.
Como informa o sociólogo John Scott, é importante distinguir o poder, em seu sentido mais
genérico, do poder social, tipo que mais interessa para os estudos de Sociologia. Para Scott, o poder
social "é uma relação que se estabelece entre dois agentes, um dos quais é o agente superior ou principal
e o outro, o subalterno ou subordinado. O superior detém ou exercita o poder, enquanto o subalterno é
afetado pelo poder de um superior". Essa relação dicotômica (superior x subalterno) persistiu, por longo
tempo, como uma das principais referências sociológicas para o estudo das relações de poder, sendo
aprofundada, primeiramente, pelo sociólogo alemão Max Weber (já estudado em aulas anteriores).
Weber compreende o poder como a "chance de um homem ou alguns homens de realizarem a sua
vontade em um ato de comando, mesmo contra a resistência de outras pessoas que participam da ação".
Para o sociólogo alemão, o poder envolve conseguir o que se quer, mesmo que contra a vontade de
indivíduos e de grupos sociais, os quais, claro, defendem projetos antagônicos dos grupos dominantes.
Estes somente conseguem hegemonizar a sua condição de poder porque se servem de instituições
legitimadoras, tais como o Estado, as universidades e as igrejas; e de recursos como veículos de
comunicação e demais dispositivos de informação. Com base nesses referenciais, determinados grupos
conseguem os seus projetos políticos, por exemplo, exercendo fazer valer o poder coercitivo e/ou a sua
autoridade. Tais formas de poder não são utolegitimadoras, pois dependem, diretamente, do tipo de
relacionamento que conseguem forjar com a sociedade.

LEITURA COMPLEMENTAR

Em seu significado mais geral, a palavra poder de- signa a capacidade ou a possibilidade de agir, de
produzir efeitos. Se o entendermos em sentido especificamente social, ou seja, na sua relação com a vida
do homem em sociedade, o poder torna-se mais preciso, e seu espaço conceptual pode ir desde a
capacidade geral de agir, até à capacidade do homem em determinar o comportamento do homem: poder
do homem sobre o homem. O homem é não só o sujeito, mas também o objeto do poder social. E poder
social é, por exemplo, a capacidade que um pai tem para dar ordens a seus filhos ou a capacidade de um
Governo de dar ordens aos cidadãos. Como fenômeno social, o poder é, portanto, uma relação entre os
homens, devendo acrescentar-se que se trata de uma relação triádica. Para definir um certo poder, não
basta especificar a pessoa ou o grupo que o detém e a pessoa ou o grupo que a ele está sujeito: ocorre
determinar, também, a esfera de atividade à qual o poder se refere ou a esfera do poder. A mesma pessoa
ou o mesmo grupo pode ser submetido a vários tipos de poder relacionados com diversos campos. O
poder do médico diz respeito à saúde; o do professor, à aprendizagem do saber; o empregador influencia
o comportamento dos empregados, sobretudo na esfera econômica e na atividade profissional; e um
superior militar, em tempo de guerra, dá ordens que comportam o uso da violência e a probabilidade de
matar ou morrer. No âmbito de uma comunidade política, o poder de A (que pode ser, por exemplo, um
órgão público ou um determinado grupo de pressão) pode dizer respeito à política urbanística; o poder de
B, à política exterior em relação a uma certa área geográfica; o poder de C dirá respeito, enfim, à política
educacional, e assim por diante. Quando, no exercício do poder, a capacidade de determinar o
comportamento dos outros é posta em ato, o poder se transforma, passando da simples possibilidade à
ação. Assim, podemos distinguir entre o poder como simples possibilidade (poder potencial) e o poder
efetivamente exercido (poder em ato ou atual).
BOBBIO, Norberto. Poder. In: Dicionário de política. 13. ed. Brasília: Ed. UnB, 2007. p. 933-934, (adaptado)

De acordo com Max Weber, existem três tipos de autoridade.

Autoridade tradicional, que consegue legitimar o poder com base nos padrões culturais e nas regras
sociais historicamente forjadas.

Autoridade carismática, baseada na devoção a um líder político, nesse caso, cabendo citar, figuras como
Adolf Hitler, na Alemanha, e de Getúlio Vargas, no Brasil. Tais homens políticos conseguiram erguer
governos autoritários com forte apoio popular, além de promover ações arbitrárias com o conhecimento de
diferentes grupos sociais.

Autoridade racional ou legal, que se legitima pelas organizações modernas ou formais, a exemplo do
Estado. Essas organizações direcionam a vida política e as regras de uma sociedade e pretendem
regulamentar os lugares sociais e a norma da vida cotidiana.
ATIVIDADE

1) “Ao analisar o Estado alemão, Weber afirma que o verdadeiro poder estatal está nas mãos da
burocracia militar e civil. Portanto, para ele, o ‘Estado é uma relação de homens dominando
homens’ mediante a violência, considerada legítima, e uma ‘associação compulsória que organiza
a dominação’ para que esta relação exista, é necessário que os dominados obedeçam à
autoridade dos que detém o poder”.
(TOMAZI, Nelson Dacio. Sociologia para o ensino médio. 2ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 106)

Desse modo, segundo Max Weber, existem três dominações que são legítimas. De acordo com a
assertiva, acima apresentada, bem como os conhecimentos em torno da sociologia weberiana,
assinale a alternativa correta, isto é, as três dominações legítimas, consideradas por Max Weber.
A) Tradicional, religiosa e carismática;
B) Carismática, tradicional e política;
C) Tradicional, carismática e legal;
D) Carismática, política e religiosa;
E) Tradicional, política e legal.

2) “O Estado me fez entrar nele obrigatoriamente, como fez com todos os outros, e me tornou
dócil em relação a ele, o Estado, e fez de mim um homem estatizado, um homem regulamentado
e registrado”.
BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas. Campinas – SP: Papirus editora, 2014, p. 92

De acordo com a assertiva, apresentada acima, assinale (V) para verdadeiro e (F) para falso:
( ) O Estado, segundo Bourdieu, opera a partir de uma lógica de dominação violenta e
simbolicamente.
( ) O Estado, por meio da escola, faz de todos os indivíduos criaturas estatizadas.
( ) O Estado, segundo Bourdieu, estatiza pessoas, mas isso não pode ocorrer pela via da escola
enquanto atividade de reprodução social.
( ) O Estado é o detentor da violência física legalmente e, também, ainda segundo Bourdieu,
detentor da violência simbólica.
( ) O Estado, de acordo com Bourdieu, estatiza pessoas, mas isso acontece, dentre outras
coisas, graças ao poder de reprodução da escola.

a) V – V – F – V – V ;
b) F – V – F – V – F ;
c) V – F – F – V – F ;
d) F – V – V – F – F ;
e) F – V – F – V – V .

3) “Discursos sobre o sexo não se multiplicaram fora do poder ou contra ele, porém, lá onde ele
se exercia e como meio para seu exercício: criaram-se em todo canto incitações a falar; em toda
parte, dispositivos para ouvir e registrar procedimentos para observar, interrogar e formular.
Desenfurnam-no e obrigam-no a uma existência discursiva”.
Tendo como referência os estudos sobre sexualidade em “A Vontade de Saber”, no qual o autor
se propõe a analisar os discursos de verdade em torno da sexualidade, é CORRETO afirmar
sobre essa obra que
A) O objetivo principal da obra foi fazer uma história das condutas, comportamentos e práticas
sexuais das sociedades ocidentais.
B) O tema principal do livro são os problemas de censura e de liberdade sexual nas sociedades
ocidentais.

C) em “A Vontade de Saber”, o discurso sobre repressão sexual moderna é criticado por ocultar a
proliferação de discursos a respeito da sexualidade.
D) Foucault demonstra que os discursos sobre a sexualidade apenas descrevem a natureza
reprodutiva humana e não se articulam com quaisquer relações de poder.
E) em “A Vontade de Saber”, o autor defende a existência de uma verdade sobre o sexo que está
escondida nos discursos sobre sexualidade.

4) Pude entender o discurso do cacique Aniceto, na assembleia dos bispos, padres e


missionários, em que exigia nada mais, nada menos que os índios fossem batizados. Contestava
a pastoral da Igreja, de não interferir nos costumes tribais, evitando missas e batizados. Para
Aniceto, o batismo aparecia como sinal do branco, que dava reconhecimento de cristão, isto é, de
humano, ao índio.

MARTINS, J. S. A chegada do estranho. São Paulo: Hucitec, 1993 (adaptado).

O objetivo do posicionamento do cacique xavante em relação ao sistema religioso externo às


tribos era

a) flexibilizar a crença católica e seus rituais como forma de evolução cultural.


b) acatar a cosmologia cristã e suas divindades como orientação ideológica legítima.
c) incorporar a religiosidade dominante e seus sacramentos como estratégia de aceitação social.
d) prevenir retaliações de grupos missionários como defesa de práticas religiosas sincréticas.
e)reorganizar os comportamentos tribais como instrumento de resistência da comunidade
indígena.

5) Faça uma pequena pesquisa sobre as principais instituições sociais do sociedades modernas e
como elas exercem poder em nossa vida cotidiana.

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