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Manual se Sociologia Politica Adelino Esteves Tomás

UNIDADE I
CONCEITOS INTRODUTÓRIOS E FUNDAMENTAIS DA SOCIOLOGIA
POLÍTICA

Objectivos da unidade temática


 Dominar a relação entre a Sociologia e a Política.
 Compreender as noções de Poder, Estado e Nação.
 Analisar as perspectivas sociológico-políticas clássicas, com ênfase em Charles
Montesquieu, Karl Marx e Max Weber.
 Discriminar os Órgãos de Soberania da República de Moçambique.

Sumário
Esta unidade temática é consagrada à análise de alguns dos principais conceitos da Sociologia
Política, designadamente poder, legitimidade, Estado, burocracia, alienação, entre outros.
Dada a transversalidade e polissemia destes conceitos, é suposto que os mesmos sejam
utilizáveis noutras disciplinas.

1.1: A Sociologia Política entre a ciência política e a teoria sociológica do poder:


objecto da Sociologia Política

A expressão “Sociologia Política” é ambígua. Ambígua porque os sentidos de “Sociologia” e


de “Política” estão tão extremamente ligados um ao outro que o significado de um converge no
outro. Ora, por Sociologia entende-se uma ciência sobre a sociedade e na Política tem-se um
conjunto de acções levadas acabo por um grupo de indivíduos com a finalidade de resolver os
problemas com que uma dada sociedade se depara. Com efeito, segundo Aristóteles, “O Homem
é um animal político”, pois é capaz de viver em sociedades organizadas em Polis e regidas por leis
que sancionam a violação das normas da sociedade. Logo, o Homem não é somente um animal
político, mas também, um animal social. Por outro lado, aquilo que Aristóteles convencionou

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chamar de Polis (Cidade, Estado) pode traduzir-se também como Sociedade política, comunidade
política, sociedade civil, etc.
Assim, a Sociologia Política pode entender-se como a ciência da sociedade civil; ramo da
Sociologia que estuda o poder; o dever político, procurando compreender a relação entre
Estado/cidadão, Estado/Estado, Estado/partido político, partido político/partido político, partido
político/cidadão, etc.; é o estudo das bases sociais da política.
Embora a Sociologia Política tenha sido institucionalizada por Augusto Comte (1798-1857),
as suas premissas teóricas remontam a Platão, Aristóteles, Maquiavel, Hobbes, Locke,
Montesquieu, Marx, etc.
De qualquer forma, uma outra definição da Sociologia Política remete-nos a uma “ciência que
estuda as normas políticas e as instituições políticas, os partidos políticos, as eleições, as tomadas
de decisões pelos governos, o funcionamento da administração pública, a selecção das elites
dirigentes, as relações entre as elites políticas e todos os aspectos do Estado” (Colas, 2008, p.10).
Outros autores entendem por Sociologia Política, o estudo científico dos factos políticos; todo
facto social relacionado com o acesso, a titularidade, o exercício e o controlo de poder (Bastos,
1999).
Da definição deste último autor extraímos a palavra poder que se deve considerar palavra-
chave, isto é, uma pressuposição da existência de uma interacção entre os indivíduos que se traduz
numa potencialidade de alguém infligir sobre os outros um determinado comportamento. Disto
depreende-se que o fundamento do poder político é a necessidade de encontrar mecanismos
orientados para a solução dos conflitos de interesses resultantes do acesso aos bens finitos.
Em suma, podemos considerar a Sociologia Política como o capítulo de Sociologia Geral que
tem por objecto os factos sociais de carácter político.

I.2: Poder, autoridade, legitimidade e Estado.

A política não é um mundo de consensos, de partilha e de comunidade de interesses. Ela é,


antes de tudo, a análise de relações desiguais entre os grupos (partidos políticos, sindicatos,
Estados, etc.), isto é, o poder.

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O poder, não no sentido semântico da palavra mas no do fenómeno, implica uma relação
desigual relativamente estabilizada em que a parte na posição mais elevada comanda e a outra, na
posição mais baixa, obedece (Colas, 104).
Convém distinguir o conceito poder do conceito poderio. O poderio é a capacidade de um ser
(indivíduo, instituição, grupo, etc.) produzir um determinado efeito. O poderio estende-se até
encontrar o outro que o trave ou que a ele se oponha. Distingue-se do poder pelo facto de este
último ser uma relação que pressupõe uma estabilidade, uma permanência e uma
institucionalização. Por exemplo, as relações entre dois Estados antagónicos emergiriam mais da
análise do poderio de um sobre o outro, ao passo que as relações políticas internas de cada um
desses Estados seriam mais relações de poder. Portanto, o poder é uma relação que supõe um
consentimento, uma adesão, uma participação nesta relação em que o poderio seria o efeito
resultante do poder. Ou seja, o poder é um laço entre dois elementos de poderios diferentes e como
diria Hobbes, “o poderio não é mais do que o excesso de poder de um Homem sobre o outro”1.
A fim de incluir nesta definição formas muito diferentes e subtis do poder, o significante
“força” está dissimulado, compreendendo-se na definição até mesmo as relações desiguais que não
utilizam a coerção física, como por exemplo, o médico que ordena uma medicação ao seu paciente,
ou o sacerdote que impõe uma ordem de carácter religioso aos fiéis obtendo obediência sem
recorrer à força.
Desde logo, a obediência à autoridade do médico ou do sacerdote não resulta da possibilidade
do uso da força pelos visados ou do uso do poder em si mesmo, mais da legitimidade da sua
autoridade.
Por legitimidade entende-se, o reconhecimento pelos súbditos da validade de uma certa
autoridade e a espontânea vontade de submissão por parte dos próprios súbditos. A uma autoridade
ilegítima, apenas há submissão dos súbditos na base da força ou da violência. O inverso também
é válido, isto é, qualquer força ou violência que vise garantir determinada autoridade, é ilegítima,
excepto quando perpetrada pelo Estado.
Nas palavras de Max Weber (1864-1920), “…uma organização de dominação é uma
organização política quando e enquanto a sua existência e a legitimidade dos seus regulamentos
são garantidas de forma permanente no interior de um território geográfico determinável pela
aplicação ou ameaça de aplicação de coerção física por parte de uma direcção administrativa. Uma

1
HOBBES, Thomas: Elements of law

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organização coerciva de carácter institucional será chamada “Estado” se sua direcção


administrativa reivindicar com sucesso na aplicação dos regulamentos, o monopólio da coerção
física, esta coerção será legítima ”(Weber, citado por Colas, 2008)
A definição de Estado por Weber repousa na caracterização pelo seu meio específico: a
violência. É óbvio que outros grupos políticos pré-estatais (Tribos, Clãs, Castas, etc.) utilizam a
violência para garantir o cumprimento dos seus regulamentos, mas um facto sui-generis ocorre
nestes grupos, é o culto do tradicional.
Quanto ao Estado, cujo conceito só atinge o seu pleno desenvolvimento no mundo moderno, a
sua característica não é só o monopólio da violência legítima num espaço geográfico dado, mas
também a renúncia ao culto do tradicional a favor do culto da lei.
Ora, a definição de Weber não nos diz que o Estado é o reino da violência, mas que ele é
reconhecido (possui legitimidade) como o único que tem autoridade de recorrer à violência.
Pereira e Quadros (1993) consideram o Estado como um modo particular de organização
política que reúne três condições de existência: povo, território e aparelho do poder.
Como tal, a função do Estado é preservar e garantir a sobrevivência da Sociedade e neste
sentido, o Estado assegura tal sobrevivência através de três vias:
1. Afirmando e defendendo a identidade do grupo ou do povo incarnado na Nação, o que
pressupõe a existência de uma língua e valores comuns;
2. Protegendo e salvaguardando a ordem social vigente no território onde esse povo vive;
3. Regulando os conflitos saciais e harmonizando as suas componentes, através de uma
actuação política organizada na base da lei

Noutro âmbito, o Estado é entendido como o conjunto dos órgãos que numa sociedade,
aparecem a exercer o poder político.
Esta definição atribui às funções dos Órgãos de Soberania a verdadeira essência do Estado,
facto que se presta para alguns equívocos já que esta definição nos pode levar a considerar parte
do Estado (geralmente o Governo) como o próprio Estado.
Por sua vez, Fernandes (2008) concebe o Estado como uma instituição social equipada e
destinada a manter a organização política de um povo, interna e externamente.
Nesta perspectiva, o Estado é associado à ideia de poder e de protecção contra os perigos
internos e externos.

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Na abordagem marxista, o Estado é uma instituição comunitária onde existe uma diferenciação
entre ricos e pobres (exploradores e explorados) de tal modo que os primeiros mandam e os últimos
se subordinam. O Estado, no sentido supracitado, destinar-se-ia a garantir a exploração dos pobres
pelos ricos.
Desde logo, estes critérios de definição de Estado deram origem à “Teoria dos três elementos
do Estado”, designadamente o Povo, o Território e Aparelho do poder, dos quais nos ocuparemos
a continuação.

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