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DEPARTAMENTO DE ANTROPOLOGIA

TEORIA ANTROPOLOGICA 1 - AM096

DOCUMENTO ACADÊMICO COMO COMPONENTE AVALIATIVO

DISCENTE: Filipe José da Silva1.


AVALIAÇÃO: Lady Selma Ferreira Albernaz.

Resenha simples do livro aqui apresentado: pontos focais de maiores discussões e


apresentações das ideias defendidas pelos referenciados autores.

No livro "Sistemas Políticos Africanos", Meyer Fortes e Evans-Pritchard explicam a


importância do método e da sua pluralidade, para que seja possível o alcance de todos os
aspectos da pesquisa, unindo o material factual a um estudo comparativo das instituições
políticas dos Tallensi e dos os Nuer, que possuem sua própria versão da organização de uma
estrutura territorial. Para estudar a organização estatal de uma sociedade é necessário
pesquisar um prisma de realidades que influenciam e são influenciadas por essa organização,
explica o autor:
Ao estudar uma organização política, temos de lidar com a manutenção ou
estabelecimento de uma ordem social, dentro de um quadro territorial, pelo
exercício organizado de autoridade coercitiva, através da utilização ou possibilidade
de utilização da força física.
Pp. 9.

As palavras “estado”, “política”, “ordem social” e “autoridade” podem ser aplicadas a


esses corpos sociais como termos simplistas para definir a forma de organização, mas os
significados profundos desses termos e as suas realizações materiais diferenciam-se
drasticamente. Em algumas sociedades, em primeira análise, a forma de punição constitui
uma expressão direta do sentimento público e não consequências pré-definidas, como no
direito constitucional – o autor define esse comportamento como uma sanção de coerção
moral, em que o ato reprovado por aquela sociedade recebe como punição a revolta social
contra o indivíduo que, consequentemente, é excluído e mal visto, afetando diretamente o

1 Graduando em Ciências Sociais. E-mail Institucional: filipe.fjs@ufpe.br.


andamento da sua vida pessoal; isso exerce uma função coercitiva que não é física, mas que
tem o mesmo objetivo e o mesmo resultado: a manutenção da ordem social estabelecida.
Dentro do mesmo paradigma lógico, a segunda espécie de sanção coercitiva é a
espiritual – crença iniludível de que o ato delituoso afetará diretamente aquele que o cometeu,
podendo ser um tipo de punição anímica ou não; amplamente, colide-se [a sanção coercitiva
espiritual] com a ideia dos muros morais da sociedade moderna que também condicionam o
comportamento dos indivíduos, infringindo a paz de sua consciência, chamam de culpa.
Nalgumas sociedades, por exemplo, o “criminoso” sente-se tão mal com o que fez que pune a
si mesmo, para reparar o seu ato; em outros casos, determinados delitos são considerados
ofensas diretas ao proprios deuses e isso causa receio o social de que a punição pelo ato de
um recaia, sobre todos – porém, avaliando o caráter moral do ato, existem diferenciações
entre os crime e entre as punições: se foi com intuito de pecar ou descuido, o segundo não
recebe uma punição, mas é feito um ritual de purificação, para que a culpa seja remediada.
No caso da presença da intencionalidade, o homem considerado culpado pode receber
maldições das pessoas incubidas de autoridade: os anciaos, que são os únicos com esse poder,
sendo considerado um pecado seguido de punição a utilização dessa prática por outros
membros da sociedade.
Neste mesmo contexto discursivo, para Max Weber a autoridade pode ser concebida
de maneiras diferentes, categorizada em 3 tipos: carismática, que advém da concordância
social em relação à autoridade daquele indivíduo; a tradicional, que infere a autoridade pela
história, conservando costumes e escolhendo o juiz legitimado pelo andamento das tradições;
e a autoridade legal, que é aplicada a partir de normas pré estabelecidas. Será esse juiz ou
juízes que terão a autoridade para definir as regras sociais e punir, absolver e ou condenar
indivíduos a partir delas. Essas ações e quem as pratica sofrem diversas ramificações nas
sociedades: os Nuer definem que as problemáticas sociais devem ser resolvidas por
arbitragem, uma outra sociedade se organiza fazendo hordas de comunicação, em que aquele
que foi ofendido pode declarar seu caso e de acordo com o nível de comoção social é
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autorizado a vingar-se a partir de atos pré-estabelecidos que buscam a reparação da parte
prjudicada, descreve o autor um exemplo, em que vê-se a constituição da sociedade,
diferentemente da sociedade moderna que apresenta uma concepção de estado como superior
ao indivíduo:

2 É um erro tentar estudar a estrutura política de uma sociedade usando sua própria base filosófica cultural
como explicação, sendo essa base cultural única e característica de cada sociedade.
O homem injuriado fará reconhecer o ato dele (aquele que injuriou) levantando um
clamor de forma apropriada e reconhecida. O sentimento público de toda a
assembleia, a que se fez apelo, pode obrigar o ofensor a submeter-se a que lhe seja
colocado uma lança entre as coxas pelo marido ofendido.
Pp. 16.

É necessário o entendimento de que a filosofia da política das sociedades modernas


não pode ser aplicada e nem comparada ao estudo de outras sociedades, uma vez que a
organização político-social é uma exposição de traços culturais. Os filósofos políticos que
conhecemos encaram as formas de políticas como uma progressão evolutiva e estudam as
sociedades primitivas de uma forma comparativa e por isso deduzem que existem estágios
fixos da política, encarando essas instituições como primitivas, como se fossem o passado da
política das sociedades europeias.
No livro, o autor separa os sistemas políticos africanos em dois tipos: o tipo A, que
configura sociedades como os Zulos, os Ngwato, os Bemba, os Banyankole e os Kede que
têm uma estrutura política de “autoridade centralizada, aparelho administrativo e instituições
judiciais” (pág. 31)3; e o tipo B que, ao contrário da primeira, não tem estrutura de poder
centralizado, instituições judiciais e aparelhos administrativos, por isso são consideradas
sociedades sem governo4. Os dois grupos têm suas diferenças e semelhanças e cada uma das
características das suas vidas sociais influencia a vida política. Os dois grupos, ainda, têm,
como forma de subsistência, técnicas de agricultura e de pastoreio, embora não tenham
sistemas que visam a acumulação de riquezas, por isso não se separam por nenhuma estrutura
de classes sociais.
Devido à invasão colonial europeia, houveram mudanças na vida política dessas
sociedades, que responderam de formas diferentes a esse intruso comum. No grupo A,
ocorreu um tipo de disfarce sobre essa nova administração: o antigo chefe da tribo teve de se
submeter a nova regência europeia, tornando-se um agente do meio em que se reduz as
limitações impostas pelos invasores, mas ainda ocupa um lugar de soberania na sua sociedade
e possui poder político; no grupo B, a resposta ao assalto territorial europeu às tribos
recusaram-se a agir como esse agente duplo, e o governo colonial só pode administrar
mandando seus próprios agentes administrativos – os escolhem a partir de uma “noção
estereotipada do chefe africano” (pág. 49). Esse intrometimento europeu pode causar o
3 As sociedades que fazem parte do tipo B são os Logoli, os Tallensi e os Nuer.
4 No grupo A, os que têm poder, têm o direito de exigir impostos, para que isso incentive a entrada na vida
política, porém equilibra-se os privilégios econômicos com o aumento das responsabilidades, balanceando os
interesses. Apesar de não existir uma separação social de classes, existe uma hierarquia política, diferente do
grupo B, que não determina privilégios econômicos para aqueles que entram na vida política. Aqueles que já são
abastados economicamente, têm um lugar mais alto no status social, possibilitando facilidade na entrada da vida
política.
colapso da vida política dessas sociedades, já que subvertem as regras e impõem o uso de seu
próprio sistema burocrático.
Essa sobreposição das normas europeias ora apresentadas causa um desequilíbrio no
funcionamento dessas sociedades – que têm suas próprias formas de viver a vida política, que
elegem os seus chefes a partir de conceitos místicos e geracional –, uma vez que a utilização
da força como forma de controle governamental é contratualista e cria um funcionalismo
social necessário para a qualidade de vida dos nativos.

acentuamos o fato de ela (o uso da força) ser um dos principais pilares do tipo
indigena do Estado. Mas a sanção de força de que a administração europeia depende
está para além do sistema político nativo. Não é utilizada para manter os valores
inerentes a esse sistema. Em ambas as sociedades do grupo A e B os governos
europeus podem impor sua autoridade, mas em nenhuma delas são capazes de
estabelecer laços morais com o povo sujeito.
Pp. 50.

A usurpação europeia fratura não só a organização política, mas com toda complexa
estrutura social que a criou. Essas coletividades africanas apresentam bases simbólicas que
deram formas às suas vidas sociais. A utilização desses símbolos permeiam o inconsciente
coletivo da sociedade e moldam o comportamento individual; o sistema de valores é diferente
para cada sociedade e mantém todo o corpo social unido e equilibrado, explicita o autor:

Na forma dos mitos, ficções, dogmas, rituais, lugares sagrados e pessoas, estes
símbolos representam a unidade e exclusividade dos grupos que o respeitam. São
considerados, porém, não como meros símbolos, mas como valores finais em si.
Pp. 52.

Comparação das escolas antropológicas: amplitude temática e correlação entre escolas


antropológicas.

A escola estrutural-funcionalista sintetiza o modelo teórico de 2 escolas: a escola


estruturalista, que difunde que toda cultura possui uma estrutura própria que molda
diretamente os comportamentos sociais, sendo algo exterior ao indivíduo; e o funcionalismo,
que rompe com o evolucionismo, que teorizava que o progresso humano segue uma linha
única com etapas pré-definidas, que considerava as sociedades indígenas como primitivas e a
europeia como o ponto alto da evolução humana. O funcionalismo, difundido por
Malinowski, rompe com essa concepção, antagonizando que cada sociedade tem seu próprio
movimento e que não se pode comparar ou usar uma cultura de base para entender a outra. O
estrutural-funcionalismo estuda a estrutura social como as relações sociais que formam o
indivíduo, a sociedade como um todo orgânico.
Une o conceito de função e estrutura para explicar um complexo cultural; um exemplo
iluminador dessa escola é o corpo humano: cada órgão do corpo realiza uma função
específica, mas apenas esse órgão não sustenta a estrutura corporal que é formada por muitos
outros órgãos com funções específicas que juntos formam o corpo. Os órgãos, em alusão à
sociedade, representam as instituições funcionais como a igreja, o estado, a família e etc.,
esses órgãos sociais juntos formam a estrutura do corpo social, para a estrutura existir é
implícito a existência de corpos funcionais.
Só é possível entender uma cultura estudando os seus corpos funcionais – que
moldam o pensamento coletivo e assim montam a sua estrutura e visualizam a sociedade
como um todo funcional. “Estrutura é um arranjo persistente de pessoas em relações
difundidas ou controladas por instituições, normas ou padrões de comportamento socialmente
estabelecidos”. Kaplan e Manners. 1975. Pp. 155.
O método de pesquisa utilizado no livro foi o método etnográfico que realiza-se numa
adaptação e familiarização do pesquisador com a sociedade estudada, este deve deixar de
lado as suas próprias noções e inserir-se nessa sociedade como uma “folha em branco”, para
que possa absorver os seus aspectos culturais e basear a sua pesquisa a partir de um olhar
naturalizado. Um dos métodos da pesquisa etnográfica é a observação direta que consiste na
atividade da observação ativa da cultura estudada, é assim que o pesquisador direciona o seu
olhar para os aspectos culturais totais, entendendo primeiro a estrutura do corpo social.

Esta demanda é habitada por aspectos comparativos que nascem da inserção


densa do pesquisador no compromisso de refletir sobre a vida social, estando
antes de mais nada disposto a vivenciar a experiência de inter-
subjetividade, sabendo que ele próprio passa a ser objeto de observação.
Lévi-Strauss, 1974,.Pp. 1-36.

É em que o pesquisador compara a realidade aos seus estudos anteriores, para, a partir
disso, direcionar o seu estudo, afunilando até o seu objetivo de pesquisa; é fácil identificar
essa atividade na obra "Sistemas Políticos Africanos", uma vez que os autores fazem as
descrições limpas sobre a cultura dos povos estudados, a fim de produzir conteúdo
explicativo primeiramente. De praxe que o antropólogo não pode excluir de si as suas
próprias tendências culturais, mas para uma pesquisa consistente e verídica é necessário que
se distancie o máximo de suas próprias noções, para que consiga penetrar no pensamento
coletivo que está estudando e pesquisar a cultura de acordo com seus próprios conceitos e
subjetivos e não àqueles que trouxe de sua cultura inicial.
REFERÊNCIAS:

KAPLAN, D. & Manners, R. Teoria da Cultura. Rio de Janeiro: ed. Zahar, 1981.

ECKERT, Cornelia; DA ROCHA , Ana luiza. Etnografia: saberes e práticas.


Iluminuras , [S. l.], p. 1-23, 4 set. 2008.

PRICHARD , Evan; FORTES, Meyer. Sistemas políticos africanos. [S. l.: s. n.], 1940.

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