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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

VINÍCIUS GANDOLFI DE MORAIS

AVALIAÇÃO DE
CONTROLE SOCIAL

CURITIBA
2022
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
DATA: DEZEMBRO DE 2022
DISCENTE: VINÍCIUS GANDOLFI DE MORAIS
TURMA: HSS023
DISCIPLINA: POLÍTICAS PÚBLICAS &
CONTROLE SOCIAL
DOCENTE(S): MARIA TARCISA SILVA BEGA
MARISETE TERESINHA HOFFMAN HOROCHOVSKI

AVALIAÇÃO INDIVIDUAL
Com base nos textos obrigatórios trabalhados e nas discussões
realizadas em sala, responda (em no máximo 10 páginas):

1) Durkheim afirma que na solidariedade orgânica a relação entre a


personalidade individual e a coletiva diverge fundamentalmente daquela
existente na solidariedade mecânica. Discuta como e de que maneira
isto ocorre. Exemplifique.
R: Ao analisar as formas de organização social da contemporaneidade, Émile
Durkheim passou a utilizar o conceito de solidariedade social para desmistificar os
modos de vida e o comportamento humano nas sociedades tanto complexas quanto
aquelas caracterizadas como menos complexas. Para isso, o autor dividiu a
solidariedade em dois espectros diferentes, uma denominada mecânica e a outra de
orgânica, cada qual seguindo sua própria sistematização e influência em dadas
sociedades, com base nas consciências individuais e coletivas de seus habitantes,
aqui entendidos como seres sociais.
Para Durkheim, a vida social é compreendida a partir da relação entre os
indivíduos que nela vivem com base em uma consciência coletiva compartilhada por
tais indivíduos, a qual produziria os valores éticos e morais, as noções de certo e
errado, de justo e injusto e diversas outras acepções vindas da sociabilidade. Essa
consciência coletiva, por sua vez, é construída a partir de uma consciência individual
de cada um, das personalidades inerentes que cada ser humano desenvolve. Muito
mais do que apenas a soma dessas consciências individuais, a vida social é
organizada nesse constante fluxo entre individual e coletivo, onde o coletivo exerce
uma pressão sobre o indivíduo e a combinação dos indivíduos, por sua vez, gera o
coletivo. Dessa forma, se chega à coesão, produzindo um fato social normal que
respira à integração e harmonia social
No entanto, a depender do tipo de sociedade envolvida, a relação do
individual e coletivo com a forma de solidariedade pode se alterar. Quando se trata
de uma solidariedade mecânica, isto é, aquela presente em sociedades menos
complexas como povos indígenas e pequenas comunidades rurais, há um maior
senso de pertencimento entre os indivíduos que compõem esses aglomerados,
dessa forma, gerando-se uma consciência coletiva mais intensa e coesa, onde a
vida desse indivíduo é fortemente ligada às regras impostas pelo social que o rodeia.
Podemos exemplificar isso na forma em que a maior parte das sociedades indígenas
produz seus alimentos, onde todos os membros estão envolvidos na caça, pesca e
agricultura e se apoiam mutuamente para o bem-estar geral.
Por outro lado, nas sociedades complexas, como os grandes centros urbanos
industrializados, onde impera a solidariedade orgânica, as consciências individuais e
coletivas alteram-se drasticamente: movidas por um sistema socioeconômico
capitalista de produção, a divisão do trabalho subsequente gera uma
interdependência entre os indivíduos por meio de relações sociais ampliadas. Dessa
forma, há uma grande diferenciação entre os indivíduos advinda da especialização
de funções que cada um assume. Com essa maior individualização e capacidade
interpretativa das normas e valores impostos, há o enfraquecimento da consciência
coletiva e do consenso geral. Exemplifica-se aqui a estrutura de um hospital, tal qual
Durkheim traça seus paralelos da sociedade como um organismo humano: toda a
equipe hospitalar interdepende entre si: os médicos necessitam dos enfermeiros que
necessitam dos zeladores e assim por diante. Essa união não existe porque os
indivíduos se sentem semelhantes entre si, mas sim apenas porque cada um se
torna interdependente do outro naquela esfera social do hospital.

2) “O controle social é o conjunto dos métodos pelos quais a sociedade


influencia o comportamento humano, tendo em vista manter uma
determinada ordem. Existem centenas de controles operando numa
sociedade, embora sua existência passe despercebida” (Mannheim,
1962, p. 173). Escreva sobre os fatores da estabilidade social em
Mannheim.
R: Enquanto Émile Durkheim desnuda a organização social por meio de
consciências coletivas e individuais e solidariedades mecânicas e orgânicas, e a
forma como cada uma traça seu caminho para se atingir a coesão social, Karl
Mannheim está mais preocupado em vislumbrar as forças responsáveis em produzir
uma estabilidade social.
Nesse cenário, para ele, se apresentam os costumes e as leis na forma de
controles sociais que regem nossas sociedades, sendo eles o conjunto de métodos
pelos quais a sociedade influencia o comportamento humano, tendo em vista manter
sua ordem. Em cada sociedade, há um sistema diferente de controle e a maneira
pela qual eles são manipulados. Aos controles mais simples, se faz presente o
controle mútuo, como quando um membro de um grupo repele o outro em virtude de
um mau comportamento sem ser transferido para uma agência oficial responsável
em nome do grupo, como por exemplo a polícia.
O funcionamento de tal controle está inerentemente ligado à uma autoridade.
Não existe ordem social sem autoridade, por menor que ela seja, como por exemplo
um porta-voz de um grupo no lugar da figura de um líder, ou mais diversificada que
ela seja, como um profeta, uma lei estabelecida ou uma tradição. O controle, por
meio de uma autoridade, também não se sustenta apenas na ameaça da violência,
visto que na maioria das sociedades ela sempre é usada como último recurso, em
favor, antes disso, de um elaborado sistema de controles.
Entre as várias formas de controles existentes, para Mannheim se destacam
as leis e os costumes como forças primordiais e intrínsecas à sociedade moderna. O
costume se apresenta como um conjunto de procedimentos que surgiu
gradualmente em uma dada população, sem a interferência de uma autoridade que
o propusesse ou o declarasse. Ele também se destaca por ser inconsciente,
democrático e totalitário, tudo ao mesmo tempo: inconsciente, porque nasce e é
transmitido sem intenções; democrático porque é desenvolvido igualmente entre os
membros do grupo, contribuindo para sua manutenção e existência; e totalitário por
afetar todas as camadas de expressão pública e privada e influenciar pensamentos,
crenças e práticas.
Por outra via, as leis são códigos mantidos pelo Estado, um conjunto de
regras que são reconhecidas e interpretadas. São conscientes, pois são
intencionalmente criadas, sancionadas e promulgadas em um dado tempo. Grande
parte das leis são racionalizações de costumes já fixados socialmente, embora
existam leis arbitrariamente criadas.
Objetivamente falando, costumes e leis são expressões concretas da
autoridade, As fontes e métodos de uma dada autoridade variam no tempo e na
estrutura da sociedade a qual se faz presente. Ela também se distingue de duas
formas diferentes: a autoridade investida em um cargo (obediência à um policial, por
exemplo, em que obedecemos por conta de sua posição e não por conta de suas
qualidades pessoais) e a autoridade investida em um líder (como um líder espiritual
ou de culto, que por sua vez, é por conta de suas qualidades pessoais como oratória
e a capacidade de se dirigir às massas).
Para finalizar sua visão acerca dos fatores da estabilidade social, Mannheim
também cunha uma interpretação sociológica dos valores como partes inerentes do
processo social, gerados socialmente e que variam com o tempo, o grupo e a classe
social. Cada indivíduo desenvolve seu sistema de valores com base naqueles
gerados institucionalmente, como por exemplo os da Igreja Católica, do nazismo e
da organização profissional de um exército. Dessa forma, embora valores não sejam
aqui entendidas como um controle social, é definitivamente um resquício das
imposições de um determinado controle.

3) Tendo como referência o texto de Elias, como pode ser abordada a ação
do Estado na constituição do autocontrole e do controle social na
sociedade contemporânea.
R: Se distanciando da sociologia clássica no sentido em que o pensamento
durkheimiano e marxista visavam o social e o weberiano se atenuava para o
indivíduo, Norbert Elias une as duas coisas para traçar uma visão do indivíduo na
sociedade. E é por meio dessa forma de pensar que ele descreve a forma de como
as formações sociais passaram por um período de mudanças que resultaram no
autocontrole.
Para ele, ao longo da história humana, de uma maneira não intencional e
natural, mas ainda sim racional, a humanidade passou por um cenário em que os
controles sociais exercidos foram passando por um adensamento psicológico dos
indivíduos, em que os impulsos afetivos e emocionais deixaram de fazer parte da
maneira em que se apresentavam até então na vida cotidiana por meio de
comportamentos violentos principalmente. A partir disso, o autocontrole é
internalizado e se torna parte do processo civilizador tanto do indivíduo, quanto da
sociedade que o cerca, visando a função social de manutenção da ordem.
A teia de interdependência entre os indivíduos que a modernidade produz
ajuda a levar esse autocontrole para as futuras gerações, seja através do seio
familiar, seja pelo fator educacional. Esse individual somado termina por levar à
integração formadora de redes sociais, guiando essas ações a promover a ordem
garantida pelo Estado.
Assim sendo, se antes era comum assassinatos, disputas e conflitos isolados
entre os indivíduos em questões envolvendo a honra e o cavalheirismo por exemplo,
com a mudança, os indivíduos passam a acreditar na força do Estado para
intermediar e regular essas ações. Dessa forma, na contemporaneidade, existe uma
formação de controles sociais a partir do autocontrole, onde todos entendem que
estão sujeitos e adeptos às leis e órgãos fiscalizadores que residem acima de nós.

4) Outsiders se tornou um marco nos estudos sociológicos do desvio.


Justifique.
R: Apesar de não ter iniciado os estudos acerca dos indivíduos considerados
desviantes dentro de determinadas normais sociais de uma sociedade, o sociólogo
Howard Becker destaca sua obra Outsiders na maneira como conduz e traz seu
discurso diretamente dos grupos ao qual o campo da sociologia do desvio usa como
seus objetos de análise. Além disso, também integra seus escritos aos pontos de
interesse que as novas gerações de estudantes universitários norte-americanos da
década de 1960 enxergavam em suas realidades, em pleno movimento
contracultural.
Em um primeiro momento, o autor utiliza-se de uma linguagem clara e
acessível para prosseguir com suas pesquisas, fugindo do texto acadêmico usual
das ciências sociais, visando a objetividade e a simplicidade para denotar a
realidade empírica a qual deseja transpassar.
Em seguida, Becker se certificou de levar suas teorias para os grupos
minoritários a qual eram considerados os outsiders da pesquisa, como músicos de
jazz que tocavam em ambientes insalubres e baratos e usuários de maconha, em
que estavam inclusos os próprios estudantes universitários. Ao traçar esse espaço
de relatividade, Becker inova ao trazer à tona em como os outsiders eram mais
comuns do que se até então se acreditava e a maneira de vê-los como seguindo
suas próprias normas e regras sociais dentro de seus grupos, os retirando de uma
posição patológica. Além disso, reproduz um pensamento de que para os outsiders,
os julgadores de suas culturas, comportamentos e modos de agir e pensar seriam os
próprios outsiders a partir de suas visões, qualificando uma identidade dupla para os
estudos da sociologia do desvio.
Assim sendo, as contribuições de Becker acerca de uma subárea do controle
social se firmam como um marco ao desmistificar noções pré-concebidas acerca de
indivíduos que quebram as regras impostas pelos controles sociais ativos e
operantes dentro de uma dada sociedade.

5) A partir da leitura do Panóptico de Benthan, Foucault atualiza a questão


dos dispositivos disciplinares no mundo moderno. Disserte sobre o
tema, relacionando-o com a dimensão institucional da vigilância,
trabalhada por Giddens.
R: Finalizando aqui toda uma bibliografia acerca do controle social nas camadas
sociais, Michel Focault atualiza a discussão trazendo um importante ponto de
vista acerca do panóptico de Jeremy Bentham, pensamento que é discutido na
contemporaneidade por Anthony Giddens ao traçar as problemáticas da
modernidade em se tratando de um mundo globalizado.
Abandonando as punições da Idade Média onde os indivíduos passavam por
espetacularizações públicas de seus castigos por violarem a norma social vigente,
isto é, irem contra os controles sociais impostos pela autoridade em questão, os
efeitos da modernidade geram uma nova forma de punição, se apresentando aqui
como um poder disciplinador no lugar de um poder ostensivo. Para ilustrar isso,
Bentham utiliza a estrutura arquitetônica de um panóptico, onde há um vigia que
observa a todos, que porém, por mais que saibam que estejam sendo observados,
não conseguem enxergar quem os observa. Isso resulta na correção do indivíduo,
que sem saber quando e por quem está sendo vigiado, educa a si mesmo para não
sair da norma social imposta. O efeito do panóptico se faz presente não apenas em
penitenciárias, como também em espaços educacionais como escolas e
universidades, bem como em serviços de saúde, tais como hospitais e manicômios e
até mesmo em ambientes profissionais, à exemplo de fábricas e indústrias.
Esse efeito panóptico adentra na psique do indivíduo transgressor, o fazendo
incutir os controles sociais em si mesmo e dessa forma, normalizando a organização
social. Ele se transforma, ao mesmo tempo, em sujeito e objeto da relação de poder,
em uma acepção que vem do interior para o exterior.
A generalização do efeito panóptico como arranjo social é visualizada por
Giddens na contemporaneidade como uma peça fundamental na concentração
administrativa do poder estatal e da ascensão da modernidade. Segundo ele, os
efeitos de vigilância e punição propostos por Focault constituem uma dimensão
institucional associada ao crescimento e fortalecimento da industrialização e do
capitalismo. Esse efeito é transposto de maneira direta, como a supervisão de
escolas, prisões e locais de trabalho, bem como indireta, quando há o controle da
informação.
Para a manutenção de mercados de produtos competitivos e a produção de
um sistema econômico e político baseado na concorrência é necessário que haja
uma vigilância vinculada a outras dimensões institucionais disciplinares. Isso permite
também uma economia do poder, onde se gera um número reduzido de vigilantes
para um grande número de pessoas vigiadas, diminuindo os custos e aumentando
os benefícios.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DURKHEIM, Emile. Émile Durkheim: sociologia. 2ª. Ed., São Paulo: Ática, 1981.
(Coleção Grandes cientistas sociais) - Cap.2 “O que é fato social?” (pp. 46-52); cap.
5 “Solidariedade mecânica” (pp.73-79) e cap. 6 “Solidariedade orgânica” (pp. 80-84).

MANNHEIM, Karl. Sociologia sistemática. 1 ed., São Paulo: Pioneira, 1962.


(Quarta parte, Estabilidade social e mudança social, cap. XI, pp. 173 a 184).

ELIAS, Norbert. O processo civilizador. V. 2: Formação do estado e civilização. Rio


de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1993. Parte II: Sinopse- Sugestões para uma Teoria de
Processos Civilizadores. (pp. 193-214 e 263-274).

BECKER, Howard. Outsiders. Estudos de sociologia do desvio. Rio de Janeiro,


Jorge Zahar Editores, 2008. Cap.1 Outsiders (pp. 15-30)
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. História da violência nas prisões. 8ª. Ed.,
Petrópolis, Vozes, 1987. Terceira parte: cap. III “O panoptismo” (pp. 173-204)

GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: Editora


UNESP, 1991. Cap. II As dimensões institucionais da modernidade. (pp. 61-82)

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