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08/10/2018 O novo cangaço no Maranhão

Confins
Revue franco-brésilienne de géographie / Revista franco-brasilera de geografia

37 | 2018 :
Número 37
Imagens comentadas

O novo cangaço no Maranhão


Le nouveau cangaço dans le Maranhão
The new cangaço in Maranhão

R B S

Entradas no índice
Index de mots-clés : banques, nouveau cangaço, sécurité
Index by keywords : banks, new cangaço, security
Índice geográfico : Maranhão
Índice de palavras-chaves : bancos, novo cangaço, segurança

Texto integral
1 No cinema os roubos a bancos têm sido romantizados, a ponto de muitas vezes criar
paradoxos na postura dos telespectadores, que se envolvem nos enredos e passam a
torcer e apoiar as motivações e ações dos criminosos. No Brasil, não distante da ficção,
essa modalidade de crime tem assumido dimensões cinematográficas e espalhado
terror e transtornos em pequenas e médias cidades. Muito além dos prejuízos
financeiros, esses eventos são marcados pelo uso de diversas formas de violência e pelos
transtornos causados no seu entorno, que remetem a um Brasil do passado.
2 Entre meados do século XIX e início do século XX, as questões sociais e fundiárias do
Nordeste do Brasil, levaram ao surgimento de um poder paralelo de enfrentamento
através da prática de crimes diversos, principalmente sobre os mais ricos. O fenômeno
de banditismo social conhecido como cangaço, instaurou a desordem na região e
alimentou o imaginário popular. Na atualidade, outras práticas criminosas, dão
significado a um “novo tipo de cangaço”, que se caracteriza pela atuação de grupos
fortemente armados que praticam furtos ou roubos a numerários.
3 Diferente do bando de Lampião, o novo cangaço assume uma nova geografia que
ultrapassa as entranhas do sertão nordestino e se faz presente em todo o país. O grau de
especialização dos criminosos chega a contar com explosivos e armas utilizadas em
guerras. Segundo Costa (2016) o tamanho dos grupos se assemelha aos do velho

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cangaço, que contavam com números entre dez e quinze pessoas, intrinsecamente
motivadas por razões político pessoal, levando em consideração vinganças e a
subversão da ordem estatal.
4 Os cangaceiros contemporâneos não são liderados por um homem, mas por vários.
Suas finalidades com os assaltos a instituições bancárias, públicas e privadas também
se distingue. A grande maioria das quadrilhas encontram nos arrombamentos e
explosões a caixas eletrônicos a oportunidade de capitalizar recursos para outras
atividades, tais como: agiotagem, lavagem de dinheiro, financiamento de campanhas
eleitorais, tráfico de drogas e armas.
5 A atuação das quadrilhas é marcada pelo uso de violências e pela instalação de um
estado de pânico nas cidades. Geralmente a atuação dos criminosos é marcada pela
tomada do poder, a partir do bloqueio de vias, com a rendição das forças de segurança
públicas e privadas e com a utilização de reféns para dar facilidade nas fugas.
Dependendo das condições, em que pese principalmente o efetivo de segurança, os
grupos realizam arrombamentos ou explosões dos caixas eletrônicos.
6 A frequência com que esses crimes ocorrem é relativamente recente, o que explica a
ausência e/ou organização sistemática das estatísticas sobre os crimes praticados na
modalidade “novo cangaço” em todo país. O Sindicato dos Bancários do Maranhão,
desde 2011 realiza mensalmente o levantamento dessas informações no estado. Ainda
que a instituição agrupe explosões e arrombamentos, ela é a principal fonte de dados
sobre esses crimes no estado do Maranhão.
7 Em sete anos foram registrados 280 casos de arrombamentos e explosões de caixas
eletrônicos no estado, o que representa uma média de 40 casos anuais. Seguindo a
tendência de crescimento do ano anterior, em 2015 as ações das quadrilhas atingiram
os números máximos, 61 ataques. Por outro lado, 2017 é o ano de menor atuação dos
criminosos, 12 casos foram registrados.

8 De outro modo, temos a espacialização desses dados no Maranhão, mostrando que


nessa série histórica houve o aumento e a expansão dos arrombamentos em todas as
regiões do estado.

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9 Dos 217 municípios maranhenses, foram contabilizados arrombamentos e/ou


explosões de caixas eletrônicos em 134, o que representa 62% da totalidade dos
municípios. A espacialização mostra uma distribuição em todas as regiões do estado,
com concentração na região central até a capital, São Luís, e também na Região
Tocantina. São Luís foi o município com maior número de ocorrências, 21, o que
inicialmente desencontra a relação arrombamento, explosão/efetivo policial. Logo em
seguida, os municípios com os maiores números de registros foram de Amarante do
Maranhão (8), Fortaleza dos Nogueiras (6) e Pio XII (5).

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10 A ação dos novos cangaceiros esteve restrita a apenas seis bancos, o Bradesco foi alvo
de 140 investidas e o Banco do Brasil, 129. A distribuição desses bancos no estado
maranhense ajuda a compreender porque são eles os que mais sofrem arrombamentos
e explosões, juntos, os dois possuem 785 postos e 220 agências. O Bradesco conta com
455 postos e 100 agências, esses números em muito se dão em razão da aquisição no
ano de 2003 do Banco do Estado do Maranhão (BEM). O Banco do Brasil, maior banco
da América Latina e principal agente financeiro do governo federal, possui 330 postos e
110 agências em todo o Maranhão.
11 Os postos e agências bancárias seguem geografia semelhante de distribuição e
aparecem como elementos que indicam hierarquia urbana, pois quanto maiores a
população e o Produto Interno Bruto (PIB) das cidades maiores também serão os
números de postos e agências bancárias.

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12 Uma outra visão dos crimes praticados pelo Novo Cangaço no Maranhão é dada com
a relação arrombamento/número de agências e postos. Nela, é possível analisar a
frequência de arrombamentos e explosões naqueles municípios com um baixo número
de unidades bancárias. Chama atenção o caso do município de Lago Verde, no centro
do estado, onde o único posto bancário sofreu nos últimos seis anos, três explosões.
Nota-se também uma repetição de casos na Região Tocantina. Além das instituições
financeiras, eventuais e terceiros também sofrem os prejuízos monetários de uma
explosão, principalmente, aqueles que residem próximos a essas instituições, mas
também o comércio. Um arrombamento ou explosão a um banco em uma pequena
cidade, gera transtornos também as cidades vizinhas, uma vez que às sobrecarrega com
o número de usuários do sistema bancário.

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13 Buscando impedir crimes a agências bancárias, correios, lotéricas e estabelecimentos


afins, em 2016 o Governo do Maranhão por meio da Secretaria de Segurança Pública,
criou o Curso de Operações de Sobrevivência em Área Rural do Maranhão (COSAR).
Atuando em parceria com as policias do interior do estado, o grupamento tem
desarticulado quadrilhas e feito apreensões, o que explica a queda na quantidade de
arrombamentos e explosões. Ainda assim, de janeiro até setembro de 2018 foram
registradas 9 ocorrências em todo o estado, sendo 2 arrombamentos e 7 explosões, o
correspondente a uma média de um caso por mês.

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14 Os cangaceiros contemporâneos que agem no Maranhão apresentam similaridades


em seus modus operandi, antecedendo a destruição das agências e postos, os
criminosos bloqueiam vias e têm como alvos os destacamentos policiais, delegacias e
quartéis. Das 7 explosões registradas em 2018, em 4 (Zé Doca, Senador Alexandre
Costa, Dom Pedro e São Luís Gonzaga do Maranhão) os grupos atingiram
primeiramente as forças de Estado, buscando assim, a intimidação, uma vez que muitas
cidades maranhenses contam com efetivo policial desproporcional ao tamanho de sua
população e com armamentos inferiores aos das quadrilhas.

Carro da polícia crivado de balas em São Luís Gonzaga do Maranhão (setembro de 2018)

(Divulgação)
15 De acordo com informações divulgadas pela imprensa, em 4 cidades (Zé Doca,
Senador Alexandre Costa, Dom Pedro e Buriticupu) houve troca de tiros entre policiais
e criminosos. Em outras duas (Aldeias Altas e Buriticupu) houve ainda reféns que
serviram de escudos durante as explosões. Em Aldeias Altas, após perseguição, dois
criminosos foram mortos pela polícia.
16 Ainda segundo a imprensa, foram apreendidos 26 criminosos: Zé Doca (7), Dom
Pedro (5), Buriticupu (5) São Luís Gonzaga do Maranhão (9). Da explosão ocorrida em

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Zé Doca, entre os presos está um policial; em Dom Pedro, dos cinco apreendidos um
era advogado; em São Luís Gonzaga um ex. sargento do exército fazia parte do grupo.
Esses casos demonstram o grau de preparação e de articulação dos cangaceiros.
17 É importante ainda notar que na maioria dos casos as quadrilhas foram apreendidas
em municípios vizinhos ao local da prática criminosa, o estado do Pará também tem
sido rota desses grupos.

18 A leitura de dados do novo cangaço no Maranhão nos possibilita uma análise da


atuação desses grupos, que estão distribuídos em todo o Brasil. Com logística e armas
de ponta, os criminosos, que muitas vezes participam de redes interestaduais, planejam
minuciosamente suas ações, obtendo muitas vezes êxito. As motivações dos crimes se
distinguem, mas o modus operandi das quadrilhas quase sempre se assemelham.
19 No Maranhão, nos últimos 8 anos foram registrados casos em todas as regiões, o que
levou o Estado a executar políticas de combate as ações dos novos cangaceiros. Desde
2016 os registros vêm apresentado quedas nos casos de arrombamentos e explosões.
Ainda assim, é preciso garantir mais políticas que assegurem o papel do Estado e a
segurança, não somente do sistema bancário, mas de toda a população.

Bibliografia
COSTA, Carlos Viana da. Novo Cangaço no Pará: a regionalização dos assaltos e seus fatores
de incidência. 66 f. Dissertação (Mestrado em Segurança Pública). – Programa de Pós-Graduação
em Segurança Pública. Universidade Federal do Pará. Belém, 2016.
Sites consultados:
www.bancariosma.org.br/
g1.globo.com/ma
www.ma10.com.br/
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imirante.com/

Índice das ilustrações

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Título Carro da polícia crivado de balas em São Luís Gonzaga do Maranhão
(setembro de 2018)
Créditos (Divulgação)
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Para citar este artigo


Referência eletrónica
Ronaldo Barros Sodré, « O novo cangaço no Maranhão », Confins [Online], 37 | 2018, posto
online no dia 05 outubro 2018, consultado o 09 outubro 2018. URL :
http://journals.openedition.org/confins/15811 ; DOI : 10.4000/confins.15811

Autor
Ronaldo Barros Sodré
Doutorando na Universidade Federal do Pará, ronaldo-sodr@hotmail.com

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Modelos do Maranhão [Texto integral]
Publicado em Confins, 33 | 2017

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