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Novas Tendências em
Psicologia do Desenvolvimento: teoria, pesquisa e intervenção. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2013.
Capítulo 10
Situando a questão
Os estudos que investigam a relação entre argumentação e processos de construção do
conhecimento expandiram-se consideravelmente nas últimas décadas (ver, por ex., Andriessen,
Baker & Suthers, 2003; Baker, 1999, 2002; Baker, Quignard, Lund & Séjourné, 2003; Boero,
1999; Candela, 1998; Douek, 2000; Forman, Larreamendy-Joerns, Stein & Brown, 1998;
Knipping, 2005; Leitão, 2000b; Nussbaum & Sinatra, 2003; Pontecorvo & Girardet, 1993;
Pontecorvo & Pirchio, 2000; Weinberger & Fisher, 2006; Weinberger, Stegmann & Fischer,
2005, entre outros). Também no Brasil parece ter-se escrito mais sobre argumentação em
ambientes de ensino-aprendizagem na última década do que em qualquer período anterior (ver,
por ex. Banks-Leite, 2007; Barros, Laburú & Silva, 2004; De Chiaro & Leitão, 2005; Goulart,
2007; Leitão, 2007; Linhares Queiroz & Passos Sá, 2005; Mortimer & Santos, 2001; Santos,
2007; Villani & Nascimento, 2003). O crescente interesse pelo tema se reflete não só no
aumento expressivo no número de publicações, mas, também, na frequência com que estudos
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Ante o aumento do interesse pelo tema, soa algo paradoxal – e deveras preocupante – a
constatação de que as relações entre argumentar e aprender não foram ainda teoricamente
elaboradas em maiores detalhes. A impressão que se tem, ao examinar a literatura da área, é que
a existência de um estreito vínculo entre argumentar e aprender é ideia axiomaticamente
assumida pelos pesquisadores do tema. Não se observa nessa literatura, entretanto (tanto quanto
é do meu conhecimento), qualquer esforço sistemático no sentido de gerar uma teorização que
venha a responder a perguntas críticas tais como: que características fazem da argumentação um
recurso discursivo privilegiado na construção de conhecimento? Que mecanismo de
aprendizagem nela operara? De que natureza é este mecanismo? Como funciona? Respostas a
estas questões estão ainda por serem dadas.
Uma proposta teórica sobre as relações entre argumentar e aprender
A argumentação é entendida neste capítulo como uma atividade sociodiscursiva dotada
de, no mínimo, três características que a distinguem de outras atividades discursivas: 1- a
natureza das situações em que emerge (só se argumenta ante a existência, ou pressuposição, de
uma divergência de opinião); 2- os movimentos cognitivo-discursivos que a constituem
(justificação de ponto de vista, consideração e resposta a perspectivas contrárias) e 3- o
propósito último a que serve (aumentar, ou reduzir, a aceitabilidade do ponto de vista em
questão). Em outras palavras: quando argumentam, os indivíduos defendem pontos de vista e
respondem a perspectivas alternativas com o propósito último de aumentar, ou diminuir, a
aceitabilidade daqueles pontos de vista por parte de interlocutores (atuais ou potenciais)
percebidos como críticos em relação às posições defendidas (Van Eemeren & Grootendorst,
1999; Van Eemeren et al., 1996).
Argumentação como diálogo de opostos
Como se pode apreender do que foi dito até agora, a argumentação é, por
definição, um fenômeno eminentemente dialógico (Bakhtin, 1994; 2004). Note-se,
entretanto, que os termos diálogo e outros derivados empregados no curso do capítulo
(relações dialógicas, dialógico) assumem aqui um sentido que em muito extrapola a
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acepção mais estrita que lhes é atribuída na comunicação cotidiana, qual seja: de uma
interação direta entre dois (ou mais) indivíduos. Relações dialógicas podem ser
identificadas em quaisquer situações ou processos nos quais múltiplas perspectivas
avaliativas se confrontam e opõem-se umas às outras de uma forma mutuamente
responsiva que se assemelha às réplicas de um diálogo face a face (Faraco, 2003).
Oposição e responsividade são dimensões inerentemente constitutivas das relações
dialógicas (Bakhtin, 1994; Holquist, 1990; Linell, 2006; Markovà, 1990). Com base
nesta perspectiva ampliada de diálogo, proposta pelo chamado Círculo de Bakhtin, se
poderia dizer que “afirmações, consciência, vida. Tudo que é humano é
dialógico” (Silvestri & Blanck, 1993, p. 103).3 Embora relações dialógicas sejam
inerentes a quaisquer atividades discursivas, na argumentação estas se tornam
particularmente explícitas: na argumentação a oposição entre perspectivas é
conscientemente reconhecida pelos participantes e desencadeia entre eles um processo
explícito de negociação.
As perspectivas – ou vozes – que entram em contato na argumentação são,
tipicamente, as de interlocutores que se relacionam de forma direta, seja em interações
face a face ou mediadas por recursos que possibilitam a comunicação à distância
(telefone, chats, correio eletrônico, etc.). Tais vozes podem também se tornar
disponíveis através de artefatos culturais (livros, gravações em áudio ou vídeo, etc.) ou,
ainda, serem ecoadas por um único indivíduo engajado num diálogo consigo mesmo
(auto-diálogo).
Partindo desta concepção ampliada de diálogo, propõe-se aqui que as relações
dialógicas (entre perspectivas, posições) – e não apenas as relações interativas (entre
indivíduos) – são o locus onde o potencial da argumentação na construção do
conhecimento pode, por excelência, ser investigado. A razão básica para esta proposta é
que a ênfase sobre relações dialógicas permite a formulação de uma teoria abrangente
que dê conta dos processos de construção do conhecimento que ocorrem tanto na
argumentação interativa como na argumentação solitariamente produzida
(autoargumentação). Num e noutro caso, a atividade argumentativa envolve
necessariamente uma negociação entre diferentes partes que assumem os papéis
dialógico/dialéticos de proponente e oponente (Freeman, 1991) em relação a um
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Especificidade da argumentação em situações de ensino-aprendizagem
Enquanto atividade discursiva, o modo como a argumentação se realiza e a
organização estrutural dos enunciados que a constituem são sensíveis aos particulares da
situação social em que é produzida. Pelo menos três aspectos distinguem a argumentação
gerada em situações de ensino-aprendizagem da argumentação produzida em situações que
servem a outros fins: 1-debatibilidade dos tópicos focalizados; 2-assimetria na disposição
dos participantes para mudança de seus pontos e vista; 3-previsibilidade do resultado da
argumentação (De Chiaro & Leitão, 2005; Leitão, 2009).
Debatibilidade do tópico
Previsibilidade do resultado da argumentação
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Mecanismo de aprendizagem que opera na argumentação
A dimensão epistêmica da argumentação é conceituada na presente perspectiva
como diretamente relacionada às propriedades semiótico-discursivas que a constituem e
diferenciam de outras atividades de linguagem. Tais propriedades são aqui definidas em
termos de um conjunto de ações ou movimentos discursivos constitutivos da argumentação.
São estes: a sustentação de pontos de vista e a consideração e resposta a perspectivas
contrárias. Tomados em conjunto, estes movimentos geram, no discurso, um processo de
negociação a partir do qual pontos de vista (conhecimento) a respeito da realidade
circundante (física ou social) são continuamente formulados, revistos e transformados.
Quando argumenta, o indivíduo confronta-se com elementos de oposição (dúvida,
questionamento, contra-argumentos, pontos de vista contrários (atual ou potencial) aos
quais precisa responder. Por si só, o confronto com oposição não garante, naturalmente, que
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mudanças venham a ocorrer nas posições que o indivíduo defende – ou seja, o confronto
com oposição não causa mudanças. A ideia que se propõe é que a necessidade dialógica de
responder à oposição ‘abre’ o ponto do vista do argumentador a re-visão (avaliação),
processo este visto como requisito fundamental para que mudanças de perspectivas possam
eventualmente acontecer (Leitão, 2000b). A necessidade de responder à oposição exige que
o argumentador tome seu próprio argumento como objeto de reflexão e pondere em que
medida este ‘resiste’ a dúvidas, questionamentos e contra-argumentos levantados pelo
oponente. E é justamente nesse processo de re-visão de perspectiva que se acredita residir
um poderoso mecanismo de aprendizagem. A ideia central da presente proposta é que a
realização dos movimentos discursivos acima indicados implica, no plano cognitivo, a
instauração de um processo de revisão de perspectivas a partir do qual a posição defendida
pelo argumentador é necessariamente avaliada e, eventualmente, transformada.
Revisão de perspectiva: a dinâmica do processo
Quando um indivíduo faz uma afirmação sobre um aspecto qualquer da realidade no
curso de um evento comunicativo, ele pode não ter qualquer propósito definido de submeter
esta afirmação a algum tipo de reflexão ou avaliação posterior. Ele simplesmente afirma
algo sobre o mundo. Se a isto nenhuma reação crítica se segue (dúvida, contra-argumento,
etc.), um número de alternativas de ação se abre para o falante. Ele pode gerar novas
afirmações em conexão com o tema em pauta sem que retorne à afirmação inicial, realizar
uma mudança temática interrompendo, temporária ou definitivamente, sua fala sobre o tema
anterior ou simplesmente se retirar da situação comunicativa. O importante a ser notado é
que, de acordo com a perspectiva ora apresentada, em nenhum desses casos se diria ter
existido argumentação. Por conseguinte, nenhuma necessidade comunicativa de responder à
oposição teria havido que constrangesse o falante a tomar sua afirmação inicial como objeto
de reflexão e revisão.
Processo bem diverso ocorreria, entretanto, se a afirmação inicial não fosse de
imediato aceita (ou assim o falante o presumisse), mas, sim, questionada por um oponente.
O surgimento deste movimento opositivo daria à situação comunicativa contornos
inteiramente novos. Em primeiro lugar, o que inicialmente se definia como uma mera
afirmação sobre o mundo, assume, retrospectivamente, o estatuto de um ponto de vista a ser
defendido pelo falante, este agora investido no papel dialógico-dialético de proponente (P)
de um ponto de vista. Por sua vez, o levantamento de questões ou críticas em relação à
aceitabilidade do ponto de vista de P, institui aquele que as levanta no papel dialógico-
dialético de oponente (O) em relação ao ponto de vista em questão. (Como ressaltado antes,
estes são papéis que podem ser exercidos por diferentes indivíduos ou por um único
indivíduo, como ocorre na auto-argumentação). O mais importante a se destacar nesta
reconfiguração da situação comunicativa é que a ação contrária do oponente é o elemento
que regula e dirige as ações futuras do proponente no sentido de engajá-lo num processo de
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revisão do argumento por ele proposto. Re-ver um argumento implica, neste caso,
considerar em que medida ele resistiria às críticas, dúvidas e questionamentos levantados.
Argumentação e mudança de perspectiva: possíveis resultados
Partindo-se de uma perspectiva diversa, propõe-se aqui que a retirada do ponto de vista
inicial é apenas um dos possíveis resultados que podem se seguir ao confronto de um argumento
com oposição. No mínimo, três outras possibilidades existiriam (Leitão, 2000b). A primeira é
que o argumentador se considere em posição de descartar o contra-argumento e, em
consequência, reafirmar a posição originalmente proposta. Uma segunda possibilidade é que,
embora reconheça a relevância do contra-argumento (que o impede, portanto, de descartá-lo),
traga para a discussão novos elementos de sustentação para seu próprio lado na disputa que lhe
permitam, à semelhança do caso anterior, reafirmar a posição inicial proposta. Uma terceira
possibilidade ocorreria em casos em que o argumentador não somente reconhece a pertinência
do contra-argumento, mas, também, integra elementos deste à sua própria posição. Desta
alternativa resultaria toda uma gama de possibilidades de surgimento de posições híbridas nas
quais se reconhecem tanto elementos do argumento originalmente formulado pelo proponente
como marcas da contra-argumentação (Leitão, 2000b).
identificar a resposta do proponente à oposição e o efeito desta oposição sobre a posição inicial
do proponente.
Contexto da argumentação
Análise
O episódio de argumentação analisado em seguida foi gravado durante uma aula de
história para alunos da quinta série do ensino fundamental.5 O tópico ensinado na ocasião
focalizava a escravidão de africanos no Brasil no período da colonização portuguesa.
Imediatamente antes da discussão ter início, a professora solicitara aos alunos que lessem
um pequeno trecho do livro didático usado na disciplina e se posicionassem em relação a
uma das afirmativas contidas no livro. A afirmativa em questão referia-se às tentativas de
justificar a escravidão do período colonial a partir das necessidades econômicas da época
(Medeiros, 1999). Embora esta tenha sido a questão central proposta para discussão, a
argumentação gerada expandiu-se de modo a incluir diversos outros temas relacionados. No
fragmento da discussão que se analisa em seguida, o que se discute são diferenças
socialmente geradas entre indivíduos aos quais os alunos se referem como “brancos e
negros”, no Brasil. Nos transcritos citados a marca ( ) indica falas inaudíveis, / indica falas
interrompidas, [...] indica pausas, MAIÚSCULAS marcam ênfase e (MAIÚSCULAS EM
PARÊNTESES) marcam comentários do analista.
A argumentação começa quando José reage fortemente ao que ele acredita ser o
ponto de vista formulado por Luís em falas anteriores, qual seja: que a diferença entre
brancos e negros é de ordem econômica.
(T399) José: (LUÍS DISSE QUE) o negro não pode ser rico, eu entendi assim, eu juro a
você que eu entendi assim, que o negro nunca podia ser rico
Na sequência, Vânia contra-argumenta. Ao mesmo tempo em que discorda da
posição que José atribui a Luís, propõe um outro ponto de vista: que a principal diferença
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entre brancos e negros não se prende ao status socioeconômico e, sim, à sua “cultura” e aos
seus “modos de pensar”. O que oferece como apoio para sua afirmação é a evocação da
crença, bastante difundida no conhecimento do senso-comum, de que “ninguém pensa igual
a ninguém”:
(T411) Vânia: É porque ele (LUÍS) disse que os negros são diferentes porque é a mesma
( ) mas a gente não tá falando de diferença assim se um tem mais grana, ou tem ( )
pequeno, a gente tá falando das ( ) é das, das diferenças sociais e econômicas, ou seja, é,
você (REFERINDO-SE A LUÍS) quis transmi, você quis transmitir assim que eles não são
iguais, eles são diferentes porque pensam diferente, ninguém pensa igual, ninguém, então
el, eles não podem ter [...] CULTURAS e modos iguais, entendeu?
Neste ponto da discussão a professora intervém selecionando outra aluna, Silvana, como
próxima falante.
(T413) Profa.: Silvana, o que é que você acha dessa questão que surgiu aí?
A pergunta da professora dirige a atenção de Silvana para a discordância entre o ponto de
vista atribuído a Luís, por um lado, e a contra-argumentação de José e Vilma, por outro. Ela
solicita de Silvana uma tomada de posição. Com esta pergunta a professora realiza um
conjunto de ações verbais como essenciais para que uma argumentação com fins de ensino-
aprendizagem seja implementada (De Chiaro & Leitão, 2005; Leitão, 2000a; Leitão, 2009).
Ela 1-apresenta o tópico em foco como polêmico e debatível, 2-legitima a possibilidade de
divergência em relação a este e 3-institui o debate como método para negociação de
diferenças de perspectiva em relação ao tema discutido.
(T414) Silvana: É, é que, como Vânia disse, né? Que um não pensa igual ao outro
(NEGROS E BRANCOS) por isso o que Luís disse eu também discordo porque claro que
eles têm culturas diferentes porque um não é, não tem o pensamento do outro, então,
exemplo, eu não tenho o pensamento de Rose, pode ela pode pensar uma coisa e eu não
posso pensar/
Pelo menos três movimentos argumentativos podem ser identificados no enunciado
produzido por Silvana em resposta à pergunta da professora. Ela contra-argumenta em
relação ao ponto de vista atribuído a Luís (“o que Luís disse eu também discordo”), afirma
sua adesão à posição defendida por Vânia (“é como Vânia disse” – brancos e negros são
diferentes quanto aos seus modos de pensar) e oferece um novo elemento de suporte para
este ponto de vista (no caso, um exemplo extraído da própria experiência: “eu não tenho o
pensamento de Rose”). Do ponto de vista do processo de conceitualização do fenômeno da
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escravidão negra no Brasil, Silvana e Vânia fazem, em T411 e T414, uma primeira tentativa
de refletir sobre a natureza das diferenças sociais observadas nos dois grupos em questão.
(T415) Profa.: E é o dinheiro, o poder, a riqueza que vai medir as diferenças culturais?
A pergunta seguinte da professora elege um dos tópicos até então trazidos para a discussão
(diferenças financeiras entre brancos e negros) como alvo para reflexão dos alunos ao
mesmo tempo em que ‘silencia’ (pelo menos, temporariamente) outro (diferenças nos seus
“modos de pensar”). Mais ainda: sua intervenção põe em destaque o conceito de cultura.
Mais especificamente, a pergunta chama a atenção para a natureza dos indicadores a partir
dos quais diferenças culturais podem ser identificadas. E é esta questão que será tematizada
pelos alunos até o final da discussão.
Ainda um outro aspecto merece destaque na pergunta da professora. Ao enfatizar
as questões financeiras utilizando-se de uma pergunta, a professora indiretamente
expressa sua discordância em relação a esta ênfase. Refrasear a afirmação de um aluno
usando a forma de pergunta é procedimento tipicamente usado por professores para
expressar desacordo e ‘convocar’ o aluno a rever sua afirmação. As condições concretas
nas quais acontece esta discussão (sala de aula) e as relações assimétricas e hierárquicas
que caracterizam o lugar social dos interactantes (professora-alunos) contribuem,
conjuntamente, para conferir ao enunciado da professora um efeito contra-
argumentativo.
(T416) Silvana: Não, não porque/
(T417) Profa.: CULTURAIS? (ENFATIZANDO FORTEMENTE A PALAVRA E
DIRIGINDO-SE A LUÍS)
(T418) Luís: Não, cada um pensa como pode também, né?
Que Luís percebe a pergunta da professora como um movimento de desacordo em
relação ao que ele anteriormente afirmara se torna claro quando se observa o modo
como reformula seu ponto de vista ao responder à contra-argumentação implícita na
pergunta da professora. A resposta de Luís flexibiliza seu ponto de vista anterior (que
enfatizava apenas questões financeiras) ao mesmo tempo que incorpora aspectos da
contra-argumentação de Vânia (T411) e Silvana (T414): “cada um pensa como pode
também, né?” o termo “também” assinala a integração das duas perspectivas.
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ponto de vista que se referia apenas a “índios” e “brancos”, aplica-se agora a toda a
humanidade.
Na sequência de turnos que se segue (T431-436), não é de todo claro que pontos de
vista ou tópicos estariam sendo postos em discussão.
(T431) Silvana: Mas se tivesse a mesma cultura, como é que ia ser? ( ) todo mundo pelado
por aqui
(T432) Profa.: Ninguém po, pode ser porque as pessoas trabalham, vivem, vivem de modos
diferentes
(T433) Luís: É a diferença de luta para os europeus e de luta para [...]
Argumentos (e contra-argumentos) que os indivíduos elaboram em relação a
objetos e situações da realidade circundante são tratados neste capítulo como formas de
conhecimento a partir das quais os indivíduos buscam compreender e interpretar o
mundo em que vivem. O ponto de partida do capítulo foi a ideia de que, para que se
construa uma abordagem psicológica às relações entre argumentação e construção do
conhecimento, uma questão crítica necessita ser respondida. O que acontece ao
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Notas de rodapé
1. Este modelo dos trabalhos de pesquisa desenvolvidos pela autora no Núcleo de Pesquisa da
Argumentação (NupArg) da Pós-Graduação em Psicologia Cognitiva da Universidade Federal
de Pernambuco.
2. Veja-se, por exemplo, a ampla utilização do modelo de Toulmin (1958) nas pesquisas
psicológica e educacional.
3. No original: “El enunciado, la consciencia, la vida. Todo lo humano resulta dialógico em el
pensamiento de Bajtín.”
4. Equivalentes, respectivamente, às terceira, sexta e sétima séries a partir da Lei nº 11.114, de
16 de maio de 2005.
5. Dados registrados por Sylvia de Chiaro como parte do estudo em que baseou sua dissertação
de mestrado (De Chiaro & leitão, 2005) e atualmente pertencentes ao NupArg.
A autora agradece o apoio oferecido pelo CNPq a pesquisas que possibilitaram a produção do
presente capítulo.
Selma Leitão
Doutora em Psicologia pela Cambridge University, Inglaterra. Fundadora e
coordenadora do Núcleo de Pesquisa da Argumentação/NupArg da Pós-Graduação em
Psicologia Cognitiva, Departamento de Psicologia, UFPE, onde atua como docente e
pesquisadora. Seu programa de pesquisa focaliza relações entre argumentação e
construção do conhecimento, argumentação e reflexão, e aquisição de competências de
argumentação oral e escrita.
selma_leitao2001@yahoo.com