Você está na página 1de 2

Em 13 de junho de 1888 nasce Fernando António Nogueira Pessoa, em

Lisboa. Com cerca de 30 mil papéis escritos durante a vida, não se restringiu à
poesia, tendo escrito textos filosóficos, de sociologia, de política, ficções e
muitos outros.
Essa aptidão para o mundo das letras era também compartilhada pelo
seu pai, Joaquim Seabra Pessoa, que escreveu despretensiosas críticas musicais,
e cuja morte precoce (mesmo antes de Pessoa completar seus 5 anos) pode tê-lo
afetado até o fim de seus dias. A tuberculose levou-lhe ainda seu irmão de 11
meses, não muito tempo após a morte do pai.
Após estes acontecimentos, toda a dinâmica de sua vida muda. Sua mãe,
ainda jovem, pretende casar-se novamente e, sabendo que vai morar no
exterior, pondera sobre o que fazer com o pequeno Fernando. E é neste
momento que surge o primeiro heterónimo, Chevalier de Pas, que escreve: “à
minha querida mamã: Eis-me aqui em Portugal/ Nas terras onde eu nasci/ Por
muito que goste delas/ Ainda gosto mais de ti.”, não deixando escolha senão a
de levá-lo consigo.
É, então, em Durban, na África do Sul, que Fernando Pessoa frequenta os
ensinos primário e secundário, aprendendo o inglês como um falante nativo.
Retorna a Portugal aos seus 17 anos, onde permaneceria até o dia de sua morte
aos 47 anos.
Em Lisboa vive com a avó. Matricula-se em letras e desiste do curso e da
carreira pouco tempo depois, como desistiu de praticamente tudo que já quis
algum dia, ainda que tenha continuado a estudar por conta própria além de não
ter parado de escrever. Fernando Pessoa “procurou ser espectador da vida, sem
se misturar nela”, e esta constante tentativa de fuga da própria realidade
justifica sua tendência para a despersonalização característica de sua criação
artística.
O que levou essa personalidade tão excêntrica a cativar leitores foi
justamente seu carácter inovador que o fez se envolver em movimentos de
renovação literária e sua escrita ousada que explorou diferentes formas de
literatura, dando especial destaque ao recurso a heteronímia. Os heterónimos
apareceram como autores fictícios com biografias próprias e cujos nomes eram
utilizados para assinar escritos de Fernando Pessoa, estando entre os principais:
Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Para alguns genialidade,
para outros patologia.
Para o próprio Fernando Pessoa, essa dissociação de personalidade que o
acometia levava-o a possibilidade de um distúrbio de personalidade múltipla.
Em um de seus textos de autoanálise se autodiagnostica histero-neurasténico,
descrevendo sintomas de transtorno bipolar e pendor suicida. O irónico disso
tudo é que a escrita heteronímia por vezes revelava ideias mais autênticas do
que as do próprio Fernando Pessoa ortónimo, que em uma carta a Cortês-
Rodrigues sobre o assunto diz “creio que estou sendo sincero… Sim, eu devo
estar a ser sincero”.
Vale ressaltar que essa “autenticidade” não é aplicável em todos os casos.
Mas eu gostaria de aplicar neste em particular.
Álvaro de Campos, em sua poesia, revela fortes indícios de
homossexualidade, como quando convida Walt Whitman a se esbarrarem
tontos pelas paredes e a se esfrangalharem juntos. Traços como estes levaram
muitos estudiosos a se questionarem sobre a natureza da criação dos
heterónimos e se eles não poderiam ser projeções de sua própria vida: dor
emocional, sexualidade…
Fernando Pessoa era homossexual? Afirmava ter um temperamento
feminino (pelo qual entende-se sua sensibilidade e forma de se expressar) e
inteligência masculina. Este lado feminino associava-se a uma passividade
(“sempre gostei de ser amado e nunca de amar”), que revelava, segundo ele,
uma inversão sexual. Mas, segundo se sabe, Fernando Pessoa nunca agiu de
acordo com esses impulsos, deixando explícita a sua aversão a prática da
sexualidade correspondente aos mesmos. Também se sabe que seu “grande
amor” foi Ophélia Queiróz, então não há como dar respostas concretas.
Com isso verifica-se que mesmo tendo muito material do Fernando
Pessoa, o autor permanece sendo uma personalidade com muitos mistérios e
cuja genialidade, ainda que reconhecida após a sua morte, ainda não é
inteiramente compreendida. Afinal como compreender mais de cem pessoas
contidas numa só? O próprio Álvaro de Campos falava Fernando Pessoa “são”
ao invés de Fernando Pessoa “é”.

Você também pode gostar