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Revolta da Vacina

O que foi?
A Revolta da Vacina foi um revolta popular que se iniciou no Rio de Janeiro, em 10 de
novembro de 1904, sendo causada pela insatisfação popular em razão de uma campanha de
vacinação obrigatória contra a varíola conduzida pelo sanitarista Oswaldo Cruz. A revolta
causou a morte de 30 pessoas e grande destruição material na então capital do Brasil.
Contexto Histórico
No começo do século XX, a cidade do Rio de Janeiro, além de capital, era a maior cidade do
Brasil, com uma população em torno de 800 mil habitantes. O crescimento urbano carioca
aconteceu de maneira descontrolada no final do século XIX, sobretudo depois que a escravidão
foi abolida e a economia cafeeira entrou em decadência naquele estado. A partir da segunda
metade do século XIX, doenças como tuberculose, peste bubônica, febre amarela, cólera,
varíola, entre outras, espalhavam-se frequentemente pela cidade, causando a morte de milhares
de pessoas. No ano de 1891, por exemplo, o Rio de Janeiro tinha sofrido:

● 4454 óbitos causados por febre amarela;

● 3944 óbitos causados por varíola;

● 2235 óbitos causados por malária;

● 2373 óbitos causados por tuberculose.

Esses números repetiam-se ao longo dos anos e deixaram o Rio de Janeiro com fama de ser uma
cidade “pestilenta”, o que afastava estrangeiros e produzia má impressão em relação ao Brasil
internacionalmente. Ao longo do século XIX, médicos e especialistas debateram medidas sobre
como resolver os problemas sanitários do Rio de Janeiro.

Muitos médicos acreditavam que os males da cidade eram causados pelos miasmas emitidos


pelos pântanos nos arredores do Rio de Janeiro. Os miasmas eram basicamente, na visão da
medicina da época, odores pútridos que rondavam os ares do Rio de Janeiro e contaminavam a
população. A quantidade de residências coletivas e as ruas estreitas, além da geografia da
cidade, impediam a circulação de ventos que reduziriam os efeitos desses odores.

Essa teoria, como sabemos, comprovou-se falsa, no entanto, as propostas de solução dadas pelos
que acreditavam nas teorias miasmáticas permaneceram na mentalidade das elites brasileiras, e
ideias de reforma do Rio de Janeiro ganharam força. Reformas que aconteceram em cidades
como Paris e Buenos Aires serviram de inspiração para o caso carioca.

Essas reformas visavam a um embelezamento e modernização da cidade, além de


promoverem sua gentrificação, expulsando os pobres das regiões centrais e forçando-os a morar
em locais mais afastados do centro. Nesse contexto da reforma, Rodrigues
Alves e Pereira Passos foram duas figuras essenciais.
Reforma do Rio de Janeiro

Rodrigues Alves era o presidente do Brasil quando a Revolta da Vacina eclodiu no Rio de
Janeiro. A ideia de realizar reformas modernizadoras no Rio de Janeiro era debatida desde o
século XIX, mas foi só durante o governo do presidente Rodrigues Alves que houve
possibilidade de levar-se esse projeto em frente. Durante sua campanha eleitoral, Rodrigues
Alves já defendia a necessidade de reformar o Rio de Janeiro, e quando foi eleito, reforçou esse
desejo.
Rodrigues Alves encaminhou o projeto de reforma da cidade para Francisco Pereira Passos,
arquiteto de formação e prefeito do Rio de Janeiro. A reforma do Rio de Janeiro foi responsável
pela demolição de centenas de edifícios, o que fez com que milhares de pessoas pobres fossem
desalojadas de suas casas.

O alvo da reforma foi justamente a região central do Rio de Janeiro, onde havia inúmeros
cortiços, residências coletivas que abrigavam dezenas de pessoas. Esses locais deram espaço
para avenidas largas e para prédios novos e com arquitetura moderna (para os padrões
europeus). Essa população desalojada ou teve de ir para os subúrbios ou instalou-se nos morros
da cidade.

A reforma do Rio de Janeiro não afetou apenas as classes pobres, mas também grupos que
formavam uma espécie de classe média de comerciantes, que tiveram que adequar seus
negócios a novos padrões impostos pelo governo. A reforma foi conduzida de maneira
autoritária, e até festas tradicionais da cidade sofreram com a repressão policial.

Existem historiadores que sugerem que a insatisfação da população do Rio de Janeiro iniciou-se
com a forma como a reforma foi conduzida, outros apontam que foi somente a política sanitária
implantada por Oswaldo Cruz que gerou a revolta popular.

Brigadas Sanitárias

Ao mesmo tempo, iniciava-se o programa de saneamento de Oswaldo Cruz. Para combater a


peste, ele criou brigadas sanitárias que cruzavam a cidade espalhando raticidas, mandando
remover o lixo e comprando ratos. Em seguida o alvo foram os mosquitos transmissores da
febre amarela.

Finalmente, restava o combate à varíola. Autoritariamente, foi instituída a lei de vacinação


obrigatória. A força policial invadia as casas é aplicava a força as vacinas nos moradores. A
população, humilhada pelo poder público autoritário e violento, não acreditava na eficácia da
vacina (algo que corroborou para isso foi a crença de que ao receber a vacina a pessoa ficaria
com aparência de animais ruminantes). Os pais de família também rejeitavam a exposição das
partes do corpo a agentes sanitários do governo.

A vacinação obrigatória foi o estopim para que o povo, já profundamente insatisfeito com o
“bota-abaixo” e insuflado pela imprensa, se revoltasse. Durante uma semana, enfrentou as
forças da polícia e do exército até ser reprimido com violência. O episódio transformou, no
período de 10 a 16 de novembro de 1904, a recém reconstruída cidade do Rio de Janeiro numa
praça de guerra, onde foram erguidas barricadas e ocorreram confrontos generalizados.
Desfecho
No dia 16 de novembro, foi decretado estado de sítio e, a partir daí, a revolta dos populares e
dos operários perdeu força. As últimas ações repressivas aconteceram no dia 23 de novembro. O
saldo da Revolta da Vacina foi de 30 mortos, 110 feridos e a deportação de 461 pessoas para o
Acre, além de muita destruição material na cidade. Apesar de tudo, a campanha de
vacinação conseguiu erradicar a varíola do Rio de Janeiro.
Fontes
|1| BENCHIMOL, Jaime Larry. Reforma urbana e Revolta da Vacina na cidade do Rio de
Janeiro. In.: FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (orgs.). Brasil
Republicano: o tempo do liberalismo oligárquico: da Proclamação da República à Revolução de
1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018, p. 215-272.
|2| CARVALHO, José Murilo de. O povo contra a vacina. In.: FIGUEIREDO, Luciano (org.).
História do Brasil para ocupados. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013, p. 357-58
BENCHIMOL, Jaime Larry. Pereira Passos: um Haussmann tropical – A renovação urbana da
cidade do Rio de Janeiro no início do século XX. Rio de Janeiro: Biblioteca carioca,1992.
CARVALHO, José Murilo de. A formação das almas: o imaginário republicano no Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 1990.
CHALHOUB, Sidney. Cidade Febril: cortiços e epidemias na Corte imperial.São Paulo:
Companhia das Letras, 1996.
Discurso de posse de Rodrigues Alves realizado em 15 de novembro de 1902. In: Anais da
Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.
Discurso do senador Rui Barbosa realizado em 15 de novembro de 1904. In: Jornal do Brasil,
Rio de Janeiro, 15/11/1904.
RIO, João do. O velho mercado. In: Cinematógrapho. Porto, Moderna, 1909.
ROCHA, Oswaldo P. A era das demolições: Cidade do Rio de Janeiro (1870-1920). Rio de
Janeiro: Biblioteca Carioca, 1995.
SEVCENKO, Nicolau (org). História da vida privada no Brasil República: da Belle Époque à
Era do Rádio. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

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