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Colecionismo e

Restauração: Desafios ao
decorrer dos séculos
Gabriela Oliveira

Podemos usar várias visualizações para o colecionismo


(negativas ou positivas). Ao longo da História o
colecionismo várias vezes foi visto como ato
individualista, assim como bens privados, que
desafortunadamente impede várias pessoas de ter acesso
a cultura.
Colecionar é uma forma de
recordação prática, e de todas as manifestações profanas da proximidade, a
mais resumida. Portanto, o ato mais diminuto de reflexão política faz, de certa
maneira, época no comércio antiquário.

(BENJAMIN, apud FRONER, 2015, p.4)

Deste mesmo modo, no ato de colecionar se torna


explicito que há movimento da obra no tempo e um
distanciamento de sua história no momento em que
deixa de ser algo de um espaço público, para poder fazer
parte de um acervo privado. Muitas vezes o valor capital
de um patrimônio afeta nesse meio, por motivos de
grande procura. Todavia, um valor capital de um acervo
pode se tornar um privilégio para as entidades públicas
terem mais cuidado ao manusear e cobrir qualquer dano
que futuramente possa ocorrer ao objeto em questão.
O capital financeiro gerado na primeira metade do séc. XX
chega com um novo modo de colecionismo, que a partir
daí começa a ter mais olhos voltados ao público e ao
setor cultural. Desta maneira, é de se analisar que de
algum modo a indústria da arte mesmo de opondo ao
sistema capitalista está interligada no contexto industrial.
Restauração após a Revolução Francesa e
durante o séc. XIX
O período da Revolução Francesa foi de grande abalo
para as obras de arte, que foram movidos por saques e
destruições com o intuito de abolir os símbolos das
antigas classes dominantes, como a nobreza e clero.
O estilo de arte mais afetado foi o medieval, que estava
ameaçado a ser apartado da França, e com isso trouxe
uma atenção especial de um Estado para criar uma
legislação sob tutela dos monumentos históricos
afetados. Vários relatórios que foram apresentados por
Abade Henri Grégoire (1750-1831) ao Comitê de
Instrução Pública na Convenção em 1793 e 1794, foram
muito valiosos pois a partir daí foi elaborado um
decreto para evitar abusos e cidadãos foram
convidados a vigilância contra os ataques e instituíram
penas para os criminosos que cometiam tais
atrocidades aos patrimônios. Por mais que essas ações
francesas não terem sido suficientes para parar
totalmente as destruições, o Estado mostrou uma
grande preocupação da Era Moderna e reconheceram
as obras de valor histórico como interesse público, e a
ter sua participação na restauração e preservação
Havia várias ameaças de outros países para invasão do
território, por que o ato de preservar esses bens era
considerado um ato antirrevolucionário, então devido
as circunstâncias do momento, as restaurações foram
interrompidas e várias obras foram salvas de depósitos.
Com toda essa balbúrdia obras foram transferidas da
França e também da Itália. Quatremère de Quincy
(1755-1849) foi totalmente contra esse deslocamento
levantando a questão de descontextualização das obras
de arte no ambiente. Para ele, esse deslocamento de
obras é o mesmo que ignorar o conhecimento, pois o
estudo de uma obra só pode ser concluído no ambiente
no qual foi criada. Obras espalhadas tornariam os
estudos incompletos, não teria como transportar todos
os objetos de uma obra juntos.
“Dividir é destruir”
(QUATREMÈRE DE QUINCY, 1996, p. 100)

Outro estilo de arte bastante incompreendido foi o


estio de arquitetura Gótica, pois suas origens eram
desconhecidas, acreditavam ser uma arte estrangeira e
resultados de invasões que teria relação ao classicismo,
que voltaria mais tarde com o Renascimento. O gótico
também foi relacionado a uma manifestação em
oposição à arquitetura acadêmica, a participação de
literatos e intelectuais foi de grande importância para o
estudo da arte gótica, como por exemplo Victor Hugo
(1802-1885). Ele tinha bastante interesse pela
arquitetura e condenava as depredações das igrejas
medievais, como por exemplo a igreja Notre-Dame de
Paris. Continuavam os esforços para manter a proteção
das obras de arte, e mesmo com estudos negavam que
monumentos góticos foram da história de seu país.
Ludovic Vitet (1802-1873) foi de grande importância
como historiador e crítico da arte, foi nomeado como
inspetor Gera dos Monumentos Históricos, que tinha
como objetivo a elaboração do inventario dos
monumentos franceses. Ele fez várias viagens em busca
dos edifícios medievais esquecidos, criou pesquisas e
relatórios que geraram grande repercussão, como por
exemplo formação de profissionais incapazes de atuar
em restaurações. Vitet ressaltava que era necessário
uma base bem detalhada de estudos e que qualquer
dedução deveria ser analisada com uma enorme cautela
para não piorar ainda mais o estado da obra, como
demonstra a citação de Augustin Charles
d´Aviler (1653-1700):
Restauração; é o refazimento de todas as partes de um edifício degradado & deteriorado
por defeitos de construção ou pela sucessão do tempo, de modo a que ele seja reconduzido
à sua forma primitiva, & mesmo aumentado consideravelmente, como aquela que o Rei
mandou fazer no velho castelo de S. Germain en Laye construído por Francisco I.
Restaurar; é restabelecer um edifício, ou reconduzir ao seu estado primitivo uma figura
mutilada. A maior parte das estátuas antigas foram restauradas, como o Hércules de
Farnese, o Fauno de Borghese em Roma, os Lutadores da galeria do grão-duque de
Florença, a Vênus de Arles que está na Galeria do Rei em Versalhes; & essas restaurações
foram feitas pelos mais hábeis escultores

(D´AVILER, 1710, v. 2, p. 836)

Quatremère de Quincy disse que várias vezes abusou


da arte de restaurar, como por exemplo não apenas
restaurar, mas construir uma obra a partir de apenas
um fragmento. Naquela época uma lenta mudança
ocorria no restauro, o excessivo respeito sempre pelo
original, que várias vezes não foi respeitado nesse
período. Vitet achava desnecessário as correções de
partes irregulares ou imcompletas, pois eram parte da
história e do tempo da obra.
Seguindo em frente na história, Viollet-le-Duc (1814-79)
foi um estudioso com vários talentos que ensaiava os
primeiros passos no restauro. Apesar da falta de prática
ele foi um ótimo restaurador e seus métodos são
usados até hoje. Viollet participou da restauração de
Notre-Dame com ótimas propostas de intervenção e
seus princípios. Várias obras enfrentavam problemas os
decorrer do séc. XIX, ainda arruinadas pelas destruições
na época da Revolução, também pela falta de
conhecimentos dos materiais usados que não tinham
boa durabilidade além da falta de ajuda de algumas
ciências. Levando a destruição em caos extremos de
partes de construções que estavam ruindo na primeira
metade do séc. Muitas igrejas tiveram um uso indevido,
usadas como armazém, transformadas em industrias,
estábulos etc. O governo estava mais concentrado na
cidade e poucos monumentos foram tombados devido à
falta de meios para resolução.
Muitas lutas ocorreram desde então, trazendo também
transformações essenciais para a história da
restauração como a importância da documentação que
começou a se firmar em meados do séc. XX.
Analisando todo esse contexto, podemos observar a
luta pelo bem da preservação e da história da arte ao
decorrer dos séculos, todo o preconceito e falta de
interesse em algo tão importante.
Nos dias atuais, ainda ocorrem lutas para mostrar a
importância da profissão que infelizmente não é
valorizada como deveria.

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