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TEÓRICOS DA RESTAURAÇÃO Profª.

Diana Melo Barbosa


TEORIA DA
RESTAURAÇÃO
VIOLLET-LE-DUC (1814- 1879)
▪ Viollet-le-Duc foi uma personalidade polémica, arquiteto,
desenhador, escritor, crítico e historiador de arte
arquitetônica. Foi ainda um excelente restaurador de
edifícios da Idade Média, que influenciou as ideias
ocidentais acerca do restauro no século XIX.
▪ Atuou numa época em que a restauração se estava
firmando como ciência e seu papel foi de grande
relevância (...) advento da chamada Revolução Industrial
e as profundas mudanças por ela acarretadas, o
despontar do Iluminismo, a Revolução Francesa – que
alteraram de forma dramática o modo como uma dada
cultura se relacionava com o seu passado e presente e
produzindo um sentimento de proteção a edifícios e
ambientes históricos em vários estados europeus.
VIOLLET-LE-DUC (1814- 1879)
▪ Restaurador de monumentos francês nascido em Paris;
▪ Um dos responsáveis pelo reconhecimento do gótico
como uma das mais importantes etapas da história da
arte ocidental.
▪ Formou-se em arquitetura, em Paris, e viajou para a
Itália (1836).
▪ Voltou à Paris, onde passou a trabalhar na comissão
Restaurador de monumentos francês nascido em Paris;
▪ Um dos responsáveis pelo reconhecimento do gótico
como uma das mais importantes etapas da história da
arte ocidental. encarregada da preservação dos
monumentos históricos.
CONCEITO DE RESTAURAÇÃO SEGUNDO VIOLLET-LE-DUC

1 Procurava entender a lógica da concepção do projeto pois esta daria resposta


unívocas.

2 Não se contentava em fazer uma reconstituição hipotética do estado de origem.

3 Busca da pureza do estilo (fazia reconstituição daquilo que teria sido feito, uma
reformulação ideal do projeto).

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Esquema ideal de Le-Duc: 1- entender profundamente o sistema de projeto e
construção 2 – conceber um modelo ideal 3 – impor ao projeto / edifício o esquema
idealizado
“Restauração. A palavra e o assunto são modernos. Restaurar um edifício não é mantê-lo,
repará-lo ou refazê-lo, é restabelecê-lo em um estado completo que pode não ter existido
nunca em um dado momento.”
As suas ideias vinham em sequência dos
desenvolvimentos anteriores. Na prática
defendia a destruição de todos os
acrescentos de épocas anteriores de
modo a restituir cientificamente o
original. Era necessário conduzir o
monumento ao estado mais puro, mesmo
que ele nunca tenha existido, o que
implicava que o arquitecto restaurador
tivesse que se colocar na pele do
projectista da obra original e perceber
quais seriam as suas ideias para
continuar a obra, mediante documentos e
desenhos, ou na sua falta, através de
regras de estilo ou edifícios circundantes,
sem acrescentar contributos pessoais. O
arquitecto deveria optar pela
reconstrução do monumento melhorando
os defeitos e procurando um ideal do seu
estilo.
“o arquitecto deve proceder como o cirurgião hábil e experimentado que não toca um órgão
sem ter tomado consciência da função e sem ter previsto as consequências imediatas e futuras
da operação. Antes que ter azar é melhor não fazer nada. Melhor deixar morrer que matá-lo.”
▪ Ganhou fama com a restauração de monumentos como a
Sainte-Chapelle e a catedral de Notre-Dame, em Paris.
▪ Supervisionou a recuperação de inúmeros prédios
medievais, como a catedral de Amiens, as muralhas de
Carcassonne e a igreja de Saint-Sernin, em Toulouse
▪ A visão de restaurador de Viollet-le-duc deve ser avaliada
dentro do contexto na qual foi produzida: um momento de
redescoberta e de grande apreciação das qualidades da
arquitetura medieval.
▪ Ficou conhecido também pelas suas obras escritas, onde se
destaca o seu “Dicionário da Arquitectura Francesa”, no
qual trabalha a partir de 1854 até 1871.
▪ A faceta de restaurador de Viollet-le-duc deve ser
avaliada dentro do contexto na qual foi produzida: um
momento de redescoberta e de grande apreciação das
qualidades da arquitetura medieval.
SAINTE CHAPELLE
BASILICA DE VEZELAY
CIDADE MURALHA DE CARCASASONE
JOHN RUSKIN: CONTEXTO

A posição de Viollet-leDuc era diametralmente oposta à


de JohnRuskin que, na Inglaterra, em1849, publicara
TheSeven Lampsof Architecture em que faz pesadas
críticasàs restaurações. Ruskin era o expoente de um
movimento que pregava absolute respeito pela matéria
original, que levava em consideração as transformações
feitas em uma obra no decorrer do tempo, sendo a
attitude a tomar de simples trabalhos de conservação,
para evitar degradações, ou, até mesmo, a de pura
contemplação.

A LÂMPADA DA MEMÓRIA: PÁTINA DO TEMPO


JOHN RUSKIN: RESTAURO ROMÂNTICO

•Anti-intervencionista
•Absoluto respeito pela matéria original, levando em
consideração as transformações feitas em uma obra no decorrer
do tempo;
•Manutenção, conservação, para evitar degradações aceleradas;
•Marcas do tempo fazem parte da essência;
•Crítico das profundas transformações por que passava o
país(Inglaterra);
•Combate a injustiça social, crescimento e densificação urbana,
destruição da natureza e história edificada;
•Sua contribuição foi essencial para as reformas sociais,
urbanísticas e de proteção ao meio ambiente, pouco a pouco
conquistadas.
Castelo dos Mouros
PRINCIPAIS FATORES QUE JUSTIFICA E BASEIA SEUS ESTUDOS

1 Sociedade Gótica medieval é um momento inigualável. O homem possui total controle


sobre sua produção Alma, personalidade dos executores.

2 Os edifícios registram história, tradição vida espiritual de cada família de cada


nação.

3 Edifícios comunicam história importância para o ornamento e a decoração. Importa a


superfície, algo que desperte a imaginação.
Cuide bem de seus monumentos, e não precisará restaurá-los. Algumas chapas de chumbo colocadas a
tempo num telhado, algumas folhas secas e gravetos removidos a tempo de uma calha, salvarão tanto o
telhado como as paredes da ruína. Zele por um edifício antigo com ansioso desvelo; proteja-o o melhor
possível, e a qualquer custo, de todas as ameaças de dilapidação. Conte as suas pedras como se fossem as
joias de uma coroa; coloque sentinelas em volta dele como nos portões de uma cidade sitiada; amarre-o
com tirantes de ferro onde ele ceder; apoie-o com escoras de madeira onde ele desabafar; não se importe
com a má aparência dos reforços: é melhor uma muleta do que um membro perdido; e faça-o com ternura,
e com reverência, e muitas gerações ainda nascerão e desaparecerão sob sua sombra. (RUSKIN, 2013)
Missão Jesuítica San Ignacio Mini
Problemas: em casos extremos era a favor de deixar ruir
o edifício afim da pura contemplação da ruína.
Contribuição: valor documental, histórico do edifício e
preservação de das marcas do tempo

“(...) o verdadeiro significado da palavra restauração é


compreendido. Ela significa a mais total destruição que um
edifício pode sofrer: uma destruição da qual não se salva
nenhum vestígio: uma destruição acompanhada pela falsa
descrição da coisa destruída.”
CAMILLO BOITO: CONTEXTO

Como restaurador e teórico, tem um lugar consagrado


pela historiografia da restauração sendo a ele reservada
uma posição moderada e intermediária entre Viollet-le-
Duc, cujos preceitos seguiu durante certo tempo, Ruskin,
sintetizando e elaborando princípios que se encontram na
base da teoria contemporânea da restauração.

PRINCÍPIO DA MÍNIMA INTERVENÇÃO


CAMILLO BOITO: RESTAURO MODERNO
Congresso dos Engenheiros e Arquitetos – Roma 1883
1. Ênfase no valor documental dos monumentos;
2. Evitar acréscimos e renovações, que se fossem necessários deveriam ter caráter diverso do original
sem destoar do conjunto;
3. O mesmo para partes faltantes;
4. Obras de consolidação deveriam limitar-se estritamente ao necessário;
5. Respeito pelas várias fases do monumento;
6. Registrar as obras, documentando as fases: antes, durante e depois;
7. Colocar lápide para pontar a data e obra de restauro realizadas.
Problema: percurso não linear e o fato da intervenção ter
que se basear apenas na documentação.
Contribuição: importância histórica, evita o falso histórico,
preserva anexos e registra o processo de restauro.

“Para bem restaurar é necessário amar e entender o


monumento, seja estátua, quadro ou edifício.”
GUSTAVO GIOVANNONI: CONTEXTO

Gustavo Giovannoni retomaria essas


colocações (de Camilo Boito) no início do
século XX, reinterpretando, as também
para a escala urbana. O autor acentua
a construção de Boito, reiterada por
grande parte da historiografia das
teorias de restauração, de uma postura
de restauro como um caminho
intermediário – o chamado “restauro
filológico” – entre os procedimentos
antitéticos de Ruskin e Viollet-le-Duc.
RESTAURO NA ESCALA URBAN
GUSTAVO GIOVANNONI: RESTAURO FILOLÓGICO OU CIENTÍFICO
filologia substantivo feminino
1. estudo rigoroso dos documentos escritos antigos e de sua transmissão, para estabelecer, interpretar e
editar esses textos.
2. estudo científico do desenvolvimento de uma língua ou de famílias de línguas, baseado em documentos
escritos nessas línguas.
3. estudo científico de textos e estabelecimento de sua autenticidade através da comparação de manuscritos
e edições.
RESTAURO FILOLÓGICO X RESTAURO CRÍTICO

O restauro crítico elabora uma releitura das propostas filiadas ao “restauro filológico” , de Boito e
Giovannoni, consolidadas nas cartas dos anos 1930. No restauro filológico, era dada grande atenção aos
aspectos documentais das obras e às marcas de sua passagem ao longo do tempo, respeitando as várias
fases; o intuito não era, de modo algum, voltar a um suposto estado original. (...) O restauro filológico, porém,
mostrou certos limites, que ficaram evidentes com as devastações geradas pela Segunda Guerra Mundial.
Mostrou-se insuficiente considerarem-se tão-sóas questões documentais da obra. (...) Desse modo o restauro
crítico, ao mesmo tempo em que acolhe os princípios fundamentais do restauro filológico – de respeito pelas
várias estratificações do bem e de diferenciar a ação contemporânea –, também os associa ao tratamento
da dimensão formal das obras, trazendo para a discussão teorias estéticas e questões relacionadas à
percepção próprias da primeira metade do século XX. É postura inovadora por considerar as dimensões –
formal e documental – concomitantemente, através duma relação dialética.
OS CONCEITOS NA ATUALIDADE DOS PROJETOS

A restauração deve ter em vista princípios fundamentais, pensados de forma concomitante e não excludente:
• Distinguibilidade: pois a restauração (que é vinculada às ciências históricas) não propõe o tempo como
reversível e não pode induzir o observador ao engano de confundir a intervenção ou eventuais acréscimos
com o que existia anteriormente, além de dever documentar a si própria.
• Reversibilidade ou re-trabalhabilidade: pois a restauração não deve impedir, tem, antes, de facilitar
qualquer intervenção futura; portanto, não pode alterar a obra em sua substância, devendo-se inserir com
propriedade e de modo respeitoso em relação ao preexistente.
• Mínima intervenção: pois a restauração não pode desnaturar o documento histórico nem a obra como
imagem figurada.
CESARE BRANDI: CONTEXTO
Por várias décadas e, em especial, a partir da fundação
do Istituto Centrale del Restauro em Roma. Cesari Brandi
buscou – junto com as pesquisas conduzidas no campo
estético e crítico e com as experimentações efetuadas no
próprio Instituto – a configuração de uma ampla e
sistemática enunciação filosófica do problema da
restauração, traduzível tanto em uma “teoria” geral
quando em princípios operativos válidos.

“Entende-se por restauração a intervenção com função


de reativar a eficiência de um produto feito pelo
homem (BRANDI, 2008)”

DESEJO DE RESOLVER ATRAVÉS DE UM JUÍZO DE VALOR


CESARE BRANDI: RESTAURO CRÍTICO OU CRIATIVO

•Critico de arte e historiador, especialista em teoria da


conservação/restauração
•Intervencionista multidisciplinar
•Crise: não havia como enfrentar a restauração das cidades
afetadas pela 2° Guerra em massa
•Na falta de documento permite processo criativo quando
necessário porém com os conceitos de reversibilidade e
distinguibilidade
•Ato histórico-crítico-reconhecimento obra de arte e história,
insere no presente
•Restauração: sair do empirismo e vincular-se às ciências
•Importância estética e histórica (não se pode entender a
obra de arte desvinculada do tempo histórico)
•Sua teoria deu origem a “trateggio”, uma técnica
controversa para repintar as seções ausentes ou
danificadas de obras de arte;
•Reconhecido pela Carta de Restauração de 1976;
•Teoria aplicada para ARQUITETURA, OBRAS DE ARTE,
SITIOS ARQUEOLÓGICOS, ACERVOS DOCUMENTAIS de
forma ampla;
1. O restauro é ato crítico, dirigido ao reconhecimento da obra de arte (sem o que a restauração não
é o que deve ser); voltado à reconstituição do texto autêntico da obra; atento ao “juízo de valor”
necessário para superar, frente ao problema específico das adições, a dialética das duas instâncias,
a história e a estética.
2. Por tratar de obras de arte, a restauração deve privilegiar a instância estética
3. A obra de arte é entendida na sua totalidade mais ampla, como imagem e como consistência
material
Em geral, entende-se por restauração qualquer intervenção voltada a dar
novamente eficiência a um produto da atividade humana. (...) Mas, quando se
tratar, ao contrário, de obra de arte, mesmo se entre as obras de arte haja
algumas que possuam estruturalmente um objetivo funcional, como as obras de arte
de arquitetura e, em geral, os objetos da chamada arte aplicada, claro estará o
restabelecimento da funcionalidade (...).
Torre Medieval do Castelo de Matrera em Villamartin (2011)

Segundo o arquiteto: "Esta intervenção pretende atingir três objetivos básicos: consolidar estruturalmente os elementos emergentes em risco;
diferenciar a intervenção adicionada ao item original (evitando as reconstruções miméticas que são proibidas por Lei) e recuperar o volume,
textura e tonalidade que tinha a torre originalmente. Sendo, portanto, uma realidade aparentemente antagônica, a essência do projeto não se
destina a ser, portanto, uma imagem do futuro, mas sim um reflexo de seu próprio passado, de sua própria origem ".
Intervenção desastrosa no Arfresco Ecce
Homo, Espanha(2012).
“Pintado na parede de uma igreja em
Borja, na Espanha, o retrato de Jesus
Cristo se tornou viral da internet em
2012, após passar pela “restauração”
da espanhola Cecilia Giménez, uma
idosa local que, com boa vontade,
queria melhorar a pintura desgastada,
mas acabou por transformá-la
completamente”
...na Espanha(2020), foi a vez da
Imaculada Conceição ser vítima de um
profissional de talentos questionáveis.
Segundo conta o The Guardian, um
colecionador de arte em Valência havia
pagado €1,200 (aproximadamente
7000 reais) a um restaurador de móveis
para limpar o quadro A Imaculada
Conceição dos Veneráveis, criado no
século 15 pelo pintor Bartolomé Esteban
Murillo. Porém depois de duas tentativas
de restauração, o resultado ficou bem
longe do original.

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