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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

ESCOLA SUPERIOR DE DESENHO INDUSTRIAL - ESDI


GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO

Amanda Salerno e Marcos Vinicius

Teorias de Restauro - Análise do Restauro da Catedral São Pedro de Alcântara


Conceitos e Teorias de Patrimônio e Restauro - 2023.1
Professora Graça

Petrópolis
2023
SUMÁRIO

1. O QUE É O RESTAURO 3

2. RESTAURO ARQUEOLÓGICO 4

3. RESTAURO ESTILÍSTICO - LE DUC 6

4. RESTAURO ROMÂNTICO - RUSKIN 7

5. RESTAURO CIENTÍFICO - CAMILO BOITO E GUSTAVO GIONONNI 8

6. RESTAURO CRÍTICO - CESARE BRANDI 9

7. ANÁLISE DO RESTAURO DA CATEDRAL SÃO PEDRO DE 12


ALCÂNTARA
1. O QUE É RESTAURO ARQUITETÔNICO
Restauro arquitetônico é o processo de conservação, recuperação e preservação de
edifícios e estruturas arquitetônicas históricas, com o objetivo de manter sua autenticidade, valor
histórico e estético. O restauro arquitetônico busca reverter danos, desgaste e deterioração
sofridos ao longo do tempo, devolvendo ao edifício ou estrutura suas características originais.
O processo de restauro arquitetônico envolve uma série de etapas. Inicialmente, são
realizados estudos históricos e análises detalhadas do edifício ou estrutura, buscando entender
sua história, estilo arquitetônico, materiais originais e eventuais modificações ao longo do tempo.
Essas pesquisas servem de base para o planejamento e execução das intervenções de restauro.
Durante o restauro, podem ser utilizadas técnicas como a limpeza e remoção de camadas
indesejadas, a substituição ou reparo de elementos danificados, a consolidação de estruturas e a
reintegração de elementos faltantes, sempre buscando manter a autenticidade e integridade do
edifício.
É importante ressaltar que o restauro arquitetônico atual deve seguir princípios éticos,
respeitando a autenticidade e a história do edifício, evitando falsificações ou modificações que
descaracterizem o valor histórico. O objetivo é preservar a memória do lugar e proporcionar a
apreciação do patrimônio arquitetônico por gerações futuras.
O restauro arquitetônico pode ser aplicado a diversos tipos de edifícios, como igrejas,
palácios, casas antigas, monumentos históricos e até mesmo bairros ou conjuntos arquitetônicos
inteiros. Cada projeto de restauro é único e requer um estudo minucioso das características
específicas do edifício ou estrutura em questão.
Em resumo, o restauro arquitetônico é o processo de conservação e recuperação de
edifícios e estruturas históricas, visando preservar sua autenticidade e valor histórico. É um
trabalho minucioso que demanda conhecimentos técnicos, históricos e estéticos para garantir a
preservação do patrimônio arquitetônico.
2. RESTAURO ARQUEOLÓGICO
Desde sempre, os seres humanos têm sentido a necessidade de preservar objetos úteis ao
longo do tempo, consertando aqueles que deixaram de cumprir sua função específica. No início,
a prioridade não era a preservação de testemunhos históricos, mas sim a reparação de algo que já
não servia para o propósito original, mesmo que isso exigisse alterações. Originalmente, os
edifícios não eram vistos como bens de valor histórico ou cultural, mas sim como bens úteis ou
representativos da época. Somente nesse caso fazia sentido preservar um edifício ao longo do
tempo.
A atividade de restauro arqueológico tem suas origens nos séculos XVIII e XIX. Até
então, os monumentos passaram por várias ações de conservação, alteração de uso e renovação,
que não podem ser consideradas como restauro nos termos atuais. Assim como a história da
arquitetura evoluiu ao longo dos anos, com mudanças nas técnicas de construção e nos estilos de
concepção e decoração, os edifícios existentes também foram modificados, recebendo novas
fachadas e ornamentações. Os conhecimentos arquitetônicos, instrumentos e técnicas mais
recentes foram aplicados aos edifícios existentes, resultando em edifícios alterados sem
distinguir claramente o presente do passado.
Existem muitos exemplos de monumentos que sofreram modificações ao longo dos anos,
tanto em suas fachadas quanto em seu interior, devido a caprichos de épocas mais modernas. Um
exemplo é o Mosteiro de Alcobaça, que no século XII era um dos primeiros exemplos da arte
gótica em Portugal. Sua fachada original provavelmente era simples, seguindo a norma
cisterciense. No entanto, no século XVIII, foi reconstruída em estilo barroco, com elementos
góticos, manuelinos e de outras influências, como nichos, estátuas e uma varanda sobreposta.
Outras catedrais, como a Sé de Lisboa, a Sé do Porto, a Sé de Viseu e a Sé de Braga, entre outras,
também foram substancialmente modificadas em épocas posteriores, apresentando poucos
vestígios de suas partes originais.
Vale ressaltar que os monumentos mais grandiosos levavam anos e até séculos para serem
construídos, passando por várias fases de construção e alterações de projeto de acordo com os
gostos e ideais dos arquitetos da época e dos caprichos dos reis. O Mosteiro da Batalha, por
exemplo, construído por D. João I e continuado durante o reinado de D. João III, sofreu danos
causados por terremotos, roubos, incêndios e a extinção das ordens religiosas. Somente graças
aos cuidados do Rei consorte D. Fernando II e do Engenheiro Mouzinho de Albuquerque, em
1840, foi possível evitar a perda total do mosteiro. Algumas obras feitas na época são discutíveis
em relação à fidelidade ao original, mas, sem dúvida, evitaram a perda completa.
A restauração posterior ao século XIX foi influenciada por abordagens mais científicas e
sistemáticas. Os princípios de preservação e conservação começaram a ser desenvolvidos,
buscando uma maior autenticidade na recuperação dos edifícios históricos. Surgiram diferentes
teorias e métodos de restauração, cada um com suas próprias diretrizes e critérios.
Um exemplo importante nesse contexto é a Carta de Atenas, elaborada em 1931 durante
o primeiro Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM). Essa carta defendia a
preservação dos monumentos históricos como testemunhos da história, rejeitando a ideia de
alterar ou "falsificar" essas estruturas. A partir desse momento, o conceito de autenticidade
tornou-se fundamental na prática do restauro.
No entanto, ao longo do tempo, surgiram discussões e debates em torno da interpretação
da autenticidade e de como conciliá-la com as necessidades contemporâneas. Muitas vezes, é
necessário encontrar um equilíbrio entre a preservação dos elementos originais e a adaptação do
edifício para uso atual, garantindo sua sobrevivência e relevância.
Além disso, o campo do restauro arqueológico evoluiu com a incorporação de avanços
tecnológicos. As técnicas de escavação, documentação e análise foram aprimoradas, permitindo
uma compreensão mais precisa dos materiais e estruturas originais. A utilização de técnicas não
invasivas, como a fotogrametria e a digitalização em 3D, tem sido cada vez mais comum para
documentar e analisar monumentos antes do início dos trabalhos de restauro.
Em resumo, ao longo da história, a abordagem do restauro arqueológico evoluiu de um
enfoque utilitário para uma preocupação mais ampla com a preservação histórica e cultural. As
práticas e teorias foram se refinando, buscando equilibrar a autenticidade com as necessidades
contemporâneas. A incorporação de avanços tecnológicos também contribuiu para uma melhor
compreensão e conservação dos monumentos. O restauro arqueológico é uma área em constante
evolução, adaptando-se às demandas e desafios do presente, enquanto busca preservar nosso
patrimônio cultural para as gerações futuras.
3. RESTAURO ESTILÍSTICO - LE DUC
Viollet-le-Duc, um arquiteto e restaurador francês do século XIX, foi conhecido por suas
contribuições no campo do restauro arquitetônico. Ele defendia a ideia de que o restauro deveria
restabelecer um edifício em um estado de plenitude, mesmo que esse estado nunca tenha
existido. Viollet-le-Duc realizou diversos trabalhos de restauração, aplicando suas ideias de
forma criativa e, por vezes, fantasiosa. Ele acreditava na reconstrução do monumento,
melhorando suas deficiências e buscando um ideal do estilo original. Suas orientações foram
seguidas em toda a Europa durante os séculos XIX e XX.
Um dos projetos mais emblemáticos de Viollet-le-Duc foi o restauro do Castelo de
Pierrefonds, que foi desmantelado e deixado em ruínas. Ele realizou um minucioso levantamento
das ruínas e reconstruiu a planta original do castelo, além de adicionar elementos e salas novas
de influência romântica. Seu objetivo era devolver ao castelo um estado completo e ideal,
introduzindo diversas alterações em relação ao projeto original.
Viollet-le-Duc também foi autor de obras escritas, sendo seu "Dicionário da Arquitetura
Francesa" uma das mais conhecidas. Nele, ele desenvolveu suas ideias e conceitos sobre o
restauro, defendendo a ideia de que restaurar um edifício não é apenas conservá-lo, repará-lo ou
refazê-lo, mas sim restabelecê-lo em um estado que nunca existiu.
Em resumo, Viollet-le-Duc foi uma figura influente no campo do restauro arquitetônico,
aplicando suas idéias de reconstrução e restituição em vários projetos. Seu trabalho deixou um
legado duradouro, inspirando gerações posteriores de arquitetos e restauradores.
4. RESTAURO ROMÂNTICO - RUSKIN
No mesmo período que Viollet-le-Duc, surgiram na Inglaterra tendências de restauro
arquitetônico mais fatalistas e com ideias opostas, protagonizadas por John Ruskin e William
Morris.
Nesse contexto, o período neogótico floresceu na Inglaterra, com uma ênfase nas formas
góticas que teve um impacto maior do que em outras partes da Europa. Os seguidores desse
movimento consideravam o gótico como um estilo puro e rigoroso, mais do que apenas um estilo
arquitetônico, quase como uma religião.
Nesse mesmo período, os escritos de John Ruskin foram publicados, anteriores ao
dicionário de Viollet-le-Duc, mas expressavam ideias opostas às do arquiteto francês. Ruskin,
que nasceu em 1819 e faleceu em 1900, era um escritor, crítico de arte e sociólogo com uma
paixão pelo desenho e música. Ele valorizava o trabalho dos construtores e artesãos e
considerava as adições de épocas posteriores como "mentiras arquitetônicas", especialmente se
não fossem feitas manualmente. Na época do desenvolvimento industrial, em que a produção em
massa substitui a fabricação manual, Ruskin considerava a produção industrial como falsa. Ele
acreditava que a arquitetura seria mais nobre ao evitar esses métodos falsos. Ruskin influenciou
os movimentos literários que surgiram na Inglaterra no meio do século XIX, que defendiam a
preservação integral das obras do passado. Mais tarde, ele afirmou que o restauro poderia ser
necessário, mas apenas no aspecto estrutural, sem preocupação com os meios utilizados, pois "é
melhor ter uma muleta do que um membro perdido".
O restauro romântico de Ruskin foi uma abordagem contrária à visão de Viollet-le-Duc e
ao movimento neogótico predominante na época.
John Ruskin, escritor, crítico de arte e sociólogo do século XIX, expressou ideias que
enfatizavam a valorização do trabalho dos construtores e artesãos, além de criticar o uso de
adições modernas em intervenções de restauro.
Para Ruskin, as adições de épocas posteriores aos edifícios eram consideradas "mentiras
arquitetônicas", especialmente se fossem produzidas industrialmente. Ele via a produção
industrial como falsa e acreditava que a arquitetura seria mais nobre ao evitar esses métodos
falsos.
Ruskin defendia a preservação integral das obras do passado e manifestou a ideia de que
o restauro poderia ser necessário, mas apenas no aspecto estrutural, sem se preocupar com os
meios utilizados. Ele acreditava que era preferível ter uma "muleta" (ou seja, uma intervenção
estrutural) do que perder um elemento original.
As ideias de Ruskin tiveram influência significativa no movimento literário e artístico da
época, e seu pensamento foi difundido por seguidores como William Morris. Essas ideias deram
origem a uma abordagem romântica e crítica em relação ao restauro arquitetônico, que buscava
preservar a autenticidade das obras do passado e se opunha às modificações modernas.
Outro seguidor de Ruskin, William Morris, político e crítico de arte, nasceu em 1834 e
estudou teologia na Universidade de Oxford. Ele iniciou o movimento Arts and Crafts, apoiado
inicialmente por Pugin e Ruskin, que buscava preservar as características das atividades
artesanais e da arquitetura tradicional, enfatizando a importância do trabalho manual e se opondo
à produção em massa da industrialização. Em março de 1877, Morris fundou em Londres a
Society for the Protection of Ancient Buildings, que reuniu literatos, artistas, arquitetos e pessoas
cultas. A sociedade apoiava as ideias de Ruskin sobre a conservação de monumentos,
defendendo sua manutenção contínua para evitar futuros restauros. Seus membros denunciaram
intervenções realizadas em monumentos na Europa e se opuseram aos planos de restauro da
época. Isso levou à formação do chamado Movimento Anti-Restauro na Inglaterra.
5. RESTAURO CIENTÍFICO - CAMILO BOITO E GUSTAVO GIOVANONNI
No final do século XIX e início do século XX, uma nova geração de arquitetos surge,
preocupada com o conceito de restauro e defesa da conservação e reparação dos monumentos,
com o objetivo de preservar seus valores históricos e artísticos. Essa abordagem, conhecida
como restauro científico, baseou-se nos princípios estabelecidos pelo arquiteto italiano Camillo
Boito e surgiu como uma reação às ideias de Viollet-le-Duc e à abordagem passiva de Ruskin e
Morris.
Camillo Boito, nascido em Roma em 1836, era um estudioso das culturas europeias e das
teorias arquitetônicas francesas e inglesas da época. Ele estudou música, literatura e belas artes, e
posteriormente se tornou professor de arquitetura, dedicando-se à renovação do estudo da
arquitetura, desenho e restauração. Boito admirava as obras de Viollet-le-Duc, mas tinha uma
visão diferente sobre as intervenções de restauro.
Boito se opunha às conclusões das obras inacabadas, defendendo a preservação de todas
as partes do monumento, inclusive as adições de épocas posteriores, que testemunharam a
história do edifício. Ele acreditava que o valor histórico dessas adições era de extrema
importância e que as intervenções de restauro deveriam ser realizadas apenas quando necessário.
Boito propunha que as obras de restauração fossem distintamente diferenciadas das partes
antigas e que a diferença entre os materiais modernos e os originais fosse visível.
Essa nova perspectiva de restauro foi resumida em princípios apresentados por Boito no
III Congresso de Arquitetos e Engenheiros Civis em Roma, em 1883, e gradualmente adotada em
toda a Europa. O governo italiano estabeleceu leis para a conservação de monumentos e objetos
de antiguidade e arte, seguindo as normas e conselhos estabelecidos por Boito. Esses princípios
incluíam a limitação das intervenções ao mínimo necessário, a distinção clara entre partes antigas
e novas, a identificação dos materiais utilizados e a exposição das partes eliminadas próximas ao
monumento restaurado. Também era recomendado o registro fotográfico das diferentes fases do
trabalho e a marcação da data das intervenções no edifício.
Os princípios estabelecidos por Boito serviram de base para teorias mais modernas de
restauro, que foram adaptadas e aprimoradas por seus seguidores e alunos. Na Espanha,
Leopoldo Torres seguiu seu exemplo ao intervir no Alhambra em Granada, enquanto na França,
Paul Léon foi influenciado por suas ideias. Na Itália, destacam-se Luca Beltrami e Gustavo
Giovannoni. Beltrami, aluno de Boito, colocou em prática suas teorias com alguns ajustes,
enfatizando a reconstrução baseada em desenhos, plantas e histórias, evitando inovações e
falsificações estilísticas.
Boito enunciou sete princípios fundamentais para a intervenção em monumentos
históricos:
[...] ênfase no valor documental dos monumentos, que deveriam ser preferencialmente
consolidados a reparados e reparados a restaurados; evitar acréscimos e renovações, que,
se fossem necessários, deveriam ter caráter diverso do original, mas não poderiam destoar
do conjunto; os completamentos de partes deterioradas ou faltantes deveriam, mesmo se
seguissem a forma primitiva, ser de material diverso ou ter incisa a data de sua
restauração ou, ainda, no caso das restaurações arqueológicas, ter formas simplificadas;
as obras de consolidação deveriam limitar-se ao estritamente necessário, evitando-se a
perda dos elementos característicos ou, mesmo, pitorescos; respeitar as várias fases do
monumento, sendo a remoção de elementos somente admitida se tivessem qualidade
artística manifestamente inferior à do edifício; registrar as obras, apontando-se a utilidade
da fotografia para documentar a fase antes, durante e depois da intervenção, devendo o
material ser acompanhado de descrições e justificativas e encaminhadas ao Ministério da
Educação; colocar lápide com inscrições para apontar a data e as obras de restauro
realizadas (BOITO, 2003, p. 21).
Gustavo Giovannoni, nascido em 1873 em Roma, marcou o restauro da primeira metade
do século XX. Além de arquiteto e restaurador, ele também era historiador, urbanista e crítico de
arquitetura. Giovannoni deu importância especial ao urbanismo, considerando-o um
complemento social, e defendeu a recuperação de casas e ruas, com regras para sobre-elevações,
descontinuidades e mudanças de volume. Ele era contra as adições que falsificavam os
monumentos e, caso fossem necessários, defendia que fossem identificados e datados, utilizando
materiais modernos que se harmonizassem com os originais. Giovannoni também valorizava a
estrutura, os materiais de construção e as técnicas construtivas, buscando utilizar técnicas
modernas, como o concreto armado, para a consolidação, reparação e reforço das construções.
Embora o método do restauro científico seja baseado em conceitos rigorosos, nem
sempre foi bem-sucedido, muitas vezes devido à falta de experiência na interpretação dos dados
históricos ou à insuficiência desses mesmos dados. No entanto, as contribuições de Camillo
Boito e seus seguidores influenciaram o campo do restauro arquitetônico e serviram como base
para as teorias e práticas atuais nessa área.
6. RESTAURO CRÍTICO - CESARE BRAND
Cesare Brandi (1906-1988) foi um dos principais teóricos da restauração do século XX.
Seu livro, intitulado "Teoria da Restauração", foi publicado em 1963 e fundamentou a redação da
Carta do Restauro Italiana em 1972, bem como uma abordagem conhecida como "restauro
crítico". Brandi esclareceu uma série de conceitos e procedimentos próprios ao ato de
restauração, visando evitar a subjetividade e arbitrariedade que frequentemente acompanham a
prática.
O restauro de Brandi se baseia em três princípios, que buscam respeitar e cuidar das
obras, sendo eles:
● Restaura-se somente o objeto artístico: Sem cometer falsos artísticos
● Distinguibilidade: As partes restauradas devem ser diferentes das originais
● Mínima Intervenção: Deve-se respeitar a obra, intervindo o menos possível
De acordo com Brandi, a restauração constitui o momento metodológico de
reconhecimento da obra de arte em sua consistência física e em sua dupla polaridade estética e
histórica, com o objetivo de transmiti-la para o futuro. Ele acreditava que a manutenção dos usos
originais de um edifício é uma forma de garantir sua conservação e evitar que se torne ruínas,
como no caso das igrejas católicas. Em outros casos, porém, o uso original pode não ser mantido,
mas o edifício pode ser adaptado a novas funções desde que sejam compatíveis com sua
arquitetura.
A teoria de Brandi se aplica principalmente a obras de arte visuais, como pintura e
escultura, mas também tem sido aplicada recentemente ao campo da arquitetura. Na perspectiva
de Brandi, a obra de arte é entendida como o "produto da atividade humana" sobre o qual
convergem os aspectos estéticos e históricos. A restauração, por sua vez, não deve interferir em
nada além de sua própria materialidade. Os restauradores devem evitar o erro de alterar a
essência da obra de arte, criando assim uma falsa narrativa histórica ou apagando as marcas do
tempo na peça. Portanto, o único objeto de intervenção deve ser o material da obra de arte,
representado no "tempo e lugar da intervenção de restauração".
Para distinguir entre a imagem artística e o material a ser restaurado, Brandi introduziu
dois conceitos fundamentais: aspecto e estrutura. O aspecto refere-se à imagem da obra de arte,
como uma pintura, enquanto a estrutura representa o suporte subjacente, como uma placa de
madeira, tela ou parede. No entanto, no caso de uma escultura em mármore, essa distinção não é
possível.
A teoria de Brandi desperta um interesse particular ao abordar o debate sobre falsas
narrativas históricas. Ele apresenta o exemplo de um restaurador que encontra a pedreira de onde
foi extraído o mármore utilizado na construção de um monumento, destacando que isso não é
suficiente para restaurá-lo. Embora a matéria-prima seja a mesma, uma vez que tenha sido
transformada em obra de arte, cabe aos restauradores interferir nela apenas o necessário.
Nesse contexto, surge o conceito de anastilose, que consiste na recomposição das partes
existentes de um monumento, seja artístico ou arquitetônico, de forma que seja possível
distinguir claramente o que é a matéria original e o que foi restaurado. Essa prática busca a
reunião dos fragmentos da obra para restabelecer sua unidade. A partir desse conceito, surge o
mais importante dos conceitos de Brandi, o da Unidade Potencial da obra de arte.
7. ANÁLISE DA OBRA DE RESTAURO DA CATEDRAL SÃO PEDRO DE
ALCÂNTARA - PETRÓPOLIS
A Catedral Imperial foi tombada pelo Iphan em 1980. O tombamento da igreja é uma
extensão da proteção conferida, desde 1964, à Avenida Köeler, inscrita no Livro do Tombo
Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico.
O restauro da Catedral de São Pedro de Alcântara é um importante projeto de preservação
e conservação desse icônico monumento religioso. Localizada em Petrópolis, no estado do Rio
de Janeiro, a catedral é um exemplo significativo da arquitetura neogótica brasileira.
O processo de restauro da catedral envolveu a recuperação e reparação de elementos
estruturais, como torres, fachadas, telhados e vitrais, além da restauração de elementos
decorativos, como esculturas e relevos, isso aliado ao acréscimo de elementos facilitadores de
acessibilidade.
A equipe responsável pelo restauro seguiu diretrizes baseadas em estudos históricos e
arquitetônicos, visando preservar a autenticidade e a integridade do edifício, além de torná-lo
mais acessível e democrático.
Durante o processo de restauro, foram utilizadas técnicas e materiais adequados,
respeitando as características originais da construção. Além disso, foram aplicadas medidas de
conservação preventiva para garantir a sustentabilidade e a durabilidade dos elementos
restaurados e acrescentados.
O restauro da Catedral de São Pedro de Alcântara teve como objetivo principal devolver
ao monumento sua beleza original, além de garantir sua segurança estrutural e sua preservação
para as futuras gerações. Essa intervenção permitiu que a catedral continuasse a desempenhar seu
papel como local de culto religioso e também como importante atração turística e cultural na
região.
Neste sentido, podemos classificar esta obra de restauro como científica com técnicas de
adição, e moderna. Tal classificação se dá devido às características que podemos observar ao
tratar o restauro com cuidado. Para que a catedral continue a compor a paisagem de Petrópolis
por muito tempo, foi realizada uma intervenção essencial para garantir a segurança do imóvel: o
reforço estrutural da Catedral e do muro em frente à igreja.
Catedral no início do Restauro. Via Jornal Hoje.
Também foram realizadas a restauração e limpeza das laterais do templo, assim como o
restauro da maioria das portas. Já a recuperação do telhado teve entre seus trâmites sua limpeza e
recuperação de partes desgastadas pelo tempo.

Seguindo o curso natural da restauração científica, foi realizada a limpeza do Mausoléu

da Família Imperial, o restauro da porta central, bem como a limpeza e restauro da parte de trás

da Catedral e da lateral localizada na Rua Ipiranga. Neste sentido ainda foram executados a

revitalização do jardim, a conclusão das calçadas, o restauro dos sinos e a finalização da rede

elétrica.
Imagens do Processo de Restauro. Incluindo o paisagismo do entorno. Via: Tribuna de Petrópolis.
Ao se tratar do restauro moderno, podemos elencar características que foram adicionadas
para que a obra passasse a se encaixar no tempo atual, conferindo a ela novos elementos, mas
que a colocam como um ponto turístico acessível e moderno, neste sentido, podemos citar o
acréscimo de rampas de acesso, corrimão, e um reforço estrutural eficiente.

Catedral em 2013 e Catedral atualmente. Via: Google Maps.


Por fim, concluindo a análise deste restauro, percebemos diversas características tanto do
restauro científico, como do restauro moderno, sendo elas:
● Ênfase no valor documental: A obra foi baseada no estudo de documentos e fotos
catalogadas no acervo da Catedral, de forma que a fidelidade da obra fosse mantida;
● Evitar acréscimos e renovações e se fossem necessários, deveriam ter caráter diverso do
original, mas não poderiam destoar do conjunto: Como pode ser observado nos
acréscimos feitos na rampa de acessibilidade;
● Registrar a obra, apontando-se a utilidade da fotografia para documentar a fase antes,
durante e depois da intervenção: O que pode ser observado através do processo de
restauração, e toda a documentação produzida.
● Atualizar-se ao tempo atual: Mesmo que respeitando as diretrizes do restauro moderno, a
edificação tombada pode se atualizar, como foi o caso da Catedral, em relação às
melhorias de acessibilidade e infraestrutura.
REFERÊNCIAS

drops 121.07 patrimônio: Desafios do restauro moderno | vitruvius. Disponível em:


<https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/18.121/6735>. Acesso em: 01 jul. 2023.

BENEVOLO, L. História da arquitetura moderna. 5.ed. São Paulo: Perspectiva, 2016.

BRANDI, C. Teoria da restauração. Cotia: Ateliê editorial, 2004.

_______. Teoria del restauro. Torino: Giulio Einaudi Editore. 1977.

CARBONARA, G. Brandi e a restauração arquitetônica hoje, Desígnio, n. 6, p. 35-47. 2006.

CHOAY, F. Alegoria do Patrimônio. 4ed.São Paulo: Unesp, 2006.

VIOLLET-LE-DUC, E. E. Restauração. Tradução: Beatriz Mugayar Kühl. Cotia, SP: Ateliê


Editorial, 2006.

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