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Colecionismo e Restauração:

Desafios ao decorrer dos


séculos
Gabriela Oliveira

Resumo: Ao longo dos séculos ocorreram inúmeros problemas em questão a


restauração e a conservação, como o descaso em relação a certos tipos de
obras, historiadores e artistas com estudos e técnicas divergentes.
As depredações a diversos monumentos como forma de protestos contra a
nobreza e clero após a Revolução Francesa, no séc. XIX, como continuou a
luta pela preservação da história.

Palavras-chave: Revolução Francesa. Restauração. Séc. XX. Medievais.


Monumentos.

Abstract: Over the centuries, there have been numerous problems related to
restoration and conservation, such as the neglect of certain types of works,
historians and artists with divergent studies and techniques.
The depredations of several monuments as a form of protest against the
nobility and clergy after the French Revolution, in the 19th century. XIX, as the
fight for the preservation of history continued

Keywords: French Revolution. Restoration. Century XX. Medieval. Monuments.

Introdução: Podemos usar várias visualizações para o colecionismo


(negativas ou positivas). Ao longo da História o colecionismo várias vezes foi
visto como ato individualista, assim como bens privados, que
desafortunadamente impede várias pessoas de ter acesso a cultura. Como é
mostrado na citação de “O Colecionador” de Walter Benjamin:
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Colecionar é uma forma de recordação prática, e de todas as manifestações profanas da


proximidade, a mais resumida. Portanto, o ato mais diminuto de reflexão política faz, de certa
maneira, época no comércio antiquário.

(BENJAMIN, apud FRONER, 2015, p.4)

Deste mesmo modo, no ato de colecionar se torna explicito que há movimento


da obra no tempo e um distanciamento de sua história no momento em que
deixa de ser algo de um espaço público, para poder fazer parte de um acervo
privado. Muitas vezes o valor capital de um patrimônio afeta nesse meio, por
motivos de grande procura. Todavia, um valor capital de um acervo pode se
tornar um privilégio para as entidades públicas terem mais cuidado ao
manusear e cobrir qualquer dano que futuramente possa ocorrer ao objeto em
questão.
O capital financeiro gerado na primeira metade do séc. XX chega com um novo
modo de colecionismo, que a partir daí começa a ter mais olhos voltados ao
público e ao setor cultural.

Restauração após a Revolução Francesa e


durante o séc. XIX
O período da Revolução Francesa foi de grande abalo para as obras de arte,
que foram movidos por saques e destruições com o intuito de abolir os
símbolos das antigas classes dominantes, como a nobreza e clero.
O estilo de arte mais afetado foi o medieval, que estava ameaçado a ser
apartado da França, e com isso trouxe uma atenção especial de um Estado
para criar uma legislação sob tutela dos monumentos históricos afetados.
Vários relatórios que foram apresentados por Abade Henri Grégoire (1750-
1831) ao Comitê de Instrução Pública na Convenção em 1793 e 1794, foram
muito valiosos pois a partir daí foi elaborado um decreto para evitar abusos
e cidadãos foram convidados a vigilância contra os ataques e instituíram
penas para os criminosos que cometiam tais atrocidades aos patrimônios.
Por mais que essas ações francesas não terem sido suficientes para parar
totalmente as destruições, o Estado mostrou uma grande preocupação da
Era Moderna e reconheceram as obras de valor histórico como interesse
público, e a ter sua participação na restauração e preservação
Havia várias ameaças de outros países para invasão do território, por que o
ato de preservar esses bens era considerado um ato antirrevolucionário,
então devido as circunstâncias do momento, as restaurações foram
interrompidas e várias obras foram salvas de depósitos.
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Com toda essa balbúrdia obras foram transferidas da França e também da


Itália. Quatremère de Quincy (1755-1849) foi totalmente contra esse
deslocamento levantando a questão de descontextualização das obras de
arte no ambiente. Para ele, esse deslocamento de obras é o mesmo que
ignorar o conhecimento, pois o estudo de uma obra só pode ser concluído
no ambiente no qual foi criada. Obras espalhadas tornariam os estudos
incompletos, não teria como transportar todos os objetos de uma obra
juntos.

“Dividir é destruir”

(QUATREMÈRE DE QUINCY, 1996, p. 100)


Outro estilo de arte bastante incompreendido foi o estio de arquitetura
Gótica, pois suas origens eram desconhecidas, acreditavam ser uma arte
estrangeira e resultados de invasões que teria relação ao classicismo, que
voltaria mais tarde com o Renascimento. O gótico também foi relacionado a
uma manifestação em oposição à arquitetura acadêmica, a participação de
literatos e intelectuais foi de grande importância para o estudo da arte
gótica, como por exemplo Victor Hugo (1802-1885). Ele tinha bastante
interesse pela arquitetura e condenava as depredações das igrejas
medievais, como por exemplo a igreja Notre-Dame de Paris. Continuavam
os esforços para manter a proteção das obras de arte, e mesmo com
estudos negavam que monumentos góticos foram da história de seu país.
Ludovic Vitet (1802-1873) foi de grande importância como historiador e
crítico da arte, foi nomeado como inspetor Gera dos Monumentos
Históricos, que tinha como objetivo a elaboração do inventario dos
monumentos franceses. Ele fez várias viagens em busca dos edifícios
medievais esquecidos, criou pesquisas e relatórios que geraram grande
repercussão, como por exemplo formação de profissionais incapazes de
atuar em restaurações. Vitet ressaltava que era necessário uma base bem
detalhada de estudos e que qualquer dedução deveria ser analisada com
uma enorme cautela para não piorar ainda mais o estado da obra, como
demonstra a citação de Augustin Charles
d´Aviler (1653-1700):
Restauração; é o refazimento de todas as partes de um edifício degradado &
deteriorado
por defeitos de construção ou pela sucessão do tempo, de modo a que ele seja
reconduzido
à sua forma primitiva, & mesmo aumentado consideravelmente, como aquela que o
Rei
mandou fazer no velho castelo de S. Germain en Laye construído por Francisco I.
Restaurar; é restabelecer um edifício, ou reconduzir ao seu estado primitivo uma
figura
mutilada. A maior parte das estátuas antigas foram restauradas, como o Hércules de
Farnese, o Fauno de Borghese em Roma, os Lutadores da galeria do grão-duque de
Florença, a Vênus de Arles que está na Galeria do Rei em Versalhes; & essas
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restaurações
foram feitas pelos mais hábeis escultores
(D´AVILER, 1710, v. 2, p. 836)

Quatremère de Quincy disse que várias vezes abusou da arte de restaurar,


como por exemplo não apenas restaurar, mas construir uma obra a partir
de apenas um fragmento. Naquela época uma lenta mudança ocorria no
restauro, o excessivo respeito sempre pelo original, que várias vezes não
foi respeitado nesse período. Vitet achava desnecessário as correções de
partes irregulares ou incompletas, pois eram parte da história e do tempo
da obra.
Seguindo em frente na história, Viollet-le-Duc (1814-79) foi um estudioso
com vários talentos que ensaiava os primeiros passos no restauro. Apesar
da falta de prática ele foi um ótimo restaurador e seus métodos são usados
até hoje. Viollet participou da restauração de Notre-Dame com ótimas
propostas de intervenção e seus princípios. Várias obras enfrentavam
problemas os decorrer do séc. XIX, ainda arruinadas pelas destruições na
época da Revolução, também pela falta de conhecimentos dos materiais
usados que não tinham boa durabilidade além da falta de ajuda de algumas
ciências. Levando a destruição em caos extremos de partes de construções
que estavam ruindo na primeira metade do séc. Muitas igrejas tiveram um
uso indevido, usadas como armazém, transformadas em industrias,
estábulos etc. O governo estava mais concentrado na cidade e poucos
monumentos foram tombados devido à falta de meios para resolução.

Considerações Finais
Muitas lutas ocorreram desde então, trazendo também transformações
essenciais para a história da restauração como a importância da
documentação que começou a se firmar em meados do séc. XX.
Analisando todo esse contexto, podemos observar a luta pelo bem da
preservação e da história da arte ao decorrer dos séculos, todo o preconceito
e falta de interesse em algo tão importante.
Nos dias atuais, ainda ocorrem lutas para mostrar a importância da profissão
que infelizmente não é valorizada como deveria.
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Referências
FRONER, YA. Coleção e arquivo como prática coletiva: a narrativa, a retórica e
o semiológico. In: PO¿S, V.5, n.9, maio/2015. Disponível em:
https://www.eba.ufmg.br/revistapos/index.php/pos/article/view /262

KÜHL, Beatriz M. A restauração de monumentos históricos na França após a


Revolução Francesa e durante o século XIX: um período crucial para o
amadurecimento teórico, Revista CPC, 2006, v.1, n. 3, pp. 110-144
(www.usp/cpc/v1)

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