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HISTÓRIA DA

ARQUITETURA E
URBANISMO V (IDADE
CONTEMPORÂNEA)

Jana Cândida Castro dos Santos


O Neoclassicismo e o
surgimento do Historicismo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Descrever o Neoclassicismo.
„„ Explicar os ideais do Historicismo.
„„ Reconhecer obras arquitetônicas da época.

Introdução
O Neoclassicismo foi um movimento marcado pelo racionalismo, e suas
criações buscavam harmonia e beleza, baseando-se especialmente em
modelos greco-romanos. Na arquitetura neoclássica eram repetidas com
precisão as proporções da antiguidade clássica, vistas como ideais para a
construção de um edifício. O Historicismo, por sua vez, buscou enfatizar
a apropriação de arquiteturas muito diferentes em termos históricos e
geográficos, abrindo caminho para o desenvolvimento do futuro espírito
eclético.
Neste capítulo, você verá a descrição do Neoclassicismo e a explicação
dos ideais do Historicismo, a fim de reconhecer as principais produções
arquitetônicas da época.

Neoclassicismo
O Neoclassicismo surgiu em meio à emergência do Iluminismo e seus anos
produtivos. Eles se tornaram, até certo ponto, sinônimos. Para Alonso Pereira
(2010, p. 182), o Iluminismo, a partir de precedentes da filosofia racionalista e
empírica do século XVII, propôs uma revisão de toda a ordem política, social
2 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

e econômica que existia, pois enxergava na razão e na experimentação meios


de se criar “[...] um novo estado, uma nova sociedade e uma nova ciência”.
O Iluminismo do século XVIII, que pregava o empirismo científico, junto com
“[...] a crescente secularização, o surgimento do pensamento democrático e a
Revolução Industrial que o acompanhou” contribuíram para a aurora da era
moderna, como revelam Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 419).
Além de partilhar do espírito de reforma do Iluminismo, o Neoclassicismo
relacionava-se também com o Eurocentrismo, que via o patrimônio europeu como
fundamental para a história da civilização. E ainda que em sua origem fosse um
movimento abrangente, incluindo todas as artes e ciências humanas, o movimento
Neoclássico já estava quase extinto em meados do século XIX, exceto na arquite-
tura, onde perdurou até o século XX, segundo Ching, Jarzombek e Prakash (2019).

Retorno à Antiguidade
Em meados do século XVIII, um novo interesse pelas edificações da antigui-
dade foi desenvolvido pela elite artística da Europa. Os artistas e arquitetos
neoclássicos buscavam uma “[...] compreensão exata dos edifícios antigos e
das obras de arte do passado” (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011,
p. 402). Durante este século foram publicados desenhos de edificações e ruínas
antigas, aumentando consideravelmente a profusão de informações sobre a
arquitetura histórica. Além do interesse pelas civilizações grega e romana,
o mundo egípcio também despertou interesse popular.

Escavações e novas publicações


A obra The ruins of Paestum, publicada em 1768 por Thomas Major, revelou exemplos de
dimensões de templos da Grécia arcaica, contribuindo com o crescente conhecimento
sobre a arquitetura grega. James Stuart e Nicholas Revett, em 1762, começaram a
publicar Antiquities of Athens, uma série de quatro volumes concluída posteriormente
por terceiros. Já os livros Ruins of Palmyra (1735) e Ruins of Baalbec (1757), de Robert
Wood, documentaram os assentamentos romanos próximos ao Mediterrâneo. Em 1778,
o francês Charles-Louis Clérisseau publicou Antiquities of Nîmes. Voyage dans la base
et la haute Egpte pendant les campagnes du Général Bonaparte (1807) e os 20 volumes
de Descriptions de l’Egypte (1809–1822) foram publicados por Barão Dominique Vivant
Denon — despertando interesse por tudo que era egípcio, entre outras publicações
importantes (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011).
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 3

A partir do acervo de informações históricas documentadas nos desenhos


das edificações antigas, os arquitetos puderam aumentar seu repertório de
estilos artísticos. As publicações do século XVIII proporcionaram uma liber-
dade de projeto que mais tarde culminou no Ecletismo do século XIX, como
ressaltam os autores citados.

Edifícios públicos e arquitetos franceses


No século XVIII grande parte dos arquitetos franceses trabalhava a serviço
do governo, e por isso concebiam edificações públicas com o objetivo de
exaltar o Estado. Neste contexto se faz necessário ressaltar dois escritores
influentes do período.

„„ J. F. Blondel — Arquiteto, teórico e professor. Em seu livro Cours


d’architecture (1771-77), a partir de suas anotações de aulas, expôs
suas ideias sobre arquitetura. Blondel em seu texto discute os elementos
essenciais para uma boa arquitetura e a hierarquia das edificações.
A seu ver tanto o arranjo da planta baixa como a composição da fa-
chada deviam ser regidos pelos conceitos de ordennance (disposição),
convenance (conveniência) e bienséance (costume).
„„ Marc-Antoine Laugier — Na obra Essai sur l’architecture, defende que
toda arquitetura de valor deveria remontar à cabana primitiva, pois esta
era uma edificação inteiramente racional. O protótipo pré-histórico
era composto por colunas, lintéis ou entablamentos e um telhado em
vertente ou frontão.

A igreja de Santa Genoveva (1757–1790), projeto de Jacques-Germain


Soufflot (1713–1780), é um exemplo dessas edificações públicas. Soufflot, ao
se aproximar do argumento de Laugier, viu uma oportunidade de experimentar.
A igreja que inicialmente foi dedicada à Santa padroeira de Paris, assumiu
depois uma função laica, sendo hoje chamada de Panthéon. Nele são abrigados
os restos mortais de importantes personagens da história francesa (PROENÇA,
2009). Entre suas características podemos apontar a planta centralizada em
cruz grega (aspiração renascentista), o frontão neoclássico bem marcado
(influência de Laugier), com seis colunas em vez de oito, e capitéis coríntios
(inspiração no Panteon romano).
4 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

No interior da Igreja, Soufflot aderiu às ideias de Laugier, que evocavam


uma arquitetura que apresentasse somente elementos que se justificassem
estruturalmente. Assim, no lugar de pilares tradicionais com pilastras e arcos,
colocou arcobotantes disfarçados para estabilizar a cúpula, segundo Fazio,
Moffett e Wodehouse (2011). Na Figura 1, vemos a planta baixa e o interior
do Panthéon, em Paris.

Figura 1. Planta baixa e interior do Panthéon, planejado por Jacques-Germain Soufflot,


em Paris (1757–1790).
Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 410).

Outra obra que podemos citar é o Petit Trianon (1761–1764) de Ange-


-Jacques Gabriel (1698–1782), no complexo de Versalhes, a residência que
pode ser vista na Figura 2. A fachada principal da edificação se apresenta
tripartite, com base rusticada, pilastras coríntias e balaustrada proeminente,
ainda que similar a algumas vilas palladianas inglesas (FAZIO; MOFFETT;
WODEHOUSE, 2011).
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 5

Figura 2. Petit Trianon (1761–1764), de Ange-Jacques Gabriel, em Versalhes.


Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 411).

O ensino da arquitetura na França


Um dos primeiros países da Europa a criar escolas de arquitetura foi a França, com
um ensino de projeto bastante organizado e com base em um corpo codificado
de teoria da arquitetura. Entre seus professores-teóricos mais influentes estava J.
F Blondel, que, com seu Cours d’architecture, lançou princípios arquitetônicos que
respondiam ao ordenamento hierárquico da sociedade. O sistema francês de ensino
de arquitetura evoluiu e se tornou a École des Beaux-Arts, onde os alunos aprendiam
por meio do esquisse (partido de projeto) e do project rendu, um projeto de edificação
totalmente desenvolvido que era executado ao longo de meses (FAZIO; MOFFETT;
WODEHOUSE, 2011).
6 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

Conclusões sobre o Neoclassicismo


O século XVIII testemunhou o surgimento do Iluminismo, que marcou o
início de um período de incertezas devido a questionamentos e descobertas
pautados pela razão. Cientistas e matemáticos deram início a conquistas
modernas em seus campos; filósofos propuseram formas racionais de go-
verno, enquanto arqueólogos e exploradores trouxeram novas informações
das civilizações antigas, novos aparelhos e máquinas surgiram de modo “[...]
a transformar a indústria, o comércio e o transporte”, como colocam Fazio,
Moffett e Wodehouse (2011, p. 399). A partir da compreensão das conquistas
da arquitetura do mundo ocidental, passou-se a valorizar civilizações como a
Grécia e a Roma Antigas. O século XVIII, marcado pelo início da Revolução
Industrial, assistiu ao nascimento do Neoclassicismo.
As criações neoclássicas eram baseadas nos modelos clássicos do passado
greco-romano. Se por um lado o ideal de beleza trouxe a perfeição e a objeti-
vidade das linhas acadêmicas, limitou a imaginação de seus artistas por outro,
já que deviam seguir modelos pré-determinados. Para Mattos (2003), foram
realizados estudos da Antiguidade clássica, para que os prédios seguissem
as proporções ideais para uma construção e neste período foram repetidas
com precisão.

Historicismos do século XIX


A passagem pelo Neoclassicismo mostra que o mesmo procedimento utilizado
neste período, o de recorrer à história da Antiguidade clássica como material
de projeto, também é aplicável a repertórios extraídos de outros períodos.
Com isso, o estilo próprio do século XIX nos conduz a diversos historicismos
e sucessivos revivals. Talvez essa seja uma das características mais repre-
sentativas do século XIX, onde o aparecimento de uma cultura historicista
enfatiza a apropriação de arquiteturas muito diferentes, tanto geográficas
como historicamente dispersas (ALONSO PEREIRA, 2010).
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 7

Desse modo, notamos a dissociação entre a linguagem e a composição


arquitetônica, porque neste período o conceito de estilo se desloca de algo
quase universal para uma forma decorativa, passível de ser aplicada a um
esqueleto genérico. Nesse sentido podemos citar o projeto do Parlamento de
Londres (1836–1867), concebido por Charles Barry (1795–1860) e Augustos
W. N. Pugin (1812–1852), e considerado um dos melhores e mais acadêmicos
exemplares britânicos, resultado de um concurso.

Figura 3. Parlamento de Londres e Big Ben, projeto de Charles Barry e Augustos W. N. Pugin.

A linguagem clássica do edifício se apresenta através da organização


compositiva dos espaços internos, volumes e massas da edificação, enquanto
que, externamente, é revestido por formas neogóticas. Para Alonso Pereira
(2010), além de um dos exemplos mais típicos de Historicismo medieval no
século XIX, esse edifício também é um ótimo exemplo de composição clássica
romântica. O que nos evidencia a clara separação entre composição e estilo,
marca da arquitetura do século XIX.
8 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

A difusão do Historicismo medieval elegeu o gótico — com alguma de-


rivação românica ou bizantina — como a modalidade natural da arquitetura
eclesiástica. Como bons exemplos temos as catedrais burguesas, entre elas as
construídas em Paris, Londres, a de São Patrício em Nova York (Figura 4) e a
Votiva em Viena, além das quatro grandes catedrais espanholas da restauração.
Essa “[...] onda de expansão dá um auge inusitado à construção de edifícios
religiosos neogóticos na Europa e na América, a qual deseja identificar com
seus novos templos a nova espiritualidade religiosa do século XIX” (ALONSO
PEREIRA, 2010, p. 198).

Figura 4. Catedral de São Patrício, Nova York.

Deve-se ressaltar que Eugène-Emmanuel Viollet-le-Duc (1814–1879) foi


o principal proponente do Historicismo Gótico, interessado no racionalismo
construtivo da arquitetura gótica. Segundo Fazio, Moffett e Wodehouse (2011,
p. 432), ele “[...] considerava o sistema de abóboda nervurada, arco ogival e
arcobotante como sendo análogo à estrutura independente de ferro do século
XIX, e sonhava com uma arquitetura moderna baseada nas conquistas da
engenharia, mas que exibisse a integridade de forma e detalhe presente nas
obras da Idade Média”. Por isso, tanto em seus trabalhos de restauração como
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 9

em suas teorias e projetos ideais, ressaltava a importância da racionalidade.


Na Figura 5, a seguir, vemos um projeto de auditório de Eugène-Emmanuel
Viollet-le-Duc.

Figura 5. Projeto de Eugène-Emmanuel Viollet-le-Duc — auditório


com estrutura de ferro extraído de Entretiens (1863–1872). Viollet-
-le-Duc teve mais sucesso como teórico do que como arquiteto
praticante. Interpretando a estrutura gótica como uma resposta
extremamente racional ao problema das cargas e dos apoios, propôs
a substituição dos elementos de ferro como uso lógico dos produtos
da Revolução Industrial.
Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 432).
10 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

Embora os projetos de sua autoria para novas edificações não sejam notá-
veis, as teorias de Viollet-le-Duc tiveram um grande impacto no desenvolvi-
mento do racionalismo do século XIX e do Modernismo do século XX, como
evidenciam Fazio, Moffett e Wodehouse (2011).
Pode-se dizer que todo esse repertório historicista, urbano e burguês, tem
no Ring de Viena (a partir de 1859) um grande exemplo (Figura 6). O conjunto
de seus edifícios gregos, góticos e renascentistas movimenta-se quase pelo
Ecletismo. Entre eles estão o Parlamento, a Prefeitura, a Ópera, os Museus de
História Natural e de Belas Artes, a ampliação do Palácio Imperial — obras
de Semper.

Figura 6. Ring de Viena (a partir de 1859).


Fonte: Alonso Pereira (2010, p. 199).

Para Alonso Pereira (2010, p. 199), esta obra se configura “[...] como um
anel urbano concebido como assento das principais amenidades e equipamentos
da capital da Áustria e paradigma da arquitetura historicista europeia”.
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 11

Conclusões sobre o Historicismo


O Historicismo tanto reproduzia os modelos do passado e recriava a história,
como revitalizava as produções arquitetônicas. E, diferentemente do Ecle-
tismo, que vem a se desenvolver em seguida, o Historicismo buscou reviver
um passado e construiu representações da história inscrevendo a arquitetura
moderna em um estilo antigo. Para Pedone (2005), o Historicismo, a partir
da idealização do passado e da natureza, possibilitou a escolha de elementos
dos mais variados repertórios, abrindo então caminho para a expressão do
Ecletismo em arquitetura, como veremos mais à frente.

Obras arquitetônicas

Giovanni Battista Piranesi (1720–1778) — Itália


Considerado o maior expoente italiano do Neoclassicismo, Piranesi se tornou
um “promotor indômito” da arquitetura da Roma Antiga, a partir de suas
três mil gravuras, aproximadamente, de temas arquitetônicos. Dentro de sua
produção, destaca-se um mapa da Roma Antiga feito em grande escala, onde
incluiu tanto edificações reais como imaginárias constituídas por formas
geométricas complexas (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011).
Além do mapa, desde meados da década de 1750 até o final da vida,
Giovanni Piranesi publicou um conjunto de gravuras chamadas de Veduti
di Roma (Vistas de Roma) — imagens de ruínas antigas romanas com seus
edifícios renascentistas e barrocos. As gravuras se tornaram inspirações
para arquitetos de toda a Europa. No entanto, ainda mais provocante, talvez
tenha sido a série de chapas feitas em 1745, intituladas Carceri (Prisões), que
representavam, para Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 404), “[...] espaços
amplos apinhados de trabalhadores cujas atividades são iluminadas por fontes
de luz obscuras”, e podem ser vistas na Figura 7.
12 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

Figura 7. Prisões — Chapas de Giovanni Piranesi (1745).


Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 404).

Robert Adam e William Chambers — Inglaterra


Dentro da arquitetura inglesa da segunda metade do século XVIII, destacam-se
os nomes de Robert Adam (1728-92) — amigo de Piranesi e autor da publi-
cação Ruins of Palace of the Emperor Diocletian at Spalato, in Dalmatia —,
e Sir William Chambers (1723–1793), que produziu o influente Treatise on
civil architecture (1759) e a publicação Designs of chinese buildings (1757).
O projeto de Adam para a Casa Williams-Wynn, nº. 20 da St. James’s
Square, em Londres (1772), é um exemplo de umas de suas obras e de um “[...]
planejamento habilidoso e de um extraordinário sistema de projeto de interio-
res”, como colocam Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 404). A distribuição
de cômodos nesta casa é feita de modo criativo em um terreno estreito, onde
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 13

são evidenciados ornamentos em estuque. O ornamento do interior da Casa


Williams-Wynn é a imagem da Figura 8.

Figura 8. Robert Adam, Ornamento do interior da


Casa Williams-Wynn, Londres 1772.
Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 405).

Considera-se como obra-prima de Chambers a Casa Somerset (Figura 9),


localizada na margem norte do rio Tâmisa, em Londres. O projeto, desen-
volvido junto com Robert Adam, foi construído para centralizar as sedes do
governo inglês. O edifício com planta baixa em C, com cerca de 150 metros
cada dimensão, é combinado a um bloco de entrada independente. Segundo
Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 406), a concepção desse edifício se
assemelha às praças residenciais arborizadas de Londres, cuja “[...] fachada
se eleva de uma grande arcada piranesiana rusticada até pavilhões conectados
que refletem a formação francesa do arquiteto, mas é prejudicada pela cúpula
excessivamente pequena, que mostra a dificuldade dos ingleses em lidar com
o Monumentalismo”. As esculturas distribuídas pelo conjunto se referem às
conquistas marítimas da Inglaterra.
14 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

Figura 9. Obra-prima de William Chambers, a fachada vol-


tada para o rio da Casa Somerset, em Londres (1776–1786).
Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 406).

Etienne-Louis Boullée e Claude-Nicolas Ledoux —


França
O movimento neoclássico na França se desenvolveu de forma diferente do
movimento na Inglaterra. Interessava para os arquitetos franceses as figuras
geométricas primárias, como o cubo, a esfera e a pirâmide, como base para suas
composições arquitetônicas. Assim, propuseram edificações inteiras marcadas
pela geometria dos volumes elementares. Entre os arquitetos neoclássicos
franceses destacam-se Etienne-Louis Boullée (1728–1799) e Claude-Nicolas
Ledoux (1736–1806), devido à criatividade e habilidade de projetar edificações
hipotéticas e reais, com propostas de cidades ideais e uso de formas ideais.
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 15

O cenotáfio é um dos exemplos dos esquemas imaginários de Boullée,


projeto para Sir Isaac Newton, o descobridor das leis da mecânica clássica.
Neste caso, “[...] é uma esfera oca de aproximadamente 150 metros de diâ-
metro, cuja metade superior representa a esfera celeste e foi perfurada para
criar a impressão das estrelas e da lua quando vista do interior”, como pode
ser vista na imagem da Figura 10 (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011,
p. 407). Boullée evidencia em sua obra as formas e volumes puros (o cubo, a
esfera, o cone ou o cilindro) como base e essência da arquitetura. Suas obras
mostram-se monumentais, tanto por fora como por dentro.

Figura 10. Etienne-Louis Boullée, Cenotáfio para Sir Isaac Newton (1784).
Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 407).
16 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

Dentre os projetos de Ledoux, podem-se destacar o projeto para Chaux,


no Leste da França — que revelava a visão de uma cidade ideal, onde a co-
munidade organizava-se em moradias em um grande conjunto oval ao redor
de uma salina (projeto considerado por alguns autores como precursor do
movimento das Cidades-Jardins do final do século XIX), e a Casa do Inspetor
na Foz do Rio Loüe, ainda que nenhum dos dois tenha sido construído. Este
último edifício, tem a forma de um cilindro oco colocado sobre um pódio,
conforme mostra a Figura 11.

Figura 11. Claude-Nicolas Ledoux, Casa do Inspetor na Foz do Rio Loüe, publicado em
1804. Esta edificação surpreendente mostra a concepção de uma “arquitetura falante”.
Aqui, o encarregado do rio mora, apropriadamente, em uma casa através da qual a água
passa constantemente.
Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 408).
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 17

Além disso, Ledoux projetou uma série de portais e pedágios para a Coroa
francesa — 45 prédios no total —, para demarcar os limites parisienses e
impressionar os visitantes que chegassem à cidade. Poucos desses portais e
pedágios foram preservados até hoje, entre os quais se destaca o da Barriére
de la Villette (1785–1789), configurando-se basicamente como um edifício
circular em torno de um poço de luz cilíndrico, onde o tambor central se
sustenta por colunas duplas.

Karl Friedrich Schinkel — Alemanha


O Neoclassicismo do século XIX na Alemanha é com frequência associado
ao trabalho de Karl Friedrich Schinkel (1781–1841), baseado nos elementos
da arquitetura grega, cuja obra mais famosa é o Velho Museu de Berlim
(1823–1828). O Altesmuseum, primeiro museu de arte europeu aberto ao
público, possuiu em sua fachada “[...] uma gigantesca colunata jônica que foi
construída sobre uma base alta e acompanha toda a largura da edificação”
(FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p. 423). O Museu pode ser visto na
Figura 12, a seguir. A simplicidade ortogonal do museu prepara seus visitantes
para o rigor da planta baixa que irão encontrar a seguir.

Figura 12. O Altesmuseum de Karl Friedrich Schinkel, Berlim (1823–1828).


Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 424).
18 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

Outros arquitetos — Estados Unidos e Inglaterra


Dentro da produção neoclássica, é importante evidenciar ainda o trabalho
de três arquitetos — Thomas Jefferson (que trabalhou nos Estados Unidos),
Sir John Soane (que trabalhou na Inglaterra) e Benjamin Henry Latrobe (que
trabalho em ambos os países).
Sir John Soane (1753–1837) é considerado o principal expoente do Neo-
classicismo na Inglaterra, cuja obra também apresentava traços da arquitetura
romântica. Para o Bank of England (1788) utilizou a luz do dia de forma criativa,
com paredes externas absolutamente cegas. Como se vê no desenho de Gandy,
da Figura 13, neste projeto Soane deu preferência à iluminação zenital, já que
as paredes externas por questões de segurança deveriam apresentar pouca ou
nenhuma abertura.

Figura 13. John Soane, Rotunda do Bank of England, iniciada em 1788. Desenho de J.M.
Gandy.
Fonte: Fazio, Moffett e Wodehouse (2011, p. 425).
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 19

Em meio à ampla exploração das fontes da historiografia clássica, a Idade


Média ganhou reconhecimento e abriu um novo caminho para as investigações
arqueológicas e documentais, como coloca Pedone (2002). Desse modo, na
Inglaterra logo progrediu no interesse pela cultura medieval, a partir da adoção
do estilo gótico nas residências localizadas fora da cidade. Segundo a autora,
os “[...] tempos medievais deixaram de ser considerados como barbárie, adqui-
rindo prestígio e autoridade, que antes somente eram atribuídos à Grécia e à
Roma”, como se vê no Neoclassicismo (PEDONE, 2002, p. 58). Temos como
exemplo dessas residências suburbanas, a residência de Fontil Abbey, projeto
de James Wyatt, cuja construção data entre 1795 e 1807. Vemos aqui a ênfase
na verticalidade, a presença da torre ao centro e ornamentos característicos
da arquitetura gótica.

Figura 14. James Wyatt. Fonthill Abbey. Vista sudoeste. 1795–1807.


Fonte: Pedone (2002, p. 59).

O Historicismo Gótico também teve importante expressão na arquitetura


eclesiástica, a partir da construção de inúmeras igrejas marcadas pelo estilo.
Na Inglaterra, Augustus Welby Northmore Pugin (1812–1852) foi o principal
historicista gótico, pois via no estilo gótico “[...] a materialização dos bons
valores morais e religiosos do passado”, segundo Fazio, Moffett e Wodehouse
(2011, p. 430). Pugin, além de trabalhar como arquiteto, escrevia tratados e
20 O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo

dava aulas. Suas publicações sobre a arquitetura gótica e desenho arquitetural


serviram de padrão para muitos revivalistas góticos. Para Pugin o gótico era a
“[...] única expressão de fé, dos desejos e do clima da Inglaterra”, defendendo
o uso do estilo em todas as edificações, inclusive nas estações ferroviárias
(FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011, p. 430). O revivalismo gótico
teve uma influência significativa na Europa e nas Américas, com uma ex-
tensa produção entre os séculos XIX e XX. Na Figura 15, vemos a catedral
espanhola Covadonga.

Figura 15. Covadonga, primeira das catedrais bur-


guesas espanholas.
Fonte: Alonso Pereira (2010, p. 198).

Vemos que os historicismos do século XIX, de maneira análoga ao Neo-


classicismo, propôs uma valorização do passado, a partir da apropriação de
elementos, sistemas e ornamentos de períodos históricos anteriores. Enquanto
o neoclássico se baseou nas formas clássicas, o segundo revisitou as heranças
medievais. A partir das obras arquitetônicas apresentadas, vemos as seme-
lhanças e diferenças entre os movimentos.
O Neoclassicismo e o surgimento do Historicismo 21

ALONSO PEREIRA, J. R. Introdução à história da arquitetura. Porto Alegre: Bookman, 2010.


CHING, F. D. K.; JARZOMBEK, M.; PRAKASH, V. História global da arquitetura. 3. ed. Porto
Alegre: Bookman, 2019.
FAZIO, M.; MOFFETT, M.; WODEHOUSE, L. A história da arquitetura mundial. 3. ed. Porto
Alegre: AMGH, 2011.
MATTOS, P. B. A arte de educar: cartilha de arte e educação para professores do ensino
fundamental e médio. São Paulo: AB - Antonio Bellini, 2003.
PEDONE, J. V. C. O espírito eclético. 2002. 250 p. Dissertação (Mestrado em Arquitetura) -
Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS,
2002. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/2373/000368750.
pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 12 ago. 2019.
PEDONE, J. V. C. O espírito eclético na arquitetura. Arqtexto, n. 6, p. 126-137, 2005. Dispo-
nível em: https://www.ufrgs.br/propar/publicacoes/ARQtextos/PDFs_revista_6/11_Ja-
queline%20Viel%20Caberlon%20Pedone.pdf. Acesso em: 12 ago. 2019.
PROENÇA, G. História da arte. São Paulo: Ática, 2009.

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