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WBA0839_V1.

CONSTRUÇÕES DE ATERROS
SOBRE SOLOS MOLES
2

Bianca Lopes de Oliveira

CONSTRUÇÕES DE ATERROS SOBRE SOLOS


MOLES
1ª edição

São Paulo
Platos Soluções Educacionais S.A
2021
3

© 2021 por Platos Soluções Educacionais S.A.

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Editorial
Alessandra Cristina Fahl
Beatriz Meloni Montefusco
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Mariana de Campos Barroso
Paola Andressa Machado Leal
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
__________________________________________________________________________________________
Oliveira, Bianca Lopes de
O48c Construções de aterros sobre solos moles / Bianca Lopes
de Oliveira, – São Paulo: Platos Soluções Educacionais
S.A., 2021.
44 p.

ISBN 978-65-89881-79-7

1. Soluções de aterro. 2. Estabilização de aterro. 3. Solos


moles. I. Título.

CDD 624.15
____________________________________________________________________________________________
Evelyn Moraes – CRB-8 SP-010289/O

2021
Platos Soluções Educacionais S.A
Alameda Santos, n° 960 – Cerqueira César
CEP: 01418-002— São Paulo — SP
Homepage: https://www.platosedu.com.br/
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CONSTRUÇÕES DE ATERROS SOBRE SOLOS


MOLES

SUMÁRIO

Investigações geotécnicas em solos moles____________________ 05

Métodos construtivos de aterros sobre solos moles__________ 20

Previsão de recalques e deslocamentos horizontais__________ 35

Estabilidade e monitoramento de aterros sobre


solos moles___________________________________________________ 50
5

Investigações geotécnicas
em solos moles
Autoria: Bianca Lopes de Oliveira
Leitura crítica: Eduarda Pereira Barbosa

Objetivos
• Apresentar a importância da investigação do subsolo
para a elaboração de projetos.

• Identificar as investigações e ensaios adequados


para as obras sobre solos moles.

• Fornecer subsídios para a interpretação dos


resultados dos ensaios e investigações.
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1. Parâmetros para projeto de aterros


em solos moles

Você já percebeu que muitas manifestações patológicas em obras, em


geral, acontecem por falhas em suas fundações? Deformações no solo,
rupturas, podem provocar a ruína de estruturas. Quando o projetista
se depara com solos que possuem características únicas, como
argilas moles, pode ser necessário projetar obras com coeficientes de
segurança relativamente baixos em comparação com outros projetos
geotécnicos, sendo isso um desafio.

No Brasil e no mundo, ocorrem depósitos de solos moles em regiões


litorâneas e várzeas de rios e córregos que, vez por outra, são ocupadas
por assentamentos populacionais, utilizadas para implantação
de sistema portuário, rodovias, ferrovias e outras edificações. As
construções de aterros realizadas sobre solos moles podem apresentar
ruptura ou recalques excessivos, como acontece na orla do município de
Santos, no Estado de São Paulo, ilustrada na figura 1.

Figura 1 – Prédios tortos na costa de Santos, estado de São Paulo

Fonte: diegograndi/ iStock.com.


7

Diante desse cenário, surge um amplo campo de atuação da engenharia


geotécnica. Quais as características de um solo mole? Como obter
informações essenciais para o desenvolvimento de um projeto de um
aterro sobre este tipo de solo?

1.1 Características dos solos moles

Massad (2010) explica que os solos moles são solos sedimentares com
baixa resistência à penetração. Geralmente, são argilas moles ou areias
argilosas fofas de deposição recente, que apresentam característica coesiva
e compressível. Essa deposição pode ocorrer em diversos ambientes, desde
o fluvial até o costeiro, dependendo de fatores como a litologia da área de
erosão, o clima e o tipo de transporte de sedimentos.

Os solos moles de origem fluvial são formados pela deposição de


sedimentos em regiões de inundação ou várzeas dos rios. No Brasil, são
exemplos o Pantanal Matogrossense (Rio Paraguai), as áreas alagáveis do
Amazonas, as bacias do Alto Xingu e Alto Araguaia, as várzeas dos rios que
cortam São Paulo e Taubaté e as regiões do alto e médio Rio São Francisco,
segundo Massad (2010).

Os solos moles de origem marinha existentes, no Brasil, foram formados


por pelo menos dois ciclos de sedimentação no período Quaternário,
a partir de episódios de ingresso do mar em direção ao continente. O
primeiro ciclo chamado de Transgressão Cananeia ocorreu há 120 mil anos,
que resultou em um sedimento argiloso e arenoso na sua base e arenoso
no topo.

O segundo ciclo, mais recente ocorreu há aproximadamente 7 mil anos,


sendo chamado de Transgressão Santos e formou sedimentos marinhos
originados pelo retrabalho dos sedimentos do ciclo anterior ou pela
sedimentação de águas tranquilas. Além disso, podem ocorrer mangues
ou aluviões recentes ao longo das lagunas e canais de drenagem com a
presença de lodo e matéria orgânica.
8

Ao analisar suas formações, os solos moles apresentam grande


heterogeneidade, alternando camadas de argilas e areias, com camadas
de areia argilosa ou argila muito arenosa entre eles, podendo ser de cores
diversas. Em geral, suas espessuras variam na faixa de 1 a 7 m para solos
aluviões fluviais e podem possuir mais de 70 m de espessura para solos
marinhos.

Em função do tipo de formação, as propriedades geotécnicas dos solos


moles são muito variáveis. Esses depósitos não são homogêneos, nem
isotrópicos. Por isso, para conhecer o solo no qual a obra será realizada é
imprescindível a realização de investigações geotécnicas.

1.2 Planejamento para uma investigação geotécnica

Um projeto de uma obra geotécnica e seu dimensionamento adequado


são desenvolvidos a partir de informações como: topografia da área, tipo
de obra a ser construída, dados da vizinhança e parâmetros geológicos-
geotécnicos (HACHICH et al., 1996). Como primeiro passo para a elaboração
de projeto é importante a programação das investigações geotécnicas e sua
execução.

O objetivo da investigação geotécnica é obter informações sobre o solo, que


incluem (DAS; SOBHAN, 2014):

• Identificar a natureza do solo e sua estratificação.

• Obter amostras para identificação visual e ensaios de laboratório


apropriados.

• Verificar a profundidade e a natureza do leito rochoso, caso seja


encontrado.

• Determinar a posição do nível do lençol freático.

• Observar as condições de drenagem do local.


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• Realizar ensaios de campo in situ como ensaios de permeabilidade,


ensaios de palheta e ensaios SPT.

Segundo Almeida e Marques (2014), a programação das investigações


geotécnicas se inicia por um reconhecimento inicial do solo por meio de
mapas geológicos, fotografias aéreas e levantamento de dados de áreas
próximas ao local. No próximo tópico, são abordadas as investigações
preliminares e complementares.

2. Investigações preliminares e complementares

A investigação preliminar do solo é feita por meio da realização de


sondagens a percussão, ensaio estabelecido pela NBR 6484:2020 (ABNT,
2020). O objetivo da sondagem é conhecer o tipo de solo atravessado por
meio da retirada de amostras, determinar a resistência (NSPT) oferecida
pelo solo à cravação do amostrador padrão a cada metro perfurado e
identificar a posição do nível ou dos níveis d’água, quando encontrados
durante a perfuração.

Em solos moles, o NSPT é, em geral, inferiores a dois ou zero. Assim, a


principal informação que deve ser obtida nessa fase da investigação é a
identificação das espessuras das camadas de solo (camadas de argila mole,
camadas intermediárias, camadas subjacentes e de aterros superficiais).
Deve-se executar a sondagem dentro de alguns metros no solo subjacente
ao solo mole para que fique caracterizado se a camada é drenante
(ALMEIDA; MARQUES, 2014).

Com as informações geradas de diversos pontos de sondagem, é possível


a construção de curvas de isoespessuras de solo mole e de perfis
geológico-geotécnicos, que são importantes para a definição dos métodos
construtivos a serem adotados na área analisada.
10

Como a informação NSPT para solos moles é limitada e não permite


diferenciar as distintas naturezas e consistências do solo, as amostras
retiradas do ensaio de sondagem são avaliadas para a determinação
da umidade (wn) e dos limites de Atterberg, conforme NBR 6459:2016
(ABNT, 2016) e NBR 7180:2016 (ABNT, 2016). Essas análises permitem
correlacionar os parâmetros do solo, como a determinação qualitativa da
compressibilidade da argila.

Após essa investigação preliminar do solo, inicia-se a fase de investigação


complementar, na qual são obtidos outros parâmetros geotécnicos por
meio de uma série de ensaios de campo e de laboratório. O Quadro 1
apresenta os principais ensaios utilizados e os respectivos parâmetros do
solo obtidos nesta fase.
11

Quadro 1–Objetivos gerais dos ensaios de laboratório e


de campo e parâmetros obtidos

Objetivo do Principais
Ensaio Tipo
ensaio parâmetros obtidos

Umidade natural in situ


(wn), limite de liquidez (wl),
Caracterização Caracterização
limite de plasticidade (wp),
completa. geral do solo.
densidade real dos grãos
(Gs), curva granulométrica.

Índice de compressão (Cc),


Cálculo de Índice de expansão (Cs), σ’vm,
recalques e de coeficiente de adensamento
Adensamento.
recalques versus para drenagem vertical (cv),
tempo. índice de vazios inicial da
amostra (e0).
Laboratório.

Cálculos de
estabilidade Resistência não drenada da
Triaxial UU.
(afetado por argila (Su).
amolgamento).

Cálculos de
estabilidade Resistência não drenada da
e parâmetros argila (Su), coesão efetiva
Triaxial CU.
para cálculos de (c’), ângulo de atrito interno
deformabilidade do solo (ϕ’).
2D.
12

Resistência não drenada da


Cálculos de
Palheta. argila (Su), sensibilidade da
estabilidade.
argila (St).

Estimativa do perfil de Su,


Estratigrafia,
Piezocone coeficiente de adensamento
recalques versus
(CPTu). para drenagem horizontal
tempo.
(ch).
Campo.

Resistência não
Tbar. Estimativa do perfil de Su.
drenada.

Su, razão de
Dilatômetro Ensaio sobreadensamento (OCR),
(DMT). complementar. coeficiente de empuxo em
repouso (Ko).
Su, modulo cisalhante a
Ensaio
Pressiômetro. pequenas deformações
complementar.
(Go).
Fonte: adaptado de Almeida e Marques (2014, p, 54-55).

Segundo Almeida e Marques (2014), para a realização dos ensaios é


comum a utilização de ilhas de investigação em verticais próximas umas
das outras, pois isso permite ter uma visão de todos os resultados
de ensaios de campo e de laboratório, de forma a melhorar o
entendimento do comportamento geotécnico das camadas de solo mole
e avaliar a coerência dos resultados. No caso de solos moles, os ensaios
realizados determinam os seus parâmetros de resistência, em geral, a
resistência não drenada (Su).
13

2.1 Ensaios de campo

Os ensaios de campo mais utilizados são o ensaio de palheta e de


piezocone. O ensaio de palheta (Vane test) é normatizado pela NBR
10905:1989 (ABNT, 1989) e determina a resistência não drenada (Su)
do solo mole. Consiste na rotação constante de 6º por minuto de uma
palheta cruciforme, como ilustrada na Figura 2, em profundidades
predefinidas.

Figura 2 – Instrumentos do ensaio de palheta

Fonte: https://damascopenna.com.br/vane/. Acesso em: 17 jun. 2021.

O ensaio de palheta permite determinar os valores da resistência não


drenada (Su) a partir da medida do torque (T) versus rotação. De acordo
com a NBR 10905 (ABNT, 1989), considerando condição não drenada do
solo, solo isotropico, resistência constante no entorno da palheta e razão
altura H x D (altura e diâmetro da palheta, respectivamente) igual a 2, Su
é calculada por:
0,86T
Su =
π D 3 kPa
14

Onde T é o torque máximo medido em kN.m e D é o diâmetro da


palheta, em m.

O ensaio de palheta pode ser usado, também, para uma estimativa


dos valores da razão de sobreadensamento (OCR) da argila. Conforme
Mayne e Mitchell apud Almeida e Marques (2014), pode-se utilizar a
equação:
Su
OCR = α
σ 'vo
Onde σ’vo é a tensão vertical efetiva in situ e α pode ser calculado pela
correlação com o índice de plasticidade (Ip):

α = 22.( Ip) −0,48


O ensaio de piezocone é realizado a partir da cravação contínua de um
elemento cilíndrico com ponta cônica e, com velocidade constante, como
ilustrada na Figura 3. Durante o procedimento. é medida a resistência de
ponta (qc), a resistência por atrito lateral (fs) e da poropressão (u).

Figura 3 – Ensaio de penetração do solo

Fonte: Hailshadow/ iStock.com.


15

Este ensaio permite a classificação, a definição da estratigrafia do


depósito de solo mole, determinação do perfil de resistência não
drenada e dos coeficientes de adensamento do solo (ALMEIDA;
MARQUES, 2014). Com os dados do ensaio, você poderá calcular a
resistência de ponta corrigida (qt):

qt = qc + (1 + a )u2
Onde qc é a resistência de ponta medida no cone, u2 é a poropressão
medida na base do cone e α é obtido a partir das características da
sonda e da calibração do piezocone. A resistência não drenada (Su) será:

qt − σ vo
Su =
N kt
Onde σ vo é a tensão vertical total e Nkt é um fator de cone obtido a partir
da correlação entre ensaios de piezocone e resistência não drenada.
Este valor varia tipicamente entre 10 e 20 e para solos brasileiros é da
ordem de 12 (ALMEIDA; MARQUES, 2014).

O ensaio de piezocone também pode ser utilizado para obtenção da


variação de OCR:
qt − σ vo
OCR = k .Qt onde: Qt =
σ 'vo
O valor de k recomendado é da ordem de 0,30.

2.2 Ensaios de laboratório

Os ensaios de laboratório são realizados a partir de amostras


indeformadas e para que os resultados sejam bons e coerentes, estas
amostras devem ser de boa qualidade. As amostras de má qualidade
podem gerar previsões incorretas de recalques e valores de volumes
de terraplenagem equivocados em projeto. A NBR 9820 (ABNT, 1997)
16

estabelece o procedimento de retirada dessas amostras por meio do


amostrador Shelby de pistão estacionário.

As amostras levadas ao laboratório são utilizadas para uma série


de ensaios para a caracterização completa do solo. São realizadas
análises granulométricas por peneiramento e sedimentação, além da
determinação dos limites de Attemberg. Outros dados importantes a
serem obtidas são a determinação da massa específica dos grãos e do
teor de matéria orgânica.

Para a obtenção de mais parâmetros são utilizados ensaios mais


complexos, como o ensaio de adensamento e os ensaios triaxiais. O
ensaio de adensamento por meio do carregamento incremental é
utilizado para o cálculo da magnitude dos recalques e a determinação da
velocidade de seu desenvolvimento. Permite a obtenção do coeficiente de
adensamento cv , índice de compressão Cc e índice de recompressão CR.

O ensaio de adensamento oedométrico consiste na aplicação de uma


tensão vertical comprimindo a amostra de solo confinada, de forma
crescente. Dura em média duas semanas, com incrementos de carga,
em geral, aplicados durante 24 horas.

No caso de argilas muito moles, deve-se iniciar com tensões verticais


baixas, de 1,5 ou 3 kPa, dobrando-se a carga em sequência até atingir a
tensão vertical necessária, que, mesmo para aterros baixos, deve ser da
ordem de 400 kPa, no mínimo. Esse nível de tensões permite a melhor
definição da curva virgem e também avaliar a qualidade da amostra [...]
(ALMEIDA; MARQUES, 2014, p. 73)

Durante o carregamento, são feitas leituras da deformação vertical da


amostra. Essa deformação do solo pode ser calculada em função do
índice de vazios. Os dados obtidos são representados por meio de um
gráfico tensão versus deformação (σ’v x e) em escala logarítmica, como
exemplificado pelo Gráfico 1.
17

Figura 4 – Exemplo da representação usual do resultado


de um ensaio de adensamento

Fonte: elaborada pelo autor.

A Figura 4 apresenta um gráfico, com um exemplo do resultado de


um ensaio de uma argila que foi adensada no passado, ou chamada
de pré-adensada. Ao receber as tensões mais baixas, a variação de
índices de vazios é pouca ou nenhuma até um certo valor de tensão.
A partir daí, a argila sofre deformações com o aumento da tensão.
Esse valor de tensão em que há a mudança do comportamento
corresponde a máxima tensão experimentada pelo solo anteriormente,
ou denominada tensão de pré-adensamento. Ensaios em que o solo
apresenta deformações grandes e irreversíveis são característicos de
argilas, normalmente, adensadas, ou seja, que não sofreram cargas
anteriormente.

A fim de se determinar a resistência do solo mole, podem ser utilizados


ensaios triaxiais. Nestes ensaios, o corpo de prova é envolvido por uma
fina membrana de borracha e, posteriormente, acondicionado em uma
câmara cilíndrica preenchida, geralmente, com água ou glicerina. Esta
amostra é, então, submetida a uma pressão de confinamento por meio
da compressão do fluido na câmara. Após isso, é aplicado uma tensão
axial por meio de uma haste de carregamento vertical para provocar a
18

ruptura por cisalhamento do solo e anotado a deformação axial ocorrida


(DAS; SOBHAN, 2014). Os ensaios triaxiais podem ser:

• Ensaio adensado drenado (CD),

• Ensaio adensado não drenado (CU),

• Ensaio não adensado não drenado (UU).

O ensaio triaxial UU é um ensaio mais rápido de execução do que os


ensaios CD e CU. Este ensaio é considerado não adensado não drenado,
ou seja, durante a aplicação da pressão da câmara não é permitido a
drenagem do corpo de prova. Com esse ensaio são obtidos círculos de
Mohr em tensões totais e a envoltória de ruptura, determinando-se a
resistência não drenada do solo Su. A Figura 5 apresenta um gráfico, com
um exemplo de envoltória de ruptura obtida em um ensaio UU.

Figura 5–Envoltória de ruptura obtida no ensaio triaxial UU

Fonte: elaborada pelo autor.

A envoltória de resistência define Su, um parâmetro importante para


análises de estabilidade de aterros e obras envolvendo solos moles.
Juntamente com os demais ensaios, os ensaios triaxiais fornecem dados
necessários para o desenvolvimento de projetos geotécnicos.
19

Com o crescimento das cidades e a implantação de empreendimentos


em áreas de solo mole, surgem muitos desafios à engenharia, como a
ruptura de aterros ou recalques excessivos. Assim, para a elaboração
de projetos adequados é necessário conhecer o solo, tornando as
investigações geotécnicas imprescindíveis.

Os ensaios, tanto realizados em campo como no laboratório,


devem sempre ser especificados de forma detalhada, com o devido
cuidado para a obtenção de amostras adequadas de forma a se
obter investigações de qualidade e parâmetros coerentes para o
dimensionamento das obras. Este conhecimento do solo minimiza riscos
e custos, permitindo a escolha adequada dos métodos construtivos
inclusive na execução de aterros.

Referências
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6459: Solo – Determinação
do Limite de Liquidez. Rio de Janeiro, 2016.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6484: Solo – Sondagens de
Simples Reconhecimento com SPT – Método de ensaio. Rio de Janeiro, 2020.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7180: Solo – Determinação
do Limite de Plasticidade. Rio de Janeiro, 2016.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9820: Coleta de amostras
indeformadas de solos de baixa consistência em furos de sondagem. Rio de Janeiro,
1997.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10905: Solo – Ensaios de
palheta in situ – Método de ensaio. Rio de Janeiro, 1989.
ALMEIDA, M. S. S.; MARQUES, M. E. S. Aterro sobre solos moles. 2. ed. São Paulo:
Oficina de Textos, 2014.
DAS, B. M.; SOBHAN, K. Fundamentos de Engenharia Geotécnica. 7. ed. São
Paulo: Cengage Learning, 2014.
HACHICH, W.; FALCONI, F. F.; SAES, J. L.; FROTA, R. G. O.Fundações – teoria e
prática. São Paulo: PINI, 1996.
MASSAD, F. Obras de Terra – curso básico de geotecnia. 2.ed. São Paulo: Oficina
de Textos, 2010.
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Métodos construtivos de aterros


sobre solos moles
Autoria: Bianca Lopes de Oliveira
Leitura crítica: Eduarda Pereira Barbosa

Objetivos
• Apresentar os principais tipos de aterros.

• Fornecer as metodologias construtivas adequadas


para a construção sobre solos moles.

• Listar as principais etapas para a execução de


aterros.
21

1. Metodologias de construção de aterros


sobre solos moles

Os solos moles, geralmente, são solos de formação sedimentar


que possuem baixa capacidade de carga e alta compressibilidade e
deformabilidade, encontrados em depósitos nas regiões litorâneas e em
várzeas de rios e córregos. O desenvolvimento econômico e a crescente
expansão do território urbano têm gerado a necessidade da construção
de obras sobre solos moles, como ferrovias, rodovias e outras obras de
infraestrutura.

Massad (2010) cita a construção da Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, que


atravessou regiões de mangue, no início do século XX. A primeira estrada
de rodagem da Baixada Santista, por exemplo, foi executada por meio
de aterro em ponta. Assim, a construção de aterros sobre solos moles
não é recente, mas ainda propõe um grande desafio a engenharia.

Do ponto de vista técnico, os grandes problemas da execução de


aterros sobre solos moles são a estabilidade deles após a construção
e os recalques ao longo do tempo. Do ponto de vista construtivo, há
problemas com relação ao tráfego dos equipamentos de construção,
amolgamento da superfície do terreno e o risco de ruptura durante a
construção, podendo afetar as pessoas envolvidas na obra e ocasionar
danos aos equipamentos (MASSAD, 2010).

Dependendo do tipo de utilização de uma área, recalques podem ser


admissíveis ou não. A fim de solucionar ou minimizar os problemas de
estabilidade e recalques, há várias metodologias construtivas que são
utilizadas na construção de aterros sobre solos moles. Na Figura 1, é
possível conhecer os principais métodos utilizados.
22

Figura 1 – Principais métodos de melhoria de


solos e estabilização de aterros

Fonte: elaborada pelo autor.

Apesar de alguns métodos construtivos solucionarem apenas os


recalques, outros somente o controle de estabilidade, a maioria dos
métodos envolvem as duas questões (ALMEIDA; MARQUES, 2014).

1.1 Substituição de solos moles

Quando os depósitos de solos moles têm até 4 m de altura, pode ser


executada a substituição deles. Essa substituição consiste na retirada
total ou parcial dos solos compressíveis por meio de dragas ou
escavadeiras e a colocada de aterro no lugar deste solo, como ilustrada
na Figura 2.
23

Figura 2 – Execução de aterro

Fonte: Iamyai/ iStock.com.

O processo de execução do aterro por meio da substituição do solo


inicia-se em permitir a entrada dos equipamentos no terreno. Quando
o solo apresenta baixíssima capacidade de suporte, como uma camada
superficial muito mole, às vezes, alagada, os equipamentos não
conseguem executar os ensaios, cravações, ou transitar no local. Para
se resolver essa questão, antes de tudo, deve-se executar um aterro de
conquista. Este aterro tem a função de permitir que os equipamentos
acessem o local, podendo ser necessário até mesmo a utilização de
geotêxtil como reforço (ALMEIDA; MARQUES, 2014).

A função do geotêxtil (materiais poliméricos de alta resistência e rigidez)


é aumentar o fator de segurança do sistema, tanto durante o processo
construtivo como nas fases posteriores durante o adensamento do
solo. Sua presença promove uma distribuição de tensões mais favorável
ao solo, absorvendo parte das tensões. Além disso, quando utilizados
geossintéticos drenantes, como no caso dos drenos verticais, permite a
aceleração do processo de adensamento, segundo Palmeira (2018).
24

1.2 Aterros de ponta

A metodologia do aterro de ponta consiste no deslocamento dos


solos moles, utilizando o peso próprio do aterro. O aterro se inicia na
periferia do local, em cota mais elevada que a do aterro projetado.
Esta construção de aterro vai empurrando (deslocando) e expulsando
a camada de solo mole existente, deixando em seu lugar o aterro
embutido, como ilustrado na Figura 3 (ALMEIDA; MARQUES, 2014).

Figura 3 – Execução de aterro de ponta

Fonte: elaborada pelo autor.

Conforme Almeida e Marques (2014), após a execução do aterro de


ponta, deve ser realizada uma avaliação da espessura do solo mole
remanescente. Se esta espessura for maior do que a desejável, deve-se
aplicar uma sobrecarga temporária sobre o terreno, de forma a eliminar
possíveis recalques pós-construção.

Tanto a metodologia de substituição de solo, como a de deslocamento


por meio do aterro de ponta, apresentam dificuldade no controle de
25

qualidade. É difícil garantir que a remoção do solo mole foi uniforme, o


que pode acarretarem recalques diferenciais e ondulações na superfície
do aterro. Também, como há retirada de material, em ambos os casos,
é necessário que haja local para a disposição dos altos volumes de bota-
fora, sendo que este solo não é útil e pode estar contaminado (ALMEIDA;
MARQUES, 2014).

1.3 Aterro convencional com sobrecarga temporária e


drenos verticais

O aterro convencional se refere ao aterro executado sem a utilização


de aceleradores de recalque. Quando realizado sobre solos moles,
sua altura deve levar em consideração o recalque que o aterro terá.
Assim, este aterro deve ser feito com uma altura maior para compensar
as deformações, sendo levado em consideração os parâmetros de
compressibilidade do solo.

Este aterro pode ser também executado utilizando uma sobrecarga


temporária. Essa sobrecarga representa um carregamento superior
(de uma a duas vezes) ao que atuará ao longo da vida da construção.
O objetivo é acelerar os recalques primários e compensar, total ou
parcialmente, os recalques secundários, como ilustra a Figura 4.
26

Figura 4 – Aterro com sobrecarga temporária –


aceleração dos recalques

Fonte: elaborada pelo autor.

A Figura 4 mostra a diferença entre o uso de um aterro convencional


e um aterro utilizando sobrecarga. A linha hachurada apresenta como
seria o recalque (Δhf), apenas com a carga permanente devido ao
aterro de espessura hf. Com o uso da sobrecarga (espessura hs) que
totaliza a espessura hfs, o recalque total acumulado a um tempo infinito
seria Δhfs. Mas no tempo t1, quando se retira a sobrecarga, inicia-se a
estabilização dos recalques (ALMEIDA; MARQUES, 2014).

Essa metodologia pode ser aplicada juntamente com o uso de drenos


verticais. Os drenos verticais utilizados em aterros podem ser pré-
fabricados, possuindo um núcleo plástico com ranhuras em forma de
canaleta, envolvido por um filtro de geossintético não tecido de baixa
gramatura. Esses drenos aumentam ainda mais a velocidade dos
recalques, pois permitem melhor drenagem da camada de solo mole,
especialmente, em camadas de solos mais espessas. Basicamente, a
água coletada pelos drenos é encaminhada a um colchão drenante que
enviará a água por gravidade ou bombeamento para a superfície do
27

terreno natural. Os primeiros drenos utilizados eram de areia. Segundo


Nascimento (2009):

[...] Os drenos verticais de areia foram pioneiramente utilizados em fins


de 1920, na Califórnia, nos Estados Unidos (Oliveira & Almeida, 2004).
Posteriormente, surgiram os primeiros drenos pré-fabricados, que foram
evoluindo até os modelos atualmente utilizados, chamados geodrenos
ou drenos fibroquímicos [...]. Os geodrenos apresentam elevada
resistência mecânica, o que garante sua integridade durante as operações
de instalação, resistindo às solicitações provenientes da cravação, e
suportando os esforços oriundos da deformação horizontal e vertical da
massa de solo de fundação em adensamento (NASCIMENTO, 2009, p. 19).

A execução de um aterro com a utilização de drenos verticais inicia-se


com a construção de uma camada drenante, como ilustrada na Figura
5. Essa camada também será utilizada como aterro de conquista,
permitindo o acesso dos equipamentos para a cravação dos drenos.
Em seguida, é realizada a cravação dos drenos verticais de forma que
fiquem solidarizados a uma sapata de cravação no fundo da camada
(ALMEIDA; MARQUES, 2014).

Figura 5 – Aterro com o uso de drenos verticais

Fonte: elaborada pelo autor

A cravação dos drenos é feita de forma hidráulica, pois se for por


impacto ou vibração, geram amolgamento do solo mole, diminuindo a
permeabilidade do solo no entorno do geodreno, o que pode diminuir
28

a eficiência da drenagem. Após a cravação dos drenos é construído o


corpo do aterro.

Quando utilizado junto a sobrecarga, pode-se aplicar o uso de


vácuo. Neste caso, a sobrecarga é feita junto com o uso de drenos
verticais e horizontais e aplica-se o vácuo por meio de um sistema de
bombeamento associado aos drenos horizontais. Este vácuo é mantido
por meio de uma membrana impermeável de PVC, cobrindo toda a área,
que permite a estanqueidade do sistema (ALMEIDA; MARQUES, 2014).
Seu princípio executivo consiste na redução da poropressão, devido ao
vácuo, aumento da tensão efetiva do solo e, consequentemente, ganho
de resistência devido aos recalques gerados.

1.4 Aterro em etapas ou com bermas de equilíbrio

Quanto o aterro é construído em etapas, o solo mole adquire resistência


de forma lenta. Isso é aplicado em situações em que o aterro não seja
estável, quando construído em uma única etapa. Em geral, é feito em
duas a três etapas, como ilustrado na Figura 6. Antes da colocação
da etapa seguinte, é avaliada a resistência não drenada da etapa
anterior. Assim, de forma lenta e gradual, é acelerado o processo de
adensamento da camada mole.
29

Figura 6 – Aterro em etapas

Fonte: elaborada pelo autor.

Outra solução que pode ser adotada, a fim de melhorar a estabilidade


do aterro, é a utilização de bermas de equilíbrio. As bermas de equilíbrio
são extensões laterais ao aterro que tem a função de compensar os
momentos atuantes no conjunto solo mole e aterro e favorecem o
aumento do fator de segurança de sua estabilidade global. No entanto,
exigem amplas áreas laterais para sua implantação. De acordo com
Almeida e Marques (2014), quando houver restrições ao comprimento
das bermas, podem ser instalados geossintéticos na base do aterro para
reforço.

1.5 Aterros leves

Os aterros leves têm como objetivo diminuir a magnitude dos recalques


primários causados pela sua construção. Essa técnica utiliza materiais
leves como EPS, dutos ou galerias de concreto, pneus picados, argila
expandida, para introduzir vazios nos aterros, como ilustrado na Figura 7.
30

Figura 7 – Aterro com o uso de EPS

Fonte: elaborada pelo autor.

O mais utilizado é o EPS, pois apresenta o menor peso específico (0,15 a


0,30 kN/m³) e baixa compressibilidade (ALMEIDA; MARQUES, 2014). Os
pesos específicos dos materiais mais comumente utilizados em aterros
são apresentados no Quadro 1.

Quadro 1–Pesos específicos dos materiais leves para aterros

Peso específico
Material
(kN/m³)

Poliestireno expandido – EPS (isopor ou similar). 0,15 a 0,30.

Tubos de concreto (diâmetro: 1m a 1,5m;


2 a 4.
espessura de parede: 6cm a 10 cm).

Pneus picados. 4 a 6.

Argila expandida. 5 a 10.


31

Serragem. 8 a 10.

Fonte: Almeida e Marques (2014, p. 40).

A escolha do material dependerá do uso do aterro e das cargas


atuantes. O aterro leve apresenta como vantagem o fato de poder ser
executado em prazos exíguos. A desvantagem de seu uso é que se a
obra for distante do fornecedor do material o custo de transporte pode
inviabilizar sua aplicação. Também, no uso em aterros de vias, deve-se
utilizar uma manta impermeabilizante sobre o EPS para sua proteção
para eventuais derrames pelo tráfego de produtos químicos, como os
derivados de petróleo, segundo Nascimento (2009).

1.6 Aterro estruturado ou sobre elementos de estacas

Segundo Almeida e Marques (2014, p. 41), os aterros estruturados


são “aqueles em que parte ou a totalidade do carregamento devido
ao aterro é transmitida para o solo de fundação mais competente,
subjacente ao depósito mole.” A transmissão da carga pode ser feita por
meio de estacas ou colunas de outros materiais, como granulares, que
recebem as tensões por meio de uma plataforma de capitéis, geogrelhas
ou lajes.

O objetivo do aterro estruturado é permitir uma melhor distribuições


das tensões, de forma a minimizar ou até eliminar os recalques,
melhorando a estabilidade do aterro. O tipo de aterro estruturado
mais simples se refere ao uso de capitéis e estadas, que transmitem a
carga por meio do princípio do arqueamento, como ilustrado na Figura
8. Quando se utiliza o reforço com geossintético, permite-se o uso de
estacas mais espaçadas (ALMEIDA; MARQUES, 2014).
32

Figura 8 – Aterro sobre estacas reforçado com geossintético

Fonte: elaborada pelo autor.

O processo executivo do aterro sobre estacas consiste, primeiramente,


na execução de um aterro de conquista para que os equipamentos
possam acessar o terreno para conseguir cravar as estacas. Depois,
são executados os capitéis, acima ou dentro do aterro de conquista,
podendo estes serem de varios formatos como circular, quadrado,
esféricos, com armadura ou não, e, então, é instalado a geogrelha acima
deles.

As funções da geogrelha podem ser listadas como as seguintes:

[...] (i) a separação do material do aterro do material natural; (ii) a


distribuição e transmissão das cargas para as estacas que não foram
transmitidas pelo efeito do arqueamento; (iii) a distribuição e a
transmissão das cargas horizontais provenientes do aterro para as estacas;
(iv) o reforço da base do aterro. (ALMEIDA; MARQUES, 2014, p. 162)

O aterro sobre estacas utiliza o princípio, estudado por Terzaghi, do


arqueamento e possibilita que as estacas com capitéis recebam a maior
parcela do carregamento. Segundo Almeida e Marques (2014), a eficácia
do arqueamento aumenta com o aumento da altura de aterro. Caso o
solo seja muito compressível, o efeito do arco pode ser reduzido. Nesses
33

casos, se usa geogrelha sobre os capitéis para corrigir a distribuição das


tensões.

As vantagens do aterro sobre estacas são seu menor prazo para


construção e maior controle dos recalques em comparação a outras
metodologias construtivas. Também, como não há submersão de
material, são utilizados menores volumes de aterro, o que diminui
o impacto ambiental gerado na área de empréstimo, bota-fora e no
transporte. As desvantagens, segundo Nascimento (2009) estão ligadas
ao custo dos equipamentos utilizados na cravação de estacas e execução
dos capitéis, além do custo de compra e instalação da geogrelha.

O aterro estruturado também pode ser feito utilizando-se colunas


granulares ou colunas de brita. Nascimento (2009) descreve que
essa técnica consiste na cravação de uma camisa metálica até o solo
resistente, com posterior retirada do solo do interior da camisa, inserção
da brita e compactação dela por apiloamento. Depois disso, se retira
a camisa metálica. A coluna formada no solo mole, promove menores
deslocamentos horizontais e verticais do que o aterro convencional
ou sobre drenos. Também permite maior dissipação de poropressões
devido a drenagem radial, aumentando a velocidade dos recalques
e melhorando a resistência do solo. A utilização de geossintéticos
tubulares envolvendo essas colunas maximiza seu desempenho
(ALMEIDA; MARQUES, 2014).

Você pode perceber que existem várias metodologias para construir


aterros sobre depósitos de solos moles. A escolha de um ou de outro
método dependerá das características do solo do local, do tipo de
utilização da área e da vizinhança, além dos prazos e custos envolvidos.
A partir dessa escolha, é realizada a análise de estabilidade do aterro
com base nos parâmetros de projetos como resistência não drenada da
argila, resistência do aterro e resistência do reforço geossintético.
34

Referências
ALMEIDA, M. S. S.; MARQUES, M. E. S. Aterro sobre solos moles. 2.ed. São Paulo:
Oficina de Textos, 2014.
MASSAD, F. Obras de Terra – curso básico de geotecnia. 2.ed. São Paulo: Oficina
de Textos. 2010.
NASCIMENTO, C. M. C. Avaliação de alternativas de processos executivos de
aterros de vias urbanas sobre solos moles. Dissertação (Mestrado). Instituto
Militar de Engenharia. Rio de Janeiro: IME, 2009.
PALMEIRA, E. M. Geossintéticos em geotecnia e meio ambiente. São Paulo:
Oficina de Textos, 2018.
35

Previsão de recalques e
deslocamentos horizontais
Autoria: Bianca Lopes de Oliveira
Leitura crítica: Eduarda Pereira Barbosa

Objetivos
• Apresentar métodos para o cálculo dos recalques
primários e secundários.

• Prever a magnitude dos deslocamentos verticais e


horizontais e sua variação com o tempo.

• Analisar soluções para aceleração dos recalques.


36

1. O princípio do adensamento

Um aumento de tensão sobre um solo causada pela construção


de fundações, aterros ou aplicação de outras cargas comprimem
as camadas de solo ocasionando deformações. As deformações
podem ocorrer de forma rápida após a construção ou se desenvolver
lentamente após a aplicação das cargas, dependendo da constituição do
solo e do estado em que ele se encontra.

Segundo Almeida e Marques (2014), os recalques podem ser


classificados em recalques imediatos (Δhi), recalques por adensamento
primários (Δh) e recalques por compressão secundária (Δhsec), como
ilustra o gráfico da Figura 1.

O recalque imediato do solo é um recalque não drenado, sem variação


do volume do solo e decorre do carregamento instantâneo, causado
pela sua deformação elástica. Geralmente, é de pequena magnitude
quando comparado ao recalque por adensamento e são calculados com
base na teoria da elasticidade.

Figura 1 – Tipos de recalques

Fonte: elaborada pelo autor.


37

O recalque por adensamento primário se refere a alteração volumétrica


do solo coesivo saturado, devido a expulsão da água contida em seus
espaços vazios. Segundo DAS (2011), em solos saturados, quando há
aumento de tensão, a poropressão aumenta repentinamente. Após
o recalque elástico, a condutividade hidráulica da argila que é baixa
permite uma dissipação gradual do excesso de poropressão gerado,
causando o adensamento.

O recalque por compressão secundária acontece depois do fim do


adensamento primário. É uma forma adicional de compressão, sob
tensão efetiva constante, observado em solos coesivos saturados e
não podem ser atribuídas à dissipação dos excessos de poropressão
(ALMEIDA; MARQUES, 2014). O recalque total será a somatória dos
recalques imediato, por adensamento primário e por compressão
secundária.

1.1 Recalque elástico ou imediato

Logo após a aplicação da carga, sem alterar o teor de umidade do solo,


ocorre o recalque elástico. Este recalque é calculado baseado na Teoria
da Elasticidade (PINTO, 2006). Essa teoria indica que os recalques na
superfície de uma área carregada são expressos pela equação:
σ o .B
=ρ I. .(1 −ν 2 )
E
Onde σo é a pressão uniformemente distribuída na superfície; E é o
módulo de elasticidade do solo; ν é o coeficiente de Poisson do solo; B é
a largura ou diâmetro da área carregada; e I é um coeficiente conforme
Quadro 1, baseado na forma da superfície carregada e no sistema de
aplicação das pressões (de forma rígida como por meio de sapatas de
concreto ou de forma flexível, como em aterros). No caso de aterros, o
recalque no centro da área carregada é maior do que nas bordas.
38

Quadro 1–Coeficientes de forma I

Flexível
Tipo de placa Rígida
Centro Borda ou canto

Circular. 0,79 1,00 0,64

Quadrada. 0,86 1,11 0,56

Retangular L/B=2. 1,17 1,52 0,75

Retangular L/B=5. 1,66 2,10 1,05

Retangular L/B=10. 2,00 2,54 1,27

Fonte: adaptado de Pinto (2006, p.188).

O recalque elástico ocorre imediatamente após a camada de solo


compressível ser submetida a um aumento de tensão. No caso de
aterros, o recalque no centro da área carregada é maior do que nas
bordas.

1.2 Recalque por adensamento primário

Após o recalque elástico, a dissipação do excesso de poropressão,


acompanhado pela redução do volume da massa de solo acontece por
um longo período nos solos moles. Para se determinar a magnitude
do recalque por adensamento primário, é feita a separação da camada
do solo de fundação em subcamadas. É calculado o recalque de cada
subcamada com os dados obtidos nos ensaios de adensamento
(ALMEIDA; MARQUES, 2014).

Os parâmetros necessários para este cálculo podem ser obtidos por


meio da curva de compressão do ensaio, como ilustra o gráfico da
39

Figura 2. A forma geral da curva obtida no ensaio envolve três estágios,


conforme DAS (2011):

• Estágio I: compressão inicial, causada predominantemente por


pré-carregamento (trecho de recompressão).

• Estágio II: adensamento primário devido a dissipação do excesso


de poropressão (trecho de compressão virgem).

• Estágio III: compressão secundária, após a dissipação do excesso


de poropressao, quando há uma deformação devido ao reajuste
plástico da estrutura do solo.

Figura 2 – Curva de compressão

Fonte: elaborada pelo autor.

O ensaio de adensamento permite estabelecer se o solo em campo a


alguma profundidade foi submetido a uma pressão efetiva máxima em
algum momento de sua história geológica, podendo ser igual ou maior
a pressão de sobrecarga existente no momento da retirada da amostra.
Com isso, define-se dois tipos de argila:
40

• Argila normalmente adensada, quando a pressão existente é


a pressão máxima que o solo já foi submetido em sua história
geológica.

• Argila sobreadensada, quando a pressão existente é menor


do que a pressão a qual o solo foi submetido no passado. Essa
tensão máxima é chamada de tensão de pré-adensamento ou
sobreadensamento (σ’vm).

Com o resultado do ensaio de adensamento, é possível calcular o


recalque por adensamento primário, assumindo-se um adensamento
unidimensional. Para argilas, normalmente, adensadas, o gráfico e x log
σ’v é linear e o recalque pode ser calculado segundo:
 C  σ ' + ∆σ  
∆h =harg  c .log  vo ' v  
1 + evo  σ vo 
Onde: Cc é o índice de compressão; evo o índice de vazios in situ na
profundidade de interesse; e, Δσv é o acréscimo de tensão.

O valor do acréscimo de tensão (Δσv) pode ser obtido pela equação:

∆σ v =
I .(γ at .hat )

Onde: γat é o peso específico do aterro, hat sua espessura e I é um fator


de influência obtido pelo Ábaco de Osterberg, em função das dimensões
do aterro, conforme Figura 1.
41

Figura 3 – Ábaco de Osterberg

Fonte: Almeida e Marques (2014, p. 84).

Para argilas sobreadensadas submetidas a uma tensão σ’o + Δσ’o ≤ σ’vm, o


recalque pode ser obtido por:
 C  σ ' + ∆σ  
∆h =harg  s .log  vo ' v  
1 + evo  σ vo 

Onde Cs é o índice de recompressão.

Para argilas sobreadensadas submetidas a uma tensão σ’o + Δσ’o > σ’vm,
a equação utilizada para o cálculo do recalque é:
 C σ '  Cc  σ vo' + ∆σ v 
=∆h harg  s .log  vm' 
+ .log  
 σ vo  1 + evo  σ vm
'
1 + evo 

O cálculo do tempo necessário para a estabilização dos recalques


primários e a variação dessas deformações com o tempo, é realizado em
duas condições de drenagem: drenagem unidimensional e drenagem
radial.
42

Para drenagem vertical, utiliza-se a Teoria de Terzaghi, em que o


recalque em função do tempo Δh (t) é:

∆h(t ) =U v .∆h

Onde Uv é a porcentagem média de adensamento vertical, em função do


fator Tv e Δh é o recalque por adensamento primário.

O fator tempo é calculado em função do coeficiente de adensamento


(cv) e da distância de drenagem (hd):
cv .t
Tv =
hd2
O coeficiente de adensamento cv pode ser obtido pelo ensaio de
adensamento por meio da equação:
k .(1 + e)
cv =
av .γ 0

Onde k é o coeficiente de permeabilidade, av é o coeficiente de


compressibilidade, e o índice de vazios do solo e γ0 é o peso específico
da água.

A distância de drenagem, segundo Almeida e Marques (2014), é igual ao


valor da espessura harg da camada de solo, se drenagem em apenas uma
face. Se houver drenagem em ambas as faces, seu valor é de metade
da espessura harg. O coeficiente de adensamento é obtido por meio dos
dados do ensaio de adensamento. Nos casos usuais de carregamento,
tem-se:

• Para Uv de 0 a 52%:
π
Tv = .U v2
4

• Para Uv maior que 52%:

1, 781 − 0,933log(100 − U v (%))


Tv =
43

1.3 Recalque por compressão secundária

Após o recalque por adensamento primário, podem acontecer


deformações que não são atribuídas à dissipação dos excessos de
poropressões. Segundo Das (2011), essas deformações ocorrem
por causa do ajuste do tecido do solo. Durante este estágio, a curva
do gráfico de deformação em função do logaritmo do tempo é
praticamente linear, como mostra o gráfico da Figura 3.

Figura 4–Variação de e com log t para um dado incremento de carga

Fonte: elaborada pelo autor.

Segundo Almeida e Marques (2014), a hipótese tradicional sobre o


comportamento do solo sob compressão é que ao final do adensamento
primário ocorrem recalques por compressão secundária. Nesta
abordagem, calcula-se para cada incremento de tensão vertical aplicada,
um coeficiente de compressão secundária Cα:

∆e
Cα =
∆ log t
44

O valor do recalque por compressão secundária pode ser calculado


como:
 t 
Cα .harg .log  * 
t
∆hsec =  p 
(1 + evo )

Onde: tp* se refere ao tempo final do adensamento primário. O


recalque total será então calculado por:

• para t ≤ tp*

∆h(t )= U (Tv ).∆h

• para t = tp*

∆h(t p *) =
∆h

• para t ≥ tp*
 t 
Cα .harg .log  * 
t
∆h(t ) =∆ha +  p 
(1 + evo )

Em solos orgânicos e inorgânicos altamente compressíveis, o recalque


por compressão secundária é mais importante do que o recalque devido
ao adensamento primário. Em argilas inorgânicas sobreadensadas,
a compressão secundária é de menor significado devido a sua baixa
magnitude (DAS, 2011).

Outra metodologia utilizada para o cálculo dos recalques por


compressão secundária propõe que ele é “correspondente à variação
de deformação vertical da condição de fim do primário (OCR=1) para
a reta OCR =1,5, para uma dada tensão efetiva vertical (σ’vf) atuante na
argila mole” (ALMEIDA; MARQUES, 2014, p.95). Essa condição calcula o
recalque por adensamento primário adotando-se uma compressão até
a tensão 1,5 σ’vf, seguido de um descarregamento até a tensão σ’vf. Nesta
45

metodologia, é possível prever o recalque por compressão secundária


como:
∆hsec
= 0,15CR
harg

Onde:
Cc
CR =
1 + evo

Em aterros realizados em etapas, o cálculo de variação de recalques


segue o procedimento usual, mas não se aguarda a estabilização de 95%
dos recalques de uma etapa para a continuação da colocação da etapa
seguinte (ALMEIDA; MARQUES, 2014). O procedimento do cálculo dos
recalques segue os passos:

a. Cálculo do recalque total (Δh1) correspondente à altura de aterro


h1, considerando aterro infinito e que a argila esteja na condição
normalmente adensada, sem considerar efeito de submersão:
 C  (σ ' + γ .h  
∆h1 =harg1  c .log  vo ' at 1  
1 + evo  σ vo 

b. Cálculo da variação de recalques Δh1(t) = Δh1.U1 para cada tempo


t até o tempo t1, correspondente ao início da construção da
segunda etapa, em geral, considerando U1(t1) ≥ 60%.
c. Cálculo dos recalques após t1 devem considerar a espessura do
aterro: como:

= harg − ∆h1.U1
harg1

E a tensão efetiva no tempo t1, como:

σ=
'
v1 σ vo' + U1.(γ at .h1 )
46

d. O recalque após t1 será composto pelo recalque, ainda que ocorra


o aterro da etapa h1 e do recalque referente à altura do aterro h2:

 C  (σ ' + ∆σ v' 1 + ∆σ v' 2  


harg1  c .log  v1
∆h2 = 
1 + evo  σ v' 1 
onde

∆σ v' 1 =(1 − U1 ).(γ at .h1 ) e ∆σ v 2 =


'
(γ at .h2 )

e. Cálculo da variação de recalques Δh2 para cada tempo t*,


considerando que a nova origem dos tempos é t1, ou seja, neste
ponto t* = 0. Se houver uma terceira etapa, devem ser repetidos
os passos c, d, e.

2. Aceleração de recalques

Como a finalidade de acelerar o desenvolvimento dos recalques de solos


moles, em projetos de aterros, podem ser utilizadas soluções como o
uso de sobrecarga temporária, drenos verticais ou uma combinação
dessas soluções. Segundo Almeida e Marques (2014):

A sobrecarga temporária também acelera recalques relativos ao


adensamento primário e reduz os recalques pós-construtivos. Assim, a
conjugação de drenos verticais pré-fabricados ou geodrenos e sobrecarga
temporária explora ao máximo o benefício do adensamento acelerado.
(ALMEIDA; MARQUES, 2014, p. 105)..

Os aterros com drenos verticais proporcionam uma drenagem radial,


de forma a diminuir o caminho de drenagem no interior do solo,
acelerando os recalques. Almeida e Marques (2014) citam, para a
solução deste problema, o estudo de Barron que permite o cálculo do
grau de adensamento médio da camada (Uh):
U h = 1 − e −[8Th / F ( n )]
47

Sendo:
ch .t
Th =
d e2

n2 3n ² − 1
( n)
F= ln(n) − ≅ ln(n) − 0, 75
n² − 1 4n ²
de
n=
dw

Onde: de é o diâmetro de influência de um dreno, dw é o diâmetro do


dreno ou diâmetro equivalente de um geodreno com seção retangular,
Th é o fator tempo para drenagem horizontal e F(n) é uma função da
densidade de drenos.

O diâmetro de influência do dreno é definido de acordo com o


espaçamento dos drenos e sua disposição. Para disposições em sistema
de malha quadrada de lado igual a l, tem-se:

d e = 1,13l

O aterro que utiliza sobrecarga temporária constrói uma camada de


aterro acima do aterro projetado com a função de acelerar o recalque
por adensamento primário, devido à sobrecarga gerada sobre o solo
mole. Seu uso pode ser combinado com drenos verticais. Um caso
particular é o uso de pré-carregamento por vácuo, no qual é aplicado
vácuo por meio de um sistema de bombeamento associado aos drenos
horizontais instalados na camada de areia (ALMEIRA; MARQUES, 2014).

3. Previsão dos deslocamentos horizontais

Quando você analisa o ensaio de adensamento, pode perceber que


ao simular o comportamento do solo, sob tensões, os deslocamentos
horizontais são nulos. Isso realmente acontece com o solo argiloso
subjacente ao centro do aterro. No entanto, nos bordos do aterro,
48

não há confinamento lateral, permitindo que ocorram deslocamentos


horizontais, cuja avaliação é importante.

Os deslocamentos horizontais máximos (δmax), segundo Almeida e


Marques (2014), são estimados a partir de relações com os recalques
máximos (Δhmax), na linha do centro do aterro. Estudos realizados
sobre este assunto concluem que existem dois estágios sucessivos de
comportamento do solo durante a fase de carregamento.

Durante a fase inicial de carregamento (parcialmente drenado), os


deslocamentos horizontais ocorrem de forma rápida e são bem
menores do que os deslocamentos verticais, sendo da ordem de 18% de
Δhmax. Com o aumento das tensões efetivas, já em fase não drenada, os
deslocamentos horizontais são da ordem da magnitude dos recalques
(90% de Δhmax). Após isso, na fase de adensamento, o deslocamento
horizontal aumenta linearmente, com uma correlação da ordem de 16%
de Δhmax. (ALMEIDA; MARQUES, 2014).

Assim, observa-se que tanto os deslocamentos horizontais, como os


recalques verticais devem ser previstos. São, em depósitos de solos
moles, em geral, elevados. Aqui, foram apresentados modelos de
cálculos simplistas, sendo que em projetos mais complexos, devem
ser feitas análises mais sofisticadas utilizando métodos numéricos e
analíticos conhecidos.

A magnitude do recalque e sua evolução ao longo do tempo devem ser


levados em consideração na escolha do método construtivo. Recalques
são inadmissíveis em construções como aterros para edificações
domiciliares ou comerciais e aterros de ferrovias, porém, em obras como
rodovias, pode-se aceitar o “convívio com uma parcela de recalques
remanescentes” (ALMEIDA; MARQUES, 2014, p. 103). Por isso, a previsão
desses é necessária. Além disso, o comportamento previsto e o
comportamento real do solo em campo podem ter discrepâncias. Surge,
então, a necessidade do monitoramento do aterro construído.
49

Referências
ALMEIDA, M. S. S.; MARQUES, M. E. S. Aterro sobre solos moles. 2.ed. São Paulo:
Oficina de Textos, 2014.
DAS, B. M. Fundamentos de engenharia geotécnica. São Paulo: Cengage Learning,
2011.
MASSAD, F. Obras de Terra – curso básico de geotecnia. 2.ed. São Paulo: Oficina
de Textos, 2010.
PINTO, C. S. Curso básico de mecânica dos solos em exercícios resolvidos. 3. ed.
Oficina de Textos, 2006.
50

Estabilidade e monitoramento de
aterros sobre solos moles
Autoria: Bianca Lopes de Oliveira
Leitura crítica: Eduarda Pereira Barbosa

Objetivos
• Relacionar os parâmetros necessários para a análise
de estabilidade de aterros.

• Apresentar os principais métodos de análise de


estabilidade em aterros reforçados e de aterros
sobre colunas granulares

• Apresentar os procedimentos e instrumentação


geotécnica para monitoramento de aterros
utilizados em obras de grande porte ou risco.
51

1. Análise de estabilidade de aterros

Um projeto de aterro sobre solos moles é elaborado com base em


parâmetros que dependem dos materiais envolvidos: o solo no qual se
apoiará, o material de aterro e o reforço de geossintético. A partir disso,
os projetos são desenvolvidos por meio de análises de estabilidade
realizadas pela aplicação de métodos de equilíbrio limite, em termos de
tensões totais ou tensões efetivas.

Os aterros sobre solos moles podem sofrer ruptura por três formas:
ruptura pelo corpo de aterro (instabilidade interna), ruptura global do
conjunto aterro fundação (instabilidade global) e ruptura da fundação do
solo mole (instabilidade de fundação), como ilustrada na Figura 1.

Figura 1 – Modos de ruptura de aterros sem reforços

Fonte: Almeida e Marques (2014, p. 140).

A análise de estabilidade dos aterros pode ser desenvolvida seguindo


um procedimento de cálculo que envolve:
52

- Cálculo da altura máxima admissível do aterro em função da resistência


não drenada Su do solo mole de fundação.

- Definição das características do aterro, como a inclinação do talude.

- Análise de estabilidade global, utilizando métodos de equilíbrio limite e


outras metodologias dependendo da complexidade da obra.

1.1 Ruptura de fundação

Na análise de estabilidade referente a capacidade de carga do solo


de fundação, o aterro é avaliado como um carregamento e é possível
estimar uma altura crítica do aterro (hcr), por meio de teorias de
capacidade de carga. Para uma fundação direta, sobre um solo com
ângulo de atrito (ϕ) igual a 0 e resistência não drenada Su, a altura crítica
do aterro pode ser calculada pela equação:
N c .Su
hcr =
γ at
Onde: Nc é o fator de capacidade de carga que pode ser obtido no ábaco
da Figura 2 e γat é o peso específico do aterro.
53

Figura 2 – Ábaco para determinação do fator de Carga Nc

Fonte: Massad (2010, p. 127).

O ábaco para determinação do fator Nc baseia-se no valor da coesão,


considerando que na superfície do terreno a coesão é co e aumenta de
um valor devido ao produto c1.D em função da profundidade, onde D
é a espessura da camada do solo mole. No caso de solos com coesão
constante ao longo da profundidade, o valor de c1 (variação da coesão) é
zero.

Sabendo o valor da relação c1.d pela coesão inicial, sendo d a largura do


talude do aterro, parte-se da abcissa do ábaco até a reta correspondente
54

a relação c1.D pela coesão inicial. O encontro dessas informações


revelará o valor do fator de carga Nc nas ordenadas.

A altura admissível para aterros construídos em apenas uma etapa é


calculada a partir da adoção de um fator de segurança considerando
a importância da obra. Em geral, são admitidos fatores de segurança
iguais ou superiores a 1,5:
hcr
hadm =
FS
Se você encontrar um valor de hadm inferior à altura necessária do aterro
para o projeto, deve-se propor a construção do aterro por um meio
alternativo como a adoção da construção por etapas ou o uso de aterros
reforçados.

1.2 Ruptura global

A análise de estabilidade global é, em geral, feita por métodos de


equilíbrio limite. A avaliação da estabilidade do aterro depende do tipo
de superfície de ruptura adotada. Superfícies de ruptura circulares
podem ser analisadas por meio do método de fatias, como o método de
Fellenius e Bishop Modificado. Superfícies de ruptura não circulares são
analisados, geralmente, pelo método de Janbu simplificado.

Para estudos preliminares da estabilidade de aterros sem reforços,


podem ser utilizados ábacos como o de Pilot e Moreau, para permitir
uma avaliação da variação dos fatores de segurança em função das
variáveis envolvidas. No entanto, com o desenvolvimento de programas
de estabilidade de taludes, os ábacos têm estado cada vez mais em
desuso (ALMEIDA; MARQUES, 2014).

Segundo Massad (2010), o método de Fellenius é uma das primeiras


soluções utilizadas para a análise de estabilidade de aterro. Esse método
admite uma superfície circular de ruptura, igualando os momentos
55

atuante e resistente. Para carregamentos uniformemente distribuídos


e flexíveis, como ilustrado na Figura 2, a carga que conduz o terreno à
ruptura (Qr) é:

Qr = 5,5.c

Onde: c é coesão do solo. Para um carregamento flexível qualquer, a


superfície de ruptura acontece como ilustrado na Figura 3. A carga que
leva o terreno à ruptura vale:
Qr = 5,5.2b.c

Onde: c é coesão do solo e b é metade do valor do raio do círculo crítico.

Figura 3 – Solução de Fellenius para carregamento flexível qualquer

Fonte: Massad (2010, p. 124).

A altura crítica de aterros será:


5,5.c
hcr =
γ at
Quando o aterro projetado é superior a capacidade do solo, ou a
espessura D for grande, recomenda-se o uso de bermas de equilíbrio.
Pode-se subdividir a rampa em bermas de igual área de seção
56

transversal e igual projeção. Para bermas com metade da altura do


aterro, pode-se utilizar o ábaco da Figura 4 para determinação da
largura (f) da berma (MASSAD, 2010).

Neste ábaco, pode-se determinar o valor do fator de carga Nc,


considerando que na superfície do terreno a coesão é co e aumenta de
um valor devido ao produto c1.z em função da profundidade, onde z é a
profundidade da camada do solo mole. Sabendo o valor da relação c1.f
pela coesão inicial, sendo f a largura da berma de equilíbrio, parte-se da
abcissa do ábaco até a reta. O encontro dessas informações revelará o
valor do fator de carga Nc nas ordenadas.

Figura 4 – Ábaco para determinação de largura de


berma de equilíbrio

Fonte: Massad ( 2010, p. 127).


57

Após a avaliação da estabilidade de aterro, de acordo com a altura


admissível a partir dos métodos de equilíbrio e definido o fator de
segurança do aterro, caso esse fator de segurança seja superior ao
de projeto, não é preciso fazer reforço do aterro ou a execução de
etapas. Deve-se apenas se atentar para a altura do aterro de forma a
levar em consideração os recalques que acontecerão com o objetivo de
compensá-los.

Caso o fator de segurança obtido seja inferior ao de projeto, deve-se


adotar outras soluções como a construção em etapas ou o uso de aterro
reforçado. A escolha dependerá do prazo existente para a obra, pois a
melhoria da resistência associada ao adensamento da argila leva tempo.

2. Análise de estabilidade em aterros


reforçados

Em aterros reforçados com o uso de geossintéticos, o reforço tem como


função resistir ao empuxo de terra que se desenvolve dentro do aterro e
resistir à deformação lateral da fundação, aumentando a capacidade de
carga da fundação.

As geogrelhas são materiais sintéticos em forma de grelha que


apresentam elevada resistência e rigidez a tração, em uma ou nas
duas direções. Os geotêxteis são materiais têxteis que podem ser
tecidos (filamentos dispostos em duas direções ortogonais) ou não
tecidos (fibras distribuídas aleatoriamente). Os materiais utilizados em
sua composição podem ser o poliéster (PET), o polipropileno (PP), o
polietileno (PE) e o álcool de polivinila (PVA). Sua resistência nominal
típica varia na faixa entre 200 e 1000 kN/m (ALMEIDA; MARQUES, 2014).

O uso do geossintético fornece um reforço passivo ao aterro. Quando


os solos de fundação e do aterro deslocam horizontalmente, ocorrem
deformações no geossintético, mobilizando um esforço de tração
58

resistente T, restringindo o deslocamento das camadas de solo


(ALMEIDA; MARQUES, 2014). Segundo Palmeira (2018):

A utilização de reforço geossintético pode aumentar significativamente o


fator de segurança da obra, sendo particularmente atrativa para razões
baixas entre a espessura de solo mole e a largura da base do aterro
(tipicamente, inferior a 0,7). Para solos mais espessos, a contribuição
da presença do reforço é pequena, uma vez que, nesse caso, restringe-
se à mobilização de uma tensão cisalhante na interface com o solo de
fundação, que geralmente aumenta um pouco o fator de segurança global
da obra. (PALMEIRA, 2018, p. 179)

Da mesma forma que na análise de estabilidade de aterros não


reforçados, a primeira etapa a ser realizada na análise de estabilidade
de aterros reforçados é a verificação da capacidade de carga do solo
de fundação. Segundo Almeida e Marques (2014), considera-se que o
aterro atue como uma sapata rígida sobre a camada de argila, sendo
que o reforço age como a rugosidade da sapata. Essa etapa permite
a definição da altura crítica do aterro, de forma que se admita uma
capacidade de carga inferior à tensão admissível da argila para que não
seja considerada responsabilidade excessiva ao reforço em seu papel na
estabilidade.

Em seguida, é analisada a ruptura por deslizamento do aterro em sua


base devido ao empuxo do aterro. Isso é feito pelo equilíbrio de forças
na horizontal, como ilustra a Figura 5, sendo que o fator de segurança
acima do reforço será:
0,5.n.γ at .hat .tan φd
Fs =
K aat .(0,5.γ at .hat + q )

Onde n é a inclinação do talude, Kaat é o coeficiente de empuxo ativo e


ϕd é o atrito reforço-solo.
59

Figura 5 – Análise de escorregamento do aterro ou do reforço

Fonte: Almeida e Marques (2014, p. 148).

O fator de segurança da análise de escorregamento abaixo do reforço,


pode ser calculado pela equação:
n.Sumob + T
Fs =
K aat .(0,5.γ at .hat + q )

Onde Sumob é a resistência mobilizada no contato reforço-argila e T é a


tração mobilizada no reforço. O fator de segurança deve ser maior ou
igual a 1,5.

No cálculo da estabilidade do aterro, deve ser calculado ou adotado


o esforço de tração mobilizado T, a deformação permissível εa e o
coeficiente de interação com o solo Ci. O esforço de tração mobilizado no
reforço não deve ser superior ao valor do esforço de tração limite que
pode ser mobilizado Tlim, que é composto do empuxo lateral no aterro e
da força cisalhante do solo de fundação.

O valor de T pode ser calculado pelo fator de segurança exigido no


deslocamento lateral ou, ainda, pelo método de ruptura por cunha
e por meio de análises de ruptura circular através de programas de
estabilidade disponíveis (ALMEIDA; MARQUES, 2014). O valor de T
adotado para o projeto será o maior entre as metodologias indicadas.
60

Esse esforço de geossintético T deve ser comparado a resistência à


tração admissível do material (Tadm), sendo T ≥ Tadm. O valor da resistência
à tração admissível pode ser determinado a partir da resistência à tração
nominal (Tr) do geossintético:
Tr
Tadm =
FRF .FRI .FRDQ .FRDB

Onde FRF é o fator de redução parcial devido à fluência para o tempo


de vida útil da obra ou da atuação do reforço; FRI é o fator de redução
devido a danos mecânicos da instalação; FRDQ é o fator de redução
parcial devido à degradação química e FRDB é o fator de redução parcial
devido à degradação biológica. Esses valores podem ser retirados da
Tabela 1.

Tabela 1 – Faixa de valores de fatores de redução

Fatores de Redução Geotêxtil Geogrelha

FRI 1,1 – 2,0 1,1 – 2,0

FRDQ 1,0 – 1,5 1,1 – 1,4

FRDB 1,0 – 1,3 1,0 – 1,2

FRF 2,0 – 3,5 2,0 – 3,0

Fonte: Almeida e Marques (2014, p. 150).

Com a definição do esforço de tração T, deve-se definir a deformação


permissível εa e o módulo de rigidez do geossintético. A deformação
permissível εa se refere a máxima deformação desenvolvida antes
do colapso do aterro. Almeida e Marques (2014) citam estudos que
recomendam valores de deformação permissíveis no reforço na faixa
de 2% a 6%. Com esses valores, é possível se determinar o módulo de
rigidez do projeto:
T
J=
εa
61

O valor do módulo de rigidez de projeto J deve ser majorado devido


ao efeito de fluência para o tempo de vida útil da obra, a fim de se
determinar o módulo de rigidez nominal Jr. Após a definição desses
parâmetros, é importante verificar o comprimento de ancoragem do
geossintético para mobilizar o esforço de tração T no reforço.

A ancoragem do geossintético no solo é essencial para que a interface


solo-reforço forneça a resistência necessária. Seu comprimento (Lanc)
pode ser calculado por:
Tanc
Lanc =
2.Ci .(cat + γ at .hat .tan φat )

Onde Tanc é a resistência de ancoragem, devendo ser superior ao esforço


de tração considerado no projeto; Ci é o coeficiente de interação do
geossintético com o solo, obtido em ensaios de arrancamento, fornecido
pelos fabricantes; hat é a altura do aterro acima do reforço e γat, cat e ϕat
parâmetros do solo de aterro.

3. Aterros sobre colunas granulares

As colunas granulares de diâmetro d são executadas em malhas


quadradas ou triangulares de espaçamento l. Em geral, os projetos
baseiam-se no conceito de célula unitária, com diâmetro equivalente
igual a 1,05l para malhas triangulares ou 1,13l para malhas quadradas.

O projeto e análise de estabilidade do aterro sobre colunas granulares


são elaborados a partir dos parâmetros de coesão (cm) e ângulo de atrito
(ϕm), além do peso específico ponderado γm do conjunto solo-coluna.
Segundo Almeida e Marques (2014), um dos métodos que mais se utiliza
é o de Priebe que combina as teorias de elasticidade e de empuxos de
Rankine. Com base nesse método, os parâmetros cm e ϕm podem ser
calculados como:
62

φm m.tgφc + (1 − m).tgφs
tg=

cm= (1 − m).cs

Onde: ϕs e cs são parâmetros de resistência da argila mole, sendo, em


geral, cs igual a Su e o ângulo de atrito ϕs igual a zero; ϕc o ângulo de
atrito da coluna granular; e, m um parâmetro que representa a parcela
de carga suportada pela coluna definido a partir da distribuição de
tensões relativa entre coluna-solo.

Devido a diversidade dos materiais envolvidos como o aterro, o solo


mole, a coluna granular e o uso de geossintético (quando utilizada
coluna granular encamisada), recomenda-se a utilização de métodos
numéricos para a análise de estabilidade de aterros com colunas
granulares, como, por exemplo, o método dos elementos finitos.

O método dos elementos finitos é uma alternativa em relação ao uso


de aterros experimentais, pois possibilita a realização de simulações
numéricas para diversas condições. Essa metodologia de cálculo permite
considerar outros fatores de forma mais realista como as deformações
ou tensões que se desenvolvem no reforço deste tipo de aterro,
identificando o mecanismo de ruptura.

4. Monitoramento de aterros e instrumentação


geotécnica

Em obras de grande porte ou que o risco inerente a que possa resultar,


além de danos materiais, perda de vidas humanas, há a necessidade
de se monitorar a evolução dos aterros sobre solos moles durante e
após sua construção. Por isso, em obras de aterros em solos moles
nas quais os fatores de segurança de projeto em geral são baixos, o
monitoramento permite buscar maior segurança.
63

O monitoramento geotécnico tem como objetivos verificar as premissas


de projeto, ajudar no planejamento da obra e garantir a integridade das
obras vizinhas. Ele permite verificar os critérios de projeto e a avaliação
de eventuais ajustes. Basicamente, os critérios que a instrumentação
proposta para o monitoramento deve atender são, conforme Almeida e
Marques (2014):

• Deve-se conhecer a grandeza medida que o instrumento


fornecerá, além da faixa de variação esperada.

• Logo após as leituras, devem ser realizadas as análises para haver


tempo de decisão adequado.

• Deve ser informada a especificação técnica dos instrumentos,


como sua forma de instalação, sua locação, profundidade,
periodicidade das leituras e como estas devem ser realizadas, além
dos valores de alerta, tempo de análise e decisão.

• A locação dos instrumentos deve ser feita com base em


coordenadas e altimetria, de preferência próxima a locais nos
quais foram realizadas as sondagens e ensaios.

O programa de monitoramento ou observação deve iniciar pela


definição do objetivo da instrumentação, desde a medição dos
deslocamentos verticais, deslocamentos horizontais e medidas de
poropressões. O Quadro 1 exemplifica alguns instrumentos utilizados e
suas funções.

Quadro 1 – Instrumentação geotécnica

Instrumentos Função

Medição de deslocamentos verticais (totalidade do


Placa de recalque.
recalque pontual).
64

Medidas de deslocamentos verticais em


Extensômetro. profundidade associados a subcamadas com
características geotécnicas distintas.

Obtenção de um perfil de recalques contínuo ao


Perfilômetros.
longo de uma horizontal

Medição de deslocamentos horizontais ao longo de


Inclinômetro. uma vertical por meio da medida do desvio do tubo
em relação à vertical.

Medições de poropressões. O mais utilizado é o de


Piezômetros.
Casagrande.

Fonte: elaborado pelo autor.

Com os dados obtidos no monitoramento, deve-se interpretar os


resultados. Por exemplo, por meio da análise da evolução do recalque
em função do tempo e da variação da poropressão, é possível obter
parâmetros de campo como o coeficiente de adensamento, além
de promover valores de alerta para os quais os aterros devem ser
removidos ou alteados, como no caso de utilização de sobrecargas
temporárias.

Assim, você pode perceber que para analisar a estabilidade de um


aterro, deve-se analisar os diversos modos de ruptura incluindo
a ruptura do aterro, da fundação ou a ruptura global. Utilizando
métodos de equilíbrio limite, determinam-se os fatores de segurança
da geometria analisada. Segundo Palmeira (2018), o projeto de aterros
sobre solos moles com o uso de reforços requer um conhecimento
acurado sobre as propriedades dos materiais envolvidos. No caso
de aterros reforçados, deve-se determinar os parâmetros do reforço
geossintético, como seu módulo de rigidez, além da avaliação da
deformação permissível no reforço.
65

Além disso, é fundamental, dependendo do porte e risco da obra, o


monitoramento do aterro com o objetivo de melhorar a segurança.
Deve ser estabelecido um programa de monitoramento dos aterros,
estabelecendo os instrumentos a serem instalados, sua localização
e grandezas a serem medidas. A avaliação dos dados e a análise e
interpretação deles é fundamental para o sucesso deste programa de
monitoramento.

Referências
ALMEIDA, M. S. S.; MARQUES, M. E. S. Aterro sobre solos moles. 2.ed. São Paulo:
Oficina de Textos, 2014.
MASSAD, F. Obras de Terra – curso básico de geotecnia. 2.ed. São Paulo: Oficina
de Textos, 2010.
PALMEIRA, E. M. Geossintéticos em geotecnia e meio ambiente. São Paulo:
Oficina de Textos, 2018.
66

BONS ESTUDOS!

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