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DIÁLOGO (ISSN 2238-9024)

http://www.revistas.unilasalle.edu.br/index.php/Dialogo
Canoas, n. 26, ago. 2014.

EXPERIÊNCIAS DOCENTES NO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE


INICIAÇÃO À DOCÊNCIA: POSSÍVEIS MARCAS NA CONSTITUIÇÃO DAS PROFESSORAS
Cristiane Camargo Gimenes1
Dóris Bittencourt Almeida2

Resumo: O trabalho aborda a formação docente e seus entrelaçamentos ao Programa Institucional de Bolsas de
Iniciação à Docência/PIBID. A partir das narrativas de bolsistas egressas, a investigação analisa as possíveis marcas
da formação vivenciadas no PIBID Pedagogia/UFRGS. Os resultados da pesquisa indicam que o Projeto deixou
marcas na formação dessas professoras, entre elas, o desenvolvimento da autonomia e a docência compartilhada
como um apoio e reconhecimento da eficiência dessa prática em sala de aula.
Palavras-chave: Formação Docente; Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência; Docência Com-
partilhada.

TEACHING EXPERIENCES IN INSTITUTIONAL SCHOLARSHIP PROGRAM AVATAR


INITIATIONS TO TEACHING: POSSIBLE MARKS ON CONSTITUTION OF
THE TEACHERS

Abstract: The work addresses the teacher education and its Institutional scholarship program meshes of initiation
into Teaching/ PIBID. From the narratives of recent grads fellows, research examines the possible training experi-
enced brands the PIBID Pedagogy/UFRGS. The survey results indicate that the project left marks on the formation
of these teachers, among them, the development of autonomy and shared teaching as a support and recognition of
the efficiency of this practice in the classroom.
Keywords: Teacher Education; Institutional Scholarship Program Initiation into Teaching; Sharedteaching.

1. INTRODUÇÃO

Este estudo3 se propõe a analisar a experiência promovida pelo Programa de Bolsas de Iniciação
à Docência [PIBID/UFRGS], em seu subprojeto Pedagogia, e suas implicações na constituição do fazer
docente a partir das narrativas de bolsistas egressas. Aqui, nos propomos a tematizar essa experiência de
docência compartilhada, investigando se os saberes desenvolvidos pelo PIBID têm ou não ressonância no
exercício da docência dessas pedagogas que participaram do Programa como bolsistas nos anos de 2010
e 2011.

1
Pedagoga, graduada pela Faculdade de Educação/ UFRGS
2
Professora de História da Educação da Faculdade de Educação/UFRGS e do PPGEDU/UFRGS, Coordenadora do Subprojeto
PIBID Pedagogia Anos Iniciais (FACED/UFRGS). E-mail: almeida.doris@gmail.com
3
Este estudo é fruto do trabalho de conclusão de curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS.
Cristiane Camargo Gimenes; Dóris Bittencourt Almeida
26
Importa desde já destacar alguns dos méritos desta política pública, especialmente consi-
derando a formação oportunizada aos integrantes. O exercício da docência compartilhada é algo
valoroso proporcionado pelo PIBID, pois faz com que as docentes reflitam coletivamente acer-
ca de suas ações. Além dessa experiência, valoriza-se a formação continuada por meio de estu-
dos sobre a diversidade cultural, em que priorizaram-se as culturas indígena e afrodescenden-
te. Como um dos propósitos do Programa é colaborar na formação de um professor pesquisador,
cumpre notar o incentivo à publicação de artigos em periódicos e apresentações de trabalhos4
em eventos científicos, desenvolvendo, assim, a autonomia e a reflexividade da prática na sala de aula.

2. O PROGRAMA, SUA IMPLANTAÇÃO NA UFRGS E O SUBPROJETO PEGAGOGIA

O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência [PIBID] foi instituído pelo Decreto5
nº 6.096, de 24 de abril de 2007, atendendo as diretrizes do Plano de Metas Compromisso Todos pela
Educação e o Plano de Desenvolvimento da Educação [PDE] com a intenção de ampliar, inicialmente, a
permanência dos alunos nas instituições de educação de ensino superior no Brasil. Seu principal objetivo é
investir na qualificação da formação inicial e continuada dos futuros docentes. A Coordenação de Aperfei-
çoamento de Pessoal de Nível Superior [CAPES] é o órgão vinculado ao Ministério da Educação [MEC]
o qual faz a concessão das bolsas de iniciação à docência de formação inicial e continuada da educação
básica, conforme a legislação que fundamenta a responsabilidade da CAPES.

O PIBID busca inserir os alunos das licenciaturas nas escolas públicas, incentiva a docência e pro-
move uma aproximação entre universidade e escola, permitindo uma qualificação das práticas pedagógi-
cas dos licenciandos desde o início do curso de graduação. Assim, através dessas ações, pretende valorizar
do professor do ensino básico, bem como a permanência do aluno graduando na sua área específica, pos-
sibilitando que o futuro professor inicie o trabalho docente antes do estágio obrigatório.

O Programa na UFRGS teve seu início em março de 2009, conforme as determinações dos Editais
2007 , contando com a participação de seis subprojetos: Biologia, Letras - Artes, Ciências Sócio Históri-
6

cas, Física, Química e Matemática. O PIBID rapidamente tomou proporções maiores na Universidade,
envolveu diversos cursos de graduação, mais alunos bolsistas e mais escolas parceiras. Em 2009, a UFRGS
lançou um novo edital7 que englobou outras licenciaturas na área da Filosofia, Pedagogia e Teatro.

O subprojeto PIBID Pedagogia/UFRGS foi implementado pela professora Drª Maria Aparecida

4
Entre eles, a apresentação de trabalho sobre a temática indígena na XVII Jornada de Ensino de História e Educação: Ensino de
História no Cone Sul: Patrimônio Cultural Territórios e Fronteiras na Universidade do Pampa [UNIPAMPA]; XVIII Jornada de
Ensino de História: o ensino de História, imagens e mídias na Universidade do vale do Rio dos Sinos [UNISINOS]; e no Salão
de Ensino da UFRGS. Também publicamos nossos escritos em periódicos , publicamos um livro de memoriais e um Caderno
Pedagógico.
5
Documento encontrado no site do MEC disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=arti-
cle&id=8724&catid=223 acesso em 07 de setembro de 2013. Outro site em que o referido decreto foi encontrado: http://www.
capes.gov.br/images/stories/download/editais/Edital_061_2013_PIBID.pdf acesso em 21 de setembro de 2013.
6
Fonte consultada: http://www.ufrgs.br/pibid/Projeto%20Institucional.pdf consulta realizada no dia 07 de setembro de 2013.
7
O novo edital do PIBID foi lançado no Diário Oficial da União e na página eletrônica da CAPES dia 02 de agosto de 2013.
O edital prevê o início das atividades em março de 2014. A duração e o prazo de execução dos projetos aprovados neste edital
são de quarenta e oito (48) meses podendo ser prorrogado. Fonte consultada no dia 07 de setembro de 2013 http://www.capes.
gov.br/images/stories/download/editais/Edital_061_2013_PIBID.pdf

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Bergamaschi8 através do plano de trabalho apresentado à CAPES com o título: “Pedagogia e Diversi-
dade: Construindo processos inclusivos na escolarização inicial”, tendo como justificativa a Lei Federal
11.645/2008 que determina a obrigatoriedade do estudo da História e da Cultura Indígena nas Escolas de
Ensino Básico, alterando o artigo 20 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Desse modo, o PIBID Pedagogia iniciou suas atividades em 2010 com quinze bolsistas, que traba-
lharam em docência compartilhada, distribuídas em três escolas estaduais. O propósito é que os encontros
com as crianças sejam diferenciados das práticas escolares rotineiras, portanto, o modelo escolar não é
referência de incentivo nos planejamentos das aulas. As participantes são impulsionadas a usar de criati-
vidade para desenvolver as atividades em formato de oficinas.

3. DA INICIAÇÃO À DOCÊNCIA À CONSTITUIÇÃO DA PROFESSORA: PROCESSOS QUE


FORMAM

O PIBID é um Programa idealizado para apoiar os alunos que estão iniciando a docência, investindo
nos significados da profissão de professor. O bolsista, ao se inserir na escola, tem a oportunidade de co-
nhecer esse espaço e, também, de se formar através da convivência com colegas e com o corpo docente em
seu futuro ambiente de trabalho. Faz-se notar a importância dessa relação desde cedo em atrelar os estudos
às aprendizagens que a Universidade proporciona, aliando, assim, a teoria com a prática na sala de aula.

Por vezes, professoras deixam de exercer sua profissão, por diversos motivos, por não conhecer seu
ambiente de trabalho ou o idealizar de modo ingênuo e até podem cumprir por um determinado tempo
a função, mas depois se desmotivam. Por isso, é relevante a conexão entre futuro/a professor/a e escola,
pois, assim, tem a possibilidade efetiva de conhecer os meandros de sua profissão desde o início da gra-
duação. Como diz Cavaco:
Se a escola se organizar para acolher os novos docentes, abrindo o caminho para que
possam reflectir e ultrapassar de forma pertinente e ajustada as suas dificuldades, se as-
sumir colectivamente a responsabilidade do seu encaminhamento através de projectos de
formação profissional, talvez contribua para inverter, por essa via, a actual tendência para
a descrença generalizada que se associa a desvalorização social da imagem do professor
(CAVACO, 1999, p.168).

De modo geral, percebe-se que as professoras aprendem referenciais teóricos na universidade, mas
têm dificuldades de percebê-los na prática escolar cotidiana. Antonio Nóvoa (1992) considera que a for-
mação docente não pode se limitar às instituições de ensino, às práticas e aos métodos, ou seja, não se faz
necessário um amontoado em metodologias e técnicas que ensinem o que fazer e como fazer, mas é através
de um trabalho de constante reflexão crítica sobre as práticas realizadas que a formação se desenvolve. O
autor defende ainda a ideia de deslocar a formação acadêmica para uma perspectiva centrada na profissão
no sentido de buscar “o desenvolvimento profissional do professor no coração da profissão”9 e valorizan-
do o seu fazer pedagógico. Essas são perspectivas relevantes valorizadas pelo trabalho desenvolvido pelo
PIBID.

8
Professora da faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS.
9
Trecho retirado de uma palestra de Antônio Nóvoa no Brasil intitulada “Ofício de professor”. Disponível em http://www.
youtube.com/watch?v=txleZKamajE consulta em 24/09/2013. Artigo escrito pelas professoras da Faculdade de Educação:
Clarice Salete Traversini, Maria Luisa Merino de Freitas Xavier, Maria Bernadette Castro Rodrigues, Maria Isabel Habkcost
Dalla Zen e Nádia Geisa Silveira de Sousa.

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Assim, o subprojeto Pedagogia teve em sua formação inicial quinze bolsistas que tiveram a
experiência de trabalhar em regime de docência compartilhada, que ocorria da seguinte forma: o grupo
planejava em conjunto e dividia as tarefas que seriam executadas na escola. Apesar de aparentar ser uma
tarefa fácil, nem sempre era simples compartilhar a docência. Cada pessoa chega à universidade com suas
bagagens culturais, o que torna esse exercício de partilha algo complexo, assim como relatam algumas
participantes do PIBID Pedagogia no livro de memórias intitulado “Iniciação à Docência em Pedagogia:
Memórias que contam histórias” (ALMEIDA; BERGAMASCHI, 2012). Nesse livro, as bolsistas narram
suas histórias de vida, refletem sobre a escolha pela docência e analisam os desafios e, por vezes, dificul-
dades de exercer a docência compartilhada.
Inspirada em Traversini10 (2012), entendemos que a docência compartilhada exige o exercício de
alteridade, de generosidade, em que cada um pode expor suas ideias, promovendo a construção de um
processo de descoberta de várias maneiras de produzir a diferença docente. É através do olhar do outro, do
modo de agir, de se relacionar com os alunos e com a escola que o outro aprende e consegue experienciar
a docência, como explicita a autora:
A ação de compartilhar traz tensões para ambos os docentes, pois é a exposição mais
íntima e detalhada de suas crenças pedagógicas, é o embate entre a proposta planejada
para o aluno e a concretização da mesma (...) assumindo riscos, realizações e fracassos no
coletivo da turma. (...) cada um dos professores passa a fazer a desconstrução do seu modo
de ser docente para construir outro. (TRAVERSINI, 2012, p. 269)

Porém, as dificuldades que surgiram no início, durante a constituição do grupo, foram dando lugar
à seriedade que o trabalho docente exigia. O reconhecimento do trabalho coletivo foi ganhando espaço e
o respeito à diversidade e a docência compartilhada difundiu novos significados às integrantes do Projeto.
A docência compartilhada não só foi uma experiência de dividir tarefas entre os bolsistas, mas, também,
foi uma espécie de preparação para aprender a considerar a complexidade do trabalho com o outro, cons-
tituindo-se um exercício de perceber os significados da docência.

4. ITINERÁRIOS DE PESQUISA
Para a realização de um trabalho investigativo, cumpre definir qual tipo de abordagem será adotada.
Esta pesquisa é de cunho qualitativo e sugere um estudo de caso porque se investiga um grupo de pessoas
que participou do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID – e são alunas egres-
sas do Curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Logo se constituiu
uma pesquisa acerca de um determinado grupo considerando um tema delimitado e, assim, tem seus “con-
tornos claramente definidos” (LÜDKE E ANDRÉ, 1986 P. 17). Este estudo pode se assemelhar a outros
já pesquisados, pois trata sobre formação docente, porém, é singular e único, porque, em alguma medida,
se distingue dos demais estudos em função do tratamento conferido aos dados, ao olhar de pesquisador.
A investigação, portanto, situa-se como um “estudo de caso em educação” (SARMENTO, 2003). Para o
autor, o que caracteriza um estudo de caso é a especificidade, ou seja, a natureza singular do objeto de
incidência da investigação. Em suas palavras, o estudo de caso em educação:
[...] visa apreender a vida, tal qual ela é quotidianamente conduzida, simbolizada e inter-
10
Artigo escrito pelas professoras da Faculdade de Educação: Clarice Salete Traversini, Maria Luisa Merino de Freitas Xavier,
Maria Bernadette Castro Rodrigues, Maria Isabel Habkcost Dalla Zen e Nádia Geisa Silveira de Sousa.

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pretada pelos atores sociais nos seus contextos de ação. Ora, a vida é, por definição, plural
nas suas manifestações, imprevisível no seu desenvolvimento, expressa não apenas nas
palavras, mas também nas linguagens dos gestos e das formas, ambígua nos seus signifi-
cados e múltipla nas direções e sentidos por que se desdobra e percorre. (SARMENTO,
2003, p. 153)
Destaca-se que “a pesquisa qualitativa supõe o contato direto e prolongado do pesquisador com o
ambiente e a situação que está sendo investigada, via de regra através do trabalho intensivo de campo”
(LÜDKE E ANDRE, 1986 p. 11), o que se aplica às autoras deste texto, pois uma delas foi bolsista e a
outra coordenadora do PIBID Pedagogia. Outra característica referente a esse tipo de pesquisa são as vá-
rias possibilidades de produção de dados. A pesquisa valeu-se da entrevista semiestruturada, chamada de
“compreensiva” por Nadir Zago (2003, p.295), que consideramos ideal para produzir os materiais a serem
analisados. Segundo Zago, se faz necessário
(...) permitir a construção da problemática de estudo durante seu desenvolvimento e nas suas di-
ferentes etapas. Em razão disso, a entrevista compreensiva não tem uma estrutura rígida, isto é, as
questões previamente definidas podem sofrer alterações conforme o direcionamento que se quer
dar à investigação (ZAGO, 2003 p.295).
No intuito de procurar compreender os significados da experiência do PIBID, organizamos alguns
desdobramentos da investigação, no sentido de estabelecer relações entre as falas das entrevistadas. Pro-
curamos articular as narrativas, buscando pontos de aproximação e de distanciamento, valorizando as
percepções de cada narradora acerca das vivências oportunizadas como bolsistas do PIBID.
A seguir, apresentamos os sujeitos da pesquisa, quatro ex-bolsistas PIBID Pedagogia, egressas do
Curso de Pedagogia, e que estão distanciadas há pouco tempo da Universidade, inseridas em outros espa-
ços de estudo e profissionais:
Quadro 1: os sujeitos da pesquisa
Tempo que
Ano de con-
Idade permaneceu no Atuação profissional Formação
Nome clusão da
PIBID Peda- Atual continuada
graduação
gogia
Professora Educação
KABÁ Psicopedagogia e tecno-
31 anos 2 anos e 1 mês 2012 Infantil berçário/ creche
DAREBU logias da informação
da UFRGS
Professora Educação In-
1 ano e 6 Psicopedagogia e tecno-
AQUABE 24 anos 2012 fantil maternal II/ creche
meses logias da informação
da UFRGS
Se preparando para
ingressar no mestrado,
MNEMÓSINE 26 anos 2 anos 2013 Sem vínculo empregatício cursa uma disciplina
Pec na linha teórica
memória.
Professora Educação
Psicopedagogia e Tec-
IZEGBE 26 anos 9 meses 2012 Infantil Jardim B/ Creche
nologias da Informação
da UFRGS

FONTE: Elaborado pelas autoras.

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Atendendo aos procedimentos éticos da pesquisa, cada uma escolheu um nome que carrega signi-
ficados de suas aprendizagens no PIBID. Kabá Darebu é personagem de um livro de Daniel Munduruku
(2002). A entrevistada escolheu este nome porque é o título de um livro indígena muito apreciado por
ela e seu grupo na escola em que participou. A palavra Aquabe é de origem Charrua e quer dizer mulher
guerreira, forte e que batalha muito. Já o nome Mnemósine, alusivo à deusa da memória, foi escolhido por
conta das formações do PIBID sobre o tema da memória. Por último, Izegbe foi devido à aproximação da
temática afrodescendente, a qual a pesquisada teve maior afinidade. Após pesquisa na internet sobre no-
mes africanos, a entrevistada encontrou Izegbe11, se identificou com o significado, que quer dizer “criança
longamente esperada”, expressão que remete à sua história de vida, pois sua mãe sempre lhe contava sobre
o quanto esperou pelo nascimento da filha.
A faixa etária das entrevistadas está entre 24 a 31 anos. Kabá Darebu e a Mnemósine ingressaram
juntas no Projeto e tiveram, desde o início, as formações sobre a temática indígena, o que acarretou um
maior contato com esta cultura. Outro detalhe importante é que ambas permaneceram por mais tempo no
Projeto, dois anos, o que possibilitou uma maior experiência na sua trajetória e formação docente. Aquabe
entrou um pouco depois e não teve a mesma formação sobre a temática indígena. Ela precisou se apropriar
aos poucos, mas, mesmo assim, não encontrou dificuldades em trabalhar porque rapidamente se inteirou
do assunto. E Izegbe se inseriu no projeto quando o grupo já estava formado e as bolsistas já atuavam há
quase um ano nas escolas. Nessa etapa, estava sendo trabalhada a temática afrodescendente, o que per-
mitiu uma aproximação entre as duas culturas. Izegbe relata que foi muito incentivada a se inscrever no
PIBID por uma colega participante do projeto.
É importante destacar que essas aproximações entre as ex-bolsistas continuaram após o PIBID Peda-
gogia. Três das entrevistadas trabalham no mesmo local, na Creche da UFRGS, e fazem o mesmo curso de
pós-graduação em Psicopedagogia e Tecnologias da Informação. Isso nos faz refletir sobre o significado
das parcerias que se constroem ao longo do curso de graduação. É importante as pessoas se identificarem
nos grupos, isso possibilita a construção de vínculos permeados pelos afetos, criam-se amizades que po-
dem ultrapassar os limites da Universidade. A experiência de trabalho, a confiabilidade e a amizade entre
as ex-bolsistas proporcionados pela experiência no PIBID promoveu uma espécie de união entre elas. Isso
se reflete atualmente no ambiente de trabalho e na continuação dos estudos, buscando a qualificação do
trabalho docente. Percebe-se que foi possível estabelecerem essa aproximação com o mundo do trabalho
e a formação continuada por haver uma relação de confiança, construída a partir das vivências no PIBID.
Entretanto, há exceções, como o caso de Mnemósine, que tem perspectivas distintas e es-
colheu outras formas de aperfeiçoamento e busca para o trabalho. Ela pretende fazer o Curso de
Mestrado em Educação, e, para isso, está se qualificando, ou seja, fazendo uma disciplina PEC12
e estudando as bases teóricas que deseja pesquisar. Optou em se aproximar na linha teórica que discute
uma das temáticas que foram trabalhadas no PIBID Pedagogia, a memória.

5. AS ENTREVISTAS

Ao optar pela entrevista como ferramenta de produção de dados, consideramos o valor que esse
11
Disponível no site http://www.nomesafricanos.xpg.com.br/
12
Programa de Extensão continuada- PEC- é uma possibilidade que o programa de Pós-Graduação da FACED oferece a alunos
que desejam cursar disciplinas antes do ingresso oficial, como alunos do mestrado ou doutorado.

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procedimento traria à pesquisa, principalmente nas interações e intervenções com as depoentes porque
a “entrevista expressa realidades, sentimentos e cumplicidades que um instrumento com respostas es-
tandardizadas poderia ocultar, evidenciando a real a infundada neutralidade científica daquela pesquisa”
(ZAGO, 2003, p. 301), sendo assim, permite que se esclareça o que os narradores quiseram dizer com
determinado assunto.

Em se tratando de questões metodológicas, são valiosas as orientações de Nadir Zago (2003), que,
apesar de destacar a singularidade de cada investigação, apresenta reflexões acerca das entrevistas, ex-
pectativas, frustrações, possíveis idealizações que acontecem nos encontros com os narradores. Defende
a idéia de uma “entrevista compreensiva” (p. 296) que não guarda uma estrutura rígida e, portanto, pode
suscitar diferentes caminhos. Esta flexibilidade, que constitui uma peculiaridade da entrevista compreen-
siva, afasta-se de qualquer ideia de entrevista anárquica, espontaneísta, sem roteiro, sem objetivos a serem
atingidos. Foi fundamental, então, ter questões previamente definidas, por mais que tenham acontecido
alterações conforme o direcionamento da investigação.

Ao iniciar a conversa, foi igualmente importante apresentar às entrevistadas uma espécie de roteiro
da entrevista, a fim de que as mesmas se situassem e até mesmo se tranquilizassem quanto aos assuntos
que seriam temas do encontro. Então, entendemos que a entrevista devia se aproximar do que seria um
debate, uma conversação acerca do tema da pesquisa, procurando envolver ao máximo as narradoras na
trama da história. A entrevista compreensiva busca a objetivação, exige o engajamento do pesquisador, e,
por fim, esta forma de entrevistar permite a construção da problemática de estudo durante o seu desenvol-
vimento e nas suas diferentes etapas.

Para chegar aos temas que seriam discutidos, fizemos uma imersão no que seria necessário que
fosse abordado na conversa, buscando uma ligação com o objetivo do estudo que pudesse efetivamente
proporcionar maiores subsídios para as análises posteriores. Dessa forma, chegaram-se às questões que
vão ao encontro das intenções da pesquisa, que são as possíveis marcas do PIBID nessas ex-bolsistas.

Ao realizar entrevistas, é preciso estar atenta a todos os detalhes em torno das perguntas, como, por
exemplo, as pausas, as risadas, as dúvidas, os olhares, os gestos, as diferenças de entonação da voz, e que
surge ao longo do tempo em que a conversa desenrola. Outro detalhe importante é dialogar com o entre-
vistado, mas de forma que ele seja o protagonista porque “é preciso não esquecer que é do entrevistado o
lugar central do encontro e, por isso mesmo, um elemento fundamental é a manifestação de interesse pela
sua pessoa e pelo seu discurso” (ZAGO, 2003, p.303). Ou seja, é importante que o depoente fale mais que
o pesquisador.

Importa dizer que as entrevistas foram realizadas na própria Faculdade de Educação. Não foi uma
escolha aleatória, pois entendemos que esse lugar se constitui em um evocador de memórias. Embora
as ex-alunas, sujeitos da pesquisa, tenham concluído a graduação em Pedagogia recentemente, já estão,
em sua maioria, inseridas no mundo do trabalho e as vivências na FACED não fazem mais parte de seu
cotidiano. Portanto, acreditamos que, para aquelas moças, voltar ao prédio da Faculdade para lembrar da
experiência no PIBID tenha sido algo importante que permitiu o desenvolvimento do presente estudo.

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6. EXPERIÊNCIAS DO PIBID PEDAGOGIA: APRIMORANDO O FAZER DOCENTE
É interessante notar os diferentes motivos que levaram as ex-bolsistas a ingressarem no PIBID.
Primeiramente, como já mencionado, o Programa era novo na UFRGS, inédito, e, por isso, poucas gra-
duandas do Curso de Pedagogia fizeram a inscrição. Cada ex-bolsista relata de forma diferente os motivos
que as levaram até o PIBID.
Kabá Darebu diz que escolheu porque a proposta era interessante, aliava a pesquisa com a prática na
sala e atendia seu interesse que sempre foi o de permanecer na sala de aula com os alunos. Aquabe relata
que o que lhe atraiu foi o ineditismo do projeto na Pedagogia, além disso, queria saber o que era o PIBID,
ficou curiosa em saber o que se fazia. Mnemósine menciona que o que mais lhe chamou atenção foi a
possibilidade de estar incluída na sala de aula, de iniciar a prática docente. E, por fim, Izegbe relata que
escolheu entrar no PIBID por ouvir uma colega falar muito bem, e principalmente, porque estava afastada
da sala de aula e viu no PIBID a possibilidade de se “encantar” novamente. Em suas palavras:
Eu não quero trabalhar com escola, eu não sei o que vou fazer com essa pedagogia! Aí surgiu o
PIBID, a minha colega falava muito do PIBID, e daí pensei, já que surgiu as inscrições pra fazer a
seleção e tudo, eu vou tentar. Tentei e passei na seleção, daí ingressei, aí comecei a me apaixo-
nar novamente pela escola, pela sala de aula, pelas crianças. (Izegbe, entrevista em 16 de
outubro de 2013).

O relato de Izegbe faz refletir o quanto o PIBID foi importante para ela acreditar na profissão, e
vem ao encontro dos objetivos do Programa que é inserir os iniciantes e promover o encantamento pelo
ofício de ser professor, de experimentar e se inserir na escola. Ao analisar os motivos que cada uma das
pesquisadas elencou para ingressar no Projeto, percebemos que todas apresentam um aspecto em comum,
no sentido de valorizar a possibilidade do exercício da docência ainda no início da graduação.

7. NOTAS IMPORTANTES: ENGAJAMENTO DAS ESCOLAS, ALGUMAS IMPRESSÕES

Estar dentro da sala de aula sem ter a graduação concluída parece não ter sido algo simples para as
entrevistadas. No início, muitas bolsistas ainda não sabiam ao certo o que era o PIBID. Estavam construin-
do juntas, coordenadoras e bolsistas, o PIBID Pedagogia. Aos poucos, tiveram formações sobre a temática
indígena, aprenderam mais sobre o projeto e seu funcionamento. A inserção nas escolas ocorreu paralela-
mente, para que houvesse, desde o princípio, um estreitamento entre universidade e escola.

Nas escolas, nem sempre foi tranquila a permanência do projeto. Algumas supervisoras13, direção e
professoras, na escola, também não sabiam exatamente o que era o PIBID e tampouco entendiam as pro-
postas levadas para as turmas. O motivo do estranhamento, em geral, se deve pela falta de compreensão
de uma das características do projeto, ou seja, por que as atividades pensadas para o grupo de alunos eram
diferenciadas das práticas curriculares, pois eram feitas em forma de oficina e valorizavam vários espaços
da escola, como o pátio com as brincadeiras e jogos lúdicos, a sala de informática e outros.

Em uma das instituições de ensino, por exemplo, a supervisora não aceitava as propostas que as
13
Cada subprojeto do PIBID conta com uma coordenação que orienta os estudos e planejamento das ações que serão levadas
às escolas. Nas escolas, existe uma professora que também recebe uma bolsa para exercer a função de supervisão do projeto.
Essa pessoa constitui-se na referência para as bolsistas na escola e é responsável pelo acolhimento às mesmas e atendimento às
demandas necessárias para o desenvolvimento do trabalho.

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bolsistas apresentavam. Conforme o relato a seguir:
Ela [se referindo à supervisora do PIBID na escola] queria o PIBID, ela teve a informação
do que era o PIBID, mas na hora ela não queria o PIBID, ela queria que a gente desse uma
aula de reforço, somente, então, isso faz analisar que, às vezes, as escolas estão aceitan-
do o PIBID, mas não quer dizer que ela esteja de fato querendo o PIBID e entendendo
o PIBID, que é muito bonito tu dizer que tem um projeto da UFRGS na tua escola, com
bolsistas estudantes de pedagogia lá desenvolvendo o projeto sobre temática indígena,
sobre memória, sobre alfabetização e letramento, enfim, mas isso não quer dizer que elas
estão engajadas de fato com o projeto PIBID (Mnemósine, entrevista em 27 de setembro
de 2013).

Para as profissionais desta escola, pareceu ser difícil entender a proposta do PIBID, por compreen-
derem que as alunas de Pedagogia lá estavam para oferecer um reforço escolar. A gestão dessa instituição
sabia da proposta diferenciada do PIBID, mas isso não foi garantia de que se cumprissem os planejamen-
tos diferenciados da forma que era esperado pelo programa. Neste caso, o projeto era bonito de se ver no
papel, não na prática.
Muitas professoras questionavam a inserção do PIBID na escola, não acreditando nas propostas
planejadas para os alunos. Diziam que eles precisavam de mais atividades de Língua Portuguesa, de Mate-
mática, e estranhavam a temática indígena que foi longamente trabalhada, pois, se não era a semana do dia
do índio, então por que trabalhar tanto este assunto? É importante destacar que a Lei 11.645, que obriga o
ensino da temática indígena nas escolas é recente, e muitas escolas, na época que iniciou o PIBID, desco-
nheciam a legislação. Importa ainda destacar que essa escola permaneceu pouco tempo no projeto, e que
as bolsistas foram designadas para outra instituição. As experiências no PIBID foram múltiplas e cada uma
tem uma impressão da receptividade da escola em relação às propostas apresentadas.

Ao longo do tempo, o PIBID foi sendo compreendido pelas bolsistas, professoras, gestores e alunos,
e, aos poucos, foram se estabelecendo as parcerias com a comunidade escolar. Uma das escolas que iniciou
no Programa permaneceu, e nas outras duas escolas não foi possível dar continuidade devido à falta de
compreensão dos objetivos do PIBID. Essa foi a única escola que recebeu bem a proposta do PIBID desde
o início. Segundo Aquabe:
Depois que eu mudei de escola eu fiquei mais feliz. As gurias que já estavam lá me acolheram
muito bem, e muito bem mesmo! Foi muito legal nessa parte de estar lá, as crianças também
adoravam, mesmo que a escola era, as vezes, um pouco resistente, achando que a gente era
da informática, depois a gente foi explicando melhor o projeto, o que a gente ia fazer, construir
mesmo essa ideia das crianças, do PIBID, dos indígenas, enfim, a gente conseguiu fazer um traba-
lho bem legal. (Aquabe, entrevista em 18 de setembro de 2013).

Os alunos tiveram um papel fundamental para incentivar as futuras professoras a continuar no Pro-
grama, de fazer que a cada semana elas se sentissem instigadas a elaborar materiais e atividades diferentes
que despertassem nos alunos o desejo por conhecer melhor as temáticas trabalhadas. Isso se evidencia no
depoimento de Izegbe que fala da receptividade dos alunos:
Ir pra escola acho que era o dia mais feliz, a felicidade deles em ver a gente, e o tempo
inteiro mostrando uma motivação pra aprender o que a gente tava levando pra fazer, as
atividades diferenciadas, era muito caderno, muito quadro, giz e caderno, e a gente tava
levando tinta, brincadeira no pátio, brincadeiras indígenas que a gente levou para eles,

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atividades com tinta a gente levou pra fazer pintura no mapa da África, então, foi muito
trabalho, eram coisas muito diferentes do que eles tinham no dia-a-dia, então eles adora-
vam e mostravam que estavam felizes em estar participando (Izegbe, entrevista em 16 de
outubro de 2013).

8. DOCÊNCIA COMPARTILHADA, AUTONOMIA E COMPROMETIMENTO

A docência compartilhada é um dos aspectos de maior relevância do PIBID, pois a iniciação à do-
cência com mais de uma bolsista atuando juntas em sala de aula tem o intuito de que a professora iniciante
na escola possa dividir ideias com suas colegas. Sabe-se que nas escolas as professoras estão, geralmente,
sozinhas e têm que dar conta de inúmeras demandas, enfrentando desafios constantes em seu cotidiano de
trabalho. Exercitar a docência com um grupo de bolsistas iniciantes faz repensar a profissão professor que
é, muitas vezes, solitária (ALMEIDA; BERGAMASCHI, 2013).

Essa marca, além de ser algo valoroso do projeto, também foi a mais relevante nas professoras
entrevistadas, pois as três que trabalham na Creche da UFRGS mencionaram a importância de terem
compartilhado a docência no PIBID. Como na Creche elas trabalham com mais de uma profissional, a
experiência no PIBID facilitou a convivência com o outro, ensinou a partilhar as responsabilidades, a pla-
nejar atividades em conjunto, a dividir o espaço profissional com outras profissionais. Kabá Darebu relata
a importância que a experiência de dividir as ideias no PIBID com outras bolsistas teve em seu trabalho.
A gente trabalha em regime de docência compartilhada e bah, o PIBID fez toda a diferença pra
mim porque eu vejo isso bem forte, assim, com as outras colegas que não tiveram a mesma opor-
tunidade, não digo de trabalhar especificamente no PIBID, mas de trabalhar antes em docência
compartilhada é uma dificuldade, assim, de dividir ideias, chegar a uma conclusão ou de alguém
tomar uma iniciativa sabe, eu acho que isso o PIBID deu bem forte, não digo em questão de
liderança, mas de pelo menos de iniciativa de pró-atividade, isso o PIBID me deu (Kabá Darebu,
entrevista em 11 de setembro de 2013).

Ao avaliar a experiência proporcionada pelo PIBID, percebemos que se trata de algo peculiar na for-
mação das futuras pedagogas, tendo em vista a iniciação à docência que acontece para muitas pibidianas
logo no início do Curso de Pedagogia. Além disso, poder estar em sala de aula na modalidade de docência
compartilhada é algo raro e altamente formativo por permitir o exercício da alteridade, a possibilidade de
aprender com os outros, compartilhando sabores e dissabores do cotidiano escolar.

Um ponto bem positivo identificado é o desenvolvimento de uma certa autonomia, especialmente


a autogestão, aspectos enfatizados pelas coordenadoras do PIBID Pedagogia. Em suas palavras, “(...) é
importante que cada bolsista e seu grupo consigam exercitar a autonomia na condução do trabalho, sejam
responsáveis pela tomada de decisões e valorizadas por essas iniciativas” (ALMEIDA; BERGAMASCHI
2013).

Para as bolsistas, essa autonomia dada, no princípio, pareceu estranha, por não entenderem a impor-
tância da autogestão. Nas palavras de Kabá Darebu:
No início, eu achei que a gente ficava um pouco solta sabe? Eu achei que as coordenadoras tinham
que coordenar o grupo (risos), mas hoje eu vejo que, eu acho que a intenção delas era essa e hoje
eu vejo isso como bastante positivo, que me deu pelo menos, não posso falar em geral pelo grupo,

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EXPERIÊNCIAS DOCENTES NO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA:
POSSÍVEIS MARCAS NA CONSTITUIÇÃO DAS PROFESSORAS 35
embora acredito que tenha sido assim pra todas também, uma autonomia muito forte (...) porque é
fácil ser mandada, eu suponho que dá muito menos trabalho (risos), quando tu tem que pensar, tu
tem que decidir, tu tem que ir atrás, na hora, assim, principalmente quando tu está acostumada a
obedecer, a seguir o que já está estabelecido, dá uma desacomodação, assim, dá um, um
certo frenesi, como dá trabalho, não é fácil , mas hoje eu vejo como bastante positivo, assim,
e eu acho um dos pontos mais fortes (Kabá Darebu, entrevista em 11 de setembro de 2013).

Aliado à autonomia, foi evidenciado nas narrativas uma outra marca importante: o comprometi-
mento. As coordenadoras do PIBID sempre oportunizaram o exercício da autogestão em várias situações,
como planejamento, elaboração de materiais, diálogos com a escola, resolução de conflitos que surgiam,
tudo isso era confiado às bolsistas. Muitas levavam a sério todas essas questões, outras não. O que acon-
tecia é que algumas costumavam chegar atrasadas às reuniões, às vezes não iam às escolas, muitas vezes
não planejavam em conjunto, e isso era motivo de conflitos no grupo, porque apesar da valorização pela
autodeterminação do grupo, havia cobranças, prazos a cumprir, planejamentos a fazer e algumas bolsistas
mais engajadas se sentiam mais exigidas do que outras.
O que mais me incomodava era o comprometimento de algumas pessoas, a falta de comprometi-
mento, porque tu está ali dentro acho que não é só por receber a bolsa não, tu está ali dentro é para
uma formação a mais que tu tem da tua graduação. Não adianta nada tu ir lá, não ir na reunião ou
chegar muito atrasada, ou sair, nunca dizer o porquê disso, tu não tá nem aí sabe? E isso me inco-
modava bastante, eu acho que a falta de comprometimento mesmo, porque tu está comprometida,
tu está aí todo dia, tu está participando, daí tu vê e um chegava atrasado, tem outro que
não vem nunca, tá, recebe o mesmo salário no final do mês, sabe! (Izegbe, entrevista em
16 de outubro de 2013).

Entretanto, apesar de algumas experiências negativas com o grupo por se tratar de pessoas comple-
tamente diferentes, e isso era um exercício diário para compreender os modos e comportamentos de cada
um, se constata que a marca da autonomia fez com que as bolsistas valorizassem a tomada de decisões e
criassem suas responsabilidades para além do Projeto,, para sua formação docente.

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Escrever sobre o PIBID foi um exercício de reflexão. Participamos ativamente do Programa no


mesmo período das entrevistadas, uma enquanto bolsista e a outra como coordenadora. Devido a isso,
partilhamos e acompanhamos o crescimento dessas bolsistas e percebemos muitas das marcas deixadas
pelo Projeto.O PIBID Pedagogia é um lindo Projeto, que contribui na formação das alunas da Faculdade
de Educação/UFRGS. Essas marcas, a docência compartilhada, o incentivo à autonomia e ao compro-
metimento e as temáticas trabalhadas fazem parte de uma experiência singular de formação docente para
alunos e alunas dos cursos de licenciatura.

Percebe-se, pelas falas das ex-bolsistas, que todas tiveram boas experiências vivenciadas no Progra-
ma. Talvez, essas vivências positivas se devam ao fato de terem permanecido no PIBID por um tempo im-
portante de sua formação. Quem sabe esse possa ser o motivo delas só perceberem as boas aprendizagens?
Entretanto, cumpre destacar que os resultados dessa pesquisa têm estreita relação com o fato da escolha
por investigar as narrativas desse grupo de ex-bolsistas egressas do Curso de Pedagogia e que permanece-
ram no Projeto, por um tempo significativo de suas trajetórias acadêmicas. Devemos esclarecer ao leitor

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que nem todas as bolsistas que ingressam no projeto ali permaneceram. Muitas deixaram o PIBID por
várias questões. Para futuras pesquisas, é importante, também, investigar os motivos pelos quais muitas
abandonaram essa possibilidade de iniciação à docência.

O PIBID é uma política pública nacional ainda recente que cresce a cada ano nas universidades bra-
sileiras. Com esse estudo, esperamos poder contribuir um pouco para que futuros pesquisadores possam
se interessar pelo Programa, refletir e ampliar a discussão. Neste trabalho, foi possível apontar algumas
marcas que contribuíram na formação individual, dessas professoras e que acrescentaram na sua formação
acadêmica. É possível constatar que as bolsistas egressas carregam essas marcas para a sua profissão e
atuação docente, que levam essas experiências para a sua vida.

REFERÊNCIAS

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p.287 - 309.

DIÁLOGO, Canoas, n. 26, p. 25-36, ago. 2014. / ISSN 2238-9024

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