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Unidade I – Primeiras Noções 1

TEORIA GERAL DO
PROCESSO I

Professor: Italo Fioravanti Sabo Mendes

PROVA: DIA 8 de outubro

Sem consulta

Toda matéria até a véspera

Sumário

Unidade I – Primeiras Noções ............................................................................................. 3

Aula do dia 11 de agosto de 2015 .................................................................................... 3

1.1. Necessidades humanas. Bens da Vida. Interesses. Classificações. ................... 3

1.2. Conflitos intersubjetivos de interesses e formas espontâneas de composições. 5

Aula do dia 13 de agosto de 2015 .................................................................................... 7

1.3. Agravação do Conflito: Pretensão e Lide. Autocomposição. ............................ 7

1.4. Lide e Processo .................................................................................................. 9

Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo ....................... 10


2 Teoria geral do processo I

A. A antiguidade do Processo .................................................................................. 10

Aula do dia 18 de agosto de 2015 .................................................................................. 12

O Processo Romano do Período Clássico e suas Principais Características .................. 12

a) Período da Legis Actiones................................................................................ 12

b) Período Per Formulas ..................................................................................... 14

Aula do dia 20 de agosto de 2015 .................................................................................. 17

O Processo Romano do Período Clássico e suas Principais Características .................. 17

Aula do Dia 25 de agosto de 2015 ................................................................................. 21

O processo germânico, canônico e comum medieval .................................................... 21

Aula do dia 27 de agosto de 2015 .................................................................................. 25

Unidade III – Da Jurisdição ............................................................................................... 31

Aula do dia 01 de setembro de 2015 .............................................................................. 31

Teoria da Jurisdição ................................................................................................... 31

Aula do dia 03 de setembro de 2015 .............................................................................. 35

Tutela Jurisdicional .................................................................................................... 35

Aula do dia 04 de setembro de 2015 .............................................................................. 39

Princípios da Jurisdição ............................................................................................. 39

Aula do dia 08 de setembro de 2015 .............................................................................. 43

Princípios da Jurisdição ............................................................................................. 43

Os aspectos da Jurisdição........................................................................................... 46

Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional......................................................... 47

I. Fundamentos, Características e Finalidades Comuns às diversas Funções do


Estado Constitucional: Legislação, Adm. Pública e Jurisdição. ................................ 47

Aula do dia 10 de setembro de 2015 .............................................................................. 49

II. Jurisdição Contenciosa e Voluntária ............................................................... 53

Aula do dia 22 de setembro de 2015 .............................................................................. 54

Espécies de Jurisdição................................................................................................ 54
Unidade I – Primeiras Noções 3

Jurisdição e Organização Judiciária ............................................................................... 58

Aula do dia 24 de setembro de 2015 .......................................................................... 58

Aula do dia 29 de setembro de 2015y............................................................................ 68

Aula do dia 01 de outubro de 2015 ................................................................................ 79

A justiça especializada da união ................................................................................ 79

A Justiça do Trabalho, a Justiça Eleitoral e a Justiça Militar .................................... 79

Aula do dia 06 de outubro de 2015 ................................................................................ 86

Funções essenciais à Justiça....................................................................................... 88

Bibliografia ........................................................................................................................ 89

Unidade I – Primeiras Noções

Aula do dia 11 de agosto de 2015

Avaliação: 2 provas escritas – 1 meio do semestre e a outra no final do semestre. Média


Aritmética das duas provas.

1.1. Necessidades humanas. Bens da Vida. Interesses.


Classificações.

O ser humano para sua sobrevivência e aperfeiçoamento necessita de determinados


bens, necessita de determinados bens essenciais para sua sobrevivência ou
desenvolvimento, que chamamos de bens da vida. Os bens da vida portanto são os bens que
se destinam à utilização pelo ser humano. Qualquer bem que se destine a ser utilizado pelo
ser humano é um bem da vida. Em relação a esse bem da vida temos a sua utilização pelo
ser humano. Só que a utilização do bem da vida pelo ser humano está condicionada a seu
interesse, ou seja, o ser humano deve ter interesse pelo bem da vida. Há a necessidade de
um interesse recaindo sobre um bem da vida para que ele seja útil a alguém, dependendo
4 Teoria geral do processo I

desse quem. O interesse é a razão que se coloca ora maior ora menor entre um ser humano
e um determinado bem da vida, que pode ser maior ou menor. Portanto podemos dizer que
nós aferimos o interesse a partir de uma posição favorável do homem em relação a uma
necessidade e, portanto, em relação a um determinado bem da vida. Se ele tem um interesse
ele tem uma posição favorável em relação a um determinado bem da vida. A partir daí
dizemos que o sujeito/titular do interesse é o ser humano e o objeto é o bem da vida.

O interesse pode ser positivo ou negativo, em uma primeira classificação, sendo


positivo quando o ser humano exerce uma posição favorável em relação a um determinado
bem da vida, ele é importante para aquele ser humano, por outro lado ele será negativo
quando o ser humano não exerce uma posição favorável em relação a um determinado bem
da vida, ou seja, aquele bem da vida não é importante para o ser humano, nesse caso temos
um interesse negativo. Em outra classificação tomamos por parâmetro não mais uma
posição favorável em relação a um determinado
bem da vida, mas que essa posição favorável é
Individuais inerente àquele determinado bem da vida,
Interesses

Positivos Coletivos classificando esse interesse em interesse


Negativos Difusos individual, interesse coletivo e interesse difuso.
No interesse individual a relação ser humano bem
da vida é aferida do ponto de vista de um único
Figura 1 - Tipos de Interesses indivíduo, ou seja, aquela posição favorável do ser
humano em relação a um determinado bem da vida
é vista/analisada em um contexto individual1. No
caso de interesses coletivos a posição favorável em relação ao bem da vida é aferida em
relação não a um único indivíduo, mas a um grupo determinado de pessoas2. Podemos ter
ainda o interesse difuso, sendo que neste a relação que se coloca entre o bem da vida e o

1
Um médico que entra em uma ação contra o Estado para receber uma gratificação a qual ele faz jus, temos
nesse caso o sujeito o médico e o objeto (bem da vida) a gratificação, tendo então um interesse individual,
pois aferimos a relação ser humano  bem da vida a partir de um indivíduo.
2
No caso teríamos não um médico, ou não apenas esse médico a postular essa gratificação, mas o sindicato
dos médicos representando seus sindicalizados para que estes recebam essa gratificação, tendo ainda como
objeto (bem da vida) a gratificação, mas tendo como titular os médicos sindicalizados representados no
processo pelo sindicado, sendo um interesse coletivo porque podemos definir quem são esses médicos
sindicalizados como um número definido, sendo um interesse coletivo porque é um interesse que se coloca
entre o ser humano e o bem da vida, aferido o ser humano a partir de um grupo determinado de pessoas.
Unidade I – Primeiras Noções 5

ser humano é aferida a partir de um grupo indefinido/indeterminado de pessoas, todas


aqueles que em tese tem interesse por aquele mesmo bem da vida3.

1.2. Conflitos intersubjetivos de interesses e formas espontâneas


de composições.

O conflito intersubjetivo de interesse, também chamado unicamente de conflito de


interesse, podemos afirmar que se dá o conflito de interesses quando duas ou mais pessoas
tem interesse pelo mesmo bem que, todavia, só a uma pode atender. Ou seja, temos em
relação a um determinado bem da vida, mais de um titular com interesse sobre o mesmo
bem da vida. Só podemos falar na existência formal de um conflito de interesses quando
nos defrontamos com a circunstância de pelo menos duas exercerem interesse sobre o
mesmo bem, tendo uma posição favorável a um determinado bem da vida. Os bens da vida
são limitados, enquanto os interesses humanos são ilimitados. O querer mais das pessoas
gera um pensar em si, um individualismo, que não é acompanhado no mesmo percentual
pelos bens da vida. Numa sociedade em que o ter vale mais que o ser, temos os bens da
vida. A tendência da nossa sociedade é cada vez mais transformar-se em uma sociedade
conflituosa, e por isso deve ser uma sociedade preocupada em criar mecanismos sociais
para resolver esses conflitos, porque a experiência nos tem mostrado que o judiciário não
está dando conta como ente público encarregado de resolver os litígios, sendo por isso que
existem mecanismos extra-processuais de resolução de conflitos. O judiciário se encontra
incapaz de resolver esses conflitos, de um lado o materialismo que cria esses conflitos e
pressiona para que eles sejam resolvidos. Essa sociedade pós-moderna não admita conviver
com processos que levam tempo para serem resolvidos. O materialismo que gera esses
conflitos não suporta a demora para que esses conflitos sejam resolvidos. O processo é um
aspecto político da vida das pessoas, não existindo direito desvinculado da política e da

3
No caso de uma lei distrital que preveja que o GDF deve gastar 25% de seu orçamento com despesas
relacionadas a saúde, no entanto se verifica que está se gastando apenas 15% com a saúde. A partir daí o MPF
ajuíza uma ação para compelir o GDF a gastar o percentual previsto em lei de 25%. Nesse caso o bem da vida
é o percentual previsto no orçamento a ser utilizado na saúde, tendo como titular a comunidade do GDF,
todos aqueles que possam gozar do direito a saúde inerente a esse bem da vida. Nessa ação do MPF temos
um interesse difuso, que se difunde sem saber quem são os beneficiários, mas sabemos que todos têm interesse
que a saúde receba o percentual encontrado na lei. Temos, portanto um interesse difuso. Temos uma diferença
entre substituição processual, no caso o MPF que é a própria parte agindo como substituto processual, e a
representação processual, como no caso do sindicato, ainda que em alguns casos possa agir em substituição
processual.
6 Teoria geral do processo I

economia. Toda e qualquer norma jurídica traz no seu bojo um contexto histórico no qual
ela foi ditada, sendo esse contexto cheio de aspectos políticos, econômicos e sociais,
estando nós às vezes diante de uma norma, frente a qual só enxergamos a norma, sem ir
além dessa norma para analisar o conceito em que essa norma foi editada. O mais difícil
para o ser humano é se inserir no contexto histórico em que vive. Quem julga os conflitos
faz política no sentido de relação entre as pessoas. Em toda a relação entre seres humanos
a política está presente, e por isso podemos afirmar que, mantidas as condições atuais,
tendemos a uma sociedade cada vez mais conflituosa. A partir da constatação desse
contexto de conflito, precisamos buscar mecanismos de resolução desses conflitos,
mecanismos que a ciência social deve estar pronta para dar uma resposta, para resolver.
Podemos falar em conflito de interesses apenas quando há a mais de uma pessoa interessada
no mesmo bem. Podemos ter formas espontâneas de se resolver um conflito. A primeira
forma espontânea de resolução de um conflito é a violência. Outras formas espontâneas de
resolução de conflito podem ser, em primeiro lugar, a resolução moral. De um temor
mútuo, pode se chegar a uma decisão contratual. Temos ainda uma outra forma
espontânea de resolução de conflito que é a solução arbitral, também por temor reciproco,
escolhe-se um terceiro para escutar as duas partes e tomar uma decisão. Temos, portanto,
como formas de resolver um conflito: a violência, a não-violência, e dentro dela a solução
moral, a contratual e a arbitral, esta através de um terceiro neutro. A violência não
resolve, ela simplesmente gera mais violência, não sendo uma forma de resolver o conflito
de forma definitiva, ainda que o resolva em um primeiro momento. A solução moral
perdura enquanto prevalece o equilíbrio moral das pessoas, enquanto uma opinião é
mantida, não sendo também uma forma definitiva de resolver o conflito. O mesmo com a
contratual e a arbitral, porque as duas envolvem um temor recíproco entre as partes. Por
isso necessitamos de uma forma que resolva esse conflito que, formalmente, é o processo.
Unidade I – Primeiras Noções 7

Aula do dia 13 de agosto de 2015

1.3. Agravação do Conflito: Pretensão e Lide. Autocomposição.

Ocorre o conflito de interesses quando duas ou mais pessoas tem um interesse sobre
um mesmo bem que só a uma pode atender, havendo várias soluções espontâneas de
conflito, além do processo. Como regra que normalmente resolve os conflitos de interesses
temos a submissão do conflito ao comando estabelecido na lei, assim eventualmente se
temos um interesse por um bem eventualmente uma das partes não tem nenhum direito
assegurado, tendo em vista um comando estabelecido na norma, de sorte que falamos que
normalmente os conflitos de interesse são resolvidos pelo comando estabelecido na lei,
como regra geral. Isso faz com que no mais das
Figura 2 - Bens da Vida e Pretensão
vezes não tenhamos conflitos ou eles não
avancem, porque sabemos que a norma resguarda um determinado direito impossibilitando
o conflito. Às vezes a existência da norma não é o suficiente para resolver um conflito,
porque um dos conflitantes exige que o outro subordine o seu interesse ao interesse dele.
Em nome da função social da propriedade, podemos subordinar o interesse de um ao outro,
havendo uma agravação do conflito, porque um dos conflitantes não está subordinando
seu interesse ao interesse da lei, pressionando o outro a subordinar seu interesse ao seu.
Surge o fenômeno da pretensão, em uma situação mais grave em que já temos a pretensão,
exigência de subordinação de um interesse alheio ao interesse próprio, ou seja, o titular da
pretensão exige que o outro subordine seu interesse sobre um bem da vida ao interesse do
“eu”. Cabe àquele a quem foi exigido que subordinasse seu interesse ao do outro que (1) se
conforme à situação, acabando o conflito ou (2) ele resiste a essa subordinação, agravando
o conflito pela resistência à pretensão, tendo
então o fenômeno da lide ou litígio.
Bem da Resistência
Pretensão Identificamos na lide primeiramente um conflito
Vida à pretensão

intersubjetivo de interesses, uma qualificação


desse conflito pela pretensão, e um agravamento
ainda maior pela resistência a essa pretensão. A lide é, portanto, o conflito de interesses
qualificado agravado por uma pretensão resistida. Temos o conflito vindo sempre em um
crescente configurado pela pretensão.
8 Teoria geral do processo I

Formas de Resolução dos Litígios em sociedade

1. Por ato de um ou de ambos os litigantes


Temos um ou ambos os litigantes concordam em sacrificar total ou parcialmente o seu
interesse para assim colocar fim ao litígio. Ou temos um dos litigantes opondo a outro
o seu interesse e pondo fim ao litígio.
1.1. Autodefesa: na autodefesa temos um dos litigantes opondo a outro o seu interesse, e
assim encerrando o litígio. Temos no direito hipóteses de autodefesa em que o conflito
é resolvido através da força em detrimento do mais fraco, menos astuto, etc., como no
caso de legítima defesa, o estado de necessidade, a greve, situações contempladas
pelo direito em que se tem a prevalência do uso da força, com um dos titulares do
interesse em conflito opondo a sua vontade pela força.
1.2. Autocomposição: temos uma hipótese em que o conflito é resolvido na sociedade por
ato de um ou de ambos os conflitos e a partir daí se resolve o litígio chamado de
autocomposição em que se tem a atitude de um ou de ambos os conflitantes colocando
termo ao litígio. Pode se dar de três formas:
1.2.1. Desistência: identificamos uma renúncia à pretensão, ou seja, aquele indivíduo
titular da pretensão renuncia a ela. No momento que se abre mão da pretensão há
um ato que põe fim ao litígio.
1.2.2. Submissão: situação na qual o titular da pretensão mantém a pretensão, e há a
submissão do outro à pretensão do primeiro, renunciando à resistência inicialmente
oposta à pretensão.
1.2.3. Transação: temos um acordo entre os conflitantes em relação à pretensão e em
relação à resistência à pretensão, colocando fim ao litígio, porque ambos os
litigantes chegaram a um acordo mediante concessões mútuas.
2. Por ato de terceiros
Como atos de terceiros podemos ter:
2.1. Mediação: na mediação temos um terceiro mediando os litigantes, facilitando os
litigantes a chegar em um acordo que coloque fim ao litígio. O mediador vai sempre
buscar a autocomposição. Buscamos incentivar a mediação pela necessidade da busca
de mecanismos extraprocessuais, entre eles um dos mais importantes o da conciliação,
convocando, por exemplo, estudantes de direito, idosos, variando de local para local.
A questão da mediação é um dos elementos de maior futuro para o processo, pelo
Unidade I – Primeiras Noções 9

grande número de demandas do judiciário e uma estrutura judicial ser algo caro. Em
um contexto em que vivemos em um Estado com muitas demandas em outras áreas
(saúde, educação), o Estado tem outras reivindicações que não apenas a justiça,
precisando de mecanismos para resolver os litígios. Estamos em um ponto de
esgotamento, com o juiz devendo julgar responsavelmente, ao mesmo tempo que é
pressionado a julgar rapidamente.
2.2. Arbitragem: na arbitragem o árbitro não apenas irá mediar o conflito, mas dirá aquele
que tem a razão no conflito, e eventualmente aquele a quem ele entender que não tem
razão terá de conviver com as consequências. Na história do processo a arbitragem era
facultativa, com os próprios litigantes escolhendo o árbitro, mas passa a ser obrigatória
por ter um terceiro dizendo quem é o árbitro, não sendo mais de escolha dos litigantes,
chegando em um outro momento em que teremos um juiz oficial, um juiz servidor do
Estado encarregado de resolver os litígios pelo Estado e a essa atividade estatal que se
encarrega de resolver os litígios chamamos de jurisdição, essa atividade estatal na qual
um terceiro (juiz) se encarrega de resolver os litígio e se exerce através do processo, o
juiz resolvendo um caso através do processo.
2.3. Processo (pela via da jurisdição): a jurisdição é aquela atividade do Estado que por
intermédio do processo se resolve um litígio.

O ordálio, como a serviço de Deus, encontra-se dentro da classificação dos processos.

1.4. Lide e Processo

Lide vem a ser o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida. Na lide
identificamos um conflito que deve ser resolvido porque não interessa aos desígnios da
comunidade que no seio dela perdure um conflito, devendo ele ser resolvido para que a
sociedade possa viver em paz dentro do possível, e esse conflito deverá ser resolvido por
intermédio da lei, ou seja, o conflito será resolvido pela incidência da norma ao caso
concreto, assim teremos a resolução da lide. Portanto, falamos que a lide será composta
pela atuação da vontade da lei ao caso concreto, ou seja, aquela lei vau incidir e a partir daí
ser aplicada ao caso concreto. A lide será dirimida pela atuação da lei ao caso concreto. O
próprio Estado se encarrega de aplicar a lei ao caso concreto, sendo que o Estado não vai
aplicar a lei ao caso concreto sem ser através do processo. Por isso falamos que o processo
10 Teoria geral do processo I

é um instrumento da jurisdição. É o instrumento através do qual se aplicará a lei ao caso


concreto. O processo é um instrumento pelo qual a jurisdição aplicando a lei ao caso
concreto resolve o litígio.

Processo é o instrumento/meio de que se vale o Estado para, no exercício de sua função


jurisdicional, compor as lides (1º conceito de processo – conceito mais amplo do processo).
Nesse processo temos alguns pressupostos formais, como réu tendo oportunidade de
defesa, ser citado para se defender, as partes devem ter provas, etc. Aspectos para termos
uma forma válida e eficaz do Estado exercer sua função jurisdicional.

Unidade II – A evolução histórica do processo à


antiguidade do processo

A. A antiguidade do Processo

Onde há seres humanos há sempre a possibilidade de litígios e, portanto, dentro dessa


possibilidade de litígios, a sociedade deve criar mecanismos para resolver os litígios, e não
podemos dizer que os litígios são coisas novas temporalmente, porque sempre há
possibilidade de litígio onde há um grupo de pessoas. De qualquer maneira a resolução de
litígios implica sempre o exercício de um poder. No processo como meio de resolução de
litígios, está envolvido o exercício de um poder, mesmo em sua fase mais antiga, porque
em muitos aspectos quem resolvia o litígio exercia também um poder político, e em
algumas um poder político e religioso. No Egito Antigo tinha-se em primeiro momento o
Faraó resolvendo os litígios, encarnando o poder político e divino, fundindo esses dois
poderes. Mais adiante o faraó delega essa atividade para seus escribas, ainda tendo o poder
de dar a última palavra sobre os litígios, ilimitadamente, como detentor do poder político e
divino. Posteriormente identificamos já com um componente mais terreno e menos
espiritual já começando a ter a elaboração de normas escritas identificamos nos povos
assírios na Babilônia a figura do rei como aquela que não apenas ditava a norma mas
aplicava para resolver os conflitos, tendo como leis mais famosas o Código de Hamurabi,
tendo leis escritas para julgar os conflitos. Passamos a ter no povo hebreu novamente uma
influência maior da religião, influindo não apenas no exercício do poder político, mas
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 11

também no fenômeno da resolução dos litígios, havendo grande influência dos juízes na
Bíblia no Antigo Testamento, tendo como juiz mais famoso Salomão, tendo a fusão em
muitos aspectos a fusão de normas religiosas e normas de conduta, em principal os Dez
Mandamentos, que ditavam regras religiosas e de comportamento que iriam nortear os
juízes na aplicação da regra. Na figura do juiz, novamente, temos um poder político para
resolver o conflito ao mesmo tempo que temos uma regra religiosa. Temos o exemplo da
deusa grega Têmis, símbolo da justiça, mostrando a influência religiosa na justiça.

Na antiga Fenícia onde hoje está sobretudo o Líbano, tivemos a figura da resolução das
lides, principalmente do aspecto mercantil. Na antiga Pérsia a figura do juiz estava também
ligada à figura religiosa, até que chegamos na Grécia Antiga. Nela existia a figura do juiz
que julgava os litígios, ainda que não haja maiores escritos sobre isso, podemos antever
pela avançada filosofia política que existia na Grécia, sobretudo com Platão e Aristóteles,
que a Grécia tinha desenvolvido um avançado sistema de direito público, entre outros
aspectos, pelo incêndio da biblioteca de Alexandria, sobretudo, onde se guardavam os
documentos gregos, que pereceram nesse incêndio, sobrando poucos textos gregos. Os
textos romanos foram mantidos. Mas, a partir dos trabalhos da filosofia política, é possível
se assumir que um sistema avançado de direito público. Até hoje a filosofia política tem
uma divisão em teoria política Aristotélica e Platônica. Temos a organização das Cidades
Estado gregas. Sabemos que a Grécia tinha um sistema avançado de direito público, com
um julgamento realizado com a participação de 300 cidadãos, julgado através de pedras
brancas e escuras. Tínhamos na Grécia, pelo próprio nível avançado grego, um sistema de
resolução de litígio, que não conhecemos como sistema romano pelo perecimento desses
sistemas. Sabemos que na Grécia havia mecanismos de resolução de litígios, mas não o
conhecemos com a profundidade igual a qual conhecemos o direito romano.
12 Teoria geral do processo I

Aula do dia 18 de agosto de 2015

O Processo Romano do Período Clássico e suas Principais


Características

O processo romano na sua evolução até a queda do Império Romano passou por três
fase/períodos. Consideramos o Processo Romano do Período Clássico o processo romano
até a queda do império romano, passando por três períodos.

a) Período da Legis Actiones

Também conhecido como período das ações das leis. Esse período vai da fundação de
Roma, por volta do ano de 754 a. C. até o ano 149 a. C., quando temos a edição da Lei
Aebutia, marco para o final da Legis Actiones. Recebe o nome de período das ações da lei
porque, para que a ação pudesse ser admitida, ela deveria estar prevista na lei. Só poderia
existir uma ação se ela estivesse prevista na lei, sendo a mais importante a Lei das Doze
Tábuas. A pretensão do autor deveria estar agasalhada na norma, na lei, para que a ação
pudesse ser admitida. Mostra-se primeiramente o aspecto forma da Legis Actiones, que só
pode haver ação agasalhada pela lei, e fora da lei não há ação. Nesse período o processo
romano tinha um procedimento extremamente formalista em que as solenidades deveriam
ser rigorosamente observadas sob pena de se entender que aquela ação não estava prevista
na lei, e, portanto, não havia ação. O procedimento além de formalista era inteiramente
oral, em que as partes deveriam comparecer obrigatoriamente, acompanhadas de parentes
e amigos, sem o comparecimento obrigatório das partes não havia como se ter o processo.
Caso o réu não quisesse comparecer, o autor estava autorizado a usar a força para levar o
réu perante o magistrado. Como o procedimento era inteiramente oral, os parentes e amigos
serviam como testemunhas dos fatos. O magistrado romano examinava primeiramente a
pretensão do autor afirmando a queixa que tinha em relação ao réu. Diante da queixa,
ouvindo a pretensão do autor, o magistrado romano iria ouvir o réu, confirmando ou
negando a pretensão. O magistrado iria ouvir autor e réu e diante do que as partes
afirmaram, o magistrado iria verificar se havia ação. Nesse período da Legis Actiones o
procedimento se divide em duas partes:
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 13

i. in iure: fase que se dá perante o magistrado em que são escutadas as queixas


das partes. Nessa fase iure perante o magistrado, este escutará a pretensão do
autor e a resistência do réu e irá verificar se diante da pretensão dou autor e
resistência oposta, se a pretensão do réu está prevista na lei. Se o pretor perceber
que a lei não prevê aquela situação, afirmará que a pretensão não terá lei que
ampare, não cabendo a sua reclamação. Verificada a previsão de situações como
a narrada pelo autor, este tem então a actio, ou seja, aquela pretensão do autor
está agasalhada na lei. Portanto, se o magistrado entende que aquela pretensão
está amparada pela lei, irá afirmar apenas que o autor tem a actio. Se ele
entender que o autor não tem a actio, o processo acaba ali mesmo. Se
reconhecida a actio, o processo pode prosseguir, havendo o fenômeno da
Litiscontestatio, que existia apenas diante da actio. A litiscontestatio era o
fenômeno que existia e quando reconhecida sua presença estabelecia um
vínculo entre as partes, entre autor e réu, com a litiscontestatio delimitava-se o
objeto do litígio, não podendo ser modificada a partir dali, e também a partir
dela as partes se obrigavam a comparecer a todos os atos do processo e dar
integral cumprimento ao que fosse decidido por sentença. O litígio era o ponto
a ser resolvido. O comparecimento de testemunhas deveria deixar claro o litígio
a ser respondido e a obrigação das partes de cumprir o determinado na sentença.
Após a litiscontestatio 4 se findava a primeira parte do processo, cabendo às
partes escolher um iudex ou arbiter que de fato julgaria o processo na fase do
iudicium; O trabalho do pretor acaba aqui. Portanto, a colheita da prova se dará
frente ao iudex ou arbiter escolhido de comum acordo pelo autor e pelo réu.
Esse iudex/arbiter não era servidor do Estado Romano.
ii. in iudicium: temos as provas e a posterior sentença a ser decidido pelo
iudex/arbiter

As características do processo romano neste período eram a existência de um


procedimento extremamente formalista em que as formalidades deveriam ser
rigorosamente observadas, pois uma palavra podia modificar a existência ou não da
actio. A segunda característica era um procedimento completamente oral. A terceira

4
Escolha do iudex/arbiter pautado pela litiscontestatio porque define qual a lide definida na lei a partir da
qual o iudex iria julgar o litígio.
14 Teoria geral do processo I

característica era a apresentação obrigatória do comparecimento das partes que não


podiam se fazer representar por juristas ou procuratores, que ainda não havia. A quarta
característica era, reconhecida a actio, estabelecia-se a litiscontestatio com todos os
seus efeitos. A quinta característica era um procedimento dividido em duas fases, a in
Iuri perante um magistrado romano, na qual se verificava a existência ou não da actio,
e a fase in indicium, perante o iudex/arbiter na qual se tinha a produção das provas e
posterior sentença, sempre o pagamento de uma soma em dinheiro. Não havia um
direito público, mas a discussão do papel do pretor, tendo o Estado romano o mesmo
tratamento de um cidadão qualquer. Esse período, portanto, e esse processo da legis
actiones vai até o ano 149 a. C., com Roma já uma potência política, econômica e
militar, acontece um processo de imigração, atraindo para suas fronteiras, se dando um
processo de expansão, sobretudo as populações do mediterrâneo e mar adriático
(gregos, trácios, “croatas”, “servos”), mas com leis do período destinada
exclusivamente para cidadãos romanos. Os magistrados que compreendiam a actio
passam a ser autorizados a resolver os casos também desses estrangeiros, mas como
fazer quando essas partes não sabem nem o idioma?

b) Período Per Formulas

Períodos formulário, ou período clássico em sentido estrito. Para resolver o problema


de compreensão, tínhamos documentos escritos que sintetizavam o conteúdo da
demanda e era entregue para os demandantes (autor e réu) desde que se compreendesse
a presença do réu. Era um procedimento que se originava das formulas, os formulários,
que se voltava para os cidadãos estrangeiros, sendo que o pretor começou a criar esse
procedimento escrito para estrangeiros em caso de flagrante injustiça. Os pretores,
mesmo não tendo previsão legal, começaram a criar esses documentos escritos e
reconhecer aí a presença da actio, quando surge em 149 a. C. a Lei Aebutia que
legalizou esse procedimento do período formulário, que antes não era previsto. Essa
atividade que os pretores exerciam através da fórmula foi legalizada por essa lei. Só
que com o passar do tempo esse procedimento que se voltava para os estrangeiros se
mostrou mais eficiente que a Legis Actiones. Mais tarde o Estado faz editar as Lex Julia
para aplicar esse procedimento a todos os processos no âmbito do Estado Romano.
Essas duas Lex Julia ampliam o formulário a todo o processo. Assim nasce o
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 15

procedimento formulário, sendo a fórmula um pequeno documento escrito que o pretor


guardava em seu livro de fórmulas chamado edito, livro de fórmulas do pretor. A
medida que o pretor tinha uma fórmula para aquela demanda ele a guardava em seu
livro de fórmula, sendo que quando as partes chegavam ele pedia que elas olhassem no
livro de fórmulas uma semelhante à sua demanda. O estrangeiro poderia verificar pela
leitura se havia um caso semelhante. A fórmula, portanto, era esse documento escrito
que o pretor tinha em seu edito que expressava a demanda e que era construído com a
colaboração das partes. Quando não havia fórmula e não era possível uma fórmula para
aquela demanda, não havia actio. “Consistia a fórmula em um pequeno documento
fundado em modelo já publicado pelo pretor em seu edito e que, na ocasião, elaborada
perante esse magistrado, com a colaboração das partes e do próprio magistrado, destina
a concretizar por escrito as pretensões das partes e a fixar a missão do juiz, no mesmo
documento indicado para decidir a causa5”. A fórmula estava em constante processo de
construção, como se o direito estivesse o tempo todo sendo construído pelo trabalho do
pretor. Alguns consideram o processo romano desse período o mais evoluído do
processo romano.

Também se dividia em dois períodos:

i. In iure: também as partes deveriam comparecer pessoalmente perante o pretor,


só que nessa fase a parte já podia ser assistida por um jurista, por um procurador.
As partes, portanto, compareciam perante o pretor, autor e réu, com
comparecimento obrigatório. Nesse momento, comparecendo autor e réu
perante o pretor, se escutava a pretensão (autor) e a resistência (réu) e nesse
momento os três iriam verificar a existência de uma fórmula correspondente
àquela pretensão. Se não houvesse uma fórmula correspondente àquela
pretensão, iria ouvir se outra fórmula que estava no edito poder ser construída
para aquela demanda. Nesse sentido havia uma participação das partes para
construção de uma nova fórmula. Se existia uma fórmula na fase iure de haver
então uma actio. No caso de não haver fórmula ou fórmula possível de
adaptação correspondendo à pretensão, nesse caso não havia actio. O processo
terminava, pois sem a fórmula não havia a actio. As fórmulas não eram

5
SANTOS, Moacir Amaral.
16 Teoria geral do processo I

uniformes entre os pretores, pois cada pretor tinha o seu edito. Havia uma
sistematização do magistério, sendo um prêmio o exercício da magistratura.

Na presença de uma fórmula, ou conhecida uma nova fórmula, se estabelecia a


litiscontestatio com mesmo significado do período anterior, estabelecendo um
vínculo entre as partes por meio do qual a lide ficava delimitada e por ela as
partes se obrigavam a comparecer a todos os atos do projeto e a dar
cumprimento ao que fosse decidido pela sentença. Nesse momento em que o
magistrado verificava a presença da forma, ou construía uma nova, verificando
a actio e a litiscontestatio, acabava o papel do magistrado. As partes deveriam
então indicar um iudex/arbiter ou um colegiado de iudex, porque perante ele
teremos a colheita das provas.

ii. In iudicium: aqui teremos a coleta das provas e a posterior sentença perante o
iudex/arbiter, não necessitando mais a decisão sobre o iudex/arbiter ser de
comum acordo das partes. Se as partes não chegassem a um comum acordo
sobre o iudex/arbiter ele seria indicado pelo pretor segundo os nomes de pessoas
que exerciam esse papel. Se houvesse acordo entre autor e réu estaria resolvido
o problema. Diante da ausência de acordo, o pretor entrava em ação. Tinha
início a fase in iudicium.

O procedimento continuava a ser oral, somente a fórmula era escrita, portanto no


âmbito do procedimento do período formulário continuava a ser oral, embora tivesse a
fórmula escrita. Portanto, no procedimento do período do formulário todos os atos eram
orais salvo a fórmula que era escrita. A fórmula delimitava o objeto do litígio. Na
fórmula já constava o nome do juiz, porque as partes de posse da fórmula que iriam
procurar o iudex/arbiter.
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 17

Aula do dia 20 de agosto de 2015

O Processo Romano do Período Clássico e suas Principais


Características

b) Período Per Formulas

Características desse processo:

(1) O procedimento era preponderantemente oral, sendo que somente fórmula era
escrita.
(2) Procedimento despido das formalidades que caracterizavam o período anterior da
Legis Actiones. Por ser um procedimento voltado para estrangeiros que muitas
vezes não entendiam a língua latina, era necessário um procedimento mais simples
para integrá-los.
(3) O procedimento era dividido em duas fases: a fase in Iuri, perante um magistrado,
o pretor, e a fase in iudicium, perante o iudex ou arbitrer que iria julgar a causa.
(4) Na fase in Iuri resolvia-se a questão pertinente à actio e se tinha, se fosse o caso, a
entrega da fórmula, documento escrito com base no qual o iudex ou arbitrer iria se
pautar para proferir a sentença.
(5) Comparecimento obrigatório das partes, que, todavia, poderiam ser assistidas por
procuradores e orientadas por juristas. As partes, portanto, deveriam comparecer
obrigatoriamente, mas, contrário ao que acontecia na fase anterior, já se apresentava
o início da atividade/carreira jurídica como atividade profissional.
(6) Os atos processuais se desenvolviam com a audiência e a contrariedade recíprocas
entre as partes. Aquilo que o autor afirmava, o réu tinha a oportunidade de
contrariedade, e vice-versa. Ocorre o próprio surgimento do contraditório, a
possibilidade das partes se contradizerem mutuamente, a contradição entre as partes
que resulta na sentença.
(7) A produção da prova incumbia a quem alegava o fato, o chamado ônus da prova,
que necessita provar aquele que alega o fato.
18 Teoria geral do processo I

(8) O juiz apreciava livremente a prova e com base nela formava sua convicção. Temos
também aqui a origem de outro princípio processual da livre convicção do juiz, com
inteira liberdade para formar o seu convencimento.
(9) O juiz condenava o réu a uma soma em dinheiro, ainda que o pedido fosse a entrega
de uma coisa. Por força da lidiscontestatio se obrigam a cumprir o que fosse
decidido.

c) Período da Cognitio Extraordinaria

Esse período surge com o imperador Diocreciano no ano de 294 d. C., e vai
aproximadamente até a codificação de Justiniano, 394 a 398 d. C., após a queda de Roma.
Recebe esse nome para se diferenciar da cognitio ordinária, do período per formulas, a
cognitio extraodinaria surge designada para determinados processos, surgindo
originalmente para as causas em que havia a introdução do Estado romano, que seriam
julgadas por um único magistrado, não mais necessitando de um iudex ou arbitrer, havendo
a função de julgar designada a um servidor, um magistrado, que iria conduzir o processo
de seu início até o final. Nesse período passamos a ter um magistrado que não apenas
verificava se havia actio ou formula correspondente, mas também vai
examinar/verificar/dirigir todo o processo desde seu início ao cumprimento da sentença.
Tivemos nesse período a criação da figura do juiz oficial, funcionário do Estado
encarregado de resolver as lides, os litígios, desde seu início até o final. Temos a atribuição
da função de julgar para um servidor do Estado. Antes quem julgava não era o Estado, mas
um particular. Há a delegação do Estado romano para o exercício da função. Temos como
consequências da criação desse juízo especial, não havendo o sentido da divisão do
processo em duas partes. Não há mais sentido na lidiscontestatio, porque tanto importava
a vontade das partes, porque o Estado era quem estava decidido. Nesse período a cognitio
extraordinária apresentava o emprego da linguagem escrita com mais presença que os
outros.

(1) O procedimento na cognitio extraordinária tenha início com a petição inicial,


que era escrita e recebia o nome de Libellus Conventiones.
(2) A petição inicial em ordem, o juiz iria determinar a citação do réu que recebia
o nome Litir Denuntiatio. Já era feita por um servidor auxiliar do magistrado.
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 19

(3) O réu apresentava então a sua contestação que recebia o nome de Libellus
Contradictiones ou Libellus Respontionis.
(4) Eram então produzidas as provas, chamadas de probatio. Podia ser oral, no caso
de testemunha, ou escrita, no caso de documento.
(5) Era então produzida a sentença, denominada sententia. Também escrita.

Uma vez proferida a sentença do Magistrado, um dos mais altos cargos do


império romano, era cabível o recurso ao imperador.

(6) O recurso recebia o nome de Appellatio na expectativa de que uma entidade


superior poderia corrigir um erro cometido pelo magistrado. Admitia-se esse
recurso para todos os projetos, com o Imperador escolhendo posteriormente um
grupo de servidores para analisar essas appellatio, havendo a origem dos
tribunais recursais para analisar os recursos enviados ao Imperador, tendo o
poder de rever o que foi decidido em sentença. É natural que aquela parte que
tem uma decisão desfavorável vai buscar uma revisão dessa decisão. O
magistrado exerce um poder, ele julga, mas no momento em que o Imperador
examina a appellatio ele toma conhecimento de tudo que acontece nas
províncias do Império, podendo tomar atitudes de forma a evitar rebeliões,
sendo que o magistrado que não encaminhasse ao imperador a appellatio era
punido com a morte, pois era a forma de o Imperador saber o que acontecia nas
províncias limítrofes do Império Romano. A partir do momento que ele começa
a analisar as appellatio ele sabe o que ocorrem em seu Império, de forma que o
conselho que julga a appellatio era de sua confiança devendo delatar qualquer
magistrado que se posicionasse de forma contrária. Praticamente no final do
Império romano do Ocidente ela é aplicada, continuando após a queda do
Império, com um fator político por trás da apelação, e do próprio processo, não
sendo possível direito/processo desvinculado da política, sendo formas de
exercício do poder político também. Toda vez que um juiz elabora uma sentença
ele está realizando um poder político. Nos períodos anteriores não havia
appellatio, porque a sentença era proferida por particular.

A diferenciação entre direito público e privado nasce aqui.


20 Teoria geral do processo I

As características do Processo Romano nesse período eram:

(1) A criação do juiz especial como funcionário do Estado encarregado de prestar a


jurisdição e assim compor as lides.
(2) Forte emprego da linguagem escrita.
(3) Citação do réu levada a efeito por um auxiliar da jurisdição, o que demonstra o
início do aparato estatal da jurisdição.
(4) Desnecessidade da divisão do procedimento em duas fases, in Iuri e in iudicium
como se dava nos períodos anteriores da legis actiones e per formulas.
(5) Possibilidade de prosseguimento do processo à revelia do réu (não é necessário
que ele compareça, podendo prosseguir sem a defesa ou a presença do réu).
(6) Desnecessidade da lidiscontestatio com o sentido que tinha nos períodos
anteriores, tendo em vista que o processo era conduzido desde seu início ao final
por um magistrado que encarnava/simbolizava o próprio Império romano, ou
seja, não haveria a necessidade da aceitação das partes para que se desse
cumprimento ao processo.
(7) Sentença proferida por um funcionário do Estado romano investido dos poderes
para tanto necessários, ou seja, no momento em que o imperador nomeava um
magistrado lhe era dado o poder para que ele em nome do Império/Estado
resolvesse as lides.
(8) Possibilidade da interposição de recurso (appellatio) destinado a impugnar a
sentença que tenha sido proferida.
(9) Possibilidade da execução da sentença por força de medidas coativas do Estado.
Por isso temos aqui a execução: o Estado romano tomava medidas para compelir
o cumprimento da sentença, não havendo necessidade de aprovação das partes.

Na modernidade, temos a fase da petição inicial, que, se adequada, dá


prosseguimento ao caso, senão há pedido de emenda da petição. Ocorre então a citação do
réu e é exercido seu direito de contestação e, em seguida, o prazo de dez dias para a réplica
do autor da petição. Em seguida, temos a elaboração das provas a serem apresentadas
(documentadas, testemunhais), com o prazo de dez dias de avaliação, havendo a
determinação da sentença. Havendo os recursos, ou passado o prazo de recursos, temos a
execução. É possível observar a semelhança entre o processo da Cognitio Extraordinaria e
o nosso processo atual, e como o primeiro serviu de base para o segundo, sendo possível
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 21

questionar se o processo romano que era tão moderno, ou o nosso que ficou estagnado,
utilizando ainda o processo do séc. III/IV da era cristã para resolver litígios do século XXI,
quando temos bens limitados para interesses ilimitados. Seria o momento de buscarmos
novos mecanismos de solução de litígios? Será que são suficientes para resolver a contento
as lides?

Já havia nessa época servidores públicos para representar o Estado.

Aula do Dia 25 de agosto de 2015

O processo germânico, canônico e comum medieval

O processo romano no período da cognitio extraordinária percebe-se um processo


bastante evoluído com início no século III da era cristã que vai até o Império romano do
Oriente até a codificação de Justiniano (394/398 d. C.). Temos um evento importante na
queda do Império Romano do Ocidente no ano 476 da era cristã, aproximadamente, com o
povo germânico rompendo as barreiras do Império Romano tendo a queda de Roma. Diante
desse fenômeno histórico, temos a transferência de manifestações culturais e sociais. Com
a queda do Império Romano do Ocidente tivemos o encontro de instituições processuais
extremamente avançadas, como era o caso do processo romano, e extremamente atrasadas
como o processo germânico, que na época do encontro era um processo bastante
rudimentar, tendo como titular da jurisdição o povo, ou seja, a chamada Assembleia
Popular dos Homens Livres, que julgava os litígios e era conhecida com o nome de Ding,
participando dela todos os homens livres quando haviam conflitos. A Ding era presidida
pelo chefe da tribo que a convocava quando havia um litígio e dirigia os trabalhos. Esse
chefe mais tarde virá a ser o Senhor Feudal. Quando havia litígios de menor importância
na ótica desse chefe tribal, convocava-se Dings menores, que eram chefiadas por um
delegado do senhor feudal, ou um delegado desse chefe da tribo. Diante do conflito
tínhamos esse conflito sendo levado à Assembleia Popular dos Homens Livres onde se
resolvia os conflitos. O procedimento no processo germânico era inteiramente oral, que se
dava perante a totalidade dos homens livres que iam à Assembleia. O Senhor Feudal, chefe
da tribo, tinha como papel orientar a Assembleia relembrando com a Assembleia casos
anteriores que ela já havia julgado da mesma maneira, e orientava quanto às provas a serem
22 Teoria geral do processo I

produzidas e eventuais regras que poderiam ser aplicadas, apenas orientando a Assembleia.
As leis eram sobretudo orais pela força do costume. O sistema probatório perante a
Assembleia dos homens livres era bastante rudimentar, prevalecendo ali o juramento,
chamava-se ambos os litigantes ao juramento, e prevalecendo também as ordálias ou juízos
de Deus, sendo comum estabelecer uma prova para que ambos os litigantes pudessem
passar pela prova (andar sobre brasas, duelo). Era um sistema rudimentar em que a sentença
resolvia definitivamente o conflito vinculava todos os participantes da Assembleia, ou seja,
um litígio sobre a propriedade, por exemplo, de um cavalo, resolvido o conflito estabelecia-
se a posse do animal e vinculava a todos os membros da tribo. Não cabia recurso, porque
não havia instância superior à Ding. Por conta disso, o que deliberava a Ding era a palavra
final. Esse foi o processo germânico que se encontrou com o processo romano da cognitio
extraordinaria.

Temos resquícios do processo germânico em seus primórdios, como o caso do


tribunal do júri e do juramento. No nosso sistema jurídico romanístico, não há o juramento,
que é reminiscência do processo germânico. O júri pressupõe o julgamento das pessoas
perante a população, que temos, no Brasil, nos casos de crime contra a vida. O papel do
juiz no júri é muito parecido com o do senhor feudal na Ding, proferindo a sentença de
acordo com o que apontam os jurados. O júri normalmente é formado por leigos, e por isso
às vezes toma decisões sem sentido, mas ninguém critica o júri, mesmo quando a decisão
do corpo de sentença conduz à impunidade, porque é vista como uma decisão tomada por
pessoas do povo. Esse fenômeno do júri é levado ao extremo no caso americano pela
presença constante desse. Nos EUA se fala em Corte, mesmo que seja uma corte de um
juiz, porque aí se infere que se reuni um colegiado, o júri, sendo um resquício do processo
germânico, da Ding, da Assembleia popular dos homens livres. Temos outro aspecto
importante para a força dos precedentes, dos costumes, a força do precedente
jurisprudencial do chefe da tribo. O sistema atual germânico se aproxima mais do processo
românico do que saxônico. Esse processo, portanto, que se encontra com o romano da
cognitio extraordinária, resultando do encontro desses processos o processo romano-
barbárico.

O processo romano-barbárico era o processo que resultava da mescla de instituições


do processo românico com o processo germânico. Esse processo foi o que começou a ser
aplicado a partir da queda do Império Romano do Ocidente.
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 23

Direito canônico e processo canônico

Referindo-se ao direito canônico e ao processo canônico, vemos uma busca de reger


a vida no âmbito da Igreja Católica. As questões que envolvessem a Igreja católica em suas
relações internas e externas, entre a Igreja e seus membros (clero) e outras instituições,
aplicava-se o direito canônico de fundo eminentemente românico. O processo canônico era
um processo baseado no processo romano da cognitio extraordinária. Esse processo foi
fundamental pela prevalência do Direito Romano. Com a queda do Império Romano do
Ocidente, grande parte dos textos romanos foram parar nos mosteiros e ali ficaram, não
sendo apenas conservado, mas servindo para o direito e o processo canônico, que tinha por
base quase exclusiva a cognitio extraordinária. Aplicava-se no âmbito do direito canônico
nas Igrejas Católicas e os textos conservados nos mosteiros. O processo que aplica nesse
contexto histórico de Igrejas guardando documentos românicos. Para regular as questões
normais dos indivíduos se aplicava o processo romano-barbárico, que resultava da mescla
de instituições germânicas e românicas, com o processo canônico vinculado à Igreja
Católica. O processo romano surge eventualmente em um retorno ao processo românico
que estava adormecido a partir da criação/fundação das Universidades, sendo a primeira
fundada no ano de 1088 a Universidade de Bolonha. Um dos fundadores dessa
Universidade foi um monge que se transformava nas horas vagas em um grande estudioso
do processo romano de nome Irnérius. Ao fundar a universidade assumiu a cátedra da
cadeira de direito romano da Universidade, sendo conhecido como o Archote, o farol do
direito. Deu uma nova dimensão ao Estudo do Direito Romano, começando a estudar os
textos romanos que estavam nos mosteiros, e esse estudo se fazia através de anotações nos
próprios textos recebendo o nome de glosas, sendo conhecido também o fundador da escola
dos glosadores, por se dedicarem ao estudo dos textos escrevendo à mão nos próprios textos
romanos, estudando o direito romano e fazendo uma comparação com o direito que se
vivenciava. Dentre os principais membros da escola dos glosadores estavam Bulgaro,
Piacentinno e Giovanni Baciano, principais discípulos de Irnérius membros da escola dos
glosadores. Estudavam através da glosa analisando a questão do direito romano e fazendo
uma comparação entre o processo romano da época com aquele realizado na época que se
redigia as provas. Surge posteriormente a Irnérius, outro que também estudava através das
glosas mas com maior ênfase na prática forense que era Acursio, fundando a escola dos
pós-glosadores.
24 Teoria geral do processo I

As duas escolas estudavam o direito e o processo romano por intermédio das glosas,
mas Acursio dava uma maior ênfase prática forense, com ele e seus discípulos fazendo uma
comparação com o processo que viviam naquele contexto histórico, buscando uma
justificativa para aplicação desse conhecimento. Seus principais discípulos foram: Baldo,
Ferrari e Bartolo de Sassu Ferrato. Bartolo foi um jurista tão consagrado com grande
influência no nosso ordenamento sendo erigido à função de Fonte do direito.

A base do processo ibérico que deu as bases processuais brasileiras está no direito
dos goudos, sobretudo visigoudos e oustragoudos, com base em uma perspectiva gótica.
Esse direito gótico dos goudos que serviu de base para o direito ibérico que considerava
Bartolo como fonte do direito. Começamos a ter a partir de Irnérius e Acursio uma essência
muito maior, ressurgindo o processo romano, que aponta para um direito romano que passa
a ser visto como uma vertente terrena e temporal que se contrapunha a uma vertente
espiritual. Começamos a analisar o direito/processo com uma outra vertente que se
contrapunha à vertente espiritual do processo canônico, com o direito do dia-a-dia no
direito romano estudado nas universidades. O direito canônico é essencial para a
implementação estrutural do processo romano, que depois acaba por se voltar como o
processo canônico. A influência religiosa era identificada com o processo canônico,
havendo uma disputa entre o processo canônico e romano. O surgimento do processo
romano-canônico processo resultante da mescla de instituições romano, germânicas,
canônicas com a contribuição dos glosadores e pós glosadores. Essa mescla é o resultado
desse processo romano-canônico. “A esse processo [germânico] em que se adaptaram as
regras costumeiras do tempo, ao direito construído pelos glosadores, pós-glosadores,
comentaristas e práticos, com a cooperação sobremodo influente dos canonistas, costuma-
se chamar romano-canônico.”6

Já na baixa Idade Média começamos a ter outro elemento que acrescentamos que
surge nesse final a lei, a legislação. Até o momento só falávamos de direito costumeiro, da
cooperação dos canonistas. No final da Idade Média/baixa Idade Média surge o elemento
da legislação. Começamos a ter os estatutos comunais. A legislação tem a ver com o
comércio, com a burguesia mercantil, servindo para dar previsibilidade para os
investidores. A partir desses estatutos comunais se identifica o fator de uma centralização

6
SANTOS, Moacyr Amaral.
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 25

do poder, com a cogitação de um sistema feudal com descentralização de um poder em que


o Rei reina, mas não governa, para a necessidade de fazer força a uma legislação, sendo
necessária a centralização do poder para que por meio desse poder se baixe uma lei, no caso
os estatutos comunais, legislações que também tratavam do comércio. Uma burguesia
mercantil busca uma previsibilidade. Essa previsibilidade é legal e política, não querendo
investir na criação de novas rotas de comércio com vários senhores. Busca-se saber também
sobre a resolução de demandas.

Aquela mescla que se resultava no processo romano-canônico, ao se somar a ele a


legislação, teremos o processo comum medieval. Ele tem esse nome por ser um processo
que se aplicava a todas as causas não-derrogadas por lei especial, sendo o processo que se
aplicava comumente. Até por sua origem germânica, romana, romano-barbárica, de pós-
glosador, glosador, temos um processo extremamente moroso, formalista, inteiramente
escrito e de difícil aplicação na vida prática, e tudo isso leva o Papa Clemente V a, mediante
uma bula papal, criar um novo processo que buscava ser um processo mais informal, que
era o processo sumário, que, portanto, surge de uma bula papal buscando retirar
formalidades do processo comum medieval restabelecendo o quanto possível a oralidade,
suprimindo formalidades, concentrando poderes na mão do juiz para que assim o processo
pudesse ter assim uma tramitação mais celeridade.

Aula do dia 27 de agosto de 2015

A partir da queda do Império romano do ocidente a doutrina é mais ou menos


unânime em afirmar que a partir daquele momento, quando se dá o encontro de um direito
processual muito adiantado (romano) e outro pouco evoluído (germânico), fala-se que o
direito processual em seu trilhar evolutivo passa por três períodos, um chamado de
praxismo, o segundo de procedimentalismo e o da reconstrução científica do processo (e
autonomia do saber sobre o processo).

Praxismo (Séc. V até 1807)


Fases
Procedimentalismo (1807 - 1868)
Reconstrução Científica do Processo (1868 - )
Figura 3 - Fases do processo na Roma Antiga
26 Teoria geral do processo I

Praxismo (Séc. V até 1807): no praxismo que contempla o período da queda do Império
romano ao ano 1807, tivemos um período em que se tinha pouca produção legislativa e que
a atividade do direito processual se limitava a uma atitude descritivista de modelos. Nesse
período do praxismo, a atividade processual se limitava a modelos, ou seja, os
processualistas daquela época não se preocupavam com conceitos (pedidos, intervenção de
terceiros, etc). Se valorizava a prática, o modelo, como se propor uma demanda, uma ação
processória, como se contestar uma demanda. Praxismo vem de práxis, prática, modelos
passados de pai para filho, com modelos de como realizar atos com base em modelos. No
momento em que se tem modelos, busca-se aplicá-los, em uma atitude descritivista. É um
período com forte predominânica da prática. Podemos dizer que o praxismo apresentava as
seguintes características:

(1) Pouca produção legislativa, que começa com maior intensidade com os
estatutos comunais no campo do processo, e de qualquer sorte, era uma
produção legislativa voltada para assegurar a atividade econômica do
comércio, em um contexto de centralização do poder político no final da
Idade Média, 800 anos mais ou menos após o século V, com a construção
das chamadas ordenações (Afonsinas, Manoelinas, Filipinas – que
vigoraram mesmo após a independência em 1822 –, ...)
(2) Atitude meramente descritivista de modelos. O processualista nesse
período não se preocupava com formulações teóricas. É uma fase em que
definem os aspectos a se constarem no modelo. Uma atitude meramente
descritivista de modelos. Como consequência dessa atitude meramente
descritivista de modelos, tínhamos um conhecimento superficial do
processo, não pelos seus institutos, mas pelos seus modelos.
(3) Tinha-se um conhecimento meramente superficial do processo. 7

7
Primitivismo: processo primitivo
Juridicialismo: momento no tempo em que se começa a ter um juiz
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 27

Procedimentalismo (1807 – 1868): Em 1807, temos na França a publicação do


código civil e o Código de Processo Civil de Napoleão, comprometido com liberdade,
propriedade e liberalismo, liberdade, igualdade e fraternidade, bases do liberalismo. A
Revolução Francesa teve um cunho liberal burguês. Napoleão Bonaparte, comprometido
com os ideais da revolução francesa e o liberalismo político e econômico, democratizando
os modelos do praxismo para que houvesse uma confluência através da colocação desses
modelos na lei, ou seja, os modelos passados de pai para filho não mais precisavam porque
estavam na lei. A partir de 1807 praticamente todos os códigos de processo civil editados
seguiram esse procedimentalismo de previsão dos modelos. A diferença entre praxismo e
procedimentalismo era de um modelo presente na lei. As demais características do
praxismo permanecem no procedimentalismo, com uma atitude ainda descritivista de
modelos, com conhecimento empírico superficial dos processos, mas agora com um
modelo previsto na lei8.

Ainda temos resquícios desse procedimentalismo/praxismo através da prática


forense com modelos de petição inicial para as várias ações, assim como outros modelos.
Ainda hoje temos vários modelos de contestação de ação, proposição de ação, entre outros.

Por volta do ano de 1855, início da metade do século XIX, tivemos na Prússia o
evento da chamada Polêmica MÜTHER x WINDSCHEID, que aconteceu nos primeiros
anos após a metade do século XIX quando MÜTHER escreve em um jornal local um artigo
questionando o conceito à época da actio romana na percepção de que talvez a actio não
estivesse contida no direito material. MÜTHER escreve esse artigo questionando a visão
que se tinha sobre a actio romana naquele contexto histórico. Diante desse conceito de
MÜTHER, WINDSCHEID, discípulo de SAVIGNY, critica as dúvidas de MÜTHER
acerca da actio romana acusando-as de não ter sentido. MÜTHER escreve frente a isso
outro artigo que reafirmava sua dúvida e trazia novos argumentos reforçando essa dúvida
acerca da actio no direito material. WINDSCHEID escreve outro artigo criticando
veementemente as posições assumidas por MÜTHER, terminando aí a polêmica MÜTHER
x WINDSCHEID. Ali o processo começa a mudar o seu enfoque. O direito processual
começa a trilhar novos caminhos para além de uma atitude descritivista de modelos.

8
Procedimento: forma pela qual o ato se movimenta no processo.
Modelo: fórmula de proposição de uma ação, fazer uma sentença, etc.
28 Teoria geral do processo I

Em nenhum momento algum dos lados fala de modelos, não questionando modelos,
mas o instituto importantíssimo para o processo da actio romana, começando o processo a
se desviar de uma atitude descritivista de modelos para se buscar uma formulação teórica.
É o que chamamos de um ponto de inflexão no direito processual. A partir daquele
momento o direito processual começa a trilhar novos caminhos buscando uma formulação
mais científica. Isso ocorre, e por isso esse marco, no ano de 1868, quando um grande
processualista alemão, OSCAR VON BÜLOW, publica uma das mais importantes obras
para o direito processual, Das exceções dilatórias e dos pressupostos processuais. Nessa
obra, marco para o processo, tendo o ano de sua primeira edição o marco da reconstrução
do processo, afirma que o processo estava em muito atrasado em relação às demais áreas
do direito, na medida em que os processualistas da época não sabiam sequer conceituar
processo. Os processualistas ainda se preocupavam com os modelos, o que VON BÜLOW
não entendia, por ser incompreensível porque meio século antes SAVIGNY já tinha
lançado as bases da sua teoria da relação jurídica (sujeito ativo <-> sujeito passivo), e como
a partir disso eles não poderiam conceituar processo. Nesse contexto de relação jurídica,
onde entraria o processo? Não entraria, porque a relação jurídica processual é outra,
diferente da relação jurídica processual tendo em vista a figura do juiz. Logo, a relação
processual não é a mesma da relação material, pois enquanto esta é bipolar com sujeito
ativo e passivo, a relação processual é tripolar pela figura do juiz atuando em favor do
estado. VON BÜLOW passa a fazer uma distinção entre direito material e direito
processual, coma ênfase em uma atitude descrtivista de modelos deixa de existir. A ênfase
agora para os processualistas passa a ser uma formulação teórico-científica do processo,
não mais à luz de modelos, mas de seus próprios institutos. O que é uma sentença? Que
princípios norteiam a defesa do réu? Etc.

Não se considera a polêmica MÜTHER x WINDSCHEID o marco, mas a obra de


VON BÜLOW pelo valor da obra, com a ênfase dos processualistas a partir dessa obra
realmente passando a ser na formulação teórico-científica. Temos ainda a obra prussiana
de ADOLF WACH de aproximadamente 1875, Da pretensão pretensão da mera
declaração, resolvendo a razão de MÜTHER na discussão sobre a natureza da actio, nãol
contida no direito material conforme preconizavam os romanos. Lança as bases para
demonstrar que a actio, a declaração, não estava contida no direito material. Cerca de dez
anos depois, tivemos autores de grande importância, dois processualistas importantes
porque formularam quase que ao simultaneamente a teoria abstracionista da ação ou teoria
Unidade II – A evolução histórica do processo à antiguidade do processo 29

da ação em sentido abstrato, com DAGENKÖLB na Prússia e PLOSZ na Hungria. O


processo deslancha a partir da obra de VON BÜLOW. CHIOVENDA formula na Itália
uma teoria importante para o processo brasileiro da Teoria da Ação como Direito
Contestativo.

Ainda na Itália temos Ramiro PODETTI que lança as bases da Trilogia Estrutural
Do Processo ou Trilogia Estrutural de Podetti, segundo quem a ação provoca a jurisdição
que irá se concretizar mediante o processo. Falamos então que o processo é o instrumento
pelo qual a jurisdição dá uma resposta à ação. Essa é a trilogia estrutural do processo. Ele
formula as bases do direito processual.

Na Itália também temos um dos mais brilhantes dos processualistas italianos aluno
de PIOVENDA de nome CARNELLUTTI, que com sua teoria lança as bases da chamada
instrumentalidade do processo que terá como principal criador o também italiano MAURO
CAPPELLETTI, que lança as bases da instrumentalidade do processo, que tem sua teoria
quase toda baseada na obra de CARBELLUTTI. Além de CAPPELLETTI, temos também
CALAMANDREI. Outro italiano de grande importância é EMILIO BETTI, assim como
ENRICO REDENTI.

Esses autores não mais se preocupam com modelo, mas com a teoria do processo,
que surgem nesse momento da Reconstrução Científica e Autonomia do Saber Sobre o
Processo, porque até aquele momento o estudo do direito processual estava localizado a
um estudo do próprio direito material. A partir de VON BÜLOW se demonstra que o direito
processual se distingue do direito material a partir de uma relação em sua base tripolar,
distinta de uma relação bipolar de direito material, falando-se, portanto, dessa autonomia
do saber do processo, analisado de forma autônoma em relação ao direito material.

Ainda, também, outro grande processualista italiano, temos ENRICO TULIO


LIEBMAN, aluno de CHIOVENDA e CARNELLUTTI.

Dentro de uma ótica de perspectiva evolutiva, a quem entenda que já estaríamos em


outra fase evolutiva, que muitos chamam da instrumentalidade do processo. Essa fase que
muito apontam como pai MAURO CAPPELLETTI, que se baseou em CARNELLUTTI,
que muitos apontam como a nova fase evolutiva pela preocupação não na formulação
30 Teoria geral do processo I

teórica do processo, com o direito processual já tendo uma maturidade de grande


conhecimento sobre seus conceitos, se preocupando com o processo como instrumento
efetivo na resolução de lides/litígios, saber como o processo está chegando ao
jurisdicionado, à população, se satisfaz os interesses da população como meio de resolução
de lides, sendo uma preocupação não mais teórica, mas de acesso à justiça, por exemplo,
preocupação eminentemente instrumental. O processo é visto como ele dá resposta a um
dado conflito. As perspectivas evolutivas do processo nos conduzem a uma visão mais
instrumental, mas hoje temos a preocupação de como o processo satisfaz ou não às pessoas.
Como criar mecanismos para acelerar o processo, fazer com que todos tenham acesso ao
processo, com leis apenas instrumentais, como as que criam os juizados especiais. Muitos
autores entendem, por isso, que já estaríamos em uma nova fase de instrumentalidade do
processo.

No Brasil, tivemos, aplicando as ordenações Filipinas sobretudo, mesmo após a


independência com a Teoria de CHIOVENDA com grande influência em termo de
processo. Falamos de construção teórica a partir de 1868. Como grande fato de importância
para o processo brasileiro, principalmente civil, no final da década de ’20, com LIEBMAN
saindo da Itália e vindo dar aula no Brasil na recém fundada USP, com muitos humanistas
europeus saindo da Europa para vir para o Brasil dar aula nessa nova Universidade, assim
como CLAUD LEVI STRAUSS. LIEBMAN traz todas as ideias de processo que
fervilhavam na Europa, lançando aqui as bases para a escola paulista de processo, com
expoentes em FREDERIC MARX, MOACYR AMARAL SANTOS, ALFREDO
BUZAID, baseados na obra de LIEBMAN. A partir de LIEBMAN, em 1939, se lança um
Código de Processo Civil nacional, que antes eram estaduais, havendo a unificação dos
códigos em ’39, com o código de ’73 baseado essencialmente por ALFRE BUZAID,
ministro da justiça e ex-aluno de LIEBMAN, que lançou as bases para uma formulação de
processo brasileiro, que antes não tinha raízes de fato no Brasil. Lança esses
conhecimentos, mas forma uma escola que dá origem a dois códigos de processo civil,
sendo o de hoje uma mescla. A contribuição de LIEBMAN foi inestimável para o direito
brasileiro. Retorna a Itália onde falece.

Não podemos conceber o direito como instrumento de resolução de litígios


desvinculado de um exercício de poder político, identificando no contexto um movimento
de unificação de países (Prússia, Alemanha e Itália), em um contexto de formação dos
Unidade III – Da Jurisdição 31

Estados Nacionais e reunificação de Estados, com a reunificação da Alemanha de


BISMARCK e da Itália de GARIBALDI. O Estado no momento que exerce a jurisdição
está exercendo um papel e um poder soberano, com um Estado fraco não resolvendo
litígios, em um processo de unificação pressupondo uma centralização do poder político
necessitando de mecanismos do Estado de resolução de litígios. Por isso que a reconstrução
científica gera esse momento efervescente em um momento propício para isso, saindo do
século V à 1868. Se não vivêssemos em um contexto de reunificação de Estado, talvez até
hoje falássemos de modelos. Não surge por mera coincidência, sendo que no âmbito do
direito, e para o processo, vivemos uma íntima relação com o próprio exercício do poder
político, em cada vez que o juiz declara uma sentença exerce um poder político no sentido
de uma visão de Estado. Não há Estado Forte que não possa julgar as lides, sendo a
atividade jurisdicional pressupondo poder soberano.

Unidade III – Da Jurisdição

Aula do dia 01 de setembro de 2015

Teoria da Jurisdição

I. A Palavra e suas acepções

A palavra jurisdição vem do latim iurisdicione, originado de dois radicais latinos (iuris
= do Direito e discere = dizer). Dentro desse contexto, em uma primeira análise poderíamos
apontar a jurisdição como uma atividade humana que consiste em dizer do direito, e
trazendo a questão para o processo podemos dizer que a jurisdição é uma atividade humana
que consiste em dizer do direito com a finalidade de compor litígios, compor as lides. Nesse
contexto faz-se a indagação que a partir dessa concepção de jurisdição os pressupostos da
jurisdição seriam (1) a existência de litígios a serem resolvidos, sabendo que toda a
atividade jurisdicional decorre da existência de seres humanos; (2) existência do direito a
ser dito, ou seja, a própria existência do ius, em geral o ordenamento jurídico, pois boa
parte das lides são resolvidas pela lei; (3) um Estado organizado como tal; (4) a legislação.
32 Teoria geral do processo I

Quem elaborou o ius tem legitimidade para elaborá-la? E quem irá posteriormente
aplica-la, tem legitimidade e poder para tal? A Jurisdição é uma função inerente ao próprio
Estado, e nesse contexto de uma função inerente ao próprio Estado, devemos verificar a
legitimidade de quem está aplicando a regra. O exercício da função jurisdicional pelo
Estado ou quem o represente está condicionada à observância de certos princípios, sendo
um deles o princípio da investidura, o que faz com que esses princípios acarretem o próprio
exercício da atividade jurisdicional. Um traficante que estabelece uma regra de conduta não
exerce a jurisdição. O exercício da função jurisdicional pressupõe um Estado organizado
como tal, porque o exercício da função jurisdicional é inerente à própria soberania do
Estado. O exercício da função jurisdicional pressupõe a própria soberania do Estado. Uma
decisão proferida pelo órgão jurisdicional de um país para valer em território nacional tem
de passar por um processo de homologação, porque, em vista da função jurisdicional do
Estado inerente ao próprio poder estatal soberano passando pela jurisdição e pela
legislação, impede que sempre valha uma decisão proferida em outro Estado dentro de
outro país.

Já chegou a ser aplicada no Brasil mesmo a legislação de outros países, o que fere
a soberania. Há tempos uma cidadã foi pega fazendo tráfico internacional de drogas e, em
seu país de origem, havia sido condenada três vezes por outro fato que no país era crime.
No Brasil o juiz a condenou por tráfico internacional de drogas e reconheceu a incidência
do agravante de reincidência e aplicou-lhe um acréscimo na pena. Não é possível falar
desse agravante de pena porque, visto o não reconhecimento (homologação) dessas
decisões no Brasil, ela não poderia ser reconhecida, visto ainda que no caso os crimes pelos
quais tinha sido condenada não eram sequer crime no Brasil.

A jurisdição é uma atividade inerente ao próprio poder estatal soberano. Ao aplicar


a reincidência nesse caso determinou a aplicação no Brasil de uma lei estrangeira e legislou,
visto que o fato não era crime no Brasil, e ainda reconheceu efeitos no Brasil de uma
sentença estrangeira não homologada. Há uma intima relação entre jurisdição e soberania.
Não podemos reconhecer em uma comunidade em que o traficante faz e aplica a lei a
existência de um poder jurisdicional.

A jurisdição, portanto, pressupõem a legislação. A jurisdição é um prolongamento


da legislação e a pressupõem, sendo um prolongamento porque elaborada a norma ela irá
Unidade III – Da Jurisdição 33

aplicar a norma. Na legislação, o Estado elabora regras gerais e abstratas que vão regular e
reger a vida em sociedade, enquanto que na função jurisdicional, a jurisdição irá pegar
aquela regra geral e abstrata e a fará incidir no caso concreto. Um dos pressupostos da
jurisdição é exatamente o do ius, ou do direito a ser dito.

Moacyr Amaral Santos afirma:

“A jurisdição consiste no poder de atuar no direito objetivo, que o próprio Estado


elaborou, compondo os conflitos de interesses e dessa forma resguardando a
ordem jurídica e a autoridade da lei”.

Aponta, portanto, para a legislação, que deve ser aplicada, elaborada pelo próprio
Estado. Diante disso, temos o Estado elaborando regras gerais e abstratas mediante a
legislação, e a jurisdição irá concretizar essas regras gerais e abstratas para resolver o
conflito no caso concreto. Temos o vocábulo jurisdição sendo empregado em várias
acepções, sobretudo em três acepções: (1) como sinônimo de autoridade estatal sobre uma
determinada área, referindo-se a qualquer autoridade estatal, que necessariamente não
precisa ser do judiciário, ainda que em geral seja; (2) a segunda acepção em que o vocábulo
jurisdição é utilizado é como órgão do poder judiciário, como sinônimo de justiça,
exemplificado em expressões como “jurisdição trabalhista”, “jurisdição eleitoral”, no lugar
de “Justiça do Trabalho”, “Justiça Eleitoral”, usada para mostrar que o órgão jurisdicional
que irá julgar aquele caso pertence a certa justiça; (3) a terceira acepção em que
empregamos o vocábulo jurisdição é como competência, ou seja, utilizamos o vocábulo
jurisdição significando competência, ou seja, quando falamos de que a competência cabe a
jurisdição de determinada vara.

II. A Jurisdição como atividade e como função: Subsunção e


diferentes formas de sua realização

Temos a trilogia estrutural do processo atribuída a PODETTI, com a ação provocando


a Jurisdição, concretizada mediante o processo, sendo o processo um instrumento da
jurisdição para que o Estado juiz possa dar uma resposta à ação que a provocou. A
Jurisdição tem por instrumento o processo, ou seja, no momento que a jurisdição foi aplicar
o ius, terá por instrumento o processo. Ou seja, aquela atuação a que se refere MOACYR
34 Teoria geral do processo I

AMARAL SANTOS de atuação do direito subjetivo dar-se-á pela jurisdição tendo como
instrumento o processo, podendo também dizer que o processo também é um instrumento
pelo qual a jurisdição faz atuar a legislação, aplica o direito. A jurisdição no momento que
aplica a legislação ao caso concreto é ao mesmo tempo poder, função e atividade. No
momento que a jurisdição é provocada por meio da ação a dizer do direito, a aplicar a
legislação para compor os litígios, essa jurisdição é ao mesmo tempo um poder, uma função
e uma atividade.

Como poder, a jurisdição expressa a capacidade que tem o Estado “Juiz” de decidir
imperativamente e impor suas decisões. A jurisdição, portanto, como poder é vista como a
capacidade ou como o próprio poder do Estado de decidir imperativamente e impor suas
decisões. Por outro lado, a jurisdição como função expressa o encargo, a função que tem
os órgãos jurisdicionais de compor os litígios promovendo assim a pacificação social. Essa
função que tem os órgãos jurisdicionais é o encargo dos órgãos jurisdicionais de controle
dos litígios promovendo a pacificação social. Não interessa aos desígnios do Estado a
permanência dos litígios por isso cabendo a esses órgãos jurisdicionais a resolução desses
litígios.

O Estado “Jurisdição” irá compor os litígios promovendo a pacificação social pela


aplicação objetiva da lei, do ius, resolvendo o litígio através dessa aplicação da lei ao caso
concreto. Por fim, a jurisdição como atividade exprime o conjunto, o complexo de atos do
juiz no processo exercendo o poder e cumprindo a função que a lei lhe atribui. Ao falar na
jurisdição como atividade falamos do conjunto de atos que o juiz pratica no processo em
nome do Estado, e no momento que o juiz age em nome do Estado em um processo cumpre
a própria função jurisdicional do Estado, com essa intima relação da jurisdição como poder,
função e atividade, falando-se do próprio Estado. Só podemos falar de fato do exercício da
jurisdição como poder, função e atividade do próprio Estado em um contexto de um
processo que segue o devido processo legal, em que o réu será citado, terá o direito de se
defender, produzir suas provas, em que o juiz seguirá o previsto na lei. Portanto, essa ideia
da jurisdição se expressa claramente nesse processo, de forma a não ter um poder abusivo
e arbitrário, com a função de anseios pessoais e a atividade do complexo de atos sem base
legal, mas surgirá de um poder abusivo em nome de uma função abusiva. O devido processo
legal norteia a ideia clara da jurisdição como uma função, poder e atividade do Estado.
Unidade III – Da Jurisdição 35

Na legislação temos o Estado elaborando o ius, elaborando regras gerais e abstratas que
vão regular/reger a conduta, a vida em sociedade e na jurisdição teremos a concretização
daquela regra geral e abstrata para resolver o caso concreto, a demanda entre A e B para
resolução de um conflito. Esse fenômeno chama-se subsunção, ou seja, é a incidência da
lei ao caso concreto. Portanto, quando MOACYR AMARAL SANTOS afirma a “atuação
do direito objetivo” aponta para a própria subsunção, pela incidência da lei ao caso
concreto. Nesse momento em que há a subsunção, falamos que o Estado tutela a ordem
jurídica. No momento em que o Estado faz incidir uma lei ao caso concreto. A tutela
jurídica vem a ser o encargo que tem o Estado de promover o restabelecimento da ordem
jurídica que foi violada ou ameaçada pelo conflito para, atuando a lei ao caso concreto, dar
a cada um o que lhe é devido. Portanto temos o Estado, no momento que aplica a lei ao
caso concreto, restabelece o império da norma jurídica ameaçado ou violado pelo conflito.

Aula do dia 03 de setembro de 2015

Tutela Jurisdicional

A tutela jurisdicional vem a ser o encargo que tem o Estado de restabelecer a paz e a
justiça que foram ameaçadas ou violadas pelo litígio mediante a aplicação da lei ao caso
concreto de modo a dar a cada um o que é seu. A tutela jurisdicional, portanto, é pedida ao
Estado juiz pela parte. Ou seja, ainda, incube a parte que se sente lesada em um direito
jurídico seu pedir a tutela ao Estado que restaure a condição de paz e justiça. A parte pede
a juiz a tutela jurisdicional por meio da ação. A tutela jurisdicional que é pedida pela parte
se manifesta por meio de uma decisão (sentença), por meio de atos de Execução, de
Medidas Cautelares ou Preventivas. Pontes de Miranda identifica outra tutela jurisdicional
de Ordem à Autoridade Pública. O juiz sabe a tutela pela tutela pedida pela parte, pois ela
traz ao Estado o litígio a ser resolvido e como será resolvido, pedindo ao Estado o que ela
quer para que o Estado componha o litígio. O autor que vai dizer ao juiz o que ele quer.
Incube ao autor definir. De qualquer maneira, sempre a parte autora vai querer ou um dos
aspectos citados. Quando a tutela jurisdicional pedida ao Estado juiz consiste na prolação
de uma decisão/sentença falamos que estamos diante de uma tutela jurisdicional de
conhecimento. Ela surge quando o autor pretende do Estado juiz uma sentença que
componha a lide. Um pendido de liminar entra em Medidas Cautelares ou preventivas. A
36 Teoria geral do processo I

tutela jurisdicional de conhecimento é a que resulta de pedido da parte autora ao Estado


juiz para que ele, Estado juiz profira uma decisão, sentença que componha o litígio, sendo
que, nesse caso, o Estado juiz para proferir a decisão (sentença) deverá tomar amplo
conhecimento do litígio, examinando a pretensão do autor e a resistência oposta à pretensão
pelo réu, por isso o nome tutela jurisdicional de conhecimento, conhecimento porque para
o Estado juiz profira a decisão (sentença) ele deverá conhecer do litígio e ao conhecer do
litígio ele deverá saber da pretensão do autor e a resistência oposta à sua pretensão, para a
partir desse conhecimento do litígio ele possa proferir uma sentença. E a tutela jurisdicional
de conhecimento por sua vez se subdivide em tutela jurisdicional de conhecimento
meramente declaratória, tutela jurisdicional de conhecimento condenatória e tutela
jurisdicional de conhecimento constitutiva. Portanto, a tutela jurisdicional de conhecimento
pode ser meramente declaratória, condenatória ou constitutiva. A tutela jurisdicional de
conhecimento meramente declaratória é a tutela jurisdicional de conhecimento na qual a
parte autora pede ao Estado juiz que profira uma decisão (sentença) que declare acerca da
existência, inexistência ou modo de ser de uma relação jurídica ou, ainda, acerca da
autenticidade ou falsidade de um documento. Na concepção clássica de Albert Wahr ela
era simplemente a declaratória de uma existência ou inexistência de uma relação jurídica.
Na tutela de conhecimento meramente declaratória a parte quer que o estado declare se uma
situação jurídica existe ou não ou falsidade/autenticidade de um documento, tendo como
objetivo apenas obter certeza jurídica, o que a parte autora quer nessa tutela é unicamente
isso9. O Código de Processo Civil de 2015 afirma:

“Art. 19. O interesse do autor pode limitar-se à declaração:

I - da existência, da inexistência ou do modo de ser de uma relação jurídica;

II - da autenticidade ou da falsidade de documento.

Art. 20. É admissível a ação meramente declaratória, ainda que tenha ocorrido a
violação do direito.”

9
Caso da senhora idosa que pede indenização ao supermercado pela sua queda, em que a seguradora não
aceita pagar à senhora o valor, com o supermercado recorrendo ao juiz para reconhecimento do pagamento
ou não à senhora, dando uma certeza jurídica sobre o caso. Não há nenhuma condenação, mas uma simples
certeza jurídica. A senhora nesse caso é ré no processo, precisando de um advogado para defende-la. Propõe-
se a ação apenas para ter-se a certeza jurídica;
Unidade III – Da Jurisdição 37

A outra tutela jurisdicional que temos é a tutela jurisdicional de conhecimento


condenatória, que é a tutela jurisdicional de conhecimento pela qual a parte autora pede ao
Estado Juiz que profira uma decisão (sentença) que condene o réu a uma prestação de dar,
fazer ou não fazer, ou seja, autor não quer uma mera certeza jurídica10. Está embutida nessa
a tutela condenatória pelo reconhecimento de relação jurídica na qual cabe a indenização,
declarando essa relação jurídica que obriga o réu a pagar a quantia inicial, mas vai além da
mera certeza jurídica, também condenando. Ou seja, a parte declaratória está contida na
condenatória. Vai-se além de uma mera certeza jurídica para a condenação do réu.

Temos ainda a tutela jurisdicional de conhecimento constitutiva, que é a tutela


jurisdicional de conhecimento pela qual a parte autora pede ao Estado juiz que profira uma
decisão (sentença) que, modificando uma situação jurídica em andamento, venha a criar
uma nova situação jurídica. Tem-se, após a sentença, a constituição de uma nova situação
jurídica, tendo por exemplo o caso do divórcio, em que se modifica a situação jurídica em
andamento (casamento) com a criação de uma nova situação jurídica (a situação de
divorciado).

Tem-se ainda os casos em que se quer que o Estado Profira atos de Execução, tendo-
se a tutela jurisdicional de execução ou executiva, na qual se quer que o Estado pratique
Atos de Execução, podendo-se falar que nesse caso a Tutela Jurisdicional de Execução é a
tutela jurisdicional na qual a parte autora (exequente) pede ao Estado Juiz a prática de atos
de execução destinados a concretizar um comando contido em uma sentença proferida na
tutela jurisdicional de conhecimento condenatória (execução por título judicial) ou em
documento ao qual a lei atribuía eficácia executiva (execução por título extra-judicial).
Hoje já se fala no simples cumprimento da sentença nas relações entre particulares, com a
tutela de execução existente sobretudo nos processos em que está envolvida a fazenda
pública. No processo penal a execução é por título judicial.

Temos a situação em que as vezes a parte autora quer que o Estado realiza uma
medida cautelar ou preventiva, tendo o que chamamos de tutela jurisdicional cautelar. Na

10
No segundo caso, temos a senhora idosa que, cansada do jogo, afirma que o supermercado tem que
indenizá-la por não ter ocorrido a imediata limpeza e identificação do piso molhado, ajuizando uma ação
contra o supermercado, pedindo que o Estado juiz por sentença condene o réu a indenizá-la pelas despesas
médicas. Temos nesse caso, não o desejo de uma mera certeza jurídica, mas o pedido de condenação do réu
a dar, fazer ou não fazer, no caso o pagamento dos danos.
38 Teoria geral do processo I

tutela jurisdicional cautelar a parte autora quer que o Estado juiz adote medidas cautelares
ou preventivas para resguardá-la em uma eventual demora no processo de conhecimento
ou execução, podendo dizer que nesse sentido ela é a tutela jurisdicional na qual a parte
autora (requerente) pede ao Estado Juiz a adoção de medidas cautelares ou preventivas
destinadas a resguarda-la de eventual demora no processo de conhecimento ou no processo
de execução 11 . A tutela jurisdicional cautelar está condicionada à observância de dois
requisitos, (1) o chamado Fumus boni juris, fumaça sinal do bom direito e (2) Periculum
in mora, perigo na demora, podendo o juiz apenas deferir a medida cautelar ou preventiva
se os dois requisitos estiverem presentes. Se um desses requisitos não estiver presente, o
juiz não poderá conceder. É o que acontece também nas chamadas liminares, que tem um
nítido caráter cautelar ou preventivo, analisando-se também esses dois aspectos.

Temos a tutela jurisdicional na qual a parte autora pede ao Estado juiz que emita
uma ordem dirigida à autoridade pública. Chamamos essa tutela de tutela jurisdicional
mandamental. A tutela jurisdicional mandamental, portanto, é a tutela jurisdicional na qual
a parte autora (impetrante) pede ao Estado-Juiz que profira uma ordem dirigida a uma
determinada autoridade pública (Mandado de segurança, Habeas Corpus, Habeas Data),

Tutela Jurisdicional

Medidas Cautelares ou Ordem à Autoridade


Decisão (Sentença) Atos de Execução
Preventivas Pública

Tutela Juridicional de Tutela Jurisdicioanal de Tutela Jurisdicional Tutela Jurisdicional


Conhecimento Execução ou Executiva Cautelar Mandamental

Meramente declaratória

Condenatória

Constitutiva
Figura 4 - Tipos de Tutelas Jurisdicionais

11
Exemplo em que se sagrou vencedora em uma licitação uma empresa que foi reconhecida como tal no
CETAMI ainda que tivesse oferecido preço mais alto que outra. Essa outra resolve ajuizar ação para anular
essa licitação. Se essa empresa que for ajuizar ação para ajuizar a ação esperar toda a tramitação da ação, a
que ganhou ação com maior preço já terá recebido os benefícios de ganhar a licitação e celebrar o contrato.
Preventivamente, a outra empresa pede de forma preventiva que o juiz profira uma decisão que impeça o
órgão público de celebrar o contrato.
Unidade III – Da Jurisdição 39

tendo no polo passivo uma autoridade pública ou alguém que a esteja representando,
querendo que o Estado-Juiz profira uma ordem à autoridade pública.

Aula do dia 04 de setembro de 2015

Há eventualmente situações em que se faz necessário colocar ordem na audiência.


Isso em decorrência do poder de polícia, pois um ambiente jurisdicional não comporta
situações como essas. É um poder com um viés mais administrativo do que jurisdicional.

Princípios da Jurisdição

São princípios que norteiam a jurisdição e o processo como mecanismos de


resolução de litígios. O primeiro princípio é o chamado princípio da investidura, segundo
esse princípio somente pode exercer a atividade jurisdicional aquele ou aquela que se
encontrar regularmente investido na condição de juiz ou de juíza. Somente pode exercer a
jurisdição aquele que se encontrar regularmente investido na condição de juiz. A jurisdição
está fundamentalmente ligada ao próprio exercício de um poder estatal soberano, em nome
do qual o Estado atribui a determinadas pessoas uma parcela desse seu poder soberano. Por
isso que o juiz ou juíza exerce uma parcela do poder soberano do Estado, uma parcela
pertinente ao poder de julgar. Essa é a razão desse primeiro princípio da investidura.

O segundo princípio é o chamado princípio da indelegabilidade da jurisdição,


relacionado ao terceiro, pois o juiz/juíza exerce a atividade jurisdicional por uma delegação
do Estado e, nessa condição, não pode delegar a quem quer que seja a delegação da
atividade jurisdicional, devendo exercê-la diretamente, por isso a indelegabilidade da
jurisdição. O juiz ou juíza exerce essa função em nome do Estado, ou seja, recebendo uma
delegação do próprio Estado não podendo delegar essa função, devendo exercê-la
pessoalmente.

O terceiro princípio é o chamado princípio da aderência da jurisdição a um


território. Muitos o chamam apenas de princípio da aderência. Esse princípio nos mostra
40 Teoria geral do processo I

que a jurisdição pressupõe um território onde será exercida. Esse princípio, portanto,
estabelece limitações ao poder do juiz. Por isso que temos eventualmente um juiz de
determinada comarca, limitações territoriais ao exercício da atividade jurisdicional pelo
juiz, pois se entende que essas limitações territoriais permite uma maior racionalidade, pois
cada juiz atua dentro do seu território. A jurisdição adere a um território, e nesse território
ela será exercida.

O quarto princípio é o chamado princípio da inevitabilidade. A jurisdição é uma


emanação do próprio poder estatal soberano, ou seja, emana, resulta do próprio poder
estatal soberano e, como resultado da própria soberania do Estado, a jurisdição independe
da concordância das partes, ou de um eventual pacto/convenção entre as partes no sentido
da aceitação do resultado do julgamento. É o princípio da inevitabilidade, a jurisdição em
seu exercício é inevitável, resultante da própria soberania do Estado, e por isso não depende
das partes aceitarem ou não o exercício da atividade jurisdicional, não dependendo também
de um acordo das partes no sentido de aceitar um resultado do julgamento, consequência
do próprio poder estatal soberano12.

O quinto princípio é o chamado princípio da inafastabilidade, segundo o qual a


todos é garantido o acesso ao poder judiciário para resolver eventuais litígios, não podendo
o poder judiciário se recusar a prestar a jurisdição que lhe foi pedida nos termos das normas
em vigo, ou seja, o Estado Jurisdição/Juiz tem o monopólio da jurisdição, e tendo o
monopólio da jurisdição não pode se recusar a prestar a jurisdição a quem veio pedir-lhe
nos termos da legislação em vigor. Isso decorre de um mandamento Constitucional, como
apontado: “art. 5º (...) XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão
ou ameaça a direito;”, como no art. 3º do Código de Processo Civil: “Art. 3o Não se excluirá
da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.”

12
Dificuldade em aceitar as decisões de tribunais internacionais, que pesam para o lado do mais fraco,
punindo, como no Tribunal Penal Internacional, os países fracos politicamente e economicamente, mas não
recaindo sobre os países mais ricos e fortes politicamente, com a afirmação da não atividade jurisdicional
sobre esses países mais fortes, montando uma superestrutura para se aprofundar as diferenças entre ricos e
pobres no mundo. Vemos, portanto, a importância da soberania na jurisdição, sendo o poder Estatal soberano
tudo na jurisdição. Não existe política e direito processual desvinculados, porque só pode exercer o poder
soberano quem tem o poder para isso. Esse poder é o poder jurisdicional que deriva do poder político de um
Estado soberano, por isso não temos como desvincular o processo da jurisdição, derivada da soberania.
Se um cidadão brasileiro realizar um fato ilícito punido pela lei brasileira no exterior violando um bem da
vida brasileiro, ele responde por isso.
Unidade III – Da Jurisdição 41

O sexto é o princípio do juiz ou do juízo natural, com todos tendo garantido o


julgamento por um juiz independente e imparcial investido na jurisdição segundo as regras
constitucionais e legais em vigor. É uma garantia de todo cidadão ser julgado por um juiz
independente e imparcial que foi investido na jurisdição daquele processo pela
Constituição. Isso veda o juízo ou tribunal de exceção. O juiz ou tribunal de exceção é
aquele órgão criado especialmente para julgar um litígio, sendo muito comum em ditaduras,
sempre para julgar inimigos políticos 13 . Esse princípio encontra base no art. 5º inciso
XXVII da Constituição que afirma: “XXXVII – não haverá juízo ou tribunal de exceção;”,
assim como o inciso LIII: “LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela
autoridadecompetente;”

O sétimo princípio é o da inércia. Por força desse princípio os órgãos jurisdicionais


são por sua própria natureza inertes, somente agindo a pedido da parte interessada, ou seja,
só agem quando provocados, quando alguém pede a sua atuação. O judiciário não toma a
iniciativa do processo14.

O oitavo princípio é o princípio do impulso oficial. Iniciado o processo, ou seja,


provocado o judiciário a prestar a sua jurisdição, o próprio judiciário se encarrega dentro
do possível de levar o processo até o final, sendo levado pelo chamado impulso oficial. Não
há incongruência com o princípio anterior, visto que só toma parte após iniciado o processo,
o Estado responsabilizado por movimentar o processo. Esses dois últimos princípios
encontram previsão no art. 2º do Código de Processo Civil, que afirma: “O processo começa
por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em
lei”, hipóteses essas últimas que precisam de iniciativa parte, sobretudo quando se necessita
de pagamento, por exemplo, quando é necessitada uma perícia. Dentro do princípio, no que
depender do Estado, este se encarrega de prestar a jurisdição. A razão de ser desse princípio
é o fato da jurisdição buscar o apaziguamento social, não sendo benéfico para o Estado
deixar um litígio em aberto, sobrepujando-se o direito do Estado sobre o das partes.

13
Temos como exemplo um caso clássico de juízo de exceção do caso que julgou o ditador Romeno Nicolai
(?) na época da derrocada dos regimes comunistas, com o ditador sendo levado ao tribunal de exceção e já
volta executado. Esses tribunais existem para punir inimigos políticos, sendo necessários princípios como do
juízo natural para sagrar um Estado de Direito.
14
Diferente do pedido de inquérito, procedimento investigatório.
42 Teoria geral do processo I

O nono princípio é o princípio do devido processo legal, princípio este muito


amplo, abarcando outros. Nos indica que todo processo deve seguir rigorosamente os
preceitos legais que regulam a solução dos litígios, ou seja, o processo é o meio público de
solução dos litígios, e como tal pressupõem uma precisa regulação legal, busca se afastar
do subjetivismo, com uma regulamentação legal que irá seguir essa regulação legal. Afasta-
se o subjetivismo, prevalecendo a objetividade da norma na resolução dos litígios. Esse
princípio encontra previsão no artigo 5º inciso LIV da Constituição Federal: “ninguém será
privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Atua também como
corolário do Estado Democrático de Direito.

O décimo princípio é o princípio da ampla defesa. A jurisdição deve assegurar a


todos os litigantes no processo a ampla defesa de sua pretensão ou da resistência oposta à
pretensão, permitindo a utilização dos meios e recursos legalmente admissíveis. É o
princípio da ampla defesa15. Temos dificuldade para saber até onde vai o exercício da ampla
defesa ou uma má fé. As condenações no Brasil por litigantes de má fé são muito poucas,
por ser difícil perceber quando uma parte quer apenas protelar. É difícil verificar esse
aspecto subjetivo da parte, por isso tão poucas condenações por litigantes de má fé,

O décimo primeiro é o princípio do contraditório. As partes no processo tem o


direito de se contradizerem reciprocamente, para, a partir daí, se permitir a formação do
convencimento do juiz, ou seja, as partes ao longo do processo estão em um contínuo
processo de contradição mútua, contradição no sentido de confronto de teses, o que
chamamos de a dialética do processo. A formação do convencimento do juiz resulta dessa
constante contradição no sentido de constante controvérsia formada entre as partes. E a
partir dessa constante controvérsia o juiz forma seu convencimento. Tem-se entendido que
o princípio do contraditório busca evitar a surpresa da parte. O fundamento utilizado pelo
juiz, deve ser um fundamento que as partes já conhecem, e podem se manifestar sobre as
provas juntadas pelas partes, que levaram mais à frente à prolação da sentença do juiz. Esse
é o escopo do princípio do contraditório. Esses princípios da ampla defesa e do
contraditório são encontrados no art. 5º inciso LV da Constituição: “aos litigantes, em
processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o

15
Essa defesa cabe a ambos os litigantes, autor e réu, devendo ambos ter de mesma forma o direito de
defender seus pontos de vista, de sua pretensão e resistência, de acordo com os meios e os recursos legalmente
cabíveis. Esse princípio é levado a muitos extremos até.
Unidade III – Da Jurisdição 43

contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”. Também tem
previsão no Código de Processo Civil de 2015: “Art. 9o Não se proferirá decisão contra
uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. (...) Art. 10. O juiz não pode decidir,
em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado
às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva
decidir de ofício”.

Aula do dia 08 de setembro de 2015

Princípios da Jurisdição

Temos, após, o décimo segundo princípio da isonomia ou da igualdade das partes,


com ambas as partes do processo tendo o mesmo peso e devendo ser tratadas de forma
igualitária, não sendo o autor tratado de forma superior ao réu por ter sido aquele que entrou
com a ação, devendo ambas as partes ter idêntico tratamento do Estado-juiz, tendo os
mesmo direitos, as mesmas obrigações, os mesmos encargos e os mesmos ônus no
processo, decorrente do fato de todos serem iguais perante a lei, devendo consagrar esse
aspecto, não conferindo benefício a uma parte em detrimento da outra.

Decorrente desse princípio temos o princípio da imparcialidade do juiz. O juiz é


aquele que vai compor em nome do Estado do litígio, devendo analisar independente de
quem seja autor, e quem seja o réu. O juiz, dependendo, pode estar impedido, por exemplo,
caso o juiz ser irmão do réu, ou estar em suspeição, por conhecer o litigante e poder decidir
a seu favor/contra. O Estado-jurisdição vive da credibilidade, e no dia que perder sua
credibilidade terá problemas. Ele não deve apenas ser honesto, mas também parecer
honesto. É importante que se preserve a imparcialidade do juiz. O juiz precisa ter ideia da
repercussão do seu ato, não podendo ser apolítico. Temos ainda os artigos 7º e 8º que
apontam:

“Art. 7º É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício


de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres
e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo
contraditório.
44 Teoria geral do processo I

Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às


exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa
humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a
publicidade e a eficiência”.

O décimo quarto princípio é o princípio da lealdade processual ou lealdade entre


as partes no processo. As partes devem se portar no processo de modo leal, buscando
sempre a realização da justiça e a concretização dos ditames da lei. Buscando a parte sempre
defender os seus direitos seguindo as diretrizes do juiz, cumprindo rigorosamente o previsto
na lei, para assim termos a composição do litígio e a concretização dos aspectos previsto
na lei.

Temo como décimo quinto princípio o princípio da boa fé processual, muito ligado
ao princípio da lealdade. Segundo este as partes não devem se valer do processo para
produzir ou alcançar fins proibidos ou vedados por lei. O processo é um meio
público/estatal de composição da lide, e nesse contexto de meio público de composição da
lide o processo deve ser utilizado para alcançar uma finalidade prevista na norma, e os atos
processuais devem ser praticados nos limites da lei. As partes devem se portar com boa fé
no processo. Presume-se a boa fé, sendo difícil reconhecer a má fé, sendo, portanto difícil
aplicar sanções às partes que utilizam o processo com má fé, pela própria presunção da boa
fé das partes. Em relação a esse dois princípios temos:

“Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se


de acordo com a boa-fé.

Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se


obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.

Temos como décimo sexto o princípio do livre convencimento do juiz. Produzidas


as provas no processo o juiz tem inteira liberdade na formação do seu conhecimento,
devendo, no entanto, motivar a formação do seu convencimento, ou seja, o juiz tem
liberdade para apreciar as provas do processo, mas deve justificar a posição por ele tomada.
O juiz tem liberdade para formar o seu convencimento, mas deverá dizer os motivos pelos
quais ele formou o seu conhecimento. Ele tem liberdade de apreciação das provas e dos
fatos.
Unidade III – Da Jurisdição 45

O décimo sétimo princípio da publicidade dos atos processuais. O processo é o meio


público de composição dos lides, sendo o meio estatal de compor as lides, sendo o meio do
qual se vale o Estado para no exercício de sua função jurisdicional compor as lides, sendo
como meio de composição pública das lides necessário cumprir alguns requisitos, tendo
todo o cidadão o direito de saber como são julgados alguns processos, não sendo,
entretanto, esse princípio absoluto, com situações em que se deve proteger a vida íntima
das pessoas, como com a quebra de sigilo. Se por um lado o Estado assegura a todos inteira
liberdade de saber como são julgados os feitos e praticados os atos também resguarda a
vida íntima das pessoas. Em poucos países a publicidade tem tanto alcance quanto no
direito brasileiro16. O sigilo pode ser pedido pela parte, ou decretado pelo juiz. A ideia do
sigilo é de restrição dos aspectos do processo às partes.

O décimo oitavo princípio é o princípio da motivação das decisões judiciais. Todas


as decisões devem ser motivadas, devem ser fundamentadas sob pena de nulidade. O
Estado, na pessoa do juiz, deve justificar a adoção de sua posição. Isso que significa a
motivação das decisões judiciais. Deve ter por base as provas apresentadas (documentos,
testemunhas, provas periciais), devendo motivar sua decisão sendo nula caso contrário,
devendo proferir nova decisão. Esses dois últimos princípios inclusive têm previsão
constitucional no art. 93, inciso IX:

IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas


todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados
atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a
preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público
à informação;

E também no Código de Processo Civil em seu art. 11, temos:

Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas
todas as decisões, sob pena de nulidade.

16
Na corte americana, e muitas cortes europeias, a publicidade vai até a sustentação oral do advogado, sendo
a decisão tomada em uma sala fechada. Quando se chega a uma decisão, se escolhe um relator para apontar
a decisão. No Brasil, temos a ideia de fiscalização, com sociologicamente sendo aplicado em grande extensão
esse princípio da publicidade, com maior transparência.
46 Teoria geral do processo I

Parágrafo único. Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente das
partes, de seus advogados, de defensores públicos ou do Ministério Público.

Como décimo nono temos o princípio da economia processual. Segundo esse


princípio, o processo deve alcançar a sua finalidade como mínimo possível de dispêndio de
tempo e valores de natureza econômico-financeira. Portanto, por força desse princípio, o
processo deve ser visto como um instrumento a mais para composição da lide, buscando-
se a economia de gastos e tempo. Temos, por exemplo, do caso das provas a serem
utilizadas de forma a ter essa economia de tempo e gastos.

Temos como vigésimo o princípio da razoável duração do processo. Segundo esse


princípio, todos tem direito à composição da lide em um tempo razoável e proporcional.
Busca-se assegurar que as partes tenham uma resposta do Estado-jurisdição na maior
brevidade possível, sendo também um princípio constitucional, no art. 5º: “LXXVIII – a
todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo
e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Esse tempo razoável depende do processo, de modo que os processos não demorem sem
uma razão para tal. É um direito da parte ser o caso julgado o mais rápido possível com
serenidade. Se contempla também esse princípio no Código de Processo Civil em seu art.
4º: “As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída
a atividade satisfativa”.

Os aspectos da Jurisdição

A jurisdição apresenta três aspectos: o aspecto material, o aspecto formal e o


aspecto orgânico. Muitos falam de elementos da jurisdição, que atua como sinônimo. O
aspecto ou elemento material da jurisdição consiste nos poderes de julgar e executar os
seus julgados. É material no sentido de ser da própria matéria, da própria essência da
jurisdição, porque esses poderes dizem respeito à própria matéria da jurisdição, não sendo
possível conceber uma jurisdição sem esses aspectos. São os poderes que demonstram a
própria razão de ser da jurisdição.
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 47

Os aspectos ou elementos formais da jurisdição são o processo e a coisa julgada.


Formalmente, o processo é o instrumento que se vale o Estado para composição das lides.
O processo é esse meio pelo qual o Estado vai compor o litígio, a lide, não havendo outro
meio formal de composição da lide por um agente do próprio Estado que não seja o
processo, por isso que formalmente o processo é um elemento formal da jurisdição. A coisa
julgada é um elemento formal tendo o processo alcançando sua razão de ser com a coisa
julgada, pois a partir dela formalmente a lide deixou de existir, com o Estado dando a última
palavra sobre aquela lide e está deixando de existir, não havendo mais lide a ser composta,
com o Estado julgando e decidindo o litígio, com o Estado dando sua palavra definitiva,
compondo definitivamente o litígio.

Por fim temos o elemento orgânico da jurisdição no poder Judiciário que


organicamente exerce a jurisdição em nome do Estado.

Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional

I. Fundamentos, Características e Finalidades Comuns às


diversas Funções do Estado Constitucional: Legislação,
Adm. Pública e Jurisdição.

a. Noções introdutórias

Nesse contexto podemos dizer que o Estado no exercício de sua função primordial de
criar e desenvolver as condições de vida em sociedade exerce três funções independentes e
harmônicas entre si que correspondem aos três poderes. Temos a função da legislação
correspondendo ao poder Legislativo, a função da Administração Pública correspondendo
ao poder Executivo, e a Jurisdição correspondendo ao poder Judiciário. Na função
legislativa o Estado trata de elaborar as normas que vão regular as condições de vida em
sociedade, inclusive em relação à estrutura do próprio Estado. Portanto, o Estado no
momento em que exerce a função legislativa irá elaborar as regras, as normas que irão reger
e regular a vida em sociedade, inclusive em relação à própria estrutura do Estado. Serão
48 Teoria geral do processo I

nessas normas que o Estado elaborar que se reconhece o direito. São normas que o Estado
elabora de forma a regular as relações entre as pessoas e entre as pessoas e o próprio Estado.

Na função legislativa teremos a elaboração de normas que buscam regular toda a vida
privada no âmbito do Estado e a vida desse cidadão em relação ao Estado ou desse Estado
em relação ao cidadão.

Na função administrativa exercida pelo poder Executivo o próprio Estado


administração aplicando as normas elaboradas pelo Estado-legislação com a finalidade de
gerir, conduzir, os interesses do próprio Estado e de seus cidadãos. Ou seja, na função
administrativa, o Estado irá aplicar as leis que ele próprio Estado ao exercer a função
legislativa elaborou de forma a gerir os interesses do próprio Estado e de seus cidadãos. De
tal forma irá construir, conceder reajustes. Isso tudo é o Estado administração aplicando a
lei elaborada pelo Estado-administração. Tudo que o administrador deve fazer há de
encontrar previsão legislativa. Toda ação administrativa deve encontrar previsão legislativa
que a preceda. O Estado administração vai aplicar a norma elaborada para gerenciar os
negócios do próprio Estado nas relações Estado-cidadão, Cidadão-Estado ou cidadão-
cidadão.

Por fim temos o Estado-jurisdição, o Estado exercendo sua função jurisdicional, que,
aplicando as normas elaboradas pela função legislativa, compor as lides. O Estado-
jurisdição vai aplicar as normas elaboradas para o fim de compor os litígios, são as normas
de direito material e processual, estas últimas apontando para a forma de condução do
processo, tudo encontrando previsão na lei, na norma.

A legislação que fornece os parâmetros,

Legislação
direcionando as demais funções, por isso nos
regimes parlamentaristas a função legislativa
e administrativa se confundem, exercendo a
administração o controle do legislativo,
caindo o governo em caso contrário, não
havendo o exercício de função administrativa
Administração Jurisdição
sem a capacidade de exercer função
Figura 5 - Relação entre os três poderes legislativa.
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 49

Aula do dia 10 de setembro de 2015

B. Jurisdição e Legislação

Na função legislativa o Estado estabelece as normas de conduta a serem aplicadas à


sociedade. Enquanto na função jurisdicional, o Estado aplicando as normas elaboradas pela
função legislativa, ele irá compor os conflitos.

A relação entre Jurisdição e Legislação é às vezes conflituosas, e no que se refere a uma


relação de antecedência, podemos dizer que a legislação antecede a jurisdição, porque a
jurisdição vai se concretizar aplicando a norma elaborada pela função legislativa, por isso
falamos que em uma relação de antecedência a legislação antecede a jurisdição. Podemos
também afirmar um outro aspecto na própria origem da jurisdição, que nos mostra como a
legislação antecede a jurisdição, designando o papel à jurisdição, com a legislação como
pressuposto da jurisdição o próprio jus, o pressuposto da jurisdição. Temos como
pressupostos a autoridade para aplicar o jus, e o próprio jus. Logo, a legislação, logicamente
antecede a jurisdição. Nesse aspecto de legislação antecedendo jurisdição, em que teríamos
uma “caixa” contendo todo o jus, colocando a jurisdição dentro dessa caixa, essa caixa não
seria suficiente para caber a jurisdição, porque às vezes o Estado Jurisdição julga mesmo
sem haver norma a respeito do tema. O Estado, se há uma demanda entre o autor e o réu,
ele deve dar uma resposta por força do princípio da inafastabilidade. O Estado-juiz não
pode se recusar de prestar a jurisdição pelo argumento de falta de norma sobre a matéria,
aplicando “as normas da caixa”, mas além dela outros elementos necessários à solução de
litígios, como os princípios, o costume. Por isso o espectro de aplicação da jurisdição é
mais amplo que o da legislação. Por isso também temos um fenômeno hoje fonte de conflito
entre a jurisdição e a legislação por conta da aplicação do ativismo judicial, ou como muitos
dizem a jurisdicização da política, porque por força do princípio da inafastabilidade, diante
de uma demanda, o Estado-juiz precisa fornecer uma resposta a essa demanda, só que essa
resposta a ser dada pelo Estado-juiz nem sempre vai encontrar uma prévia previsão
legislativa. Por força dessa figura do ativismo judicial, se questiona a entrada do Judiciário
na esfera legislativa elaborando normas para resolução do litígio entre o autor e o réu, com
a sentença servindo como norma para regular a conduta entre autor e réu. Tem-se, portanto,
esse conflito latente, tendo por um lado a necessidade de resposta, e por outro a dificuldade
50 Teoria geral do processo I

do Parlamento de se elaborar normas, com uma representatividade de várias bancadas com


vários grupos de pressão, sendo cada dia mais difícil elaborar regras, devendo-se atender
tantos grupos que para uma norma “passar” ela precisa agradar muitos grupos, e quando
não agrada a todos opta-se pela situação mais cômoda de não legislar, trazendo problemas
nas relações sociais. A escolha do Estado-legislação por não legislar não acaba com os
conflitos, mas quem terá que dar a palavra sobre os conflitos será o juiz, que não pode optar
por não julgar, diferente do legislador. Toda e qualquer atividade legislativa é uma
atividade política, podendo falar ao falar de uma jurisdicização da política ao falar sobre o
ativismo judicial.

Não se pode ignorar que ao tomar uma decisão o juiz sempre acaba por legislar, sempre
acaba agindo de forma política, mas não político partidária. Por isso desde sempre em um
Estado democrático de direito não temos um legislativo acompanhando a jurisdição. O
grande problema não é o ativismo judicial, mas quando a jurisdição não acompanha a
legislação, ou seja, quando há uma distância entre o judiciário e o legislativo, sem que haja
algo a preencher essa distância, exceto pelo poder dos mais fortes, por frustações e pelos
próprios conflitos, diferente de quando o legislativo não acompanha a jurisdição, mas sendo
a distância preenchida pelo ativismo judicial. Quando a sociedade (legislativo) está à frente
do Judiciário, começa-se a imaginar a resolução do problema pela própria força, com a
descrença nas instituições, culminando em ações como a de linchamento, em um desaguar
de frustações em relação às Instituições, relacionado às próprias instituições do Estado que
devem satisfazer os cidadãos. Essa relação é problemática por se relacionar com as
instituições do Estado em sua relação com a sociedade.

Temos sempre como parâmetro a Constituição. Mas o agigantamento de um vem em


apequenamento de outro. Por outro lado, não podemos ignorar as necessidades da
sociedade a serem atendidas, sendo difícil encontrar o parâmentro ideal para que não aja a
extrapolação. É muito diferente de um contexto de Parlamento. Há algo que é essencial a
todos: a credibilidade, a legitimidade. No momento que o cidadão perde a credibilidade em
suas instituições temos um grande problema, sendo preferível ter uma instituição atendendo
os anseios da população do que não ter nenhuma. Essa dificuldade legislativa para legislar
salta os olhos. É algo natural da democracia. Todo Parlamento tem os grupos que estão lá
representados, que olharam os interesses do grupo. Não passa a norma, mas a sociedade
não para. Não temos como desvincular o processo da política. Todo o direito é reflexo de
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 51

um poder político em um determinado contexto histórico e isso se aplica completamente


ao processo, instrumento da jurisdição, que é política, e o processo também é político, ainda
que diferente do político partidário.

Ainda nessa relação falamos também que a legislação trata de elaborar regras genéricas
e abstratas de conduta destinadas a reger a vida em sociedade. Mas a legislação elabora
regras gerais e abstratas, reconhecendo e elaborando, declarando de forma taxativa, por
exemplo, o direito à personalidade. O juiz irá concretizar a norma elaborada de forma
genérica e abstrata pela legislação sendo concretizada para assim se ter a composição do
litígio. Enquanto a legislação elabora uma regra geral e abstrata, a jurisdição traz a norma
para o caso concreto de forma a compor um conflito de interesses, um litígio.

A questão do ativismo judicial, o juiz no momento que julga um litígio independente


da norma do Estado, julgando sem a norma, ele não quebra essa relação. Ele dentro da ideia
hermenêutica ele dará resposta a esse conflito independente da norma. Em um aspecto
institucional, saindo de DWORKIN e indo para WEBER, não haveria essa quebra porque
o juiz institucionalmente aplicando o princípio da inafastabilidade ele está realizando a sua
competência. Por isso a importância de se ter como parâmetro a Constituição. Se tem toda
resposta a um aspecto político, seja em uma ótica concretista, dos envolvidos no litígio, que
concretamente, particularizadamente no caso concreto estão envolvidos no litígio, seja em
uma ótica abstrata institucional, não havendo quebra da anterioridade.

Jurisdição vem do latim “dizer o direito”, no dizer o direito para compor as lides. A
legislação também é uma atividade que diz o direito, mas o diz como origem do direito,
visto o direito dentro de uma concepção normativa. Nesse contexto podemos
tranquilamente dizer que a legislação também é uma atividade que diz o Direito com um
enfoque diverso da jurisdição.

C. Jurisdição e Administração

A função administrativa e jurisdicional do Estado aplicam as leis elaboradas pela


função legislativa. O critério orgânico da administração exercida pelo poder executivo
administrando o Estado com base na lei elaborada pela legislação e a jurisdição utilizando
52 Teoria geral do processo I

a legislação de forma a compor o litígio, não é o bastante para realizar a diferenciação. A


administração também julga e a jurisdição também administra, como quando a
administração julga um servidor que cometeu um ato que não deveria, e a jurisdição
administra quando celebra uma licitação para contratar uma empresa para realizar o serviço
de limpeza do Fórum, ou quando celebra uma licitação. Por isso esse critério orgânico não
é suficiente, sendo necessário analisar outras atividades realizadas que permitam uma
diferenciação.

A primeira diferenciação que podemos fazer é eventualmente ao modo de aplicação da


lei, pois ainda que ambas apliquem a lei, a jurisdição aplica uma lei para resolver, para
dirimir um conflito, enquanto a administração aplica a lei com o sentido de gerenciar, gerir
os interesses do Estado ou dos cidadãos. O papel da jurisdição na aplicação da lei, seja no
legislar negativamente, estará inserida no contexto de incidência da norma para resolver
um conflito, enquanto na administração essa incidência da norma será para os interesses do
Estado e dos cidadãos. Dentro desse contexto, toda e qualquer atividade jurisdicional ao
aplicar uma norma para resolver um conflito, estará concretizando a norma. O interesse do
juiz, do julgador, do servidor que age em nome do Estado é compor a lide, segundo o
princípio da inafastabilidade, não importando o critério de hermenêutica a ser utilizado.

A outra diferença que podemos ver é que a jurisdição só age quando provocada, sendo
por sua própria natureza inerte, segundo o princípio da inércia, sendo por sua própria
natureza inerte, não tomando a iniciativa de prestar a jurisdição. Por outro lado, a
administração tem a iniciativa. A partir daí cabe ao Estado provedor realizar as atividades
para o seu fim. O administrador tem iniciativa que o julgador não tem.

Temos ainda outra diferenciação quanto a aplicação da norma. Ainda que ambas as
funções apliquem as normas, só que a jurisdição aplica a norma como a razão de ser da
solução de um conflito, enquanto que a administração aplica a norma como um limite à sua
atuação. A outra diferença é que a jurisdição aplica a norma em face de um conflito, e por
isso, o julgador adota uma posição de imparcialidade no momento da aplicação da norma.
Já o administrador não tem posição de imparcialidade em relação a norma, aplicando-a em
interesse próprio da administração para saber o que ele pode ou não fazer. Se o orçamento
previu que em uma duplicação de uma rodovia o administrador pode gastar X, ele irá aplicar
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 53

a norma no interesse da própria administração para realizar aquela norma. São essas
portanto as principais diferenças possíveis de serem identificadas.

II. Jurisdição Contenciosa e Voluntária

A. Espécies de Jurisdição

A jurisdição é inerente ao próprio poder estatal soberano e rigorosamente, se a


jurisdição é inerente ao próprio poder estatal soberano, se se fala de espécies de jurisdição.
Rigorosamente, não podemos falar de espécies de jurisdição, pois como o poder estatal
soberano, a jurisdição é uma e indivisível. Se fala em jurisdição trabalhista, eleitoral, para
se visualizar melhor como essa jurisdição atua dentro de um Estado soberano, e é apenas
por isso que falamos em espécies de jurisdição, não entendendo que podemos ter múltiplas
jurisdições em um dado território por ser inerente ao próprio pode estatal soberano, mas
para melhor visualização do funcionamento da jurisdição una e indivisível falamos de
espécies de jurisdição.

Nesse aspecto, em relação à matéria, a jurisdição pode ser (1) penal ou (2) cível (não
penal).

(1) A jurisdição penal é a jurisdição que versa sobre lides de natureza penal, ou seja, é
a jurisdição que versa sobre conflitos de interesse qualificados por pretensão de
natureza punitiva. Na jurisdição penal, portanto, aplicamos o código penal e o
código penal militar, e o instrumento da jurisdição penal é o processo penal e o
processo penal militar. Temos a atuação do Estado-juiz para resolver um conflito
com pretensão de aplicar uma punição a alguém que realizou um tipo penal.
(2) A jurisdição cível ou não-penal é a jurisdição que versa sobre lides de natureza não-
penal, isto é, versa sobre conflitos de interesse qualificados por pretensão de
natureza não-punitiva. Na jurisdição não-penal temos o Estado-juiz resolvendo
conflitos de interesse com natureza não-punitiva (indenização, pagamento de um
valor a mais). Aqui se inclui lides eventualmente administrativas, tributárias, cíveis.
Dentro dessa jurisdição, por questão de conveniência do legislador, foram retiradas
algumas espécies de lide que passaram a constituir objeto de jurisdições próprias, é
54 Teoria geral do processo I

o caso da jurisdição trabalhista e eleitoral. Portanto, jurisdição cível ou não-penal


em sentido estrito vem a ser a jurisdição que versa sobre lides nas quais se discute
pretensão de natureza não punitiva com exclusão daquelas lides que por
conveniência do legislador constituinte formam jurisdições especiais. Portanto,
temos a jurisdição cível ou não penal em sentido amplo, discutindo toda e qualquer
lide com pretensão não-punitiva. A justiça federal faz parte da jurisdição comum.

Aula do dia 22 de setembro de 2015

Espécies de Jurisdição

Quanto ao organismo judiciário que a exercem, a jurisdição pode ser classificada


como especial ou comum. A jurisdição especial é aquela exercida pelos órgãos
jurisdicionais em relação aos quais a Constituição reconheceu um caráter de especialidade
em relação à matéria contravertida ou às pessoas envolvidas no litígio. São objeto de
legislação, de jurisdição própria (ex.: Trabalho, Eleitoral, Penal Militar), sendo jurisdições
especiais por essa jurisdição própria vista a especialidade da matéria e das pessoas, a cargo
do legislador Constituinte. A jurisdição comum é aquela exercida em relação aos litígios
nos quais o legislador constituinte não visualizou aspectos que ensejariam a formação de
uma jurisdição especial. Surge por exclusão, ou seja, daquilo que não é jurisdição especial
(juízes federais, municipais). Tal diferenciação é determinada pelo seu conteúdo (ex.:
trabalho) ou pessoa (ex.: militar).

Quanto a posição hierárquica dos organismos judiciários que a exercem, a jurisdição


pode ser inferior (originária) ou superior (recursal). A jurisdição inferior/originária é
a jurisdição exercida pelos órgãos jurisdicionais que conhecem do litígio em primeiro lugar
(originariamente). É a jurisdição exercida pelos juízes em primeiro grau. A jurisdição
superior/recursal é a jurisdição exercida pelos magistrados que julgam a causa em um
grau de recurso, isto é, em grau superior, por exemplo o STJ ao julgar um recurso
interposto, ou o STF em caso de recurso extraordinário. Não cabe fazer uma generalização
em relação aos tribunais apreciados, porque podemos ter ocasiões em que um mesmo
tribunal pode agir como tribunal recursal em um caso e recursal em outro. O STF é sempre
recursal.
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 55

O foro privilegiado gera situações em que há o julgamento por um órgão


jurisdicional em que não cabe recurso, porque o recurso é para o próprio órgão.

Na classificação da jurisdição quanto à fonte do direito com base na qual é proferido


o julgamento, temos uma jurisdição podendo ser de direito ou por equidade, isto é, com
base na fonte do direito que serve de substrato ao julgamento a jurisdição se classifica em
jurisdição de direito ou por equidade.

A jurisdição de direito é a exercida nos termos de uma precisa regulação legal. O


juiz não pode fugir dos ditames da lei. Por outro lado, a jurisdição por equidade é a
jurisdição na qual está o juiz autorizado a julgar fora dos ditames previstos na lei, valendo-
se para tanto de um juízo de equidade. A nossa jurisdição é uma jurisdição de direito,
porque havendo a norma o juiz deve aplica-la.

Temos quanto ao seu objeto a jurisdição contenciosa e a jurisdição voluntária.


Moacyr Amaral Santos classifica em relação ao seu objeto a jurisdição em jurisdição
contenciosa e voluntária. A jurisdição contenciosa é a autentica e verdadeira jurisdição,
sendo a jurisdição que versa sobre os conflitos de interesses, ou seja, tem por objeto a
composição dos conflitos de interesse, por isso afirmando-a como a autêntica e verdadeira
jurisdição, que surge como um instrumento para o Estado compor os conflitos de interesses.
Esses conflitos de interesse podem ser ou não litigiosos, ainda que na grande maioria das
vezes o sejam. Podemos ter eventualmente uma jurisdição contenciosa sem ser litigiosa,
por exemplo um processo no qual não houve a contestação do réu do pedido do autor. Mas
ainda assim o conflito ocorreu, porque houve a necessidade de haver o pedido. Nessa
jurisdição contenciosa, pelo seu objetivo, teremos alguém que irá acionar o Estado-juiz em
relação a outra pessoa (réu), alguém que irá exercer a jurisdição. Temos, como primeira
característica nessa jurisdição a existência de partes no processo. Essas partes são o autor e
o réu, contra quem ou em relação a quem foi pedida a tutela jurisdicional. A segunda
característica reside na situação de que, o autor deduz uma pretensão contra ou em relação
ao réu. O Estado juiz, para acolher essa pretensão do autor, terá de ouvir a defesa do réu,
que terá oportunidade de contradizer o autor no momento que esse estabeleceu uma
pretensão contra ele. Essa segunda característica é, portanto, a possibilidade de instalação
do contraditório. O contraditório tem início na situação do réu para realizar sua contestação.
O processo tem na contestação do réu apenas a primeira possibilidade de se instaurar o
56 Teoria geral do processo I

contraditório, visto que todo o processo se desenvolve sob o signo do contraditório. Temos
uma tendência de acharmos que o contraditório só serve para ajudar o réu, mas também
serve para beneficiar o autor, como quando o réu traz uma prova nova aos autos, dando
oportunidade do contraditório ao autor. Portanto, na jurisdição contenciosa, como temos o
conflito a ser composto, este será composto com a observância do contraditório. E ainda
temos o contraditório como característica da jurisdição contenciosa. E também como
característica da jurisdição contenciosa, temos a seguinte circunstância: a jurisdição
contenciosa tem como objeto a composição do conflito. A composição do conflito se dá
quando houver o trânsito em julgado da sentença ou do acórdão. Na jurisdição contenciosa
há a coisa julgada. É a decisão ao qual não mais cabe o recurso. E diante dessa última
palavra do Estado juiz podemos dizer que esse conflito está definitivamente composto,
resolvido. E nesse sentido, a jurisdição contenciosa alcançou o seu ser, ela compôs o seu
conflito. Temos ainda outra característica de que na jurisdição contenciosa o Estado-juiz
como vai resolver o conflito entre o autor e réu se porta com imparcialidade. O juiz é o
sujeito imparcial da relação processual no âmbito da jurisdição contenciosa, sendo o sujeito
que em nome do Estado irá dizer se o autor tem razão em sua pretensão ou se o réu tem
razão em sua resistência. Essa posição de imparcialidade do juiz no curso do processo é
também uma característica.

Ao lado dessa jurisdição contenciosa, temos a figura da jurisdição voluntária.


Enquanto a jurisdição contenciosa tem por objeto a composição dos conflitos de interesses,
a jurisdição voluntária versa sobre interesses não em conflito, interesses que não são
conflituosos. Temos várias categorias de interesses privados, alguns deles acarretando a
intervenção do Estado; mas alguns interesses privados para sua repercussão na sociedade e
para as pessoas em geral faz com que o Estado neles intervenha, como o caso do nascimento
de uma pessoa, que é um aspecto privado mas de importância, sendo registrada a pessoa.
A declaração de óbito, a formação de uma empresa são pontos privados mas que pela sua
repercussão fazem com que o Estado neles intervenha, fazendo com que aqueles interesses
privados tenham a presença do Estado. Nos casos de certidão de nascimento e óbito, o
próprio casamento, são interesses privados nos quais o Estado interfere, mas nenhum desses
interesses será administrado por um órgão legislativa. Mas há ainda aqueles em que o
Estado intervém e aponta os interesses não em conflito mas que cabem ao juiz, como a
nomeação de um tutor nomeado pelo juiz. São atos privados em relação aos quais a lei
determina que deva ser feita a administração desses interesses pelo próprio órgão
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 57

jurisdicional. Temos aspectos totalmente privado entre entes privados. Podemos ter um tipo
de interesse privado que acarrete intervenção do Estado. São interesses privados que pela
sua repercussão exige a interferência de um órgão em tese estatal. Temos ainda os interesses
em que se estabelece um agente judiciário para responder. São interesses privados que
constituem objeto de uma apreciação jurisdicional. O que era originalmente uma jurisdição
voluntária pode se tornar contenciosa, por exemplo da separação por mútuo consentimento
se tornando um conflito. É essencial para a distinção verificar a presença ou não do conflito.

(1) Na jurisdição voluntária temos interesses que não estão em conflito. Se não há
um conflito de interesses, logo podemos dizer que uma das características da
jurisdição voluntária é a não existência de partes, mas interessados.
(2) Como na jurisdição voluntária temos interesses que não estão em conflito, temos
nesse caso como segunda característica a ausência de contraditório na jurisdição
voluntária.
(3) Se não temos na jurisdição voluntária conflitos de interesses, não há o que
compor em termos de conflito. A atividade do Estado-juiz não se destina a
compor conflitos ou ao apaziguamento social, não havendo, portanto, coisa
julgada. Por isso temos em uma determinada circunstância, podendo, por
exemplo, nomear um tutor e depois outro, desde que mais conveniente ao
interesse do menor.
(4) Como última característica temos que na jurisdição voluntária o juiz não age
com imparcialidade, mas buscando tutelar os interesses que em tese devem ser
protegidos, como no exemplo do menor, analisando o que é melhor para ele. Na
jurisdição voluntária o juiz abandona o seu componente de imparcialidade para
zelar pelos interesses que lhe são entregues para administrar.

Independentemente da jurisdição ser contenciosa ou voluntária, ela será sempre


exercida pelo juiz.

O processo administrativo tem regras próprias, sendo difícil analisar suas


peculiaridades. Uma decisão feita por analogia também é de direito. Temos o interesse
meramente privado, o interesse privado com a intervenção do Estado que não jurisdição e
o interesse privado com a intervenção do Estado jurisdição.
58 Teoria geral do processo I

Jurisdição e Organização Judiciária

Aula do dia 24 de setembro de 2015

Na nossa estrutura temos o poder Judiciário estruturado na esfera estadual e na


esfera da União. Nosso sistema federativo não é como o Norte-americano em que
encontramos o juiz estadual, municipal, do condado, com juízes eleitos e federais nomeados
pelo presidente da república e estadual pelo governador. Não temos no Brasil uma justiça
municipal, mas estadual ou da união.

Cada estado membro da federação tem o seu próprio poder judiciário estruturado
pela Constituição estadual e organizado pela lei de organização judiciária local, estadual,
com estruturas de poder judiciário com organização do poder judiciário dada pela lei de
organização judiciária local, com a previsão de cada Vara de justiça estadual, horário de
funcionamento das varas, com todo estado da federação tendo essa lei. O Distrito Federal
tem uma justiça do DF que integra o aparato estatal da União, sendo bancada por esta. É
chamada a Justiça do Distrito Federal e Territórios, embora não tenhamos mais na nossa
estrutura os territórios. É a Constituição estadual e a lei de organização judiciária local que
disciplina a estrutura judiciária de cada membro da federação.

Na Constituição Federal, no art. 125 temos:

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios


estabelecidos nesta Constituição. (EC no 45/2004)

80 Constituição da República Federativa do Brasil

§ 1o A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado,


sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.

§ 2o Cabe aos Estados a instituição de representação de


inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face
da Constituição estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único
órgão.
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 59

§ 3o A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a


Justiça

Militar estadual, constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos


Conselhos de Justiça e, em segundo grau, pelo próprio Tribunal de Justiça, ou
por Tribunal de Justiça

Militar nos Estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes.

§ 4o Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos


Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos
disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for
civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente
dos oficiais e da graduação das praças.

§ 5o Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar,


singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais
contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a
presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares.

§ 6o O Tribunal de Justiça poderá funcionar descentralizadamente, constituindo

Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça


em todas as fases do processo.

§ 7o O Tribunal de Justiça instalará a justiça itinerante, com a realização de


audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da
respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários.

A Justiça estadual tem como órgão de primeiro grau de jurisdição os chamados


Juízos de Direito. O juiz de direito exerce em primeiro grau de jurisdição a jurisdição no
âmbito dos estados membros da federação, ingressando na magistratura estadual através de
um concurso público de provas e títulos. Cada estado da federação tem o seu próprio
concurso, não sendo permitido que o aprovado no concurso de um estado seja transferido
para outro. Irá exercer sua jurisdição no âmbito de sua comarca, a circunscrição territorial
60 Teoria geral do processo I

no âmbito do qual o juiz estadual exerce sua jurisdição. A justiça estadual no primeiro grau
de jurisdição é organizada em entrâncias. Em geral o juiz de direito aprovado em concurso
irá exerce primeiramente em uma comarca de primeira entrância, entrando como juiz
substituto. São as comarcas menores de uma população menor em que em geral há um
único juiz que julga toda a competência da justiça estadual. Entra na carreira da
magistratura estadual como juiz de primeira entrância, podendo ser posteriormente
promovido a uma comarca de 2ª estância, ocorrendo sempre alternadamente por
antiguidade e por merecimento. Na comarca de segunda entrância, já será uma comarca
maior, não sendo mais apenas um juiz, com uma competência limitada. Posteriormente,
também por promoção (antiguidade e merecimento) será promovido para uma comarca de
terceira estância, em uma cidade maior, com um número maior de juízes, com uma
competência mais limitada ainda. Em muitos estados há ainda a comarca de entrância
especial, em geral as comarcas da capital do estado e aquelas cidades maiores. Essa é uma
regra geral, sendo disciplinada por estado, nada impedindo que possa haver estruturas
diferentes.

O termo comarca compete apenas a justiça estadual, e mesmo na justiça do DF á


circunscrições e não comarcas. O juiz de direito tem sua jurisdição limitada a sua comarca.
Podem haver comarcas com jurisdição sobre vários municípios (termos de uma comarca).
A justiça estadual tem como órgão de cúpula o chamado Tribunal de Justiça. Os Tribunais
de Justiça dos estados têm jurisdição sobre a integralidade do estado. O tribunal de justiça
Figura 6 - Pirâmide de Promoção na Jurisdição Estadual é formado/integrado por

Tribunal de desembargadores, definido


Justiça
diferentemente em cada estado. O
(Comarca de
estância Tribunal de Justiça é integrado
especial)
por: 4/5 dos desembargadores
Comarca de 3ª
estância juízes de direito; 1/5 por
advogados e membros do
Comarca de 2ª estância
Ministério Público (quinto
Comarca de 1ª estância constitucional). O Tribunal de
Justiça como tribunal de recurso
Substituto
tendo como principal recurso por
ele julgado a apelação, ainda que
não seja o único, interposta pelo Juiz de Direito das comarcas. O Juiz de Direito tem acesso
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 61

ao Tribunal de Justiça também por promoção segundo os critérios da antiguidade e


merecimento, e nesse caso para ter acesso ao Tribunal de Justiça deve estar na última
estância e na 5ª parte mais antiga da carreira, para que possa ter aspiração a ser
desembargador no Tribunal de Justiça do estado, mesmo para promoção por merecimento.
No art. 93 da Constituição Federal, temos:

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá


sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: (EC no
19/98, EC no

20/98 e EC no 45/2004)

I – ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante


concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos
Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no
mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à
ordem de classificação;

II – promoção de entrância para entrância, alternadamente, por antiguidade e


merecimento, atendidas as seguintes normas:

a) é obrigatória a promoção do juiz que figure por três vezes consecutivas ou


cinco alternadas em lista de merecimento;

b) a promoção por merecimento pressupõe dois anos de exercício na respectiva


entrância e integrar o juiz a primeira quinta parte da lista de antiguidade desta,
salvo se não houver com tais requisitos quem aceite o lugar vago;

c) aferição do merecimento conforme o desempenho e pelos critérios objetivos


de produtividade e presteza no exercício da jurisdição e pela freqüência e
aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento;

d) na apuração de antigüidade, o tribunal somente poderá recusar o juiz mais


antigo pelo voto fundamentado de dois terços de seus membros, conforme
procedimento próprio, e assegurada ampla defesa, repetindo-se a votação até
fixar-se a indicação;
62 Teoria geral do processo I

e) não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder
além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho
ou decisão;

III – o acesso aos tribunais de segundo grau far-se-á por antigüidade e


merecimento, alternadamente, apurados na última ou única entrância;

IV – previsão de cursos oficiais de preparação, aperfeiçoamento e promoção de


magistrados, constituindo etapa obrigatória do processo de vitaliciamento a
participação em curso oficial ou reconhecido por escola nacional de formação e
aperfeiçoamento de magistrados;

V – o subsídio dos Ministros dos Tribunais Superiores corresponderá a noventa


e cinco por cento do subsídio mensal fixado para os Ministros do Supremo
Tribunal

Federal e os subsídios dos demais magistrados serão fixados em lei e


escalonados, em nível federal e estadual, conforme as respectivas categorias da
estrutura judiciária nacional, não podendo a diferença entre uma e outra ser
superior a dez por cento ou inferior a cinco por cento, nem exceder a noventa e
cinco por cento do subsídio mensal dos Ministros dos Tribunais Superiores,
obedecido, em qualquer caso, o disposto nos arts. 37, XI, e 39, § 4o;

VI – a aposentadoria dos magistrados e a pensão de seus dependentes observarão


o disposto no art. 40;

VII – o juiz titular residirá na respectiva comarca, salvo autorização do tribunal;

VIII – o ato de remoção, disponibilidade e aposentadoria do magistrado, por


interesse público, fundar-se-á em decisão por voto da maioria absoluta do
respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça, assegurada ampla
defesa;

VIII-A – a remoção a pedido ou a permuta de magistrados de comarca de igual


entrância atenderá, no que couber, ao disposto nas alíneas “a”, “b”, “c” e “e” do
inciso II;

IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e


fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 63

presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou


somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do
interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

X – as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão


pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus
membros;

XI – nos tribunais com número superior a vinte e cinco julgadores, poderá ser
constituído órgão especial, com o mínimo de onze e o máximo de vinte e cinco
membros, para o exercício das atribuições administrativas e jurisdicionais
delegadas da competência do tribunal pleno, provendo-se metade das vagas por
antigüidade e a outra metade por eleição pelo tribunal pleno;

XII – a atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas


nos juízos e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver
expediente forense normal, juízes em plantão permanente;

XIII – o número de juízes na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva


demanda judicial e à respectiva população;

XIV – os servidores receberão delegação para a prática de atos de administração


e atos de mero expediente sem caráter decisório;

XV – a distribuição de processos será imediata, em todos os graus de jurisdição.

Podemos ter estados com regulação diferente da acima. Portanto temos que, para
um juiz tenha acesso ao cargo de desembargador deve estar na última estância com
promoção sempre alternadamente por antiguidade e por merecimento. Quando a promoção
é por antiguidade, lança-se um edital pedindo que os juízes manifestem o seu interesse por
ocupar aquela vaga, e os juízes de direito que entregam essas condições, selecionando o
nome mais antigo e submetendo-o ao plenário de justiça para aprova-lo ou não. Sendo
aprovado o nome, a promoção é efetivada. Quando a vaga for por merecimento, o
presidente do tribunal lança o edital dando ciência aos juízes de direito sobre a vaga e pede
que os juízes de direito da entrância especial ou última estância que integrem a 5ª parte do
tribunal manifestem interesse. E aí os juízes de direito que perfazem tais condições
apresentam seus nomes e o presidente do tribunal irá submeter ao plenário o nome de todos
64 Teoria geral do processo I

os que se candidataram dentro dos requisitos. E aí o tribunal irá elaborar uma lista tríplice,
encaminhada ao próprio presidente do tribunal que irá escolher, normalmente o primeiro
da lista que foi mais votado no âmbito do plenário do tribunal. Deve ser promovido aquele
juiz que por três vezes seguidas integrou a lista tríplice, ou não consecutivamente por cinco
vezes. Quando for vaga do quinto constitucional, deve ser advogado com mais de 10 anos
de carreira, assim como membro do Ministério Público com mais de 10 anos de carreira,
como exposto no art. 94:

O presidente do tribunal informa a OAB local sobre a aposentadoria e vaga a ser


preenchida por um advogado, solicitando à OAB a elaboração de uma lista sêxtupla a ser
encaminhada ao Tribunal de Justiça respectivo. A respeito disso a OAB se reúne, faz uma
convocação a todos os advogados do estado que manifestem seu interesse ou não em
compor o tribunal. Em geral se usa a votação pelo conselho da ordem para elaboração da
lista a ser encaminhada ao tribunal de justiça. O Tribunal de Justiça ao receber a lista
sêxtupla se reúne e pelo seu órgão pleno transforma essa lista sêxtupla em uma lista tríplice.
Essa lista tríplice é enviada pelo tribunal ao governador do estado para escolher um nome
desses para compor o quinto. Não vale a promoção obrigatória pela figuração na lista, regra
válida apenas para o juiz de direito. O Tribunal de Justiça que define se será a OAB ou o
MP que irá caber na vaga. Quando o número é par, já se sabe anteriormente, mas quando o
quinto é ímpar, não é possível ter o mesmo número de cada parte, ocorrendo uma
alternância entre o MP e a advocacia, cabendo ao Tribunal a decisão de quem ocupará o
cargo. No caso da lista tríplice, cada membro ao elaborar a lista vota em três nomes.
Figura 7 - Composição dos Desembargadores do Tribunal de
Justiça
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 65

Quando a vaga é de Ministério


Público, o presidente do Tribunal de Justiça
respectivo encaminha um ofício ao chefe do
Juízes de
Direito
(4/5)
Ministério Público local, o Procurador Geral
Advogados
de Justiça, informando da abertura da vaga
Ministério pedindo que o Ministério Público local
Público

encaminhe uma lista de seis nomes de


membros do MP que se disponham a ocupar
Desebargadores do Tribunal a vaga. O chefe do MP local lança um edital
de Justiça
convocando os candidatos a representar o
interesse e uma eleição em toda a categoria,
votando todos os membros do Ministério
Público Estadual. Apurada essa eleição, os seis mais votados integraram a lista sêxtupla
enviada ao Tribunal de Justiça. O Tribunal de Justiça convoca uma sessão do Plenário de
forma a elaborar a lista tríplice que será enviada ao governador do estado que irá escolher
um membro para ser desembargador. O governador pode escolher qualquer membro da
lista. Os estados têm em geral uma regra para que o Procurador Geral não se candidate,
já prevendo normalmente um prazo no qual ele não pode se candidatar. Os
desembargadores têm atuação em todo o estado, como juízes de direito, advogados ou
membros do Ministério Público.

A aposentadoria compulsória para membros do Tribunal de Justiça é aos 75 anos.

Justiça do Distrito Federal e Territórios

A justiça do DF em primeiro grau também é formada pelos Juízos de Direito do


DFT, com ingresso na carreira com mesma hipótese que nos estados (concurso de prova e
títulos) de acordo com o art. 125 da Constituição Federal, mas diferencia-se pela
inexistência de comarcas ou entrâncias, mas a circunscrição judiciária (Paranoá,
Brazlândia, Sobradinho, etc.), sendo circunscrições dentro do DF. A jurisdição é limitada
territorialmente à circunscrição judiciária, mudando-se apenas a denominação. O juiz de
direito também entra na carreira por concurso público ingressando como juiz substituto até
que haja vaga para assumir como titular. A promoção também observa os critério de
66 Teoria geral do processo I

antiguidade e merecimento alternadamente. Como não há entrância, a promoção para o


Tribunal de Justiça será feita entre os juízes que ocupam o 5º mais antigo.

O TJDFT também tem como principal recurso por ele julgado a apelação, mas não
o único, sendo formado por desembargadores observando a mesma proporção (4/5 de
Juízes de Direito e 1/5 por advogados e Ministério Público), com promoção de mesma
forma pelos critérios já analisados, por meio de edital e candidatura. Aplica-se a regra do
juiz, por merecimento, que figurar três vezes na lista seguidamente, ou cinco vezes não
seguidamente, deve haver uma aprovação obrigatória.

Quando a vaga é de advogado, o critério é semelhante, com o presidente


encaminhando um ofício à OAB, com a elaboração da lista sêxtupla, encaminhada ao
TJDFT, que irá transformar a lista sêxtupla em uma lista tríplice, sendo encaimhada essa
lista tríplice à/ao Presidente da República, visto o TJDFT integrar o poder judiciário da
união, sendo escolhido o desembargador.

Quando a vaga for do MPDFT, a sistemática é parecida com a dos Tribunais


Judiciais estaduais, com o presidente do tribunal dando conhecimento da existência dessa
vaga ao Procurador Geral de Justiça do MPDFT, pedindo a elaboração de uma lista
sêxtupla. O Procurador Geral de Justiça do MPDFT baixa um edital dando conhecimento
sobre a vaga e pedindo que possíveis candidatos manifestem seu nome, ocorrendo eleição
com todos os membros para composição da lista, sendo esta encaminhada ao Tribunal de
Justiça que transformará essa lista sêxtupla em uma lista tríplice, encaminhada à
Presidência da República. No parágrafo único do art. 94, temos:

Art. 94. Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados,
e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros do Ministério Público, com mais
de dez anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com
mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de
representação das respectivas classes.
Parágrafo único. Recebidas as indicações, o tribunal formará lista tríplice, enviando-a ao Poder
Executivo, que, nos vinte dias subsequentes, escolherá um de seus integrantes para nomeação.

O TJDFT tem a sua jurisdição sobre todo o Distrito Federal, enquanto o juiz de
direito tem a sua jurisdição sobre a circunscrição que lhe cabe.
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 67

Cada estado membro da federação tem autonomia para criar, no âmbito dos
respectivos tribunais de justiça, um Tribunal Militar ou, ainda, auditorias militares para
julgar as forças policias locais (a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros Militar), sendo
possível apenas se tiver pelo menos 20 mil integrantes essa força militar17. Nos parágrafos
3º e 4º do art. 125, temos:

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidosnesta


Constituição. (EC no 45/2004)
§ 3o A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar
estadual, constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e,
em segundo grau, pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos
Estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes.
§ 4o Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes
militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a
competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a
perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças.

A lei apontada é o código penal militar. A competência do STM cabe apenas para
os militares federais.

No âmbito do Poder Judiciário da União temos como órgão de cúpula o Supremo


Tribunal Federal, considerado o guardião da Constituição, julgando como principal recurso
o Recurso Extraordinário, buscando expugnar os acórdãos dos Tribunais de Justiça que
violam uma prescrição constitucional. O Supremo Tribunal Federal tem jurisdição em todo
o território nacional. É integrado por 11 ministros, que devem ser brasileiros natos e idade
entre 35 anos e 65 anos, e ainda reputação ilibada e notável saber jurídico. A Presidência
da República, optando por um nome que preencha essas condições, submete esse nome à
apreciação do Senado Federal, sendo esse aprovado pela maioria absoluta (50% + 1) do
Senado Federal, e somente após essa aprovação ocorrerá a nomeação. No art. 101 da
Constituição Federal, temos:

17
São pouco os estados que tem um Tribunal Militar, pelos custos desse Tribunal, normalmente tendo uma
Vara/Auditoria para o julgamento na própria justiça local, mas quando existem, o órgão de cúpula ainda é o
Tribunal de Justiça. No DF temos um juiz-auditor militar. Normalmente, portanto, não há desembargador
militar. Cabe recurso do juiz de 1º grau para o tribunal militar. Nos locais em que há Tribunal Militar, cabe a
ele a apelação da sentença da auditoria militar; quando não, cabe ao Tribunal de Justiça.
68 Teoria geral do processo I

Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre
cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber
jurídico e reputação ilibada.
Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente
da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.

Aula do dia 29 de setembro de 2015y

Ainda integra a estrutura do poder judiciário brasileiro o chamado Conselho


Nacional de Justiça (CNJ), tendo uma atividade de fiscalizar os órgãos do poder judiciário
em relação a suas atividades administrativas e financeiras e fiscalizar o cumprimento dos
deveres funcionais dos magistrados. Ainda que integre formalmente o aparato jurisdicional,
não tem uma função jurisdicional, analisando a atuação jurídica e financeira dos órgãos
jurisdicionais e as atividades funcionais dos magistrados. O CNJ é formado por 15
integrantes, chamados conselheiros, exercendo essa função em um mandato de dois anos,
sendo permitida uma recondução. Os conselheiros do CNJ são os seguintes: O Presidente
do Supremo Tribunal Federal, um Ministro do STJ indicado pelo respectivo tribunal, um
Ministro do TST indiciado pelo próprio TST, um desembargador de um tribunal de justiça
estadual ou do Distrito Federal, indicado pelo Supremo Tribunal Federal; um
desembargador federal ou juiz do Supremo Tribunal indicado pelo Superior Tribunal de
Justiça, um juiz de 1º grau indicado pelo STJ, um juiz de direito do 1º grau indicado pelo
Superior Tribunal Federal, um Membro do Ministério Público da união indicado pelo
Procurador Geral da República, um Membro do Ministério Público Estadual indicado pelo
Procurador Geral da República entre os nomes enviados por cada MPE, um juiz do Tribunal
Regional do Trabalho desembargador do trabalho indicado pelo Tribunal Superior do
Trabalho, um juiz do trabalho indicado também pelo TST, dois advogados indicados pelo
Conselho Federal da OAB e dois cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibadas,
sendo um indicado pelo Senado Federal e outro pela Câmara dos Deputados. Os
conselheiros do CNJ, com exceção do presidente, que é o presidente do STF, são nomeados
para exercer essa função pelo Presidente/a da República após a aprovação pela maioria
absoluta do Senado Federal. O presidente do CNJ, em suas ausências e impedimentos, é
substituído pelo vice-presidente do Supremo Tribunal Federal. Ainda na estrutura do CNJ
temos que o corredor nacional de justiça será sempre o ministro/a que integra o CNJ, sendo
sempre um ministro da justiça.
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 69

Temos, portanto, o apontado no art. 103-B da Constituição Federal:

Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois)
anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: (EC no 45/2004 e EC no 61/2009)

I – o Presidente do Supremo Tribunal Federal;

II – um Ministro do Superior Tribunal de Justiça, indicado pelo respectivo tribunal;

III – um Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, indicado pelo respectivo tribunal;

IV – um desembargador de Tribunal de Justiça, indicado pelo Supremo Tribunal Federal;

V – um juiz estadual, indicado pelo Supremo Tribunal Federal;

VI – um juiz de Tribunal Regional Federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça;

VII – um juiz federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça;

VIII – um juiz de Tribunal Regional do Trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho;

IX – um juiz do trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho;

X – um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador-Geral da República;

XI – um membro do Ministério Público estadual, escolhido pelo Procurador-Geral da República dentre os


nomes indicados pelo órgão competente de cada instituição estadual;

XII – dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

XIII – dois cidadãos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados
e outro pelo Senado Federal.

§ 1o O Conselho será presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal e, nas suas ausências e
impedimentos, pelo Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal.

§ 2o Os demais membros do Conselho serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a
escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.
70 Teoria geral do processo I

§ 3o N ão efetuadas, no prazo legal, as indicações previstas neste artigo, caberá a escolha ao Supremo Tribunal
Federal.

§ 4o Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do


cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem
conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

I – zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo
expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

II – zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos
administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder

Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias
ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;

III – receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder

Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de
registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar
e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a
disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar
outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa;

IV – representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de


autoridade;

V – rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais


julgados há menos de um ano;

VI – elaborar semestralmente relatório estatístico sobre processos e sentenças prolatadas, por unidade da
Federação, nos diferentes órgãos do Poder Judiciário;

VII – elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias, sobre a situação do Poder
Judiciário no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Supremo
Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso

Nacional, por ocasião da abertura da sessão legislativa.


Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 71

§ 5o O Ministro do Superior Tribunal de Justiça exercerá a função de Ministro-

-Corregedor e ficará excluído da distribuição de processos no Tribunal, competindo-lhe, além das atribuições
que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura, as seguintes:

I – receber as reclamações e denúncias, de qualquer interessado, relativas aos magistrados e aos serviços
judiciários;

II – exercer funções executivas do Conselho, de inspeção e de correição geral;

III – requisitar e designar magistrados, delegando-lhes atribuições, e requisitar servidores de juízos ou


tribunais, inclusive nos Estados, Distrito Federal e Territórios.

§ 6o Junto ao Conselho oficiarão o Procurador-Geral da República e o Presidente do Conselho Federal da


Ordem dos Advogados do Brasil.

§ 7o A União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios, criará ouvidorias de justiça, competentes para
receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, ou
contra seus serviços auxiliares, representando diretamente ao Conselho Nacional de Justiça.

Tabela 1 - Conselheiros do CNJ

Órgão de Origem Indicação

Presidente do Supremo Tribunal Não é por indicação


Federal

Ministro do STJ Indicado pelo STJ

Ministro do TST Indicado pelo TST


72 Teoria geral do processo I

Desembargador de um Tribunal de Indicado pelo STF


Justiça Estadual ou do Distrito Federal

Juiz Estadual Indicado pelo STF

Juiz de Tribunal Regional Federal Indicado pelo STJ

Juiz Federal Indicado pelo STJ

Juiz de Tribunal Regional do Trabalho Indicado pelo TST

Membro do Ministério Público da Indicado pelo Procurador Geral da


União República

Membro do Ministério Público Escolhido pelo Procurador Geral da


Estadual República dentre os nomes indicados
pelos Ministérios Públicos Estaduais

Dois advogados Indicados pelo Conselho Federal da


Ordem dos Advogados do Brasil

Dois cidadãos, de notável saber jurídico Indicado um pela Câmara dos Deputados
e reputação ilibada e outro pelo Senado Federal
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 73

A Presidente da República está vinculada à indicação feita pelo Tribunal, exercendo


apenas um ato de confirmação dos nomes que lhe foram entregues, não se aplicando ao
membro do STF, visto ser ele um chefe de poder.

Temos também como órgão jurisdicional o STJ, guardião da lei federal, do


direito federal infraconstitucional, julgando as causa em grau de Recurso Especial, julgando
uma violação a uma norma legal infraconstitucional. O STJ, a exemplo do Supremo
Tribunal Federal, também tem jurisdição nacional. É integrado por trinta e três ministro,
devendo ser brasileiros/as, ainda que naturalizados (não precisam ser natos/as), com idade
variando entre 35, no mínimo, e 65 anos de idade (máximo para o ingresso no tribunal). A
aposentadoria compulsória, assim como ocorre com os membros do STF, é de 75 anos de
idade. A composição do STJ é da seguinte forma:

Tabela 2 - Composição do STJ

Quantidade Composição

1/3 Desembargadores de Tribunal de Justiça

1/3 Juízes de Tribunal Regional Federal (desembargadores Federais)

1/3 Advogados e membros do Ministério Público

Não há promoção por antiguidade, sendo sempre por merecimento. Ou seja, quando
há abertura de vaga para Desembargadores de Tribunal de Justiça, o presidente do STJ
encaminha um ofício aos 27 tribunais de justiça, informando a existência da vaga e para
que os interessados manifestem seu interesse no preenchimento da vaga. Todos os
candidatos têm seus nomes enviados ao STJ que irá realizar uma sessão para examinar
esses nomes e escolher três nomes que irão entregar a lista tríplice, portanto, do nome de
todos os candidatos dos TJs, em uma sessão os três mais votados integram a lista tríplice.
Essa lista é enviada à Presidência da República, que irá escolher um dos nomes. Esse nome
74 Teoria geral do processo I

escolhido deverá ser encaminhado ao Senado Federal que deverá aprovar esse nome por
maioria absoluta. Aprovada a sua escolha, ocorre sua nomeação e posse. O procedimento
é semelhante para os desembargadores Federais nos 5 TRFs do Brasil. No Senado ocorre
uma sabatina prévia na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal.

No STJ, teremos ora mais membros do MPF, ora mais advogados. Quando a vaga
aberta é a advogado, este deve ter no mínimo dez anos efetivos de exercício como
advogado, sendo informada à OAB por meio de ofício a existência da vaga, pedindo à OAB
que seja elaborada uma lista sêxtupla para ser encaminha ao STJ. A OAB encaminha o
nome conforme votação pelo Conselho Federal, sendo essa lista sêxtupla submetida ao
crivo do Plenário do STJ que irá por meio de tal formar a lista tríplice, a ser enviada à
presidência da República, para que a Presidência escolha um nome e o submeta ao Senado
Federal, para que seja aprovado pela maior absoluta do Senado. Aprovado o seu nome,
ocorre sua nomeação e posse.

Quando a vaga é de Ministério Público, concorrem membros do Ministério Público


Estadual, do MPDFT e também do MPF. O presidente do STJ encaminha ofício para os
Ministérios Públicos Estaduais, para o MPDFT e para o Procurador-Geral da República,
informando sobre a existência da vaga, pedindo para que cada órgão do Ministério Público
ofereça uma lista sêxtupla, ou seja, cada órgão pode indicar seis nomes, escolhidos dentro
de cada órgão por meio eletivo, sendo encaminha a lista de todos os estados ao STJ,
escolhendo três nomes para compor a lista tríplice em sessão do Pleno, sendo essa lista
tríplice encaminhada à Presidência da República, para que escolha um nome a ser
encaminhado Federal, que deverá aprovar esse nome pela maioria absoluta, havendo a
nomeação e a posse desse membro após sua aprovação.

Eventualmente das decisões do STJ é cabido ao supremo o Recurso Extraordinário


ao Supremo de matéria constitucional.

Ainda no âmbito do aparato de jurisdição da União temos a chamada Justiça


Federal, que também integra o aparato de jurisdição da União. Em primeiro grau de
jurisdição temos os juízos federais, formados pelos juízes federais em primeiro grau de
jurisdição. Esses juízos também ingressam na carreira por um concurso público de provas
e títulos. E os juízos federam irão exercer sua atividade em uma Vara Federal. O Juiz
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 75

Federal tem sua jurisdição federal tendo sua circunscrição recebendo o nome de seções
judiciária em capitais e subseções judiciárias de cidades pequenas. O Juiz Federal tem sua
jurisdição limitada territorialmente, ou aos limites de sua seção, ou aos limites de sua
subseção judiciária. Na Justiça Federal, a exemplo do que ocorre na Justiça do Distrito
Federal e Territórios, não há entrância, entrando como Juiz Federal substituto, sendo
promovido a juiz titular caso haja vaga. Se encerra aqui a carreira do Juiz Federal em
primeiro grau de Jurisdição, não existindo uma sequência de entrâncias, sendo sua
promoção para juiz titular sendo realizada por mérito e por antiguidade.

A competência da Justiça Federal é prevista no art. 109 da Constituição Federal,


pois havendo uma dessas hipóteses, competirá o julgamento da causa ao juiz federal:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (EC no 45/2004)

I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem


interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de
acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

II – as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa


domiciliada ou residente no País;

III – as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo
internacional;

IV – os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou


interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as
contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; (crimes
federais)

V – os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução


no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;

V-A – as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5o deste artigo;

VI – os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o
sistema financeiro e a ordem econômico-financeira; (crimes do colarinho branco)

VII – os habeas corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento


provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;

VIII – os mandados de segurança e os habeas data contra ato de autoridade federal, excetuados
os casos de competência dos tribunais federais;
76 Teoria geral do processo I

IX – os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça


Militar;

X – os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta


rogatória, após o exequatur, e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes
à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização;

XI – a disputa sobre direitos indígenas.

§ 1o As causas em que a União for autora serão aforadas na seção judiciária onde tiver
domicílio a outra parte.

§ 2o As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for
domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou
onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.

§ 3o Serão processadas e julgadas na Justiça estadual, no foro do domicílio dos segurados ou


beneficiários, as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre
que a comarca não seja sede de vara do juízo federal, e, se verificada essa condição, a lei poderá
permitir que outras causas sejam também processadas e julgadas pela Justiça estadual.

§ 4o N a hipótese do parágrafo anterior, o recurso cabível será sempre para o Tribunal Regional
Federal na área de jurisdição do juiz de primeiro grau.

§ 5o N as hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da

República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados


internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o
Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de
deslocamento de competência para a Justiça Federal.

Em segundo grau temos os TRFs que julgam de forma recursal as apelações


realizadas pelo Juízes Federais, ainda que seja a apelação o principal recurso, mas não o
único. Das decisões dos acordos proferidos pelos Tribunais Regionais Federais, cabe o
Recurso Especial ao STJ em matéria infraconstitucional, e do TRF para o STF o Recurso
Extraordinário em matéria constitucional.

De forma semelhante ao modelo americano, temos uma estrutura regionalizada nos


TRFs, sendo cinco tribunais da 1ª, 2ª,3ª, 4ª, 5ª.
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 77

Tribunal Regional Federal Sede Jurisdição

1ª Região Brasília Distrito Federal, Goiás,


Mato Grosso, Rondônia,
Acre, Amazonas,
Roraima, Amapá, Pará,
Tocantins, Maranhão,
Piauí, Bahia e Minas
Gerais

2ª Região Rio de Janeiro Rio de Janeiro e Espírito


Santo

3ª Região São Paulo São Paulo e Mato Grosso


do Sul

4ª Região Porto Alegre Rio Grande do Sul, Santa


Catarina e Paraná

5ª Região Recife Ceará, Rio Grande do


Norte, Paraíba,
Pernambuco, Alagoas e
Sergipe.

Nos EUA os Tribunais Federais são chamados de tribunais de circuitos sendo 12


circuitos nos EUA, com estrutura semelhante à nossa, cada um com sua própria jurisdição.
78 Teoria geral do processo I

Portanto a Jurisdição dos TRFs é regionalizada. Os TRFs são compostos por juízes
do TRF ou desembargadores federais, devendo, para seu ingresso, ter idade mínima de 30
anos e máxima de 65 anos de idade.

No art. 107, estabelece-se:

Art. 107. Os Tribunais Regionais Federais compõem-se de, no mínimo, sete juízes, recrutados,
quando possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente da República dentre
brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta e cinco anos, sendo: (EC no 45/2004)
I – um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e
membros do Ministério Público Federal com mais de dez anos de carreira;
II – os demais, mediante promoção de juízes federais com mais de cinco anos de exercício, por
antiguidade e merecimento, alternadamente.
§ 1o A lei disciplinará a remoção ou a permuta de juízes dos Tribunais Regionais Federais e
determinará sua jurisdição e sede.
§ 2o Os Tribunais Regionais Federais instalarão a justiça itinerante, com a realização de
audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva
jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários.
§ 3o Os Tribunais Regionais Federais poderão funcionar descentralizadamente, constituindo
Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as
fases do processo.

Temos um processo semelhante, com a diferença de que aprovando o nome, mesmo


no caso da antiguidade, a promoção será sempre feito pela Presidência da República, mas
sem necessidade da aprovação do nome pelo Senado. Quando a vaga for por merecimento,
há a comunicação aos juízes sobre a abertura da vaga, com a candidatura dos interessados,
com a elaboração de uma lista tríplice, que é encaminhada à Presidência da República, para
que se escolha um nome, sem que seja necessária a aprovação do nome pelo Senado
Federal. No caso dos advogados, temos a elaboração da lista sêxtupla, encaminhada para o
TRF respectivo que a transforma em uma lista tríplice e o envia à Presidência da República
para que se escolha um nome para integrar o tribunal. No caso de vaga do Ministério
Público, só pode concorrer membro do Ministério Público Federal, encaminhando-se ofício
ao Procurador Geral da República, elaborando-se uma lista sêxtupla a partir de eleição,
sendo essa lista enviada ao tribunal respectivo, sendo escolhida a lista tríplice enviada à
Presidência da República para que seja feita a e escolha e a nomeação.
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 79

Foi aprovado projeto de emenda criando novo TRF no Paraná, na Bahia, em


Minas Gerais e em Manaus, sendo suspendido pelo Ministro Joaquim Barbosa, por um
entendimento de vício de inconstitucionalidade, dependendo agora de julgamento pelo
Supremo Tribunal Federal.

Aula do dia 01 de outubro de 2015

STF

CNJ

STJ TST TSE STM

Tribunais Regionais Tribunais Regionais do Tribunais Regionais Juízos (Auditorias)


Tribunal de Justiça Tribunal de Justiça do DFT
Federais trabalho Eleitorais Militares

Juízes Eleitorais/Juntas
Juízos de Direito Juízos de Direito do DFT Juízos Federais Juízos do Trabalho
Eleitorais

Como apontado no art. 106 da Constituição Federal, temos como

A justiça especializada da união


A Justiça do Trabalho, a Justiça Eleitoral e a Justiça Militar
A Justiça do Trabalho tem como órgão de primeiro grau de jurisdição os Juízos do
Trabalho ou Juízos Trabalhistas. A Justiça do trabalho julga dos conflitos decorrentes dos
chamados litígios trabalhistas, das relações de trabalho. O ingresso na carreira da
magistratura do trabalho se dá também por concurso público de provas e títulos. O aprovado
no concurso ingressa na carreira no cargo de juiz do trabalho substituto. A Justiça do
Trabalho em primeiro grau não tem entrância, sendo que o juiz do trabalho exerce seu ofício
no âmbito das Varas do Trabalho. Tem, portanto, algumas circunscrições territoriais que
recebem uma denominação própria. Portanto, em primeiro grau de jurisdição a jurisdição
de um juiz de trabalho de primeiro grau é limitada pela área circunscrita em que o juiz do
trabalho tem jurisdição. O tribunal regional do trabalho, os chamados TRTs constituem no
80 Teoria geral do processo I

órgão o segundo grau de jurisdição da justiça do trabalho, tendo como principal recurso,
mas não o único, o recurso ordinário. Temos no Brasil 24 tribunais regionais do trabalho,
mantendo o nome em vista de um aspecto histórico.

Tabela 3 - Tribunais Regionais do Trabalho e Regiões

Tribunal Regional do Sede Jurisdição


Trabalho
1ª Região Rio de Janeiro Rio de Janeiro
2ª Região São Paulo São Paulo Capital e Região
Metropolitana
3ª Região Belo Horizonte Minas Gerais
4ª Região Porto Alegre Rio Grande do Sul
5ª Região Salvador Bahia
6ª Região Recife Pernambuco
7ª Região Fortaleza Ceará
8ª Região Belém Pará e Amapá
9ª Região Curitiba Paraná
10ª Região Brasília Distrito Federal e Tocantins
11ª Região Manaus Amazonas e Roraima
12ª Região Florianópolis Santa Catarina
13ª Região João Pessoa Paraíba
14ª Região Porto Velho Rondônia e Acre
15ª Região Campinas Campinas e municípios não
abrangidos pelo TRT da 2ª
Região
16ª Região São Luís Maranhão
17ª Região Vitória Espírito Santo
18ª Região Goiânia Goiás
19ª Região Maceió Alagoas
20ª Região Aracaju Sergipe
21ª Região Natal Rio Grande do Norte
22ª Região Teresina Piauí
23ª Região Cuiabá Mato Grosso
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 81

24ª Região Campo Grande Mato Grosso do Sul

Os TRTs são integrados por juízos do TRT ou, como também são conhecidos
desembargadores do Trabalho, aplicando-se também a eles a regra do quinto constitucional,
ou seja, os TRTs são formados por 4/5 de juízes de primeiro grau e 1/5 de advogados e
membros do Ministério Público do Trabalho. Um membro do TRT tem sua forma de
provimento muito semelhante a de um membro do TRF por antiguidade e merecimento,
alternadamente. Quando a vaga for destina ao preenchimento por antiguidade, o Presidente
do Tribunal baixa um edital para ciência dos juízes do trabalho e para que aqueles mais
antigos se manifestem, sendo que aquele com nome mais antigo seja levado ao plenário e
então encaminhado à Presidência da República para que se aprove ou não e seja feita sua
nomeação. Quando a vaga for por merecimento, o Presidente do Tribunal baixa um edital
para o preenchimento da vaga, os juízes manifestam o interesse e esses juízes que
manifestam o interesse tem seus nomes levados ao plenário do tribunal e o plenário irá
escolher uma lista tríplice que será encaminhada à Presidência da República para que seja
escolhido um nome. Quando for vaga do 1/5 constitucional da advocacia, o Presidente do
Tribunal respectivo encaminha um ofício e, quando a jurisdição do TST for apenas em
relação a um determinado estado, se encaminha o ofício para o Presidente da Seccional
local da OAB para elaboração de uma lista sêxtupla dos magistrados interessados.
Escolhida essa lista sêxtupla pela OAB, está será encaminhada ao TRT respectivo que irá
transformar essa lista sêxtupla em uma lista tríplice a ser encaminhada à Presidência da
República para que se escolha um nome. Quando a vaga de advogado for em um TRT com
jurisdição sobre mais de um estado, encaminha-se ofício para o Presidente do Conselho
Federal da OAB para que este elabore a lista sêxtupla. A escolha será dada
preferencialmente entre os advogados dos estados dentro da jurisdição. Quando for vaga
destinada ao Ministério Público do Trabalho, é feita uma eleição no âmbito da carreira do
Ministério Público do Trabalho para que os seis nomes mais votados possam integrar a lista
sêxtupla. Essa lista será encaminhada para o TRT respectivo que levará esses seis nomes
para deliberação do seu órgão plenário, sendo escolhidos três nomes em lista tríplice a ser
encaminhada à Presidência da República que irá escolher um nome para integrar o TRT.

Temos como órgão de cúpula da Justiça do Trabalho o Tribunal Superior do


Trabalho (TST) que julga os recursos contra as decisões proferidas nos TRTs (recurso de
82 Teoria geral do processo I

revista, independentemente da matéria (constitucional, legal), não sendo, entretanto, esse o


único recurso julgado. No art. 115 da Constituição Federal aponta-se:

Art. 115. Os Tribunais Regionais do Trabalho compõem-se de, no mínimo, sete juízes,
recrutados, quando possível, na respectiva região, e nomeados pelo Presidente da República
dentre brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta e cinco anos, sendo: (EC no 45/2004)
I – um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e
membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício,
observado o disposto no art. 94;
II – os demais, mediante promoção de juízes do trabalho por antigüidade e merecimento,
alternadamente.
§ 1o Os Tribunais Regionais do Trabalho instalarão a justiça itinerante, com a realização de
audiências e demais funções de atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva
jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários.
§ 2o Os Tribunais Regionais do Trabalho poderão funcionar descentralizadamente,
constituindo Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça
em todas as fases do processo.
O TST tem jurisdição sobre todo o território nacional para a matéria trabalhista. É
integrado por 27 ministros, e em relação ao TST também se aplica a regra do 1/5
constitucional. 4/5 do TST é formado por Juízes de TRTs e 1/5 por advogados e membros
do Ministério Público do Trabalho. A sistemática se aproxima do STJ, porque o ministro
do TST deve ser brasileiro com mais de 35 anos de idade e menos de 65 anos de idade para
ingresso na carreira. Para o TST, não há promoção por antiguidade, se dando sempre por
merecimento. No caso do ingresso para o TST, quando for vaga do 4/5, para os juízes de
TRT, deverão ser juízos da carreira da magistratura trabalhista. Quando for vaga para o
STJ, diferentemente, pode ser alguém que entrou pelo 1/5 da advocacia ou do Ministério
Público. Quando for abrir uma vaga no Tribunal Superior do Trabalho destina a juiz de
Tribunal Regional do Trabalho, se encaminha ofício para os 24 TRTs informando da
abertura da vaga e pedindo que os candidatos manifestem interesse tendo nome
encaminhado ao plenário do TST, sendo elaborada uma lista tríplice encaminhada a
Presidência da República, sendo o nome encaminhado ao Senado Federal e necessitando
ser aprovado pela maioria absoluta do Senado. Aprovado o nome, faz-se a nomeação e a
posterior posse do ministro. Quando for vaga de advogados, o Presidente do TST
encaminha um ofício para o Presidente do Conselho Federal da OAB pedindo que se
elabore uma lista sêxtupla a ser encaminhada ao Tribunal Superior do Trabalho, escolhendo
seis, com a lista tríplice enviada à Presidência da República, para que o nome seja
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 83

submetido ao Senado Federal. Quando for vaga destinada ao Ministério Público do


Trabalho, o presidente do TST encaminha ofício para o Procurador Geral do Ministério
Público do Trabalho, ocorrendo uma votação dentro do Ministério com os seis nomes mais
votados sendo encaminhada à apreciação do Plenário do TST que irá escolher três nomes
que comporão a lista tríplice a ser encaminhada à Presidência da República, que escolherá
um e o encaminhará para o crivo do Senado Federal a ser aprovado por maioria absoluta e
se aprovado nomeado. Observe-se o art. 111 da Constituição Federal:

Art. 111-A. O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de vinte e sete Ministros, escolhidos
dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos, nomeados pelo
Presidente da República após aprovação pela maioria absoluta do

Senado Federal, sendo: (EC no 45/2004)

I – um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e
membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício,
observado o disposto no art. 94;

II – os demais dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura da


carreira, indicados pelo próprio Tribunal Superior.

§ 1o A lei disporá sobre a competência do Tribunal Superior do Trabalho.

§ 2o Funcionarão junto ao Tribunal Superior do Trabalho:

I – a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho, cabendo-


lhe, dentre outras funções, regulamentar os cursos oficiais para o ingresso e promoção na
carreira;

II – o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, cabendo-lhe exercer, na forma da lei, a


supervisão administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do

Trabalho de primeiro e segundo graus, como órgão central do sistema, cujas decisões terão
efeito vinculante.
Alegando violação de disposição constitucional, é cabível o encaminhamento ao
STF.

Justiça Eleitoral
A Justiça eleitoral é formada em primeiro grau de jurisdição pelos juízes eleitorais,
existindo, na época das eleições, as chamadas juntas eleitorais. A jurisdição dos juízes
eleitorais se dá no âmbito das zonas eleitorais. Mesmo na época das eleições, as juntas
84 Teoria geral do processo I

eleitorais diminuíram com o voto eletrônico, porque antes com a cédula de papel a apuração
era realizada pelas juntas eleitorais. Em primeiro grau de jurisdição quem atua como juízes
eleitorais são juízes de direito estaduais ou do DFT. O TRE irá indicar o juiz eleitoral de
cada uma das zonas eleitorais, aproveitando o juiz de direito da comarca eleitoral,
recebendo uma gratificação eleitoral de cerca de 20-30% 18 do valor recebido por Juiz
Federal. Exercerá ao mesmo tempo as duas magistraturas, sendo esse exercício, em geral,
por um período de dois anos. Quando há eleições, é comum o TRE respectivo para que o
juiz de direito fique apenas como juiz eleitoral.
O órgão de segundo grau da Justiça Eleitoral é o Tribunal Regional Eleitoral
julgando em grau de Recurso Ordinário os recursos interpostos pelos Juízes eleitorais ou
juntas eleitorais. Todos os estados da federação e o Distrito Federal tem seu próprio tribunal
eleitoral. Como apresentado no art. da Constituição Federal:
O Tribunal Regional Eleitoral é composto por 7 juízes ou desembargadores
eleitorais. Todos os TREs têm essa mesma composição. Desses 7, 2 são desembargadores
do Tribunal de Justiça do estado ou do Distrito Federal, sendo um deles o Presidente do
Tribunal de Justiça. O TRE também é integrado
por dois juízes de direito dos estados ou juiz de
direito do Distrito Federal e Territórios. O TRE
é formado por um desembargador federal de
onde tiver TRF, caso contrário, será um juiz
federal. Ainda integram o TER dois advogados
indicados em lista sêxtupla pelo Tribunal de
Justiça estadual ou pelo TJDFT para que a
Presidência da República escolha os nomes.
Conforme apresentado no art. 120 da
Constituição Federal:
Art. 120. Haverá um Tribunal Regional Eleitoral na capital de cada Estado e no
Distrito Federal.
§ 1o Os Tribunais Regionais Eleitorais compor-se-ão:
I – mediante eleição, pelo voto secreto:
a) de dois juízes dentre os desembargadores do Tribunal de Justiça;

18
STF -> STJ (-5%) -> TRF (-5%) -> Juiz Federal (-10%)
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 85

b) de dois juízes, dentre juízes de direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça;


II – de um juiz do Tribunal Regional Federal com sede na capital do Estado ou no Distrito
Federal, ou, não havendo, de juiz federal, escolhido, em qualquer caso, pelo
Tribunal Regional Federal respectivo;
III – por nomeação, pelo Presidente da República, de dois juízes dentre seis advogados de
notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Tribunal de Justiça.
§ 2o O Tribunal Regional Eleitoral elegerá seu Presidente e o Vice-Presidente dentre os
desembargadores.
O órgão de cúpula da Justiça Eleitoral é o Tribunal Superior Eleitoral, que recebe
recursos especiais sobre qualquer material julgada pelos TREs, tendo jurisdição em todo
território nacional, diferente dos TREs com jurisdição estadual. O TSE é formado por 7
juízes/ministros. Desse 7, três são ministros do Supremo Tribunal Federal, 2 são do STJ e
dois são advogados indicados em lista sêxtupla escolhidos, dentro dessa lista, pela
Presidência da República não precisando de aprovação do Senado. O Presidente e o Vice-
Presidente do TSE serão ministros do STF e o corregedor ministro do STJ. No art. 119 da
Constituição Federal estabelece-se:
Os membros do TSE exercem o mandato por dois anos, sendo possível uma
recondução que, em geral, ocorre com os advogados. E, os desembargadores eleitorais do
TER e os ministros do STF e STJ tem uma gratificação por exercer cumulativamente a
jurisdição eleitoral recebendo o nome de GETON, ocorrendo pelo número de participação
em sessões no tribunal, que, fora do período de eleições, é um máximo de oito sessões
mensais e, no período eleitoral, um máximo de quinze sessões mensais. Conforme apontado
no art. 118:
Em matéria constitucional, é cabível o recurso extraordinário para o STF.

Justiça Militar
Temos por último a Justiça Militar da união, que julga os militares da União em
relação aos chamados crimes militares, sendo militares do Exército, Marinha e
Aeronáutica. Em primeiro grau de jurisdição temos os juízos ou auditorias militares. As
auditorias militares formam uma espécie de órgão colegiado, julgando em primeiro grau os
membros do Exército, Marinha e Aeronáutica. Acredita-se haver uma necessidade do
conhecimento dos rigores da vida militar para conheciemtno da vida do quartel. O juiz
auditor militar entra na carreira por meio de um concurso de provas e títulos. No âmbito da
justiça militar na união, o órgão de segundo grau, que é também um órgão superior, é o
86 Teoria geral do processo I

Superior Tribunal Militar (STM), que julga em grau de apelação as sentenças proferidas
pelas auditorias militares, tendo uma jurisdição nacional julgando casos de todo o brasil. O
STM é integrado por 15 ministros, sendo 10 militares da carreira militar e 5 civis. Desses
10 militares três são generais do mais alto posto da Marinha, 4 generais do mais alto posto
do Exército, e três são generais do mais alto posto da Aeronáutica. Dos cinco civis, três são
advogados, escolhidos pela presidência da República, um é juiz militar de carreira também
escolhido pela Presidência da República, e um é membro do Ministério Público Militar. Os
membros do STM deverão ter o nome aprovado pelo Senado Federal por maioria simples,
todos, inclusive os militares. Conforme apontado no art. 123 da Constituição Federal:
Observa-se no art. 122 os componentes da Justiça Militar:
Dos acórdãos do STM cabe recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal em
matéria Constitucional.

Aula do dia 06 de outubro de 2015

São garantias que o poder constituinte garantiu ao magistrado para que possa
exercer seu poder jurisdicional, afirmando que são garantias tanto à magistratura quanto à
sociedade para o juiz exerça sua função de forma imparcial e autônoma. A magistratura
tem três garantias constitucionalmente asseguradas. São garantias da magistratura a:
(1) VITALICIEDADE: por meio dessa garantia da vitaliciedade o juiz, após dois
anos no exercício do cargo, somente pode ser demitido do seu cargo por
decisão/sentença judicial transitada em julgado. Esse período até os dois anos é
chamado de estágio probatório. Nesse período o juiz pode ser exonerado de
sua função por ato do tribunal desde que assim deliberado por maioria absoluta.
Como apontado no art. 95 da Constituição Federal:
Essa regra de vitaliciedade após dois anos se aplica apenas para juízes de
primeiro grau. Para os demais cargos, a vitaliciedade se aplica a partir da posse.
Administrativamente, o juiz vitalício não pode perder o cargo.
(2) INAMOVIBILIDADE (INTRANSFERIBILIDADE): por meio dessa garantia,
o juiz só pode ser removido/transferido a pedido de forma a impedir que o juiz
possa sofrer sanções decorrentes de decisões que tenha proferido. O juiz só pode
ser removido a pedido, fora certas exceções. O juiz pode inclusive recusar
promoção. A lei orgânica da magistratura contempla como uma das sanções
administrativas é a sua remoção compulsória, tendo esse caso como exceção à
Unidade III b – Jurisdição no Estado Constitucional 87

garantia ocorrendo sempre pela maioria absoluta do tribunal. A remoção do juiz


também pode ocorrer por interesse público19. Esse caso também é exceção à
regra. Apresenta-se possível, portanto, a remoção compulsória por punição ou
por interesse público pela maioria absoluta dos membros. Observa-se aqui o art.
95, inciso II.
(3) IRREDUTIBILIDADE DE SUBSÍDIOS: por meio dessa garantia, da qual
também gozam, em geral, os servidores públicos, é de não ter seus vencimentos
reduzidos, observado o art. 95, inciso III. Não implica redução de subsídios da
magistratura a incidência de tributos, ou seja, está sobre a mesma incidência de
tributos que os demais cidadãos brasileiros. O Supremo Tribunal Federal
afirmou que essa irredutibilidade é nominal, não real, sendo de quanto o juiz
ganha nominalmente, ou seja, não contempla o aumento dos impostos e o poder
aquisitivo, mas o valor nominal.
Ao lado dessas garantias temos algumas vedações que decorrem do próprio
exercício da magistratura.
(1) A primeira vedação nos diz que o juiz não pode exercer qualquer outro cargo ou
função pública salvo uma de magistério, ou seja, de professor, fora da
magistratura20.
(2) Aos juízes é vedado a qualquer título ou pretexto receber custas ou participação
em processo, porque até a constituição de 1946 as custas do processo iam para
o juiz. As custas hoje vão para a União ou para o estado da federação. O juiz
apenas recebe os seus subsídios, e gratificações no caso da justiça eleitoral.
(3) Veda-se o exercício da política partidária, ou seja, é vedado ter atividade política
partidária, como apontado no art. 95. Isso não significa, visto ainda a
impossibilidade, do juiz ser um ser apolítico. Não pode ser votado em eleição,
se candidatar a um cargo público.
(4) É vedado receber auxílios, contribuições, subversões de entidades públicas ou
particulares. Observa-se o art. 95, parágrafo único, inciso IV21.

19
Exemplo: caso em que os juízes da capital foram removidos pela ausência de juízes em cidades menores.
20
Tem-se o entendimento de que o juiz pode exercer a magistratura em instituições de ensino diferentes. No
caso das palestras, questiona-se o que se entende por magistérios (passar o conhecimento, passar o
conhecimento de forma academicista?). Como não há nenhuma regulamentação sobre isso, depende da visão
que cada um tem do magistério. O valor recebido não está inserido no valor do teto.
21
Por exemplo, vedado o auxílio em Congressos de Juízes. Faz-se necessário o patrocínio de eventos para a
própria existência de debates sobre aspectos jurídicos.
88 Teoria geral do processo I

(5) A outra vedação é a que recomenda que o juiz que se exonerar ou se aposentar
não poderá exercer a advocacia no órgão do qual se exonerou ou do qual se
aposentou por três anos. É a chamada quarentena dos juízes. Observa-se o
parágrafo único inciso V do art. 95. É vedado seu exercício não só na Vara, mas
na instância de primeiro grau no órgão ao qual era vinculado.

Funções essenciais à Justiça


O legislador constituinte estabeleceu que algumas funções são consideradas funções
essenciais à justiça e, nesse contexto, são funções essenciais à justiça: (1) o Ministério
Público, (2) a advocacia pública, (3) a advocacia privada e (4) a defensoria pública. O
legislador constituinte reconheceu a advocacia privada como uma função essencial à justiça
na forma do art. 133 da Constituição Federal:

Esclarecer os fatos ao juiz, trazer o direito aplicado ao fato, sendo que quando bem
exerce a profissão tem um trabalho importantíssimo à justiça. Além disso, também é função
essencial à justiça a chamada defensoria pública, também uma instituição permanente
essencial à administração da justiça, se encarregando de promover os direitos humanos e
promover a assistência judicial e extrajudicial aos necessitados. Contribui para levar o
acesso ao poder judiciário para aqueles que não teriam condições de levar ao poder
judiciário suas causas. Como apontado no art. 134 da Constituição Federal:

Temos a defensoria pública estadual, assistindo judicial e extrajudicialmente os


necessitados no âmbito do estado membro, e a defensoria pública da União. No âmbito do
estado a defensoria pública tem como chefe o defensor público geral, sendo em geral
escolhido por eleição entre seus membros, com a elaboração de lista tríplice encaminhada
ao governador do estado. No âmbito da união temos a figura do defensor público geral da
união que é ligado ao Ministério da Justiça, escolhido pelo Ministro da Justiça entre os
membros da defensoria pública da União. A carreira da defensoria pública tanto nos estados
quanto na União se fala de defensor público de primeira, segunda, terceira categoria até
chegar ao defensor público geral. A defensoria pública também deve respeitar os princípios
da unidade, indivisibilidade e independência funcional. No art. 134 temos:

Por força desse princípio da unidade, a defensoria pública é vista como um órgão
uno, por isso podendo haver eventualmente um defensor público posterior a outro, sendo
indivisível a sua atuação, devendo atuar em defesa dos necessitados, com sua ação
Bibliografia 89

beneficiando a todos aqueles necessitados que dele necessitem, indistintamente. A atuação


do defensor público deve também estar coberta pela independência funcional, de acordo
com as normas constitucionais e infraconstitucionais e a sua consciência 22 . A Emenda
Constitucional 80 de 2014 prevê:

A defensoria pública do Distrito Federal, diferente do poder judiciário e Ministério


Público do DF, faz parte da própria estrutura do GDF.

Bibliografia

BUENO, C. S. (s.d.). Curso Sistematizado de Direito Processual Civil: Teoria Geral do


Direito Processual Civil (Vol. 1). Saraiva.

CINTRA, A. C., GRINOVER, A. P., & DINAMARCO, C. R. (s.d.). Teoria Geral do


Processo. Malheiros Editores.

CORREIA, M. O. (s.d.). Teoria Geral do Processo. Saraiva.

DINAMARCO, C. R. (s.d.). A Instrumentalidade do Processo. Malheiros Editores.

LACERDA, G. (s.d.). Teoria Geral do Processo. Editora Forense.

MARINONI, L. G. (s.d.). Cursi de Processo CIvil. Vol. 1. Teoria Geral do Processo.


Editora Revista dos Tribunais.

MARQUES, J. F. (s.d.). Instituições de Direito Processual Civil (Vol. I e II). (E. a.


Sandoval, Ed.) Millenium Editora.

NOGUEIRA, G. S. (s.d.). Curso Básico de Processo Civil. Tomo I. Teoria Geral do


Processo. Editora Lumen Juris.

22
Até alguns anos atrás era comum exercer convênios com empresas para exercer a atividade da defensoria
pública, mas hoje praticamente todos os estados já estão com a defensoria pública estruturada.
90 Teoria geral do processo I

PINHO, H. D. (s.d.). Teoria Geral do Processo Civil Contemporâneo. Editora Lumen Juris.

SANTOS, M. A. (s.d.). Primeiras Linhas de Direito Processual Civil (Vol. Vols. I e II).
Editora Saraiva.

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