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PONTO CEGO
P.46 – O urbano se define como lugar onde as pessoas tropeçam umas nas outras, encontram-
se diante de um amontoado de objetos (...). Na sua definição, esse espaço comporta um vetor
nulo (virtualmente): a anulação das distâncias obceca os ocupantes do espaço urbano.
P.47 – Esse espaço urbano é contradição concreta. O estudo de sua lógica e de suas
propriedades formais conduz a análise dialética de suas contradições. O centro urbano é
preenchido até a saturação: ele apodrece ou explode.
O FENÔMENO URBANO
P. 53 – O fenômeno urbano se apresenta, desse modo como realidade global (ou, se se quer
assim falar: total) implicando o conjunto da prática social.
P. 54 – Metodologicamente é mesmo recomendado abordar o fenômeno urbano pelas
propriedades formais do espaço antes de estudar as contradições do espaço e os seus
conteúdos, ou seja, de empregar o método dialético.
P. 61 – Atualmente a realidade urbana aparece mais como um caos e uma desordem – que
contém uma ordem a descobrir – do que como objeto.
NÍVEIS E DIMENSÕES
P. 78 – Esse nível global, ao mesmo tempo social (política) e mental (lógica e estratégia)
projeta-se numa parte do domínio edificado: edifícios, monumentos, projetos urbanísticos de
grande envergadura, cidade novas. Projeta-se também no domínio não edificado: estradas e
autoestradas, organização geral do trânsito e dos transportes, do tecido urbano e dos espaços
neutros, preservação da “natureza”, sítios, etc.
P. 80 – O que persiste sob o olhar de reflexão conserva uma forma relacionada com o sítio (o
meio imediato) e com a situação (o meio distante, condições globais). Esse conjunto
especificamente urbano apresenta a unidade característica do “real” social, o agrupamento:
formas-funções-estruturas.
P. 81 – Para reencontrar o habitar e seu sentido, para exprimi-los é preciso utilizar conceitos e
categorias capazes de ir aquém do vivido do habitante, em direção ao não-conhecido e ao
desconhecido da cotidianidade. (...) O ser humano não pode deixar de edificar e morar, ou
seja, ter uma morada onde vive sem algo a mais (ou a menos) que ele próprio: sua relação
com o possível como com o imaginário.
P. 87 – o segundo nível (M) pode parecer essencial (...) porém, ele é simplesmente o
intermediário (misto) entre a sociedade, o Estado, os poderes e saberes à escala global, as
instituições e as ideologias, de um lado, e, de outro, o habitar. Se o global quer reger o local,
se a generalidade pretende absorver as particularidades, o nível médio (misto: M), terreno de
defesa e ataque, de luta, pode servir. Porém, ele permanece meio.
P. 88 – Quanto ao arquiteto, ele condensa (no sentido do termo criado pelos arquitetos
soviéticos entre 1920 e 1925, o “condensador social”) as relações sociais existentes. Queira ou
não, ele constrói de acordo com as imposições dos rendimentos (salários e outras
remunerações), das normas e valores, isto é, segundo critérios de classe que conduzem à
segregação, mesmo quando há vontade de integração e de convívio.
P. 89 – A grande cidade não é apenas vícios, poluições, doença (mental, moral, social). A
alienação urbana envolve e perpetua todas as alienações. Nela, por ela, a segregação
generaliza-se: por classe, bairro, profissão, idade, etnia, sexo. Multidão e solidão. Nela o
espaço torna-se raro: bem valioso, luxo e privilégio mantidos e conservados por uma prática
(o “centro”) e estratégias.
P. 89-90 – (...) a cidade se enriquece. Atrai para si todas as riquezas, monopoliza a cultura,
como concentra poder. Devido à sua riqueza, explode. Quanto mais concentra os meios de
vida, mais torna-se insuportável nela viver. (...) Se há conexão entre as relações sociais e o
espaço, entre os lugares e os grupos humanos, seria preciso, para estabelecer uma coesão,
modificar radicalmente as estruturas do espaço. (...) Com efeito, os conceitos que parecem
designar os lugares e as qualidades do espaço só designam de fato, relações sociais alojadas
num espaço indiferente: vizinhança, circunvizinhança, etc.
P. 93 – Não é menos verdadeiro que o urbano se define como lugar onde as diferenças são
conhecidas e, ao serem reconhecidas, postas à prova, Portanto, confirmando-se ou anulando-
se. Os ataques contra o urbano consideram, fria ou alegremente, o desaparecimento das
diferenças, não raro identificadas e confundidas com as particularidades folclóricas.
P. 93 – Não existe cidade, nem realidade urbana sem um centro. Mais que isso; o espaço
urbano se define, já dissemos, pelo vetor nulo: é um espaço onde cada ponto, virtualmente,
pode atrair para si tudo o que povoa as imediações: coisas, obras, pessoas.