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MANUAL DO PROFESSOR

A PALAVRA
MÁGICA
Moacyr Scliar
Organização pedagógica
Maria José Nóbrega
Contextualização da obra

ÁRVORES E TEMPO DE LEITURA


Maria José Nóbrega

“O que é, o que é, Um texto sempre se relaciona com outros produzidos


Uma árvore bem frondosa antes ou depois dele: não há como ler fora de uma perspec-
Doze galhos, simplesmente tiva interdiscursiva.
Cada galho, trinta frutas Retornemos à sombra da frondosa árvore — a árvore do
Com vinte e quatro sementes?¹” tempo — e contemplemos outras árvores:

Deus fez crescer do solo toda espécie de ár-


Enigmas e adivinhas convidam à decifração: “Trouxes- vores formosas de ver e boas de comer, e a árvore
te a chave?”. da vida no meio do jardim, e a árvore do conheci-
Encaremos o desafio: trata-se de uma árvore bem fron- mento do bem e do mal. […] E Deus deu ao homem
dosa, que tem doze galhos, que têm trinta frutas, que têm este mandamento: “Podes comer de todas as ár-
vinte e quatro sementes: cada verso introduz uma nova in- vores do jardim. Mas da árvore do conhecimento
formação que se encaixa na anterior. do bem e do mal não comerás, porque no dia em
Quantos galhos tem a árvore frondosa? Quantas frutas que dela comeres terás de morrer”.²
tem cada galho? Quantas sementes tem cada fruta? A res-
Ah, essas árvores e esses frutos, o desejo de conhecer,
posta a cada uma dessas questões não revela o enigma.
tão caro ao ser humano…
Se for familiarizado com charadas, o leitor sabe que nem
Há o tempo das escrituras e o tempo da memória, e a
sempre uma árvore é uma árvore, um galho é um galho, uma
leitura está no meio, no intervalo, no diálogo. Prática enrai-
fruta é uma fruta, uma semente é uma semente… Traiçoeira,
zada na experiência humana com a linguagem, a leitura é
a árvore frondosa agita seus galhos, entorpece-nos com o
uma arte a ser compartilhada.
aroma das frutas, intriga-nos com as possibilidades ocultas
A compreensão de um texto resulta do resgate de mui-
nas sementes.
tos outros discursos por meio da memória. É preciso que os
O que é, o que é?
acontecimentos ou os saberes saiam do limbo e interajam
Apegar-se apenas às palavras, às vezes, é deixar esca-
com as palavras. Mas a memória não funciona como o dis-
par o sentido que se insinua nas ramagens, mas que não
co rígido de um computador em que se salvam arquivos; é
está ali.
um espaço movediço, cheio de conflitos e deslocamentos.
Que árvore é essa? Símbolo da vida, ao mesmo tempo
Empregar estratégias de leitura e descobrir quais são
que se alonga num percurso vertical rumo ao céu, mergulha
as mais adequadas para determinada situação constitui um
suas raízes na terra. Cíclica, despe-se das folhas, abre-se
processo que, inicialmente, se produz como atividade exter-
em flores, que escondem frutos, que protegem sementes,
na. Depois, no plano das relações interpessoais e, progres-
que ocultam coisas futuras.
sivamente, como resultado de uma série de experiências,
“Decifra-me ou te devoro.”
transforma-se em um processo interno.
Qual é a resposta? Vamos a ela: os anos, que se des-
Somente com uma rica convivência com objetos cultu-
dobram em meses, que se aceleram em dias, que escorrem
rais — em ações socioculturalmente determinadas e aber-
em horas.
tas à multiplicidade dos modos de ler, presentes nas diver-
Alegórica árvore do tempo…
sas situações comunicativas — é que a leitura se converte
A adivinha que lemos, como todo e qualquer texto,
em uma experiência significativa para os alunos. Porque
inscreve-se, necessariamente, em um gênero socialmente
ser leitor é inscrever-se em uma comunidade de leitores
construído e tem, portanto, uma relação com a exteriori-
que discute os textos lidos, troca impressões e apresenta
dade que determina as leituras possíveis. O espaço da in-
sugestões para novas leituras.
terpretação é regulado tanto pela organização do próprio
Trilhar novas veredas é o desafio; transformar a escola
texto quanto pela memória interdiscursiva, que é social,
numa comunidade de leitores é o horizonte que vislumbramos.
histórica e cultural. Em lugar de pensar que a cada texto
Depende de nós.
corresponde uma única leitura, é preferível pensar que há ¹ Meu livro de folclore, Ricardo Azevedo, Editora Ática.
tensão entre uma leitura unívoca e outra dialógica. ² A Bíblia de Jerusalém, Gênesis, capítulo 2, versículos 9 e 10, 16 e 17.

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Um pouco sobre Moacyr Scliar, o autor de
A palavra mágica
Moacyr Scliar, gaúcho de Porto Alegre, onde nasceu em 1937, foi escritor
e médico especialista em saúde pública. Autor de mais de 75 livros, alguns
deles já traduzidos em diversas línguas, recebeu prêmios literários como o
Jabuti, o APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte), o da Casa de las
Americas, entre inúmeros outros. Sua obra abrange contos, crônicas, ensaios,
romances e literatura juvenil. Foi colaborador de diversos órgãos da imprensa
Arquivo do autor

e teve textos adaptados para cinema, teatro, tevê e rádio. Foi membro da Aca-
demia Brasileira de Letras.
Faleceu em 27 de fevereiro de 2011, em Porto Alegre, mas continuará para
sempre vivo em livros como A palavra mágica.

A OBRA a uma capivara como se quisesse selar a relação fraternal


entre dois amigos, assim como decidir que esse nome seria
O livro A palavra mágica, que é uma novela – uma his- a senha para garantir a divisão da fortuna ganha por ambos
tória intermediária entre o conto (uma narrativa curta) e o na loteria. Também Pedro, ao entrar na loja onde encontra
romance (uma narrativa longa) –, conta a história do reen- Soninha, sente-se tocado pela magia do amor e sua emoção
contro afetivo entre um neto e seu avô, e a busca de uma se- “podia comparar-se à de Ali Babá entrando na caverna onde
nha perdida, que possibilita o ganho de uma grande fortuna. estavam os tesouros”. Se, por fim, o esquecimento da se-
Tudo começa com um debate entre Pedro, um menino de 14 nha fez o avô perder o dinheiro, ao mesmo tempo lhe abriu
anos, e seu pai sobre o avô, Lucídio, um senhor rabugento e o mundo para outras riquezas: o encontro com a palavra
amargo que guarda um grande segredo. escrita, quando aprendeu a ler e a escrever, podendo então
descobrir cada vez mais palavras novas e, depois, quando
se aproximou do neto e da própria família.
COMENTÁRIOS SOBRE A OBRA
A propósito, lembremos o que disse o filósofo francês
Ao lermos o título A palavra mágica, ficamos nos per- Georges Gusdorf: “A linguagem fornece a senha de entrada
guntando que palavra é essa: seria tal como aparece nos no mundo humano”. Portanto, pelas palavras mergulhamos
contos maravilhosos que ouvimos desde crianças? Diferen- dentro de nós mesmos e nos relacionamos com os outros,
temente dessa hipótese, ao contar a história do intratável dando ocasião à magia do encontro. Mas, se não tentarmos
Lucídio, brigado há muito com a família e reconduzido ao decifrar os enigmas da própria vida, poderemos permanecer
afeto familiar pela disponibilidade amorosa de seu neto Pe- à margem dela. Por isso, cada pessoa tem de descobrir sua
dro, o autor vai nos revelando aos poucos os múltiplos signi- palavra mágica.
ficados da “palavra mágica”. Ficamos sabendo que, apesar
de toda palavra mágica possuir poderes extraordinários,
nessa história trata-se de uma palavra comum, tão comum QUADRO-SÍNTESE
que “quer partilhar a vida com os outros”, ou seja, conviver Gênero: Novela.
com as outras palavras, com as quais forma frases e as fra- Componentes curriculares: Língua Portuguesa, História,
ses formam uma história. Pois não é que existe magia em Geografia, Filosofia.
cada história contada? Porque “quando o escritor sabe con- Temas contemporâneos: Direitos da criança e do adoles-
tar uma boa história ele mexe com a gente, não é mesmo? cente; respeito e valorização do idoso; educação em direi-
É como se a gente estivesse vivendo outra vida, a vida das tos humanos; vida familiar e social; diversidade cultural.
personagens”. Mas não só. Na vida diária tecemos laços de Público-alvo: 8o e 9o anos do Ensino Fundamental.
pura magia: por exemplo, dar o nome de “Nossa Amizade”

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Orientações para a aula
(Atividades pré-leitura, durante a leitura e pós-leitura)

PROPOSTAS DE ATIVIDADES base nas informações contidas nesse texto, estimule-os


a criar hipóteses a respeito do desenrolar da narrativa.
Este material fornece orientações para aulas que pre­
7. Comente com os alunos que o gênero a que o livro per­
parem os estudantes antes da leitura da obra, durante o
tence não tem relação com as conhecidas novelas de te­
processo de leitura, assim como para a retomada e a pro­
levisão. Explique que, em geral, a novela literária (como é
blematização do conteúdo.
o caso de A palavra mágica) é considerada uma história

intermediária entre o conto (uma narrativa curta) e o ro­
PRÉ-LEITURA
mance (uma narrativa longa).
Ao ler, mobilizamos nossas experiências para compreen­
8. Leia a seção Para saber mais, localizadas no final do
der o texto e apreciar os recursos estilísticos utilizados pelo
livro, para que os alunos se familiarizem com a obra e
autor. Folheando o livro, numa rápida leitura preliminar, pode­
para mais informações que podem auxiliar o trabalho
mos antecipar muito a respeito do desenvolvimento da his­
com o livro.
tória. As atividades propostas favorecem a ativação dos co­
nhecimentos prévios necessários à compreensão do texto:
• Explicitação dos conhecimentos prévios necessários DURANTE A LEITURA
para que os alunos compreendam o texto.
• Antecipação de conteúdos do texto a partir da observa­ São apresentados alguns objetivos orientadores para a
leitura, focalizando aspectos que auxiliem a construção dos
ção de indicadores como título (orientar a leitura de títu­
significados do texto pelo leitor:
los e subtítulos) e ilustração (folhear o livro para identifi­
• Leitura global do texto.
car a localização, os personagens, o conflito).
• Caracterização da estrutura do texto.
• Explicitação dos conteúdos que esperam encontrar na
• Identificação das articulações temporais e lógicas res­
obra levando em conta os aspectos observados (estimu­
ponsáveis pela coesão textual.
lar os alunos a compartilhar o que forem observando).

1. Quando os estudantes estiverem mais ou menos na


1. Apresente aos alunos o aparentemente simples título do
metade da leitura, pergunte a eles se a apresentação
livro: A palavra mágica. O que ele sugere sobre o enredo?
do livro, escrita por Maria Lúcia de Arruda Aranha, que
A que imagens do repertório de leitura do aluno esse títu­
antecede o início da história, ajuda a contextualizar o en­
lo remete? Que atmosfera sugere?
redo de ficção com o qual eles estão tomando contato.
2. Converse com os alunos para levantar hipóteses sobre o Proponha a seguinte questão: se não houvesse a apre­
que eles pensam a respeito do que seja uma palavra má­ sentação, o entendimento da história seria prejudicado?
gica: as que ouviram em histórias infantis, em filmes ou Por fim, indague se preferem que haja uma apresentação
em relatos de casos contados em família? Solicite então ou que a história comece sem apresentação nenhuma.
que imaginem suas próprias palavras mágicas e o que Comente que, em alguns livros, a apresentação costuma
gostariam de transformar com elas. ser chamada de prefácio.
3. Analise com os alunos a capa do livro. Como a imagem 2. Recomende aos alunos que atentem para os títulos dos
se articula ao título? capítulos e a relação que estabelecem com o episódio
narrado.
4. Chame a atenção para a dedicatória do livro. Peça que
observem para quem o autor dedica a história e que rela­ 3. Leia com os alunos os dois primeiros parágrafos do li­
ção a pessoa a quem o livro é dedicado tem com o autor. vro, em que a palavra mágica se apresenta. Observe com
Por fim, pergunte: por que a maioria dos escritores, ao eles que, logo de início, o autor dá uma pista preciosa
ao dizer que a etimologia de abracadabra, do idioma ara­
escrever uma história, a dedica a alguém?
maico, significa “criarei ao falar”, indicando que a palavra
5. Mostre aos alunos o sumário do livro e, com base nos surge como criadora da cultura, com poder de interferir
nomes dos capítulos, estimule-os a criar hipóteses a res­ na natureza. Indague dos alunos o que é que nós, seres
peito da trama. falantes, criamos com as palavras.

6. Explique aos alunos que o texto que aparece na parte de 4. Chame a atenção dos estudantes para o fato de a histó­
trás do livro é chamado de “texto de quarta capa”. Com ria conter algumas “idas e vindas” entre a narração em

4
terceira pessoa do autor (Moacyr Scliar) e a narração • Identificação dos pontos de vista sustentados pelo autor.
em primeira pessoa (da palavra mágica). Advirta-os de • Explicitação das opiniões pessoais diante de questões
que, na verdade, mesmo quando a narração é feita pela polêmicas.
palavra mágica, ela é uma invenção do autor do livro, e
que, este sim, tudo pode, tudo sabe. Não obstante, per­
gunte que efeito essa maneira de narrar causou neles, 1. Para explicar os diferentes idiomas, o autor evoca a
enquanto liam a história. Comente que Machado de As­ construção da Torre de Babel, passagem descrita no
sis (1839-1908), considerado o maior prosador brasileiro, Gênesis, Antigo Testamento. Podemos trazer essa ideia
gostava muito dessas “idas e vindas” em suas histórias, para os tempos atuais, de globalização, em que os ­povos
como se interrompesse a história e começasse uma con­ convivem com diferentes línguas e costumes, muitas
versa à parte com o leitor. Aproveite para perguntar se já vezes enfrentando conflitos. Por outro lado, a tentativa
leram algo escrito por Machado de Assis ou mesmo um de unificação das línguas já foi o sonho do esperanto,
livro dele. Aproveite para sugerir a leitura desse escritor. língua universal, criada artificialmente com termos co­
muns a todas as línguas. Após discutir com os alunos
5. Pergunte a eles se conhecem as histórias citadas, Ali
sobre esse tema, peça-lhes que identifiquem nos jornais
Babá e os quarenta ladrões e Capitão Marvel, herói das
exemplos desse desencontro de entendimentos e as ten­
histórias em quadrinhos norte-americanas desde a dé­
tativas de solução de conflitos pela palavra.
cada de 1940. Quanto a Ali Babá, vale lembrar que, junto
a outras histórias, como Simbad, o marujo e Aladim e a 2. O avô Lucídio, depois que aprendeu a ler, gostava de ro­
lâmpada maravilhosa, faz parte de As mil e uma noites, mances e contos porque se sentia como “se estivesse
que circulou oralmente durante a Idade Média, reunindo vivendo outra vida, a vida das personagens”. Pergunte
várias histórias orientais. Nessa obra clássica, um rei aos alunos se concordam com ele e peça que discutam
traí­do pela esposa, depois de castigá-la com a morte, em grupo sobre alguma história (literatura, filmes, histó­
resolveu passar cada noite com uma jovem esposa, man­ ria em quadrinhos, relatos míticos, novelas etc.) com que
dando matá-la ao amanhecer. Apenas Sherazade conse­ tenham se identificado e por quê.
guiu evitar o terrível destino, porque em cada noite come­ 3. Pedro promete ajudar o avô na busca da senha perdida.
çava a contar uma história interrompida em momento de Prometer significa empenhar a palavra, assumir um com­
suspense para continuar o relato no dia seguinte. Com promisso com alguém (ou consigo mesmo). Portanto,
o tempo passando, o casal teve filhos e firmaram-se os a promessa representa uma obrigação moral de ser fiel
laços afetivos entre eles, porque, pela palavra, Sherazade ao prometido. O perjúrio – a quebra da jura – rompe a
sabia “criar ao falar”. Em seguida, peça aos estudantes confiança estabelecida e depõe contra aquele que des­
que identifiquem situações reais de relações entre as cumpre o prometido. Por isso a palavra empenhada se
pessoas em que falar seja oportunidade de encontro e constitui como valor: quanto vale a palavra dada? Mes­
também de separação. mo quando não se trata de juramentos solenes, fazemos
promessas aos outros ou a nós mesmos. Peça aos alu­
nos que identifiquem no seu cotidiano esse tipo de em­
PÓS-LEITURA penho, por que o fazem e quanto têm conseguido cumpri­
-lo. Estenda a questão para níveis além do pessoal: por
Propõe-se uma série de atividades para permitir uma
exemplo, que promessas precisamos fazer com relação
melhor compreensão da obra, aprofundar o estudo e a refle­
ao futuro do nosso planeta, diante da crise ecológica que
xão a respeito de conteúdos das diversas áreas do conheci­
vivenciamos?
mento, bem como debater temas que permitam a inserção
do aluno nas questões contemporâneas: 4. Peça que os alunos identifiquem os mais diversos senti­
• Compreensão global do texto a partir da reprodução oral dos da palavra senha como um meio de comunicação de
ou escrita do texto lido ou de respostas a questões for­ ideias. Por exemplo, sinais de trânsito (placas, semáfo­
muladas pelo professor em situação de leitura compar­ ros), ícones de programas de computador, senhas dos car­
tilhada. tões de banco, senhas entre namorados, gestos, bilhetes,
• Apreciação dos recursos expressivos mobilizados na palavras secretas, mapas, gráficos etc. Após a elaboração
obra. da lista, com a contribuição de todos, peça que discutam

5
as dificuldades enfrentadas por pessoas que não estão bem entendido, porque sem referências do passado
habituadas a esses códigos (que até lhes parecem secre­ ­morrem os afetos e os laços sentimentais.” Essa frase é
tos): por exemplo, os analfabetos – como Lucídio – em um do escritor português José Cardoso Pires, que após um
mundo letrado, os jovens “analfabetos digitais”, por não acidente vascular cerebral perdeu, por um período, a qua­
terem acesso aos recursos da internet em uma sociedade se totalidade da memória: durante a doença, as palavras
cada vez mais informatizada etc. ditas não correspondiam às coisas, nem mesmo sabia

5. Peça que os alunos discutam o seguinte: quando Lucídio quem era ele e não reconhecia as pessoas com quem
perdeu a senha, perdeu o dinheiro. No entanto, na busca vivia. Após ler a citação e discutir a respeito com os alu­
da senha perdida, o que ele ganhou de realmente impor­ nos, peça a eles que apliquem o exemplo à experiência
tante para si e para a família? própria, estabelecendo a relação entre palavra e memó­
ria, memória e sentimento.
6. Quando Lucídio descobre que a palavra mágica era ca-
pivara, o autor pergunta: “O que tem de mágico o nome 10. “Escrever, para mim, é um ato que preenche várias fina­
desse bicho? Nada. E tudo”. Indague aos alunos qual é o lidades. Em primeiro lugar, é uma forma de organizar o
significado da frase, tendo em vista o que já foi discutido mundo, de dar sentido às coisas, através daquela pro­
a respeito do poder das palavras. gressão lógica: princípio, meio, fim. Em segundo lugar,
é um grande meio de comunicação com nossos seme­
7. Diz o autor: “Esperança, pessoal, é uma palavra quase
lhantes: a palavra escrita é um território que partilhamos
mágica, uma palavra que anima as pessoas, que lhes
em silêncio, em amável cumplicidade.” Essa frase é do
dá forças para continuar lutando”. Ou seja, pela palavra
próprio autor, Moacyr Scliar, em uma entrevista. Após a
antecipamos o que desejamos no futuro e planejamos a
leitura e a discussão do livro, pergunte aos alunos se o
ação para realizar esse desejo. A partir da palavra espe-
autor alcançou, com eles, os objetivos citados.
rança, sugira aos alunos que discutam a importância da
palavra ao situar o ser humano no tempo: para viver o 11. Solicite aos alunos que escrevam uma redação de mais
presente, lembrar o passado e projetar o futuro. ou menos 20 linhas tendo como tema uma frase extraída
da apresentação escrita por Maria Lúcia de Arruda Aranha:
8. Forme uma roda de conversa e releia com os estudantes
“A palavra é a ‘roupa do pensamento’”. Oriente-os a usar
este trecho da história, da página 35: “Há momentos na
referências da leitura feita e também de fontes externas
nossa vida em que temos de tomar uma decisão. Às ve­
e de sua experiência como leitores, falantes e ouvintes.
zes, são decisões importantes, por exemplo, qual a pro­
fissão que queremos seguir. Às vezes, são decisões pou­ 12. Já no final do livro, há a informação de que a palavra
co importantes”. Em tom informal, pergunte aos alunos capivara se origina da expressão indígena kapi wara, que
se eles se lembram de uma decisão importante que te­ significa “comedor de capim”. Pergunte aos alunos se
nham tomado na vida. Após ouvir os relatos, que devem eles já viram em foto ou em vídeo (ou mesmo de per­
ser espontâneos, questione-os sobre a importância de já to) uma capivara. Em seguida, questione se sabiam que
irem tomando a rédea da própria vida. Comente que uma a língua portuguesa tem muitas expressões oriundas da
pesquisa aponta que, nas últimas décadas, os jovens es­ língua indígena tupi-guarani – como a nossa kapi wara.
tão demorando mais a deixar a casa dos pais. Pergunte Por fim, instigue-os a pesquisar algumas palavras que
o que acham disso e se consideram válido adiar a vida têm origem no tupi, a língua dos primeiros habitantes de
adulta para completar a formação educacional e profis­ nosso país. Alerte-os de que há muito mais palavras do
sional, ou mesmo para aproveitar melhor a liberdade de tupi em nosso cotidiano do que eles imaginam.
uma juventude sem compromissos como casamento ou 13. Chame a atenção dos estudantes para a frase da mãe
filhos. Ao fazer essa abordagem, leve em conta a dispa­ de Moacyr Scliar, que ele cita no posfácio do livro: “Em
ridade das experiências dos alunos, havendo aqueles nossa casa, pode faltar até comida, mas não podem
oriundos de famílias mais bem estruturadas, em que há
faltar livros”. Sugira a eles que, em duplas ou trios, fa­
informação e diálogo, e aqueles provenientes de um am­
çam um levantamento sobre pesquisas a respeito do
biente familiar em tudo avesso ao estímulo ao estudo e
hábito de leitura em nosso país. Instigue-os a consta­
à informação.
tar se a frase da mãe do autor corresponde à realidade
9. “Sem memória esvai-se o presente que simultaneamente das famílias brasileiras. Problematize a questão inda­
já é passado morto. Perde-se a vida anterior. E a ­interior, gando o porquê da situação constatada nas pesquisas

6
­consultadas. ­Pergunte se, na casa deles, a frase faz feita a eleição; que atributos um escritor precisa ter
sentido e por quê. para fazer parte dela etc.

14. Peça aos alunos que atentem para o seguinte trecho do b. Relacionem a frase “Mas continuo pensando no jo­
texto do autor, depois do final da história, na página 111: vem escritor que fui” com a de outro escritor brasilei­
“Colaboro em vários jornais e revistas e sou membro da ro, Fernando Sabino (1923-2004), que, em sua lápide,
Academia Brasileira de Letras. Mas continuo pensando pediu que fosse colocada a frase: “Aqui jaz Fernando
no jovem escritor que fui”. Com base nesse trecho, soli­ ­Sabino, nasceu homem, morreu menino”. Questione­
cite aos alunos que: -os: com base nas frases dos dois escritores, a in­
a. Em grupos, façam uma pesquisa sobre a Academia fância, a adolescência e a juventude são uma grande
Brasileira de Letras. A pesquisa deve conter informa­ fonte de inspiração para um escritor? Peça que jus­
ções sobre: seu ano de fundação; seus fundadores; tifiquem a resposta, podendo incluir depoimentos de
qual é a função de uma academia de letras; como é outros autores que conhecem.

7
Abordagem interdisciplinar em sala de aula

Este material fornece orientações gerais para aulas de bulário e o grau de intimidade com as nuances da língua
outros componentes ou áreas do conhecimento para a uti- são responsáveis pela indigência do próprio pensamento
lização de temas e conteúdos presentes na obra, visando ou pelo seu requinte.
à abordagem interdisciplinar, que enriquece o trabalho e a 2. Enfatize para os alunos, como forma de conclusão sobre a
compreensão dos conceitos discutidos. leitura feita, a importância da reflexão a respeito das múlti-
plas faces da palavra em uma época de predominância de
imagens, gestos, performances e, muitas vezes, de empo-
ATIVIDADE DE HISTÓRIA brecimento da linguagem verbal. Explique que a linguagem
humana resulta de uma construção da razão, uma invenção
Além da referência bíblica da Torre de Babel (menciona-
do sujeito para se aproximar da ­realidade, para se comuni-
da na atividade 1 da parte Pós-leitura do Material de apoio
car com os outros, para retornar sobre si mesmo e se reco-
ao professor: orientações para a aula), historicamente teria
nhecer. Complemente dizendo que a linguagem é um dos
existido, na antiga Babilônia, um centro comercial e intelec-
principais instrumentos da invenção do mundo cultural, por
tual para onde convergiam povos de diferentes idiomas, daí
nos permitir lembrar o passado, projetar o futuro e, dessa
a ideia da confusão das línguas. Sugira aos estudantes que
maneira, nos tornar capazes de transcender nossa experiên-
realizem uma pesquisa com viés histórico para saber mais
cia vivida – atributos exclusivamente humanos.
sobre essa região.
Acrescente que, por se tratar de um atributo huma-
no fundamental, a palavra é um elemento constitutivo,
ATIVIDADE DE GEOGRAFIA aquilo que faz com que transcendamos a mera condi-
ção de humanos, que não nos basta. A palavra é tam-
Comente com os alunos que a busca da boa convivên- bém a via da construção da identidade: por meio dela
cia na diferença entre os diferentes países e culturas se en- “conversamos” conosco quando refletimos e saímos de
contra na atuação de organizações internacionais (como a nós mesmos, e quando dialogamos.
Organização das Nações Unidas – ONU), dispostas a inter-
3. Se julgar oportuno, aprofunde a reflexão da atividade an-
vir pela diplomacia – diga-se, pela palavra – para contornar
terior comentando que o interesse pela palavra decorre
conflitos que, de outro modo, terminariam em guerra. de suas múltiplas funções cognitivas, comunicativas e
Sugira à turma que faça uma pesquisa sobre essas or- valorativas. Ao enfocar a palavra nas expressões da fala
ganizações internacionais e suas áreas de atuação. Após o e da escrita, chame a atenção para seus aspectos funda-
levantamento, separe os alunos em grupos e peça a cada mentais, ou seja, sua capacidade de:
um que apresente sobre uma organização diferente. Os re- • Conhecer a realidade, ainda que por perfis e aproxi-
sultados podem ser expostos em murais que ficarão dispo- mações;
níveis para apreciação de toda a escola. • Dialogar, estabelecendo a intersubjetividade da comu-
nicação;
• Provocar a ação: o agir humano é sempre intencional,
ATIVIDADES COMPLEMENTARES
antecedido pela reflexão; e vice-versa: o pensar, por
FILOSOFIA sua vez, se enriquece com o fazer;
• Valorar: além de nos humanizar, a palavra possibilita
1. Lembre os alunos de que a palavra, embora tenha seus que façamos juízos de valor.
aspectos virtuosos, “mágicos”, também possibilita usos Finalize dizendo que, pela palavra, podemos: contar
nocivos, que impedem ou enfraquecem o processo de um acontecimento, levantar hipóteses e examiná-las,
humanização. Cite o filósofo francês Georges Gusdorf, planejar um trabalho (ou a própria vida), inventar uma
para quem “as palavras possuem um destino, feliz ou história, representar no teatro, criar ou resolver enigmas,
infame”, já que elas nos permitem mentir, maldizer, pro- traduzir, cumprimentar, orar, imaginar metáforas, poetar,
vocar mal-entendidos, dissimular acontecimentos, dou- comandar, implorar, comunicar-se com os outros, escre-
trinar, caçoar, ofender, trair, difamar. Realce que cabe aos ver, persuadir, ensinar, prometer, orientar a ação, avaliar
educadores – pais e professores – possibilitar à criança comportamentos e pessoas e muito mais.
e ao jovem o encontro fecundo com a palavra no movi- Se possível, pesquise na biblioteca da sua escola ou
mento de aprendizagem e do seu necessário aprimora- da sua cidade outros livros que tratem o tema “Diálogos
mento. Mesmo porque a pobreza ou a riqueza de voca- com a História e a Filosofia”.

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