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Resumo
O objetivo deste artigo é abordar a importância da construção sonora para a linguagem
narrativa do cinema. Partindo dos seus primórdios e chegando até os dias atuais, dissecando as
suas técnicas e aparelhamento, o artigo frisará o intenso trabalho do som e de seus profissionais,
que tem por objetivo proporcionar ao espectador uma imersão cada vez maior na história que
se desenrola na tela do cinema.
1 Introdução
O cineasta americano Paul Thomas Anderson sempre desejou dirigir um filme sem
diálogos. Em 2007, ao lançar filme Sangue Negro (There Will Be Blood, 2007), ele realizou
parcialmente o seu sonho: os primeiros minutos são totalmente desprovidos de qualquer fala.
A ascensão de Daniel Plainview, protagonista do filme interpretado por Daniel Day-Lewis, é
contada com o apoio dos sons que cercam o personagem em sua jornada em busca de petróleo
no árido solo do oeste estadunidense. O atrito das ferramentas na terra, o deslizar da terra seca,
o cuspe do garimpeiro, a sua respiração ofegante, o vento soprando, um trovão rugindo distante,
o pavio de uma dinamite sendo queimado, uma explosão, um degrau de escada quebrando, um
corpo caindo no chão, um arfar de dor, o arrastar na terra, o raspar da caneta no papel, o
borbulhar do petróleo, um pedaço de madeira caindo sobre um corpo, o choro de um bebê, o
trafegar de um trem sobre os trilhos e uma trilha que vai e volta ora discreta, ora
indiscretamente. Ao longo de 14min e 30s nenhuma boca formula uma palavra sequer, deixando
para o som das pequenas coisas a tarefa de nos fazer imergir no universo no qual o filme se
desenrola. Como observamos no universo audiovisual um “vococentrismo” inegável,
obviamente ao eliminar os diálogos da sequência, a narrativa perde um importante instrumento
fornecido pelo som para o seu bom andamento. Mas, se em 1895 os irmãos Lumiére já
apresentavam ao mundo A Chegada do Trem ao som de um piano, é justamente ao negar essa
realidade centrada na voz, remetendo à relação bruta e original do som com a imagem que
Anderson e os diretores de som do filme Matthew Wood e Christpher Scarabosio desnudam o
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¹ Aluno do curso de Comunicação Social – Jornalismo, Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação,
UFRGS. Trabalho realizado como pré-requisito para avaliação da disciplina BIB02144 – Mídias
Audiovisuais, Porto Alegre, maio de 2016. E-mail: glaubeercruz@gmail.com
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Dessa forma, não importa se está sendo falado de um blockbuster da Marvel Studios, de
uma animação da Pixar ou mesmo de um curta-metragem universitário. O som é, em todas essas
escalas, e em outras mais, indispensável para a construção de uma narrativa convincente e
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Com a extinção do Vitaphone e o comprometimento cada vez maior por parte dos
realizadores no sentido de reproduzir na tela uma impressão cada vez mais fiel da realidade,
outras tecnologias foram introduzidas, popularizando nos Estados Unidos e Europa o uso do
som nos filmes. É nessa época, meados da década de 1930, que surgem os chamados talkies,
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Com a cena devidamente registrada, tanto em áudio quanto em vídeo, entra o trabalho
do responsável pela mixagem do som. “Na mixagem, como o próprio termo sugere, o que se
faz é misturar todos esses elementos para que eles soem como um conjunto uniforme”
(BERCHMANS, 2006, p. 169). É nesse momento que o som que chegará ao ouvido o
espectador tomará forma: a trilha sonora se relaciona com o diálogo, que dá espaço para sons
criados, que compartilha segundos de exibição com os sons resgatados de bibliotecas sonoras,
ajudando a contar a história de forma equilibrada.
Na produção cinematográfica, o campo do som pode se dividir em três instâncias: a
música, o desenho de som (ou sound design) e os diálogos.
A música é uma “poderosa ferramenta para emocionar o espectador. Pode ser
especialmente composta para o filme ou ser adaptada de obra já existente e gravada”
(GERBASE, 2012, p. 140). Na história do cinema temos exemplos perfeitos de como a
música, seja ela composta especialmente para o filme ou resgatada de outra mídia, pode criar
cenas clássicas e imortais, bem como contribuindo para a construção de um universo e seu
clima. É o caso da trilha da cena do chuveiro em Psicose (Psycho, 1961), composta por
Bernanrd Herrmann e do uso de Assim Falou Zarathustra na abertura de 2001: Uma Odisseia
no Espaço (2001: A Space Odyssey, 1968), respectivamente. Outro exemplo marcante que
temos é a utilização da trilha como representação direta de personagens, representando uma
extensão das características e traços do personagens para além do roteiro e da atuação do
artista. O compositor John Williams ao longo de sua carreira fez isso de forma magistral. Os
temas de Darth Vader, Indiana Jones, Harry Potter e Superman transcendem e confirmam que
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o som, muito mais que material de apoio, é de extrema importância para a construção,
também, dos personagens pertencentes à narrativa.
O termo sound design apareceu pela primeira vez na tela do cinema nos créditos de
Apocalypse Now (1975).
Conceitualmente, sound design é a criação, manipulação e organização de
elementos sonoros. É o processo que reproduz o rugir de um tiranossauro
rex ou o som de uma arma laser, o tiroteio de uma sangrenta batalha, ou
ainda, a voz de um computador futurista. (BERCHMANS, 2006, p. 162)
Para chegar em um grau profundo de fidelidade aos sons reais que nos cercam (e
também daqueles que não nos cercam e nunca o farão) e, assim, dar um tom realista para a
narrativa sonora e, finalmente, na narrativa cinematográfica, o desenhista de som é munido
de uma série de técnicas que o auxiliam nesse processo. Uma das mais conhecidas é o foley,
batizada assim em homenagem à Jack Foley, um editor de som da Universal Studios que foi
precursor na arte de imitar e regravar o som dos passos, gestos e atitudes do elenco em cena,
visando melhorar a qualidade do som do ambiente sonoro dos filmes. Dessa forma,
Berchmans diz:
(..) é a técnica de se reproduzir em estúdio todo som gerado pela atividade
física dos personagens por meio de mímica de seus movimentos. Passos,
ruídos de roupas, manejo de objetos, quedas e outras ações são imitadas
pelos artistas de foley enquanto assistem à cena e gravam seus sons.
(BERCHMANS, 2006, p. 162)
Outra técnica da qual o sound design faz largo uso são os efeitos sonoros, que são os
sons criados do zero para enriquecer a linguagem utilizada pelo filme e a sua narrativa. Típica
em ficções científicas, a técnica tem como um dos grandes nomes Ben Burtt, designer de som
de Guerra nas Estrelas (Star Wars, 1977) que, ignorando conceitos científicos e violando as
leis da física, recriou o som de motores e explosões em pleno espaço.
No aspecto prático, criar efeitos sonoros consiste em dissociar um som de
seu emissor, que vemos na imagem, para reassociar este emissor a outros
sons, mais marcantes. Isso acontece por uma variedade de motivos, como
conveniência (o som de pisadas em galhos de milho ficam melhor,
sonoramente, do que o barulho de passos reais na neve); necessidade (muitas
vezes, por motivos de segurança, usa-se vidro falso e outros objetos
cenográficos que não fazem o mesmo som que um objeto real); até motivos
éticos, já que esmagar uma melancia é muito mais aceitável de que quebrar
de verdade a cabeça de uma pessoa. (TOLEDO, 2010)
criou o som emitidos pelos dinossauros para que depois fossem criados os visuais dos
mesmos, que viriam a se “casar” com o trabalho sonoro do editor.
Outro técnica importante do sound design é a criação do som ambiente, ou background,
que nos dá o tom e o clima da cena, ou do universo no qual o filme é ambientado.
São sons constantes e assíncronos, como o som do interior de um shopping,
uma esquina movimentada, uma plantação num dia de muito vento, uma
praia, um escritório, o interior de uma nave espacial. (BERCHMANS, 2006,
p. 163)
Por fim, finalizando o âmbito do som no cinema, temos o diálogo. Através de falas ou
de narrações em off, os diálogos “carregam muito do sentido de compreensão da história
(ficcional ou não)” (GERBASE, 2012, p. 141), representando, portanto, a forma mais direta
e exposta do trabalho sonoro em um filme. Daí a ideia de “vococentrismo”: o verbo e a fala
como as formas mais comumente usadas para o desenrolar de uma narrativa.
Carlos Gerbase ainda fala em uma quarta instância, o silêncio:
A sua carga emocional pode ser forte e perturbadora. A ausência do som,
usada de forma deliberada, tem se tornado um recurso interessante na
concepção de certos significados, criando uma espécie de “vácuo” da
narrativa de um filme. (GERBASE, 2012, p. 141)
4 Considerações Finais
Observada a criação e o desenvolvimento do som no cinema, bem como as ferramentas
utilizadas pelos diversos profissionais, é possível compreender a extrema preocupação que se
tem em relação ao som de um filme. Desde a sua trilha, que ajuda a compor personagens, até
os seus diálogos, a forma de falar, o tom ao falar, passando pelos sons criados especialmente
para aquela narrativa e pelos sons que compõem o ambiente, tão ricos e discretos, o som no
cinema é uma quase que uma arte à parte que, infelizmente, é ofuscada pelo apelo mais visual
do cinema. A fotografia, o figurino, a maquiagem, os efeitos especiais sempre terão maior
destaque em razão da sua natureza aberta, desnuda. Assim como eles, o som é uma importante
e indispensável peça na estrutura narrativa de um filme e na construção das sensações e
imersão do espectador no universo de ilusão que é a Sétima Arte.
5 Referências Bibliográficas
BERCHMANS, Tony. A música do filme: tudo o que você gostaria de saber sobre a
música de cinema. São Paulo: Escrituras Editora, 2006.
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TOLEDO, Carina. O som no cinema: criando emoções com efeitos sonoros, 2010.
Disponível em: https://omelete.uol.com.br/filmes/artigo/o-som-no-cinema-criando-emocoes-
com-efeitos-sonoros/.