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OS ESPIRITOS EM PRISÕES

1 Pe 3.19-21
Nem consciência e nem uma segunda oportunidade

Crendo na possibilidade de distinção entre corpo e alma, na comunicação entre vivos e


mortos, no estado consciente dos mortos e em uma segunda oportunidade de
arrependimento depois da morte, muitos são aqueles que defendem a idéia de que
durante os três dias e três noites que passou na sepultura, esteve Jesus pregando o
evangelho em algum lugar, aos “espíritos dos mortos”. Este lugar, dizem ser o “hades”.
Reconhecemos ser este um texto aparentemente difícil de ser entendido, mas de uma
coisa estamos certos, essa não é a interpretação correta do texto, pelas seguintes razões
(entre outras):

1o) Depois da morte, não haverá uma Segunda oportunidade. Acreditar que mesmo
depois da morte ainda haverá uma Segunda oportunidade de arrependimento e de
conversão para quem morreu afastado da graça salvadora de Cristo, é contrapor-se ao
ensino das Escrituras, porque, assim como Cristo consumou com a sua obra na morte,
quando fez o único sacrifício que lhe estava reservado fazer para remissão dos pecados
do mundo, não lhe restando mais nenhum outro sacrifício além daquele, assim também,
com a morte do homem cessam todas as suas oportunidades de arrependimento e de
conversão, ou seja, assim como a obra de Cristo foi concluída com a sua morte, assim
também a obra do homem é concluída com a morte deste, pois assim está escrito: “E,
como aos homens está ordenado morrerem uma vez vindo depois disso o juízo, assim
também Cristo, oferecendo-se uma vez para tirar os pecados de muitos, aparecerá
segunda vez, sem pecado, aos que o esperam para a salvação”, Ver He 9:27 e 28.

2o) As pessoas mortas não têm consciência de nada. A idéia segundo a qual as
pessoas fisicamente mortas, estão conscientes e capazes de ouvir o que é dito pelos
vivos, é um pressuposto que não encontra respaldo nas Escrituras. Ao contrário disso, as
Escrituras afirmam que: “... Os vivos sabem que hão de morrer, mas os mortos não
sabem coisa nenhuma... até o seu amor, o seu ódio e a sua inveja já pereceram... porque
na sepultura, para onde tu vais, não há obra nem indústria, nem ciência, nem sabedoria
alguma”, Ec 9:5, 6 e 10. “Porque não pode louvar-te a sepultura, nem a morte glorificar-te;
nem esperarão em tua verdade os que descem à cova. Os vivos, os vivos, estes te
louvarão como eu hoje faço; os pais aos filhos fará notória a tua verdade”, Is 38:18 e 19.
“Porque na morte não há lembrança de ti; no sepulcro quem te louvará?”, Sl 6:5. “Os seus
filhos estão em honra, sem que ele o saiba; ou ficam minguados sem que ele o perceba”,
Jó 14:21.

3o) O “hades” é o lugar dos mortos e não dos espíritos dos mortos. A palavra
“hades” empregada por esses leitores da Bíblia com o significado de “lugar dos espíritos
dos mortos”, é a tradução grega do vocábulo hebraico “Sheol”, e que foi traduzido para o
português por sepultura. O próprio Pedro dá o verdadeiro significado de “hades”, quando
em seu sermão após a experiência do pentecostes, falando da ressurreição de Cristo, se
reporta a um Salmo messiânico (Sl 16:10), e o reproduz da maneira como segue: “Varões
irmãos, seja-me lícito dizer-vos livremente acerca do patriarca Davi que ele morreu e foi
sepultado, e entre nós está até hoje a sua sepultura. Sendo pois ele profeta, e sabendo
que Deus lhe havia prometido com juramento que do fruto dos seus lombos, segundo a
carne, levantaria o Cristo, para o assentar sobre o seu trono, nesta previsão disse da
ressurreição de Cristo: que a sua alma não foi deixada no hades, nem a sua carne viu a
corrupção. Deus ressuscitou a este Jesus, do que todos nós somos testemunhas”, At
2:29-32. Neste texto, Pedro substitui a palavra “hades” por “sepultura”. A esta altura
perguntamos: De onde saiu Jesus ao ressuscitar? Não foi da sepultura? Algumas versões
das Escrituras preferem chamar a sepultura de “inferno”; porém, sheol, hades, sepultura e
inferno têm, nas Escrituras, o mesmo significado. E não se trata do lugar dos espíritos dos
mortos e sim, do lugar onde foram depositados os corpos dos mortos.

No sentido de esclarecer as razões de toda a polemica levantada em torno do texto que


trata do assunto, julgamos conveniente reproduzi-lo.

“Porque também Cristo padeceu uma vez pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a
Deus; mortificado, na verdade, na carne, mas vivificado pelo Espírito; no qual também foi, e
pregou aos espíritos em prisão; os quais noutro tempo foram rebeldes, quando a longanimidade
de Deus esperava nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca; na qual poucas (isto é) almas
se salvaram pela água”. 1

Face ao modo de crer dessas pessoas perguntamos: Seria essa a interpretação correta
do texto? Ao fazer dele objeto de reflexão e análise, temos como propósito esclarecê-lo à
luz da Palavra de Deus. Para isso, convidamos o leitor a nos acompanhar nessa reflexão.

1
I Pe 3:18 e 19.
De acordo com as considerações já feitas anteriormente, vemo-nos constrangidos a
reconhecer que de fato estamos diante de um texto de difícil compreensão,
principalmente para um noviço, ainda não familiarizado suficientemente com questões de
natureza doutrinária. Entretanto não podemos esquecer o fato de que, uma doutrina é
caracterizada principalmente por sua freqüência, uniformidade e coerência. Biblicamente,
isto significa dizer que, a doutrina bíblica para ser considerada como tal, precisa estar
alicerçada em afirmações feitas por mais de um escritor e em livros diferentes da
Escritura. No tocante a freqüência ou repetição, há um princípio bíblico que precisa ser
levado em consideração, especialmente neste caso, e este princípio deve nortear o
estudante na leitura, análise e interpretação de qualquer texto bíblico: “Pela boca de duas
testemunhas, ou pela boca de três testemunhas, se estabelecerá o negócio”, Dt 19:15.
Ver ainda: Mt 16:18; II Co 13:1. Isto significa dizer que, o que foi escrito por um escritor
sagrado precisa estar em perfeita harmonia com aquilo que foi escrito por outros
escritores sobre o mesmo assunto, em outros livros da Bíblia, não podendo haver entre
eles contradição alguma. Está escrito que, toda a Escritura é divinamente inspirada, I Tm
3:16 e que aqueles que a escreveram não o fizeram por iniciativa própria, senão por
inspiração do Espírito Santo, II Pe 1:19-21. E a conclusão a que se pode chegar como
resultado dessas afirmações bíblicas é a seguinte: O mesmo Espírito que inspirou os
profetas de Deus a escreverem a Escritura, tiveram uma mesma fonte de inspiração –
Deus – e, por isso, não podem contradizer-se.
Se não há possibilidade de uma pessoa viva estabelecer contato com outra pessoa morta,
é bem menos possível o contato entre pessoas igualmente mortas, Lc 16:26. O mundo
dos mortos são as sepulturas e lá as pessoas permanecem totalmente inconscientes,
como já ficou demonstrado (Ec 9:5 e 6 e 10). E, se não tem consciência de nada, que
proveito tiraria Jesus de sua pregação, se insistem em compreender o texto literalmente?
Já dissemos que os vivos sabem que hão de morrer mas os mortos não sabem de coisa
nenhuma. Davi diz. “Sai-lhes o espírito e , e eles tornam-se em sua terra; naquele mesmo
dia perecem os seus pensamentos”, Sl 146:4. Chamamos a atenção do leitor para
algumas expressões contidas no texto, as quais serão analisadas separadamente:

a): Cristo padeceu uma vez pelos pecados. Com o propósito de consolar seus irmãos
na fé, em meio ao sofrimento, Pedro recomenda-lhes a prática da paciência, enquanto
aponta como modelo, o exemplo do próprio Cristo, lembrando-lhes que o pecado (a
começar com o primeiro pecador), foi sempre a causa maior do seu sofrimento, “o justo
pelos injustos”, para levar-nos a Deus.
“Sabendo que não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes
resgatados da vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos pais,
mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado,
o qual, na verdade em outro tempo foi conhecido , ainda antes da fundação do mundo,
mas manifestado nestes últimas tempo por amor de vós”, I Pe 1:18-20. É sempre bom
lembrar que a morte de Cristo (incluindo-se também o seu sofrimento), é considerada, do
ponto de vista bíblico, não apenas em ordem cronológica, mas antes disto, em ordem de
importância. E, nesta ordem, ele foi morto desde a fundação do mundo, Ap 13:8. Portanto
quando João apontou para ele e disse: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do
mundo” (Jo 1:29 e 36), estava se referindo a Cristo como o Salvador do mundo, incluindo
nessa sua declaração, os pecados de todos os pecadores, a começar com o primeiro
deles.

b): vivificado pelo Espírito no qual também foi, e pregou. Essa sentença mostra a
maneira, através da qual Cristo pregou aos espíritos. Considerando-se que a “pregação” a
que se refere o texto foi feita às pessoas que viveram nos dias de Noé, Jesus não a
poderia ter feito na forma como veio a ser conhecido após sua humanização, isto é,
pessoal e literalmente, porque até então não era conhecido desse modo. Daí a
declaração de que foi “em espírito” que ele foi e pregou. Observemos o que o mesmo
Pedro diz sobre a obra redentora de Cristo:

“Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua grande
misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo
dentre os mortos, para uma herança incorruptível, incontaminável, e que se não pode murchar,
guardada nos céus para vós, que mediante a fé estais guardados na virtude de Deus para a
salvação, já prestes para se revelar no último dia... Ao qual, não o havendo visto amais; no qual,
não o vendo agora, mas crendo, vos alegrais com gozo inefável e glorioso; alcançando o fim da
vossa fé, a salvação das almas. Da qual salvação inquiriram e trataram diligentemente os profetas
que profetizaram da graça que vos foi dada, indagando que tempo ou que ocasião de tempo o
Espírito de Cristo, que estava neles, indicava anteriormente testificando os sofrimentos que a
Cristo haviam de vir, e a glória que se lhes havia de seguir. Aos quais foi revelado que, não par si
mesmos, mas para nós, eles ministravam estas coisas que agora vos foram anunciadas por
aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, vos pregaram o evangelho; para as quais coisas
os anjos desejam bem atentar”. 2

2
I Pe 1:3-5, 8-12.
Chamamos a atenção para a declaração: “o Espírito de Cristo que estava neles”. Quem
foram “eles?” Os profetas, evidentemente, pois na reprodução do texto foi dito: “os
profetas que profetizaram da graça que vos foi dada”, etc. Todos os profetas de Deus,
foram inspirados pelo Espírito de Deus, ou seja, falaram impelidos pelo poder do Espírito
Santo que operava através deles, não importa o tempo em que tenham profetizado. Por
isso está escrito: “E temos, mui firme, a palavra dos profetas, à qual bem fazeis em estar
atentos, como a uma luz que alumia em lugar escuro, até que o dia esclareça, e a estrela
da alva apareça em vossos corações. Sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia
da Escritura é de particular interpretação. Porque a profecia nunca foi produzida por
vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo
Espírito Santo”, II Pe 1:19-21. Portanto, Noé, a quem Pedro chama de “pregoeiro da
justiça” (II Pe 2:5) foi o profeta de Deus enviado aos antediluvianos, para chamá-los ao
arrependimento, embora não saibamos ao certo de que forma foi feita essa pregação. O
certo é essa pregação, qualquer que tenha sido a maneira como foi feita, foi o resultado
da ação do Espírito Santo na vida dos pregadores.

c):aos espíritos em prisão. A maior dificuldade na compreensão de todo o texto talvez


esteja centrada em um pequeno núcleo dele, representado pela afirmação de que Jesus
“foi e pregou aos espíritos em prisão”. Esta prisão é entendida por alguns leitores da
Bíblia com o significado de “lugar dos espíritos dos mortos”. Nesta frase, os termos
“espíritos” e “prisão” são figurativos, ou seja, querem significar outra coisa. O primeiro
significa pessoas, e o segundo representa prisão sob o domínio do pecado. Em um
diálogo com alguns judeus Jesus disse: “E conhecereis a verdade e a verdade vos
libertará”, Jo 8:32. Ao lhes dizer isto, Jesus tinha em mente o objetivo de sua missão no
mundo: “O Espírito do Senhor Jeová está sobre mim, porque o Senhor me ungiu para
pregar boas novas aos mansos: enviou-me a restaurar os contritos de coração, a
proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos”, Is 61:1; Lc 4:18 e 19.
A isto eles retrucaram: “Somos descendência de Abraão, e nunca servimos a ninguém;
como dizes tu: Sereis livres? Respondeu-lhes Jesus: Em verdade em verdade vos digo
que todo aquele que comete pecado é servo do pecado... Se pois o Filho vos libertar,
verdadeiramente sereis livres”, Jo 8:32-34 e 36. O que Jesus disse, na verdade, é que o
pecado aprisiona as pessoas e que, deste tipo de prisão só ele pode livrar. Daí o
significado das palavras de Paulo: “E vos vivificou, estando vós mortos em ofensas e
pecados... Estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com
Cristo...”, Ef 2:1 e 5. “E, quando vós estáveis mortos nos pecados, e na incircuncisão da
vossa carne, vos vivificou juntamente com ele, perdoando-vos todas as ofensas”, Cl 2:13.
Portanto, foi aos que estavam presos e até mortos pelos pecados, que Cristo foi e pregou.
E isto fez ele através de Noé, ou melhor, através do seu espírito que operava em Noé, de
quem se utilizou como instrumento.

d): os quais noutro tempo foram rebeldes. A referência é feita aos pecadores
contemporâneos de Noé. Este fato está de acordo com a declaração do mesmo apóstolo
Pedro, onde ele diz que, para benefício daqueles pecadores, Noé foi feito o pregoeiro da
justiça, II Pe 2:5. Ora, a quem Noé teria pregado o evangelho senão para aqueles que
viveram no seu tempo?

e): quando... Deus esperava nos dias de Noé. Não há dúvida de que isto aconteceu
nos dias de Noé, pois o sentido desta frase se completa com a afirmação de que foram
rebeldes “quando a longanimidade de Deus esperava nos dias de Noé, enquanto se
preparava a arca; na qual poucas pessoas se salvaram pela água”, I Pe 20.
Aos que insistem em acreditar que foi depois de sua morte que Jesus foi ao lugar dos
espíritos dos mortos e a eles pregou o evangelho, perguntamos: Onde fica esse lugar e
quando isso aconteceu? Porque de acordo com as Escrituras, depois de morto, como
normalmente acontece com todas as pessoas que morrem, Jesus foi para a sepultura. E
nesta, ninguém mais havia, senão ele só. Aliás, o sepulcro onde foi colocado era novo, e
antes de Jesus, ninguém tinha sido sepultado nele, Jo 19:40-42.

O significado mais razoável do texto. Portanto, repetimos: O texto refere-se ao


testemunho dado por Noé, o pregoeiro da justiça (II Pd. 2:5) que, no seu tempo, e sob a
influência do Espírito Santo ou Espírito de Cristo que operava através dele (I Pe l0-l2),
evangelizou a seus contemporâneos (I Pe. 3: l8-20), os quais, em razão dos seus muitos
pecados estavam espiritualmente mortos (I Pe 4: 6). Na sepultura, os mortos não sabem
coisa nenhuma, como já podemos demonstrar, Ec. 9: 5, 6 e l0. E, se assim é, que efeito
produziria a pregação ministrada a eles? Após a morte não haverá uma segunda
oportunidade, pois “aos homens está ordenado morrerem uma vez, vindo depois disso o
juízo”, Hb. 9: 27. Além disso, há uma barreira entre os vivos e os mortos que torna
impossível a comunicação entre ambos, Lc. l6: 25 e 26.
Comentando a frase “desceu ao inferno”, inserida em uma das versões do Credo feita por
Rufino, no ano 390 da Era Cristã, e que tem como fundamentação bíblica o texto de I Pe
3:19 e 20, diz Champlin, o seguinte:
”Depois, não foi incluída de novo em nenhuma versão do Credo anterior a 650 d. CC. Além disso,
Rufino, a única pessoa a incluí-la antes de 650 d. C., não pensava que essa frase significasse que
Cristo desceu ao inferno, mas que foi “sepultado”. Em outras palavras, ele entendia que a frase
significava que Cristo “desceu à sepultura”. (A forma grega traz hades, que pode significar apenas
“sepultura”, e não geena, inferno, “lugar de punição”.).3

Prosseguindo em suas considerações em torno do mesmo texto que temos comentado até agora,
acrescenta ainda o mesmo teólogo:
Alguns entendem que “foi e pregou aos espíritos em prisão” significa que Cristo foi ao inferno e
pregou aos espíritos que ali estavam – ou proclamando o evangelho e oferecendo uma segunda
oportunidade de arrependimento, ou só proclamando que havia triunfado sobre eles e que
estavam eternamente condenados. Mas essas interpretações não explicam de modo adequado
nem a própria passagem nem sua colocação nesse contexto. Pedro não diz que Cristo pregou aos
espíritos em geral, mas só aos que “noutro tempo foram desobedientes [...] enquanto se
preparava a arca”. Tal público limitado – os que desobedeceram durante a construção da arca –
seria um grupo estranho pelo qual Cristo teria descido ao inferno para pregar. Se Cristo proclamou
se triunfo, por que só a esses pecadores e não a todos? E se ele ofereceu uma segunda
oportunidade de salvação, porque só a esses pecadores e nãao a todos? Ainda mais difícil para
essa concepção é o fato de as Escrituras em outras partes indicarem que não há oportunidade de
arrependimento após a morte (Lc 16:26; He 10:26 e 27). Além disso, o texto de I Pe 3 torna
improvável uma pregação no inferno. Pedro está incentivando seus leitores a testemunhar com
ousadia a incrédulos hostis à sua volta. Ele só lhes diz que devem estar “sempre preparados para
responder a qualquer que lhes pedir a razão da esperança” que há neles (I Pe 3:15 NVI). Esse
tema evangelístico perderia sua urgência se Pedro estivesse ensinando uma segunda
oportunidade de salvação após a morte. E não caberia em absoluto uma “pregação” de
condenação (...) Os que defendem essa idéia de “pregação aos anjos decaídos” precisam
pressupor que os leitores de Pedro “leriam nas entrelinhas” para concluir tudo isso (pontos 2-5) a
partir da simples declaração de que Cristo “pregou aos espíritos em prisão, os quais noutro tempo,
foram desobedientes” (I Pe 3:19 e 20). Mas não parece muito complexo dizer que Pedro sabia que
seus leitores leriam tudo isso nas entrelinhas? Além disso, Pedro destaca pessoas hostis, não
demônios, no contexto (Pe 3:14 e 16). E onde os leitores de Pedro encontrariam a idéia de que os
anjos pecaram “enquanto se preparava a arca”? Não há nada disso na história de Gênesis a
respeito da construção da arca. E (apesar do que reclamam alguns), se examinarmos todas as
tradições da interpretação judaica da história do dilúvio, não encontramos menção de anjos
pecando especificamente “enquanto se preparava a arca”.

3
Grudem, Wayne, Teologia Sistemática, Edições Nova Vida, Primeira Edição, São Paulo, 1999, p 489.
Assim, a idéia de que Pedro está falando de Cristo proclamando julgamento a anjos decaídos
também não é de fato convincente (...) A explicação mais satisfatória de I Pe 3:19 e 20 parece
aquela proposta (mas não de fato defendido) por Agostinho: a passagem refere-se não a algo que
Cristo fez entre sua morte e ressurreição, mas ao que fez “no âmbito espiritual da existência” (ou
“pelo espírito”) nos dias de Noé. Quando Noé estava construindo a arca, Cristo “em espírito”
estava pregando por meio de Noé aos incrédulos hostis em torno dele. Essa concepção ganha
apoio de duas outras declarações de Pedro. Em I Pe 1:11, ele diz que o “Espírito de Cristo” estava
falando nos profetas do Antigo Testamento. Isso dá a entender que era fácil Pedro pensar que o
“espírito de Cristo” também estava falando através de Noé. Depois, em II Pe 2:5, ele chama Noé
“pregoeiro da justiça. Empregando o substantivo (Keryx) que vem da mesma raiz do verbo pregar
(ekeryxen) em I Pe 3:19. Assim, parece provável que quando Cristo “pregou aos espíritos em
prisão” ele o fez por intermédio de Noé nos dias anteriores ao dilúvio”.4

Pr. Edilson Dias

4
Grudem, Wayne, Teologia Sistemática, Edições Vida Nova, Primeira Edição, São Paulo, 1999,492-494.

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