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Resumo
O presente trabalho procura expressar as transformações produtivas e de consumo
ocorridas no estado de São Paulo em consonância com a logística, com os sistemas de movi-
mento e com os fluxos econômicos. A desconcentração produtiva e de consumo rumo ao interior
só foi possível, em ritmo acelerado, com a combinação hierarquizada de alguns elementos
básicos, como: 1) a logística enquanto estratégia, planejamento e gestão de transportes,
armazenamento e comunicações (inclusive na concessão de serviços públicos à iniciativa priva-
da); 2) o aprimoramento tecnológico dos sistemas de movimento (infra-estruturas e meios de
transportes) e; 3) os fluxos econômicos (bens, serviços, informações, capitais e pessoas) no
território. Dessa forma, partimos para uma análise dos impactos da “quinta revolução logística” e
as alternativas entre sistemas de movimento e fluidez territorial no atendimento das demandas
corporativas no território paulista.
Palavras-Chave: Logística. Sistemas de Movimento. Fluxos Econômicos.
Abstract
The logistics reestructure and its impacts on the systems of movement and the
economic flows on the space pertaining to the state of São Paulo
This work aims to express the production and consumption changes occurred in the
State of São Paulo in line with the logistics, the systems of movement and the economic flows.
The mentioned productive and consumption devolutions towards the interior just was possible in
the fast rhythm, with the hierarchical combination of some basic elements, such as: 1) the
logistics as strategy, planning and management (including in the concession of public services
to the private enterprise) of transports, storage and communications; 2) the technological
improvement of systems of movement (infrastructure and means of transportation) and 3) the
economic flows (goods, services, informations, capital gains and people) in the territory. Thus,
we go to an analysis of the impacts of the “fifth logistics revolution” and the alternatives
between systems of movement and territorial fluidity in the service of corporative demands in
the space pertaining to the State of São Paulo.
Key words: Logistics. Systems of Movement. Economic Flows.
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Professor Doutor do Curso de Graduação (campus de Ourinhos) e Pós-Graduação (campus de Presidente
Prudente) da Universidade Estadual Paulista (UNESP). Av. Vitalina Marcusso, n. 1500 – Ourinhos/SP – CEP:
19910-206 – E-mail: marcio@ourinhos.unesp.br.
INTRODUÇÃO
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Veremos aqui duas formas diferentes de circulação, ou seja, a circulação no sentido clássico marxista, isto é,
a do movimento circulatório do capital – especialmente na esfera da circulação já que o movimento circulató-
rio do capital também é composto pela esfera da produção – e a circulação no sentido clássico da Geografia
dos Transportes. A circulação do capital destaca o movimento permanente entre a “esfera da produção” e a
“esfera da troca”. A “esfera da troca”, também utilizada por nós, exprime uma simples circulação de mercado-
rias, ou seja, é apenas um momento da circulação do capital (é basicamente de nosso interesse que a
circulação do capital ou, especificamente, a circulação de mercadorias realize-se com a contribuição dos
sistemas de movimento e dos fluxos materiais e imateriais). Na esfera da troca, não há necessidade de
deslocamento espacial da mercadoria para ela circular. A circulação “stricto sensu”, utilizada no sentido clás-
sico da “Geografia dos Transportes”, diz respeito ao movimento e aos fluxos materiais. Já o termo correto
para os fluxos imateriais (informacionais) como transmissão de dados, ondas, ligações telefônicas e outros,
vem a ser “comunicações”.
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Destaca-se que, por conta dessa alta seletividade nesse espaço, há diversas regionalizações, como região
metropolitana, macrometrópole e cidade-região.
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condições para tal é o ferroviário. Apesar de reconhecermos que outros modais ajudarão,
todavia, a multimodalidade, como proposta válida, terá o predomínio das rodovias e das
ferrovias, seguidas mais de longe pelos modais aeroviário, dutoviário, hidroviário e maríti-
mo de cabotagem. As conexões se darão nos principais nós dessas redes interconectadas,
como estações de armazenamento de mercadorias, portos secos e/ou EADIs (Estações
Aduaneiras de Interior), Centros Logísticos Integrados, portos fluviais e marítimos assim
como aeroportos.
O modelo instalado é territorialmente percebido, ou seja, as demandas corporativas,
em pleno momento de “neoliberalismo”, de “globalização econômica” e do “regime de acu-
mulação flexível”, estão modificando os fixos com intenção de facilitar os fluxos econômi-
cos e de ordenar o território para seus interesses. Isso não seria problema se não hou-
vesse ganhos e perdas regionais a ponto de dinamizar e de solidificar as diferenciações
regionais no estado de São Paulo.
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Consideraremos, nesse trabalho, revoluções e evoluções logísticas como as intensas transformações – entre
revolução e evolução há diferença de intensidade – ocorridas nos sistemas de movimento e nas formas de
comunicações. Isso remete à evolução tecnológica dos meios e das vias de transportes e de comunicações e
ao aumento dos fluxos de pessoas, de bens e de serviços (impulsionando o comércio e as trocas culturais).
Todavia, para que tudo isso ocorra há necessidade de estratégia, de planejamento e de gestão logística.
Assim, consideramos que quando há saltos tecnológicos nos sistemas de movimento e de comunicações, há
nos fluxos econômicos e culturais, por conseguinte, estratégia, planejamento e gestão logística – mesmo que
esta última seja desarticulada, como observado nas civilizações mais antigas. Lembramos que a logística
stricto sensu não ocorreu continuamente no tempo e no espaço. Houve frações no tempo e no espaço onde os
sistemas de movimento e de comunicações transformaram a ordem vigente a ponto de impulsionar civiliza-
ções e modos de produções, ou seja, interferiram nas relações de produção e de trabalho.
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Estados Unidos (1826), Cuba (1837), México e Peru (1849), Chile (1850), Brasil (1854), Colômbia (1855) e
Argentina (1857).
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do, com a vinda das estradas de ferro e da navegação a vapor, foi repleto de tragédias e de
benefícios econômicos.
No Brasil, o contato com os sistemas de movimento (meios e vias de transportes)
mais modernos foi mediado pelas estradas de ferro e pela navegação a vapor. Ao mesmo
tempo, os portos e os sistemas de armazenagem e de estocagem se modernizaram,
especialmente o porto de Santos, para atender à demanda agro-exportadora de café.
Nem mesmo o arranque tecnológico e produtivo da última substituição de importações
(1873-1896), do século XIX, foi capaz de engendrar, com exceção do estaleiro Mauá, a
mais simples tecnologia para os sistemas de transportes. Equipamentos, peças de reposi-
ção e até mesmo dormentes eram importados. Espacialmente, as estradas de ferro inte-
graram muitos centros produtores a poucos centros exportadores de café. Nesse ínterim,
algumas cidades foram criadas ou refuncionalizadas, como ocorreu em cidades portuárias
e de moradia dos barões do café.
O Brasil, um país de dimensões continentais, era um emaranhado de ilhas econômi-
cas e populacionais. Ilhas essas isoladas e, em alguns casos, mais conectadas com a
Europa (era o caso de cidades como Belém, Manaus, Salvador, etc.). O relevo e, por
conseguinte, a disposição fluvial limitaram territorialmente a navegação interiorana. O
mais moderno, o navio a vapor, era mais comum na Região Norte – entre Manaus e Belém
(Bacia Amazônica) e, a partir daí, desenvolveu-se o transporte marítimo de longo percur-
so. A navegação interiorana, a de cabotagem e o transporte ferroviário eram intercalados
com formas mais primitivas, como as caravanas de muares (caminhos das tropas), as
rodovias para carruagens, carroças e carros de boi assim como o arraste e a locomoção a
pé por trilhas ou pelo litoral.
Os fatos supracitados não se repetiram por toda a América. Os Estados Unidos,
juntamente com a Alemanha, através da Segunda Revolução Industrial, lideraram a quarta
revolução logística (final do século XIX). Destacou-se a utilização do petróleo, do motor a
combustão, da linha de montagem, do automóvel e das vias asfaltadas. No Brasil – perife-
ria do sistema capitalista – ocorreram conseqüências importantíssimas para os rumos
econômicos do país. Tratou-se, nesse período, da mudança da matriz dos transportes do
sistema ferroviário para o rodoviário. Novamente o país não participou da quarta revolução
logística como irradiador de tecnologias de transportes. Fato comprovado com a chegada
das montadoras automobilísticas estrangeiras, meio século depois, em 1957.
Todavia, o pacto político-econômico dominante (latifundiários e burguesia industri-
al), na busca por viabilizar seus interesses através do aumento da produção industrial,
criou infra-estruturas capazes de colocar o Brasil no rumo do crescimento econômico:
• construiu-se uma série de rodovias asfaltadas, em especial as BRs;
• instalou-se a capital da república (Brasília) no centro do país (altiplano goiano);
• surgiu o incentivo fiscal para as indústrias de autopeças, na sua maioria nacio-
nais;
• surgiram as montadoras automobilísticas estrangeiras;
• ocorreu a criação da Petrobrás e a instalação de refinarias de petróleo em pontos
estratégicos do território brasileiro;
• surgiu o incentivo ao transporte aéreo, com a criação de aeroportos de grande
porte (internacionais) e o surgimento de empresas aéreas, como a Transbrasil,
Varig e outras regionais;
• construíram-se portos e dutovias.
O Estado também incentivou o desenvolvimento regional através de uma série de
superintendências (SUDENE, SUDECO, SUDAM, SUDESUL e SUFRAMA), de pólos de de-
senvolvimento (Polonordeste, Polamazônia, Polocentro, Prodegram e Prodepan) e de ou-
tros incentivos governamentais seletivos espacialmente. A especialização produtiva do
território foi determinada pelo planejamento estatal. Todavia, já havia a influência corporativa
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Grandes empresas de capital local, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul iniciaram um processo de
deslocamento territorial da produção em direção ao interior de São Paulo, Minas Gerais, Centro-Oeste, Nor-
deste e Região Amazônica assim como iniciaram, também, um processo de deslocamento da gestão para a
capital paulista, como a Sadia e a Perdigão.
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Corresponde ao valor em Reais que passa por cada trecho rodoviário (Reais em valores correntes do ano de
2002) multiplicado pelo respectivo tamanho do trecho em quilômetros, ou seja, é a análise agregada de vários
trechos (ICHIHARA, 2007).
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São Paulo, Campinas e Sorocaba, em 2002, segundo Ichihara (2007), foram res-
ponsáveis por 57% do total da demanda por transportes em valores monetários. O mapa
abaixo apresenta a intensidade dos fluxos econômicos por trecho rodoviário no estado de
São Paulo, em 2002. Os principais fluxos estão nas rodovias pedagiadas.
A Região Administrativa de Campinas concentrou 25% dos fluxos econômicos do
estado. Sua conexão com a RMSP se faz por duas importantes rodovias: a Anhanguera e
a Bandeirantes. A Anhanguera é a rodovia paulista que apresenta, depois do Complexo
Anchieta-Imigrantes, o maior fluxo econômico e faz a conexão da RMSP e da RA de
Campinas com a RA de Ribeirão Preto e também faz a conexão de Franca com o Triângulo
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Lembramos que São Paulo estabelece importantes fluxos econômicos com outros estados. Destacam-se as
conexões entre as capitais e alguns centros de produção, especialmente na Região Concentrada.
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Já falamos que retirando as cargas de minério, transportadas pelas ferrovias, estas não transportarão mais
que 8% das cargas gerais no país.
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rar o Brasil como um todo e também sua relação com o exterior. Todavia, colocar o estado
e a metrópole de São Paulo como o centro radiador do desenvolvimento brasileiro nada
mais é que exagero. Outros espaços, como a Região Sul do Brasil, Minas Gerais e Rio de
Janeiro são dinâmicos a ponto de possuírem uma apreciável dinâmica interna (capitais
locais), desconcentrarem suas atividades para outros espaços do território brasileiro, como
o Sudeste, o Centro-Oeste, o Nordeste e a Região Norte e serem líderes de destacáveis
setores da economia nacional.
O estado de São Paulo é responsável pela geração de 34% do PIB nacional, ou seja,
nele há uma grande concentração espacial das atividades econômicas do território brasilei-
ro e o mesmo ocorre com o próprio estado de São Paulo, já que sua concentração está
sediada na macrometrópole e nos eixos Anhanguera e Presidente Dutra. Há, portanto,
uma concentração das atividades econômicas que representa 58% do PIB na região me-
tropolitana e 73% na macrometrópole. Já o restante do estado produz apenas 27% do
PIB do estado de São Paulo e se concentra em algumas cidades médias do interior paulista,
como São José do Rio Preto, Ribeirão Preto, Bauru, Marília, Sorocaba, Araçatuba e Presi-
dente Prudente.
Ao mesmo tempo, o tamanho do território da macrometrópole e da RMSP repre-
senta uma porcentagem ínfima do território brasileiro e paulista, ou seja, em áreas relati-
vamente pequenas ocorre a maior parte das atividades econômicas e o adensamento
populacional do estado de São Paulo e do Brasil. Os sistemas de engenharia não suportam
o peso dessa demanda e, assim, observamos problemas que se tornaram crônicos, como
os seguintes: mobilidades (pessoas, mercadorias e informações), ambientais, sociais (vio-
lência urbana, habitação, saneamento e custo de vida) e logística urbana e interurbana.
A região metropolitana e a macrometrópole são importantíssimas no que diz res-
peito às infra-estruturas em transportes e aos fluxos de mercadorias, pessoas e informa-
ções. O transporte – sendo uma atividade de serviços – é uma demanda gerada pela
economia e, assim, auxilia as atividades econômicas. A circulação do capital (tanto na
produção quanto nas trocas) não se realiza sem os sistemas de transportes e comunica-
ções. Todavia, isso não torna a logística e a circulação “stricto sensu” geradoras de capital,
de mais-valia e, assim, partes integrantes da produção. A logística e a circulação são
predominantes na esfera da circulação.
Como há intensa densidade no território metropolitano e na macrometrópole, exis-
te demanda de transporte e de circulação. Portanto, onde há mais atividades econômicas,
existe mais demanda de infra-estruturas em transportes, de fluxos e de fluidez. Todavia,
há falta de sistemas de movimento adequados e, portanto, há viscosidade no território a
ponto de interferir numa logística eficiente e de afetar, inclusive, o PIB regional e gerar
desconcentrações produtivas e imobiliárias. As infra-estruturas e os fluxos de transportes
são concentrados porque a atividade econômica é concentrada e a concretização de plane-
jamentos logísticos é lenta. Por isso, a região metropolitana e a macrometrópole agregam
grandes problemas de transportes.
Podemos também afirmar que havendo a manutenção do atual PIB, a matriz de
transporte nacional logo entrará em colapso. Observa-se que conforme diminuímos a
escala geográfica em direção à cidade de São Paulo e ao seu entorno, principal centro
nevrálgico do território brasileiro, os problemas de fluidez e de infra-estruturas em trans-
portes se agravam.
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REFERÊNCIAS