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unitizadas/

Sistemas de fachadas: Dez anos de fachadas unitizadas

Em cerca de dez anos, desde a primeira obra executada com uma linha totalmente
fabricada no brasil, o sistema unitizado conquistou a maioria das grandes obras e
mudou radicalmente o modo de construção de fachadas, trazendo velocidade de
instalação, excelente desempenho e mais segurança para os trabalhadores

Ao ser inaugurado, em 2002, o edifício-sede do BankBoston, em São Paulo, tornou-se o


primeiro edifício brasileiro a ter uma fachada-cortina construída com o sistema unitizado.
Projeto da Kawneer, empresa norte-americana subsidiária da Alcoa, essa fachada unitizada
marcou o início de uma nova era para a indústria da construção civil. Logo depois, a Área de
Desenvolvimento da Alcoa Brasil, encabeçada pelo hoje consultor Antônio B. Cardoso, da
AC&D, trouxe parte desse conhecimento técnico para o Brasil, sendo o ponto de partida para a
realização de obras com fachadas unitizadas totalmente produzidas no país e a abertura de
caminho para que outras empresas estrangeiras do setor aportassem no mercado brasileiro.

Desde então, o sistema unitizado está presente na maioria dos edifícios comerciais e
administrativos construídos no país, devidamente atualizado e em várias versões. E não é para
menos. As mudanças que ele promoveu começam no modo de produção da fachada, passando
pela velocidade de instalação na obra, qualidade e desempenho do sistema e segurança dos
profissionais que trabalham na execução. “Sem dúvida, foi a maior conquista do setor nos
últimos dez anos”, observa Cardoso.
Antes que o unitizado chegasse ao Brasil, a construção de uma fachada-cortina era feita com o
sistema stick. A montagem da caixilharia, executada parcialmente na obra, seguia uma
sequência em que primeiro vinham as colunas e depois as travessas. E só depois dessa etapa os
vidros eram colados nas devidas folhas. Toda essa operação se realizava pela área externa do
edifício, com o uso de balancins, exigindo rigor nas medições prévias, acertos de prumadas e
cuidado redobrado com a segurança dos trabalhadores.

O sistema unitizado inverteu a ordem. No lugar de colunas e travessas instaladas


sequencialmente, o processo industrial passou a gerar módulos completos, já reunindo perfis,
vidros colados, gaxetas de vedação e demais componentes. Levados para a obra prontos para
serem instalados, esses módulos passaram a garantir mais segurança aos trabalhadores. O
balancim tornou-se desnecessário. A instalação passou a ser feita pelo lado interno, no apoio da
laje, sendo cada módulo içado e colocado por encaixe, em fileiras, começando de baixo para
cima.

“Isso resultou em controle total do desempenho, pois o módulo é produzido e acompanhado no


processo”, afirma o consultor. “Já o stick tem controle final menos apropriado, por falta de
adequação do sistema em si”, explica Cardoso, que acompanhou o desenvolvimento da linha
Unit, da Alcoa, nas instalações da Kawneer, em Atlanta, nos Estados Unidos, há pouco mais de
dez anos.
Antes de ser aplicada nas fachadas do edifício do BankBoston, projetado pelos escritórios
Skidmore, Owings & Merrill e Escritório Técnico Júlio Neves, (leia o quadro abaixo), a linha
Unit já havia sido utilizada na fachada entre vãos do edifício Berrini 500, projeto de Ruy
Ohtake, também em São Paulo. Em seguida vieram as fachadas-cortina executadas pela Prando
Pavanello no Centro Empresarial Rio Negro, projeto de Ricardo Julião em Alphaville, SP.
Quase na mesma época os módulos unitizados foram instalados nas fachadas do edifício
Yerchanik Kissajikian, de Kogan & Villar, consultoria de Mario Newton Leme e execução da
Algrad, também em São Paulo.

Dois anos após a obra do BankBoston, uma das maiores empresas europeias do setor, a alemã
Schüco, colocava seu projeto de sistema unitizado pela primeira vez em uma obra no Brasil – a
Torre Almirante, no Rio de Janeiro, projeto arquitetônico dos escritórios Pontual Arquitetos e
Robert Stern Associados. Inaugurada no final de 2004, a obra teve consultoria de Mario Newton
Leme e Igor Alvim, sendo a Algrad responsável pela fabricação e montagem das fachadas.

Depois vieram outros projetos da Schüco, com fachadas cada vez mais complexas, como a do
edifício Eco Berrini, em São Paulo, projeto do escritório Aflalo & Gasperini. “O Eco Berrini
tinha dois blocos, ora unidos, ora separados, e vazios internos. Os módulos eram grandes e
havia sistemas de abertura sofisticados”, recorda o arquiteto e consultor Paulo Duarte, do
escritório Paulo Duarte Consultores, responsável pela consultoria de vidros e fachadas,
executadas pela Artalum, com a participação de Crescêncio Petrucci nas etapas de fiscalização e
aprovação de projetos.

Obras ainda em implantação, que terão sistemas unitizados da Schüco, exibem fachadas com
geometrias cada vez mais sofisticadas, como é o caso dos edifícios Vitra, EZTowers e Faria
Lima 3500, empreendimento da Tishman Speyer, projetado pela KOM Arquitetura. Com planos
inclinados, recortes assimétricos e grandes vãos livres, o Faria Lima 3500 teve suas fachadas
produzidas pela Artalum, e contou com consultoria de dois escritórios: o norte-americano Israel
Berger & Associates (arquiteto Walter Martinez) e o brasileiro Paulo Duarte Consultores.

NOVOS MERCADOS
Fora do eixo Rio-São Paulo, a região Nordeste registrou grande arrancada de obras com
fachadas unitizadas a partir de 2006, quando a Pórtico Esquadrias executou as fachadas da
Faculdade Universo e do Empresarial Isaac Newton, em Recife. Hoje, a Pórtico contabiliza
cerca de 50 obras com o unitizado, entre residenciais, empresariais e hotéis.

Uma delas, a do Hotel Sheraton em Recife, ainda em execução, trouxe desafios. “São grandes
módulos com brises integrados aos painéis e marcações externas dos módulos, conforme projeto
do arquiteto argentino Daniel Piana”, explica Leonardo Maranhão, diretor da Pórtico. “Além
dessas questões técnicas, o curto espaço de tempo destinado à execução, em função dos
compromissos assumidos para a Copa do Mundo, torna o projeto muito especial”, diz ele.

Instalada em Recife, a Pórtico Esquadrias foi pioneira em levar as fachadas unitizadas para as
principais capitais nordestinas, em obras como o Empresarial Premier Tower, em Salvador; o
Hotel Radisson, em Maceió; o Empresarial JFC Trade Center, em Aracaju; o edifício Solar
Mares de Ponta Negra, em Natal; o Empresarial Office Tower, em São Luís; e as sedes do INSS
de João Pessoa e Fortaleza. “Praticamente não utilizamos mais o sistema stick na concepção de
nossos projetos de fachadas de maior porte”, afirma Maranhão. “Geralmente empregamos o
sistema em locais de difícil logística de içamento e manuseio dos módulos unitizados, ou em
fachadas pequenas, soltas no térreo ou cobertura dos prédios.”

DESEMPENHO
“O sistema unitizado é um processo industrializado e, portanto, permite a produção de qualidade
em larga escala, ampliando a capacidade produtiva e a resposta às demandas do mercado”,
afirma Michael H. Eidinger, gerente geral da Schüco do Brasil. “Bem planejado, supera a
velocidade de execução da estrutura portante dos edifícios e a tecnologia pode ser adequada sem
limites a qualquer exigência de normas técnicas, nacionais e internacionais.”, observa ele.

Para o consultor Paulo Duarte, a instalação dos módulos unitizados é mais rápida,
principalmente porque a produção dos painéis pode ser iniciada mais cedo e, a partir de
determinado pavimento de laje já concretado, é possível começar a montagem das fachadas,
acompanhando a construção da estrutura. A solução é também mais econômica, segundo ele,
devido aos ganhos decorrentes da fabricação e montagem dos painéis unitizados em fábrica, à
não utilização de andaimes e bandejas, além da economia de mão de obra.

Outra questão destacada pelo consultor “é que o sistema industrializado permite, e é de interesse
que assim seja feito, atender às normas técnicas com todo o controle, já que parte do trabalho é
realizada na própria fábrica”.

“Sabemos que a velocidade na entrega da obra é fundamental, pois conseguindo concluir a


fachada com antecedência teremos uma economia significativa”, afirma Cardoso. “É possível,
por exemplo, ser feita a quarta laje e já colocar as esquadrias na segunda, e assim
sucessivamente. Além disso, temos hoje a ancoragem telescópica, que passa a suportar com
mais propriedade as diferenças de prumo. Logo, se juntarmos essa colaboração na linha
unitizada, estaremos mais tranquilos em citar a vantagem do tempo.”

INTEGRAÇÃO DE EQUIPES
Com tanta sofisticação tecnológica, o sistema unitizado também promoveu mudanças na relação
de trabalho entre arquitetos, consultores de fachadas e vidros, fabricantes e construtoras. “Há
alguns anos, em uma entrevista para a FINESTRA, eu dizia que o sonho para os arquitetos era
possível. Na época era possível, mas muito trabalhoso. Hoje, com o sistema unitizado, é muito
mais fácil executar e garantir o desenvolvimento de trabalhos com maior arrojo”, afirma o
consultor Igor Alvim, da QMD Consultoria, do Rio de Janeiro.

“Estamos atingindo níveis internacionais, pois o que se faz hoje no Brasil não fica nada a dever
aos países mais adiantados”, diz Alvim. Sua empresa é responsável pela consultoria de fachadas
unitizadas em obras como as dos edifícios da Petrobrás em Santos (SP) e Vitória, e o Ventura
Towers, no Rio de Janeiro, projetado pelo escritório norte-americano Kohn Pedersen Fox e o
paulistano Aflalo & Gasperini. Nesta obra, a consultoria de fachadas foi feita pela QMD, a
AC&D, de São Paulo, e a IBA, de Nova York.

Alvim observa que as fachadas unitizadas também acabaram promovendo algumas empresas
como executoras especializadas nesse tipo de obra. “Esse trabalho exige a utilização de
softwares sofisticados de análise estrutural do alumínio e vidro. É muita pesquisa e
desenvolvimento; deixou de ser um feijão com arroz e, portanto, todos têm que se adequar e se
informatizar.”

Assim, empresas que se equiparam, como a Tecnofeal e a Artalum, em São Paulo, a Central do
Alumínio, o Grupo Paris e a Pró Alumínio, no Rio de Janeiro, entre outras, saíram na frente. Em
São Paulo, três grandes do setor – Itefal, Algrad e Luxalum – se reuniram e criaram o consórcio
Italux, responsável pelas maiores obras realizadas nos últimos anos, como o Centro
Administrativo de Minas Gerais e, recentemente, a ampliação do aeroporto de Cumbica.

Ao abraçar a sofisticação tecnológica, a fachada unitizada exige mudanças dos profissionais. “O


arquiteto deve se adaptar à solução em que a fachada é projetada, fabricada e instalada em
painéis que devem incluir o máximo possível de elementos, ou seja, vidros, pedras naturais,
painéis cerâmicos ou metálicos, elementos de marcação e até brises”, diz Paulo Duarte. “Já o
consultor deve conhecer muito bem o sistema para melhor projetar ou orientar, utilizando todas
as vantagens possíveis.”
Duarte acrescenta que os fabricantes de esquadrias devem também ter experiência no sistema
unitizado, para fabricar os painéis corretamente. E são necessários equipamentos adequados
para as usinagens de perfis, geralmente maiores e mais sofisticados em desenho, uso de gaxetas
especiais e aplicação correta dos selamentos.

A montagem não é menos importante, pois exige perfeito alinhamento, prumo, garantia das
ancoragens e aferição das condições da estrutura, entre outras ações. E como o sistema muda
todo o modo de realização das fachadas, as construtoras também devem estar familiarizadas
com o unitizado, que exige maior velocidade da execução da estrutura, maior precisão de
medidas, prumos e níveis, para extrair do sistema todas as suas vantagens, inclusive de
qualidade.

“Essa nova tecnologia envolve diretamente projetistas, pessoal da construtora, a parte comercial
e fabricantes, exigindo um movimento de aprendizado, sob o ponto de vista de cultura,
educação, treinamento, muitas apresentações e muitos testes”, diz Cardoso. Isso tudo sem contar
com a disposição de fazer e entender o novo, investir em equipamentos, continuidade de
pesquisa, com experiência que vai se acumulando para a realização das obras.

“Só para ter uma ideia do que ocorreu ao longo dessa caminhada, hoje existem centenas de
ferramentais de extrusão desenvolvidos para contribuir com as particularidades de cada obra”,
comenta Cardoso. “Isso seja no sentido da arquitetura, da condição de esforços, de otimização,
para facilitar uma operação, ou para todas essas etapas juntas, mas sempre buscando o melhor
desempenho”, conclui.

A ESPECIFICAÇÃO DO VIDRO E O CLIMA DE SÃO PAULO


Conhecido por ser o primeiro prédio construído no país com fachada-cortina em módulos
unitizados, a sede do BankBoston, em São Paulo, é também o primeiro exemplo de edifício
corporativo brasileiro com arquitetura mais no estilo norte-americano. De autoria de Skidmore,
Owings & Merrill (SOM), uma dos maiores companhias de projetos dos Estados Unidos, e do
escritório brasileiro Júlio Neves, o prédio tem arquitetura de indiscutível qualidade, fachadas
marcantes e primoroso paisagismo de Isabel Duprat, ocupando 12 mil metros quadrados de área.
Mas, apesar de todos esses predicados, também passou a ser lembrado como exemplo de
especificação equivocada de vidros para fachadas.

O arquiteto Paulo Duarte conta que foi o consultor brasileiro para esquadrias, trabalhando em
parceria com o norte-americano Peter Miller. “Fizemos o projeto básico, conceitual, nos
escritórios de Peter Miller em Houston, Texas. Depois eu trouxe esse projeto para o Brasil,
montando o memorial descritivo e as especificações para a concorrência de contratação do
fabricante de esquadrias, que foi a Algrad ”, recorda Duarte.

Pelo lado brasileiro, a consultoria de vidros também foi de Duarte, inicialmente. Entretanto, os
estudos dos vidros foram também feitos por profissionais indicados pelo escritório de
arquitetura norte-americano e tiveram preferência no projeto. “Desde o início discordei da
especificação, pois eles não conseguiam entender o que era o clima de São Paulo, uma cidade
que fica exatamente sobre o Trópico de Capricórnio”, conta Paulo Duarte. Os dados energéticos,
segundo ele, consideravam condições climáticas de, no máximo, um clima temperado e não
atenderiam, como de fato não atenderam, às condições da região.

Sem conseguir convencê-los, Duarte declinou de continuar no projeto na parte referente aos
vidros e produziu um documento prevendo o que de fato aconteceu: excessivamente
transparente à luz, o vidro gera desconforto aos ocupantes do edifício, devido ao ofuscamento.
Além disso, os fatores inadequados ao clima geraram ineficiência energética. O caso do
BankBoston chegou a ser citado em evento de eficiência energética e conforto ambiental para
arquitetos, em Londres, sob o tema Exemplo de Especificação Errada de Vidros para um Projeto
nos Trópicos.

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