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São Paulo

2022
Astros e Arquétipos

Um diálogo criativo da astrologia com a psicologia junguiana.

de Tereza Kawall
 
Editor

Eldes Saullo
Revisão

Cheila Vargas  

Produção Gráfica e Editorial

Casa do Escritor

 
 
 

 
 
 
Copyright © Tereza Kawall 2022. Reservados todos os direitos. Nenhuma parte
desta obra poderá ser reproduzida por fotocópia, microfilme, processo
fotomecânico ou eletrônico sem permissão expressa da autora.
 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

À Nina, ao Marco, ao Leonardo e ao Enrico, as estrelas


que moram no céu do meu coração.

AGRADECIMENTOS
Pela confiança, encorajamento e cumplicidade, agradeço a Roberto
Gambini, Luiz Seabra e Luís Pellegrini.
Pela amizade eterna, agradeço a Marylou Simonsen e Liane
Leipnitz.
Pelo amor às estrelas, agradeço a Willy Wirtz, Antonio Carlos Bola
Harres, Divani Terçarolli, Ciça Bueno, Douglas Marnei, Constantino
Riemma, Maria Theresa Sandoval, Cleide Guedes, e Valdenir
Benedetti (in memoriam).
Pelo incentivo e amizade agradeço a Tito Cavalcanti, Sonia
Mendonça, Aspasia Papazanakis, Daniel Silva, Solange Rosset,
Sandra Amaro, Malu Benevides, Neusa Sauaia, Katia Bueno, Vera
Lessa, Amnéris Maroni, Marcia Ferreira, Fernando Fernandes, Lilian
Gouvea, Arnaldo Bassoli, José Jorge de Morais Zacharias e
Américo Sommerman.
 

 
Sumário

Prefácio
Introdução
Capítulo I
Origens da Psicologia Analítica
Jung, seu trabalho com psicóticos  e a origem do termo
complexo.
Testes de Palavras: Como eram feitos?
Nise da Silveira e a chegada  da Psicologia Analítica no Brasil
Breve histórico da vida de Jung
História da Astrologia no Ocidente
Reflexão
Breve histórico da  Astrologia no Brasil
Capítulo II
Inconsciente Coletivo e Arquétipos
Duas facetas do Arquétipo:  instinto e imagem
A Astrologia é arquetípica
Zodíaco, a Anima Mundi
A simbologia dos doze signos zodiacais
Conclusão do Capítulo
Capítulo III
Os Quatro Tipos Psicológicos
Os Tipos Psicológicos como  funções da consciência
Função superior ou dominante e função inferior
Os quatro elementos na Astrologia
Fogo, Ar, Água, terra
Conclusão do Capítulo
Capítulo IV
Complexos, Multiplicidade das Imagens da Alma
O que é um complexo
Subpersonalidades:  o que são
Diferentes Tipos de Personalidades
Conclusão do Capítulo
Dicas para mapear subpersonalidades  ou complexos na carta
natal
Sugestões para nomear possíveis  complexos no trabalho
psicoterápico
Capítulo V
Sombra
Mecanismos de defesa do Ego
Trabalhando com a Sombra
Dimensão arquetípica da Sombra
Saturno e Plutão na Astrologia
Mito de Saturno / Cronos
O Mito de Plutão e Perséfone
Simbolismo astrológico de Saturno
Trânsitos de Saturno
Simbolismo Astrológico de Plutão
Trânsitos de Plutão
Conclusão do Capítulo
Capítulo VI
Individuação
Atitude simbólica e função transcendente
Símbolos Solares
Mitologia e a Jornada do Herói Solar
O Mito de Apolo
O Sol e o Tarot
O Sol na Alquimia
Conclusão do Capítulo
Resumo das operações alquímicas mais relevantes
Capítulo VII
Sincronicidade,  o Tempo Qualitativo
Definição e criação do conceito
Pesquisa astrológica de Jung
Sincronicidade e a Física Atômica
A Sincronicidade e o Zeitgeist
Trânsitos e progressões astrológicas
Ciclos planetários de desenvolvimento
Astrologia humanista ou psicológica
Conclusão do Capítulo
Capítulo VIII
A Mandala,  os Símbolos do Self
Estruturas Quaternárias
Self, símbolo de totalidade
As Doze Casas Zodiacais
Doze setores da evolução humana
Conclusão do Capítulo
Considerações Finais
Bibliografia
Prefácio

Esta obra não se insere no conjunto de textos imaginativos


aleatoriamente, ou naqueles que somente se aprofundam em
pesquisas de evidências empíricas ou documentais. O presente
trabalho é como um testamento, no qual os bens da atividade
laboral de anos a fio são apresentados. Em cada capítulo, cada
conceito e cada amplificação está presente a autora e sua vivência
pessoal. Nada aqui é tratado somente de maneira intelectual, mas
tem suas raízes na experiência de anos de trabalho, busca,
pesquisa, aprendizagem e encontros com a própria Alma da autora.
Como no sonho impactante do transferidor a autora vê meio
círculo. Podemos pensar no período diurno de uma jornada; no
entanto não se completará sem o período noturno, o outro lado
complementar. Neste caso me invade a ideia da aproximação,
conversação e integração do conhecimento milenar da astrologia. O
primeiro semicírculo, com os pressupostos da ciência psicológica
contemporânea, o segundo, formando um círculo completo, uma
jornada pela noite e dia da existência humana e sua eterna busca
de conhecimento.
Alguns estudiosos afirmam que as religiões surgiram quando,
após a aquisição da consciência autorreflexiva, a humanidade olhou
para o céu estrelado e indagou: quem terá criado tudo isto? No
entanto acredito que não foi este o caminho, imagino que a visão do
céu causou um maravilhamento, um êxtase, uma profunda
admiração! A base do sentimento religioso foi emocional, a mesma
que ainda hoje sentimos ao ver estrelas, a lua, o pôr ou nascer do
sol.
A partir deste momento, a observação do movimento dos
astros se desenvolveu, observou-se uma faixa celeste de
deslocamento do que seria nomeado como planetas e esta faixa fixa
seria identificada como constelações, o cinturão do zodíaco. A
conexão profunda entre estes fenômenos astrais e a profundeza
inconsciente já estava reconhecida desde os primeiros momentos
de maravilhamento e a observação sistemática do movimento
celeste e humano se estabeleceram desde a antiguidade, chamada
de Astrologia.
Desde a antiga Mesopotâmia os símbolos e elementos da
Astrologia têm fundado aspectos de diversas religiões e saberes ao
longo do tempo. Como exemplo podemos elencar os doze signos
zodiacais e os sete planetas visíveis a olho nu. Estes números
simbólicos estão presentes em várias referências, como os meses
do ano, as tribos de Judá, os apóstolos de Jesus, o candelabro de
sete braços, os dias da semana, a narrativa da criação segundo
Gênesis dentre outras referências. Pensando em termos de
composição teremos a interação de dois outros números simbólicos,
o três e o quatro que, somados geram o sete e multiplicados o doze.
Esta simbologia estará presente também na alquimia, na kabalah,
no tarô e muitos mais sistemas mágico-religiosos.
Todas estas derivações e ampliações que surgiram do pensar
sobre a impressão primeva tornaram-se representantes do
movimento do espírito humano, de suas variações, de suas
transformações e desenvolvimento.
As relações entre a posição celeste, que é sempre dinâmica, no
dia do nascimento de uma pessoa imprimem como uma foto de seu
momento de chegada ao mundo, apontam o caminho a percorrer,
obstáculos e facilidades ao longo deste caminho e possíveis pontos
de chegada se cumprida bem a caminhada. Na tradição de matriz
africana se entende que quando uma alma vai nascer no mundo, ela
se dirige até a casa de Oxalá e escolhe um Ori, significando a
escolha de sua cabeça. Neste Ori estão características pessoais,
bem como o Odu, que significa o caminho, o destino daquela alma.
A partir do nascimento características fundamentais e caminhos
para o desenvolvimento dos potenciais estão indicados. Embora
pareçam um tanto míticas estas concepções, a genética, que é
ciência empírica e experimental, já demonstrou que podemos trazer
características predeterminadas geneticamente que poderão se
expressar ou não; por exemplo, determinadas patologias. Parece
que a possibilidade de um destino estrutural amplo não é só um
conceito dos povos primitivos, mas uma realidade científica.
A busca em conhecer o mundo em que vivemos, e entendermos
suas conexões com corpo e alma sempre moveram a humanidade,
desde as práticas mágico-religiosas, passando pela ciência empírica
reducionista até novos modelos mais amplos da atualidade como a
fenomenologia e a física quântica.
No campo da psicologia Carl Jung foi o principal proponente
de uma ciência da mente que não alienasse o conhecimento
ancestral, mas descobrisse pontes entre esses saberes, uma vez
que entendia ser a astrologia a psicologia de uma época. Ele
pesquisou arduamente o conjunto de símbolos expressos na
alquimia medieval, na kabalah, no I Ching, nas religiões ocidentais e
orientais; bem como na própria astrologia. Ele percebeu que
imagens e símbolos presentes nestas antigas tradições de
conhecimento continuavam vívidas e ativas em sonhos,
alucinações, imaginação ativa e produções artísticas de pessoas da
contemporaneidade, muito distantes daquelas práticas míticas.
Seriam estes saberes recordações, ou expressões do mesmo
fenômeno psíquico que ocorriam com as populações tribais e que
ainda ocorrem com pessoas na pós-modernidade?
Este campo de especulação e pesquisa levou Jung ao conceito
de inconsciente coletivo e de arquétipos que se expressam por
imagens e símbolos tão antigos quanto a própria psique. Ele
identificou que o mesmo fenômeno humano e psíquico vem
ocorrendo desde os primeiros agrupamentos e que as formas de
compreender este fenômeno também foram elaboradas ao longo
dos séculos. Aí está a conexão da abordagem fenomenológica de
Jung com as tradições antigas mágicas e religiosas. A psicologia
complexa ou analítica de Jung resgata e revisa os saberes
ancestrais em uma roupagem científica para compreensão do
fenômeno psíquico, para além dos processos de consciência e
mesmo para além dos processos do inconsciente pessoal.
Como afirma Hillman, um dos grandes expoentes da psicologia
analítica em nosso tempo, a Astrologia devolve ao Cosmos e aos
deuses a atuação presente nos eventos. Esta percepção evidencia
um Unus Mundus, um contínuo sempre presente de todas as coisas.
Na concepção dos gnósticos, tudo são emanações do
Incognoscível, e todas as coisas emanam e se desdobram. Assim o
universo parece uma grande teia, onde cada fio está ligado ao outro
por um nó de intersecção, como rizomas que abaixo da superfície
conectam todas as plantas em volta. Curiosamente a existência da
atual rede universal de computadores, o conceito de nuvem e o
aparelho de telefone celular na mão de cada pessoa representam
este mundo de rizomas, interconectados.
Deste ponto de vista céu e humanos, natureza e clima, pessoas,
animais, plantas, ventos e planetas estão todos conectados por fios
invisíveis, sutis e diáfanos, para cujas conexões e responsabilidades
conscientes estamos apenas despertando. Boa leitura!
 
Prof. Dr. José Jorge de Morais Zacharias

Analista junguiano pela AJB e IAAP


Introdução

Morei no Rio de Janeiro desde o início do ano de 1976 até o final


de 1980. Lá, tive o meu primeiro e definitivo contato com a
Astrologia através de Antonio Carlos Harres, que já tinha um
considerável conhecimento desta arte e estava precisando de uma
pessoa que pudesse calcular os mapas astrológicos de seus
clientes. Participava de um grupo de estudos em que Harres, mais
conhecido como Bola, sempre de forma generosa, séria e criativa
nos passava o seu saber astrológico. Tive, assim, o privilégio de
receber os meus primeiros ensinamentos de forma oral.
É bom lembrar que nesta época não havia computadores,
softwares para cálculos astrológicos, nem Google ou Internet. Os
mapas natais eram feitos à mão, com inúmeras tabelas e contas
intermináveis. Munida de infinita curiosidade, de réguas e canetas
coloridas, fui aos poucos me familiarizando com a beleza dos
símbolos planetários e sua enorme abrangência. Nossas
ferramentas de estudo, até então, se limitavam a livros em outras
línguas, cópias em xerox, apostilas, grupos de estudo, e claro, os
nossos próprios mapas, com os quais íamos observando e
aprendendo a complexa arte de interpretar os símbolos zodiacais.
Com tempo e paciência consegui, aos poucos, pavimentar a bela
estrada que levou ao conhecimento deste saber ao qual devo tanto.
Para fundamentar o entendimento deste mágico universo simbólico,
estudávamos os mitos gregos, que fertilizavam nossa imaginação,
fazendo brotar e crescer a vontade de saber mais e mais.
Comecei a ler e me interessar pela psicologia junguiana em
meados dos anos 70, estimulada por amigos psicólogos, e a teoria
do mestre Carl Gustav Jung já me encantava. Nesta época seguia à
risca o manual da cultura hippie. Nosso apartamento no Rio, dividido
com amigos, era todo decorado num estilo franciscano e despojado:
acessórios e incensos indianos, almofadas jogadas, móveis baixos e
inúmeras samambaias penduradas por todos os cantos. Havia muita
música, agregados, fazia batik em tecido. Já não comia mais carne
vermelha, lia sobre oráculo chinês, o

I-Ching, apreciava Yoga e culturas do oriente.


Vivia, nesse momento, uma grande dúvida. Aspirava fazer
graduação em Psicologia, mas não tinha certeza se queria me
aventurar no mundo acadêmico e, além disso, naquela altura já me
via muito envolvida com a Astrologia. Tive então um sonho
revelador, decisivo: Jung estava à minha frente, e eu via o seu perfil
já idoso. Era um homem alto, vestia um terno escuro e estava
desenhando num chão batido de areia com a sua bengala. O
desenho feito por ele era um semicírculo com linhas que se abriam.
Ao acordar, logo percebi que o desenho era um transferidor,
instrumento usado para fazer o cálculo de ângulos numa escala
circular. No ofício astrológico, é fundamental saber calcular e
interpretar os ângulos ou graus de distância entre os planetas que
se situam em determinados pontos ou signos que estão em
evidência no mapa de nascimento.[i]
Como a luz do amanhecer, o sonho iluminou a minha mente.
Naquele instante ficou claro que a Astrologia era o caminho que eu
deveria abraçar. E o mestre Jung me ajudara nessa decisão: uma
revelação, que foi uma benção. Ali o conflito se resolveu e a
faculdade ficou para depois.
A partir de 1981, de volta a São Paulo, comecei meu trabalho
como astróloga com consultas individuais. Como havia poucos
astrólogos até então, a princípio este trabalho despertava grande
curiosidade e estranheza, mas logo isso foi mudando e um
renovado interesse por essa linguagem antiga e fascinante se
alastrava rapidamente. Boas escolas surgiram, ótimos seminários
foram organizados tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro.
Na década de1980 o mercado editorial já se mostrava bastante
ativo para a astrologia. Inúmeros livros foram traduzidos para o
português pela Editora Pensamento, boas revistas criadas pela
Editora Três, entre outros eventos e publicações. Consolidava-se,
assim, uma nova profissão para muitos. Um ofício um pouco
estranho ou excêntrico certamente, distante do mundo acadêmico e
com uma roupagem ainda desconhecida, curiosa, mas igualmente
fascinante. E lá estava eu.
 

Roberto Gambini – Foto: Paula Stéfani

Nos anos 90 eu tinha um novo mestre, agora da Psicologia


Analítica, Roberto Gambini. Como meu analista durante vários anos,
rápida e sabiamente me estimulou e orientou a fazer a postergada
graduação em psicologia. Segui meu trabalho com atendimentos em
astrologia, mas pude dedicar mais tempo para entender e vivenciar
a teoria e a clínica junguiana, o riquíssimo simbolismo dos sonhos e
o processo de individuação. Realizei meu antigo sonho e percebi,
com clareza e alegria, que ter mais experiência de vida foi essencial
para aproveitar melhor essa nova fase de estudos.
A dimensão e a profundidade da Astrologia e da Psicologia
Analítica são incontestáveis. Acredito que nesses dois campos de
conhecimento, que têm como objeto de interesse o ser humano e a
sua alma, de forma intrínseca, é imprescindível a vivência dos
processos internos, ou seja, você se torna o seu próprio balão de
ensaio, um observador de si mesmo. Os símbolos vão surgindo e
construindo a extensa caminhada em direção ao autoconhecimento,
enquanto você tece um bordado contínuo dos processos anímicos.
Mas ao mesmo tempo, percebendo que esse bordado tem também
o seu lado avesso; vai acolhendo seus altos e baixos, na entrega e
aceitação das perdas inexoráveis, das dores da alma, mas sempre
prospectando novos desafios e conquistas, que lhe acompanharão
até o ultimo inspirar. Você é, a um só tempo, o chão, o céu, a poeira,
a caminhada e o caminhante. Ou como diz a canção: “A viola, o
violeiro e o amor se tocam.”[ii]
E assim é, quando podemos observar e acalentar nossos sonhos
noturnos ou trânsitos astrológicos diários ou mensais. Eles são, para
mim, a água, farinha e o sal que fazem o pão da vida de cada dia, a
nos ensinar e despertar para um possível melhor viver. Eles têm
sido como faróis ou bussolas na travessia das noites escuras da
vida. Bênçãos que a vida simbólica traz a quem nela mergulha, sem
medo, com reverência e humildade. O enorme espaço para o não
saber também deve ser reverenciado em nosso espírito. É
justamente o desconhecido que curiosa e misteriosamente nos leva
a dimensões maiores do nosso ser, do contínuo processo de
integração de sombra e luz, do fácil e do difícil, da vida consciente e
inconsciente.
Nosso Zeitgeist atual aponta para tempos de mais integração,
entre diferentes áreas do saber na busca de uma visão de mundo
mais sistêmica e interconectada. Espero que esse livro possa ser
uma ponte de aproximação entre dois riquíssimos campos de
conhecimento, a Astrologia e a Psicologia Analítica. E, se possível,
cumprir uma função teleológica para os conturbados tempos que
estamos atravessando, em que o excesso e a velocidade das
informações facilmente nos sequestram a visão de unidade do todo
e a noção do propósito da vida.
Assim, este livro se configura como uma “opus” pessoal, tendo
em vista todo o tempo de trabalho, pesquisa, leitura e, sobretudo, de
decantação dos processos internos que permearam minha trajetória.
Tanto a Psicologia Analítica quanto a Astrologia Psicológica se
propõem entender o aspecto simbólico da alma humana, e desta
feita não devem ser vistos como simples produtos culturais que aí
estão para serem consumidos e descartados. Seus princípios
teóricos precisam, com o passar do tempo, serem introjetados e
assimilados por nossas instâncias anímicas e subjetivas, e isso se
dá por meio de experiências únicas de cada um, pela introspecção e
mergulhos esporádicos em áreas que não são regidas
exclusivamente pela razão ou pela lógica.
O processo alquímico de superação e de desenvolvimento é
único para cada pessoa, e assim sendo não há uma cartilha com
fórmulas corretas e nem medalhas de honra ao mérito como
prêmios. A Astrologia não faz parte do mundo formal acadêmico, e
os astrólogos, de alguma forma, são “outsiders”, pois o seu ofício,
até agora, não tem reconhecimento como profissão regulamentada.
Muitas vezes, ao final de uma consulta astrológica, num misto de
surpresa e alegria um cliente me pergunta: “Mas como você
consegue ver tanta coisa aí dentro desse círculo com todos esses
números, pontinhos e riscos coloridos”? Confesso que sempre fico
feliz com essa pergunta, pois sei que de alguma maneira aquela
pessoa, de posse daquela informação ou conhecimento, poderá
encontrar algum sentido para repostas que ela supostamente veio
buscar naquele momento de vida. Ou, então, foi tocada por algo que
transcende a materialidade e a suposta lógica da vida. O que, a meu
ver, não é pouca coisa!
Capítulo I

Origens da Psicologia Analítica

Carl Gustav Jung nasceu em 1875, em Kesswil, Suíça. Em 1900


termina o curso de medicina e torna-se médico assistente de Eugen
Bleuler na clínica psiquiátrica do Hospital de Burghölzi, em Zurique,
um dos mais avançados centros psiquiátricos da Europa. Estamos
falando do final do século XIX, período em que acontecia uma forte
mudança de mentalidade, um novo paradigma na área do
conhecimento estava nascendo em vários campos da cultura. O
século anterior havia sido fortemente marcado pelo positivismo,
cujos pressupostos abarcavam uma visão mais mecânica, racional e
previsível do homem e da natureza.
E nesse momento, início do século XX, o modelo de ciência
vigente começa a ser questionado e criticado, pois há uma
percepção de que a soberania da razão não poderia responder por
questões metafísicas ou espirituais dos indivíduos. A perspectiva
mecanicista de ciência não satisfazia mais os interesses e
necessidades da época. Os fenômenos irracionais começaram a
despertar a atenção de pensadores e estudiosos.
Um grande interesse pelo lado mais subjetivo e indomável do ser
humano estava em curso. Os doentes mentais viviam em
sanatórios, em condições de extrema precariedade e suas graves
patologias causavam muito sofrimento. À vista disso, as pesquisas e
os tratamentos na área psiquiátrica avançavam rapidamente e já
estavam apontando para outras formas de entendimento e de
tratamento das mazelas psíquicas humanas.[iii]
E nessa conjuntura surgiu, na comunidade médica europeia, a
Psicanálise, criada por Sigmund Freud, e a Psicologia Analítica,
criada por Carl Gustav Jung. Ambas escolas deram origem ao que
foi posteriormente denominado Psicologia Profunda, cujo intuito
era pesquisar justamente o desconhecido, misterioso e não racional,
vale dizer, o inconsciente humano.
Sobre o renovado interesse pelos fenômenos da alma neste
período, escreve Grimberg:
 
O soberano intelecto corria o risco de virar um ditador e
governar sozinho e isolado, e, pior, solteiro, sem a presença de
uma companheira! Com o resgate do outro lado, abria-se a
possibilidade para o feminino e as emoções. A fantasia, a
imaginação, o sonho e a linguagem do mito começavam a ser
valorizados e ganhavam espaço para sua expressão. O
desconhecido, assim como a subjetividade, passava a ser
encarados como realidades em si, cheios de vida e de
significados. Não era mais possível encaixar todo o mundo
subjetivo num conjunto de leis gerais e absolutas, espremidas
dentro de fórmulas matemáticas previsíveis.[iv]

Jung, seu trabalho com psicóticos

e a origem do termo complexo.


No hospital Burghözli, sob a direção de Eugen Bleuler, o trabalho
de Jung era feito com esquizofrênicos e psicóticos. Foi Bleuler quem
cunhou o termo esquizofrenia (do grego: separar, fender), um
estado de dissociação psíquica, que substituiu o termo “demência
precoce”. O renomado psiquiatra era muito exigente com seus
colaboradores e valorizava uma atitude mais humana e afetuosa
com os pacientes; esse fato teve forte influência na postura
profissional de Jung em toda a sua vida.
Portanto, no início do século XX assistimos o nascimento da
psiquiatria e da psicologia, que sinalizavam um período riquíssimo
em investigações sobre a psique humana e de grande produção
científica. As pesquisas feitas com os testes de associação de
palavras avançaram muito e esses experimentos foram relevantes
na compreensão do funcionamento psíquico, que indicavam a
existência de um inconsciente reprimido.
Amnéris Maroni, em “Individuação e Coletividade” afirma que:
Jung não inventou o teste; pelo contrário, na psiquiatria e na
psicologia experimental Galton, Wundt e Kraepelin, para citar os
nomes mais conhecidos, já o usavam e tentavam aperfeiçoá-lo.
Foi, porém, Ziehen quem descobriu um detalhe precioso
enquanto aplicava o teste: o tempo de reação era maior quando
a palavra-estímulo estava relacionada com algo desagradável
para o sujeito. Esse “algo” desagradável, Ziehen chamou de
gefühls betonter Vorstellungkomplex (complexo de
representação emocionalmente carregado) ou simplesmente
complexo.[v]
 
Jung trabalhou durante nove anos em Burghözli e dedicou-se
especialmente aos experimentos de associação de palavras,
dando continuidade, assim, às descobertas de Ziehen. Com o intuito
de decifrar os neologismos e fantasias estranhas no discurso de
seus pacientes esquizofrênicos, Jung foi consolidando a teoria dos
complexos que mostravam a existência de conteúdos inconscientes
e com alta carga emocional em estado latente. Desta feita, esses
experimentos se tornaram valiosos métodos para a exploração do
inconsciente e trouxeram uma enorme contribuição para a
psicologia moderna.

Testes de Palavras: Como eram feitos?


 
O observador organizava uma lista de palavras isoladas e
aleatórias, sem nenhuma relação entre si; eram as palavras
indutoras. O indivíduo examinado era solicitado a reagir a cada
palavra indutora pronunciando uma única palavra, a primeira que
viesse a sua mente. O observador, então, com um cronômetro de
segundos, verificava o tempo decorrido entre uma e outra palavra.
Entre o click da última palavra do experimentador e o click da
primeira sílaba da palavra induzida havia o denominado tempo de
escoação. Em geral eram provocadas 50 reações, das quais se
observava: o tempo de reação, as alterações fisiológicas, como
sudorese, cor da pele, nervosismo, silêncio, lapsos de memória,
palpitações, a repetição da palavra, etc. Todas as respostas eram
meticulosamente assinaladas, pois estariam sinalizando algo
importante, de natureza mais inconsciente.
As perturbações do comportamento individual indicariam que a
palavra indutora havia atingido um conteúdo emocional, que era
inconsciente. Como vimos, a esses conteúdos de intensa carga
afetiva foi dado o nome de complexos afetivos ou complexos que
demonstravam a força do psiquismo inconsciente.
Os pacientes psiquiátricos eram verdadeiros reféns de intensa
perturbação física e emocional. As alucinações, os delírios, as
reações de violência ou catatonia profunda se mostravam
praticamente inacessíveis à compreensão ou tratamento. O poder
das imagens que emergiam desses pacientes, cujo sofrimento era
devastador, despertou em Jung a curiosidade de pesquisar mais
intensamente sua natureza e suas origens. Ele tratou de inúmeros
pacientes psicóticos e observou com grande interesse que as suas
potentes fantasias não faziam parte só da sua história ou de suas
vivências pessoais. É importante ressaltar que essa percepção foi
fundamental para o entendimento de que havia neles um
inconsciente muito mais abrangente e misterioso, que precisava ser
melhor investigado e compreendido.
Freud e Jung conheceram-se em 1907. O primeiro encontro de
ambos foi intenso e marcante para os dois pioneiros, sabe-se que
eles conversaram durante treze horas seguidas, sem interrupção. A
partir daí, trocaram intensa correspondência, discutindo casos
clínicos, uma rica experiência compartilhada que seguiu até o ano
de 1912. Freud considerava Jung como seu sucessor, ou como um
“príncipe herdeiro”, e nele depositava grandes expectativas de que
pudesse dar continuidade ao seu trabalho.
Com o tempo, entretanto, várias divergências teóricas surgiram
entre eles. Uma delas, bastante específica, era relacionada ao
conceito de libido, que para Freud tinha uma conotação sexual e
para Jung era uma energia psíquica generalizada, podendo
encontrar expressão também em outras as atividades do ser
humano. Esta divergência foi apresentada em seu livro
“Transformações e símbolos da libido”, cujo lançamento fez
desencadear uma ruptura definitiva entre os dois no ano de 1913.
Nessa fase, por volta de seus 38 anos, Jung viveu uma época
difícil e de muita reclusão, com intensas experiências interiores,
visões e sonhos impressionantes. Decidiu viver isso intensamente,
confrontar-se, mergulhar em suas próprias imagens e tentar decifrar
o sentido delas, mantendo a consciência vigilante para não perder o
contato com a realidade externa. Foi desde esse período que ele
começou a construir a base teórica de seus conceitos e de seus
métodos psicoterapêuticos.
Há que se ressaltar que seu trabalho clínico e a complexa
viagem que fez ao próprio inconsciente, observando e desenhando
suas visões e angústias, foram a base, ou a matéria-prima para a
posterior consolidação de suas concepções teóricas. As estruturas
psíquicas e arquetípicas como anima, animus e sombra foram
vivenciadas por ele e estão graficamente representadas em seu
extraordinário livro Red Book, ou Liber Novus, que foi lançado só
em 2009, em inglês e alemão, 48 anos após a sua morte, por
recomendação do próprio Jung. O livro é autobiográfico. Foi
organizado como um manuscrito medieval, escrito em alemão gótico
e com uma série de desenhos altamente impactantes.
Em seu livro “Memórias, sonhos e reflexões”, compilado por
Aniella Jaffé, no final da sua vida, Jung descreve um instigante
sonho que teve por volta de 1908, quando ainda trocava ideias com
Freud. Conta ele:
 
SONHO:
“Eu estava numa casa desconhecida, de dois andares. Era a
minha casa. Estava no segundo andar onde havia uma espécie de
sala de estar, com belos móveis de estilo rococó. As paredes eram
ornadas de quadros valiosos. Surpreso de que essa casa fosse
minha, pensava: “Nada mau”. De repente, lembrei-me que ainda
não sabia qual era o aspecto do andar inferior. Desci a escada e
cheguei ao andar térreo. Ali, tudo era mais antigo. Essa parte da
casa datava do século XV ou XVI. A instalação era medieval e o
ladrilho vermelho. Tudo estava mergulhado na penumbra. Eu
passeava pelos quartos, dizendo: “Quero explorar a casa inteira”.
Cheguei diante de uma porta pesada e abri. Deparei com uma
escada de pedra que conduzia à adega. Descendo-a, cheguei a
uma sala muito antiga, cujo teto era uma abóbada. Examinando as
paredes descobri que entre as pedras comuns de que eram feitas,
havia camadas de tijolos e pedaços de tijolo na argamassa.
Reconheci que essas paredes datavam da época romana.
Meu interesse chegara ao máximo. Examinei também o piso
recoberto de lajes. Numa delas, descobri uma argola. Puxei-a. A laje
deslocou-se e sob ela vi outra escada de degraus estreitos de
pedra, que desci, chegando enfim a uma gruta baixa e rochosa. Na
poeira espessa que recobria o solo havia ossadas, restos de vasos
e vestígios de uma civilização primitiva. Descobri dois crânios
humanos, provavelmente muito velhos, já meio desintegrados. –
Depois, acordei.”
Nesse mesmo livro, Jung conta que nos dias anteriores estava
preocupado em como entender as premissas da psicologia
freudiana dentro de um contexto histórico e não meramente pessoal.
E com esse sonho chegaram as respostas que ele precisava, pois
as imagens nele contidas retratavam uma casa com dois andares e
uma gruta pré-histórica, que ele entendeu e deduziu como sendo a
representação da história das civilizações e seus estados
sucessivos de consciência humana. Certamente esse sonho foi um
importante catalisador para que pudesse mais tarde elaborar seu
conceito de inconsciente coletivo e arquétipos.
Como bem sintetiza Jung, ainda neste mesmo livro:
 
O sonho acrescentava à minha situação consciente que acabo
de descrever outras camadas de consciência: o andar térreo de
estilo medieval, há muito abandonado, a adega romana e enfim,
a gruta pré-histórica representavam épocas findas e níveis de
consciência ultrapassados.
 
Jung construiu sua teoria durante os anos em que pesquisava e
trabalhava com esquizofrênicos, analisando a natureza das imagens
que surgiam em seus delírios, visões ou surtos psicóticos. Em
trabalho clínico diário, analisava desenhos e sonhos de seus
pacientes de forma meticulosa e apaixonada. Em suas grandes
viagens à África, ao Novo México (EUA) e Índia verificou que
embora as distâncias entre os países de diferentes continentes
fossem enormes, havia denominadores comuns a todos eles no que
dizia respeito aos seus mitos, valores culturais e espirituais. Essas
crenças, valores ou ideias possuíam um substrato psíquico arcaico,
mítico e profundo, uma espécie de matéria-prima psíquica que
permitiu a ele construir dois de seus conceitos fundamentais:
Inconsciente Coletivo e Arquétipos.
 
O Círculo de Eranos

Um notável grupo de estudos, chamado Eranos, se formou a


partir de 1933. As reuniões eram realizadas anualmente na
residência de Olga Fröebe-Kapteyn, às margens do lago Maggiore,
em Ascona, Suiça. Esse nome foi sugerido por Rudolf Otto, e deriva
de uma palavra grega que significa “banquete sem anfitrião”. Ali se
reuniam, no verão, intelectuais e especialistas de várias áreas de
conhecimento, cuja finalidade era a troca de idéias sobre suas
relativas disciplinas. Esse “banquete’ intelectual e interdisciplinar
reuniu personalidades ilustres como teólogos, cientistas, médicos,
psicólogos e mitólogos. Entre eles, além do próprio Jung, estavam
D.T. Suzuki, Mircea Eliade, Erich Neuman, HenrichZimmer,
Wolfgang Pauli, Joseph Campbell, James Hillman, Karl Kerény e
outros. Esses encontros acabaram por se tornar um foro da
psicologia analítica, tendo Jung como figura central.
Entre os mentores que inspiraram Jung em seu início de carreira
temos: Jacob Burkhardt, Johann Bachofen, Pierre Janet, Wundt,
William James, Théodore Flournoy, entre outros. É importante
ressaltar que durante toda a sua trajetória profissional, Jung contou
com a valiosa contribuição intelectual de sua esposa, Emma Jung, e
também de discípulas e colaboradoras que foram fiéis a ele até o
final de sua vida. Entre elas temos Barbara Hannah, Aniela Jaffé,
Jolande Jacoby, Toni Volff, Esther Harding, Marie-Louise von Franz.
Entre alguns de seus discípulos homens destacamos C.A. Maier,
Heinrich Karl Fierz, Edward Edinger, Erich Neumann.
A esse respeito, diz Gambini:
 
A relação de Jung com as mulheres sempre foi constante e
intensa; elas o rodeavam e o inspiravam. Muitas testemunharam
que no contato com ele sentiram sua criatividade liberada, e de
fato grande numero delas produziu trabalhos de valor, como
mencionado. Sendo a anima uma força arquetípica que cria todo
um sistema de expectativas do homem com respeito à mulher,
analogamente Jung esperava, e recebia, as sementes que elas
plantavam em sua mente. Jung considerava que o princípio
feminino, em tudo oposto ao fálico, com seu poder regenerador
e doador de vida, era o grande valor reprimido da cultura,
posição esta que o levou a confrontar certos dogmas cristãos
que degradavam a matéria e o corpo, criando uma das cisões
responsáveis pela unilateralidade de nosso tempo.[vi]

Nise da Silveira e a chegada

da Psicologia Analítica no Brasil


No Brasil, a renomada psiquiatra Nise da Silveira (1906-1999) é
considerada como a introdutora do estudo sistemático da Psicologia
Analítica no Brasil. Nise nasceu em Alagoas e fez a sua formação
na Faculdade de Medicina da Bahia, de 1926 a 1931; importante
dizer que era a única mulher dentre os 157 homens da sua turma.
Em 1944 iniciou seu trabalho no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro
II, Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro. Nise discordava dos
tratamentos convencionais aos quais eram submetidos os pacientes
esquizofrênicos, que na época constavam de choques elétricos,
lobotomia, comas insulínicos e uso de psicotrópicos em larga
escala. Criticava o ambiente dos hospitais que eram muito frios e
impessoais.
Em função da radical discordância com o trabalho nas
enfermarias, a inquieta psiquiatra foi transferida para o trabalho com
terapias ocupacionais, até então desprezadas pelos médicos.
Assim, ela fundou a “Seção Terapêutica Ocupacional”, que dirigiu
desde 1946 até 1974. Ali se praticavam pintura, modelagem e
trabalhos artesanais. Essas atividades tinham um valor terapêutico
inestimável, uma vez que cumpriam uma importante função no
sentido de despotencializar o poder das imagens atemorizantes
presentes nas visões e delírios nos pacientes esquizofrênicos. Nise
se referia aos internos pelo próprio nome, se recusava a chamá-los
de “pacientes”, pois os considerava como seus clientes; sua
proposta era que após o tratamento, eles pudessem voltar ao
convívio social.
É importante assinalar que, no paciente esquizofrênico, acontece
uma espécie de arrombamento ou colapso das estruturas do ego e
isso caracteriza um estado de dissociação psíquica que define a
esquizofrenia. O avassalamento das imagens do inconsciente
compromete gravemente o contato do indivíduo com a realidade.
Nesse tipo de paciente são perceptíveis as camadas mais profundas
do inconsciente: sonhos, visões, delírios ou alucinações auditivas
emergem com intensidade, revelando imagens que seriam
arquetípicas, comuns a toda humanidade, impossíveis de serem
compreendidas dentro de um contexto pessoal.
Em 1952, Nise fundou o Museu das Imagens do Inconsciente, no
Rio de Janeiro, centro de pesquisas destinado à preservação dos
trabalhos produzidos na instituição. Em 1956 desenvolveu outro
projeto, a Casa das Palmeiras, clínica destinada à reabilitação de
egressos de instituições psiquiátricas. Foi pioneira também na
pesquisa da importância das relações afetivas entre os pacientes e
seus animais, aos quais ela chamava de coterapeutas. Segundo ela,
os animais representavam um ponto de referência afetiva estável na
vida dos internos. Nise recebeu inúmeras condecorações e prêmios
por seu extraordinário trabalho na área da psiquiatria, e seu
pioneirismo se tornou fonte de inspiração para a criação de outras
instituições terapêuticas no Brasil e no exterior.
No ano de 1954, a médica iniciou uma profícua troca de
correspondência com Jung. Há algum tempo ela mantinha contato
com a sua teoria e investigava com grande interesse os desenhos
dos pacientes que acompanhava, feitos em formas circulares,
relacionando-os às mandalas estudadas pelo psicoterapeuta suíço.
Segundo ele, mandalas desenhadas de forma espontânea
evidenciavam uma tentativa de cura, cumprindo uma função de
reorganização, em casos de forte dissociação ou desorientação
psíquica. A correspondência entre eles se intensificou, e por conta
disso Nise foi convidada a participar, com parte de seu acervo do
Museu das Imagens do Inconsciente, do II Congresso Internacional
de Psiquiatria, em 1957, em Zurique.
 
Carl Jung e Nise da Silveira - 1957

Jung fez questão de abrir a mostra brasileira que ocupava cinco


salas, tecendo comentários relevantes sobre as obras ali expostas.
Essa exposição – A Esquizofrenia em imagens - acabou por abrir,
para a psiquiatra brasileira, novos caminhos e orientações em sua
atividade profissional. Nise publicou nos anos 60 uma obra, “Jung,
vida e obra”,[vii] que traz os principais conceitos da escola junguiana.
Escreveu também “Imagens do Inconsciente”[viii] e “Emoção de
lidar”,[ix] sobre os gatos, sua grande paixão. Sem sombra de dúvida,
Nise foi uma das grandes divulgadoras da obra de Jung no Brasil.
Afirma Josélia Aguiar,[x] em artigo na Revista EntreLivros (2006):
“Incansável, Nise manteve, até o final da sua vida, aos 94 anos,
muitas de suas atividades, como a de mentora de um grupo de
estudos que realizava em sua própria casa. Apesar de uma década
de debilidade física, o vigor criativo persistia. A razão para tanto
entusiasmo talvez se resuma em uma declaração sua, registrada
num vídeo disponível no acervo do seu museu: “Felizmente, eu
nunca convivi com gente muito ajuizada”.
Breve histórico da vida de Jung

 
1875: Nasce Carl Gustav Jung, em Kesswil, Suíça.
1895: Entra no curso de Medicina da Universidade de Basiléia.
1900: Conclui o curso e torna-se segundo assistente de Eugen
Bleuler na clínica psiquiátrica do Hospital de Burghözli, em Zurique.
1902: Defende sua tese de doutoramento intitulada: “Sobre a
psicologia e a patologia dos chamados fenômenos ocultos”.
1903: Casa-se com Emma Rauschenbach, com quem teve 5 filhos.
1905: Qualifica-se como professor em psiquiatria da Faculdade de
Medicina na Universidade de Zurich; continua com professor até
1913.
1907: Primeiro encontro com Sigmund Freud, em Viena.
1909: Dedica-se ao estudo de mitologia comparada. Viaja com
Freud, também convidado, para dar palestras sobre a sua obra.
1910: Fundação da Associação Internacional de Psicanálise (IPA)
durante o congresso em Nuremberg. Jung é eleito o seu primeiro
presidente, entre 1910 e 1913. Deixa o Burghölzli e muda-se para
sua casa em Kusnacht, às margens do lago, perto de Zurique.
Dedica-se mais a prática psicoterapêutica.
1912: Publicação de Transformações e símbolos da Libido
1913: Rompimento com Freud. Posteriormente rompe com o IPA.
1913-1919: Confronto com o seu próprio inconsciente.
1917: Durante a Primeira Guerra Mundial, serve o exército, trabalha
como médico comandante em um campo de soldados ingleses.
1920: Viaja para o norte da África.
1921: Publicação de “Tipos Psicológicos”
1924: Viaja aos EUA, onde visita os índios pueblos do Novo México
e do Arizona.
1925: Expedição ao Quênia, África Oriental Britânica.
1928: Estudos de alquimia, com Richard Wilhelm.
1933: Torna-se presidente da Sociedade Médica Geral Internacional
de Psicoterapia.
1933-1951: Participante e professor das Conferencias Eranos, em
Ascona, Suiça.
1934: Começa a pesquisar Alquimia.
1937: Viagem para Índia. Recebe títulos de doutor honorário das
Universidades de Calcutá, Benares e Allabad.
1940: Publicação de Psicologia e Religião.
1944: Publicação de Psicologia e Alquimia. Para de lecionar na
Universidade da Basiléia.
1945: Completa 70 anos. Homenagem da Universidade de Genebra.
1948: Fundação do Instituto C.G. Jung, em Zurique.
1951: Pronuncia sua última conferência em Eranos.
1952: Publicação de Símbolos da Transformação; edição ampliada
e reelaborada publicada em 1912.
1955: Morte de Emma Jung em 1955.
1957: Escreve sua biografia: Memórias, Sonhos e Reflexões.
1961: No dia 6 de junho, morre, em sua casa, aos 85 anos. Suas
últimas palavras foram dirigidas à governanta Ruth Bailey: “Hoje à
noite vamos tomar aquele vinho tinto gostoso!”.
 
História da Astrologia

no Ocidente

Em várias épocas a astrologia funcionou como um mecanismo


medidor do tempo e precursor dos calendários, uma linguagem
dos deuses, a base para uma cosmologia de algumas das
maiores religiões do mundo; um depositário para a imagem
projetada dos deuses; um termo sinônimo que abrangeria a
astronomia, geometria, matemática e psicologia; um primeiro
diagnóstico e ferramenta na medicina; e como mãe das artes
mânticas.[xi]
 
A tradição astrológica é um campo de conhecimento cuja origem
está no século IV AC, na Mesopotâmia, região habitada por diversos
povos no decorrer da história, como os Acádios, os sumérios, que
foram responsáveis por criar a escrita cuneiforme; e a roda, os
Babilônios, criadores do primeiro código de leis, o Código de
Hamurabi; os Assírios, que criaram o primeiro exército profissional
da história; e os Caldeus, que fundaram a maior biblioteca da
antiguidade na cidade de Nínive, além de importantes obras
arquitetônicas, como os jardins suspensos da Babilônia e a torre de
Babel.[xii]
Babilônia era acidade mais relevante do Império Babilônico, um
importante centro econômico, político, cultural e científico da
civilização mesopotâmica. Acredita-se que esse tenha sido o local
de fundação e origem da astronomia ocidental. Os sumérios
desenvolveram operações matemáticas, um sistema numérico que
acabou sendo usado pelos egípcios, no intuito de estabelecer
correlações entre a sua arquitetura e as posições das estrelas fixas
no firmamento. Os caldeus estudaram os ciclos dos planetas e seus
movimentos retrógrados e estacionários.
Os primeiros almanaques babilônicos datam de 1300 AC, e
estabeleceram o ano solar com doze meses de 30 dias. O dia foi
dividido em duas partes de 12 horas e cada hora em 60 minutos,
criando o sistema 12 – 60, que perdura até hoje.
No século VII AC os babilônicos já desenvolviam uma
cosmologia assentada em uma visão de universo na qual o
movimento do cosmos se relacionava com as ações humanas.
Foram os babilônicos e caldeus que estabeleceram pela primeira
vez a relação entre corpos celestes e os eventos da Terra.
No império babilônico os planetas eram considerados os
representantes dos deuses. Assim, o deus Schamasch era o Sol,
Sin a Lua, Ishtar era Vênus, Nabu era Mercúrio, Nergal era Marte,
Marduk era Júpiter e Ninurta era Saturno.
Nessas eras remotas, religião, astrologia e astronomia eram
inseparáveis tanto no conceito quanto na prática. Tendo em vista
que nessa época havia o predomínio de culturas agrárias, o
conhecimento dos movimentos do Sol e da Lua foram fundamentais
para o entendimento das quatro estações do ano, e também para o
êxito nos plantios e nas colheitas. Supõe-se que os primeiros
marcadores do tempo foram criados devido à necessidade de
realizar rituais para glorificar os deuses.
No século V AC os babilônicos passaram a dividir a eclíptica em
doze partes iguais, cada uma com 30 graus, sendo os primeiros 30
graus a partir do equinócio da primavera. Fez-se uma correlação
entre as constelações existentes com esses 12 segmentos, e assim
foi surgindo a ideia de Zodíaco, que quer dizer “círculo dos animais”.
 
Astrólogo Medieval

Destacamos alguns filósofos e astrônomos que tiveram


relevância nos primórdios do conhecimento astrológico:
Empédocles (495-430 AC), nascido na Sicília, forneceu bases
importantes para a astrologia grega, que privilegiou o cálculo das
posições planetárias. Foi o primeiro filósofo pré-socrático a falar que
o mundo era dividido em quatro elementos básicos, fogo, ar, terra e
água. Da Grécia antiga, destacamos Platão (428-348 AC) e
Aristóteles (384-322 AC)
Platão, em sua obra Timeu, aborda a questão muito relevante
para a premissa astrológica da interação entre o homem e o
cosmos, o micro e o macrocosmos, ou seja, a estrutura da alma
humana é semelhante à alma do universo, a anima mundi, para os
alquimistas.
Em sua obra Meteorologia, Aristóteles discorre sobre química e
matéria, e sobre as quatro qualidades primitivas que seriam: quente,
frio, seco e úmido.
Foi Berose, sacerdote caldeu e historiador, quem levou a
astrologia para a Grécia, na ilha de Cós, fundando a o primeiro
ponto de ensino desse conhecimento, em torno de 281 AC. Ele é o
autor de Bayloniakas, histórias babilônicas desde os seus
primórdios até Alexandre, o Grande.
Hiparco (190-120 AC) foi um grande astrônomo, entre outras
coisas montou o primeiro catálogo com cerca 850 estrelas e
calculou com precisão a precessão dos equinócios.
Importante ressaltar que a expansão da Astrologia na Grécia se
deu após a conquista da Mesopotâmia no século IV AC por
Alexandre, o Grande, que conquistou a Ásia, Grécia e o Egito. Na
cidade de Alexandria, fundada por Ptolomeu I Soter, um dos
generais de Alexandre, reuniu-se todo o conhecimento do mundo
antigo, havendo uma fértil integração entre a mitologia grega e
egípcia.
Muitos estudiosos e filósofos da antiga Grécia edificaram um
ordenamento do mundo que afirmava: o universo é um, e cada parte
que o compõe guarda semelhança com o todo. Essa cosmovisão do
micro e do macrocosmo, foi partilhada, sob diferentes aspectos, por
Platão, Empédocles, Aristóteles, Pitágoras, Hipócrates e outros. A
fértil fusão entre a cultura da Mesopotâmia e a cultura da Grécia
antiga resultou na estruturação do saber astrológico.
 
Claudio Ptolomeu

Em sua famosa obra Tetrabiblos, o egípcio Claudio Ptolomeu


(100-178 DC), o mais importante astrólogo e astrônomo da
Alexandria, sistematizou pela primeira vez todo o conhecimento
astrológico e astronômico da Antiguidade, relativo às posições, aos
significados dos planetas e suas influências nos assuntos humanos.
Ptolomeu expôs, de forma organizada, a teoria geocêntrica, ou seja,
a Terra está no centro do universo e em trono dela giram os demais
astros celestes. Esta obra foi considerada a “Bíblia da Astrologia”,
por muito tempo.
Diz Grof sobre essa valiosa obra:
 
Nos séculos subsequentes, várias gerações de astrólogos
expandiram, revisaram e refinaram o sistema de Ptolomeu. Em
sua forma grega, completamente desenvolvida, a astrologia
influenciou, durante quase dois mil anos, a religião, a filosofia e
a ciência da Europa pagã e posteriormente cristã.[xiii]
 
Na era romana três nomes se destacaram: Marcus Manilius,
autor do poema Astronomica, que é um tratado sobre astrologia;
Julius Firmicus Maternus, autor de Matheseos libri octo (Oito livros
de astrologia), e Doroteu de Sidon que escreveu a obra
Pentateuco, onde aborda triplicidades, o Ascendente e os eclipses.
No ano de 317 o imperador Constantino I, o Grande, adota a
religião cristã, rejeitando os deuses romanos. Ele reconstruiu a
antiga cidade grega de Bizâncio, que depois veio a ser chamada de
Constantinopla, sede do Império Romano do Oriente.
No século V, Odoacro, um chefe bárbaro germânico, depõe o
Imperador Rômulo Augusto, marcando o fim do Império Romano do
Ocidente. Roma deixa de ter o poder político, mas ainda mantém o
poder espiritual, sendo que o cristianismo se disseminou pela
Europa ocidental. Era o início da Idade Média, que foram mil anos
de dominação religiosa e obscurantismo cultural.
Constantinopla caiu na mão dos turcos, 1453, assinalando o final
do império romano de oriente. Centenas de textos mágicos e
alquímicos em grego, que haviam sido preservados pelo império
bizantino durante a perseguição religiosa no Ocidente, retornaram
às cidades ocidentais junto com os fugitivos de Constantinopla.
Sábios cristãos fugiram para a Itália, e esses eventos históricos
deram início ao Renascimento.
Os livros de astrologia foram traduzidos do árabe e do grego para
o latim. A obra de AbūMaʿshar, conhecido como Albumasar, De
Magnis Coniunctionibus (Das grandes conjunções) foi traduzida
em Veneza no ano de 1515.
 
Thot

 
Cosme de Médici, (1389-1464) o senhor da República de
Florença, havia solicitado a um monge italiano chamado Leonardo
da Pistoia que trouxesse da Macedônia manuscritos antigos em
latim e grego. E foi assim que recebeu os manuscritos da notável
obra dos primeiros séculos da era cristã, cujo nome era Corpus
Hermeticum[xiv], escrito em grego na Alexandria por vários autores
egípcios instruídos na cultura e filosofia grega. Cosme de Médici
havia criado a Academia Platônica de Florença com os filósofos
Cristoforo Landino e Marsílio Ficino (1433-1499). Solicitou a Ficino
que traduzisse imediatamente essa obra. Hermes Trimegisto, “três
vezes muito grande”, a quem foi atribuído a autoria desses textos,
era o sincretismo ou sobreposição do deus egípcio Thot, mestre da
escrita, da palavra divina e da inteligência e de Hermes dos gregos,
o mensageiro dos deuses, divindade da oratória, da astúcia, das
estradas e dos viajantes.
A esse respeito, comenta Sommerman:
 
(...) pois era tido como o arquétipo ou modelo perfeito do maior
dos reis, do maior dos sacerdotes e o maior dos sábios, e
também como o possuidor do conhecimento pleno das três
partes da sabedoria: dos fundamentos cosmogônicos e da
aplicação da alquimia, da astrologia e da teurgia, o que lhe dava
o domínio dos três mundos que são correspondentes a essas
três ciências sagradas: o mundo físico, o mundo astral e o
mundo espiritual. Ele personificava a transmissão da sabedoria
divina através dos tempos não somente aos homens, mas
também aos próprios deuses, tendo sido ele quem transmitiu,
por exemplo, a Osíris, Hórus e a Ísis[xv].
 
Marsílio Ficino, astrólogo, filósofo e mago florentino, teve um
papel muito relevante na Renascença Italiana, pois traduziu também
obras de Platão, Plotino, Jâmblico e Proclo.
Selecionei alguns nomes que se destacaram na construção dos
fundamentos astrológicos e astronômicos no Renascimento,
notadamente no período em que houve uma quebra de paradigma
muito importante. A astrologia, que até então era um sistema
geocêntrico, passa a ser compreendida como um sistema
heliocêntrico.
Nicolau Copérnico

Nicolau Copérnico (1473-1543) foi um astrônomo e matemático


polonês que desenvolveu a teoria heliocêntrica do sistema solar em
1541, contestando a teoria geocêntrica de Ptolomeu, que tinha sido
adotada pela Igreja Católica. Convém observar que o heliocentrismo
já era proposto na Antiguidade, sendo que o primeiro astrônomo a
se dar conta de que o sistema geocêntrico era um erro foi o grego
Aristarco de Samos (310- 230 a.C).
Giordano Bruno (1548-1600) era um teólogo, filósofo, escritor,
matemático, poeta, astrônomo, ocultista hermético e frade
dominicano italiano, que e foi queimado na fogueira pela Inquisição
em 1600 por defender a teoria heliocêntrica.
Em 1610, Galileu Galilei, físico e astrônomo italiano, avista quatro
satélites de Júpiter, o que para ele era uma prova que a Terra não
era o centro do Universo, mas teve que abjurar de suas convicções
para não ir para a fogueira.
Tycho Brahe foi um astrônomo dinamarquês que propôs um
modelo cosmológico híbrido, segundo o qual a Terra estava fixa no
centro do Universo, enquanto os planetas e outros astros giravam
em torno do Sol, que por sua vez girava em torno da Terra.
Johannes Kepler foi um astrônomo, astrólogo e matemático
alemão. Ele sucedeu Tycho Brahe no cargo de matemático imperial
do imperador Rodolfo IIe publicou em 1600 “Mysterium
Cosmographicum” (O Mistério Cosmográfico), uma defesa da teoria
heliocêntrica de Copérnico. Em 1621 ele lança os três volumes de
“Epitome Astronomia e Copernicanae” (Epítome da Astronomia de
Copérnico) na qual estavam contidas as três leis do movimento
planetário, que buscava explicar os movimentos celestes através de
causas físicas.
O conhecimento astrológico aperfeiçoado pelos árabes, que já
era parte do pensamento ocidental da Idade Média, foi depois
amplamente disseminado na Renascença, em almanaques com
previsões de plantio e colheita e em estudos de classificação
botânica. Os astrólogos atuavam como consultores e prestavam
serviços especiais aos reis e nobres da corte europeia. Naquele
momento, esse campo de conhecimento era muito valorizado e
estava presente não só na vida cotidiana das pessoas, mas também
nas universidades da Europa.
Diz Fernando Fernandes a esse respeito:
 
O astrólogo a serviço do rei, ou da autoridade local, moldava a
sua práxis em função das expectativas do público-alvo:
Venceremos a guerra? A peste será mortal? A colheita do trigo
será farta? E o falar de estrelas era, na verdade, um falar dos
homens para os homens. Apesar desta finalidade
eminentemente mundana, a astrologia jamais deixou de revestir-
se de uma certa sacralidade, na medida em que evidenciava,
em seus pressupostos fundamentais, a unidade subjacente na
multiplicidade, a interpenetração entre o macrocosmo e o
microcosmo e a articulação de toda a realidade conhecida em
torno dos eixos espaço-tempo.[xvi]
 
O período do Renascimento recuperou muito da cultura greco-
alexandrina, tornando-se um marcante movimento artístico,
filosófico e cultural, em cuja expansão resgatou as tradições
esotéricas que acabaram por fornecer forte inspiração também para
as artes em geral.
A esse respeito, Cid Marcus comenta: “Grandes artistas
mergulharam no neo-pitagorismo, no neo-platonismo, na
quiromancia, na geomancia, na astrologia; a alquimia forneceu um
abundante material para gravuras maravilhosas”.[xvii]
Na Renascença a astrologia recebeu um grande impulso, tendo
em vista seu caráter panteísta, que ampliava a visão humanista do
mundo. Além disso, teve um papel bastante relevante na descoberta
dos novos continentes, pois as tabelas astronômicas que haviam
sido elaboradas para o cálculo dos movimentos dos astros foram
usadas nas grandes navegações.
Posteriormente, com as grandes descobertas da astronomia, a
repressão da Igreja católica e a expansão da tecnologia em outros
setores produtivos, a astrologia perdeu a sua força e seu pacto
inicial com a natureza foi rompido. O antagonismo entre ciência e
magia, ou entre racionalismo e esoterismo, foi se delineando de
forma crescente desde o século XVI, quando a astrologia caiu em
descrédito nos meios científicos; foi banida da Universidade de
Sorbonne na França no século XVII. Nesta época, a visão de mundo
passa por grandes transformações e o paradigma astrológico
sustentado por um contexto mais sagrado, mágico e humanista foi
substituído por uma mentalidade cujo Zeitgeist se voltava, agora,
para uma visão mais científica, objetiva e mecânica da natureza.
Nesse período a astrologia sofre uma transformação, sendo
linguagem hermética e oculta, foi relegada ao rol das superstições e
crendices populares. Assistimos, aqui, o nascimento do paradigma
da ciência clássica, cuja visão racionalista e mecanicista definiu e
estruturou várias áreas do conhecimento até o final do século XIX.
Antes desse ciclo positivista, a Astrologia e a Astronomia eram uma
coisa só; a partir daí, a Astronomia ganha status de ciência e
avança por conta própria.
Incluo aqui três nomes relevantes de astrólogos, posteriores ao
renascimento:
Século XVII: Jean Baptiste Morin de Villefranche (1583-1659),
Robert Fludd (1574-1637) e William Lilly (1602-1681).
No século XIX: Madame Blavatsky (1831-1891), Rudolf Steiner
(1861-1925) e Alan Leo      (1860-1917)
Século XX: Michel Gauquelin (1928-1991) e André Barbault
(1921- 2019).
Alquimia e magia floresceram nesse período e retornam com
intensidade no Renascimento. O Hermetismo é o conjunto de
crenças, ideias e ritos transmitidos através da literatura hermética.
Hermenêutica significa compreender, traduzir, esclarecer, dar um
sentido ou decifrar o incompreensível; é a arte da interpretação.

Reflexão
Não tenho dúvidas de que JUNG, ao pesquisar e estudar a
Astrologia para si mesmo e para entender melhor os seus clientes,
deu a esse conhecimento mais credibilidade, através da qual muitos
de nós, astrólogos, fomos beneficiados. Hoje podemos olhar para as
Artes Mânticas e para a Alquimia, Tarot ou Kabala com reverência e
respeito, uma vez que representam a somatória de conhecimento
que percorreram os picos e os vales de distintas civilizações durante
milênios, e que permanecem vivos em nosso inconsciente coletivo.
Não há como negar que essa matriz simbólica segue exercendo
sobre muitos um grande fascínio, uma vez que estabelece essa
ligação espiritual e profunda com nossos antepassados.
No caso da astrologia, podemos imaginar as milhares de horas
de observação do céu estrelado, a olho nu, necessárias aos
estudiosos, através dos séculos, para que produzissem cálculos
sofisticados que decifrariam a engrenagem da mecânica celeste, tão
complexa e perfeita. Somos herdeiros afortunados desses homens
fantásticos e obstinados. Penso sempre que deveríamos ser gratos
a muitos deles, em especial àqueles que morreram em fogueiras por
sua obstinação para provar, a qualquer preço, as suas descobertas
e verdades aos poderosos de seu tempo. E pensar que hoje nós,
com nossos sofisticados softwares, e com alguns toques em nossos
teclados, temos toda a sagrada geometria celeste desvendada em
poucos instantes...
 
Urania, Jan  Sadeler  I, after Maarten de Vos,  

from the series The Seven Liberal Arts, after 1575


Breve histórico da

Astrologia no Brasil

A história da Astrologia no Brasil tem início no século XVI, com a


chegada das caravelas de Cabral em nossas terras tupiniquins. Os
primeiros astrólogos que aqui aportaram foram astrólogos da corte
portuguesa, além de jesuítas, médicos e pilotos das expedições
espanholas e portuguesas. Os médicos, conhecedores das leis
celestes, cuidavam da saúde das tripulações e tinham também a
incumbência de ensinar os navegadores a se orientarem através da
posição das estrelas e das constelações.
Não encontramos referências relevantes sobre a astrologia no
país até a chegada da Família Real e da Corte Portuguesa por aqui,
em 1808. As primeiras ordens maçônicas chegaram ao Brasil nesse
período e sabemos que contribuíram para a difusão do
conhecimento astrológico em nosso território, inicialmente na cidade
do Rio de Janeiro. Nos templos maçônicos que ficam em suas lojas,
é comum vermos a representação das constelações com signos
zodiacais e a abóboda celeste. As colunas que existem nos seus
templos correspondem os doze signos e seus planetas regentes e
simbolizam o caminho iniciático do maçom aprendiz a ser percorrido
em seu caminho evolutivo. Assim como a estrutura zodiacal, os
quatro elementos também fazem parte da simbologia maçônica.
Entretanto, se passou um século até o acontecimento que
garantiu a ampla e fértil propagação da Astrologia em nosso país, e
isso se deu em 1909, com a fundação da Editora Pensamento, por
Antonio Olívio Rodrigues. Imigrante português, desembarcou em
São Paulo em 1890. Era assíduo leitor de Allan Kardec, Blavastky,
Eliphas Lévi, SwamiVivekananda, entre outros. Foi também o
idealizador e fundador da primeira ordem esotérica do país, o
Circulo Esotérico da Comunhão do Pensamento, em São Paulo, um
marco definitivo na disseminação de ensinamentos de cunho
espiritual muito abrangente.
Rodrigues começou a fazer os primeiros esboços de cálculos
astrológicos tomando por base a obra de F.Ch. Barlet, um iniciado
do século XIX. Após muito esforço e dedicação, percebe que a
exatidão dos seus cálculos comprova suas previsões; isso desperta
o interesse de pessoas das mais variadas classes sociais que o
procuram, o que torna seu nome torna bastante conhecido. O
consultório de AOR cresce rapidamente, recebe o nome de Brasil
Psychico-Astrológico e ele vem a ser o primeiro astrólogo do qual
temos notícia em nosso país.
 

Primeiro Almanaque do Pensamento


 
Posteriormente, percebendo o enorme interesse e a demanda de
um mercado para a astrologia, Rodrigues lança o primeiro
Almanaque do Pensamento[xviii], em 1913. Com numerosas gravuras
e com o imponente nome de Almach d´O Pensamento Scientífico,
Astrológico, Philsophico e Literário, a visionária publicação é
sucesso instantâneo, alcançando em sua primeira tiragem a marca
expressiva de vinte mil exemplares. Um de seus notáveis
colaboradores foi Francisco Waldomiro Lorenz, homem de vasta
cultura, cabalista, astrólogo e profundo conhecedor da filosofia
esotérica. A pioneira contribuição de Antonio Olívio Rodrigues para
a estruturação do saber astrológico foi fundamental para história
astrologia no Brasil. A Editora Pensamento foi responsável pela
publicação de inúmeros livros de Astrologia, de renomados autores
internacionais que certamente ajudaram na formação de inúmeros
astrólogos, hoje espalhados pelo nosso país. Afirma Harres[xix]:
 
No início da década de 20, o livro Astrologia, da Coleção
Ciências Herméticas, é enviado aos afiliados do Círculo
Esotérico da Comunhão do Pensamento, como primeira
tentativa de um curso de Astrologia por correspondência.
Grande parte do público que hoje contamos para consultas,
eventos, leitura de colunas e artigos sobre Astrologia em jornais
e revistas, devemos ao trabalho perseverante dos fundadores
da Pensamento. Através de seus círculos esotéricos e
instruções espiritualistas, Rodrigues, apoiado por Francisco
Valdomiro Lorenz, consolidou uma obra que ainda hoje serve,
com renovada energia, à divulgação do saber que se produz no
campo da Astrologia, no país e no estrangeiro.
 
Muitos outros astrólogos pioneiros surgiram por aqui, como Jubal
Tavares, que também escreveu para o Almanaque, Jerfferson T.
Álvares, Ullo Getzel, Danton Pereira de Souza, Demétrio de Toledo.
E destacamos também Emma Costet de Mascheville, que chegou
ao Brasil em 1925, e posteriormente fixou residência em Porto
Alegre. Foi ali que ela deu início a um fecundo trabalho com
astrologia, influenciando toda uma geração de excelentes astrólogos
e pesquisadores, moldados dentro de uma visão humanista e
espiritual da astrologia.
Em meados dos anos 60 um famoso astrólogo paulista, Omar
Cardoso (1921-1978), popularizou a astrologia através de
horóscopos radiofônicos, com enorme repercussão e sucesso.
Iniciou sua carreira de astrólogo ainda na adolescência, estreando
como locutor aos 19 anos. Suas previsões positivas atravessaram
todo o território nacional, por meio de rádio e televisão. Seu
horóscopo era publicado em 140 jornais. Antes de falecer, Omar
Cardoso criou um instituto com o seu nome, para continuar
divulgando a sua astrologia em várias mídias.
Outro astrólogo igualmente importante foi Assuramaya (1929-
2007), nascido no Rio Grande do Norte. Além de astrólogo, era
admirador de teatro e grande amante da natureza. Em 1957
começou a trabalhar como jornalista nos Diários Associados, no
Diário de Notícias e no Correio da Manhã, onde era responsável
pela publicação de horóscopos. Substituiu Omar Cardoso na Rádio
Nacional chegando a receber mais de 3.000 cartas por mês. Tinha
uma coluna em “O jornal” e na revista “O Cruzeiro”. Promoveu o
primeiro Congresso de Astrologia no Brasil, em 1971. Assuramaya
fundou em 1974, na Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro,
o primeiro centro de pesquisa de astrologia, que vigorou até 1982.
Numa fase já mais recente, agora embalada e abraçada pela
cultura hippie dos anos 60, a astrologia deixa de ser um saber
hermético das confrarias e torna-se uma grande “novidade”, sendo
amplamente divulgada nos meios de comunicação por todo o país.
Em consequência, nos anos 70 assistimos a uma grande
proliferação de escolas, cursos, eventos e traduções de livros
relevantes e mais modernos que assinalaram um “boom” da
Astrologia nas grandes capitais do Brasil. A vinda de astrólogos
estrangeiros para congressos no eixo Rio-São Paulo, coloca em
evidência o renovado interesse por esse saber milenar. Um veículo
de informação que teve papel aglutinador dos profissionais de
astrologia foi a revista Planeta, que aprofundou e propagou o
trabalho iniciado pela editora Pensamento.
Nos anos 80, a livraria Zipak, em São Paulo, sob o comando de
Luís Pellegrini, foi também essencial para expandir o interesse e
entusiasmo por temas holísticos, com a divulgação de assuntos
relacionados ao esoterismo, psicologia, mitologia, espiritualidade e,
claro, à astrologia. Nesse período, várias escolas de Astrologia
foram inauguradas em outras capitais do Brasil, o que muito
contribuiu para que mais pessoas tivessem acesso a esse campo de
conhecimento. O aparecimento dos softwares e programas de
astrologia permitiram mais velocidade nos cálculos, e seu uso
facilitou e ampliou de forma expressiva o número de estudantes e
interessados nesse saber milenar, tão fascinante quanto complexo.
 
O mapa astrológico do Brasil, calculado para o dia 7 de setembro

de 1822 tem o Ascendente no signo de Aquário.


Capítulo II

Inconsciente Coletivo

e Arquétipos

Para a psicologia analítica, o Inconsciente Coletivo é o


depositário de todas as memórias arcaicas das imagens primordiais
da humanidade. Essa matriz psíquica pertence a todos nós,
independentemente de raça, era ou cultura, abarcando toda a
evolução da espécie humana. O inconsciente coletivo vem a ser a
camada mais profunda do inconsciente humano e nele encontramos
histórias de toda a humanidade, que nos foram transmitidas através
das experiências, comportamentos, visões, fantasias ou sonhos
daqueles que nos antecederam.
O inconsciente coletivo pode ser apreendido por imagens
simbólicas e análogas em sua estrutura que, de forma recorrente,
estão presentes na mitologia comparada, no folclore, nos contos de
fadas, assim como em ritos de inúmeras religiões, na filosofia e nas
artes de inúmeras civilizações, guardando grande semelhança entre
si.
Da mesma forma, sabemos que a anatomia do corpo humano é
semelhante para todos os seres humanos, em todas as raças.
Nossa estrutura anatômica, fisiologia e psicológica é o resultado do
processo evolutivo e biológico da espécie humana, formada durante
milênios. Da mesma forma, a nossa psique como um todo é a
somatória de todas as vivências ancestrais, sendo que esse
processo histórico nos é dado ou revelado por imagens e símbolos
que foram se construindo ao longo da história das civilizações.
Jung pesquisou intensamente, tanto em seu trabalho em
Burghözli quanto em sua extensa prática clínica, a existência de
camadas de imagens em memórias inconscientes que não
derivavam de experiências pessoais, e esse fato posteriormente o
levou a criar o conceito dos arquétipos, estruturas psíquicas básicas
que pertencem à espécie humana. Sobre isso, afirma:
 
Convém lembrar que assim como a anatomia do corpo humano
é a mesma, apesar das diferenças raciais, assim também a
psique possui um substrato comum, que ultrapassa todas as
diferenças de cultura e de consciência. A esse substrato dei o
nome de inconsciente coletivo... Ele é a mera expressão
psíquica da identidade da estrutura cerebral,
independentemente das diferenças raciais. Este fato explica a
analogia e às vezes a identidade dos temas mitológicos e dos
símbolos, sem falar na possibilidade da compreensão humana
em geral. As diversas linhas do desenvolvimento anímico
partem de uma base comum, cujas raízes mergulham no
passado mais distante.[xx]
 
No Inconsciente Coletivo vivem e pulsam os Arquétipos. Esses
dois conceitos são correlatos e é importante que possamos
entendê-los bem. Os arquétipos constituem e formam a “matéria-
prima” do inconsciente coletivo, pois são as matrizes das imagens
arcaicas que foram descritas acima, as representações humanas
imagéticas e instintivas comuns aos seres humanos. Os arquétipos
condensam as experiências dos homens num passado longínquo,
em imagens universais.
Segundo Jung, nós herdamos não a imagem em si, mas a
capacidade de ter e criar essas imagens, que por serem universais,
são arquetípicas. Elas existem em estado latente em todos nós,
representando assim a soma de todas as potencialidades latentes
na psique humana, e dotadas de extraordinário dinamismo psíquico.
É importante ressaltar que os arquétipos não são simplesmente
ideias estruturantes ou imagens universais abstratas. Essas
representações originais ou arcaicas, com imagens similares
presentes em diferentes culturas dizem respeito aos
comportamentos e impulsos vitais comuns a todos os homens, e
ainda permanecem ativas em nosso imaginário coletivo.
Sobre esse legado histórico, Jung relata que o homem “possui
muitas coisas que ele nunca adquiriu, mas herdou dos
antepassados. Não nasceu tabula rasa, apenas nasceu
inconsciente. Traz consigo sistemas organizados e que “estão
prontos a funcionar numa forma especificamente humana; e isto ele
deve a milhões de anos de desenvolvimento humano”.[xxi]
As imagens arquetípicas são a base e a motivação de toda a vida
psicológica humana, e têm grande poder. Nessa profunda matriz
energética chamada Inconsciente Coletivo, podemos encontrar o
arquétipo da Grande Mãe, do Pai, do Herói Solar, da Sombra, do
Velho Sábio, do Salvador da Pátria, do Puer, do Curador, etc.
Para exemplificar o universo arquetípico, temos as imagens
relacionadas ao princípio materno em diferentes civilizações. Como
neste texto escrito pela autora, a respeito do Arquétipo da Lua:
Adentrando a dimensão simbólica da Lua, em civilizações
remotas e em inúmeras culturas, podemos dizer que ela foi
adorada e cultuada de diferentes formas, sempre evocando o
princípio materno e feminino, a imagem do arquétipo da Grande
Mãe. Entendemos que a crença de que há uma conexão
bastante peculiar entre a mulher e a Lua tem sido
universalmente mantida, ou, dito de outro modo, essa foi uma
experiência humana arquetípica, projetada na Lua física do céu.
Em termos mitológicos, a Lua é a representação da Grande
Deusa ou Grande Mãe, patrona da fertilidade, concepção e
crescimento, tanto na vida vegetal, quanto animal ou humana.
Como Ártemis da antiga Grécia, ou Ísis do antigo Egito, ou
Shakti da cosmologia hindu, as deusas mães ou divindades
lunares regiam, além do ciclo anual da vegetação, o ciclo
humano do nascimento, da vida e da morte.[xxii]
 
Ártemis de Éfeso, a Grande Mãe  

No Brasil, temos os cultos afro-brasileiros como a umbanda e o


candomblé, e ali encontramos os rituais feitos para os orixás
Iemanjá e Oxum. Como forças femininas da natureza, elas
representam o arquétipo materno, que se traduz como símbolos de
fertilidade, geração da vida e a proteção divina a todos os seres
humanos.
Como vimos, um dos postulados centrais da Psicologia Analítica
afirma que há uma predisposição subjetiva, a priori da existência,
que torna possível toda e qualquer experiência humana que nos é
dada pela noção de arquétipos. É importante salientar que não
herdamos os arquétipos em si, mas a capacidade de gerar as
chamadas imagens arquetípicas. O que significam essas
imagens?

Duas facetas do Arquétipo:

instinto e imagem
Os arquétipos são ao mesmo tempo imagens e instintos; são
como moedas que apresentam dois lados distintos e
complementares. A natureza instintiva de um arquétipo está
presente em inúmeras manifestações do mundo natural. Todos os
animais já nascem sabendo aquilo que instintivamente deverão
fazer para poder sobreviver. Podemos nos lembrar de inúmeras
ações surpreendentes relacionadas ao princípio arquetípico, vitais
para que as diferentes espécies da natureza não desapareçam: as
formigas buscando seu alimento de forma incansável, as rotas
migratórias dos peixes e das aves, as abelhas em ritmo frenético
construindo suas colmeias, os pássaros construindo seus ninhos e
buscando alimento para seus filhotes. Tudo o que eles fazem de
forma instintiva para a manutenção da vida não foi ensinado, foi
herdado.
 

 
Assim, os arquétipos são também padrões de comportamento
herdados (patterns of behavior), e este é o aspecto biológico do
arquétipo. Podemos percebê-los facilmente em comportamentos
instintivos presentes em toda a vida animal, que sempre se repetem
e não mudam. Na manifestação do instinto é perceptível uma ação
ou vontade, ordenadas de forma inteligente, em direção à
adequação ao objeto e à perpetuação da vida. Os instintos em si
não são criativos, pois constituem uma organização estável, ou seja,
são automáticos e repetitivos.
Para Jung, do ponto de vista psicológico há cinco grupos
principais de fatores instintivos, a saber: a fome, a sexualidade, a
atividade, a reflexão e a criatividade. A fome como impulso de
autoconservação, a sexualidade como instinto de preservação da
espécie, a ação, que é inerente a todos, o instinto criativo e a
reflexão, aspecto mais abstrato, inerente ao ser humano. Sobre o
instinto de reflexão, Jung explica:
 
Há um outro instinto, diferente do impulso a agir e, enquanto
sabemos, especificamente humano, que pudéramos chamar de
instinto de reflexão.(...) A reflexio é um voltar-se para dentro,
tendo como resultado que, em vez de uma reação instintiva,
seja uma sucessão de conteúdos ou estados, que podemos
chamar de reflexão ou consideração. Assim, a compulsividade é
substituída por uma certa liberdade, e a previsibilidade por uma
relativa imprevisibilidade. (...) A reflexão é o instinto cultural par
excellence, e sua força se revela na maneira como a cultura se
afirma em face da natureza.[xxiii]
 
Pela teoria junguiana há uma plasticidade que permite ao
indivíduo, uma vez se percebendo como um ser cultural, ter a
capacidade de viver e desfrutar de experiências criativas e
imprevisíveis ao longo da vida. Desta forma, o instinto psiquizado
ou modificado torna-se uma experiência que permite a
transformação; este é um ponto a ser destacado em sua teoria. O
instinto, ao perder sua característica da compulsividade e de
repetição, nos faz compreender a grande importância da noção de
psiquização no processo de individuação. Trata-se, aqui, de um
dos conceitos centrais da escola junguiana, o objetivo do processo
terapêutico que permitirá a esse indivíduo tornar-se cada vez mais
aquilo que ele realmente é. Na psicologia de Jung a individuação
não é só um conceito, mas também o objetivo da prática
psicoterapêutica, como veremos mais adiante.
Na psicologia analítica, há o entendimento de que o arquétipo é
como uma fôrma, uma moldura, sendo oportuno dizer que há uma
organização individual que é única para cada pessoa. Por exemplo,
todos nascemos de uma mãe, e com uma imagem a priori de mãe,
uma vez que ela já existe em estado latente, pois é arquetípica,
comum a todos. No entanto, a imagem ou a experiência que cada
um possui a respeito de sua própria mãe é única e intransferível.
Para Jung, cada indivíduo já nasce com uma fôrma do mundo, que
é uma matriz ou imagem virtual, mas esta fôrma vai adquirindo
conteúdos à medida que as experiências arquetípicas vão surgindo
no desenvolvimento do indivíduo durante sua vida; nascimento,
infância, adolescência, sexualidade, casamento, filhos, maturidade e
finalmente a própria morte. Para cada fase da vida, novas imagens
se tornam disponíveis para a consciência e esse padrão cíclico de
crescimento está relacionado com fatos empíricos da existência.
Ainda sobre o arquétipo materno, cito Sasportas:
 
Um arquétipo pode ser definido como a representação mental
de um instinto. Pelo fato dos seres humanos existirem há tanto
tempo, eons de tempo e processos evolutivos construíram e
estruturaram em nossa psique certas perspectivas que foram
transmitidas de geração a geração- uma espécie de “célula de
sabedoria”. Uma de nossas expectativas inatas é a de que deve
haver uma mãe ou, para ser ainda mais exato, a de que deve
haver um bico de seio. Ainda no útero esperamos que haja um
mamilo – nossa memória celular é portadora dessa expectativa.
Em nossa célula-memória também há a expectativa de um pai,
além da perspectiva de crescimento e morte. Essas imagens
existem em estado latente, antes mesmo de termos a real
experiência dessas coisas.Já nascemos com uma imagem de
mãe, com uma imagem deste arquétipo; e já nascemos com
uma imagem do pai, uma imagem do nascimento, uma imagem
do crescimento, outra da morte, etc. Mas cada pessoa tem
imagens ligeiramente diferentes acerca destes fenômenos
arquetípicos.[xxiv]
 
A predisposição inata é também defendida pela astrologia
psicológica ou arquetípica, pois o mapa natal, enquanto
possibilidade virtual, contém essas imagens em estado latente.
Assim, as predisposições imagéticas reveladas pelos símbolos
astrológicos da carta natal indicam tendências a uma determinada
forma de apreensão da realidade.
Marie-Louise Von Franz, que colaborou muitos anos com Jung
em inúmeras pesquisas, traduções e publicações, estudou
profundamente o simbolismo dos contos de fadas que nos permite
entender melhor o que a aparente simplicidade das imagens, fala a
todos de forma tão tocante. A respeito dessas formas estruturais da
psique diz ela:
 
Chapeuzinho Vermelho

 
Contos de fadas são a expressão mais pura e mais simples dos
processos psíquicos do inconsciente coletivo.
Consequentemente, o valor deles para a investigação científica
do inconsciente é sobejamente superior a qualquer outro
material. Eles representam arquétipos na sua forma mais
simples, plena e concisa. Nesta forma pura, as imagens
arquetípicas nos fornecem as melhores pistas para a
compreensão dos processos que se passam na psique coletiva.
Nos mitos, lendas ou qualquer outro material mitológico mais
elaborado, atingimos as estruturas básicas da psique humana
através de uma exposição do material cultural.[xxv]
 
Como vimos anteriormente, tanto a estrutura do corpo como da
psique, são resultados de um processo de adaptação e evolução
continuada; em nossa estrutura cerebral há várias camadas que
foram se sobrepondo durante o processo evolutivo, assinalando a
historicidade da nossa psique humana. Dito de forma mais simples,
cada indivíduo possui o seu inconsciente pessoal e familiar, mas ele
está imerso também no inconsciente de toda a humanidade, que
vem a ser essa camada mais profunda da psique humana, como
vimos no início do capítulo.
Para ratificar essa importante questão teórica, cito Jung:
 
O Inconsciente Coletivo não é, de forma alguma, um canto
obscuro da mente, mas o poderoso depósito de experiências
ancestrais acumuladas por milhões de anos. O eco de
acontecimentos pré-históricos, aos quais cada século adiciona
uma infinitesimal pequena quantidade de variação e
diferenciação. Como o inconsciente coletivo é, em última
análise, um depósito de processos terrenos encravados na
estrutura do cérebro e do sistema nervoso simpático, ele
constitui na sua totalidade uma espécie de eterna e atemporal
imagem-do-mundo que se contrapõe a nossa visão consciente e
momentânea do mundo.[xxvi]
 
Os arquétipos contêm uma reserva inesgotável do conhecimento
antigo sobre as profundas relações entre o homem, o Cosmos e a
natureza. Vamos ver em seguida como o simbolismo astrológico se
manifesta e expressa simbolicamente as experiências arquetípicas
de todos nós.
 
A Astrologia é arquetípica

Vimos no capítulo I que a Astrologia é fundamentada em padrões


ou princípios arquetípicos, e que os símbolos astrológicos são a
expressão de imagens primordiais, encontradas em inúmeras
civilizações remotas. Este vasto campo de conhecimento se vale de
uma complexa linguagem simbólica que nos permite criar uma
identificação entre o homem e o universo; para muitos estudiosos
ela é o estudo comparado entre o céu e a Terra.
Como um campo de conhecimento que observa os ciclos da
natureza, a astrologia funcionou como uma medida de tempo que
deu origem aos calendários, serviu como base para a cosmologia de
algumas grandes religiões do Ocidente e Oriente, tornando-se
depositária das projeções de imagens das antigas divindades da
humanidade. Como escreve Freitas:
 
Mas de todos os recursos “mágicos” criados pela humanidade, a
Astrologia sempre foi o mais encontradiço; todas as culturas,
independente de sua localização geográfica, condições
climáticas e grau de desenvolvimento comercial, agrícola ou
artesanal, tiveram algum nível de prática astrológica. Por uma
simples razão: como diz o ditado popular, o sol nasce para
todos!
Isto é: em todas as latitudes e longitudes, e em todas as épocas,
o ser humano teve sobre si o céu e os astros, em sua
inexorável, porém ritmada mutação; gradativamente no suceder
de incontáveis gerações, nexos de “coincidência” foram
observados e registrados, permitindo o acúmulo de informações
sobre os padrões que tendiam a se repetir, independentemente
das condições que parecessem predominar.[xxvii]
 
Hemisphaerium Coeli Australe, celestial map published in Atlas Coelestis

in quo Mundus Spectabilis, Johann Gabriel Doppelmayr, 1730

A estrutura astrológica engloba a astronomia, a matemática, a


medicina, a psicologia, e contém os aspectos centrais daquilo que
chamamos de civilização, a realidade criada pelo próprio homem.
Os doze signos que compõem o Zodíaco são considerados como
campos de energia, indicando padrões de comportamento ou
princípios arquetípicos formativos universais, presentes em toda a
manifestação da vida, seja ela individual ou coletiva.
 
Os planetas são a representação simbólica dos impulsos,
necessidades e motivações humanas e servem como agentes
catalisadores de funções psicológicas específicas. São modelos
simbólicos universais de energia e das ações humanas, dotados de
grande dinamismo psíquico, que apontam a dinâmica arquetípica
celestial num determinado momento, indicando a natureza do
tempo qualitativo.
Alguns exemplos: Sol: representa o senso de individualidade, a
força criativa, o impulso de ser, criar e atrair. Júpiter: Princípio de
expansão e desenvolvimento do ser, através da fé e do
conhecimento. Vênus: impulso social e amoroso, necessidade de
harmonia, partilha e cooperação. Marte: a força da ação, da
liderança, a batalha pela vida.
Esse cosmos arquetípico pulsa e vive em nossas mentes e
corações há milênios. Ele abarca a contínua dança dos planetas
através das constelações que compõem a partitura da harmonia da
criação, presente na música das esferas. Esse cosmos celestial é
também o arcabouço das fantásticas narrativas míticas dos deuses
e deusas gregos, que enchem nossas vidas de propósito e sentido.
Não por acaso, as divindades gregas têm o mesmo nome que os
planetas no céu.
As palavras de Plotino, filósofo mais influente do período
posterior da antiguidade clássica, remetem diretamente a esse
entendimento: “As estrelas são como letras, as quais se inscrevem
no céu a cada momento... Tudo no mundo está cheio de signos...
Todos os eventos são coordenados... Todas as coisas dependem
umas da outras; como foi dito, Tudo respira em uníssono”.[xxviii]

Zodíaco, a Anima Mundi


O Zodíaco é um símbolo universal e arquetípico. Em sua forma
circular, com doze divisões e dez planetas, ele é encontrado em
inúmeras culturas antigas, ancestrais, tais como Mesopotâmia,
Egito, Grécia, Pérsia, Índia, China. Expressando a fonte perene da
energia natural, humana e cósmica, ele simbolicamente reflete a
correspondência entre os eventos astronômicos e os eventos
humanos. Essa visão da Astrologia está contida no conhecido
axioma hermético que afirma: “O que está acima é como o que está
abaixo” - a correspondência entre o homem como um microcosmo
em relação ao macrocosmo. Nessa concepção de universo tudo
está interconectado através de um propósito de ordem e significado.
O Zodíaco era chamado pelos astrólogos e filósofos da
Antiguidade a “alma da Natureza”, ou a “anima mundi”, que é
sempre apreendida como matriz da vida - aquela que dá forma e
ordem à vida. Dito de outra forma, em termos psicológicos, as
constelações zodiacais no céu são representações dos chamados
arquétipos do Inconsciente Coletivo, que aparecem em forma de
projeções do espírito humano, com incríveis imagens e histórias que
retratam o psiquismo da humanidade como um todo.
É importante compreendermos que na Astrologia os signos não
são influências vindas das constelações, mas sim campos
magnéticos vibratórios que se irradiam de uma fonte de vida, que
para nós é o Sol. Assim, os antigos usavam os desenhos
imaginários que as estrelas faziam no céu noturno para nomear as
constelações - que simbolizam os campos de energia, que são os
doze signos zodiacais.
 
Zodíaco, círculo dos animais. Ilustração de Intereni Kazki.

Zodíaco vem da palavra grega zôé que quer dizer vida e diakos
que se traduz por caminho. Mas a etimologia de zôé contém zôon,
que significa animal, assim o Zodíaco pode ser traduzido ou
considerado como a rota ou caminho da vida, ou “círculo dos
animais”.
Giordano Bruno, teólogo italiano do Renascimento definiu
funções específicas para a “alma do mundo”, como prover vida
vegetativa, capacidades sensíveis, assim como a beleza e o mundo
como um todo:
 
Se, então, o espírito e a vida são encontrados em todas as
coisas e preenchem toda a matéria em vários graus, então eles
são o ato real e a real forma de todas as coisas. Portanto, a
alma do mundo é o princípio constitutivo formal do universo, e
de qualquer coisa que o universo inclua; quero dizer, se a vida é
encontrada em todas as coisas, então a alma é a forma de todas
as coisas; é o que controla a matéria em todos os aspectos e
predomina nos compostos, opera a composição e a consistência
das partes.[xxix]
 
Sobre a importância do número doze encontramos:
 
“Os 12 caminhos de vida ou, de outro ponto de vista, os 12
estágios de crescimento, não são exclusivos da astrologia. Se
observarmos de perto a tradição cristã, veremos que os 12
apóstolos são, em alguns aspectos, representantes de 12 tipos
humanos... O número 12 também é encontrado nos 12 filhos de
Jacó, os ancestrais dos 12 tribos de Israel. Nem esqueceríamos
os 12 portões de Jerusalém, conforme descrito no Apocalipse. O
número 12 também desempenha um papel importante em
outras culturas. Assim, o saber védico possui suas 12 Adityas,
ou 12 aspectos do “Deus do Caminho Solar”, que se manifestam
como 12 seres divinos. [xxx]
 
Entendemos que cada indivíduo possui uma base instintiva, dada
a priori, e também possui as imagens primordiais, que já estão
dadas a partir do mapa de nascimento. Se de um lado a estrutura
zodiacal é universal, temos a qualidade da experiência que é
individual, e que é dada no mapa astrológico, que é calculado pela
data, hora e lugar onde nasce o indivíduo. O mapa é como uma
semente que guarda de forma latente todas as potencialidades da
criança recém-nascida.
Um tema mitológico é também astrológico, uma vez que seus
símbolos estão intimamente entrelaçados e dizem respeito a
estruturas psíquicas semelhantes a todos os seres humanos. Esses
símbolos, sejam os signos, planetas, elementos, casas ou aspectos,
compõem uma espécie de partitura zodiacal, cuja melodia segue
uma ordenação sincrônica entre os fenômenos celestes e os
eventos terrestres. Eles não são causais e nem deterministas, não
devem ser interpretados dentro de uma relação de causa e efeito,
pois são compreendidos num contexto analógico, dentro do
princípio das correspondências. As histórias míticas relacionadas
aos arquétipos zodiacais são internas e externas, refletindo a alma
de uma pessoa, seus deuses regentes e seu destino. Um tema
mitológico é também astrológico, uma vez que seus símbolos estão
intimamente enraizados e entrelaçados no Inconsciente Coletivo.
Diz Sicuteri sobre o Zodíaco:
Julgamos que a vida não poderia ser vivida e expressa na sua
mais íntima profundidade – mesmo inconsciente - se os
símbolos não viessem em nossa ajuda. E é com a ajuda deles
que podemos traduzir em linguagem aquilo que sentimos dentro
de nós. Portanto, o símbolo é a imagem que criamos a respeito
de um conteúdo interior que transcende a consciência. No caso
da astrologia, o símbolo encerrado no Zodíaco e nos planetas é
o ponto de encontro, a soldagem dominante entre o mundo
psicológico e espiritual do homem (microcosmo) e o universo
dos astros no céu (macrocosmo).[xxxi] [xxxii]
 
 
Eclíptica [xxxiii]
 
 

A simbologia dos doze signos zodiacais


Já sabemos que a astrologia contém uma estrutura mitológica e
arquetípica, se compreendermos que a essência dessas imagens e
padrões pré-ordenados está na base de toda a criação humana.
Cada signo pressupõe uma jornada mítica e todas as imagens
simbólicas que lhe são inerentes. Um signo não descreve só um tipo
de comportamento ou personalidade; ele contém um padrão de
desenvolvimento, uma história dinâmica a ser vivida.
Vamos entendê-los melhor?
ÁRIES
Este é o primeiro dos doze signos e corresponde ao início do ano
zodiacal. É representado graficamente pelo Carneiro, com seus
grandes chifres. Áries representa e corresponde ao equinócio da
primavera que acontece no Hemisfério Norte, onde nasceu toda a
simbologia astrológica, tal qual a conhecemos também no
Hemisfério Sul. Nunca é demais lembrar que no hemisfério norte a
primavera tem uma energia especial, pois é o despertar e o
renascimento da vida. Toda a natureza celebra a chegada da
primavera, onde o calor dos raios de sol se sobrepõe ao frio, as
cores do dia e das flores se sobrepõem ao branco da neve. A água,
antes em forma de gelo, ganha movimento e aos poucos vai
retomando o leito dos rios, e os animais agora vão poder encontrar
seu alimento com maior facilidade.
Assim, este signo é marcado pelo arquétipo dos inícios, a
centelha divina que traz a vida, o impulso para a ação e a imposição
da vontade pessoal. No mapa astrológico individual Áries encontra
correspondência com o signo Ascendente, que é também primeira
casa do mapa de nascimento e que contém doze casas. Está
relacionado ao momento do nascimento, o “dar à luz”. É o sopro da
vida, o momento em que o indivíduo respira pela primeira vez, em
que vê e é visto pelos olhos do mundo externo. Áries é o signo do
“start”, a energia de ação, da força e da coragem para vencer, lutar
pela vida, da vontade e assertividade para a afirmação da
individualidade: eu sou!
Relacionamos ao signo de Áries tudo o que está associado à
ação, impetuosidade, iniciativa, liderança, o entusiasmo pela vida. O
elemento que corresponde a Áries é o fogo, seu modo é cardinal e
seu planeta regente é Marte. Na mitologia grega encontramos essa
divindade em meio a muitas atribulações e lutas, uma vez que é
representado pelo guerreiro ou pelo soldado, cujas armas são uma
espada e seu escudo. Marte é o deus senhor das guerras e, nas
batalhas, precisa vencer um inimigo, animais ferozes, defender seu
rei e seu território, ou sua própria vida. Sua expressão fundamental
se refere à coragem audácia, assertividade, à imposição da
vontade. Como arquétipo de herói, Marte representa a necessidade
de conquistar algo ou alguém que é importante para ele e para o
mundo. Mas natureza desse arquétipo pode ser também a
agressividade como instinto de sobrevivência, a violência, a
crueldade, a arrogância, a ausência de ponderação e reflexão.
TOURO
O segundo signo zodiacal pertence ao elemento terra e ao modo
fixo. É graficamente representado por um touro, por vezes ao lado
de elementos da natureza tais como a terra cultivada, as flores ou
uma mulher jovem e bela. Temos neste arquétipo o universo criado,
a energia vital de Áries se condensa agora na matéria. Touro é um
arquétipo de fertilidade, dos alimentos, daquilo que é a base de
sustentação da vida. O ser que nasceu agora precisa de comida e
de segurança física para poder sobreviver. É a energia da
estabilidade, da força terrena, da continuação da vida. Touro se
relaciona com os cinco sentidos, e com o prazer que deles advém,
em especial o olfato e o paladar. Touro está relacionado com a
segunda casa zodiacal, que nos fala de talentos e recursos
materiais, o dinheiro, finanças. Com a combinação do elemento
terra e modo fixo, este signo possui um ritmo lento, estável e
constante. Expressa o apego ao mundo material, às formas
tangíveis, a subordinação ao que é estável e seguro. É regido por
Vênus, a deusa da beleza, da sensualidade, dos desejos e do amor.
Sabemos que todos os símbolos têm múltiplos significados e
esse planeta é também o regente do signo de Libra. Ressaltamos
neste signo o aspecto de Grande Mãe, em que Vênus/ Afrodite é
diferente das outras divindades femininas ou maternas: ela recebe
todas as sementes, mas não está interessada na identidade do
semeador. Personifica a natureza em estado puro, e seu corpo é
sagrado. Ao contrário das outras deusas que apareciam vestidas,
era sempre retratada nua em estátuas e quadros. Vênus tinha,
como as demais deusas femininas, o poder de fertilizar a terra,
propiciando as boas colheitas. No contexto terreno, o seu poder de
atração estendia-se também aos seres humanos e aos animais,
como um símbolo da sensualidade e da procriação, o que permitiria
a perpetuação das espécies. Na mitologia existem muitas histórias a
respeito de Vênus para os romanos, e Afrodite, para os gregos, que
nos contam da sua extraordinária beleza, sensualidade, aventuras
amorosas, sua capacidade de atração que se manifestava como a
força arquetípica irrefreável da paixão.
Representado sempre ao lado de Afrodite/Vênus, Eros ou
Cupido, conhecido por múltiplas genealogias, é considerado por
Hesíodo o mais belo os deuses, aquele que, através da força do
amor, transtorna o juízo dos homens e muda o curso de seus
destinos (ou do destino do mundo). Sua imagem é a de um menino
alado e travesso que se diverte ao ferir o coração dos homens com
suas flechas envenenadas de amor e paixão. Na verdade,
Eros/Cupido e Afrodite/Vênus representam a mesma coisa. Ambos
expressam o arquétipo do amor, o desejo de união ou conexão
amorosa, o constante pulsar humano em buscado seu
complemento.
Vênus também amou Adônis, cuja beleza a encantou. Essa
paixão intensa despertou ciúmes em Marte que tramou uma
vingança fatal, atraindo-o para uma caçada, e ali o jovem foi
mortalmente atacado por um javali. Vênus correu ao seu encontro,
mas o encontrou já sem vida. Desconsolada, recolhe algumas gotas
do seu sangue e com elas rega a terra. Assim nasceram as
anêmonas, as primeiras flores da primavera, e que se tornaram o
símbolo da vida efêmera. Espalhado pelo chão, o sangue de Vênus
ferido pelos espinhos da mata, fez nascer rosas vermelhas.

GÊMEOS
Regido por Mercúrio, este signo representa o arquétipo da
comunicação, da inteligência, do movimento e do aprendizado. Está
relacionado à terceira casa zodiacal, ao modo mutável e ao
elemento ar, simbolizando o poder intelectual, a dualidade da vida
que nos é dada pelos princípios opostos complementares, presentes
em toda a manifestação de vida: masculino e feminino, o Sol e da
Lua, o dia e a noite, o céu e a terra. Seguindo o processo evolutivo
do zodíaco, a criança (ou indivíduo) agora vai aprender, imitar e
assimilar do seu meio ambiente o que precisa saber para ganhar
sua autonomia primária. Começa a andar e a falar, iniciando o
processo de socialização e aprendizagem, que será vivenciada em
sua interação com irmãos, primos, vizinhos e a escola. Na mitologia
grega Mercúrio, ou Hermes para os gregos, era o filho mais
inteligente de Zeus, o mensageiro dos deuses. Era a divindade que
protegia as estradas, os comerciantes e os ladrões. Hermes possuía
o talento e a perspicácia da boa oratória, de intermediação e trânsito
livre entre os três reinos, que eram os mundos ctônicos, terrestres e
celestiais. Com suas sandálias aladas, um capacete que o tornava
invisível e o seu caduceu, Hermes Psicopompo tinha o poder de
conduzir as almas dos mortos para o mundos subterrâneos e
infernais do Hades. Essa divindade não tinha um lugar determinado,
pois vivia nas fronteiras, nas encruzilhadas e nas passagens.
Hermes era também a divindade da astúcia, versatilidade e
sabedoria, da magia e da gnose. A dualidade da natureza
geminiana é também ilustrada por outro mito grego, o de Castor e
Pólux, os gêmeos Dióscuros. Eram filhos de Zeus e Leda, esposa
do rei Tíndaro de Esparta. Zeus teve que se transformar em cisne
para poder seduzir Leda, que botou dois ovos após essa união. De
um, nasceram Pólux e Helena, filhos e Zeus, portanto imortais. Do
segundo nasceram Castor e Clitemnestra, filhos mortais de Tíndaro.
Castor e Pólux viveram sempre juntos numa amizade fraterna,
embora com pais diferentes. Um dia, na adolescência, lutaram com
outro par de gêmeos, Linceu e Idas, e nessa luta Castor foi morto.
Em uma versão para esse mito dizem que Castor e Pólux foram
transformados em estrelas por Zeus, e assim ficariam para sempre
juntos na constelação de Gêmeos. Em outra versão conta-se que,
desesperado ao ver o seu irmão morto, Pólux suplica a seu pai que
o traga de volta à vida. Compadecido de seu sofrimento, Zeus
decidiu então que os irmãos passariam metade do ano nos infernos
de Hades, e a outra metade na morada celeste do Olimpo. Na
cultura grega Castor estava ligado à luz matinal, e Pólux estava
conectado com a luz do crepúsculo. Temos aqui presente a ideia de
polaridade, onde luz e trevas coexistem, e assim como a noite e o
dia, o bem e o mal, são também inseparáveis. Na Astrologia
Mercúrio representa a comunicação, a oratória, a dualidade da vida,
a inteligência, a intermediação, as trocas, a curiosidade, a
jovialidade do espírito.

CÂNCER
Câncer corresponde ao solstício de verão no hemisfério Norte.
Ele é o primeiro dos signos da água e o mundo aquático diz respeito
à origem da vida, à mãe, é o arquétipo materno, relacionado à
infância, à proteção e segurança emocional que advém da família e
da nossa ancestralidade. Câncer é a também a quarta casa
zodiacal, também chamado de Fundo do Céu na astrologia, que tem
a ver com nossas heranças psíquicas, a nossa raiz matriz afetiva, o
inconsciente familiar. É um signo que pertence ao elemento água e
ao modo cardinal, regido pela Lua, o princípio feminino da natureza
que diz respeito ao mundo da alma, da subjetividade do indivíduo,
seus sonhos, sua intimidade. A Lua astrológica representa a
memória emocional da criança, que é construída por emoções e
sensações corporais como calor, frio, sono, contato físico, dor,
amamentação, sons e imagens. O indivíduo agora pertence a um
grupo familiar, sua base e as suas raízes ali estão ancoradas. Em
analogia com nosso satélite que gira ao redor da Terra, modulando a
luz e o calor do disco solar, assim é a mãe, que gira em torno do
bebê, satisfazendo e atendendo suas necessidades básicas.
Também o homem primitivo dependia muito da Mãe natureza, e
para poder sobreviver deveria se submeter a ela, que embora
generosa e provedora, era por vezes imprevisível e destrutiva. Em
termos mitológicos, a Lua é tanto a vida vegetal, quanto animal ou
humana. Como a deusa Ártemis da antiga Grécia, ou Isis do Egito
antigo, ou Shakti, divindade da cosmologia hindu ou como Jaci, a
deusa da noite e da Lua na nossa cultura indígena tupi-guarani, as
deusas lunares regiam, além do ciclo anual da vegetação, o ciclo
humano de nascimento, da vida e da morte. Ártemis era
considerada pelos gregos uma deusa virgem, que quer dizer “uma
em si mesma”, pois agia por conta própria, e não dependia de
relacionamentos com homens. O mito de Ártemis diz que, logo ao
nascer, a deusa acabou sendo a parteira de sua própria mãe, Leto,
que deu à luz seu irmão Apolo. Era invocada pelas gestantes que
pediam a sua proteção para a hora do parto. Independente, tinha
uma natureza instintiva e também cruel com quem não a
respeitasse. Como divindade caçadora, era sempre representada ao
lado de cervos, cães ou lobos.

LEÃO
O signo de Leão, que é regido pelo Sol, pertence ao elemento
fogo a ao modo fixo. Representa uma importante etapa do
desenvolvimento humano, ocupando a quinta casa zodiacal, onde
há o nascimento da consciência e da noção de “indivíduo”. No
hemisfério norte Leão corresponde ao auge do calor de verão, é o
segundo estágio do elemento fogo, que se iniciou em Áries, e que
mostra a sua plenitude na exuberância das flores, dos frutos e das
colheitas. Sob a regência solar, esse arquétipo representa a paixão,
a alegria de viver, a criatividade, o poder da atração, a força da
vontade e a perpetuação da vida. A passagem diária do Sol no céu
é um tema mitológico sempre presente em antigas civilizações. Na
mitologia grega, encontramos o deus Apolo como a divindade solar
por excelência. Conta o mito que Apolo era um jovem de rara
beleza, com seus cabelos dourados e a cabeça cercada de raios.
Precedido por sua irmã Aurora, ele percorria a abóboda celeste
todas as manhãs com seu carro de fogo, levado por quatro cavalos.
Ao final das tarde, próximo ao poente, chegava aos oceanos, onde
banhava seus cavalos fatigados. À noite descansava num palácio
de ouro e pela manhã recomeçava um novo trajeto pelo céu. Como
uma divindade das profecias, era considerado pelo mundo grego
“aquele que tudo vê”, pois diante de sua luz não poderia haver
mistérios. Apolo era o deus da agricultura, da música, da poesia e
das artes em geral. Apolo concentrou, de acordo com seu mito,
funções bastante diversificadas. Era também deus da agricultura, da
medicina e da cura, sintetizando uma divindade complexa, mas que
certamente sempre esteve relacionada a um ideal de beleza, honra,
cultura e sabedoria. Os chamados deuses solares, como Apolo/
Hélio na Grécia, Hórus no Egito e Mitra para os persas eram
cultuados como heróis, simbolizando a inegável força criadora do
Sol. Na astrologia o Sol, como fonte de luz e vida, está associado ao
princípio masculino da natureza, ao Logos, simbolizando o pai, a
consciência, a força vital, o espírito e a autoexpressão. O Sol
astrológico é o doador da identidade do indivíduo, a “chamada para
a aventura” do herói solar em sua eterna busca de conhecer e
desvendar o si-mesmo, tornar-se aquilo que é, tendo em vista
desenvolver seus recursos e potenciais, encontrar um ideal ou
propósito para a própria vida. Vimos que a Lua como um princípio
feminino representa a mãe, o inconsciente, a alma, a subjetividade.
Como pares de opostos, a Lua e o Sol abrangem as polaridades da
natureza, a vida e a morte, o feminino e o masculino, o dia e a noite,
alma e o espírito, tudo o que nos remete ao princípio da dualidade e
da unidade dos contrários. Falaremos mais do simbolismo solar no
capítulo VI.

VIRGEM
Este signo está associado ao arquétipo da sabedoria das leis da
natureza. Esse signo é regido também pelo planeta Mercúrio, que
no contexto evolutivo se manifestará como a mente racional e
analítica que se sobrepõe aos instintos e paixões de Leão, o signo
anterior a ele. No campo arquetípico de Virgem, o indivíduo quer
aperfeiçoar a si mesmo, através da análise e da razão; temos então
o aprimoramento dos potenciais criativos através do aprendizado,
do pragmatismo e da lógica. Processo análogo a um cristal que
após ser lapidado poderá então mostrar a sua natureza intrínseca e
seu brilho. Processos de terapia ou de análise bem realizados tem o
mesmo efeito, no sentido de, aos poucos, poder de curar e
transformar as sombras e limitações internas do indivíduo, fazendo
emergir a sua verdadeira natureza, deixando-o mais livre dos
impulsos destrutivos ou inconscientes. Virgem é o segundo signo do
elemento terra, seu modo é mutável, onde surge a consciência do
corpo, seu funcionamento e fisiologia, sendo assim relacionado com
a saúde no sentido mais amplo. É comum associarmos esse signo
ao mito de Deméter, que representava para os gregos a terra
cultivada. Conta o mito que sua filha Perséfone havia sido raptada
por Plutão ou Hades para com ele habitar os mundos subterrâneos.
A mãe desesperada sai em sua procura por vários dias e noites,
sem êxito. Infeliz e irada, deixa a terra seca e estéril e isso significa
que o homem não terá mais o que comer. Ao final do mito, Zeus, o
grande juiz do Olimpo, intercede a favor de Demeter, decidindo que
Perséfone ficaria seis meses do ano com a mãe e seis meses com
seu marido. O período em que está com sua mãe corresponde aos
meses da primavera e do verão, e o tempo em que passa com seu
marido, abaixo do solo, corresponde ao outono e ao inverno. Esse
mito, aqui descrito de forma bastante simplificada, simbolizava para
a cultura grega o ciclo das estações da natureza, e as formas de
plantio que produziriam bons alimentos. E também os ciclos
geracionais, das mães e suas filhas, em que as sementes são
plantadas no seio da terra, ou seja, no ventre feminino, para que
possam ser germinadas, o que nos remete aos princípios da
perpetuação da espécie humana, da renovação da vida,
simbolizados pelas estações do ano.
Mercúrio, como regente do signo de Virgem nos fala da
inteligência crítica, seletiva e ordenadora. O arquétipo de Virgem
representa na astrologia as funções psíquicas e cognitivas da
inteligência pragmática, detalhista e minuciosa, sempre focada na
realidade material e objetiva. Neste signo, o indivíduo busca o
aperfeiçoamento da sua personalidade, está mais consciente de
seus talentos, se prepara para a vida em sociedade, e seus ideais
deixam de ser meramente pessoais.

LIBRA
Libra é o sétimo signo zodiacal, momento em que tem início o
outono no hemisfério norte. Nesse ciclo, as noites e os dias se
equilibram em sua duração. Seu símbolo é uma balança com dois
pratos, com dois pesos ou as duas medidas que se equiparam.
Pertencendo ao elemento ar, que é relacionado à vida intelectual,
este signo representa a justiça, equilíbrio, a conquista do eu social,
a cooperação, a diplomacia, assim como as questões éticas, e
valores estéticos, os códigos morais da sociedade. Relacionado ao
modo cardinal, este signo manifesta uma disposição intensa para os
movimentos e para o enfrentamento das situações; nestas, será
necessário estabelecer relações e comparações entre os fatos para
que se chegue à justiça. Libra governa os casamentos, associações
e as uniões. É importante observar que para um libriano uma
relação não necessita obrigatoriamente de emoções, mas de
equilíbrio e compromisso. Os arquétipos da beleza e da harmonia
aqui estão representados pelo planeta Vênus, que no panteão grego
é a portadora da cultura, dos amantes do belo e dos artistas em
geral. Esse arquétipo personifica o amor, a justiça, a eterna busca
pelas parcerias. Assim, este signo apresenta um caráter mais social,
uma vez que não se limita apenas aos instintos e desejos que
precedem o ato sexual. Desta feita, seu aspecto erótico pode
transformar a libido e o simples prazer físico em algo que vai além, e
é esse o impulso que está presente em manifestações criativas ou
artísticas como a dança, a poesia, e a música. Nos mitos gregos
encontramos um paralelo entre Libra e Palas Atena, que foi gerada
e nasceu da cabeça de Zeus, com a ajuda de Prometeu. Gerada
apenas por seu pai, tinha um aspecto mais masculino e
independente, que faria prevalecer nela os atributos do logos e da
inteligência. Representada sempre com um escudo, um capacete e
uma lança nas mãos, era cultuada como uma divindade da
sabedoria e da justiça, temas vitais para os deuses olímpicos e os
cidadãos da antiga Grécia. Protegia os heróis e soldados em suas
sagas e batalhas. Com sua sabedoria, sabia criar estratégias de
guerra, indicando a hora certa para atacar ou para recuar. Nas
narrativas míticas, Palas Atena era muito habilidosa em trabalhos
manuais, era também a patrona dos tecelões, dos navegantes e dos
artesãos.
ESCORPIÃO
Escorpião é um signo que pertence ao elemento água e ao modo
fixo. Seu simbolismo é complexo e profundo, assim como a casa a
ele relacionada e seu regente Plutão. Esse signo simboliza o mundo
oculto e invisível, as emoções profundas da alma, as pulsões da
vida inconsciente, a sexualidade, a magia. É o arquétipo da morte e
renascimento e da transmutação da matéria. Escorpião é um grande
laboratório da alma, onde padrões familiares e emocionais
arraigados precisam se dissolver num processo alquímico doloroso
e por vezes, muito solitário. No hemisfério norte, o oitavo signo
zodiacal também corresponde ao ciclo do outono, estação na qual
se dissolvem folhas e raízes e a natureza vai se recolhendo para o
interior da terra. O símbolo da lagarta que por longo período fica
imóvel dentro de seu casulo escuro, para depois se metamorfosear
numa delicada borboleta, bem descreve os processos internos
relacionados a essa casa zodiacal. O animal escorpião, seu
símbolo, que é temido por seu ferrão venenoso, foge da luz e vive
no escuro, escondido em lugares inacessíveis e úmidos. Pode
atacar repentinamente sua presa, e diante de um perigo iminente é
capaz de provocar a sua própria morte. Os aspectos sacrificiais e as
mortes simbólicas vividas durante uma vida bem traduzem os ciclos
astrológicos de Plutão, ou Hades, que é o regente deste signo. No
panteão da mitologia greco-romana, ele era uma divindade
misteriosa e temida como o senhor absoluto dos mundos
subterrâneos e invisíveis, para onde iam os mortos. Em suas
atribuições estavam também o poder de tornar o solo fecundo e o
da germinação das sementes. Ele não tinha altares para ser
cultuado e tampouco era visto pelos mortais. Seu nome quer dizer
“riqueza”, pois tem o poder de revelar talentos e tesouros que se
tornam disponíveis depois de momentos de devastação da alma
humana. Hades ou Plutão era filho de Cronos e de Réa, era irmão
de Zeus e de Poseidon. Acreditava-se que durante a grande batalha
entres os deuses recebeu dos cíclopes um capacete que tornava o
seu portador invisível. Na partilha que se seguiu à batalha, coube-
lhe o controle dos mundos subterrâneos. Em analogia, podemos
dizer que não existem dúvidas sobre as riquezas minerais que estão
no fundo da terra, embora não possamos vê-las. Carl G. Jung
sempre se referiu aos poderes criativos e dinâmicos do
inconsciente, àquilo que está oculto ou adormecido, mas guarda em
si um potencial latente para uma nova vida ainda não vivida, ou uma
nova consciência. Da mesma forma, como o Plutão astrológico, que
representa o inconsciente, a sexualidade, a potência psíquica do
ser, aquilo que para renascer precisa, antes, morrer. Vimos
anteriormente, no signo de Virgem, a rica simbologia relacionada
aos ciclos das estações, onde Perséfone, como semente precisa ser
fecundada por Plutão, nos mundos invisíveis, abaixo de terra. Sem
eles não haveria renovação da vida, e esse constante nascer e
morrer da natureza é primordial na compreensão dos fundamentos
arquetípicos deste signo. Neste sentido, a morte simbólica significa
recomeçar, com uma nova consciência e uma nova atitude.
Veremos mais sobre o simbolismo de Plutão no capítulo V.

SAGITÁRIO
O signo de Sagitário pertence ao elemento fogo e ao modo
mutável, expressando o idealismo e visão metafísica do ser
humano. Esse signo zodiacal é regido por Júpiter, o rei dos deuses
na antiga Grécia, e simbolizado pela figura mítica do Centauro, que
tem a parte inferior do corpo de um cavalo e a parte superior de uma
figura humana. O símbolo fala por si; o Centauro tem em mãos um
arco e flecha que está dirigido para o céu ou para o divino,
simbolizando uma síntese da natureza animal e humana já
diferenciada: a imanência dos instintos e a busca constante pela
transcendência. Com a alma mais apaziguada e após cumprir as
grandes metamorfoses de Escorpião, o indivíduo busca por uma
elevação espiritual, pelo conhecimento e pela fé. Como arquétipo da
visão e da sabedoria, esse signo ocupa a casa nove zodiacal, a
área do saber, da filosofia, o portal para a universalidade, o que
permite fazer a ligação entre o humano e o plano sagrado. A energia
transmutada no corpo e na consciência se move para o plano
metafísico, onde a abstração permite ao indivíduo, através dos
símbolos, uma finalidade e um significado para a vida e para outros
planos de realização.
Como símbolo astrológico Júpiter representa a maturidade, a
sabedoria, o desejo de expansão, a fé, a elevação espiritual, assim
como a capacidade de julgamento, as leis e o poder judiciário, a
educação superior. Ele representa o pensamento abstrato, a
filosofia, a reflexão, e a capacidade que o homem tem para criar
símbolos. Na astrologia, Júpiter, em seu aspecto positivo,
representa a dignidade, o senso de justiça, a benevolência, o
otimismo, a generosidade, a devoção e proteção espiritual. Em seu
aspecto negativo está associado à confiança excessiva, à
arrogância, ao esbanjamento, imoralidade, megalomania,
exibicionismo, ausência de limites e à soberba. Na Grécia antiga, o
nome Zeus deriva de “Djeus”, que vem a ser “Luz do céu”, ou
“Doador da luz”; em Roma seu nome vem de “Diu-pater”, que
significa “ Deus Pai”. A Titanomaquia foi uma grande e longa batalha
entre os titãs e Saturno, de um lado, e de outro, Zeus e seus irmãos,
os Ciclopes e os Sem Braços; nesse emblemático e violento
confronto entre gerações, Zeus vence seu pai Cronos/ Saturno.
CAPRICÓRNIO
No hemisfério norte o signo de Capricórnio corresponde ao início
do inverno, quando temos o dia mais curto e a noite mais longa do
ano. A vida se recolhe, as cores da natureza cedem ao branco da
neve e do gelo, os animais buscam refúgio em cavernas e os
pássaros migram para lugares mais quentes. No Zodíaco,
Capricórnio pertence ao elemento terra e ao modo cardinal
corresponde à décima casa, no Meio do Céu, o que é um símbolo
de elevação social e profissional, do status, do legado das
realizações, da ambição, e da capacidade para servir ou influenciar
a sociedade como um todo. É regido por Saturno, o senhor do
Tempo, ou Cronos, da mitologia grega. Saturno representa o tempo,
que tudo consolida através das estruturas visíveis e sólidas, o
princípio da lógica e da razão. Este é o último planeta visível a olho
nu, mostrando assim os limites da natureza humana. É ele que rege
a concretização, a promoção e a integração dos valores, das leis
que devem estar presentes nas instituições que dão sustentação à
vida em sociedade. Na Astrologia mundial, Saturno também rege o
poder executivo, os políticos e o Estado. Em termos psicológicos
encontramos em Capricórnio os arquétipos do senex e puer, o pai e
o filho que se confrontam na luta pelo poder e pela renovação da
vida. No mito grego, Saturno/Cronos derrota e castra seu pai Urano,
usurpando o seu poder. Mais tarde, quando se torna pai, acaba por
devorar seus filhos assim que nascem, pois teme que estes façam o
mesmo com ele. Mas será vencido e destronado pelo filho caçula
Zeus, que se tornará o deus supremo e poderoso do Olimpo. Esse
mito será relatado com maiores detalhes no capítulo V.
No plano individual, o simbolismo saturnino está relacionado à
capacidade de realização, perseverança, disciplina, limites, coesão,
determinação e responsabilidade. Em seu aspecto mais sombrio,
nos remete aos processos de limitação, escassez, melancolia,
solidão, renúncia e às dores da alma. Por outro lado, existe uma
clara percepção de que são as crises e circunstâncias dolorosas
que levam o indivíduo a sair da inércia, desenvolver a humildade e a
paciência para que possa superar a repetição de modelos ou
padrões emocionais paralisantes e envelhecidos. O sofrimento tem
o poder de desenvolver a força da resiliência, a determinação, a
perseverança para que surja uma nova consciência. Saturno, como
o arquétipo do Velho Sábio e da maturidade da vida, nos fala do
poder criativo e restaurador da psique, da sabedoria que chega com
o passar do tempo. Não por acaso, sabemos que os alquimistas
trabalhavam com o intuito de transformar o metal chumbo em ouro,
ou seja, o ouro psíquico e espiritual, e não o ouro vulgar. Veremos
mais sobre Saturno no capítulo V.
AQUÁRIO
Aquário é o décimo primeiro signo do zodíaco, relacionado ao
elemento ar e ao modo fixo, representado pelo Aguadeiro, o homem
cósmico que, com sua ânfora, verte seu conhecimento acumulado
para toda a humanidade. Na mandala zodiacal simboliza os
arquétipos da liberdade e da fraternidade, que indicam que o ser
humano já pode libertar-se de sua individualidade egocêntrica e agir
motivado por ideais mais elevados e universais. Dentro do processo
evolutivo, o homo sapiens busca a sua independência, o não
convencional, a originalidade e o que ainda está voltado para o
amanhã. O grupo social é a sua meta e a raça humana é a sua
família. Regido por Urano, que na mitologia grega representa o céu
estrelado, esta divindade primordial dos espaços celestiais fora
gerada por Gaia, a deusa mãe que alimentava as montanhas, as
grutas e as florestas. Urano tinha o mesmo tamanho de Gaia, e
estava sempre deitado sobre ela, pois assim poderia fecundá-la o
tempo inteiro. Como o céu estrelado é masculino e a terra é
feminina, esse casal primordial de forças opostas gerou inúmeros
filhos, os Titãs e Saturno/Cronos. Na astrologia o planeta Urano
rege as invenções tecnológicas, o futuro, a intuição, a astrologia, o
progresso, a criatividade, a originalidade, as grandes descobertas
científicas que aceleram o desenvolvimento da espécie humana.
Urano atua no sentido de romper os paradigmas, desestruturando a
ordem já conhecida ou estabelecida, em nome da liberdade.
Um mito que bem representa a natureza aquariana é o de
Prometeu. Seu nome significa: “aquele que vê à frente”, pois tinha o
dom da antecipação. Ao ousar roubar o fogo sagrado dos deuses e
entregá-lo aos mortais foi duramente castigado por Zeus, que o
deixou acorrentado no monte Cáucaso, nos confins do mundo. E
uma águia, enviada por Zeus, diariamente devorava o seu fígado,
que voltava a crescer novamente durante a noite. Esse suplício
durou por anos a fio. Prometeu é um herói semidivino, um rebelde
com causa, cujo intuito era o de libertar os seres humanos de sua
natureza puramente instintiva e da submissão aos deuses.
Representa o anseio humano de evoluir através das novas idéias,
da tecnologia, o princípio humanizador evolutivo, a inteligência
humana e tudo o que chamamos de avanços civilizatórios. Sem o
fogo do conhecimento, o homem estaria condenado a viver na
escuridão das grutas e das cavernas. O fogo roubado jamais foi
devolvido, ou seja, o conhecimento adquirido nunca se perde, ao
contrário, sempre se renova.

PEIXES
O último signo do zodíaco, Peixes, nos remete ao arquétipo da
síntese e unidade da vida, ele é a somatória dos demais signos
anteriores, onde todas as experiências humanas se dissolvem em
um arcabouço psíquico comum a todos os seres, o inconsciente
coletivo da humanidade. Peixes e a casa doze do zodíaco estão
relacionados ao período final do inverno no hemisfério norte, em que
a neve começa a derreter e as chuvas umedecem a terra,
anunciando a chegada de um novo ciclo vital, a primavera. Esse é
um signo mutável, e assim constela tanto a dissolução das formas
quanto o renascimento da vida, do calor e das cores. Encerra um
grande ciclo cósmico e natural, e dá inicio ao signo de Áries. O
hieróglifo de Peixes é formado por dois peixes ligados entre si, mas
que nadam em direções opostas, mostrando a dualidade da vida, o
dia e a noite, o frio e o quente, o bem e o mal, a queda e a
ascensão. É também um símbolo de renovação e do eterno
movimento do fluir e refluir da vida. É o terceiro signo do elemento
água, nos reportando às águas dos oceanos para onde correm
todos os rios, a etapa final do próprio zodíaco, o fim e o início de um
novo ciclo. É regido por Netuno, divindade dos oceanos e das
emoções profundas, simboliza o grande útero da Mãe Natureza, de
onde emerge toda a vida. Na Astrologia esse planeta representa o
inconsciente, a vida psíquica, a imaginação, a inspiração, os
sonhos, o mundo invisível, o infinito, a utopia, a loucura, a ausência
de limites. Os mistérios, a devoção religiosa, a iluminação, o
misticismo, a fé, a compaixão e o amor universal também estão sob
a regência deste planeta. No mito grego, Poseidon/Netuno era filho
de Cronos e Reia, seus irmãos eram: Zeus, Hades, Hera, Demeter e
Héstia. Nas narrativas míticas, ele aparecia imponente com seus
cavalos brancos com patas de bronze e crinas de ouro. Quando seu
coche emergia do fundo do mar, as tempestades passavam, e os
monstros marinhos que ali viviam passavam a escoltá-lo. Após a
grande batalha olímpica entre Zeus e seu pai Cronos, Poseidon se
tornou senhor absoluto do elemento líquido, com a tutela dos mares
e dos oceanos. Também as fontes, os rios, as chuvas, assim como
as navegações estavam sob a sua proteção. Influenciava a
fertilidade do solo, propiciando o crescimento dos grãos e as boas
colheitas. Poseidon era sempre representado de pé, em forma
majestosa, com farta cabeleira, o busto nu, e segurando o seu
tridente em uma das mãos. O tridente é o próprio símbolo da
psicologia, das profundezas inconscientes que dominam nossa vida
psíquica, tanto individual quanto coletiva.
Diz Jung:
O inconsciente coletivo - até onde nos é possível julgar - parece
ser constituído de algo semelhante a temas ou imagens de
natureza mitológica, e, por essa razão, os mitos dos povos são
os verdadeiros expoentes do inconsciente coletivo. Toda a
mitologia seria uma espécie de projeção do inconsciente
coletivo. É no céu estrelado cujas formas caóticas foram
organizadas mediante a projeção de imagens, que vemos isto o
mais claramente possível. Isso explica as influências dos astros,
afirmadas pela Astrologia: estas influências mais não seriam do
que percepções introspectivas inconscientes da atividade do
inconsciente coletivo. Do mesmo modo, como as constelações
foram projetadas no céu, assim também outras figuras
semelhantes foram projetadas nas lendas e nos contos de fadas
ou em personagens históricas.[xxxiv]
 
Conclusão do Capítulo
As incursões no campo da Psicologia começaram a influenciar a
astrologia, de forma mais marcante, a partir da década de 1930.
Essa gradual assimilação começou a tomar forma com a publicação
do livro A Astrologia da Personalidade, pelo conhecido escritor,
músico e astrólogo francês, Dane Rudhyar. Este autor, apropriando-
se de conhecimentos de psicologia, que passava por um momento
de muita efervescência e criatividade, desenvolveu uma abordagem
filosófica da astrologia.
Rudhyar afirma em seu livro “Astrologia Humanista e Astrologia
Transpessoal” que se encantou com as ideias de Jung no ano de
1933. A partir dali, ele percebeu que poderia desenvolver uma séria
e conexões entre os conceitos junguianos e um tipo reformulado de
astrologia.
A partir desta importante publicação, em 1936 teve início um
positivo intercâmbio e entrelaçamento conceitual, com
aproximações teóricas, entre a Astrologia e a Psicologia Analítica.
Esse paralelo entre os dois campos de conhecimento começou a
dar frutos e inúmeras publicações surgiram dando início, muitos
anos mais tarde, ao que chamamos hoje de Astrologia Psicológica,
que conta com renomados estudiosos na Europa e EUA. Além de
Dane Rudhyar, temos Alexander Ruperti, Michel Gauquelin, Roberto
Sicuteri, Liz Greene, Stephen Arroyo, Robert C. Jansky, Robert
Hand, Howard Saportas, Richard Idemon, Christine Valentine,
Richard Tarnas, entre outros.
A Astrologia é uma linguagem que usa de uma sequência de
símbolos para criar identificação entre o homem e o universo; é o
estudo comparado entre o céu e a Terra. Na estrutura zodiacal, os
planetas são a representação simbólica dos impulsos, necessidades
e motivações humanas, servindo como agentes catalisadores das
várias funções psicológicas. Da mesma forma, os doze signos
zodiacais são energias psíquicas ou princípios arquetípicos
presentes em toda a manifestação da vida, seja ela individual ou
coletiva.
Entendemos que, em sua estrutura, a Astrologia é
essencialmente arquetípica. Fundamentada em padrões simbólicos
e imagéticos, comuns a toda humanidade, os símbolos astrológicos,
sejam signos ou planetas, são a expressão de um universo de
imagens primordiais que, como vimos anteriormente, são
encontradas em inúmeras civilizações antigas, o que nos remete à
ideia e ao conceito de Inconsciente Coletivo. Esses símbolos
zodiacais compõem uma espécie de partitura zodiacal cósmica, cuja
melodia segue uma ordenação sincrônica e analógica entre os
fenômenos celestes e os eventos terrestres
Já vimos no capítulo II que, para Jung, os arquétipos são
princípios universais, ideias estruturantes inatas ou herdadas, a
soma de todas as potencialidades latentes na psique humana, que
pertencem ao Inconsciente Coletivo. Representado na estrutura
zodiacal de diferentes culturas antigas, o riquíssimo substrato
psíquico arquetípico carrega consigo o legado extraordinário da vida
humana.
Com seus doze signos, doze casas, dez planetas e quatro
elementos, o Zodíaco é um grande espelho celestial no qual são
projetados, de forma simbólica, nossos impulsos humanos, seja de
ordem racional, passional, instintiva, cognitiva, espiritual, etc.
Modelos humanos ordenados e ordenadores que têm, desde
sempre, um extraordinário dinamismo psíquico e se atualizam
continuamente, adquirindo novas roupagens.
A astrologia psicológica abarca os valiosos conceitos da
Psicologia Analítica, uma vez que o arcabouço intelectual de ambas
apresenta muitos pontos em comum. Outras premissas teóricas
abrangem os postulados de vida potencial dada a priori, o aspecto
dinâmico do inconsciente e o propósito criativo e finalista da
existência, em que o desenvolvimento individual, vale dizer, a
própria vida, tem um significado.
Cito Jung numa carta ao astrólogo francês André Barbault, em
1954: “A astrologia consiste de configurações simbólicas do
inconsciente coletivo, que é o assunto principal da psicologia; os
planetas são deuses, símbolos dos poderes do inconsciente”.[xxxv]
Os símbolos astrológicos, sejam eles associados a histórias de
deuses e heróis ou sobre a origem das constelações, são projeções
de imagens internas do homem, criadas pelo coração do homem
para serem lançados ao céu a fim de povoá-lo de figuras, visões e
significados. Essa percepção nada mais é que a experiência
especular humana, a busca de uma ordem e significado para sua
existência.
Termino com a citação de Stanislav Grof, renomado médico e
psicólogo transpessoal, sobre estas imagens coletivas:
 
O pensamento astrológico pressupõe a existência de arquétipos,
princípios primordiais e atemporais que fundamentam, informam
e formam a estrutura do mundo material. A tendência para
interpretar o mundo nos termos dos princípios arquetípicos
surgiu inicialmente na Grécia e foi uma das características mais
notáveis da filosofia e da cultura grega. Os arquétipos podem
ser vistos de várias perspectivas diferentes. Nas epopeias
homéricas, eles tomaram a forma de figuras mitológicas
personificadas, como divindades, tais como Zeus, Poseidon,
Hera, Afrodite ou Ares. Na filosofia de Platão, foram descritos
como princípios metafísicos puros, as Ideias ou Formas
transcendentes. Eles possuíam sua própria existência
independente, em um reino inacessível aos sentidos humanos
normais. Nos tempos atuais, C. G. Jung trouxe o conceito de
arquétipo para a psicologia moderna, descrevendo-os
principalmente como princípios psicológicos.[xxxvi]
 
Zeus e Hera
Capítulo III

Os Quatro Tipos Psicológicos

“As quatro funções oferecem ao ego uma espécie de orientação


básica no caos das aparências. A sensação (ou seja, a
percepção pelos sentidos) lhe diz que algo existe; o pensamento
lhe diz o que é esse algo; o sentimento diz se ele é agradável ou
não; e a intuição diz de onde ele vem e para onde ele vai”.
(Jung)

A necessidade de se criar uma estrutura básica do ser humano


em características mais ou menos definidas, vem desde a mais
remota antiguidade. Os sistemas de classificação de tipologias
humanas nasceram da observação de determinados padrões de
comportamento dos indivíduos, e visavam entender aquilo que era
comum em um grupo e totalmente diferente em outro.
O primeiro filósofo a pensar sobre a composição do mundo e da
natureza foi Empédocles (492-432 a.C.). Médico naturalista,
organizou os fenômenos naturais em quatro elementos primordiais:
fogo, ar, terra e água, também chamados por ele de “elementos
raízes”; cada um deles tinha uma determinada qualidade. Os
elementos para ele não eram substâncias, mas divindades que
geravam as formas e cores de todas as coisas.
Hipócrates (460- 370 a.C.), considerado o pai da medicina
moderna, sustentado por esse postulado, formulou a teoria de que o
corpo humano é composto desses quatro elementos: ar, água, fogo
e terra. Relacionou esses elementos a fluidos corporais presentes
em todo corpo, que são: sangue, fleuma, bile amarela e bile negra.
Claudio Galeno, médico e astrólogo que viveu no século II
depois de Cristo (129-216) estabeleceu a relação desses fluidos em
quatro tipos de pessoas, de acordo com a mistura desigual, nelas,
dos quatro elementos. A partir dessa concepção, estabeleceu uma
relação tipológica baseada nos humores, ou líquidos corporais do
corpo humano. São eles: sanguíneo, fleumático, melancólico e
colérico. Assim, a fisiologia humana estaria relacionada a um
determinado comportamento, ou temperamento. De um modo
geral, essas são suas características:
Sanguíneo: excesso de sangue - afetuoso, otimista, expansivo e
impulsivo.
Fleumático: excesso de fleuma - tímido, quieto, pacífico, dócil,
coerente, sonhador, lento.
Melancólico: excesso de bile negra - irritável, nervoso, tende ao
pessimismo, poético ou artístico.
Colérico: excesso de bile amarela - dominador, explosivo,
energético, apaixonado e ambicioso.
Diz Jung a esse respeito:
 
Dentre esses médicos, destacou-se Galeno que, com esta
doutrina, influenciou a ciência da doença e do homem por quase
1.800 anos. Os antigos nomes dos temperamentos ainda
denunciam sua procedência da “patologia humoral”: melancólico
(de bile negra); fleumático (mucoso: a palavra grega phlegma
significa queimação, inflamação; o “muco” foi considerado como
produto final da inflamação); sanguíneo (de sangue); colérico
(bílis amarela). Nossa concepção moderna de “temperamento”
tornou-se mais bem psicológica, pois a “alma”, desses 2.000
anos de desenvolvimento, libertou-se dessa vinculação com
humores quentes e frios, mucosos e biliosos.[xxxvii]
 
“Four Humours”, gravura de Leonhart Thurneisser, 1574

No antigo sistema zodiacal chinês, encontramos uma tipologia


humana baseada nas figuras de doze animais. Cada um deles tem a
regência de um ciclo de 12 meses. Alguns deles são: o cavalo, o
tigre, o dragão, o coelho, o rato, etc.
Há também uma tipologia riquíssima no sistema das tradições
africanas, como a do candomblé e a da umbanda, muito populares
em nosso país, e nelas encontramos divindades ou orixás, tais
como: Ogum, Oxossi, Iansã, Oxumaré, entre outros.
De todos esses sistemas tipológicos milenares, o mais conhecido
entre nós é a Astrologia, que tem suas origens no Egito e na
Babilônia, com aproximadamente 5.000 anos. Em sua estrutura
básica encontramos uma tipologia para os doze signos, que estão
agrupados ou divididos numa estrutura quaternária, ou seja, de
quatro elementos: fogo, ar, terra e água.
Jung certamente pesquisou muitas obras antigas e nelas
encontrou inspiração para montar sua própria tipologia, e o fez de
forma brilhante e criativa. Começou a elaborar sua teoria a partir de
1913, quando mergulhou no próprio inconsciente, vivenciando
processos psíquicos de forma profunda e solitária. Homem dotado
de inteligência e curiosidade fora do comum, Jung se aventurou,
durante toda a vida, a pesquisar mitologia, antropologia, religiões
comparadas, assim como tradições herméticas de inúmeras culturas
remotas. Nessa extensa jornada intelectual encontrou fundamentos
simbólicos e filosóficos sobre as concepções da alma, do ser e da
vida, com os quais alicerçou as bases da sua psicologia. Parte
desse rico arcabouço teórico está presente no livro Tipos
Psicológicos, que foi lançado em 1921.
Sabemos também que o livro “Os Quatro Tipos Psicológicos”, de
Jung, foi lançado em 1921 e causou grande impacto em seu meio
profissional tornando-se uma de suas obras mais conhecidas.
Nessa obra Jung apresenta modelos de orientação do indivíduo em
relação ao mundo (introversão e extroversão) e as quatro funções
da consciência (sensação, intuição, pensamento e sentimento), que
são modos de adaptação e de percepção da realidade, que
apresentaremos em seguida. Foi a sua primeira obra relevante após
a ruptura com Freud.
Diz Deirdre Bair sobre essa obra:
 
O livro é uma espantosa compilação das leituras extensivas de
Jung, mas não há referência alguma ao que ele lera antes de
escrever Símbolos da transformação. Simplesmente examina o
problema dos tipos, como ele ocorre nos diversos textos que lhe
serviriam de esteio durante os muitos anos futuros, as
referências-padrão que ele repisava incessantemente para
sustentar suas posições teóricas. Por sorte, escolheu bem,
porque selecionou obras que eram as melhores em poesia,
psicopatologia, estética, filosofia moderna e biografia (entre
outras áreas) (...) Reconheceu que o problema dos tipos fascina
a humanidade desde sempre, das antigas astrologia,
quiromancia, frenologia, fisiognomonia e grafologia aos mais
recentes, como Wilhelm Ostwald e Otto Weininger.[xxxviii]
 
Vamos entender agora o que são os quatro tipos psicológicos ou
as quatro funções da consciência segundo a escola junguiana.
Os Tipos Psicológicos como

funções da consciência
Na visão de Jung, a psique possui uma estrutura quaternária
que mostra a maneira como esta opera para cada pessoa em sua
interação com o mundo. Esses quatro pontos cardeais da psique ou
as quatro funções da consciência mostram maneiras distintas de
organização e de adaptação individual, e cada uma delas
representa um “tipo psicológico”. Importante ressaltar que se trata
de um modelo dinâmico da psique, que está sempre em movimento
e que poderá se alterar durante a vida, tendo em vista a ideia de
que nosso inconsciente não é estático, muito ao contrário, é muito
criativo. São elas:
 

As quatro funções da consciência são opostas e complementares entre si.


SENSAÇÃO
A sensação como função é aquela que registra conscientemente
fatos exteriores e interiores através dos órgãos dos sentidos, de
modo irracional. O indivíduo é atento à realidade objetiva, aos
detalhes do ambiente externo, vive o aqui e agora do tempo
presente, é muito realista e conservador. Gosta dos prazeres dos
sentidos, é pragmático, organizado, rotineiro, geralmente tem pouca
imaginação. O mundo das formas é facilmente apreendido por esse
tipo psicológico, que tem facilidade de realizar suas aspirações.

INTUIÇÃO
A intuição como função indica a apreensão de potencialidades
futuras; busca a inspiração criativa; desloca-se facilmente para
aquilo que está por vir, mudança ou inovação; percebe melhor o
todo. O indivíduo é idealista, possui bom faro para novidades e
projetos, gosta de pesquisas, apoia ideias arrojadas ou visionárias.
Entretanto, como tem dificuldade em perceber a realidade tangível,
essa característica pode resultar em pouca eficiência para
concretizar seus ideais, seguir uma rotina ou até mesmo cuidar do
próprio corpo.

PENSAMENTO
O pensamento como função age através do nosso ego
conscientemente, estabelece uma ordem lógica racional entre os
objetos e esclarece o que eles significam. O indivíduo toma
decisões baseadas na justiça e na causalidade lógica dos eventos.
Ele pode aparentar frieza em seu julgamento, tende a formalidade,
pode ter dificuldade em estabelecer relações. Nesse tipo, há uma
tendência a valorizar o pensamento sobre o sentimento; é sempre
questionador e imparcial em seus pontos de vista.
SENTIMENTO
O sentimento como função é aquele que seleciona hierarquias de
valor para o mundo, seja de atração ou rejeição pelo objeto.
Sentimento aqui não é afeição e não deve ser confundido com
emoção, está relacionado à dimensão estimativa das coisas, com
juízos de valor de gostar ou não gostar. O indivíduo valoriza o
sentimento sobre a lógica; pode ser parcial em seus julgamentos,
levando em consideração aquilo que sente em relação a uma
determinada situação, seguindo a lógica do coração. Sua índole é
sempre apaziguadora. Seus interesses geralmente estão voltados
para as pessoas e as relações.
Nessa estrutura psíquica, Jung observou também uma dualidade
direcional da psique. Ou seja, a energia psíquica, ou libido, pode
fluir em direções opostas. Segundo ele, essas duas atitudes básicas
são a introversão e a extroversão, que indicam as atitudes
preferenciais na forma que o indivíduo tem de se relacionar com o
mundo.

INTROVERSÃO
Na introversão, o foco da atenção do indivíduo está voltado para
o mundo interno. A energia psíquica ou libido recua diante do objeto,
ou seja, o introvertido foca a sua atenção no mundo das suas
impressões íntimas, emoções ou pensamentos. Prevalece nele a
capacidade de reflexão, uma postura questionadora e certa
hesitação para tomar decisões, pois o mais importante é o fator
subjetivo da experiência. Desta feita, o introvertido opta por
compreender o mundo antes de vivenciá-lo de forma mais direta ou
espontânea. Prefere ambientes calmos e a comunicação escrita. Na
atitude introvertida, a motivação principal encontra-se em fatores
subjetivos.

EXTROVERSÃO
Na extroversão, a energia psíquica é voltada ou direcionada para
o mundo externo, o indivíduo se adapta mais facilmente às
situações ou novidades, faz aquilo que lhe é solicitado e vive mais
de acordo com as exigências da realidade objetiva. É sociável,
impulsivo, confiante e deixa-se levar ou influenciar pelo ambiente.
Gosta de agir, enfrenta o desconhecido e as novidades sem grandes
dificuldades; no entanto, pode perder a percepção dos seus limites,
fato esse que pode prejudicar a própria saúde. Tende a ser mais
generalista do que especialista, pois tem muitas áreas de interesse.
Na atitude extrovertida os fatores externos são a força motivadora
do indivíduo. É importante ressaltar que para que haja um equilíbrio
psíquico é necessário que a pessoa extrovertida encontre
momentos de reflexão e silêncio e a pessoa mais introvertida, por
sua vez, se deixe levar pelo inusitado, aventurando-se nas
novidades ou desafios que a vida traz.
Com relação a esses preceitos, diz Zacharias[xxxix]:
Jung considerou introversão e extroversão como critérios muito
simples e genéricos. Então foi em busca de outras
particularidades básicas para melhor compreender as diferenças
individuais, praticamente ilimitadas. Assim, ele observou que
algumas pessoas preferiam não se basear em conceitos gerais
para suas avaliações, outras evitavam atentar para as
informações fornecidas pelos cinco sentidos; outras pareciam
desprovidas de imaginação e outras evitavam avaliações
pessoais e afetivas. Por meio dessas observações e
constatações, Jung identificou quatro formas de atividade da
psique em relação ao mundo e denominou-as de funções da
ectopsique, que é a parte do sistema psíquico que relaciona os
conteúdos da consciência com os fatos e as informações do
meio ambiente.[xl]
 
Na visão de Jung encontramos também outra classificação
relevante. O pensamento e o sentimento são considerados funções
de adaptação racionais, uma vez que seu funcionamento se dá
através da reflexão do que é razoável e mais adequado a uma
situação, ou tomada de decisão. Por outro lado, a intuição e
sensação são chamadas de funções irracionais, pois se baseiam
mais numa percepção imediata de algo, que não é lógico, mas que
é capturado pelos sentidos, por um insight ou pressentimento
momentâneo. Para cada tipo de atitude de personalidade que são
introversão e extroversão, encontramos também quatro variações
de funções, que resultam num total de oito tipos psicológicos
básicos:
 
Pensamento extrovertido Pensamento introvertido
Sentimento extrovertido Sentimento introvertido
Sensação extrovertida Sensação introvertida
Intuição extrovertida Intuição introvertida
 

Oito cabeças, Maurits Cornelis Escher, 1922


Função superior ou dominante e função
inferior
A teoria dos quatro tipos psicológicos diz também que cada
indivíduo possui uma atitude mais atuante e específica, que é
chamada de função superior ou dominante. É aquela que funciona
melhor para ele, agrega valor social, e a que indica as suas aptidões
naturais, e também é a mais usada no dia a dia. Diferenciada e mais
desenvolvida em relação às demais, está ligada à consciência.
Todos nós usamos nossas melhores habilidades para nos
colocarmos no mundo. Já na infância, é bem comum as crianças
optarem por tarefas que são fáceis para elas e deixarem para o
outro aquilo que não gostam de fazer.
Por outro lado, há também a função inferior que, de modo
oposto, revela dificuldades, como um ponto cego ou frágil da psique.
Esta função é sempre oposta à função dominante ou superior.
Geralmente é com a função inferior que montamos as nossas
defesas, e nela encontramos as deficiências e feridas da nossa
alma.

Esta função se encontra distante da consciência, é menos


diferenciada, e desta feita pode estar ligada aos complexos, aos
aspectos mais indomáveis e conflitantes que se relacionam com a
sombra do indivíduo. Desta forma, ela se manifesta em
comportamentos regredidos e reativos às críticas, em dificuldade de
aprender ou memorizar. São as áreas onde o comportamento é
inadequado, inseguro, lento ou repetitivo. A função inferior é como
uma área nevrálgica e aberta da personalidade inconsciente. Assim,
as funções menos desenvolvidas, que permanecem na dimensão
inconsciente, e são facilmente projetadas nos outros, acabam nos
atormentando, pois revelam nossas facetas difíceis ou “inferiores”.
Por conseguinte, a projeção ajuda a nos “livrar” de uma parte de
nossa psique que não conseguimos ver e aceitar em nós mesmos.
É importante ressaltar que a função inferior e os complexos
autônomos, com forte carga emocional, são a porta aberta para a
compreensão e investigação do inconsciente. O processo analítico
bem conduzido certamente facilitará a integração desses conteúdos
menos disponíveis à consciência, e isso nos remete ao processo de
individuação que vai acontecer durante a vida. O que não significa
isolamento, mas pressupõe a interação social do indivíduo, ou seja,
o “outro” é de vital importância nesse contínuo desenvolvimento
psicológico.
Na visão de Von Franz, (1995), “A função inferior é a ferida
sempre aberta da personalidade consciente, mas, através dela, o
inconsciente pode sempre entrar e assim ampliar a consciência e
gerar uma nova atitude”.[xli] Dizendo de forma mais prosaica: o tipo
sentimento facilmente nega os pensamentos que lhe desagradam.
O tipo pensamento tende a ignorar a própria subjetividade, com
frequência abandonando seus sentimentos à própria sorte. O tipo
sensação sempre vai desconfiar de seus pressentimentos ou
intuições, pois para ele ambos são estranhos e sem sentido. O
intuitivo estará constantemente voltado para algo que está além da
vida prosaica e cotidiana, pois não incorpora o aqui/agora, ou
mesmo aquilo que poderia ser simplesmente apreendido pelos cinco
sentidos. Ainda é Von Franz quem esclarece:
 
(...) Outro aspecto típico da função inferior, que também se
relaciona com a inadaptação e primitivismo, é a sua
suscetibilidade e tirania. Quando se mexe com a função inferior,
a maioria das pessoas fica terrivelmente infantil; elas não podem
suportar a mais leve crítica e sempre se sentem agredidas.
Nesse aspecto são inseguras e por isso, tiranizam todas as
pessoas à sua volta, porque todos têm que agir com cautela.
Dizer alguma coisa sobre a função inferior de outra pessoa é o
mesmo que caminhar sobre ovos.[xlii]
Finalizo com Zacharias:
(...) Segundo a concepção de Jung, tipo é uma disposição geral
que se observa nos indivíduos, carcterizando-os quanto a
interesses, preferências e habilidades. Jung afirma que a
tipologia não tem a finalidade de dividir as pessoas em padrões,
mas é um instrumento de investigação crítica, na medida em
que oferece uma ordenação metódica de conteúdos psíquicos.
É a possibilidade de ordenar a profusão de experiências
individuais – um quadro de referências.[xliii]
Vejamos agora como são observados e compreendidos os quatro
elementos astrológicos.
Os quatro elementos

na Astrologia

Stephen Arroyo em: Astrologia, Psicologia e os quatro elementos,


afirma:
 
Os quatro elementos na astrologia (fogo, ar, terra e água) são os
blocos básicos para a construção de todas as estruturas
materiais e todos orgânicos. Cada elemento representa um tipo
básico de energia e consciência, operando em cada um de nós.
Assim como a física moderna demonstrou que energia é
matéria, os quatro elementos se entrelaçam e combinam para
formar toda a matéria.[xliv]
 
A Astrologia é a leitura simbólica da energia criadora que está
presente em toda a natureza. Uma das premissas astrológicas é
que tudo no universo deriva de duas forças opostas e
complementares, dois princípios universais, que entendemos como
os princípios masculino e feminino, o dia e a noite, ativo e passivo,
ou o yin e yang, como apresentados na concepção chinesa milenar
do equilíbrio dos opostos. Nesse sentido, vemos os doze signos do
Zodíaco, que na sua sequência natural reproduzem seis pares de
eixos, com os signos opostos entre si, num ângulo de180°.
Os chamados signos masculinos estão associados à ideia de
movimento, ação, extroversão, dinamismo, calor, luz, atividade,
futuro, e sua energia é centrífuga por excelência. Os chamados
signos femininos ou passivos relacionam-se aos princípios de
receptividade, suavidade, inércia, frio, subjetividade, recolhimento,
introversão, contração e passado; sua expressão básica é
centrípeta.
Nesse modelo energético e psíquico encontramos, assim, quatro
padrões básicos, que nos mostram quatro diferentes formas de
consciência, de apreensão e adaptação à realidade, e que são
representadas pelos quatro elementos: fogo, ar, terra e água.
Nesta concepção zodiacal encontramos os três signos masculinos
do fogo e do ar, que fazem oposição entre si e, da mesma forma, os
três signos femininos da água e da terra, que seguem essa mesma
disposição angular.

Fogo, Ar, Água, terra


Os quatro elementos são considerados a pedra angular da
astrologia, e esta, em função de sua estrutura arquetípica,
pressupõe um modelo de totalidade que nos é dada pela roda
zodiacal ou pelo mapa de nascimento. No mapa natal, o padrão de
potencialidades se expressa de uma forma holística, já que é
arquetípica, porém de uma forma individual, pois a distribuição dos
quatro elementos é diferente para cada pessoa, de acordo com a
posição dos planetas nos doze signos e com o dia e hora em que
nasceu.
São eles:
Fogo: Áries, Leão, Sagitário
Ar: Gêmeos, Libra e Aquário
Água: Câncer, Escorpião e Peixes
Terra: Touro, Virgem e Capricórnio.
Quatro elementos

ELEMENTO AR
Na Astrologia, o ar é o elemento do intelecto e simboliza o mundo
das ideias, da palavra, seja escrita ou oral. É considerado um
elemento positivo ou masculino, cuja função é estimular as trocas
com o meio ambiente, a comunicação e a expressão. Os signos de
ar são os mais sociáveis, com habilidade para se afastar da
experiência concreta, o que lhes permite uma visão de perspectiva
mais ampla sobre o mundo e as pessoas. Nos signos aéreos há
uma forte necessidade de troca intelectual, o amor pela vida cultural,
o senso de justiça, o refinamento, uma extraordinária capacidade de
adaptação a situações novas. Entre todos os elementos, o ar é
considerado como o mais civilizado e distanciado da natureza
instintiva. Tem capacidade de respeitar o pensamento alheio,
facilmente coloca eventos em perspectiva. Curiosamente, está
relacionado aos signos cujos símbolos não são representados por
animais e sim por figuras humanas, como em Gêmeos e Aquário, ou
por objetos criados pela mão humana, como Libra, que é
representado por uma balança. Facilmente encontramos estes tipos
em profissões ou atividades relacionadas ao magistério, literatura,
jornalismo, advocacia, comércio, publicidade e comunicação em
geral, tudo o que demanda inteligência, versatilidade, dinamismo e
rapidez. No nível pessoal os signos do ar não manifestam suas
emoções com facilidade, muitas vezes são vistos como pessoas
frias ou indiferentes, que racionalizam seus sentimentos. Preferem
questionar e entender os relacionamentos com algum
distanciamento, esquivam-se de pensamentos toscos ou muito
primitivos. A falta desse elemento pode indicar dificuldade de
adaptação a novas ideias, desconfiança intelectual, pouca
capacidade de reflexão. O excesso pode ser percebido como
propensão a ansiedade, dispersão e irritabilidade; a mente tende a
ser errática, imprecisa ou dispersiva.
ELEMENTO FOGO
O elemento fogo é a energia radiante, fonte de calor, luz e
expansão da vida. Exatamente como sua expressão na natureza, os
indivíduos com ênfase neste elemento são exuberantes, ardentes,
apaixonados e espaçosos. Têm forte tendência a expressar a sua
individualidade de forma voluntariosa e criativa. Não é difícil
perceber que a modéstia não combina com sua personalidade
altiva. Para eles, a vida é um infinito oceano de possibilidades a ser
exploradas, sem fronteiras ou limites. Sua energia flui de forma
espontânea e mesmo infantil, o que os tornam sempre cativantes ou
surpreendentes. São líderes naturais, capazes de inspirar, conduzir
e apoiar os outros, e é aí que se encontra grande parte de seu
carisma. Possuem uma fé inabalável na generosidade do destino,
se lançando por vezes de forma irrefletida atrás de seus ideais.
Teatrais e exagerados, fazem da vida um palco para expressar seus
rompantes e grandes aspirações; raramente expõem as suas
fraquezas. Encontramos estes tipos astrológicos mais facilmente em
atividades profissionais que exijam ambição, dramaticidade,
capacidade de liderança, pioneirismo, visão e futuro e forte
idealismo. Em seu lado exagerado este elemento pode tornar o
indivíduo demasiadamente competitivo, autoritário, passional ou
autocentrado, o que o torna insensível aos sentimentos dos outros.
O orgulho e a vaidade excessiva dificultam o reconhecimento de
suas falhas ou erros, e isso o impede, muitas vezes, de alcançar a
maturidade psicológica. A ausência deste elemento pode resultar
em pouca vitalidade, fé, autoestima e confiança na vida; fraqueza
diante das adversidades da vida.

ELEMENTO TERRA
No saber astrológico, o elemento terra diz respeito ao mundo das
formas e da matéria estruturada e visível. É comum aos indivíduos
com ênfase neste elemento um contato bem estreito com os cinco
sentidos e com a realidade do mundo material e tangível. Seu
universo de valores precisa de direção e utilidade, pois têm um forte
senso de dever. A natureza construtiva e realizadora dos signos de
terra é direcionada para a praticidade; ocupam-se com tudo o que
diz respeito ao que é sólido e organizado.São dignos de confiança,
disciplinados, ambiciosos, amam a ordem, o trabalho e valorizam
seus bons resultados. Geralmente são cautelosos, prestativos,
eficientes e determinados; sua necessidade de segurança e
inteligência pragmática faz com que seus empreendimentos sejam
sempre bem calculados e organizados.
Esse tipo astrológico sente-se geralmente muito à vontade com o
próprio corpo, sabendo expressar facilmente seus desejos físicos,
com cuidados e atenção à saúde e bem-estar. Todas essas aptidões
indicam êxito em atividades e trabalhos que exijam dedicação,
pragmatismo, método, cálculo, habilidades manuais, grande
determinação e perseverança.
Norteados pelas sensações físicas, facilmente deixará de lado as
considerações teóricas e abstratas a respeito da vida. Essa atitude
acaba por restringi-los, pois propicia uma visão estreita e imediatista
do mundo, e que pode anular qualquer outra maneira de apreensão
da realidade. A ênfase nesse elemento poderá deixá-los muito
apegados a necessidade de segurança e podem se tornar escravos
de uma rotina maçante e repetitiva, que acaba por impedir mais
flexibilidade e criatividade para com a vida de modo geral. Outro
aspecto sombrio é o pragmatismo que se transforma em teimosia,
ceticismo ou ironia, e uma forte tendência ao excesso de trabalho, o
que frequentemente gera prejuízos nas relações pessoais ou
familiares. A falta deste elemento indica a probabilidade de pouco
interesse ou sintonia com o mundo físico, que começa pelo seu
próprio corpo e atenção a coisas básicas, como a alimentação ou
exercícios regulares. Poderá ter limitações para aceitar rotinas e
regras, assim como abraçar um trabalho regular, ser autossuficiente,
ou seja, zelar pela própria sobrevivência.
ELEMENTO ÁGUA
Na tradição astrológica, a água representa o mundo dos
sentimentos, a vida íntima, instintiva e subjetiva. Suas atitudes são
por vezes infantis, pois como crianças esperam do mudo respostas
de amor e afeto. Pessoas cujos mapas têm ênfase nesse elemento
falam a língua do coração.
Os signos de água são os mais enigmáticos do zodíaco.
Receptivos, envolvem-se profundamente nos relacionamentos
pessoais, pois sabem “mergulhar” na intimidade do outro. Eles estão
naturalmente com contato com seus próprios sentimentos, gostam
do silêncio e da introspecção que possa promover o seu
autoconhecimento. Estes indivíduos são psiquicamente muito
sensíveis e vulneráveis. Intuitivos, percebem sutilezas do
comportamento humano de forma muito marcante. Necessitam de
paz e proteção, as turbulências e aglomerados humanos são um
problema para eles. Possuem uma imaginação muito criativa,
deliciam-se com suas próprias fantasias e devaneios. São
protetores, bons conselheiros, se dão bem em profissões da
assistência social, voluntariados, e da saúde em geral, pois a
empatia e a compaixão são sua assinatura no mundo. Amorosos,
fraternos e solidários, são ótimos cuidadores daqueles que sofrem
de algum tipo de carência ou deficiência.
Na vida social são afáveis e cordiais, não têm receio de expor as
suas fraquezas. Tornam-se cativantes, pois mais do que ninguém os
signos de água captam as necessidades dos outros, sem fazer
discriminações ou julgamentos.
A ênfase deste elemento significa uma vulnerabilidade psíquica
marcante, uma natureza imprevisível, sua noção de realidade
depende daquilo que podem sentir, o que os torna sujeitos a
situações de conflitos interpessoais; as idealizações são o caminho
direto para as decepções amorosas. Em nome da paixão e da
entrega, os tipos água absorvem tanto o seu parceiro que terminam
por paralisá-lo, sendo notadamente esse elemento que desconhece
os limites nas conexões amorosas. A deficiência desse elemento
pode indicar dependência excessiva de aprovação alheia,
acarretando forte insegurança e problemas de autoestima. O
indivíduo pode se tornar muito fantasioso, sofrendo com emoções
ou intuições equivocadas.
 
Conclusão do Capítulo
A descrição dos tipos psicológicos de Jung guarda semelhança
intrínseca com a tipologia humana dada pelos quatro elementos
astrológicos. No que diz respeito às duas atitudes psíquicas
predominantes, que são introversão e extroversão, vemos o mesmo
paralelo com os chamados signos femininos e masculinos
respectivamente. De modo geral, observamos que a natureza
intrínseca de pessoas com mais ênfase em signos de água e terra é
a de refletir sobre o mundo ou viver mais dentro de si mesmos. Sua
índole ou temperamento mais cauteloso e ponderado está em
ressonância com o que chamamos de “introversão”.
As pessoas com ênfase em signos de fogo e ar, por outro lado,
apresentam um temperamento mais expressivo, com mais interação
no mundo externo, guardando semelhança com os tipos
“extrovertidos”.
É interessante notar que, na natureza, os elementos água e terra
são mais pesados, sofrem a influência da força da gravidade, e se
concentram no nível inferior da matéria. Os elementos fogo e ar
tendem a se espalhar e subir pela atmosfera são mais rápidos e
leves.
Com relação às quatro funções, isso também é relativamente
fácil de observar, tanto na teoria quanto na prática clínica ou
astrológica. . Pessoas que têm uma natureza marcadamente mais
afetiva, empática, psiquicamente sensível, que são socialmente
mais receptivas e mesmo sonhadoras (tipo sentimento), geralmente
possuem o elemento água predominante na carta natal.
Outras que são mais realizadoras, pragmáticas, orientadas pelo
mundo físico e tangível, pelos cinco sentidos, voltadas para a
segurança material (tipo sensação), podem ter a ênfase no
elemento terra.
Os chamados intuitivos, mais orientados pelos processos
criativos, pelo entusiasmo das novidades e pela visão do amanhã,
frequentemente possuem a ênfase no elemento fogo em suas cartas
natais. Os tipos mais racionais, que privilegiam e valorizam a lógica,
as ideias e as realizações de natureza intelectual (tipo pensamento),
geralmente terão o predomínio dos signos de ar em sua carta natal.
É importante dizer que isso vem a ser uma classificação geral,
com infinitas variáveis, e que devemos observar a presença dos
outros elementos, uma vez que não existem tipos puros, nem do
ponto de vista das funções da consciência e nem da astrologia. O
astrólogo experiente sabe o quão é importante olhar o mapa com
um todo. Exemplo: o indivíduo tem muito fogo, mas os planetas
estão colocados na parte inferior do mapa, o que pode mostrar a
tendência ao movimento mais introvertido da libido. Ou, o indivíduo
tem pouco elemento terra, mas possui o Saturno bem aspectado na
casa um, que é uma casa de ação, o que dará a ele um colorido
“saturnino” relevante, ou seja, responsável, realizador e
determinado.
Entendo também que conhecer essas duas tipologias nos
propicia referências relevantes e facilitadoras da comunicação ou
compreensão do “outro”, tão diferente de mim. As idiossincrasias
criam estranhamento e perplexidade em todas as áreas das
relações humanas. Essas barreiras no entendimento entre pessoas
que se querem bem são reais e geralmente frustrantes. A
Astrologia, frequentemente e de forma simples, vem em nosso
socorro para auxiliar nesses impasses interpessoais.
Dito de forma prosaica, cito alguns exemplos em que as
expectativas foram frustradas em três situações diferentes:
a) Indefinição e contradição:

“Bem, você queria o quê? Fulano/a de tal é geminiano!”


b) Lentidão ou atrasos:
“Olha, pode esperar sentado, fulano/a de tal tem o Sol e o
Ascendente em Touro!”
c) Pressa ou individualismo exacerbado:
“Puxa, o fulano/a nem esperou eu falar e já fez tudo sozinho!
Só podia ser ariano mesmo!”
Muitas vezes Jung foi questionado sobre por que havia
estabelecido um sistema de dois tipos ou atitudes, quatro funções e
oito tipos possíveis. A esse respeito, Liz Greene observa:
Os quatro tipos funcionais de Jung se ajustam perfeitamente à
antiga divisão astrológica dos quatro elementos. Não se trata de
uma visão ser explicada pela outra, ou derivar da outra; em vez
disso, cada uma é uma forma diferente de descrever a
observação empírica do mesmo fenômeno. Esse fenômeno é o
simples fato de que, embora únicas, todas as pessoas também
se agruparem em categorias gerais baseadas numa forma
fundamental de ver, avaliar, apreender e interpretar a vida. Além
de ser um meio divertido de rotular amigos e parentes, entender
um pouco dessa tipologia é uma excelente maneira de aprender
a mais difícil das lições: nem todas as pessoas são iguais a
mim.[xlv]
Capítulo IV

Complexos, Multiplicidade das Imagens


da Alma

“A psique é múltipla” (Jung)

“Não podemos esquecer que os complexos são uma espécie de


tecido interativo entre corpo e alma” (Amnéris Maroni)

O que é um complexo
Todos nós já ouvimos em algum momento da nossa vida: “Fulano
é complexado”. Nesse capítulo vamos abordar um tema que é
precioso para a escola junguiana, que são os complexos. Vimos na
introdução que Jung, no início de suas atividades psiquiátricas,
observou as fortes perturbações que aconteciam com os seus
pacientes nos testes de associação de palavras, e a esses núcleos
inconscientes que disparavam alterações emocionais e fisiológicas,
foi dado o nome de complexos.
Sabemos que os complexos podem ter sua origem numa
situação dolorosa ou traumática, uma vez que são dotados de alta
carga emocional. Segundo Jung (1988), o complexo é como uma
psique fechada, cuja fantasia desenvolve uma atividade própria;
através de sua manifestação podemos chegar ao inconsciente.
Galatea  of the Spheres, Salvador Dali, 1952

Diz ele: “A etiologia de sua origem é muitas vezes um chamado


trauma, um choque emocional, ou coisa semelhante, que arrancou
fora um pedaço da psique”.[xlvi]
O complexo é como um emaranhado de ideias, emoções,
convicções, pensamentos, impulsos. É percebido como uma
personalidade dentro de outra, chamada de “subpersonalidade” ou
personalidade autônoma e parcial, pois é fragmentada ou
dissociada do todo.
Os complexos funcionam como fragmentos ou satélites
psicológicos, coexistem dentro da personalidade total. São dotados
de vida própria, possuem mecanismos infantis e arcaicos, têm
sentimentos, impulsos e crenças bem específicas. Geralmente
organizam-se em torno de um tema arquetípico central.
O complexo possui autonomia, tem forte carga de energia
afetiva. Ele perturba o ego, e isso se torna perceptível em função de
uma série de alterações que podem surgir numa pessoa que esteja
sob o impacto de um complexo em ação. Numa pessoa que está
possuída por ele, surgem alterações fisiológicas variadas e a
personalidade se altera: o tom ou o timbre da voz se modifica ou se
eleva, alterando o tônus emocional; os batimentos cardíacos se
aceleram, pode surgir sudorese, forte irritação, pensamentos
repetitivos, sonolência, letargia, etc. Podemos dizer que um
complexo é o calcanhar de Aquiles na vida de um indivíduo, uma
fissura psíquica, uma ferida em estado latente e que reage
intensamente a situações externas.
A esse respeito diz Grinberg:
 
Os complexos do inconsciente nos visitam pela porta dos
fundos, invadindo a nossa intimidade nas horas mais
inoportunas. Seu propósito é o de nos revelar o que menos
gostamos de ver em nós mesmos: nossa Sombra. São os
amigos e as pessoas mais íntimas que costumam enxergá-la.
Se alguém nos faz ou nos fala algo que toca nossa Sombra,
ficamos possuídos pela raiva, pela vergonha ou pelo medo.
Ficamos sob tempestades emocionais, imersos em paixões que
se voltam contra nós ou contra quem denunciou nosso lado
sombrio, escondido da consciência. Nossa reação é devolver a
crítica, manifestar intolerância, preconceito, acalentar desejos de
vingança, e às vezes aprontar muita confusão. Ou, então,
ruborizamos ou gelamos. Às “vezes também engasgamos,
tossimos, emburramos.[xlvii]
 
Não integrado, um complexo autônomo é sempre voraz,
onipotente, veemente, ou então, pedinchão, lamuriento, impotente e
produz pensamentos repetitivos. Há nele uma tendência a repetição
e compulsão de um tipo do comportamento ou pensamento, e por
isso é comum dizermos que são os complexos que nos têm, e não
o contrário. Os complexos, especialmente quando constelados,
podem infernizar a vida de alguém, ou daqueles que estão perto
desse alguém.
Assim descreve Jung sobre essas subpersonalidades
autônomas e parciais da psique:
 
Os complexos são fragmentos psíquicos cuja divisão se deve a
influências traumáticas ou a tendências incompatíveis. Como
no-lo mostra a experiência das associações, eles interferem na
intenção da vontade e perturbam o desempenho da consciência;
produzem perturbações na memória e bloqueios no processo
das associações; aparecem e desaparecem de acordo com as
próprias leis; obsediam temporariamente a consciência ou
influenciam a fala e ação de maneira inconsciente”[xlviii]
 
Os complexos formam áreas de concentração de alta carga
emocional que interferem na vida do indivíduo e podem também
promover doenças. Nas manifestações de neurose, os complexos
podem sofrer alterações ao longo da vida; nas psicoses eles se
cristalizam e impedem o progresso da personalidade. Em linhas
gerais, os aspectos do complexo são: compulsividade, falta de
liberdade, autonomia; possuem um caráter ondulatório, ou seja, vão
e voltam. São como um banco de memórias que podem moldar o
destino de um indivíduo com maior ou menor intensidade.
Assim como os sonhos, os complexos são uma porta de acesso
para o inconsciente, são indicadores de conflitos ainda não
assimilados pela personalidade. Todos temos complexos, que
apontam para nevralgias da psique ainda não conscientes. Um
processo psicoterapêutico bem conduzido poderá dar condições ao
paciente de fazer elaborações mais profundas dessas fissuras
psicológicas, no sentido de reconhecer e posteriormente recolher as
projeções de seus complexos nos outros. O esperado deste
processo é que ele possa, aos poucos, se desidentificar e
despotencializar as imagens internas dolorosas e, assim, deixar de
ser refém das mesmas. Essa energia, antes dissociada ou
indiferenciada, poderá ser recuperada e ficar disponível para a
consciência e o desenvolvimento psicológico do indivíduo. Ou seja,
nosso inconsciente é também nosso amigo e aliado quando nos
dispomos a decifrar sua “complexidade”.
Termino com a citação que um renomado neurocientista, David
Servan-Schereiber faz a respeito dos processos emocionais
relacionados ao funcionamento do nosso cérebro límbico, que a
meu ver, encontra forte ressonância com aquilo que observamos na
atuação dos complexos:
 
Imagens, pensamentos, cheiros, emoções, sensações físicas,
crenças que se desenvolveram, como “estou sem saída”, estão
todos estocados em uma rede neural que tem vida própria.
Imprimida no cérebro emocional e desconectada do nosso
conhecimento racional a respeito do mundo, essa rede se torna
um pacote de informações não processada e disfuncional, que
pode ser reativada à menor lembrança do trauma original.[xlix]
 
Veremos em seguida a relação dos complexos que encontram
um paralelo bastante interessante com as subpersonalidades
astrológicas do mapa de nascimento.
Subpersonalidades:

o que são

“Em cada canto de minh’alma, há um altar para um deus


diferente” (Fernando Pessoa)

Neste capítulo vamos mostrar como o estudo dos símbolos de


uma carta natal funciona como um “mapa”, no sentido de fornecer
dicas e orientações sobre o dinamismo psíquico de um indivíduo,
com ênfase na percepção dos pontos críticos ou padrões
energéticos conflitantes que possam nos revelar aquilo que
entendemos como complexos ou subpersonalidades. Os signos, os
planetas e os ângulos que fazem entre si, a presença ou a ausência
de certos elementos são ferramentas preciosas, que auxiliam o
entendimento dos pressupostos anímicos dados a priori pela carta
de nascimento. As subpersonalidades astrológicas também
possuem um núcleo arquetípico, da mesma forma que os
complexos, e podem definir o destino de um indivíduo.
Com esse propósito, busquei inspiração na Psicossíntese, um
modelo de psique criado por Roberto Assagioli (1888-1974). Neste
modelo, Assagioli desenvolveu seus próprios conceitos e a teoria
das subpersonalidades que, a meu ver, não só guarda semelhanças
com a escola junguiana, como é também um referencial valioso e
apropriado para a análise e compreensão da simbologia astrológica.
Na sua visão, as subpersonalidades se organizam no decorrer do
desenvolvimento do indivíduo. A criança, em sua fragilidade, vai
consolidando sua identidade a partir da aprovação ou não por parte
dos adultos. Ao realizar a exigência ou expectativa dos outros, ela
se adapta às condições ambientais, mas pode ficar alienada do seu
verdadeiro “eu”, criando falsos “eus”. 
Cada subpersonalidade possui autonomia, tem expectativas,
atitudes e necessidades próprias. Esse processo segue vida afora,
consolidando crenças, valores e formas de percepção de si e do
mundo específicas e por vezes estreitas e distorcidas, como vimos
na teoria dos complexos da escola junguiana. As subpersonalidades
estão ocultas na vida inconsciente e podem reagir de forma
repetitiva, obsessiva, instintiva ou sem controle perante as situações
do cotidiano. Importante ressaltar que elas são prejudiciais ao nosso
desenvolvimento quando nos controlam, da mesma forma que os
complexos nos fazem reféns de suas incansáveis reivindicações.
Com o propósito de entendermos melhor nossas
subpersonalidades, Assagioli desenvolveu técnicas como a
imaginação dirigida, diálogos e teatralização. Elas permitiriam um
processo de desidentificação da autonomia das subpersonalidades,
sem negá-las, mas buscando outras maneiras de integrá-las de uma
forma mais consciente e saudável.
Assim descreve Roberto Assagioli, sobre a incongruência que
aparece às vezes entre as subpersonalidades:
 
Nós não somos unificados; frequentemente sentimos que
somos, porque não temos diversos corpos e diversos membros,
porque uma mão usualmente não bate na outra. Mas
metaforicamente, isto é exatamente o que de fato acontece
dentro de nós. Muitas subpersonalidades estão continuamente
envolvidas numa rixa tumultuada: impulsos, desejos, princípios e
aspirações estão engajados numa luta incessante.[l]
 
Essa multiplicidade de seres, e porque não dizer, essa multidão
que nos habita, geralmente salta aos nossos olhos quando nos
deparamos com um mapa natal: O que afinal estão querendo nos
dizer todos esses estranhos glifos, dentro de um círculo fracionado,
cheio de números e de traços coloridos, maiores e menores, que
montam triângulos, quadrados e estrelas?
Assim explica Piero Ferruci, aluno e colaborador de Assagioli:
 
Em cada um de nós, há uma multidão. Pode haver o rebelde
espiritual, a sedutora e a dona de casa, o sabotador e o esteta,
o organizador e o bon-vivant - cada qual com sua própria
mitologia e todos, mais ou menos confortavelmente agrupados
numa só pessoa. Com frequência estão longe de estar em paz
uns com os outros.[li]
 
A linguagem simbólica é uma expressão profunda da natureza
humana. Os símbolos e as imagens a eles relacionadas têm
diversos significados, e na astrologia isso às vezes parece se
multiplicar infinitamente. Cada símbolo astrológico possui um amplo
espectro de qualidades positivas ou negativas e a compreensão
mais global dessa simbologia pode jogar uma luz especial no
entendimento mais profundo da natureza humana, que é
constantemente obscura, confusa ou contraditória. Essa
compreensão nos permite alcançar com mais objetividade a
intrínseca e misteriosa natureza das subpersonalidades, ou seja, o
núcleo energético de seus complexos.
Quando falamos no planeta Marte, são evocadas as energias e
imagens de ação, impulso, vontade, liderança, luta, enfrentamento,
agressividade, violência, desafios, o deus da guerra, etc.
Para Vênus, exaltamos as qualidades de doçura, amor, equilíbrio,
estética, beleza, artes, harmonia, dependência emocional, luxúria,
apego material, etc.
Olhamos para Netuno e pensamos em sensibilidade, compaixão,
visão do todo, espiritualidade, escapismo, indefinição, utopia,
negação da realidade, entre outros.
E o que dizer de Saturno, que tanto nos ensina através das
limitações e das dores da alma, mas ao mesmo tempo constela a
noção da responsabilidade, perseverança e realização?
Dessa forma, interpretar um mapa significa fazer um
entrelaçamento dessas variáveis, tendo em vista, ao mesmo tempo,
o “palco zodiacal” onde se encontram doze signos, dez planetas,
doze casas e os quatro elementos dispostos de forma única e
particular. É preciso apurar os ouvidos para decifrar o que os
arquétipos planetários conversam entre si. Enquanto alguns
cochicham baixinho, outros parecem estar falando alto demais, em
constante conflito. Outros conversam e interagem entre si, felizes de
mãos dadas, e alguns estão em silêncio, desconectados dos outros
“atores” deste mesmo palco.
Desta feita, ouviremos o intrincado diálogo das
subpersonalidades parciais, cujo núcleo arquetípico será dado pela
qualidade das energias planetárias dispostas de forma mais ou
menos harmoniosa, e que construirão a caminhada psíquica de um
indivíduo. É sempre bom ressaltar que os potenciais dados pela
carta natal poderão ser potencializados pelo ambiente externo,
educação, recursos, etc.
 
Os Doze Deuses Olímpicos, Nicolas-André Monsiau, século XVIII

Ao interpretar um mapa natal, ou as imagens que um sonho


apresenta, penso que o melhor a fazer é deixar que ele vá se
revelando aos poucos, sem nenhum sentido de urgência ou
racionalização excessiva. É preciso abrir espaço para a intuição e
para a sensibilidade, uma vez que o bailado cósmico ali
apresentado é universal, mas o ouvinte apreenderá e dançará essa
música de acordo com sua estatura psíquica, emocional e espiritual.
O mesmo cuidado é sempre necessário para se compreender os
sonhos, dada a amplitude e riqueza simbólica de suas imagens. Em
função da abrangência e complexidade dos símbolos ali presentes,
entendo que a arte do analista está em não dispor de um caráter
reducionista. As imagens deverão ser apreendidas cuidadosamente
tanto no contexto do inconsciente pessoal do cliente, quanto em seu
aspecto coletivo, associando-as assim a uma dimensão mais ampla,
relacionadas ao Inconsciente Coletivo.
Diz Liz Greene a esse respeito:
 
Esse mapa é como uma semente, pois contém em microcosmo
os potenciais existentes no indivíduo e os períodos de sua vida
em que esses potenciais provavelmente serão concretizados.
Embora a imagética da astrologia seja diferente da terminologia
mais precisa da psicologia, o mapa astrológico de nascimento
pode ser comparado aos modelos da psique que nos foram
oferecidos por homens de gênio e percepção no campo
psicológico, como C.G.Jung e Roberto Assagioli”. (...) é o mapa
de uma estrada no seu sentido mais autêntico, pois o objetivo de
seu estudo não é “superar” as “influências” dos planetas, mas
sim dar espaço, na vida das pessoas, para a expressão de
todas as qualidades e impulsos nele simbolizados. Só então o
indivíduo pode se aproximar do plano original do
desenvolvimento de sua vida, conforme foi “concebido” – pois
precisamos, no fim, concluir por um desenvolvimento inteligente,
com propósito – pelo Self.[lii]
Seria impossível fazer aqui uma descrição de todas as
combinações planetárias possíveis, levando em conta que a
proposta deste trabalho não é discorrer sobre as especificidades
desses símbolos, mas sim dar uma visão geral dos correlatos
teóricos entre astrologia e psicologia analítica, que podemos
também chamar de astrologia psicológica ou arquetípica. No
entanto, existem algumas indicações pontuais e marcantes no mapa
natal que podem sinalizar a expressão mais ou menos clara de
emoções, ações e valores que sugerem a possibilidade do
aparecimento de complexos ou subpersonalidades. Essas
configurações planetárias certamente podem dar pistas muito ricas
na compreensão das dificuldades e bloqueios dos clientes.
O astrólogo e psicólogo da escola junguiana, Howard Saportas,
ensina: “Cada subpersonalidade quer ter a sua própria história e sua
própria mitologia. Algumas são mais facilmente reconhecíveis do
que as outras. Elas podem surgir e desaparecer; aparecem novas
que então se modificam outra vez”. E completa:
 
Em outras palavras, a subpersonalidade é uma síntese de vários
traços e de outros elementos psicológicos. Uma
subpersonalidade tem impulsos, sentimentos, emoções e seu
próprio modo de andar e de ficar em pé. Mas para haver essa
síntese de diversas partes da personalidade tem de existir um
centro ao redor do qual ela se processa.[liii]
 
Sasportas criou de forma interessante e didática uma relação de
algumas subpersonalidades astrológicas, que resumo aqui, de
forma simples, com alguns acréscimos e observações pessoais.

Diferentes Tipos de Personalidades

Subpersonalidade amorosa
Elas exibem impulsos bastantes persistentes voltados para a
questão dos relacionamentos amorosos, um forte desejo de
pertencer a alguém, compartilhar a vida a dois. São geralmente
afetuosas, sensíveis ao ambiente externo, abertas e receptivas ao
outro. Sabem estabelecer conexões fortes, e lidam bem com a
intimidade interpessoal. No seu aspecto mais distorcido, essa
subpersonalidade permite que tudo em sua vida fique girando em
torno de ter ou não ter alguém para amar ou sentir-se amado. Em
relação à personalidade, a necessidade de amor pode gerar todo o
tipo de insegurança, falta de discriminação ou tendência a se
adaptar demais ao outro para garantir a presença em sua vida.
Esperam pelo amor incondicional que nunca chega, e para isso
fazem uso de inúmeros subterfúgios ou de artimanhas de pressão e
controle, que acabam por afastar o objeto desejado. O que está por
trás dessa subpersonalidade pode ser o medo da rejeição, da
solidão, geralmente sustentada por uma falta de autoestima
marcante.
Do ponto de vista astrológico estas subpersonalidades amorosas
podem ter posições astrológicas muito marcantes em signos de
Água, como Câncer, Peixes e Escorpião. Como vimos no capítulo
dos quatro elementos, os tipos aquáticos têm forte tendência a uma
busca incessante de experiências amorosas na vida. Os planetas
mais fortemente associados a essa dinâmica psicológica são: Lua,
Sol, Vênus e Netuno. As casas quatro, sete e doze podem
manifestar mais comumente esta expressão.

Subpersonalidade voluntariosa
Essa subpersonalidade se organiza em torno do princípio
arquetípico da vontade. Há nelas um forte impulso para a
autoexpressão, a necessidade de reconhecimento por parte dos
outros, para a afirmação pessoal. Apostam em grandes causas, são
fortes, têm carisma e amam o poder. Empreendedoras e criativas,
lançam-se em aventuras e ideais com muita energia, pois esperam
pelo reconhecimento alheio. No lado distorcido e extremado dessa
dinâmica, podemos ver nelas o medo de não ser amado ou
admirado, uma dificuldade em perceber os limites das situações ou
das pessoas. No extremo, podem ser competitivas, autoritárias e
excessivamente ambiciosas porque, de forma inconsciente, têm
medo de perder o poder e o controle sobre tudo e todos. Impulsos
fortes de vontade ou poder estão associados aos planetas: Jupiter,
Sol, Marte, Urano e Plutão. Observar os signos: Áries, Leão e
Sagitário, que pertencem ao elemento fogo. Os signos de Escorpião
e Capricórnio podem dar pistas interessantes nesse sentido.
Devem-se observar também as casas um, cinco e dez.

Subpersonalidade conservadora
Existe nessa subpersonalidade uma forte necessidade de se
ancorar, consolidar as formas e manter aquilo que já existe, as
estruturas básicas da vida. Há nelas um ritmo e continuidade que
sugerem segurança e estabilidade. Os signos frequentemente
associados e essas qualidades pertencem ao elemento terra, que
são Touro e Capricórnio. Dito de forma mais simples, eles gostam
de manter os pés no chão, o pragmatismo é o seu forte, são bem-
sucedidas no mundo prático do cotidiano. Os signos de Câncer e de
Leão podem também apontar para essa tendência.
Em seu aspecto distorcido, essas subpersonalidades podem
expressar excesso de convencionalismo, teimosia, inércia, pouca
iniciativa, medo do desconhecido. Resistem às mudanças, e tudo o
que põe em xeque sua segurança ou seu status já adquirido pode
ser um grande desafio ou conflito. Uma subpersonalidade deste tipo
geralmente se constrói em torno de posições marcantes nas casas
dois, quatro e dez; e em posições específicas do planeta Saturno e
Vênus no mapa natal.

Subpersonalidade transformadora
É geralmente motivada por forte necessidade de modificar e
renovar tudo o que está ao seu redor. São pouco apegadas às
formas do mundo material, se levam facilmente por novidades e
mudanças sem grandes questionamentos. Desapegadas e mais
livres, são idealistas, evitam a monotonia e a repetição. As ideias e
as palavras as colocam em movimento. O cotidiano e a rotina
tendem a subtrair a sua motivação vital. Os signos que indicam mais
essas características são: Gêmeos, Aquário, Áries e Sagitário e os
elementos predominantes são ar e fogo. No limite, essas
subpersonalidades são extremadas; têm medo de enraizar ou de
serem aprisionadas no mundo da forma, o que pode indicar uma
faceta por vezes intolerante e destrutiva. Há uma dificuldade em
materializar e realizar suas ideias e projetos, que se renovam de
tempos em tempos e assim não são finalizados. Os planetas
envolvidos nessa dinâmica psicológica são geralmente: Mercúrio,
Marte, Urano e Júpiter. Devem-se observar as casas: três, seis e
onze.

Subpersonalidade pragmática
Essa subpersonalidade guarda algumas semelhanças com o tipo
descrito na subpersonalidade conservadora. Ela é organizada,
realista, com facilidade em executar ideias de forma rápida e
eficiente. Valoriza bastante o status e a segurança material, o que
significa uma tendência de visão mais materialista de existência.
São bem-sucedidas em ações de resultados imediatos e buscam
soluções no lugar de abstrações. Em seu lado mais distorcido, não
conseguem enxergar a totalidade da realidade ao seu redor,
derrapando na falta de sutileza com a complexidade da natureza
humana. Tendem a ser desconfiadas e irônicas em excesso, o que
pode ser um empecilho nas relações em geral. Tornam-se mais
abertas às mudanças quando essas são realmente imprescindíveis
ou inadiáveis. Diante de situações críticas são vulneráveis à
desesperança, pela dificuldade de ver um significado naquilo que
lhes acontece. Essa predisposição geralmente se constrói em torno
de posicionamentos de planetas nos signos de Touro, Virgem e
Capricórnio, que representam o elemento terra. São relevantes
também as casas dois, três, seis e dez.

Subpersonalidade mística
Aqui observamos uma forte tendência ao idealismo, onde o
indivíduo vive de forma mais ou menos confortável dentro de um
mundo de possibilidades ou de sonhos que podem ou não se
concretizar. Sua visão de mundo é abrangente e suas aspirações
sempre incluem o social e o aspecto humanitário. O mundo
sobrenatural e transcendente é alvo de seus interesses e estudos; é
uma buscadora de verdades e de significados para tudo o que
acontece, seja no plano individual ou coletivo. Essa
subpersonalidade não convive bem com as limitações do cotidiano
e, por vezes, o escapismo e a negação são as suas formas de
maquiar ou suportar a realidade. Suas ambições espirituais não
realizadas podem implicar em grande frustração e paralisia
psicológica. Em função de uma autoimagem idealizada, têm
dificuldade em reconhecer suas próprias limitações e sentimentos
negativos como ciúmes ou raiva, etc. É importante se observar
posições marcantes de Júpiter, Urano ou Netuno. Os signos de ar e
fogo pressupõem essa tendência, assim como as casas nove, dez e
doze.
As subpersonalidades podem funcionar como uma lente de
aumento de uma determinada expressão planetária; isso, em geral,
tem a ver com posições de Marte, Júpiter, Sol e Urano. No sentido
contrário, onde a distorção é no sentido de subtração, de menos
valia ou inferioridade, podemos nos deparar com aspectos difíceis
envolvendo Netuno, Vênus e Saturno. Em casos de naturezas
contraditórias, explosivas e polêmicas, geralmente encontramos
Marte, Lua e Urano em ação. Em casos de indivíduos mais
ambivalentes, indecisos e procrastinadores, Mercúrio, Netuno, Lua e
Vênus são relevantes. Oscilações entre desânimo e euforia ou
entusiasmo e tristeza podem ser observadas em posicionamentos
entre Saturno e Júpiter. Observe-se, entretanto, que essas
indicações são bastante genéricas e não podem ser levadas ao pé
da letra, pois cada indivíduo é único e reage a eventos da vida de
forma idiossincrática.
Explicitando melhor as distorções dos arquétipos, cito novamente
Ferrucci:
 
As subpersonalidades também são degradações ou distorções
de qualidades atemporais existentes nos níveis superiores da
psique. Por exemplo, a subpersonalidade hiperativa pode ser
vista como uma distorção do arquétipo da energia; o sedutor
compulsivo é um parente distante do amor em seu aspecto
superior; a subpersonalidade obstinada pode ser vista como
uma distorção da vontade; e assim por diante.[liv]
 
Conclusão do Capítulo
Tanto as subpersonalidades astrológicas quanto os complexos,
na psicologia junguiana, fazem parte de nossa vida inconsciente, da
nossa personalidade. Como já vimos, ambos têm autonomia,
pulsões, desejos e reivindicações próprias e, desta feita, moldam
nosso destino. Não são necessariamente negativos, mas podem ser
prejudiciais quando sequestram a nossa vontade ou libido e nos
impelem a agir de forma compulsiva e repetitiva. Ambos têm um
núcleo arquetípico central, que como personagens ditam regras
para um roteiro a ser vivido.
É importante salientar que as respostas que o indivíduo dá a
certas situações na vida dizem muito sobre sua tipologia, seus
complexos, e claro, sobre as configurações planetárias existentes
no dia de seu nascimento; entretanto, é primordial o entendimento
de que cada mapa natal é único, e as configurações astrológicas ali
presentes são pressupostos, cujo valor simbólico não é igual para
todos. Há que se levar em conta a interpretação do mapa como um
todo e a história individual que ali está contida. O mapa astrológico
pode indicar tendências que, como uma bússola, vai apontar uma
direção, ou guiar o astrólogo ou psicólogo em seu entendimento dos
possíveis caminhos para que haja uma transformação, caso ela for
necessária.
Afirma Greene sobre a complexidade da natureza humana:
 
Tudo o que possui vida e dinamismo é, portanto, “destinado”
pela natureza de seus complexos, os quais são modelos
inerentes percebidos pela psique humana como narrativas
míticas que determinam ambos, caráter e destino. (...)E para
Jung, os arquétipos que existem no âmago de todo complexo
são simbolizados pelos deuses planetários.[lv]
 
A esse respeito, completa Jung:
 
A jornada pelas casas planetárias, como também o passar pelos
grandes pórticos do mundo egípcio, portanto, significam a
superação de um obstáculo psíquico, ou de um complexo
autônomo, adequadamente representado por um deus ou
demônio planetário. Quem superou todos os círculos planetários
está livre de coação: conseguiu ele a corona victoriae e com
isso a semelhança com Deus.[lvi]
 
Gosto de lembrar que os sonhos, com suas preciosas e
surpreendentes imagens sempre são únicos, tal e qual o sonhador e
a sua história de vida. Um sonho pode conter imagens e situações
semelhantes, mas nunca será igual a outro. Sua estrutura simbólica,
como aquela que vemos na carta natal, precisa ser compreendida
sempre dentro de um contexto de respeito, amplitude e
sensibilidade. A interpretação pode levar o indivíduo a uma reflexão
mais profunda de si mesmo, seja em suas limitações ou
potencialidades. Os símbolos geralmente apontam para uma nova
direção ou caminho; sua riqueza e complexidade, quando
assimilados de forma adequada, são agentes de transformação
potentes. O inconsciente é criativo e dinâmico; se não assim não
fosse, por quê exerceriam tanto fascínio sobre nós?
Na literatura junguiana encontramos muitas referências aos
complexos: paterno, materno, inferioridade e superioridade, rejeição,
poder, velho sábio, puer e senex, salvador da pátria. Como vimos,
as configurações planetárias que chamamos de “aspectos” são
dadas pelas relações angulares entre os planetas no mapa
astrológico. Através delas podemos observar os pontos vulneráveis,
as fissuras psíquicas, os conflitos contraditórios da psique, ali
expressos pelas batalhas travadas pelos “deuses” ou arquétipos
planetários.
Dicas para mapear subpersonalidades

ou complexos na carta natal


Grande ênfase de um determinado elemento, ou a falta
dele. Esse fator pode ajudar a detectar a função inferior.
Ênfase de signos masculinos ou femininos, que podem ter
relação com uma natureza mais acentuadamente
extrovertida ou introvertida. Muitos planetas no hemisfério
sul ou norte da carta também apontam para essas
tendências.
Presença do Sol Lua e Ascendente em signos de pouca
compatibilidade. Exemplos: Sol em Peixes e Lua em
Leão, (água e fogo) Lua em Virgem e Sol em Libra (terra
e ar). Sol em Gêmeos, Ascendente Escorpião, (ar e
água).
Planetas sem aspecto com outros planetas ou pontos do
mapa natal, como Ascendente e Meio do Céu.
Stellium: A presença de três ou mais planetas no mesmo
signo e/ou casa.
Planetas masculinos versus planetas femininos. Aspectos
conflitantes entre Sol, Marte, Urano e Júpiter em
dissonância com Vênus, Netuno e Lua.

Sugestões para nomear possíveis

complexos no trabalho psicoterápico


Subpersonalidade ou complexo paterno: observar: Sol,
Saturno e Júpiter.
Subpersonalidade ou complexo materno: Saturno, Júpiter
e Lua.
Subpersonalidade ou complexo de inferioridade e
superioridade: Saturno e Júpiter.
Subpersonalidade ou complexo de timidez, rejeição:
Vênus, Saturno e Lua.
Subpersonalidade ou complexo do herói: Observar Marte
e Júpiter.
Subpersonalidade ou complexo de sabotagem, poder e
controle: Saturno e Plutão.
 
Retomando o que já foi dito, é muito importante salientar que não
podemos descrever ou intuir os possíveis complexos na carta
astrológica, como se estivéssemos seguindo uma receita de bolo.
Os “ingredientes” da matéria psíquica de um complexo podem ter
origens distintas. A sua intensidade pode acontecer de acordo com
o trauma, que pode ter sido circunstancial ou de longa duração.
Além disso, o mapa com um todo deve ser observado, pois
aspectos planetários específicos podem suavizar ou ampliar a
natureza de um complexo. É preciso levar em conta que cada
indivíduo é único, tanto quanto seu histórico familiar, social, etc. E,
sem dúvida alguma, devemos entender que a dimensão da natureza
do simbolismo astrológico é imensa, e por isso mesmo exigem não
só a lógica, mas, sobretudo, o pensamento analógico e a intuição do
astrólogo. Dito de outra maneira, um planeta, casa ou signo têm
amplos e diferentes significados, que podem ser mais concretos ou
abstratos.
Não há como praticar um “reducionismo” astrológico apressado
em relação a um cliente. Nenhum mapa é igual a outro. Nesse
mesmo raciocínio, você pode contar com um bom conhecimento
sobre a simbologia dos sonhos, e isso é importante. Mas nunca
ouvirá um sonho, mesmo que com as mesmas imagens
surpreendentes, igual a outro, dadas as especificidades do símbolo
sonhado por cada cliente.
Mais vale praticar a escuta atenta para estabelecer uma sintonia
fina com o cliente e sua história. Num dado instante, o “momentum”
acontece, e daí a intuição, os símbolos e o Self do terapeuta e do
cliente de manifestarão. E delicadamente se revelarão, mostrando
os significados mais precisos para que a consulta, seja
psicoterápica ou astrológica, faça sentido para ambos.
Termino com a frase de Jung sobre a multiplicidade da alma:
A chamada unidade de consciência é uma ilusão. Gostamos de
pensar que somos um; mas não somos, certamente não. Gostamos
de acreditar em nossa força de vontade e em nossa energia e
naquilo que podemos fazer, mas quando se trata de agir, vemos que
pouco podemos fazer, pois somos limitados por esses diabinhos, os
complexos.[lvii]
Roberto Assagioli[lviii]
Capítulo V

Sombra

“Precisamos da sombra. Ela nos conserva com os pés no chão,


ela nos relembra da nossa incompletude e nos proporciona
traços complementares. Seríamos, na verdade, muito pobres se
fôssemos apenas o que imaginamos ser”. (Marie-Louise von
Franz)

“Quem nunca passou horas de vigília, chorando

e esperando o sol amanhecer, esse não conhece

os poderes celestiais”. (Goethe)

Um dos legados importantes da teoria de Jung é que a psique


humana consiste de luz e sombra, e esta dualidade coexiste num
estado de tensão psíquica constante. Seu conceito de totalidade é
diferente de equilíbrio, mas, sim, implica numa unidade dos
contrários. Na totalidade nós temos e somos luz e sombra.
Segundo Jung, a integração dos opostos é condição básica para
se atingir a maturidade psicológica. No seu entendimento, a
valorização excessiva de qualquer aspecto da psique manifestada
de forma perigosamente unilateral poderia resultar em doenças,
neuroses ou mesmo psicoses.
A sombra vem a ser uma parte constitutiva da psique humana, e
é um conceito fascinante da psicologia junguiana. De modo conciso,
sabemos que a sombra pessoal está relacionada com tudo aquilo
que o homem não deseja ver em si mesmo. A formação da sombra
acontece a partir da infância e permeia o desenvolvimento psíquico
do indivíduo por toda a vida. A natureza e a especificidade da
sombra serão matizadas pela cultura, ou seja, variando de acordo
com as crenças religiosas, os valores familiares, educacionais,
sociais, políticos e por experiências dolorosas. Situações de
violência ou forte repressão podem ser traumáticas e as crianças
em geral não têm como se defender delas. Dessa forma elas se
tornam reféns de medos, culpas e segredos que podem adoecer
seu corpo e sua psique ao longo da vida.
 

Malévola, a senhora de todo Mal

 
Se por um lado as qualidades de generosidade, bom
comportamento e honestidade geralmente são estimuladas numa
criança, por outro, igualmente, são rechaçadas as manifestações de
agressividade, indisciplina, rebeldia, sexualidade ou fragilidade
emocional. Portanto, a sombra tem um aspecto individual e coletivo,
e nesse contexto ela é também a expressão de todas as formas de
intolerância, segregação, desigualdades, injustiças e dos horrores
das guerras.
A sombra pode ter uma natureza infantil, quando entendemos
que ela foi o depositário de todas as feridas ou humilhações
provindas da infância, que o indivíduo sofreu num grau maior ou
menor. Poderíamos dizer, assim, que a sombra existe dentro dos
territórios da psique onde o não prevalece, ou seja, em todos os
núcleos em que alguém, por motivos diversos, negou ou reprimiu
alguns aspectos inaceitáveis da sua história, personalidade, seja de
forma consciente ou não.
Num esquema simples, temos de um lado a persona, termo que
vai designar nossa fachada ou máscara, que é útil e funcional para a
vida social; de outro lado há essa outra parte do eu, mais sombria e
inconsciente, que permanece amordaçada ou trancafiada no porão
da psique. É como se a sombra ficasse escondida “atrás” da
persona (máscara) do indivíduo.
No comportamento humano é fácil reconhecer a entrada em cena
da sombra, pois ocorre no indivíduo uma mudança repentina da
personalidade. Assistimos então, perplexos, aos atos falhos,
explosões de ódio, emoções descontroladas, opiniões sarcásticas
ou desejos de vingança, medo, tristeza ou obscenidades que
normalmente não estariam na fala de certas pessoas. Em situações
de grande stress e doenças isso também pode ocorre, pois é
quando surge um rebaixamento da consciência. O ego dá uma
espécie de “cochilada” e qualquer contrariedade funciona como um
gatilho que aciona emoções negativas ou destrutivas, o que nos
permite afirmar que a sombra e os complexos são parentes bem
próximos e que andam de mãos dadas!
Pouco civilizada e primitiva, a sombra é também responsável por
comportamentos e pensamentos marcados pela inveja, ou
ressentimento. Nesse território sempre indomado e inconsciente
habitam também tendências cruéis e destrutivas, ganância
desmesurada, mesquinharias, enfim, o lado titânico do homem, e
que por convenções sociais e culturais não deve ser mostrado.
Em nome de uma autoimagem positiva, tudo o que na
consciência se opõe às qualidades socialmente valorizadas é
jogado ou banido para o inconsciente do indivíduo. A sombra, ao ser
tratada como inimiga e julgada ameaçadora, ganha vulto e força
justamente em função de seu não reconhecimento. Em outras
palavras, quanto mais negada ou não reconhecida, mais hostil a
sombra se torna.
No livro “A prática da psicoterapia”, diz Jung: “No momento em
que o espírito humano conseguiu inventar a ideia do pecado surgiu
a parte oculta do psiquismo, em imagem analítica: a coisa
recalcada”[lix].
É importante destacar também que a sombra não é
simplesmente aquilo que um indivíduo considera uma falha de
caráter, como egoísmo ou ambição. Por definição, como já vimos,
ela é inconsciente, reprimida e pode ser realmente detestável; no
processo psicoterápico, a sua integração à consciência é
geralmente bastante dolorosa.
É sempre um ponto de vulnerabilidade do indivíduo, uma espécie
de cicatriz que de tempos em tempos pode doer, virar um sintoma,
seja ele psíquico ou físico, originando as doenças. Dessa forma, é
compreensível que as pessoas prefiram negar ou justificar esse lado
escuro e perturbador. No inconsciente os complexos, a sombra e a
função inferior estão ou são emaranhadas entre si e podem atuar
em conjunto, pois possuem um dinamismo psíquico próprio. Os
habituais mecanismos de negação ou de defesa do ego funcionam
muito bem em nossa forma de autoavaliação, sempre arbitrária e
parcial, pois é assim que continuamos bem instalados nas áreas de
conforto psíquicas e supostamente bem longe de nossos defeitos e
limitações.

Mecanismos de defesa do Ego


Esses mecanismos de defesa do ego têm a função de preservar
o indivíduo do mal-estar e constrangimento diante daquilo que se
apresenta de forma repugnante perante a sociedade. Um deles é a
negação, em que certas características destrutivas ou indesejáveis
são sumariamente rejeitadas por ele. A enorme resistência para
alguém admitir que existe algo sombrio dentro de si, que causa
vergonha ou grande constrangimento, é sempre uma carga
intolerável.
A projeção é o mecanismo de defesa mais utilizado pelo ego, ou
seja, tudo o que é ruim, nocivo ou indesejável dentro do indivíduo é
lançado para um objeto externo, pois o mal está fora, no outro, seja
ele um amigo, o cônjuge, o político, o sistema financeiro, etc. Ao
projetar, o ser humano se livra de sua sombra e também da culpa
por ela acarretada. É importante compreender que é o inconsciente
que se projeta fora do indivíduo, sem que ele tenha consciência do
que está fazendo. A intensidade das reações emocionais dá pistas
óbvias quando a sombra é questionada, uma espécie de sinal de
alerta de que o mecanismo de projeção entrou em ação. Discussões
violentas geralmente acarretam doses maciças de projeções.
Portanto, fica fácil perceber que nada é melhor do que procurar por
culpados no mundo externo! Há no linguajar popular frases como:
“serviu a carapuça”... ou: “o buraco é mais embaixo”... que
evidenciam este fenômeno.
 
 
Entendemos que a sombra, como um mecanismo de exclusão e
negação, sequestra muita energia emocional e vital e acaba por
deter o fluxo criativo da vida psíquica, gerando, como já vimos,
depressão, autossabotagem, culpa, agressividade e doenças. Tudo
o que causa vergonha precisa ser escondido, causa mal-estar e
precisa de um permanente estado de alerta e atenção que, pela
pressão do inconsciente, em algum momento pode “vazar” para a
consciência.  A inércia, a paralisia gerada pelo medo ou a indolência
são mecanismos de fuga da realidade, ou seja, as outras facetas da
sombra subtraindo energia da psique humana. É comum vermos
como os emaranhados emocionais comprometem o
desenvolvimento de pessoas muitas vezes bastante dotadas e
inteligentes.
A sombra excluída e trancafiada no porão da psique tem alta
carga tóxica e aparece de forma ambígua, tanto em pessoas
explosivas que sempre se defendem atacando, como naquelas que
são muito rígidas, preconceituosas e controladoras, geralmente
muito ocupadas em vigiar e julgar a vida alheia.
Ela pode ser também a parte negligenciada ou não desenvolvida
da psique e, como tal, tem também potenciais latentes e
adormecidos que podem se desenvolver. Há uma parcela da vida
“não vivida” na sombra. Talentos ou habilidades que foram
reprimidos ou frustrados também causam raiva e destrutividade,
gerando mecanismos psicológicos sombrios que vão afetar o
comportamento e o desenvolvimento de um indivíduo.
No trabalho psicoterápico, o processo de transformação vai
ocorrer quando houver aceitação dessas partes sombrias de
personalidade, que também estão associadas aos complexos, onde
vivem as crenças de inferioridade, tais como aquelas que o
indivíduo não é merecedor de amor, de sucesso, ou na contínua
sabotagem e desqualificação inconsciente de si mesmo. Portanto,
será preciso trabalhar na desconstrução dessas crenças, e essa
tarefa não é simples e nem rápida. Exige uma grande dose de
humildade e paciência, pois a sombra certamente é “um osso duro
de roer”. Sendo um momento doloroso da terapia, muitas vezes
resulta no abandono da mesma. No livro AION, de Jung,
encontramos:
 
A sombra constitui um problema de ordem moral, que desafia
toda a personalidade do eu como um todo, pois ninguém é
capaz de tomar consciência dessa realidade sem despender
energias morais. Mas nesta tomada de consciência da sombra
trata-se de reconhecer os aspectos obscuros da personalidade,
tais como existem na realidade. Esse ato é a base indispensável
para qualquer tipo de autoconhecimento, e por isso, via de
regra, ele se defronta com considerável resistência.[lx]
 
No processo da longa jornada terapêutica, a gradual retirada
das projeções constitui um momento importante, quase um “turning
point”, que pode ser norteado por intuições e sonhos importantes.
Isso leva o analisando a um movimento oposto da psique que é a
reflexão, que significa curvar-se sobre si mesmo, olhar para dentro,
suportar e aceitar a dura realidade de que aquilo que é sombrio,
inadequado e terrível em sua vida é de sua própria autoria e leva
sua própria assinatura, e de mais ninguém.
 

Retirada de projeções

Recapitulando, os conteúdos psíquicos dos quais não temos


consciência aparecem de forma projetada em situações externas. A
projeção emana de conteúdos sombrios ou destrutivos dos
complexos de dentro para fora de uma pessoa, e ocorre de forma
inconsciente e não intencional. O inconsciente não faz isso de forma
aleatória, mas escolhe um objeto que possa conter alguma ou
muitas das coisas que projeta. Jung fala de um “gancho”, objeto no
qual o indivíduo que faz a projeção a “pendura”, como se fosse um
casaco.
A intensidade emocional em discussões acirradas ou nas
tentativas do indivíduo em desacreditar seu oponente, dá boas
pistas para percebermos a entrada em ação no palco dos desafetos
dessa personagem espinhosa e nem sempre bem vinda: a “sombra
projetada”. Dito de forma mais simples, aquilo que pode exercer um
fascínio, seja positivo ou negativo, está dentro da pessoa; todos os
excessos, sejam no amor ou no ódio, podem conter boas doses de
projeção inconsciente.
O objeto da projeção não diz respeito só a uma pessoa, pode
estar ou pulsar dentro de uma nação, organização, ideologia ou
cultura. Nesse fenômeno psíquico encontraremos também a sombra
coletiva espelhada e projetada em todo tipo de fanatismo, em ações
políticas extremadas, no racismo, em preconceitos dirigidos aos
inimigos de toda ordem, e que no limite, são início às guerras.
Para alcançarmos a maturidade psicológica e avançarmos em
direção à individuação, teremos em algum momento que entrar em
contato com a nossa capacidade destrutiva, maléfica ou demoníaca.
Saber-se engolido por inferioridades não é agradável, enfrentar a
sombra-pessoa pode ser a última trincheira na longa caminhada
para o Si-mesmo.
A retirada lenta e gradual das projeções é uma etapa crucial no
processo analítico, mas conhecer esse lado oculto em nós é um
grande passo em direção a uma espécie de libertação, de uma vida
mais realizada. Sempre é importante lembrarmos que na sombra há
também uma vida ainda “não vivida”, e isso quer dizer que
potenciais ou recursos latentes do indivíduo podem estar
adormecidos no porão da psique. Represados e confinados como
um animal selvagem, estão à espera de espaço e liberdade para
viver.
Assim, a reflexão, que é um movimento contrário ao da
projeção (fora), significa um voltar-se para dentro, um dobrar-se em
si mesmo; a pessoa não mais simplesmente descarrega sua energia
ou libido só para o lado externo da vida. As reações instintivas e as
compulsões cedem mais lugar para liberdade e atitudes pessoais
mais sensatas e criativas. Isso não significa reprimir a sombra, mas
aceitá-la, dar-lhe um novo significado através de um novo e mais
consciente olhar. Se não reconhecermos a nossa sombra
certamente não seremos capazes de transformá-la. Literalmente
seremos “assombrados” por ela.
Assim esclarece Von Franz sobre a importância da retirada das
projeções em seu livro “Psicoterapia”:
 
“Quanto mais a pessoa se conhece e, por conseguinte, faz
menos projeções sobre os outros, mais pode se relacionar
consigo mesma e com as outras pessoas de maneira mais
objetiva, genuína e sem ilusões. Aí reside, em última análise, a
distinção entre a simpatia ou paixão e o verdadeiro amor, ou
entre o ódio e a rejeição objetiva e o desapego. Todo o
progresso realizado na compreensão mútua e na melhora das
relações entre as pessoas depende da retirada das projeções”.
[lxi]

Trabalhando com a Sombra


No processo analítico há recursos terapêuticos que possibilitam o
trabalho de percepção e integração da sombra. Jung sempre
privilegiou o trabalho psicológico feito através das imagens, com as
fantasias. Se a função da psique é imaginar, sua linguagem é a
fantasia, esse reino intermediário entre a consciência e o
inconsciente.
A imaginação ativa é um método criado por Jung, cujo objetivo
é a diferenciação das imagens mentais, essas figuras da
imaginação, presentes nos complexos. Ela é uma espécie de
devaneio ativo em que há um rebaixamento da consciência e,
portanto, uma facilidade para que os conteúdos do inconsciente
venham à tona, criando uma faixa intermediária onde as fantasias
brotam espontaneamente.
Esse recurso pode ser feito também por meio da pintura, trabalho
em argila, escrita automática, por desenhos, pela dança, levando-se
em consideração a facilidade que a pessoa tem para se expressar
em cada uma delas. Aqui o inconsciente aproxima-se do consciente,
e dessa união dos contrários surge o símbolo, que é o produto
justamente dos opostos, do que é racional e irracional ao mesmo
tempo. Assim é possível acontecer a desejada transformação, a
“novidade” que chega através dos encontros desses opostos
conflitantes, que são as contradições internas do indivíduo. Esse
encontro é chamado de função transcendente.
A interpretação das imagens dos sonhos é também um recurso
amplamente utilizando na psicologia analítica. O sonho é uma
imaginação passiva, uma vez que ninguém controla um sonho, ele
simplesmente acontece. O nosso inconsciente é povoado por
imagens e símbolos, que na terapia deverão ser “decifrados” de
modo a podermos captar o significado de suas mensagens. Com
essa matéria-prima onírica, o psicoterapeuta poderá fazer
associações livres com essas imagens e a na amplificação delas,
fazendo relações com a história pessoal do cliente ou com imagens
arquetípicas relacionadas aos elementos presentes no sonho. Esses
procedimentos são relevantes para que haja uma compreensão do
que o Self está querendo dizer, uma vez que os sonhos são portas
para o inconsciente. O conhecimento de simbolismo, em seu sentido
mais amplo, é fundamental na “arte” de interpretar sonhos.
Dimensão arquetípica da Sombra
É importante entender que nem só do escuro vive a sombra.
Como já vimos, ela também abarca talentos e potenciais ainda não
vividos, que querem emergir para a consciência. Jung fala do
inconsciente como dotado de um grande dinamismo e que contém,
em forma germinal, qualidades que nunca puderam ser expressas e
que são fundamentais para o desenvolvimento pleno e criativo da
personalidade.
A sombra provoca em nós o redentor (redenção), pois sem ela
não haveria as dores da alma, a tensão entre ela e a persona, o
inconsciente e o consciente, que é o que faz o indivíduo buscar a
compreensão e a cura do seu sofrimento.
Tema recorrente nos contos de fadas, a sombra pode ser
encontrada em todos os tipos de personagens sombrios: uma
criatura deformada, um anão, um ser estúpido. Esse último, como
um personagem sombra, mesmo sendo infantil ou bestial é aquele
que poderá salvar o herói com a sua sabedoria instintiva. Muitas
vezes vemos o personagem sombra que pede algo ou faz uma
barganha em troca de algo para que o protagonista possa seguir a
sua viagem e cumprir a sua difícil tarefa. De outro lado, temos a
bruxa que rouba crianças; o próprio diabo ou guerreiro selvagem
que tenta destruir o herói. Sua fraqueza e sua força, assim como
sua perseverança ou inteligência serão duramente testadas pela
força desses personagens.
Sintetizando, em termos mitológicos e arquetípicos a sombra
geralmente está associada aos gigantes, dragões, monstros,
feiticeiras, demônios e lugares como cavernas, porões, labirintos.
No conto “A Bela e a Fera” temos o encontro da Bela com seu
aspecto masculino de animus “feio” ou “indesejável”; em uma
análise simbólica, ao se apaixonar pela Fera, ela está aceitando e
integrando essa sua dimensão complexa e difícil de ser assimilada.
Acolher qualidades inconscientes e detestáveis é uma ameaça ao
ego, ao lado consciente da personalidade e à autoimagem positiva
que temos de nós mesmos. No entanto, querer demonstrar só a
perfeição é também uma carga intolerável, com a garantia que isso
certamente não vai funcionar. Luz e sombra habitam nosso ser,
queiramos ou não.
 

Hercules Matando Hydra, Hans Sebald Beham, 1545

Desse modo, tanto o ser desprezível e inferior do conto sabe de


algo importante, quanto à maldade intencional da bruxa ou da rainha
malvada, o aspecto sombrio da mãe, podem atingir o seu objetivo,
que é forçar o desenvolvimento do personagem, e levá-lo a uma
espécie de transformação ou redenção. A sombra contém em si um
potencial criativo que exige do indivíduo humildade, capacidade de
entrega e uma sutileza de percepção para ver que os “adversários”
externos estão dentro dele mesmo.
Sobre esses temas diz Greene: “Os contos de fadas nos
mostram um fato importantíssimo sobre a sombra: secretamente,
por trás do mau jeito e da escuridão, ela oculta muitas qualidades
que longe de serem “más”, em forma embrionária são necessárias
para que o ego se torne um todo integrado”.[lxii]
No caminho da individuação será fundamental o confronto com a
sombra. Mas sabemos que essa parte escura e pouco civilizada da
personalidade não será modificada ou exorcizada através de críticas
ou julgamentos severos, tanto externos quanto internos. A
condenação de si mesmo não irá surtir nenhuma cura, uma vez que
frequentemente a sombra diz respeito às lacunas de amor e de não
aceitação provenientes da infância. Uma pessoa mais equilibrada é
aquela que permite que a sua inferioridade ou fragilidade se
expresse, uma vez que assim a sombra pode ser mais integrada. Se
o indivíduo é muito unilateral ou intransigente consigo ou com
outros, tanto mais escura ou destrutiva será a sua sombra. Gosto de
frase: quanto mais nego ou fujo da minha sombra, mais
“assombrada” minha vida será.
Sobre o trabalho terapêutico e a importância das dores da alma,
Gambini ensina:
 
Então, devemos sempre nos perguntar se aquilo que
inicialmente se manifesta como dor, ainda que muitas vezes
negada e não nomeada, não poderá conter em seu âmago uma
matéria misteriosa e transformadora, que, no entanto, nenhuma
psicologia define nem conceitua, como se fosse um território
inacessível à elaboração mental e ao entendimento. Portanto,
encaro a terapia como um trabalho capaz de tocar um cerne
obscuro, que nos apavora, e que até preferiríamos ignorar, que
é o coração da agonia, porque lá, em seu mais íntimo, pulsa e
vibra uma força de renascimento e restauração do que foi
destruído e caiu nas trevas da sombra.[lxiii]
 
Entre as inúmeras técnicas de acesso a esse “território
inacessível à elaboração mental e ao entendimento”, como relata
Gambini, destacamos duas:
A técnica do Sandplay, ou Jogo de areia, é feita com uma caixa
de madeira com areia, e nela o paciente vai colocando figuras em
miniatura, montando assim um “cenário” de imagens internas que
vão aparecendo. É um método não verbal, lúdico e profundo. Essa
técnica permite o acesso ao inconsciente, acolhendo as projeções e
a dinâmica psíquica do indivíduo. Traz à tona emoções ou
sentimentos reprimidos. Em sua origem era uma modalidade
terapêutica para crianças, e depois foi adaptada com êxito também
para adultos como complementação da terapia verbal; tem a função
de organizar conteúdos internos e estimula a criatividade. O
psicoterapeuta geralmente não faz intervenções durante o processo
de criação dentro da caixa. A criadora desse método foi a suíça
Dora Kallf (1904-1990) que, muito estimulada por Jung, fez a sua
formação como analista no Instituto Zurich. A criativa combinação
da Psicologia Analítica entre a técnica de Margaret Lowenfeld e a
filosofia oriental atraiu seguidores e praticantes do Sand Play em
todo o mundo.
A Calatonia é uma técnica de trabalho corporal, criada pelo
médico húngaro Pethö Sándor, que fixou residência no Brasil em
1949. Ela é feita com toques delicados que se concentram
preferencialmente nos pés, depois nas mãos e finalizando na região
da nuca. Essa técnica ativa o sistema parassimpático e permite a
regularização do tônus, ajuda a aliviar o stress, dores, tensão; o
estado de relaxamento também favorece o acesso às imagens e
conteúdos do inconsciente do paciente.
 
Saturno e Plutão

na Astrologia

Na Astrologia, os planetas representam diferentes impulsos,


motivações, forças instintivas, e impulsos específicos que movem o
ser humano em direção à realização de seus desejos.
Todos têm características tanto positivas quanto negativas, dada
a sua natureza arquetípica que engloba a dualidade e a totalidade.
De modo geral, é bastante comum encontrarmos na literatura
astrológica mais tradicional a afirmação, ou axioma de que Saturno
é o “grande maléfico”. Este postulado está longe de ser verdadeiro,
mas ele ainda persiste dentro de uma visão mais maniqueísta deste
princípio simbólico.
Entendemos que há uma relação entre a sombra e o simbolismo
astrológico de Saturno. É importante lembrar também que a
mitologia grega está intrinsecamente ligada ao simbolismo
planetário, haja vista os nomes das divindades primordiais terem a
mesma nomenclatura dos planetas. Vejamos o que nos conta o mito
de Saturno/Cronos.

Mito de Saturno / Cronos


Na Teogonia de Hesíodo, temos a descrição do mito da
castração de Urano por seu filho Cronos e a batalha com seu filho
Zeus:
Urano, o Céu estrelado e Gaia, a Terra, eram um casal
primordial. Ambos tinham o mesmo tamanho e Urano estava
sempre deitado sobre Gaia; assim ele a fecundava o tempo inteiro.
Sendo duas forças opostas, masculino e feminino, geraram muitos
filhos. Porém, como o Céu estrelado estava sempre grudado em
Gaia, não havia espaço para esses filhos saírem do ventre materno
e lá ficavam espremidos, sem luz, fazendo a própria mãe gemer de
dor. Entre eles estavam: os Titãs, forças selvagens e indomáveis da
natureza, os Cíclopes, monstros que tinham um olho na testa e os
Hecatônquiros, gigantes horríveis que tinham cem braços.
O que havia no mundo era uma escuridão sem fim. A Terra-Gaia
estava furiosa e revoltada com seu esposo e com seu triste destino
de não poder ver os seus filhos e pediu ajuda a um deles para livrar-
se deste martírio. Seu filho mais novo, o titã Cronos, aceitou o
desafio de enfrentar seu pai. Para este intento, Gaia deu a ele uma
foice afiada por ela. Assim, quando Urano vai novamente se deitar
sobre sua esposa, Cronos agarra e corta os órgãos sexuais do pai,
e com a mão esquerda rapidamente joga-os para trás. Algumas
gotas de sangue caem sobre a terra fecundando-a mais uma vez, e
assim nasceram as Erínias, que eram as Fúrias. O esperma de
Urano caiu nas ondas do mar, misturou-se às suas espumas
brancas e delas nasceu, dentro de concha de madrepérola, Afrodite,
a mais bela das deusas.
Gemendo de dor, Urano, o céu estrelado, bateu em retirada,
afastando-se da Terra. Instalou-se no teto do Mundo, de onde nunca
mais saiu. Desde então, criou-se um espaço entre Céu e Terra, e
tudo o que ela gerasse poderia agora respirar e viver. E assim
aconteceu! Também o nascimento do dia e da noite, que agora se
intercalavam com regularidade entre si, apoiando-se mutuamente,
pois não havia noite sem dia e vice-versa.
 
Réa entrega pedra para Cronos

Cronos, após tomar o governo do mundo para si, tornou-se um


tirano temido e odioso. Casou-se com sua irmã Réa, dando início a
uma nova geração. Havia um oráculo que dizia que um dos seus
filhos usurparia o seu trono, e isso o deixava sempre desconfiado.
Para que isso não acontecesse, Cronos devorava cada filho que
nascia. Do ventre materno iam direto para o ventre paterno. Sua
esposa Réa não suportava mais essa situação, e aconselhada por
Gaia, planejou uma artimanha. Quando seu último filho estava
prestes a nascer, Réa fugiu para Creta e dentro de uma caverna deu
à luz Zeus. Este ficou aos cuidados da cabra Amaltéia, que o
amamentou por muito tempo.
Réa voltou para casa e entregou a Cronos uma pedra enrolada
num pano, e este acreditou ser o seu filho recém-nascido; sem
pensar, engoliu a pedra. Réa suspirou aliviada, pois tinha salvado
seu filho, cumprindo assim a profecia. Atingindo a idade adulta,
Zeus volta para enfrentar seu pai. Métis, a Prudência, o ajudou,
entregando a ele uma droga, o “pharmakon”, que Zeus fez o pai
beber. Mal Cronos a engole, começa a vomitar violentamente.
Primeiro a pedra, depois vomita os seus filhos: Héstia, em seguida
Deméter, Hera, depois Hades e Poseidon. Cronos assim “deu à luz”
os filhos que Réa havia gerado.
E assim tem início uma grande rebelião, liderada por Zeus. Para
garantir sua vitória, Zeus desceu aos infernos e liberou os Cíclopes,
forjadores de armas, e os Hecatônquiros com cem braços, monstros
que Urano, em sua loucura, havia encerrado nas profundezas da
terra. Agradecidos, os Cíclopes e os Cem-braços deram a Zeus o
raio e o trovão; a Hades/Plutão ofereceram um capacete mágico
que o tornava invisível. Netuno/Poseidon foi agraciado com um
tridente com o qual poderia abalar, quando quisesse, tanto a Terra
quanto o Mar.
Seguiu-se então uma longa e terrível batalha entre as forças do
mundo primordial, a Titanomaquia. De um lado Saturno e os Titãs, e
do outro Zeus, seus “tios”, e alguns de seus irmãos, até então
desconhecidos. No pior momento da batalha, o Mundo voltou ao seu
estado caótico; as montanhas desabaram abrindo fendas na Terra, e
voltaram as neblinas que estavam no abismo. O Céu despencou
sobre a Terra, voltando tudo ao caos primordial.
Mas, por fim, Zeus vence a batalha contra o seu pai, que foi viver
nos confins do universo. Longa e muito árdua foi essa guerra, porém
com glorioso triunfo. Cronos e os titãs foram vencidos e confinados
no Tártaro. Essa vitória restabelece a ordem do mundo. Em
majestosa conferência, os vencedores da grande batalha reuniram-
se e dividiram entre si o domínio do Mundo: Hades seria o senhor
dos Mortos, habitando o Tártaro. Poseidon ganhou a soberania dos
Mares e Zeus subiu ao Olimpo para de lá comandar altíssimo e
absoluto o Céu e a Terra, os demais deuses e os homens. A
consciência mais terrena representada pelo titã terrestre
Saturno/Cronos é substituída por uma perspectiva celestial, uma vez
que Zeus personificava o Pai-Céu, deus dos deuses e dos
humanos.
É importante ressaltar que existem várias narrativas míticas que
envolvem a simbologia destes dois planetas. O mito do rapto de
Perséfone é bastante rico em significados, então vamos a ele.

O Mito de Plutão e Perséfone


Demeter e seu irmão Zeus tiveram uma filha, chamada
Perséfone. Num dia de primavera, ela estava passeando
alegremente na companhia de amigas e num dado momento se
encanta com um lindo narciso à beira do lago e se inclina para
pegá-lo. Subitamente a terra se abre sob os seus pés, e dela surge
um carro preto puxado por quatro cavalos que estão sob o comando
de seu tio, Hades/Plutão. Ele a agarra rapidamente e desce com ela
para o seu mundo subterrâneo, o sombrio mundo dos mortos.
Nesse momento, Perséfone/Core, dá um grito, mas sua mãe
Demeter não consegue vê-la e nem entender o que havia
acontecido de imediato. Somente com a ajuda de Hélios, que tudo
vê, ela fica sabendo do ocorrido. Desesperada, com um archote
aceso em cada uma das mãos, Demeter vagou pelo mundo durante
muitos dias em busca de sua única filha.
Mas tudo foi em vão. Deprimida e igualmente furiosa, a deusa da
fertilidade da terra proíbe o crescimento das colheitas dos grãos e
dos frutos, deixando a terra seca e improdutiva; os homens foram
castigados e não tinham mais como se alimentar.
Zeus interveio e pediu a Íris que fosse até Eleusis, onde estava a
sua irmã Demeter, para pedir que voltasse ao Olimpo, ao que ela se
negou, afirmando que não permitiria que a vegetação crescesse
novamente enquanto sua amada filha não lhe fosse devolvida a. A
ordem do mundo estava em perigo. Finalmente, Zeus pediu a
Hermes que fosse ao mundo das sombras para convencer Hades a
trazer Perséfone de volta ao mundo superior, onde vivia sua mãe.
Hades não poderia desobedecer às ordens de seu irmão, então
engendrou um plano para ter Perséfone ao menos uma parte do
ano. Deu a ela uma romã para comer, e isso seria a garantia do seu
retorno aos mundos subterrâneos.
 

Rapto de Perséfone, Gian Lorenzo Bernini, 1621

Assim, um grande acordo foi feito entre Hades e Zeus para que o
sofrimento de Demeter terminasse. No outono e no inverno, período
em que a terra dorme, Perséfone ficaria com seu esposo no mundo
ctônico; no verão e na primavera, ela voltaria para ficar com a sua
mãe, pois seria época das florações e das colheitas dos grãos e dos
frutos.
Junito Brandão faz um excelente comentário dessa linda
narrativa:
 
Deusa maternal da Terra, sua personalidade é simultaneamente
religiosa e mítica, bem diferente, já se salientou, da deusa Géia,
concebida com elemento cosmogônico. Divindade da terra
cultivada, a filha de Cronos e Réia é essencialmente a deusa do
trigo, tendo ensinado aos homens a arte de semeá-lo, colhê-lo e
fabricar o pão. Tanto no mito quanto no culto, Demeter está
indissoluvelmente ligada à sua filha Core, depois Perséfone,
formando uma dupla quase sempre denominada As Deusas. As
aventuras e sofrimentos das Deusas constituem o mito central,
cuja significação profunda somente era revelada aos Iniciados
nos Mistérios de Elêusis. (...) Demeter é, pois, a Terra-Mãe, a
matriz universal e mais especificamente a mãe do grão, e sua
filha Core o grão mesmo de trigo, alimento e semente, que,
escondida por certo tempo no seio da Terra, dela novamente
brota em novos rebentos, o que, em Elêusis, fará da espiga o
símbolo da imortalidade. Plutão é a projeção dessa semente.
(...) Fundamentalmente agrário, o culto de Demeter está
estreitamente vinculado ao ritmo das estações e do ciclo da
semeadura e colheita para a produção do mais precioso dos
cereais, o trigo.[lxiv]
Simbolismo astrológico de Saturno
No saber astrológico, Saturno/Cronos é representado pela figura
do ancião que carrega uma foice, um instrumento agrícola e uma
ampulheta, que significa a passagem inexorável do tempo. Como o
regente do signo de Capricórnio é também o eremita, o velho sábio,
aquele que aprendeu com a caminhada da vida. Para alguns
estudiosos, a foice, que teria sido dada por sua mãe para que
pudesse destronar seu pai, é a expressão simbólica ou arquetípica
de um ponto de ruptura, quando o tempo expira, sinalizando a
duração dos ciclos ou fases da vida.
 

Chronos, Franz Ignaz Gunther, 1765-75


Em termos astronômicos Saturno é o último planeta do nosso
sistema solar visível a olho nu, simbolizando o princípio da realidade
e dos limites humanos. Na anatomia zodiacal ele representa a pele,
o esqueleto, articulações, joelho, unhas, dentes e os processos de
envelhecimento.
Saturno é um princípio estruturador, ligado ao mundo das formas,
do mundo tangível e material. Desta feita, os princípios astrológicos
positivos a ele atribuídos são: disciplina, perseverança, estabilidade,
resiliência, trabalho, ambição, esforço, autoridade e lealdade. Os
sentidos do real e do plano concreto da existência, do sacrifício e da
obstinação sempre estão presentes quando evocamos as imagens
arquetípicas saturninas. Suas qualidades são, sem dúvida,
imprescindíveis para que as grandes realizações humanas
aconteçam.
No mapa de nascimento, Saturno tende a manifestar-se também
como o “tendão de Aquiles”, o ponto nevrálgico da vida do indivíduo,
onde certas dificuldades ou conflitos aparecem de forma recorrente.
Assim é que o indivíduo constrói, de forma inconsciente, seus
esquemas de proteção ou segurança, como vimos anteriormente
nos mecanismos de defesa do ego em relação à sombra. A defesa
saturnina geralmente se apresenta com a faceta da vitimização,
sentimentos negativos em relação à vida, uma postura muito
defensiva, um forte ceticismo que deixa o indivíduo refém do
isolamento que prejudica sua interação pessoal ou social. Podemos
observar também sentimentos de inferioridade, medo, insegurança,
melancolia, baixa autoestima, pouca confiança no mundo, paralisia,
culpa e tristeza quando o planeta está pressionado por ângulos
difíceis com outros planetas no mapa natal astrológico. Liz Greene,
sobre a posição de Saturno no mapa de nascimento, expõe:
 
“A posição de Saturno no mapa de nascimento sugere uma
esfera de vida do indivíduo na qual foi, de certa forma, atrofiado
ou teve seu crescimento interrompido, na qual ele pode se sentir
inadequado, supersensível ou desajeitado, ou tende a se
supercompensar tentando exibir uma face corajosa e algumas
vezes insensível... A posição de Saturno sugere em que área é
mais provável a pessoa ser mesquinha, pequena, estreita; e
desde que as pessoas estão prontas a culpar o mundo por seus
infortúnios, a posição do planeta no nascimento certamente
sugere de onde o infortúnio virá”.[lxv]
 
Daí a importância de se conhecer essa parte sombria ou inferior
que todos temos. A frustração, a dor, aquilo que falta, os fracassos,
o fim das ilusões, acabam por remeter o indivíduo em direção a ele
mesmo, o primeiro grande passo para que desejadas mudanças
possam acontecer. Aceitar a própria escuridão é uma dura tarefa
moral, invariavelmente dolorosa para todos.
Nas narrativas mitológicas, podemos depreender que os
monstros aprisionados na escuridão do Tártaro ou no ventre de
Gaia e os filhos engolidos por Cronos são uma metáfora de forças
primitivas e caóticas presas em nosso inconsciente. Cronos/
Saturno, ao castrar seu pai, exerce um organizador, separando o
céu e a terra, o masculino e o feminino, o espírito e a matéria. Há o
surgimento do tempo cronológico, e assim o sol e a lua como
entidades distintas se alternam no céu, criando o dia e a noite,
propiciando aos homens a percepção da passagem do tempo e dos
ciclos das quatro estações da natureza.
Seu caráter obsessivo e apegado ao poder pela posição já
alcançada no mundo se manifesta nesse mito com um dos aspectos
negativos de Saturno. E, da mesma forma, sua faceta tirânica e
cruel destrói o potencial criativo dos filhos que representam uma
ameaça ao seu poder e, como consequência, impede a renovação
da vida. O simbolismo arquetípico de Saturno aponta para
potenciais a serem desenvolvidos com o passar do tempo e das
experiências duras da vida, que criam força, resiliência, maturidade
e sabedoria.
Sobre as forças caóticas ou mesmo indiferenciadas que desejam
emergir para a consciência do indivíduo, diz Sullivan:
 
Elas permanecem sonolentas e inativas até que um trânsito de
Saturno as chama à superfície para reavaliação ou
aprimoramento. Os próprios filhos que Cronos manteve em
cativeiro em seu corpo tornaram-se as figuras originárias do
panteão grego – uma clara indicação de que, se escolhêssemos
desentranhar impulsos criativos reprimidos, eles poderiam
provar-se bastante valiosos.[lxvi]

Trânsitos de Saturno

Os trânsitos astrológicos[lxvii] dizem respeito ao movimento dos


planetas no céu planetário, ativando ou estimulando o mapa natal
ou radical de um indivíduo. Vamos agora compreender o significado
geral dos ciclos de Saturno, tanto no sentido ativo ou passivo. Vale
dizer, seja esse planeta em trânsito, atuando sobre determinados
pontos do mapa, ou também recebendo trânsitos dos demais
planetas do zodíaco. A intenção aqui é facilitar ao leitor a
compreensão de como essa simbologia astrológica atua na
dinâmica do indivíduo, estabelecendo assim a sua relação com o
princípio da sombra na psicologia junguiana.
Nos trânsitos desafiadores de Saturno teremos o “tempo” certo e
adequado para fazer uma avaliação realista nos trânsitos difíceis
(conjunções, quadraturas e oposições), das premissas de fim de
algo, quer seja uma relação, um trabalho, uma postura, estão
chegando ao seu limite. Saturno em trânsito, como um grande
mestre tem uma ação moderadora, nos diz o momento em que
teremos que “baixar a bola” dos estados inflados do ego, do orgulho,
da ganância, do excesso de atividades ou trabalho que
comprometem a vida emocional.
Um trânsito difícil de Saturno pode trazer provações, profunda
melancolia, perdas ou frustrações para que possamos enfrentar os
medos, fazer um esforço de superação por vezes hercúleo, e assim
revelar uma força que desconhecíamos possuir. Doenças crônicas e
limitações físicas surgem, e eventualmente são também a moldura
do cenário externo para que essas experiências de superação
possam acontecer.
Assim, nos trânsitos saturninos ficamos mais suscetíveis ao
surgimento da sombra com todas as nuances já escritas sobre seu
funcionamento. A sensação de que tudo está suspenso no tempo e
que nada sai do lugar pode criar estados de ansiedade, pânico,
melancolia e desesperança. Os obstáculos externos, de alguma
forma, estão refletindo os conflitos internos, muito embora isso não
seja muito claro durante o trânsito, uma vez que processos
inconscientes e doídos precisam de um tempo para chegar à
consciência. A transformação que se espera no caso de um trânsito
de Saturno, ativo ou passivo, promove não só uma abstração, mas,
sobretudo, a possibilidade de incorporar e trabalhar com a realidade,
com novas escolhas, atitudes mais sábias e, como tal,
responsáveis, pragmáticas e realistas. Sobre essa sensação de
paralisia, diz Liz Greene:
 
Jung achava que as situações “encalhadas” tendiam a gerar
fenômenos sincrônicos, pois a situação de impasse na vida
constela a natureza compensatória do inconsciente, e tendem a
surgir sonhos e imagens arquetípicas como uma espécie de
“abertura de caminho”. (...) Mas uma olhada no horóscopo
nessas épocas aparentemente morosas, em geral, revela que as
coisas estão longe do encalhe ou estagnação; de fato, estão
caminhando para o amadurecimento; o ego ainda está preso à
velha perspectiva, mas já sente um novo vento soprando.[lxviii]
 
A respeito dessas experiências, diz também o psicólogo e
astrólogo Roberto Sicuteri:
 
A renúncia implica em separação. Sabemos que a separação
pode ser psicológica, moral, afetiva ou corpórea. Claro, Saturno
faz sofrer, predispõe à solidão porque restringe o campo da
consciência, acentua a introversão. Mas nesses casos a pessoa
perde seus aspectos coletivos a favor de uma individualidade
mais clara. Ele supera as atitudes do puer, mas adquire um
equilíbrio superior ao encarar a vida em perspectiva. Acaba com
as ilusões e até pode provocar duras desilusões, mas
exatamente por isso cria o sentido filosófico. Através da
separação, das paixões e das coisas, realiza a transcendência
ou fortes valores intelectuais. Em vista das escolhas a serem
feitas, Saturno leva a eliminar aquilo que se tornou insuficiente
ou que não é mais idôneo.[lxix]

Simbolismo Astrológico de Plutão


“Para que os ramos de uma árvore cheguem aos céus, é preciso
que suas raízes cheguem ao inferno.”
Nesta máxima alquímica medieval, nos deparamos com o
pressuposto da dualidade do arquétipo plutônico que opera em
termos de opostos. Seu poder pode ser destrutivo e cruel, mas
também criativo e regenerador.
No capítulo I do livro temos a descrição do arquétipo do signo de
Escorpião, onde foram esboçadas algumas características
relevantes sobre o simbolismo do Plutão astrológico.
Os símbolos de Plutão estão relacionados aos mistérios da vida
e da morte, à sexualidade, ao inconsciente, ao mundo invisível, à
magia, ao ocultismo, desintegração e transmutação da matéria e da
vida, para que possa surgir uma nova consciência. Morte e vida lhe
dizem respeito assim como o potencial criador e curativo no nosso
inconsciente. No corpo humano Plutão rege os órgãos sexuais e
excretores. Na Astrologia mundial se relaciona com transformações
políticas, geológicas e sociais; arqueologia, energia nuclear,
exploração mineral, as pedras preciosas, os vulcões, o crime
organizado, recursos energéticos subterrâneos, como o petróleo,
energia nuclear.
Quando foi descoberto nos confins do nosso sistema solar, em
1930, o planeta Plutão recebeu este nome que é um dos epítetos
atribuídos a uma importante divindade greco-romana, o deus Hades.
É o último planeta do nosso sistema solar. Ao lado de Urano e
Netuno, Plutão é considerado um desses planetas trans-saturninos
que não podem ser vistos a olho nu, e que foram descobertos mais
recentemente nos séculos 18, 19 e 20 respectivamente. Veremos
mais sobre esses planetas geracionais e de ritmo lento no capítulo
VII.
No panteão olímpico da antiga Grécia, Hades/Plutão era uma
divindade misteriosa e muito temida. O “príncipe das trevas” ou o
“Deus dos mundos subterrâneos” era o senhor do mundo dos
mortos e das sombras. Seu nome significa rico ou riqueza.
Hades, como já vimos, era filho de Cronos, o Tempo, e de Gaia,
a deusa da Terra, irmão de Zeus e Poseidon. Era o deus da riqueza
agrária. Acreditava-se que durante a Titanomaquia Hades recebeu
dos Cíclopes um capacete que dava a ele o dom da invisibilidade.
Na partilha dos mundos que se seguiu à longa guerra, coube a ele o
controle absoluto do mundo subterrâneo e dos mortos. Hades
aparece raramente nos mitos, embora seja muito mencionado;
dessa respeitada divindade nenhum favor ou benefício era
esperado.
Quando representado, mostravam-no com um forcado, uma
lança de duas pontas. Havia o templo de Elis, que era consagrado a
Hades/Plutão, que só abria uma vez por ano.
Sobre a natureza misteriosa de Plutão, assim se expressa
Stephen Arroyo, astrólogo e psicólogo junguiano:
 
“A maior parte dos astrólogos concordam que o planeta Plutão
simboliza uma dimensão da vida tão complexa e com fontes tão
profundas que uma aura de mistério rodeia o significado deste
planeta no horóscopo de nascimento (...), ainda não fui capaz de
encontrar qualquer explicação de significado deste planeta para
o ser humano considerado individualmente e para a sua
caracterização psicológica que possa parecer completa. Parece
que existe sempre algo escondido acerca de Plutão, algo sutil e
difícil de conceitualizar em termos lógicos correntes. Tudo o que
se relaciona com Plutão é, de certo modo, fora do vulgar, é um
tanto excêntrico e indica um domínio de intensidade cósmica
que confunde o espírito”.[lxx]

Trânsitos de Plutão
Os aspectos sacrificiais e as mortes simbólicas vividas durante a
vida muito bem traduzem os ciclos ou trânsitos astrológicos de
Plutão.
É necessário dizer que Plutão e destino andam de mãos dadas e
muitas vezes atadas. No plano psicológico não é raro observarmos
como seus trânsitos ou progressões podem desencadear a erupção
de complexos e de partes mais sombrias e doentes do indivíduo. A
escolha, a vontade individual e o arbítrio têm pouca eficácia; pode
haver uma verdadeira humilhação ou rendição do ego, para um
despertar de consciência ou de compreensão da vida.
Seus trânsitos ou ciclos desafiadores tendem a implodir certos
sistemas de crenças negativas, arraigadas e presentes nos
complexos, e que tendo vida própria não são fáceis de serem
confrontados. Traumas e resíduos de natureza compulsiva podem
vir à tona para que possam ser vistos, aceitos e ultrapassados.
Acredito que não temos capacidade de transformar totalmente
nossos complexos, eles constituem a nossa dinâmica psíquica. Vale
dizer, podemos chegar ao fundo do poço, de lá tirar a água
renovadora da vida, mas ainda assim, o poço lá permanecerá.
Plutão atua intensamente no plano dos relacionamentos
amorosos. É o regente do signo de Escorpião, que por sua vez
corresponde à oitava casa do zodíaco natural. Esse planeta quando
ativa essa área, por trânsito, pode constelar complexos parentais
reprimidos, traumas de violência ou abusos de natureza sexual,
trazendo à tona dores de rejeição ou humilhações da infância que
estavam adormecidos, porém vivos. Lá estavam controlados, com
sua variada tessitura ou intensidade emocional. Mas ao serem
provocados por complexos de outrem, podem se assemelhar a um
vulcão em erupção que vai despejar as lavas ferventes dos
ressentimentos até então inconscientes. Cenas de ciúmes e
possessão cinematográficas acometem casais de forma súbita, mas
não por acaso. As lavas plutônicas precisam emergir para que
antigas toxinas emocionais soterradas na psique possam ser
eliminadas. Howard Sasportas assim alude aos trânsitos de Plutão:
 
Os trânsitos de Plutão evocam imagens de descida – uma
viagem ao mundo subterrâneo do inconsciente, uma viagem de
descoberta do que está escondido dentro de nós. Deve-se
enfatizar novamente que o inconsciente não é apenas o
depósito das emoções, complexos e sentimentos negativos que
nos recusamos a reconhecer, embora não faltem “demônios”
desse tipo à espreita, nas profundezas da nossa psique.[lxxi]
 
Como enfrentar lembranças negativas da matriz afetiva, ou
erótica, da infância, que brotam sem avisar e se atualizam de forma
inconsciente em relações aparentemente equilibradas?
A verdade é que esses ciclos têm como propósito o confronto
desses aspectos mais bestiais e destrutivos, pois é ali que estamos
impotentes e somos desnudados, as defesas caem, fazendo com
que algo novo possa emergir para a consciência. Questões
existenciais e profundas são temas que encontramos na música,
literatura, na poesia. Como elas poderiam surgir não fossem as
inquietações e as dores da alma? Na inspiradíssima canção do
cantor baiano encontramos:
 
“Se eu quiser falar com Deus
Tenho que comer o pão que o diabo amassou
Tenho que virar um cão
Tenho que lamber o chão
Dos palácios suntuosos do meu sonho
Tenho que me ver tristonho, tenho que me achar medonho
E apesar do mal tamanho alegrar meu coração”.[lxxii]
 
Conclusão do Capítulo
Na descrição dos significados arquetípicos destes dois planetas,
seja do ponto de vista mitológico ou astrológico, percebemos que
eles guardam semelhança bastante clara com aquilo que
entendemos ser a sombra no contexto da psicologia analítica.
Portanto faço aqui um resumo daquilo que entendo ser uma
possível interface simbólica e teórica entre a natureza da sombra
na psique humana e os conteúdos arquetípicos associados a
Saturno e Plutão no simbolismo astrológico na carta de nascimento:
- Ambos os planetas representam aspectos reprimidos, escuros
ou inconscientes da psique. Especificamente Saturno, no mapa
natal, representa as áreas de fragilidades ou defesas, onde
construímos nossos esquemas ou muros de proteção. A casa e o
signo onde ele está deve ser observado, independentemente dos
aspectos. Plutão diz respeito às feridas da alma que ficaram
soterradas em nossa história emocional.
- Saturno e Plutão têm uma relação intrínseca com a
manifestação da sombra nos complexos, a expressão exagerada ou
compulsiva das emoções, com vimos no capítulo IV.
- Ambos estão ligados à imagem do demônio, de Lúcifer, ao
príncipe das trevas, com a Besta, os aspectos indomados ou
destrutivos da personalidade, difíceis de serem aceitos tanto pelo
próprio indivíduo quanto pela sociedade. Nos mitos nos deparamos
com a natureza titânica, cruel e violenta de Saturno que, a meu ver,
encontra um paralelo com a força não civilizada, primitiva e
irracional de Plutão.
- Em ângulos difíceis no mapa natal ambos podem indicar
sentimentos de medo, rigidez, obsessão, depressão, pânico,
negatividade, comportamentos de frieza e indiferença. Em ângulos
harmônicos Saturno indica seriedade, segurança, resiliência,
determinação, senso de realidade. Plutão indica capacidade de
superação, tenacidade, determinação, capacidade de correr riscos,
obstinação, profundidade, enfrentamento, compromisso com a
verdade nua e crua, audácia e poder pessoal.
- Ambos estão implicados com o valor educativo da dor que
chega através das perdas, mortes, rupturas, traumas, frustrações ou
de situações difíceis que estão fora do nosso controle. É comum
observarmos experiências traumáticas em ciclos (trânsitos) fortes de
Saturno e Plutão. Há uma frase que diz: “O encontro com a sombra
rouba-nos a inocência”.
- Em trânsitos desafiadores, ambos podem representar
processos psicológicos de descida da libido, de depressão,
angústia, catarses, sofrimento, purificação, morte e renascimento,
para que haja o desenvolvimento da consciência. Nossos potenciais
ainda desconhecidos e inconscientes emergem de lugares
dolorosos para que possam ser reconhecidos e integrados em
nossa vida. Um processo terapêutico bem conduzido será
certamente bem-vindo e proveitoso para que a transformação
desejada possa ocorrer.
- Ciclos de Saturno demandam a paciência, a aceitação da
limitação, a espera pela passagem do tempo; processos de
purificação, regeneração e conscientização por vezes dolorosos,
geralmente são marcantes em trânsitos plutônicos. Ambos
demandam humildade para que haja uma nova consciência. Muitos
fazem analogias ao ciclo da lagarta dentro do casulo que, inerte,
espera o tempo certo para dele se libertar; uma vez transformada
em borboleta, poderá, finalmente, voar!
- Indicam ciclos (trânsitos) em que a sombra emerge em
decorrência de eventos externos ou internos, que podem resultar
num colapso de valores e na derrota do ego.
- Nas narrativas míticas, ambos se relacionam com gigantes,
pântanos, cavernas, labirintos, ogros, duendes, seres deficientes,
dragões, demônios, bruxas ou feiticeiras. Nelas o herói deverá
atravessar florestas, ser engolido por baleias, atravessar mares
revoltos, matar seres monstruosos, etc. Nessas histórias cujas
metáforas tão bem simbolizam a complexidade da dinâmica
psíquica, o herói necessita vencer enormes obstáculos e desafios
para que o tesouro seja encontrado, seja a princesa, uma jóia, um
reino encantado, ou o retorno para casa.
Em suma, Saturno e Plutão nos levam ao encontro da nossa
sombra. Promovem a humanização e a humildade; por outro lado
nos ensinam a altivez do espírito perante as adversidades; são os
senhores do destino. Mostram o valor educativo da dor, do
sofrimento que leva à sabedoria que advém do desenvolvimento da
consciência.
Capítulo VI

Individuação

“Individuação significa tornar-se um ser único, na medida em


que por individuação entendemos nossa singularidade mais
íntima, última e incomparável, significando também que nos
tornamos o nosso próprio Si-mesmo”. (Jung)

“Tornar-se o ser desejado não representa o processo de tornar-


se perfeito; ao contrário, significa tornar-se ciente dos próprios
ângulos e arestas, do movimento próximo ao desconhecido e do
nosso potencial. (Irene Gad)

“Tudo manifesta símbolos: o sábio é aquele que em qualquer


coisa pode ler outra, processo que é familiar a todos nós em não
raros campos da experiência cotidiana”. (Plotino)

 
A individuação é um processo de reflexão, que possibilita um
criativo diálogo entre o inconsciente e a consciência. É um trabalho
psicológico interminável que permeia toda a existência, cujo
pressuposto está na realização de um padrão básico que é inerente
a todo indivíduo. A individuação é um conceito central na psicologia
junguiana e também o objetivo da prática psicoterápica. É o emergir
da essência do indivíduo em detrimento da aparência, onde haverá
a integração de aspectos contraditórios e obscuros da psique.
Individuar-se significa ir além das limitações do nosso intelecto, e
implica a possibilidade de viver experiências transcendentes ou de
cunho religioso, junto à apreensão do sentido e do significado da
vida. Esse caminho de emancipação e de integração da
personalidade subtende uma maior autonomia e liberdade em
relação às forças do Inconsciente coletivo e o fim da submissão
inconsciente ou compulsiva aos valores sociais, aos complexos
parentais, culturais ou religiosos da sociedade.
A noção de indivíduo como uma unidade inseparável, não
divisível e ao mesmo tempo integrada ao contexto coletivo, assim é
descrita por Jung em “Two Essays on Analytical Psychology”:
 
A individuação só pode significar um processo psicológico
evolutivo que realiza a disposição de dado indivíduo. Em outras
palavras, é um processo pelo qual o homem pode criar a partir
de si mesmo aquele ser definido, único, que ele no fundo sente
ser... À medida que o indivíduo humano, como unidade viva é
composto de valores universais, esta unidade é totalmente
coletiva e, portanto, não se opõe à coletividade em nenhum
sentido... a individuação tem por meta uma cooperação
essencial de todos os fatores.[lxxiii]
 
É preciso lembrar que a individuação, como busca de expressão
da individualidade, não é um privilégio só daqueles que fazem
psicoterapia, seja de qual linha for, uma vez que essa predisposição
é inerente a tudo o que nasce e vive, cresce e morre. Todo ser vivo
tem um potencial biológico natural para tornar-se aquilo que está
destinado a ser, e isso acontece de forma espontânea.
Simplesmente que para alguns será de forma mais consciente do
que para outros. Sempre podemos fazer uma simples analogia de
que a nossa vida é como a semente de uma fruta: sendo de uma
laranja, nunca se desenvolverá como um abacaxi. Quando
nascemos somos uma semente, ou seja, um potencial, um vir a ser,
no entanto não somos uma tabula rasa, já trazemos conosco certas
predisposições e inúmeras possibilidades em estado latente. Desta
forma, todo indivíduo sadio poderá desenvolver habilidades e
talentos no decorrer de sua existência, sejam elas corporais,
emocionais, intelectuais ou mesmo espirituais.
 
O processo de individuação é, na verdade, mais que um amplo
acordo entre a semente inata da personalidade e as
circunstâncias externas que constituem o seu destino. Sua
experiência subjetiva sugere a intervenção ativa e criadora de
alguma força supra pessoal. Por vezes, sentimos que o
inconsciente está nos guiando de acordo com um desígnio
secreto. É como se algo estivesse nos olhando, algo que não
vemos, mas que nos vê a nós - talvez o Grande Homem que
vive em nosso coração e que, através dos sonhos, vem nos
dizer o que pensa a nosso respeito.[lxxiv]
 
O psicoterapeuta será o orientador do paciente neste processo
dinâmico e poderá se valer das imagens dos sonhos ou de outras
técnicas, no sentido de ajudar na elaboração e conscientização dos
conteúdos que forem surgindo na terapia. A individuação não ocorre
de forma aleatória, mas também não depende só da vontade egóica
do homem; cada um vai realizá-la de forma única e singular.
 
Labirinto da Catedral de Chartres

Esse processo pode ter início com alguma forma de sofrimento,


sejam perdas, doenças, frustrações por planos que não deram
certo, separações difíceis. Muitas vezes o sofrimento é uma espécie
de armadilha, que enreda o indivíduo em situações conflituosas para
que uma nova consciência possa surgir. Verdades amargas,
fracassos, desesperança ou depressões podem abrir as portas que
levarão o indivíduo ao encontro dele mesmo. Momentos de grandes
impasses psíquicos podem mobilizar também movimentos de cura.
O contato com as poderosas imagens do inconsciente que habitam
os sonhos, e as dolorosas erupções emocionais presentes na
manifestação dos complexos, têm a sua razão de ser. O indivíduo,
ao sondar os mistérios de sua psique, irá se deparar com o poder
criativo, curador e transformador dos símbolos e do Self.
No trabalho psicoterápico poderá haver o encontro com a
sombra, que como já vimos no capítulo V não é nada prazeroso,
muito ao contrário. E também o confronto com nossos complexos e
provavelmente com a tirania da função inferior. As forças
arquetípicas da anima e do animus que tanto influenciam os
bastidores da vida amorosa, também estarão à espreita nessa
caminhada da individuação.
Para a psicologia junguiana a dimensão somática tem um
correlato psíquico, a anima, que é a feminilidade inconsciente do
homem, e o animus, que é masculinidade inconsciente da mulher. A
anima é uma imagem interna que resulta de todas as experiências
que o homem teve em relação às mulheres; portanto para Jung
anima é o arquétipo do feminino, cuja imagem primordial tem origem
basicamente na experiência com a mãe. Essa imagem será
transferia posteriormente para a irmã, a professora, a cantora, a
atriz preferida, a namorada ou esposa. Anima significa “alma”, que
corresponde ao Eros Materno e exerce uma função intermediadora
entre o inconsciente e a consciência, ou entre o Ego e o Self. O
homem bem resolvido com a sua anima terá mais facilidade para
acessar os seus sentimentos, cultivar o mundo da alma e viver
relações mais maduras. Terá mais capacidade para amar, imaginar,
nutrir e ser nutrido. O animus, como imagem arquetípica, é comum a
toda humanidade. Ela é moldada em primeiro lugar na relação da
mulher com seu pai. Desta feita, o animus corresponde ao Logos
Paterno. Essa imagem interna será projetada também em seu
irmão, amigo, professor, político, marido ou mestre espiritual. O
animus vem a ser a masculinidade inconsciente na mulher, e está
associado à força de ação, ao potencial criativo da sua mente e de
seu espírito. A palavra animus significa “espírito” ou “sopro”. Este
princípio masculino da mulher, diferenciado e bem trabalhado, dá a
ela uma sensação de autoconfiança e capacidade reflexiva na
busca de seu autoconhecimento e do significado da vida. Ambos os
arquétipos atuam intensamente como catalisadores dos
relacionamentos afetivos entre homes e mulheres. Dessa maneira
contribuem para a autoconsciência, pois sabemos que as relações
são desafios indispensáveis e necessários ao nosso
desenvolvimento interior e nossa maturidade psíquica.
Nessa caminhada rumo ao autoconhecimento haverá um
contínuo diálogo entre o ego e o Self do paciente. É a consciência,
ou seja, o ego, que vai auxiliá-lo na interpretação dos símbolos,
assimilando conteúdos inconscientes, participando e cooperando
com esse processo. Essa autotransformação advém do aumento
progressivo da consciência em relação a si mesmo, seja ela
sombra, seja ela luz. É o que na psicologia junguiana se denomina
como o “eixo EGO-SELF”.
Surpresas e revelações podem e devem surgir. O paciente vai se
deparar também com potencialidades ou talentos que estavam
adormecidos e que poderão pavimentar novos caminhos de
superação e realização. A sensação de que o indivíduo ou cliente
experimenta como sendo cocriador de seu destino e não só um
joguete na mão de fenômenos externos é muito relevante no
processo analítico. Essa ativação da vida simbólica e a percepção
mais profunda da existência criam uma perspectiva mais
encorajadora para ele, propiciando não só uma desejada
transformação como também um sentido para a vida. Paradoxos,
contradições ou traumas não serão simplesmente resolvidos, mas
ultrapassados.
Aprecio muito esse comentário de Jung sobre os tais “problemas
insolúveis”:
 
Vi muitas vezes pacientes superarem problemas aos quais
outros sucumbiram por completo. Tal “superação” ou
“ampliação”, como denominara anteriormente esse fenômeno,
revelou-se depois de experiências posteriores como uma
elevação do nível de consciência. Algum interesse mais alto e
mais amplo apareceu no horizonte, fazendo com que o
problema insolúvel perdesse a urgência. Sem que este
encontrasse uma solução lógica, empalideceu em confronto com
um novo e forte rumo de vida. Não foi reprimido, nem submergiu
no inconsciente, mas simplesmente apareceu sob outra luz,
tornando-se outro.[lxxv]
 
A individuação pode significar para muitas pessoas uma
saudável necessidade de isolamento, sem o qual esse processo de
diferenciação do coletivo, das normas culturais e dos preceitos
familiares pode ser em vão. No entanto, essa solidão está muito
longe de ser entendida ou vivenciada como alienação; um indivíduo
diferenciado não é indiferente ao que se passa ao redor dele. Sua
intenção é viver de forma mais autêntica possível a sua própria
natureza, ocupar um lugar no mundo onde a sua presença seja
também a assinatura da sua essência, o que pessoalmente entendo
como viver uma vida mais plena, criativa e feliz. O ser individuado
tem mais autonomia e liberdade para fazer suas escolhas, uma vez
que forças inconscientes, sejam elas pessoais ou coletivas, não têm
mais domínio sobre ele.
Sobre esse processo cito Crema:
 
É o que traduzo afirmando que todos nós somos filhos e filhas
de uma promessa que fizemos. Encarnamos para honrar e
cumprir essa promessa através da realização de uma tarefa
individual intransferível. É essa aventura que nos convoca a
penetrar no labirinto de nós mesmos, em direção ao diamante
do ser, no coração da pedra bruta de nossas existências.[lxxvi]
 
O objetivo da jornada da individuação é chegar à expressão
maior da totalidade psíquica, a unidade dos opostos, que vem a
ser o Self ou o Si-mesmo para a psicologia analítica. Resumindo, o
Self é entendido como sendo a totalidade da personalidade, como
um arquétipo central, que simboliza também o sentido da vida. De
forma metafórica, Jung relacionou o Self com a pedra filosofal dos
alquimistas, ou seja, o resultado da opus alquímica, em que os
conteúdos do inconsciente se depuram e se diferenciam até que
haja a transformação da personalidade consciente. Nessa
caminhada evolutiva, o indivíduo, aos poucos, poderá desenvolver o
que se entende por “atitude simbólica”.                    

Atitude simbólica e função transcendente


Como sabemos, os símbolos estão presentes em inúmeras
manifestações culturais, em sonhos, mitos, e de forma relevante no
saber e ofício das artes mânticas em geral, como o Tarot, I Ching,
Astrologia e outras. A leitura e a interpretação dos símbolos
permitem romper os limites da realidade e do pensamento lógico.
Com uma atitude simbólica, o indivíduo vai além dos fatos ou
eventos ordinários do cotidiano e poderá vislumbrar outro patamar
de compreensão de si mesmo e da existência. Através dessa
percepção ele será capaz de decifrar o significado daquilo que lhe
acontece e dessa forma desfrutar do viver de forma mais criativa.
Entendo que para que isso aconteça, será necessário um estado
de espírito de receptividade e abertura mais sutil e intuitiva que
permita a ele chegar a um estado de transcendência, que tem como
consequência a transformação da realidade interna e externa. Jung
deu a essa capacidade o nome de função transcendente, um
processo natural e involuntário, onde ocorre uma nova percepção e
postura perante conflitos de opostos psíquicos, que são conteúdos
conscientes e inconscientes. Aqui o poder dinâmico e transformador
dos símbolos se faz sentir como um terceiro elemento que poderá
abrir caminhos de crescimento e expansão da consciência. A função
transcendente é nossa capacidade psíquica de formar os símbolos e
de manter unidos a consciência e o inconsciente.
Como esclarece Jung: “A tendência do inconsciente e a da
inconsciência são os dois fatores que formam a função
transcendente. É chamada transcendente, porque torna possível
organicamente, a passagem de uma atitude para outra, sem perda
do inconsciente”.[lxxvii]
Podemos aqui fazer uma relação interessante entre essa função
psíquica, na Astrologia, associada ao planeta Mercúrio que, como
sabemos, era um deus mensageiro e “intermediador” entre o céu e a
terra, entre os deuses e os homens na Grécia antiga.
Por essa capacidade ele foi também denominado como Mercúrio
Psicopompo, que está relacionada com uma versatilidade
intermediadora entre o inconsciente e a consciência (psiche = alma
e pompós = guia). Sua sabedoria também se manifesta por alguns
“sussurros” que vêm de algum lugar desconhecido, talvez onde
habitem os anjos que nos conduzem em momentos de dúvidas e
aflições!
Mercúrio representa a capacidade mental, inteligência, a intuição
que orienta, mostra caminhos ou traz a revelação dos símbolos para
que os processos de transformação possam ocorrer durante a
caminhada individual. Essa instância psíquica é essencial no
processo de individuação por seu poder mediador, que acontece por
analogias, cujas associações ocorrem de maneira instantânea e
criativa. As imagens que comumente encontramos dessa divindade
com suas sandálias aladas, percorrendo os céus, nos transmitem
essa ideia de rapidez e leveza e magia.
 
Caduceu, símbolo de Hermes ou Mercúrio.

Em síntese, entendo que tanto num processo psicoterápico ou na


leitura da carta natal essa função psíquica mercurial é fundamental,
pois permite ao analista e ao cliente chegarem aos insights e
vislumbres que mostram outras possibilidades de ver ou enfrentar
uma situação. Mercúrio é, portanto, nossa capacidade psíquica de
decifrar símbolos, de sabermos nos guiar pelos labirintos de nossa
alma, chegar ao Si-mesmo. Mercúrio rege a consciência reflexiva,
ou seja, a capacidade de ponderar e de agir de forma não impulsiva
e instintiva, tendo em vista que, diferentemente do mundo animal,
possuímos um córtex frontal que é responsável por elaborações
cognitivas diferenciadas.
Pessoalmente, vejo-o como um grande amigo e aliado de todos
os “buscadores” de si mesmos, que não podem prescindir desse
processo mercurial tão bem expresso neste trecho da canção
intitulada “Caçador de mim”:
 
Nada a temer senão o correr da luta
Nada a fazer senão esquecer o medo
Abrir o peito à força, numa procura
Fugir às armadilhas da mata escura
Longe se vai sonhando demais
Mas onde se chega assim
Vou descobrir o que me faz sentir
Eu, caçador de mim.
Canção de Luís Carlos Sá e Sergio Magrão.
 
O processo da individuação encontra conceituação análoga ao
processo alquímico, no qual Mercúrio possuía papel relevante, como
afirma Howard Sasportas:
 
Em alquimia, Mercurius representava tanto o transformador
como aquilo que precisa ser libertado ou transformado. Ele
simbolizava tanto a prima matéria (o chumbo ou os excrementos
que deviam ser transformados em ouro), como a meta da obra.
Mercurius duplex, utriusque capax, é a frase em latim usada
para descrever Mercurius, e sua tradução é: “Mercúrio duplo é
capaz de qualquer dessas duas coisas”. A mente pode nos
prender ou moldar um novo mundo para nós. Jung comparava
Mercurius à função transcendente.[lxxviii]
 
Amnéris Maroni nos traz um olhar claro, quase poético:
 
Todo esse percurso psicológico sugere-me um refletir sobre si
mesmo, um curvar-se, uma dobra. É dessa dobra que emerge o
homem espiritual para Jung; um homem capaz de apreender em
grande parte seu padrão energético, imagético, poético
arquetípico... Esse estado lhe garante liberdade, flexibilidade,
variabilidade, imprevisibilidade e, em especial, espiritualidade.
[lxxix]

 
Por fim, creio que seja bastante importante ressaltar que a
individuação tem, como já vimos, um pressuposto não só individual,
mas também relacional, igualmente relevante. O processo subjetivo
da psique acontece e reverbera também no mundo externo, nas
relações, naquilo que o indivíduo poderá doar de si para o
desenvolvimento da coletividade.
Veremos a seguir o vasto simbolismo do Sol na Astrologia e
como ele se relaciona com esse processo de desenvolvimento
psicológico, conquistado e construído durante toda a vida e que
torna a existência mais plena se significados.
Símbolos Solares

“Por isso o Sol é adequado para representar o deus visível deste


mundo, a força propulsora de nossa própria alma a que
chamamos de libido e cuja essência é produzir coisas úteis e
nocivas, boas e más. Essa comparação não é um mero jogo de
palavras, como nos mostram os místicos; quando, por
introversão, descem para as profundezas de seu próprio ser,
encontram “em seu coração” a imagem do Sol, encontram a sua
própria “vontade de viver” que, com razão, posso dizer com
razão física, é chamada Sol, pois nossa fonte de energia e vida
é o Sol. Assim, nossa vida fisiológica como processo energético
é inteiramente Sol.” (Carl G. Jung)

“O coração, vemos assim, é o ponto de origem e de retorno. É


anterior a todas as dicotomias. É o lugar da psique total,
urobórica, de início indiferenciada como uma semente, mas com
todo o potencial do seu vir-a-ser. E também a meta, o paraíso
almejado, o lugar de encontro com o Self, conquistado após
muitos anos de trabalho.” (Denise Gimenez Ramos)

“Conhece-te a ti mesmo.” (Inscrição encontrada no templo de


Apolo, monte Parnaso, Grécia).

Em essência, a Astrologia é uma linguagem simbólica que nos


permite acessar e sobretudo compreender os conteúdos
arquetípicos da alma humana. Nesse infinito espaço imagético
encontramos os signos, os planetas, os quatro elementos que, como
espelhos, refletem nossa estrutura psíquica, nossas forças e
fraquezas, limitações e alegrias, motivações e pulsões que nos
acompanharão até o final da jornada. Esse vasto universo simbólico
está representado pelo Zodíaco, chamado na antiguidade como a
alma da natureza, ou a anima mundi.
É importante entendermos que esse conhecimento milenar foi
construído ao longo da nossa civilização tanto no Oriente quanto no
Ocidente e que sempre foi estudado e compreendido através do
pensamento analógico. Este se faz por aproximação, relação ou
semelhança entre duas coisas, o que é compreendido também
como o princípio das correspondências para/entre os astrólogos.
 

Robert Fludd: O Sol no céu é como o coração no corpo humano.

 
Vamos agora tentar entender de forma mais específica o que
representa o Sol na astrologia, para assim estabelecer uma
correspondência entre o seu simbolismo e o processo de
individuação. A mitologia e outras tradições antigas também nos
contemplam com ricas imagens e significados do nosso astro-rei e
que veremos também nesse capítulo.
Do ponto de vista astronômico o Sol é a estrela central do nosso
sistema solar, sendo responsável por 98,6% da massa deste
sistema. Todos os demais corpos giram ao seu redor, pela ação de
sua intensa força gravitacional. No interior do Sol se produzem
quantidades imensas de energia, e, como um reator atômico, ele
transforma hidrogênio em hélio. A interação entre o Sol e a Terra
determina as quatro estações do ano; sem essa energia de luz e
calor não haveria vida na Terra. Seu tamanho é 109.000 vezes
maior do que o da Terra, e a distância entre o nosso planeta e o Sol
é de 150 milhões de Km. Essa dimensão astronômica nos dá a
percepção da magnitude e importância do astro-rei em nossas
vidas.
No saber astrológico, o glifo do Sol vem a ser um círculo com um
ponto no meio, que representa a consciência dentro do círculo da
totalidade.
Simbolicamente, o Sol representa a força de atração, a
vitalidade, a direção e o pulsar da vida, o impulso por autonomia, o
princípio masculino da natureza, a criatividade, autoexpressão, a
consciência do eu, a generosidade, o calor da paixão. Suas imagens
arquetípicas nos remetem ao sopro da vida, à centelha divina,
consciência, força criadora da vida e do espírito, ao poder, comando
e autoridade. O Sol na astrologia personifica o pai, os governantes,
os professores, os reis, os gurus e os heróis.
Pelo princípio das correspondências, podemos observar que o
Sol que está no céu e no centro do sistema solar é o mesmo que
está no centro do nosso corpo sob a forma do coração, pulsando e
irradiando a vida. No mundo mineral ele é simbolizado pelo ouro,
diamante e o quartzo rutilado; no mundo animal pelo leão, no mundo
vegetal pela flor girassol e o açafrão. Na anatomia zodiacal o Sol
corresponde ao coração e ao sistema circulatório, o timo, a coluna
vertebral, os olhos. É bastante clara a percepção que a imagem
arquetípica do Sol astrológico está sempre relacionada com a luz,
atração, força vital, criação, poder, exuberância, grandeza e realeza.
 

Leão, por Yuri Prokopenko

Já vimos no capítulo II que o Sol astrológico é o doador da


identidade, a essência criativa que se manifesta na vontade
humana, no esforço para o homem tornar-se aquilo que é, e assim
encontrar um propósito para o seu viver. Representa a capacidade
que um indivíduo tem de dirigir e governar a sua vida de acordo com
seus intentos, e também de saber ou poder atrair para si o que ele
deseja. Sua função na carta astrológica é indicar o sentido de
individualidade de uma pessoa. No entanto, nunca é demais lembrar
que ninguém nasce pronto, pois existe sempre um processo do “vir
a ser” que se constrói ao longo da vida. Portanto, o Sol astrológico
relacionado ao mês de nascimento conjuga o verbo “ser”, quando
dizemos “eu sou de tal signo”, determinando assim algo mais
intrínseco ao indivíduo, que pode “ter” Mercúrio ou Vênus em
qualquer um dos doze signos zodiacais.
A meu ver, o signo solar do mapa de nascimento sempre merece
especial atenção. Sendo o Sol astrológico o “coração” do mapa
natal, encerra em si mesmo o pulsar da vida, a fonte de energia
física e psíquica, o vir a ser potencial da semente, o propósito
existencial do indivíduo, sua autorrealização. O Sol é considerado o
princípio progressivo da carta, a direção que a vida vai tomando de
acordo com nossas escolhas, mais ou menos conscientes.
Igualmente relevantes são a casa e o elemento do signo onde o
Sol está, assim como os aspectos ou ângulos que ele faz com os
demais planetas. Esses ângulos expressam uma estrutura simbólica
que aponta para talentos, facilidades ou dificuldades que o cliente
terá para se desenvolver ao longo da sua caminhada evolutiva.
Podemos dizer que os planetas com ângulos mais brandos e
afortunados são como uma espécie de “equipe de apoio e
proteção”, uma força de sustentação para que o indivíduo não
desista de suas metas.
Os ângulos mais árduos vão mostrar as áreas de conflito ou
contradições internas, resistências ou lacunas da alma que podem
impedir as realizações e os frutos da semente original. No entanto,
são as adversidades que forjam e fortalecem o espírito, promovendo
uma “musculatura psíquica” e a vontade de seguir adiante. Aspectos
fortes sobre o Sol no mapa natal acentuam essas predisposições
arquetípicas relacionadas ao que entendo como o propósito maior,
aquilo que dignifica a existência de uma pessoa, e que por mais
simples que seja é o que dá um sentido a sua vida. O regente solar
também merece créditos especiais por parte do astrólogo, uma vez
que este fornece direções certeiras de como (signo) e onde (casa)
esse impulso de realização irá manifestar de forma mais perceptível.
Nesse contexto, afirma Freitas:
 
O Sol simboliza numa carta astrológica natal o padrão global de
estruturação do ego da pessoa, isto é, daquela instância que é o
centro da consciência e serve como ponto central de referência
na psique para a organização de todos os recursos disponíveis
ao atingimento dos objetivos e à satisfação dos desejos do
indivíduo.[lxxx]
 
Tudo o que nasce e vive tem o seu destino peculiar, toda
existência carrega consigo uma promessa, seja uma semente de
árvore, seja um recém-nascido. Não por acaso, o simbolismo da
árvore em várias tradições sempre esteve associado à totalidade do
desenvolvimento humano, que na psicologia analítica é
representada pelo Self, ou o Si-Mesmo. Entendo que no ofício do
astrólogo as perguntas essenciais podem e devem remeter o cliente
em direção ao seu projeto de vida e seus propósitos mais
idiossincráticos e nucleares, questões como “quem sou eu” e “para
onde estou indo”.
Percebemos que esses são os aspectos progressivos e
existenciais do Sol natal, e a compreensão mais madura desse
caminho implica numa forma de percepção e de aceitação da
realidade da vida, com seus altos e baixos, perdas e ganhos que se
sucedem ao longo dela. Os conflitos da infância, juventude,
maturidade e velhice são mais ou menos específicos e inerentes
aos diferentes ciclos da vida. Em nosso “projeto solar”, o processo
evolutivo se faz presente em cada uma dessas etapas, onde a
consciência do eu se amplia continuamente.
Cito Valentine: “Este é o processo de Individuação de Jung, a
descoberta do Self, e o Sol é seu veículo. O Sol não é uma meta em
si, nem uma garantia de que a meta será cumprida. É o centro da
consciência, não da psique como um todo, e abrange a vontade
pessoal condicionada pelos desejos, apegos e considerações
pessoais – ou seja, nosso orgulho solar”.[lxxxi]
Por outro lado, em paralelo, as questões subjetivas e reflexivas
indicam com mais nitidez se o caminho está aberto para que os
potenciais latentes do indivíduo possam se manifestar. O cliente
está consciente de seus potenciais? Aquilo que ele está realizando
o deixa feliz?
Colocar a vida em perspectiva tendo em vista o entendimento do
signo solar dentro da carta natal é sempre bastante inspirador para
um cliente. O indivíduo de alguma maneira compreende ou aceita
melhor suas aspirações ainda não muito conscientes e se apropria
de seus talentos de forma mais segura e confiante. Entendo que o
indivíduo que realiza o seu “chamado solar”, seu daimon, terá
acesso a uma força criadora, que permitirá a ele contribuir também
com a caminhada de seu próximo, pois terá algo a mais para
oferecer a sua coletividade. Essa palavra, de origem grega, daimon,
tem uma relação com aquilo que podemos chamar de fado, vocação
ou chamado, sendo o portador do destino de uma pessoa; aquilo
que a pessoa sente que “precisa fazer”. É interessante notar
também que vocação vem do grego, vox + core, que significa o
chamado ou a voz do coração.
Sobre o ciclo solar e sua força criativa, comenta Jung:
 
Assim como o Sol, em seu movimento e segundo as suas leis
intrínsecas, sobe desde a manhã até o meio-dia, ultrapassa o
meio-dia e declina para a tarde, deixando para trás o seu
esplendor e mergulhando na noite que tudo encobre, assim
também o homem, segundo leis imutáveis, segue o seu caminho
e desaparece na noite ao fim da jornada, para renascer de
manhã em seus filhos, reiniciando nova trajetória.[lxxxii]
 
No universo da psicologia arquetípica encontramos mais
variantes análogas, aqui descritas por James Hillman, que discorre
sobre a importância do simbolismo do coração e do sol em nossa
cultura, e sobre uma delas, que seria a paixão e a coragem de viver,
o coeur de Lion. Ele diz:
 
O primeiro desses corações vem do folclore, da astrologia, da
medicina simbólica, da fisiognomia. O coração do leão é como o
sol: redondo, cheio e íntegro. Os simbolismos clássicos desse
coração são o ouro, rei, vermelho, sol, enxofre, calor. Ele brilha
no centro de nosso ser e irradia-se para fora, magnânimo,
paternal, encorajador.[lxxxiii]
 
No mapa natal o Sol representa a individualidade, o veículo
através do qual o Eu Superior, ou Self, vai se manifestar. De forma
análoga podemos pensar que a caminhada aparente do Sol no céu
tem uma relação imagética como no processo de individuação.
Como já vimos, o símbolo do Sol é um ponto no meio de um círculo,
ou seja, a individualidade em relação à totalidade. Dito de outra
maneira, o Sol do mapa de nascimento, representa aquilo que se
estabelece na relação entre Ego – Self, ou seja, entre o eu e a
totalidade.

Mitologia e a Jornada do Herói Solar


“No desenvolvimento da consciência individual, a figura do herói
representa os meios simbólicos com os quais o ego emergente
ultrapassa a inércia da mente inconsciente e libera o homem
maduro do desejo regressivo de voltar ao estado bem-
aventurado da infância, a um mundo dominado pela figura
materna.” (Joseph L. Henderson)

“Mas o regente do Sol é a divindade que nos preside; e o herói e


seu prêmio são, no final das contas, a mesma coisa.” (Liz
Greene, sobre o regente solar)

Vamos agora ao mito de Apolo, onde encontramos várias


referências simbólicas relevantes para entendermos sua importância
na construção da individualidade que acontece ao longo da vida, na
superação de desafios constantes do indivíduo em direção à
conquista do seu Eu profundo. A jornada do herói é um tema
bastante conhecido e estudado entre aqueles que apreciam a
mitologia também como uma metáfora do desenvolvimento da
consciência.
 

Templo de Apolo

O Mito de Apolo
Na Grécia antiga, no monte Parnaso, Apolo era cultuado e
reverenciado em seu templo, que abrigava o Oráculo de Delfos,
construído na cidade grega do mesmo nome. Em uma variante do
mito conta-se que Apolo, antes de se instalar nesse lugar, teve uma
importante missão: matar com suas flechas a enorme serpente de
Píton, que era a guardiã do oráculo de Gaia, a terra primordial.
 
Após destruí-la, ele ergueu o seu próprio templo, onde
reinou por muitos séculos, e homenageou a serpente,
dando o nome de Pitonisa à sua sacerdotisa. Num ritual
sagrado, sentada numa trípode de bronze e coberta pela
pele de Píton, ela respondia, em êxtase, às perguntas
dos consulentes que vinham ao Oráculo de vários
lugares, sendo que as consultas eram sempre feitas no
sétimo dia de cada mês. Nesse templo de Apolo havia a
famosa inscrição: “Homem, conhece-te a ti mesmo”.
Sabe-se que o oráculo de Apolo chegou ao seu apogeu
entre os séculos VI e IV a.C. da civilização grega. Em seu
templo iam se consultar chefes militares, soberanos e
navegadores, todos à procura de desvendar seu futuro ou
ganhar mais consciência sobre seu destino. A influência
político-social do Templo de Delfos foi de grande
importância na vida grega, não obstante as guerras e os
conflitos internos que nela houvesse. O templo de Delfos
era um centro de poder moral e sua influência religiosa
predominou na cultura grega e na hegemonia do povo
grego. Apolo, como representante da harmonia e da
beleza, lá estava para apaziguar as tensões e guiar o
gênero humano a favor do desenvolvimento da sua
consciência apesar das barbáries das guerras entre os
povos. Ao mesmo tempo que Apolo é a luz da
consciência, ele também promove uma ideia de cultura e
soberania, típicas da cultura grega. A espiritualidade por
ele representada é a função superior da consciência.
(Tereza Kawall)[lxxxiv]
 
Apolo

Já vimos anteriormente que em seu mito o jovem Apolo/Hélio,


com seus cabelos dourados, era representado em seu carro de fogo
puxado por quatro cavalos, atravessando a via solis ou abóboda
celeste e trazendo consigo a luz da manhã, simbolizando o curso
diário do Sol e o renascer contínuo da vida que chega dia após dia.
Apolo/Hélio é o deus da luminosidade, a luz que ilumina nossa
mente, nos traz inspirações para o viver e para criar nossa
realidade, dia após dia.
No imaginário do nosso inconsciente mais profundo, o Sol é o
doador da luz primordial que rompe a escuridão do mundo das
trevas, da noite, o mundo lunar, frio e até sombrio. Traz com ele luz
e calor, a visão, a consciência do ser. Quem nunca se encantou com
a luz e a força do amanhecer?
Como afirma Sicuteri: “O Sol, portanto, sustenta o homem no seu
caminho dentro da vida, e o sustenta como noumen, como centelha-
scintillae Animae Mundiignae- como arquétipo do divino nele
presente, pois toda criatura humana traz em si um Sol invisibilis, ou
seja, uma imago Dei .“[lxxxv]
 

Jonas e a Baleia: O herói é engolido pelo inconsciente

e depois volta transformado.

 
A superação e o confronto com o mundo lunar e inconsciente é
muito bem representado nas jornadas dos mitos dos heróis solares.
No mundo lunar, o eu está ainda submerso e preso em influências
familiares ou fatores mais subjetivos e emocionais. Os caminhos
tortuosos pelos quais o herói vai passar estão geralmente
representados por imagens arquetípicas que sinalizam uma
travessia pelo inconsciente: florestas escuras, rios que conduzem
aos infernos, mares revoltos e mesmo passar dias dentro da barriga
de uma baleia. Em sua jornada solar, o herói deverá matar dentro de
si as potências cósmicas do mal, representadas por serpentes e
dragões que habitam as cavernas de sua alma, vale dizer, livrar-se
da dependência materna ou familiar, que impedem o seu
desenvolvimento e autonomia. Sua meta ou recompensa, seja a
princesa, o tesouro ou a imortalidade é chegar à consciência de si-
mesmo.
Na representação dessa busca solar, da noite escura que
antecipa o amanhecer, ou seja, da inconsciência para a consciência,
e para a luz do dia que permite a visão, encontramos o simbolismo
do cavalo solar:
 
Na Grécia, o cavalo está associado a Apolo, o deus solar,
por conduzir a sua carruagem. Cavalo e carro solar têm
uma identificação tão íntima que muitas vezes não são
vistos separadamente. Ambos conduzem o Sol em seu
movimento diário pelo céu.[lxxxvi]
 
O Sol como símbolo cósmico sempre ocupou uma posição
central de poder em antigas civilizações. Em nosso país, na
concepção cosmogônica da cultura tupi-guarani, encontramos
presentes esses belos mitos. Para essas culturas, Tupã é o grande
espírito do trovão que deu origem à vida. Guaraci é o deus do Sol
que auxiliou seu pai na criação do mundo. Ele é irmão e marido de
Jaci, a deusa da Lua, que é guardiã da noite e responsável pela
reprodução das espécies.
Outras relações solares podem ser feitas com o deus Mitra, da
antiga Pérsia, um espírito poderoso, gênio do Sol e do fogo. E
também com Rá ou Horus, da mitologia egípcia, que era filho de Isis
e Osíris; Horus era representado como um homem com a cabeça de
um falcão. Era associado ao Sol, a luz do dia, sendo o protetor da
realeza egípcia. Também encontramos Surya, a divindade solar no
hinduísmo.
Termino com Valentine:
 
A tarefa do Herói consiste em “combater o dragão da
inércia a fim de destravar e liberar o fluxo da vida para o
corpo do mundo, na direção de um lugar onde a vida
secou, tornando-se uma terra estéril. Se recusamos a
chamada para viver nossas próprias vidas ficamos
deprimidos, sem vitalidade. O Sol simboliza a potência
criativa, cujos raios põem fogo no mundo, iluminam a
escuridão primordial, espírito penetrando na matéria, tudo
vai ganhando vida. O Sol nos liga com a forma vital e
bruta que existe em nós, oferecendo um canal para sua
manifestação, um princípio universal superior que nos
livra da dominação da natureza, liberta-nos das garras da
vida instintiva.[lxxxvii]
 

ATON, a divindade solar do antigo Egito.

O Sol e o Tarot
Encontramos dois arcanos maiores no Tarot de Marselha, cujas
representações são bastante análogas aos princípios astrológicos
do Sol e do signo de Leão.
Vemos na carta “O Sol” a figura do astro-rei brilhando e duas
crianças. O Sol em seu trajeto diário e anual representa a fertilidade,
a ressurreição dos ciclos da natureza, e de acordo com sua potência
criadora, temos os princípios da organização e continuidade.
Sol e Carta de Tarot

O Sol é a imagem do espírito masculino, a realização plena dos


ideais, e a luz, que é a consciência. No plano divinatório, a carta do
Sol indica um período de mais clareza e de confiança renovada,
uma vez que ele chega depois da escuridão da noite.
Na carta XI, “A Força”, vemos um leão e uma donzela que segura
a sua boca bem aberta. O leão é símbolo de poder e força voraz,
possui o sangue quente de um animal devorador, representando
assim os instintos e as paixões violentas. A carta representa a
possibilidade de se dominar os instintos e a própria força. A figura
feminina sugere a necessidade de domar os afetos descontrolados
e as emoções passionais, vale dizer, saber domar o fogo das
paixões. A meu ver, o pressuposto de Jung sobre a psiquização dos
instintos está bem representada nesta carta do Tarot, que vimos no
capítulo II.
O Sol na Alquimia
Nesse processo psicológico, tão bem representado nas
complexas imagens tanto da mitologia quanto da Alquimia, está
implícito, como uma grande metáfora, cravada em raízes
profundas do nosso inconsciente, a conscientização gradual do
homem, a revelação do “Si-mesmo”, uma árdua tarefa que
perdura até o final da vida. (Tereza Kawall)

O que torna a alquimia tão valiosa para a psicoterapia é o fato


de suas imagens concretizarem as experiências de
transformação por que passamos na psicoterapia. Tomada
como um todo, a alquimia oferece uma espécie de anatomia da
individuação. (Edward Edinger)

Na Alquimia encontramos um tema central, que é a


transformação dos metais em ouro, que como já sabemos é um
símbolo solar. Do ponto de vista dos alquimistas, o ouro físico e o
ouro psíquico eram a mesma coisa; eles não estavam interessados
no “ouro vulgar”, mas sim no “ouro filosófico”. “A Grande Obra” ou a
“Pedra Filosofal” era a descrição de um processo bastante complexo
relacionado à transformação da natureza humana, a fim de que ela
pudesse espelhar o seu aspecto divino.
O objetivo da obra era achar Deus na matéria e o metal ouro,
cuja natureza nobre e brilhante era o símbolo do eu espiritual
transformado. A opus alquímica estaria destinada a aperfeiçoar o
homem, a obra inacabada de Deus.
Sabemos que Jung durante muitos anos pesquisou longamente a
Alquimia. A partir desses estudos, da observação de suas próprias
experiências internas e de seus pacientes, estabeleceu relações
entre a complexidade da psique humana, suas misteriosas imagens
e as diferentes fases do processo alquímico, ao que ele chamou de
processo de individuação. Para ele, as imagens alquímicas seriam
uma metáfora dos processos da alma que ocorrem ao longo do
desenvolvimento de um indivíduo. A imagem central da Alquimia é a
opus, o trabalho sagrado ou divino, as experiências arquetípicas
que vivenciamos de diferentes maneiras, ao longo da vida. Para o
alquimista a opus alquímica era uma tarefa sagrada e divina, e só
poderia ser concluída mediante a graça de Deus (Déo concedente).
Os filósofos da antiguidade tinham uma imagem arquetípica de
que o mundo teria surgido de uma matéria única ou primordial, que
seria a prima matéria. Na concepção filosófica dessa época,
imaginava-se que essa “matéria primeira” teria passado por um
processo de diferenciação, sendo então decomposta em quatro
elementos: fogo, ar, terra e água.
Os antigos alquimistas herdaram a ideia da prima matéria da
antiga filosofia, aplicando-a ao seu trabalho de transformação dessa
matéria, que era uma massa confusa, indiferenciada, caótica, sem
limites. Para iniciar o processo, o alquimista deveria procurar, em
primeiro lugar, essa matéria primordial, e a partir dela seria iniciada
a opus alquímica. Através de algumas operações químicas ela seria
transformada na Lapis, ou Pedra Filosofal.
Assim, dentro de um contexto psicológico, essa prima matéria
está relacionada com as compulsões, instintos, pulsões sombrias e
medos, aquilo que não muda nunca e gera muito sofrimento.
Vimos no capítulo V as diferentes faces da sombra humana e sua
relação com o planeta Saturno. Seu aspecto infantil e indomável
está relacionado à prima matéria no que diz respeito às pulsões
destrutivas, aos complexos, àquilo que faz a alma doer e que
geralmente tem como consequência a depressão que paralisa o
desenvolvimento do paciente.
Liz Greene comenta aqui sobre essa “ferida da vida”:
 
Em termos individuais, isso naturalmente é a sombra, a parte
inconsciente de nós que muitas vezes é tão socialmente
embaraçosa, visto que é desagradável ou infantil, ou demasiado
vulnerável, embora contenha todos os potenciais não vividos da
personalidade”. Portanto, reitera Liz Greene, “a prima matéria
sempre tem uma conotação de aparência negativa ou sombria.
[lxxxviii]

 
As diferentes fases do processo alquímico tinham uma relação
direta com a posição dos planetas no céu, uma vez que tanto a
alquimia como a astrologia são baseadas no princípio das
correspondências e no tempo qualitativo. Dito de outra maneira,
os metais transformados tinham a mesma substância e energia dos
planetas, e tudo tinha o tempo certo para acontecer. No final deste
capítulo encontra-se uma descrição dessas fases alquímicas
também no contexto astrológico.
O ouro buscado pelo alquimista através da transmutação da
matéria é também um símbolo solar, por excelência. O Sol no céu e
o ouro encontrado em seu laboratório (da alma) brilham
intensamente e são representações do renascimento das forças
espirituais, como é a centelha do fogo divino no espírito humano.
Em analogia, o pressuposto alquímico é que o Sol é a própria
imagem de Deus, assim como o coração é a imagem do Sol no
homem. Por sua vez o homem é a opus, ou revelação do plano
divino da terra.
Sobre a pedra filosofal como metáfora alquímica, Roberto
Gambini[lxxxix] afirma:
 
A ideia é que, se andamos na direção da coisa importante que
queremos alcançar, os símbolos aparecem para nós para
sinalizar se estamos no caminho certo ou não. Na alquimia, a
pedra filosofal simboliza o longo processo que leva à unificação
interior. Então, pensando numa pessoa, quando ela consegue
chegar perto desse encontro consigo mesma e começa a se
aceitar do jeito que é, para de projetar seus conteúdos internos
para fora de si, aceita suas limitações e seu potencial – enfim,
torna-se responsável por si mesma. Aí é que se pode ver como
age uma pessoa psicologicamente madura, capaz de uma ação
eficaz porque aquilo que ela está se propondo é algo que lhe
corresponde. Ela chegou lá... uma configuração psicológica que
caricatamente pode ser resumida assim: “Essa pessoa
encontrou a sua pedra filosofal”.
 

“Nozze Chimiche”, Christian Rosen Kreutz


Conclusão do Capítulo
Como vimos, o simbolismo da potência solar está presente na
força dos heróis, que devem vencer os dragões, atravessar e
enfrentar as sombras nas florestas escuras de sua alma. O
pressuposto arquetípico de consciência, luz, superação da inércia,
dos instintos irracionais, dos monstros que habitam o inconsciente e
nos labirintos dos mundos lunares se faz presente nas narrativas
míticas de todas as culturas milenares. Encontramos também no
contexto alquímico inúmeras analogias das relações do Sol com a
ideia de nobreza, valor, luz, brilho, poder ou exuberância. E
observamos também a sua relação com o vir a ser, aquilo que
viemos buscar nessa existência e tudo aqui que traz um significado
e um propósito maior de realização, como já vimos sobre o processo
de individuação. O “ouro” filosófico ou espiritual guarda
semelhanças intrínsecas com o que falamos sobre o Sol astrológico,
em sua travessia diária celeste, que, como um princípio progressivo,
assinala diferentes etapas do desenvolvimento psíquico. Ou seja, a
conscientização gradual do Si-Mesmo, a própria individuação, o
“ouro” como revelação de essência de cada um, ou a quintessência
alquímica.
Termino com essa citação do sábio de Zurich, que tão bem soube
compreender a natureza simbólica das artes herméticas e relacioná-
las com a psique humana:
 
Parece-me de muita importância, particularmente com relação a
nossa hipótese de existência de uma consciência múltipla e
seus fenômenos, que a visão característica dos alquimistas -
aquela das centelhas que brilham na substância arcana negra-
se transforma, segundo Paracelso, no espetáculo do
"firmamento interior" e de seus astros ( estrelas). Ele considera
a psique obscura como um céu noturno semeado de estrelas
cujos planetas e constelações fixas representam os arquétipos
em toda a sua luminosidade.

O céu estrelado é, na verdade, o livro aberto da projeção


cósmica no qual se refletem os mitologemas, ou
arquétipos.Nessa visão, a Astrologia e a Alquimia, as duas
representações da psicologia do inconsciente nos tempos
clássicos, dão-se as mãos.[xc]
Para os interessados, fiz um breve resumo das operações
alquímicas e suas possíveis relações com as energias planetárias
presentes em determinados trânsitos astrológicos. Veremos no
capítulo VII o que vem a ser conceito de sincronicidade e o tempo
qualitativo, ao qual Jung dedicou anos de estudos e pesquisas. E
também como os trânsitos e progressões astrológicas vão
sinalizando de forma mais individualizada a manifestação de certos
arquétipos que, num dado momento, estarão dialogando mais
intensamente entre si. Ou seja, quando e como o universo traz
indicações precisas e importantes sobre os diferentes estágios do
nosso desenvolvimento.
Resumo das operações

alquímicas mais relevantes


De forma bastante sucinta vamos aqui descrever os diferentes
estágios do processo alquímico como metáforas, do ponto de vista
psicológico, tendo em vista que as operações alquímicas enquanto
estados de alma guardam algumas semelhanças com o simbolismo
astrológico. Podemos perceber esses processos internos com mais
clareza durante a passagem de certos trânsitos e progressões
que estão ativando o mapa natal de um indivíduo. Não há uma
sequência específica, entretanto na realização da opus algumas
etapas podem ser mais recorrentes, dependendo das características
do próprio mapa de nascimento.

Calcinatio
Esta operação tem íntima relação com o simbolismo do elemento
fogo, que vem a ser: aquecer e queimar a prima matéria, chegando
às cinzas. É um processo de secagem, para evitar a contaminação
inconsciente dos complexos. Em sonhos podem surgir imagens
recorrentes de incêndios, fogueiras, lareiras, vulcões. Queimar os
pecados no fogo do purgatório. A vivência da calcinatio é frequente
em vivências relacionadas com o desejo, raiva, decepção e amores
frustrados. O fogo aqui é a paixão que será extinta ou exaurida em
si mesma. Transmutar esse fogo significa elaborar as emoções, e
não ser refém de desejos de forma cega ou compulsiva. Sabemos
que a paixão é um catalisador para transformações. Aspectos
relevantes de Vênus, Marte e Plutão.

Solutio
Operação associada ao elemento água, que implica em
dissolução. Desintegração, onde os limites do ego se perdem ou há
ausência de limites, ou a inundação do inconsciente. Imagens de
renascimento, lavagem, purificação ou limpeza, como batismo,
banho de mar, ondas, cachoeiras, imersão na água, piscina, chuva.
Vemos resistências que precisam ser dissolvidas, o chorar e as
lágrimas. Experiências amorosas onde a fusão exagerada gera a
perda de identidade ou impotência. Trânsitos de Netuno e Lua.

Coagulatio
Operação relacionada ao simbolismo do elemento terra, cujas
características são o peso, a permanência, o chão, a encarnação na
matéria. Terra representa a cruz da matéria, a encarnação do corpo
físico. Autores dizem que essa fase pode vir após as duas
anteriores, onde paixões arrebatadoras pedem depois atitudes mais
realistas, a aceitação dos limites e da própria realidade. Pode
representar a capacidade de ficar só, ter responsabilidade sobre si
mesmo, pela própria vida. O planeta Saturno está associado a essa
fase, assim como a ideia de crucificação e do sacrifício. Seus
trânsitos nos levam a priorizar ou definir metas mais palpáveis e
realistas, e os esforços para concretizá-los. Pode haver melancolia,
depressão, que acabam se tornando necessárias para que haja a
transformação do metal pesado chumbo em ouro. Ou seja, a
individualidade se cristaliza e toma forma no aqui e agora da vida
real.

Sublimatio
Essa operação é associada ao elemento ar. As imagens
recorrentes podem ser pássaros, figuras aladas, escadas,
movimento de ascensão, elevadores, altura, alpinismo. Estar no
alto, olhar de cima permite a visão mais distanciada e desapegada
do emaranhado da existência cotidiana ou limitada. Ver a vida em
perspectiva também nos leva à capacidade de refletir, e à essência
significativa da matéria mais densa. A capacidade de abstração ou
de traduzir a vida em múltiplos significados, através dos símbolos e
de atividades criativas. Autores dizem que a sublimatio se relaciona
com a capacidade de brincar e imaginar, o pressuposto para obras
criativas ou artísticas. Trânsitos relevantes associados a Mercúrio,
Júpiter e Urano.

Coniunctio:

O casamento sagrado ou o Par Real


O objetivo do opus alquímico é produzido pela união final dos
opostos purificados. Nesse estágio do opus há a integração dos
opostos, o pressuposto da totalidade do Self. O casamento sagrado
vem a ser a união simbólica do Sol e da Lua, do Rei e da Rainha,
dos nobres metais como a prata e o ouro, dos céus e da terra, do
corpo e da alma. É a integração dos opostos, positivo e negativo, do
bem e do mal, da luz e da sombra.
 
Casamento do Sol e da Lua
Capítulo VII

Sincronicidade,

o Tempo Qualitativo 

“O pressuposto astrológico afirma que corpo, psique e cosmos


guardam entre si uma relação sincrônica, e seus fenômenos não
seguem ou obedecem a uma relação de causa e efeito, mas de
significado.”[xci]

“É do conhecimento de todos a importância da alquimia na


Europa medieval e no Renascimento. No entanto, talvez muitos
ignorem que essa ciência também existiu na China antiga (a
alquimia taoísta), na Índia, no Egito, na Grécia, no Irã ou no
mundo árabe, por exemplo. Aliás, uma possível raiz da palavra
“alquimia” é o termo árabe “al kimia”, do egípcio ”kemi” , “terra
negra”.[xcii]

Definição e criação do conceito


Em linhas gerais, o que vem ser sincronicidade?
Uma coincidência no tempo de dois ou vários eventos
sem uma relação causal entre si, mas com um conteúdo
significativo.
O princípio da sincronicidade afirma que os termos de
uma coincidência significativa são ligados pela
simultaneidade e significado.
Nessas “coincidências” há simultaneidade entre um
estado psíquico e eventos objetivos. Entretanto, este
fenômeno acontece independentemente do tempo e do
espaço, ou seja, eles são relativos.
A sincronicidade não segue os modelos causais e
racionais da ciência clássica; ela é um evento humano e
subjetivo, sempre validado por uma pessoa.
 

Relógio Sincronicidade

Resumindo, o que define basicamente a sincronicidade são a


coincidência e o seu significado; esses dois eventos acontecem
geralmente quando um arquétipo está implícito ou constelado, vale
dizer, ativado. Ou seja, dizemos que há um “pano de fundo”
arquetípico específico e temporal adequado para que a
sincronicidade possa ser observada.
Os eventos de sincronicidade podem se apresentar de inúmeras
formas e são mais comuns do que imaginamos. Podem estar
relacionados aos sonhos que antecipam situações que depois se
concretizam; a certos pressentimentos e com pessoas nas quais
pensamos e que em seguida encontramos; também com eventos
chamados telepáticos, que são frequentes entre pessoas que têm
uma relação afetiva. São aqueles objetos ou livros que aparecem
em nossa vida com algum tipo de mensagem que fazem sentido
especial; são barulhos ou sons que não deciframos, coisas que
desejamos muito e que “chegam” até nós. São pequenos milagres
ou epifanias do cotidiano, cuja ressonância interna parece ter um
toque de magia, produzindo uma sensação de completude.
As sincronicidades podem surgir em períodos de transição da
vida tais como em casamentos, nascimentos, mortes, doenças, ou
seja, em que decisões ou eventos importantes estão acontecendo
ou vão acontecer. A receptividade psíquica e dos cinco sentidos por
parte do indivíduo é fundamental na apreensão desse processo,
onde os símbolos estão dialogando com ele, e permitindo uma
conexão entre aspectos conscientes e inconscientes de um mesmo
fenômeno. Retomando a teoria junguiana vemos que a psique
humana vive numa união indissolúvel com o corpo, ambos estão
inter-relacionados, ou seja, o organismo representa uma totalidade
somatopsíquica. Importante ressaltar que esse é um postulado da
medicina psicossomática.
Os sonhos ou eventos de sincronicidade possuem uma relação
com a vida inconsciente, com os arquétipos e, portanto, com o
Inconsciente Coletivo. No entanto, há que se tomar cuidado com
certos equívocos no entendimento desses fenômenos. A
capacidade de apreensão da sincronicidade pressupõe uma
capacidade de pensar simbolicamente, fazer conexões, estabelecer
relações entre os eventos e de saber abstrair em termos analógicos
ou metafóricos sobre os mesmos.
Sobre esses fenômenos diz Von Franz:
 
“De acordo com a visão junguiana, o Inconsciente Coletivo não
é, de forma alguma, uma expressão de desejos e objetivos
pessoais, mas uma entidade neutra, psíquica em sua natureza,
que existe de uma forma absolutamente transpessoal, e atribuir
a ocorrência de eventos sincronísticos ao inconsciente do
observador não seria nada além de uma regressão ao
pensamento mágico primitivo, de acordo com o qual supunha-se
antigamente que, por exemplo, um eclipse poderia ser
“causado” pela malevolência de um feiticeiro”.[xciii]
 
Jung define a sincronicidade como a ocorrência simultânea não
causal de um determinado estado psíquico e um acontecimento
externo que se apresenta como um paralelo significativo com
relação a um estado subjetivo. É o que chamamos também de
paralelismo psicofísico. Em outras palavras, matéria e psique são
dois aspectos diferentes de uma só e mesma coisa. E foi dentro
deste contexto que Jung usou o termo da Alquimia medieval unus
mundus (um só mundo) para descrever o aspecto unitário que
sustenta a dualidade da mente e da matéria, do mundo interno e do
mundo externo.
Jung nos relata que desde o final de 1920 estava atento,
observando os fenômenos de sincronicidade em sua própria vida e
as experiências relatadas por seus clientes, relacionadas a eventos
externos ou que eram coincidentes com as imagens internas de
seus sonhos. Ou seja, ele já manifestava um interesse particular
pelos fenômenos que não se enquadravam numa visão mecanicista
ou causal da ciência ocidental, mas que estavam presentes na
cultura oriental, cujo pensamento é não linear e acausal. É
importante destacar que Jung sempre foi muito cauteloso ao falar
desses temas, pois o modelo de ciência de sua época estava muito
restrito a moldes mais cartesianos. Mas ele jamais deixou de
estudar, e com afinco, esses “esquisitos” campos de conhecimento
mais herméticos como astrologia, alquimia e as religiões orientais,
como também o Taoísmo e o Budismo, Hinduísmo. Em 1920 Jung
conheceu o sinólogo Richard Wilhelm, que foi o tradutor da melhor
versão do I Ching para o Ocidente. Tornaram-se grandes amigos e
colaboradores e assim foi até a morte prematura de Wilhelm, em
1931.
Diz Carlos Byington sobre essa importante relação:
 
“Segundo o próprio Jung, o sinólogo e missionário protestante
alemão Richard Wilhelm foi a relação profissional mais
importante de sua vida. Jung já conhecia o oráculo chinês I
CHING, mas a tradução comentada para o alemão, feita na
China por Wilhelm, em 1920, teve sobre Jung um efeito
extraordinário. A abertura para perceber a coincidência
significativa entre os hexagramas sorteados e o estágio do
desenvolvimento da personalidade de quem consulta o oráculo,
pareceu a Jung uma forma original de pensar o mundo. A esse
principio de coincidência a-causal, ele denominou
sincronicidade. Aplicou-o depois para explicar os significados da
astrologia e de ocorrências únicas com seus pacientes”.[xciv]
 

Richard Wilhelm
No livro O segredo da flor de Ouro, assinado pelos dois
estudiosos, encontramos a frase de Jung sobre a construção deste
conceito:
 
“A ciência do I Ching não se baseia no princípio da causalidade,
mas em outro princípio, até o momento sem nome – por não
existir entre nós – ao qual chamei experimentalmente de
princípio de sincronicidade. Minhas pesquisas no campo da
psicologia dos processos inconscientes levaram-me a procurar
outras explicações para esclarecimento de certos fenômenos de
psicologia profunda, uma vez que o princípio da causalidade me
parecia insuficiente. Descobri, inicialmente que existem
manifestações psicológicas paralelas que não se relacionam
absolutamente de modo causal, mas apresentam uma forma de
correlação totalmente diferente. Tal conexão parecia basear-se
essencialmente na relativa simultaneidade dos eventos, daí o
termo sincronicidade”.[xcv]
 
Jung, ao estudar antigas tradições herméticas, como a Alquimia,
se deparou com pressupostos e concepções comuns a todas elas.
Ou seja, uma visão de mundo que abraça a ideia de uma perfeita
unidade e comunhão entre o homem, a natureza e o cosmos, o
unus mundus, a unidade transcendente de todas as manifestações
de vida. Entendo que Jung, ao estudar essas tradições estava já
vislumbrando o seu conceito de Inconsciente Coletivo, nossa matriz
psíquica de onde emergem as imagens dos arquétipos que
representam as pulsões vitais presentes em todas as manifestações
da natureza, sejam elas físicas, emocionais, filosóficas ou
espirituais.
A Alquimia como um vasto, complexo e arquetípico
conhecimento milenar tornou-se secreta no início do período
medieval devido à forte oposição que a Igreja fazia a ela; no entanto
era praticada em segredo por muitos. Com a queda de
Constantinopla pelos turcos em 1453, inúmeros textos mágicos e
alquímicos gregos, ainda preservados pelo império Bizantino,
voltaram para as cidades ocidentais. Entre eles um volume especial,
chamado Corpus Hermeticum, onde se encontravam invocações
planetárias, procedimentos para produzir talismãs mágicos, as
diferentes etapas para a transmutação dos metais, e assim por
diante. Nesse conjunto de textos vemos o homem dotado de
poderes criativos e divinos, imagem humana preponderante do
homem renascentista, que ao libertar-se das crenças religiosas do
mundo medieval, encontra seu lugar como o centro do Universo.
Relata Liz Greene sobre esse resgate do conhecimento
alquímico:
 
“Na Itália, Cosimo de Médici, o senhor de Florença, ficou
especialmente interessado em adquirir esses textos, que então
fez traduzir. O poderoso movimento filosófico e cultural que
chamamos de Renascença, e que incluiu a alquimia, resultou
diretamente da aquisição destes textos neoplatônicos e
herméticos. Muitos desses textos provinham originalmente de
Alexandria”.[xcvi] Essa obra é uma compilação de obras de
diferentes autores escritas em um período que se estendeu por
mais de três séculos, conforme apresentado no capítulo I.
 
Foi em 1460 que o célebre mecenas italiano solicitou a Marsílio
Ficino (1433-1499) que fizesse a tradução dos antigos manuscritos
gregos para o latim daquilo que viria mais tarde ser o Corpus
Hermeticum. Essa obra é uma compilação de obras de diferentes
autores escritas por um período que se estendeu por mais de três
séculos
O milenar conhecimento da Astrologia sempre contemplou a
correlação entre os movimentos dos astros no céu e os eventos
terrestres formando um todo dinâmico, harmônico e indivisível. Essa
relação sincrônica entre céus e terra encontra-se na Tabula
Smaradigma, ou a Táboa de Esmeralda, datada do século VII, e que
contém a célebre frase atribuída a Hermes Trimegisto, o mensageiro
e intérprete dos deuses, que diz: “O que está embaixo é como o que
está em cima. O que está em cima é como o que está embaixo,
para realizar os milagres de uma coisa única”.

Pesquisa astrológica de Jung


E foi com seu espírito curioso, investigativo e mesmo ousado que
Jung se propôs a fazer um estudo bastante minucioso,
fundamentado em preceitos astrológicos, com o intuito de mostrar
as sincronicidades possíveis nesse campo de conhecimento. Com o
auxílio de seus colaboradores, Jung realizou uma expressiva
pesquisa astrológica com homens e mulheres casados, vale dizer,
180 casamentos ou 360 horóscopos individuais cujo objetivo final
era descobrir se haveria combinações planetárias específicas e
semelhantes entre esses casais. Na tradição astrológica e mais
especificamente no estudo da técnica das sinastrias[xcvii] há o
pressuposto de que os fatores de atração e compatibilidade estejam
associados aos arquétipos representados pelo Sol, Lua, Marte e
Vênus, que entre outras coisas representam simbolicamente os
princípios masculinos e femininos. Nesse estudo ou técnica, são
levados também em conta os signos que estão no Ascendente e no
Descendente da carta natal dos parceiros. Portanto, a intenção da
pesquisa seria a de verificar se esses fatores ou “coincidências
astrológicas” se confirmariam numa escala maior e comparativa.
[xcviii]

Verificou-se ao final deste experimento astrológico que as


conjunções entre Sol e Lua dos casais eram bastante expressivas;
em segundo lugar o Ascendente em conjunção a Vênus; e em
terceiro lugar a Lua conjunção ao Ascendente dos casais. É
interessante notar que o símbolo ou princípio feminino da Lua e
masculino do Sol, tanto na Astrologia quanto na Alquimia,
apareceram com fatores relevantes e favoráveis ao casamento.
Numa segunda pesquisa, foram observadas em primeiro lugar a
conjunção entre as posições lunares do casal. E também as
conjunções entre o Ascendente e Lua, entre Sol e Vênus, entre Sol
e Marte, e entre ambos os Ascendentes. Os resultados dessa
grande pesquisa foram considerados bastante satisfatórios em sua
proposta inicial, mas não foram conclusivos para Jung.
A esse respeito comenta von Franz:
 
“Mas Jung não ficou contente com a obtenção desse resultado
positivo. Sentado diante de sua torre em Bollingen, numa certa
tarde, ele de súbito viu, graças ao jogo entre luz e sombra, uma
face maliciosa que, cravada na parede, ria dele.... Veio-lhe de
impacto o pensamento: “Teria Mercurius, o espírito da natureza,
lhe pregado uma peça? Com uma disposição mental mais sóbria
e cética, ele repetiu o experimento com um segundo lote de
horóscopos, e, dessa vez, o resultado foi substancialmente
menos provável. Portanto, com toda a probabilidade, o primeiro
resultado fora por si só uma coincidência significativa, ou seja,
um fenômeno de sincronicidade.... mas a “prova” estatística era,
naturalmente questionável em sua totalidade”.[xcix]
 
A questão seria: poderiam eventos sincrônicos não causais
serem medidos de forma estatística com uma ferramenta “causal”
ou científica? Não seriam esses fenômenos espontâneos e
imprevisíveis?
É importante salientar que Jung foi um homem de vasta cultura e
erudição, fato que é facilmente percebido em toda sua obra e
correspondência, sempre com inúmeras citações de estudiosos,
teólogos, historiadores, filósofos gregos, etc. Sua
“Weltanschauung”, ou concepção de mundo e de homem, está
profundamente enraizada em conhecimentos filosóficos, herméticos
e espirituais que permeiam grande parte de sua obra. Entre tantos
homens de gênio coloco em evidência Plotino[c], o pai do
neoplatonismo, considerado por muitos como a “glória da filosofia
antiga” (205-270 DC). Sobre o filósofo, diz Greene:
“Mas Plotino pode ter sido importante para Jung por outras
razões do que o aparente misticismo “racional” das Enéadas... Jung
creditou a Plotino como sendo a primeira testemunha da ideia do
unus mundus, porque esse filosofo greco-egípicio declarou que
todos os indivíduos “são somente uma só alma”. Desse modo Jung
o considerou como um predecessor, ao lado de Platão, da ideia do
inconsciente coletivo”.[ci]
Para corroborar essa afirmação cito Tarnas, que confirma em seu
extraordinário livro sobre a astrologia arquetípica o profundo
conhecimento de Jung em relação às ciências herméticas que
acompanharam a história e a cultura dos homens desde tempos
primordiais:
“Desse modo, o trabalho posterior de Jung sugeria o antigo
entendimento de um mundo com alma, de uma anima mundi no
qual a psique humana participa e com o qual divide os mesmos
princípios ordenadores de sentido. Jung notou paralelos entre
fenômenos sincronísticos e o entendimento chinês do Tao, o
antigo conceito Grego de simpatia cósmica entre todas as
coisas, a doutrina Hermética do microcosmo e do macrocosmo,
a teoria das correspondências da idade média e da Renascença
e conceito medieval de uma unidade última pré-existente de
toda a existência, o unus mundus (o mundo unitário)”[cii]
 

Sincronicidade e a Física Atômica


O acentuado interesse de Jung pela sincronicidade nunca o
deixou, e foi o que o levou ao encontro do físico austríaco Wolfgang
Pauli (1900-1958), assim como a um profícuo mergulho científico
nesse tema. Especialista em mecânica quântica, admirado por
Einstein, recebeu o Premio Nobel em 1945. Jung e Pauli foram
grandes amigos por 25 anos, e a contribuição do cientista foi
fundamental para que Jung pudesse encontrar fundamentos para
seu conceito de sincronicidade dentro de um contexto científico. Há
um entendimento de que Jung teve uma influência mais “oriental”
em suas investigações ao partilhar seus interesses e conhecimentos
com o sinólogo Richard Wilhelm. Numa segunda fase, seus
conhecimentos foram direcionados e ampliados por uma influência
“ocidental”, através das trocas importantes que fez com Pauli. A
colaboração mais efetiva entre os dois teve início em 1947, e um
forte intercâmbio dos respectivos campos de conhecimento se
estabeleceu entre Jung e Pauli, em cartas que foram posteriormente
publicadas. Esses homens de gênio, cada um em sua seara de
experiências e observações específicas, foram capazes de
estabelecer paralelos complexos e fascinantes entre o aspecto físico
e as dimensões psíquicas da realidade, onde consideravam ser
possível haver uma analogia entre o núcleo atômico e o Self.
Transcrevo partes de duas cartas de Jung para Pauli, uma em
1935, e a outra já em 1953, que evidenciam de forma muito clara a
fertilidade da correspondência entre eles:
 
“O núcleo radioativo é um excelente símbolo para a fonte de
energia do inconsciente coletivo, ultimo estrato externo que
aparece na consciência individual. Como um símbolo, indica que
a consciência não se desenvolve a partir de qualquer atividade
inerente a ela; ANTES ela está constantemente sendo produzida
por uma energia que vem das profundezas do inconsciente e
vem sendo representada na forma de raios desde tempos
imemoriais...”
“O centro, ou núcleo, sempre foi para mim um símbolo da
totalidade da psique, como o consciente mais o inconsciente, o
qual centro não coincide com o ego como o centro da
consciência, e consequentemente sempre tem sido percebido
como externo”.
“Significa muito para mim ver como os nossos pontos de vista
estão se aproximando, pois se você se sente isolado de seus
contemporâneos quando enfrenta o inconsciente, também é o
mesmo comigo, na verdade, mais ainda, já que estou de pé
numa área isolada lutando de alguma forma para fazer uma
ponte no espaço que me separa dos outros. Afinal, não é uma
prazer para mim sempre ser visto como esotérico. Por incrível
que pareça, o problema é ainda o mesmo de 2.000 anos atrás:
Como alguém vai do Três para o Quatro?”[ciii]

Wolfgang Pauli

Sobre essa notável troca de experiências, que entrelaçou a


psicologia do inconsciente e a física quântica, encontramos:
 
“Em particular, ele (Pauli) reconheceu as profundas implicações
que o conceito de arquétipo tem para a ciência e as suas
derivações epistemológicas... Para Jung, o encontro com Pauli
trouxe à tona certos aspectos da natureza da realidade que o
levaram à posterior expansão do conceito de arquétipo e que
deram ao conceito de sincronicidade e suas aplicações
posteriores um melhor embasamento científico”.[civ]
Jung acreditava que as manifestações do inconsciente como
sonhos, sintomas ou sincronicidades tinham uma função psíquica
relevante que seria movimentar ou redirecionar a psique de um
determinado patamar existencial pra outro, mais alargado e
saudável. Vale dizer, abrir a psique para uma nova visão da
existência, mais criativa e mais livre. Para Jung o inconsciente não
era um simples depósito de experiências traumáticas e frustrantes,
mas também um manancial de vida, um vir a ser, um arcabouço
dinâmico e pleno de novas possibilidades. O contato com o mundo
arquetípico é a abertura, a porta de entrada para que exista essa
relação com aquilo que transcende a razão e o mundo concreto. Os
arquétipos não são, de forma alguma, conceitos abstratos. Seus
símbolos, quando bem compreendidos, são uma força energizante
para a psique, pois liberam a energia necessária para que
aconteçam as transformações. A palavra transformação, não por
acaso, é a soma de: transforma + ação, que representa o esforço
considerável feito dentro um processo terapêutico, que é a mudança
de atitude consciente de um indivíduo perante a vida e seus
inexoráveis conflitos. Daí a importância do cultivo da vida simbólica
e da função transcendente, como vimos anteriormente.
Transcrevo aqui um relato bem conhecido do próprio Jung sobre
um evento impressionante de sincronicidade, ocorrido em seu
consultório com uma cliente, e que ficou muito conhecido no
contexto junguiano como “O sonho do escaravelho”:
 
“O exemplo que vos proponho é de uma jovem paciente que se
mostrava inacessível psicologicamente falando; sua dificuldade
residia no fato dela pretender saber melhor as coisas do que os
outros. Após algumas tentativas de atenuar o seu racionalismo
com um pensamento mais humano, tive de me limitar à
esperança de que algo inesperado e irracional acontecesse,
algo que fosse capaz de despedaçar a retorta intelectual em que
ela se encerrava. Assim, certo dia, eu estava sentado diante
dela, de costas para a janela a fim de escutar sua torrente de
eloquência. Na noite anterior ela havia tido um sonho
impressionante no qual alguém lhe dava um escaravelho de
ouro (uma joia preciosa) de presente. Enquanto ela me contava
o sonho, eu ouvi que alguma coisa batia de leve na janela, por
trás de mim. Voltei-me e vi que se tratava de um inseto alado
(...) que se chocou contra a vidraça do lado de fora,
evidentemente com a intenção de entrar em um aposento
escuro. (...) Abri imediatamente a janela e apanhei o
animalzinho em pleno vôo. Era (...) um besouro rosa comum
cuja cor verde dourada torna-o muito semelhante ao
escaravelho de ouro.[cv]Estendi-lhe o besouro, dizendo: “Está
aqui o seu escaravelho”.Este acontecimento abriu a brecha
desejada no seu racionalismo e com isto rompeu-se o gelo de
sua resistência intelectual. O tratamento pôde então ser
conduzido com êxito”.[cvi]
 
Para Jung a sincronicidade é quando se dá o rompimento, é um
espanto, não é uma coincidência mecânica, ela tem um significado,
uma numinosidade. Resumindo, a sincronicidade, como princípio de
relações a-causais, entendido como um “paralelismo psicofísico”,
reúne uma dimensão física e uma dimensão psíquica dentro de um
acontecimento significativo. Jung dizia que as sincronicidades são
“atos de criação no tempo”.
 
Kairós, o instante oportuno
A Sincronicidade e o Zeitgeist
“A palavra alemã Zeitgeist, de maneira geral, significa o “espírito
da época”, um novo vento que sopra através de uma era e
anuncia alterações significativas e dramáticas na consciência
humana. Poderíamos dizer que as grandes mudanças ocorridas
na perspectiva do homem na época da Renascença, na religião,
nas ciências, nas artes e em todas as áreas da atividade
humana foram manifestações de um Zeitgeist. Algo novo nascia,
permitindo ao indivíduo ver um tipo diferente de realidade ou,
mais precisamente, ver uma porção da realidade maior do que
ele percebia antes”.[cvii]
 
Considero o sentido da palavra Zeitgeist muito rico e preciso,
pois ele abarca de uma maneira muito ampla o incrível dinamismo
psíquico humano que se verifica através das gerações e de seus
processos históricos e culturais correlatos. Veremos como os
movimentos e alinhamentos planetários encontram ressonâncias e
correspondências específicas com fenômenos humanos. A
sincronicidade entre “céus e terra” é observada e constatada em
eventos humanos, sejam pessoais ou também em processos
coletivos, revelando a real natureza daquilo que entendemos como
sendo a “qualidade do tempo”, um pressuposto fundamental para a
compreensão da astrologia psicológica ou arquetípica. Assim
assinalou Jung:
 
“Se consideramos a existência de diagnósticos astrológicos
corretos, estes sem dúvida não se baseiam na influência dos
astros, mas em nossas hipotéticas qualidades do tempo. Em
outras palavras, o que nasce ou é criado num dado momento
adquire as qualidades deste momento”.[cviii]
 
Nos séculos 18, 19 e 20 pudemos observar três períodos
históricos marcados por novos conhecimentos e acontecimentos
relevantes que promoveram mudanças definitivas na vida social,
política e cultural da sociedade daquela época. Muitos astrólogos
escreveram sobre as correlações entre esses eventos históricos e a
descoberta de três planetas que estão além da órbita de Saturno,
que foram chamados por alguns de “secretos”, pois são invisíveis a
olho nu. São eles: Urano, Netuno e Plutão. Esses três planetas têm
um ritmo lento, e representam de acordo com seu posicionamento
zodiacal, as tendências de um grupo ou geração à qual um indivíduo
pertence, ou seja, são considerados planetas geracionais. Como
característica comum representam forças que constantemente
impelem à mudança e a transformação mais profunda da
consciência humana, pois atuam intensamente consciência da
coletividade.
Vejamos então o seu simbolismo astrológico destes e sua
relação com a época histórica em que foram descobertos.

URANO
A descoberta de Urano em 1781 coincidiu com a época de duas
grandes mudanças políticas do mesmo período, as revoluções
Francesa e Americana, ambas envolvendo ideias de liberdade e
igualdade. Coincide também com o auge do Iluminismo e com o
início da Revolução Industrial, impulsionando os avanços
tecnológicos do século 19. Surgiram novos impulsos que mudaram
a consciência do indivíduo e desta feita, ampliando as possibilidades
tanto no setor cultural, quanto artístico, político, e científico. Urano
na astrologia tem a função de romper as barreiras do passado,
inovar, acelerar o ritmo da vida. Ele atua geralmente no sentido de
desestruturar uma ordem já estabelecida; é o movimento para frente
e para o futuro, a força que rompe com o status quo, a
irreversibilidade do amanhã.
NETUNO
Netuno foi descoberto em 1846. Assistimos nesse período o
surgimento movimentos religiosos expressivos como a fundação da
Sociedade Teosófica na Inglaterra, e acentuado interesse pelo
estudo de filosofias orientais ou esotéricas e o espiritualismo em
geral. Tivemos nesse ciclo o início da química, das indústrias
farmacêuticas, a invenção dos analgésicos, e as primeiras
experiências com a hipnose que abriram espaço para intensas
explorações do inconsciente, que posteriormente resultaram no
surgimento da chamada psicologia profunda. Nessa época, as
invenções da fotografia e do cinema tiveram forte impacto na vida
cultural e artística, assim como a estética do Impressionismo. Tem a
ver com as utopias; as ideologias do socialismo e comunismo se
expandiram nesse ciclo. Na astrologia Netuno é o anseio pela
transcendência, a capacidade de síntese, os ideais místicos, a
sensibilidade psíquica, a psicologia, a psiquiatria, os sonhos, as
fantasias, as imagens produzidas pela psique ou a imaginação, a
espiritualidade a compaixão.

PLUTÃO
O planeta Plutão foi descoberto em 1930, que coincidiu com a
quebra da bolsa de valores em Nova York, o que acarretou um
colapso na economia em proporções mundiais. Desemprego em
massa, desesperança, desemprego e suicídios marcaram
fortemente esse período. Com a recessão, novas medidas que
levassem em conta um aspecto essencial da vida – a alimentação.
Houve uma verdadeira revolução nas técnicas de plantio, com a
introdução de fertilizantes e inseticidas para que esse objetivo
pudesse ser alcançado. Foi descoberta a penicilina, medicamento
que salvou milhares de vidas durante a Segunda Guerra Mundial.
Foi em meados de 1930 que se obteve pela primeira vez a liberação
da energia da matéria através da fissão nuclear. Nesse período o
mundo assistiu a ascensão do Terceiro Reich na Alemanha, com a
eclosão de governos autoritários e guerras em toda a Europa. Numa
definição essencial, diríamos que esse planeta representa o poder
em diferentes formas: o poder da regeneração, da cura, da
sexualidade, dos recursos minerais subterrâneos, do potencial
invisível da natureza. É o planeta dos mistérios ou milagres da
criação da vida, da magia, da energia atômica e da psique coletiva.
Ele é arquétipo do fluxo incessante de vida e morte e renascimento
presente em todas as manifestações da natureza.
Para muitos astrólogos esses planetas são considerados como
“transpessoais”, pois eles revelam estágios transcendentes do
desenvolvimento humano, colocando o indivíduo em contato com
experiências que estão além de suas motivações pessoais,
geralmente relacionadas à coletividade. Ao expandir o nível de
percepção psíquica do ser humano, podem provocar de forma
incontrolável crises disruptivas e mudanças profundas na sociedade.
Não pertencem por completo ao sistema solar; estão dentro da sua
esfera de influência para desempenhar uma missão de ligar nosso
pequeno sistema (do qual o Sol é o centro e a órbita de Saturno é a
circunferência) ao sistema maior que é a galáxia. Entendemos que
os movimentos psíquicos na vida dos indivíduos são os mesmos
que estão presentes na psique coletiva, ou seja, a psique individual
está em ressonância com o universo como um todo. Macro e
microcosmos refletem-se mutuamente, e dessa feita, para muitos
autores, os planetas trans-saturninos ou transpessoais são a
representação viva das forças do Inconsciente Coletivo.
Vemos assim que fatos históricos associados ao que se entende
por

“modernidade” foram relacionados à descoberta desses planetas,


estabelecendo dessa forma uma relação ou “paralelismo” que
aponta para uma reciprocidade entre a alma do homem e alma
universal; as duas refletem e afetam uma a outra. A meu ver, a
astrologia possui um caráter dinâmico e não se vale unicamente de
modelos mecanicistas ou de tradições o milenares da antiguidade. A
compreensão de nós mesmos, do universo e do cosmos se torna
mais e mais cada vez mais alargada, abrangente, possivelmente em
direção ao infinito, da mesma forma o imaginário coletivo, que sem
limites, está sempre abraçando novas realidades, novos símbolos e
arquétipos.
Jung, segundo A.T. Mann, chamou este processo de
“constelação de imagens arquetípicas latentes”:
 
“Em termos psicológicos, as constelações no céu são o lugar
onde os arquétipos do inconsciente coletivo aparecem em
projeção, de tal forma que, em contraste aos mitos, contos de
fada e outras elaborações do arquétipo, a qualidade de tempo é
também levada em consideração. O arquétipo está constelado e
se torna um poder realizador tendo efeitos reais, somente
quando uma atitude específica da consciência prevalece”.[cix]
 
A seguir nos debruçaremos sobre os trânsitos e as progressões
astrológicas que remetem mais diretamente ao que entendemos
sobre o tempo qualitativo, e mais especificamente, naquilo que
representam no desenvolvimento de um indivíduo em sua jornada
existencial.
Trânsitos e progressões astrológicas

Ciclos planetários de desenvolvimento


“Na minha maneira de ver, a constelação de conteúdos
arquetípicos e acontecimentos sincrônicos ocorre em
coordenação com trânsitos e progressões planetárias; o
significado da experiência e suas qualidades essenciais são
refletidos pelos trânsitos envolvidos”. (Liz Greene) [cx]

No mapa natal pulsa a individualidade daquilo que denomino a


“impressão celestial”, única e intransferível, que existe em estado
latente em todo o ser que nasce. Esse mapa contém, em forma
potencial, um esquema da estrutura da psique humana, as diretrizes
da alma, e que para alguns indivíduos já aparecem na primeira
infância.
Veremos agora como esse mapa pode indicar os diferentes ciclos
de desenvolvimento individual que estão espelhados na “partitura”
do céu planetário que está sempre em movimento. Os ciclos
astrológicos mostram quando e qual vem a ser a natureza do
“diálogo arquetípico” que estará constelado entre dois ou mais
planetas num dado momento da existência; no ofício astrológico
isso é interpretado de acordo com os trânsitos e progressões dos
planetas.
O mapa de nascimento, entendido como uma estrutura de tempo
e espaço, pode indicar como e em que ritmo todo esse potencial de
vida pré-existente estará em maior evidência. Aqui estamos falando
do tempo qualitativo, que justamente está relacionado com a
simbologia dos contínuos movimentos associados aos arquétipos
planetários. É isso que chamo de “mapa em movimento”, o que uma
pessoa está atravessando naqueles meses ou anos de sua vida. E é
nesse contexto que se pode observar e compreender de forma mais
profunda da natureza dos diferentes ciclos da nossa jornada, e
extrair deles o seu significado.
 

Árvore de Vida e do Conhecimento. Toda vida é criada

e sustentada a partir do centro, bronze, Índia, século XIV.

Quais são as tendências prováveis de que algo aconteça, como


interpretar essa sintonia ou o espelhamento que existe entre o
homem e as coordenadas celestes? Como entender a rica
simbologia que nos é oferecida através das técnicas de predição
astrológica (trânsitos e progressões) para melhor compreendermos
nosso processo evolutivo? Como apreender e ouvir a “música das
esferas”? Afinal, as demandas dos clientes geralmente giram em
torno dessas expectativas; todos querem sabe de amor, saúde e
trabalho, filhos, dinheiro, viagens, novos projetos, etc.
No meu caso, e de inúmeros clientes, já pude constatar que a
leitura de um mapa muitas vezes pode se tornar algo mágico e
surpreendente, pois aquele círculo colorido parece tirar fotografias
nítidas das pessoas, seus talentos, dificuldades, contradições e
mesmo esquisitices. Esse misto de surpresa e encanto é bastante
comum em um primeiro encontro entre o astrólogo e seu cliente. No
que diz respeito à compreensão do timing astrológico idem, pois é
quando podemos estabelecer essa conexão entre eventos da vida
diária com os ciclos planetários, vale dizer, podemos viver e nos
emocionar com a experiência das sincronicidades. Saturno e
Júpiter não estão simplesmente lá longe no firmamento, eles estão
em mim ou em você, como determinados símbolos, sinalizando
características idiossincráticas ou tendências temporais para
diferentes situações ou experiências. Sim, o céu estrelado está
dentro de nós!
Em uma analogia feliz, diz Howard Sasportas sobre a “cadência
da semente”:
 
“A carta natal revela que tipo de semente somos, mas os
trânsitos e progressões aplicados a ela nos dizem algo sobre a
cadência da nossa semente. Há algo a semear? Há algo pronto
para desenvolver-se? Algumas sementes podem levar semanas,
apenas, para germinar; outras podem levar muitos meses ou
anos para crescer”.[cxi]
 
É importante salientar que a apreensão do sentido da experiência
é essencial no desenvolvimento psicológico, notadamente em
períodos de crises e perdas marcantes. Frequentemente é quando
elas ocorrem que o indivíduo vai buscar algum tipo de orientação ou
de compreensão para então melhor assimilar os processos de
mudanças, tomar decisões ou enfrentar rupturas que fatalmente
acontecerão ao longo da sua existência. A percepção e a vivência
da transitoriedade para alguns é muito dolorosa, e esse
entendimento é obviamente difícil, mas funciona também como um
exercício de superação e de libertação das amarras de crenças
limitantes que impedem o seu amadurecimento, ou seja, o não
enfrentamento das adversidades, das neuroses que promovem a
paralisia psíquica, e das crises que certamente virão. Não por acaso
os psicólogos gostam tanto das narrativas mitológicas, pois elas
montam um grande arcabouço imagético das inúmeras experiências
a serem vividas por todos. São histórias fantásticas, narradas de
forma dramática e fantasiosa, mostrando padrões de
comportamento humano com os quais em algum momento
poderemos nos surpreender, justamente em função da similitude
com nossas histórias pessoais. Dito de maneira mais junguiana, são
as histórias arquetípicas dos deuses que nos habitam.
Sabemos que os oráculos e seus rituais estão presentes em
todas as grandes culturas. Eles propiciam aos consulentes uma
revelação ou reflexão, e a partir delas as dificuldades ou obstáculos
podem ser vistos à luz de um novo ponto de vista, onde outras
possibilidades se abrem. Um processo riquíssimo, em que o
indivíduo não só se reconhece também como autor de sua própria
história, mas capaz de abrir as portas de sua sensibilidade e
criatividade.

Astrologia humanista ou psicológica


Como vimos no final do capítulo II, Dane Rudhyar influenciou
toda uma geração de astrólogos com sua visão mais espiritualizada
do cosmos e do ser humano. Brilhante filósofo, escritor, músico e
astrólogo, foi o precursor de uma maneira mais psicológica e
elaborada de compreender a prática astrológica a partir dos anos
30. Rudhyar foi o primeiro astrólogo a estudar o tema do nascimento
de forma holística, na forma de uma mandala, com finalidade de
extrair daí o sentido da vida de uma pessoa e o desenvolvimento
progressivo de suas potencialidades ao longo da vida. Ao transferir
a ênfase do mundo externo, centrada nos eventos, para o mundo
interno, ou seja, centrada na pessoa, assistimos assim a uma
espécie de ruptura epistemológica, que sinalizou o nascimento de
uma nova abordagem astrológica, chamada de Astrologia
Humanista, cujo sistema de referência mais importante é o próprio
indivíduo, que busca estar consciente dessa individualidade, do seu
destino e do seu lugar no universo. Uma astrologia mais livre,
menos fatalista, cujo pressuposto é teleológico, ou seja, a vida de
um indivíduo tem um propósito e finalidade.
Sobre os trânsitos e progressões, o astrólogo Alexander Ruperti
afirma:
 
“Do ponto de vista humanístico, eles se referem essencialmente
a um processo interno ou subjetivo do desenvolvimento do
potencial individual. Eles se relacionam com as transformações
graduais que ocorrem à medida que o propósito e o caráter do
indivíduo, revelados em seu mapa de nascimento, realizam-se
através do processo da própria vida. As progressões
relacionam-se com o desenvolvimento interno da
personalidade, ao passo que os trânsitos se referem
essencialmente ao impacto externo da sociedade e do cosmos
sobre essa personalidade. Nenhum dos dois deverá ser
considerado isoladamente”.[cxii]
 
Felizmente o saber astrológico possui um caráter dinâmico, não
se valendo unicamente das tradições milenares da antiguidade em
que os conceitos de fatalismo ou determinismo predominaram, ou
seja, de que o homem estava subordinado aos desígnios celestiais,
fossem eles “bons” ou “maus”. Essas mudanças do entendimento,
da linguagem e da finalidade da astrologia foram o reflexo de uma
consciência humana mais ampla tanto do ponto de vista individual
quanto universal, e que, por assim dizer, se acentuou nos séculos
XVIII, XIX e XX com o descobrimento de três planetas: Netuno,
Urano e Plutão. Não por acaso, eles foram denominados os
“embaixadores da galáxia” por Dane Rudhyar.
 
Dane Rudhyar

 
No meu entendimento, a “paisagem” interna de cada pessoa
torna-se determinante na sua visão de mundo, e como
consequência, nas suas atitudes perante a vida. Indivíduos muito
pragmáticos ou extrovertidos tendem a perceber os eventos da vida
em termos bons ou ruins, certos ou errados, justos ou injustos. Os
introvertidos, com mais facilidade para a abstração e a reflexão,
sofrem ou se comprazem com os eventos da mesma forma.
Entretanto, são mais hábeis em extrair algum significado dos
mesmos, aceitando-os como parte de sua evolução pessoal. Dito de
forma mais prosaica, sabem fazer “do limão uma limonada”.
Torna-se bastante relevante o fato que essas técnicas de
orientações astrológicas se dão em função de determinados
períodos de tempo, podendo ser dias, meses ou anos. Essa
informação é preciosa, pois pode criar uma espécie de organização
psíquica interna, em que o cliente pode compreender melhor a
“qualidade” do tempo que ele tem por viver e definir com quais
recursos, internos ou externos, ele poderá contar. Ao se apropriar e
entender a natureza de seus ciclos planetários (trânsitos e
progressões), poderá otimizar ou explorar assertivamente certos
períodos, com mais oportunidades de crescimento, e ao mesmo
tempo aprender a contornar adversidades dos ciclos mais
conflituosos. Afirma Sasportas:
 
“Não podemos, entretanto, negar o fato de que trânsitos e
progressões frequentemente têm correlação com eventos
externos que parecem desabar sobre nossa cabeça. Mesmo
assim, ainda acredito que esses eventos são a manifestação
sincrônica externa de mudanças internas que estão
acontecendo”. [cxiii]
 
Nesse contexto, é preciso colocar em destaque o elemento
criativo do homem perante seus inexoráveis desafios. Quem não os
tem? Com a atitude simbólica o homem entra em contato com seu
mundo interno, pleno de imagens e fantasias. E nesse lugar ele
poderá ver o mundo com lentes diferentes, pois o símbolo é a
linguagem capaz de promover transformações mais profundas e
duráveis. Como Jung dizia: “Psique é imagem”.
A atitude simbólica, a meu ver, também pressupõe silêncio e
humildade perante o não saber. Digo isso, pois a “luz” que um
símbolo astrológico pode representar, ou os insights de uma
imagem onírica, não chegam de imediato e nem pela via racional. É
preciso saber reverenciar e ouvir o diálogo arquetípico, bastante
sutil, entre os planetas sem urgência, e isso já é um aprendizado.
Toda a simbologia brota da alma humana e com astrologia isso não
é diferente. Simbolizar é algo arquetípico e isso nos define como
seres que estão em busca de algo, provavelmente de uma
compreensão, e mais que isso, de um sentido para o viver e
atravessar os embates de vida.
Cito novamente Dane Rudhyar, que enfatizou o caráter
teleológico e transpessoal da astrologia, que se ocuparia não só
daquilo que uma pessoa é, mas do que uma pessoa deve ser. Em
sua visão, o homem, uma vez transformado, também poderá atuar
como agente transformador:
 
“Crises e conflitos do homem são não só meios para realizar a
autoconsciência e, através da superação dos mesmos, alcançar
finalmente a paz de espírito e uma sabedoria que a cultura do
indivíduo limita e define; eles também podem ser usados como
um processo alquímico de transmutação de energia, o qual, se
for bem sucedido, pode transformar o homem em mais-do-que-
homem. Podem ser aguçados pela consciência de um desígnio
mais do que pessoal, como instrumentos para vencer a inércia
de hábitos passados, recordações e medos”.[cxiv]
 
O “mapa” natal mostra o caminho e a direção a seguir. Os
trânsitos e progressões astrológicas nos fornecem um
“mapeamento” que sinaliza os períodos de tempo para sabermos
quando a estrada da vida estará mais ou menos desimpedida, em
quais momentos ela pode subir ou descer, a necessidade de parar
ou fazer retornos, ou simplesmente ficar no acostamento esperando
uma chuva forte passar. Para tudo existe um tempo mais adequado,
e a astrologia nos mostra isso de forma muito clara. Quem já viveu
bastante sabe que dirigir um carro em uma estrada é bem mais do
que simplesmente apertar o pé no acelerador.
É bastante comum que as pessoas procurem os astrólogos para
saber que tipos de eventos os aguardam num determinado período
de tempo, ou seja, a “previsão” anual. Entendo que a finalidade da
astrologia bem aplicada é aquela que traz uma mensagem de ordem
ou sentido para o cliente seja ela cronológica, emocional,
existencial. A percepção de um significado muitas vezes dissipa
dúvidas, reforça intuições, aponta para desejos ainda não
explicitados pela consciência, encorajando decisões que ainda
estavam sufocadas por demandas sociais ou culturais. Uma leitura
bem elaborada pode trazer ao cliente um forte insight para o início
de um processo de individuação, uma tomada de consciência
daquilo que se é ou não é, ou seja, quais são seus dons, recursos,
dificuldades ou tendências.
O indivíduo poderá entender que Júpiter ou Mercúrio enquanto
princípios arquetípicos projetados no céu estão dentro dele, e que
sendo assim ele é cocriador de seu destino. Essa percepção
permite uma mudança na compreensão e nas atitudes em relação
às marés vazantes e cheias da vida, dos altos e baixos anímicos
que batem à porta de todos. E finalmente, como o céu planetário
está em constante e inexorável movimento, ele poderá entender que
as perdas ou transformações fazem parte de seu processo evolutivo
e tem a sua razão de ser. Por mais óbvio que isso possa parecer,
não o é quando se está atravessando turbulências emocionais,
físicas ou materiais. Nas crises e nas rupturas que exigem decisões,
facilmente a percepção do sentido se esvai, o que dificulta bastante
a aceitação e assimilação dos fatos que causam sofrimento.
Existe entre alguns astrólogos a ideia de que há um Eu profundo
ou interior que guia e revela o processo do nosso desenvolvimento,
e que sempre está lá, em estado potencial. Esse “guia” é também
chamado de destino, daemon, dharma, ou então de “intenção
original”, segundo Robert Hand, em seu importante livro, Planets in
Transit:
 
“Tanto trânsitos quanto progressões indicam a realização de
várias fases dessa intenção original. Embora eu penetre com
frequência no vocabulário causal nesse livro, eu não acredito
que os planetas “causem” alguma qualquer coisa. Eles
meramente são signos da manifestação da intenção original,
parte da qual é experimentada como vontade fluindo através de
você. Essa é a intenção da qual você tem consciência. A outra
parte da intenção é experimentada como o que vem de fora;
você pode chamar isso de fatalidade, destino ou circunstâncias
fora do seu controle. Mas isso também vem de dentro de você, e
tudo o que você precisa para saber disso é aumentar a sua
consciência. Parte da função da astrologia é elevar a
consciência do indivíduo exatamente nessa direção.”[cxv]
 
 
Conclusão do Capítulo
No contexto da astrologia arquetípica ou psicológica, o processo
de individuação está representado pelas fases de desenvolvimento
do indivíduo que podem ser apreendidas pelos trânsitos planetários.
Dito de outra forma, o mapa pode mostrar de forma individualizada a
manifestação mais intensa de certos arquétipos, em diferentes
momentos da vida.
A despeito das preferências de técnicas de predição ou
interpretação usadas pelos astrólogos, entendo que o fator subjetivo
deve ser levado em conta em cada situação ou consulta. Cada
pessoa tem a sua própria maneira de apreender, aceitar e
compreender os eventos, e aqui destaco as experiências igualmente
marcantes para todos os seres humanos, como: adolescência, vida
amorosa, casamento, filhos, crises profissionais, separações,
doenças, perdas e envelhecimento. No processo psicoterápico isso
também será observado, pois o timing de cada cliente é diferente,
ou seja, a negação, as resistências naturais sejam no confronto com
a sua sombra, ou com mudanças irreversíveis ou revelações
difíceis; tudo precisa ser respeitado, cada alma e sua história é
única. Não há fórmulas e nem técnicas exatas para adentrar a alma
humana. Como disse Jung, o sapato que serve para uma pessoa
aperta o pé da outra!
Diz a astróloga Liz Greene:
 
“As progressões individuais dos horóscopos descrevem
simbolicamente o tempo interior dos acontecimentos psíquicos.
Elas indicam, de forma sucinta, que áreas do potencial básico
expresso pelo mapa de nascimento serão “consteladas” – isto é,
vão ter a oportunidade do reconhecimento e integração
conscientes – em diferentes períodos da vida.” (...) Os trânsitos,
sendo reflexos dos movimentos planetários reais, refletem as
forças ou energias reais no mundo exterior que impressionam a
psique a partir de fora, produzindo uma reação de acordo com a
constituição do indivíduo.” [cxvi]
 

Liz Greene

Vimos neste capítulo os conceitos gerais sobre sincronicidade


relacionados a uma visão de mundo de culturas primordiais, o unus
mundus, a união subjacente presente tanto na natureza visível como
invisível. Essa teoria nos fala do tempo qualitativo, pleno de
significado, presente nas imagens espontâneas de sonhos ou em
eventos cotidianos quase mágicos. E também em possíveis
correlações astrológicas semelhantes encontradas em mapas de
homes e mulheres que constituem um casamento. Vimos a
complexidade desse mundo unitário, numa surpreendente
aproximação teórica encontrada por homens de gênio, como Pauli e
Jung, entre o átomo e o conceito de Self, ou seja, entre a física
atômica e a Psicologia Analítica. E também na impressionante
correlação astrológica verificada entre eventos mundiais relevantes
e a época em que os planetas exteriores foram descobertos,
apontando a constelações de arquétipos cósmicos de uma
determinada época.
Os ciclos astrológicos individuais também sinalizam a natureza
da qualidade do tempo, nos inúmeros eventos internos e externos a
serem interpretados pelo astrólogo. No processo psicoterápico, ao
se conhecer mais profundamente, o cliente poderá lançar mão de
recursos e habilidades ainda não disponíveis para a consciência e
avançar em seu processo de individuação.
O inconsciente humano é dinâmico e vasto, assim como o céu
planetário. O indivíduo, de posse do conhecimento e, sobretudo, da
vivência desses símbolos arquetípicos, certamente fará um percurso
existencial mais significativo. O homem individuado, sendo coautor
de seu destino, pode tornar-se fonte de inspiração para outros, que
igualmente almejam essa união mais plena e criativa entre seu
inconsciente e sua consciência.
Há que se enfatizar que tanto os símbolos astrológicos quanto a
exploração do inconsciente, sejam através dos complexos ou dos
sonhos, claramente ativam processos criativos nos indivíduos. Ao
cooperar com seus processos ou imagens internas, sentem-se mais
“donos” de seu destino. Passam a perguntar menos sobre o
“porquê” das coisas e compreender que há um “para que” que
aponta em uma direção, um novo patamar do processo evolutivo
que torna sua existência mais feliz e gratificante.
Todo esse trabalho nos remete ao contexto teleológico da vida,
ou seja, tudo tem uma finalidade, um sentido, uma razão de ser.
Entendo que todo ser humano é, em alguma medida, permeável ou
suscetível a todas energias, sejam elas cósmicas, terrestres, sociais
ou culturais; mas está nele um extraordinário poder de transformar
essas mesmas energias. É isso que nos diferencia de outras
criaturas da natureza, que seguem seus instintos ou padrões de
perpetuação da sua espécie, geralmente previsíveis e imutáveis.
E assim encerro com uma frase inspiradora do criador da
Logoterapia, Viktor E. Frankl.
 
“Na verdade, as oportunidades de agir de modo apropriado, as
potencialidades para realizar um sentido são afetadas pela
irreversibilidade das nossas vidas. Mas também as
potencialidades isoladamente são afetadas por este fato. Porque
tão logo usamos uma oportunidade e realizamos um sentido
potencial, isto está feito de uma vez por todas. Já o salvamos
para o passado, onde foi entregue e depositado em segurança.
No passado, nada fica irremediavelmente perdido, mas, ao
contrário, tudo é irreversivelmente estocado e entesourado. Sem
duvida, as pessoas tendem a ver somente os campos desnudos
da transitoriedade, mas ignoram e esquecem os celeiros
repletos do passado, que mantém guardada a colheita das suas
vidas; as ações feitas, os amores amados e, não menos
importantes, os sofrimentos enfrentados com coragem e
dignidade.”[cxvii]
 
Viktor Frankl[cxviii]

 
Capítulo VIII

A Mandala,

os Símbolos do Self

“Deus é uma esfera cujo centro está em toda parte

e cuja circunferência não se delimita em parte alguma”. (Nicolau


de Cusa)

“O círculo, designado por Platão a mais perfeita das formas,


exerceu seu domínio mágico desde os tempos primordiais”.
(Sigfried Giedion)

“Só pouco a pouco compreendi o que significa propriamente a


mandala: Formação – Transformação, eis a atividade eterna do
eterno sentido”. (Jung)

A palavra mandala vem do sânscrito, significa “círculo”. Seu


desenho mais tradicional é a forma circular, que desde os primórdios
da antiguidade foi apreendida como símbolo do cosmos e da
totalidade da natureza.
Acredita-se que suas primeiras representações remontam a
tempos paleolíticos, bem antes da invenção da roda. Enquanto
imagens ou representações gráficas estão presentes em inúmeras
culturas bastante remotas, o que demonstra o seu caráter
arquetípico. Desenhadas, pintadas, dançadas ou esculpidas em
pedras ou templos, as formas das mandalas são manifestações
espontâneas ou instintivas de um símbolo universal, que é o
círculo, ou a roda.
Esta estrutura circular pode ser encontrada em vários elementos
do mundo da matéria, seja no mundo vegetal, mineral ou animal. É
muito comum nos encantarmos com as formas simétricas e perfeitas
de uma flor, de uma estrela, das frutas, de um simples átomo, do
próprio sistema solar, da forma espiralada de uma concha ou das
galáxias. Sua dinâmica imagética nos permite experimentar a
energia de união ou integração quando, por exemplo, nos reunimos
em círculo para orar, dialogar, brincar ou dançar, seja como adultos
ou como crianças.
A esse respeito diz Aniela Jaffé:
 
“No Lamaísmo e no Tantra Yoga a mandala é uma
representação circular do cosmos em sua conexão com os
poderes divinos. Era usada como instrumento de contemplação.
Na mandala cristã, com o Cristo ao centro, os quatro
evangelistas ou seus símbolos marcavam os quatro pontos
cardeais. Os vitrais das rosáceas nas catedrais góticas são a
abstração das mandalas cósmicas. Na arquitetura pode-se
achar o círculo como a forma subjacente das construções
sagradas das cidades”.[cxix]
 
No contexto cultural podemos observar e nos encantar com o
padrão circular da mandala encontrado em cavernas pré-históricas,
nos desenhos dos índios astecas no México, nos calendários maias,
no símbolo chinês do Yin e Yang, na roda zodiacal, nas magníficas
rosáceas da catedral gótica francesa de Notre Dame, no incrível
templo budista Borobudur na Indonésia, no belo labirinto circular que
está na entrada da catedral de Chartres, nos discos voadores, nas
danças circulares, no conhecido desenho renascentista do homem
vitruviano, na arquitetura, nos jardins ou praças dentro das cidades.
É interessante notar que as mandalas sempre foram encontradas
em monumentos históricos de antigas civilizações como zigurates,
fortificações, templos, catedrais e pirâmides.
Assim descreve JUNG sobre seus primeiros insights sobre as
mandalas e o Self :
 
“Mas principalmente comecei a compreender as mandalas que
desenhava. Foi entre 1918-1919. Pintei a primeira mandala em
1916, depois de ter escrito os Septem Sermones and Mortuos.
Naturalmente não a compreendera. Em 1918-1919, eu estava
em Château-d’Oex, na função de comandante da Região
Inglesa dos internados de guerra. Todas as manhãs, esboçava
num livro de notas um pequeno desenho de forma redonda, uma
mandala, que parecia corresponder à minha situação interior. À
base dessas imagens podia observar, dia após dia, as
transformações psíquicas que se operavam em mim” ....Meus
desenhos de mandalas eram criptogramas que me eram
diariamente comunicados acerca do estado de meu Si-mesmo.
Eu podia ver como meu Si-mesmo, isto é, minha totalidade,
estava em ação. (...) Ele me aparecia como a mônada que sou e
que é o meu mundo. A mandala representa essa mônada e
corresponde à natureza microcósmica da alma”.[cxx]
 

Em seu trabalho clínico, Jung observou e estudou durante muitos


anos o efeito terapêutico dos sonhos e dos desenhos das mandalas
feitos por seus pacientes. Em seu entendimento, elas apareciam
com uma forma destinada a “compensar” estados de desorientação
ou dissociação psíquica. Dito de outra forma, elas poderiam
favorecer uma homeostase psíquica, pois para ele as imagens das
mandalas tinham um efeito tranquilizador e restaurador do caos
interno dos pacientes. Para ele, esses desenhos eram uma tentativa
e o esforço do paciente para buscar uma reordenação psíquica.
Nesse sentido o trabalho com as mandalas poderia refletir a
renovação da personalidade dentro do trabalho psicoterápico, bem
como desenvolver e estimular a criatividade. Jung usou desse
recurso terapêutico com muitos pacientes, tanto com crianças que
estavam sofrendo com a separação dos pais, adultos em crises
existenciais e diferentes níveis ou tipos de desordens psíquicas
mais graves. Ele diz:
 
“Em geral, a mandala aparece em estados de dissociação
psíquica ou de desorientação... podem aparecer em
esquizofrênicos, cuja visão de mundo se tornou caótica, devido
à irrupção de conteúdos incompreensíveis do inconsciente. Em
tais casos vemos nitidamente como a ordem rigorosa de tal
imagem circular compensa a desordem e a perturbação do
estado psíquico, e isso através de um ponto central em relação
ao qual tudo é ordenado... Trata-se evidentemente de uma
tentativa de autocura da natureza, que não surge de uma
reflexão consciente, mas de um impulso instintivo”.[cxxi]
 

No início de sua atividade clínica, é provável que Jung ainda não


soubesse, com tanta clareza, que essas figuras circulares eram uma
representação simbólica primordial da divindade e do cosmos, em
inúmeras civilizações antigas. As figuras geométricas das mandalas,
com um centro bem definido, mostram imagens de plenitude
psíquica. A partir daí, Jung associou suas formas estruturadas ao
Self, o arquétipo da totalidade psíquica de um indivíduo, o centro
regulador de toda a personalidade.
 
Marie-Louise von Franz  

Para Von Franz a mandala, com sua multiplicidade de imagens,


entendida como unidade última de todos os arquétipos, encontra um
paralelo com o conceito alquimista de unus mundus, a unidade
original do mundo, em que céus e terra se refletem mutuamente,
macrocosmos e microcosmos são uma única e só coisa:
 
“Essa imagem primordial, contudo, só seria esclarecida por
Platão e, mais tarde por Plotino, momento em que o movimento
circular foi caracterizado como próprio da alma e do espírito e
como elemento que a tudo governa, sendo o cosmos visto como
uma esfera perfeita, concebida a feição do organismo esférico
do ser, do mundo das ideias. Foi principalmente Plotino quem
ampliou essas representações e as transmitiu à era cristã; o
centro de todas as criaturas é o Uno, a Luz que se irradia em
todas as direções até o infinito; cerca esse Uno a camada
esférica da alma do mundo e, para além dela, o cosmos visível.
Mas o centro é uma “esfera espiritual” (sphaera noète), que é
unidade, totalidade e a própria divindade”.[cxxii]
 
Em muitas representações herméticas antigas havia uma
evidente estrutura quaternária, o que revela o aspecto arquetípico
da imagem alquímica da “quadratura do círculo”. Nelas podemos
observar o círculo dentro do quadrado ou vice-versa; podem ter
subdivisões de múltiplos de quatro, que irradiam de um centro ou se
dirigem ao centro. O quadrado simboliza a terra e os quatro
elementos; o círculo, ou roda representam o céu, mostrando assim
síntese dos opostos, que era a meta do trabalho alquímico. É
importante ressaltar que o círculo é também um símbolo da
eternidade – uma linha sem começo e nem fim.
 

Estruturas Quaternárias
É importante esclarecer o que se entende como estrutura
quaternária da psique, que está presente de diferentes maneiras
em imagens de disciplinas que formam a complexa filosofia
hermética, como a magia astral, a alquimia e a Cabala. Essas
imagens, com uma enorme riqueza simbólica, estão frequentemente
dispostas em forma de cruz, na qual se subdividem os quatro
ventos, os quatro temperamentos, as quatro estações do ano, ou os
quatro pontos cardeais.
 
"Todas as coisas estão contidas somente no três / no quatro elas se alegram"
(Quadratura do Círculo), Jamsthaler, Viatorium Spagyricum, 1625.

A mandala geralmente possui um caráter geométrico e


matemático, lembrando que os números são elementos de
ordenação ou organização do mundo. Essas representações
simbolizam a unidade de um todo, interdependente, inteligente,
organizado, que remonta à ideia do Uno, de Deus, a na estrutura
cosmológica tão bem representada pela própria astrologia.
Não por acaso, encontramos esta estrutura arquetípica no
famoso desenho de Leonardo da Vinci, feito em 1490, inspirado no
conceito de “proporção divina” do arquiteto e engenheiro romano
Marcos Vitrúvio Polião (81 AC- 15 AC). Relevante obra do
renascimento italiano, representa o ideal clássico de beleza e
equilíbrio; nela presenciamos a perfeição das proporções do corpo
humano: um homem nu circunscrito dentro de um quadrado e de um
círculo, as duas formas perfeitas que representam a Terra e o
Paraíso.
Esta obra de Leonardo da Vinci conhecida como Homem
Vitruviano, corresponde ao início do Antropocentrismo,[cxxiii]
movimento que surgiu no Renascimento, e que afirmava que o
homem estava no centro do mundo, sendo responsável por suas
ações culturais, sociais e filosóficas.
 

Homem Vitruviano. Texto: Estudo de proporção do corpo humano, 1490

Como sabemos, Jung buscou inspiração para seus constructos


teóricos em diversos filósofos da antiguidade e renascença como
Plotino, Boehme, Leibniz, Robert Fludd e outros.
O alemão Jacob Boehme, (1575-1624) teólogo, astrólogo e
místico, foi precursor dos metafísicos alemães; criou mandalas que
representavam a cosmologia cristã, concebendo assim duas
grandes realidades: o espírito e a matéria, que giravam como rodas
dentro do círculo maior da Divindade.
Para Boehme, a roda ou o círculo tinham relações místicas
profundas e tiveram um papel relevante em sua obra. A roda para
ele significava em termos alquímicos a “impressão” da vontade
eterna, ou a própria Mãe Natureza. Remonta à essência dos
símbolos circulares ou da mandala que vem a ser, como já vimos, a
totalidade dos cosmos, ou do unus mundus. Nesse contexto, cito
Jung:
 
“A roda da natureza gira de fora para dentro de si mesma; a
divindade, no entanto, mora dentro de si mesma e sua figura
não pode ser representada; trata-se apenas de uma semelhança
natural, como Deus ao retratar-se na imagem deste mundo. Em
toda parte, Deus está por inteiro, habitando também em si
mesmo. Observe a roda externa que é o zodíaco, com os astros,
seguindo-se os sete planetas”.[cxxiv]

Ainda no que diz respeito às mandalas, precisamos destacar o


significativo trabalho que Nise da Silveira realizou no Centro
Psiquiátrico Pedro II no Rio de Janeiro, como já vimos no capítulo I.
Seus pacientes esquizofrênicos trabalhavam com desenho, pintura,
modelagem, todos feitos livremente. Em sua incansável busca por
compreender a dinâmica psíquica em processos psicóticos, acabou
por encontrar os pressupostos da psicologia junguiana, que deu a
ela um suporte teórico relevante para continuar suas pesquisas. Ela
relata que seus pacientes constantemente desenhavam formas
circulares que lembravam mandalas.
“Frequentemente a mandala surge como fenômeno psicológico
primário que apenas reflete a estrutura quaternária básica da
psique em imagens compostas de quatro elementos
semelhantes ou múltiplos de quatro também semelhantes, ou
em forma de cruz, de estrela, etc”... As imagens circulares
exprimem tentativas, esboços, projetos de renovação. No nosso
atelier predominam esses projetos configurados em mandalas
incompletas e indiferenciadas”.[cxxv]

O estudo das mandalas permanece até os dias de hoje, e a


extensa pesquisa feita por Jung e seus colaboradores sobre o seu
simbolismo em muito contribuíram para que elas se tornassem
acessíveis e até mesmo populares no ocidente. Sua utilização por
muitos psicoterapeutas vem sendo bastante difundida através das
técnicas expressivas, tão valorizadas no contexto da psicologia
analítica.
Além do aspecto psicoterápico e restaurador, não podemos
deixar de pontuar a dimensão espiritual das imagens circulares, que
dão um suporte imagético especial e relevante às práticas
meditativas profundas. A meditação busca uma integração entre o
eu e o todo, e possibilita o encontro do homem consigo mesmo e
com o Self. Há que se destacar as coloridas e riquíssimas mandalas
tibetanas, de caráter filosófico e religioso, pelas quais Jung tinha
especial predileção. As mandalas, assim, podem designar tanto a
totalidade psíquica do homem quanto a totalidade cósmica, que são
sempre presentes na tradição religiosa oriental. Novamente cito Von
Franz:
 
“Os símbolos do anthropos cósmico e da mandala são
sinônimos; apontam para uma unidade psíquica interior última,
para o Self. O Buda, o grande símbolo oriental dessa unidade,
sempre era representado, no princípio, como uma roda de doze
raios; somente depois de algum contato com a Grécia,
começou-se a representá-lo na Índia, como figura humana. No
Ocidente, Cristo foi com frequência retratado no centro de uma
mandala, com símbolos dos quatro evangelistas”.[cxxvi]
 
Self, símbolo de totalidade
“Como conceito, o Self significa a abrangência completas de
todos os fenômenos psíquicos no homem. Expressa a unidade e
a totalidade da personalidade global”.[cxxvii] (Jung)

A experiência de um centro interior foi entendida por Jung como


o Self, cujo poder espiritual e regulador da dinâmica psíquica dá ao
indivíduo uma sensação de plenitude e significado; essa
personalidade diferenciada é mais confiante, e sua presença é
enriquecedora na vida da coletividade. Sendo um símbolo de
totalidade, o Self engloba a vida consciente e inconsciente do
indivíduo, que não são simplesmente opostos, mas
complementares.
Há um trecho interessante em que Von Franz explica como o Self
está relacionado a objetos circulares, que são símbolos do
movimento espontâneo da alma:
 
“O símbolo de uma bola representaria mais a sua capacidade de
movimentar-se; para a mente primitiva a bola era obviamente
aquele objeto com propriedade espantosa de se mover a partir
da própria volição, pois para eles a bola é considerada como tal
quando se move por sua própria vontade, sem necessidade de
um empurrão; por seu próprio impulso de vida ela se move e
continua rolando através de todas as vicissitudes, obstáculos e
dificuldades do mundo material. Como Jung constatou, ela
representa aquela característica da psique inconsciente capaz
de criar movimento por si mesma, de agir por si mesma, sem um
impulso causal delineável, sendo capaz de produzir algo novo”.
[cxxviii]

 
Cristo em mandala astrológica

Como vimos, são inúmeros símbolos do Self que encontramos


em imagens oníricas, mitos, sonhos, contos de fadas, expressões
artísticas, enfim, em todas as manifestações da alma humana.
Encontramos esse vasto manancial simbólico de forma recorrente
em figuras humanas como o Anthropos, como o microcosmos do
homem completo, na criança, como símbolo de renovação de vida,
no Cristo ou a imago Dei, como a síntese do aspecto humano e
divino, e no Velho Sábio. O Self é igualmente representado na
imagem da árvore que se modifica durante as quatro estações,
simbolizando as diferentes etapas do desenvolvimento humano. E
ainda pela pedra filosofal dos alquimistas, pelo Yin e Yang do
Taoísmo, e pelas estrelas que são os símbolos tanto do espírito
tanto quanto da matéria.
Assim escreveu o sábio de Zurich:
 
“Desde tempos remotos a relação com os astros simboliza a
própria “eternidade”. A alma vem “das estrelas” e retorna às
regiões estelares.[cxxix]
 
Finalizo ressaltando a importância da imagem de Cristo, que sem
dúvida é um mito vivo da nossa civilização, abarcando a síntese do
humano com o divino, da morte e da ressurreição. Sendo o centro
da mandala cristã, é apontado por muitos como “Rei dos Reis”, cujo
símbolo ou mensagem tornou-se a representação central na cultura
judaico-cristã. Diz Jung:
 
“O símbolo de Cristo é da maior importância para a psicologia,
porquanto constitui, ao lado da figura de Buda, talvez o símbolo
mais desenvolvido e diferenciado do Si-mesmo. Isso pode ser
avaliado pela amplitude e pelo conteúdo dos predicados
atribuídos ao Cristo, que correspondem à fenomenologia
psicológico do Si-mesmo de um modo incomum, apesar de não
incluir todos os aspectos deste arquétipo”.[cxxx] [cxxxi]
As Doze Casas Zodiacais

“O mapa astrológico é um complexo símbolo cósmico – uma


palavra ou logos revelador do que a pessoa potencialmente é. É
o nome “celeste” de uma pessoa e também um conjunto de
instruções sobre como ela pode realizar melhor aquilo que por
ocasião de seu nascimento era potencial puro – “potencialidade
germinal”. O mapa de nascimento é uma mandala, um meio
para alcançar uma integração todo-abrangente da
personalidade”.[cxxxii] (Rudhyar)

Vimos que as formas circulares fazem parte das imagens


matrizes do inconsciente coletivo, e que no contexto histórico e
cultural a sua manifestação espontânea se confirmou através dos
quatro pontos do mundo com bastante clareza. Essas imagens
também se manifestam no rico simbolismo zodiacal, como veremos
a seguir.
Vimos que tanto as mandalas, cujo simbolismo de ordenamento e
totalidade psíquica, representados pelo unus mundus, são
manifestações do Self, o arquétipo da totalidade psíquica na
psicologia junguiana; vejamos agora as correspondências que
encontramos nos fundamentos que estão presentes na estrutura
zodiacal e as doze casas do mapa astrológico.
A quaternidade está também presente na estrutura zodiacal, e
podemos observá-la em representações medievais, nas quais o
Cristo foi retratado com frequência no centro de uma mandala,
cercado pelos quatro evangelistas. São eles: Mateus, Marcos,
Lucas e João, as quatro criaturas do tetramorfos, palavra que
vem do grego tetra (quatro) e morf. (forma). Esse conhecido
conjunto simbólico presente na iconografia cristã, é geralmente
composto por quatro elementos distintos que formam uma unidade.
Há uma relação astrológica quaternária dos quatro signos fixos
nessa combinação: Mateus é representado por um anjo ou homem;
Marcos por um leão; Lucas por um boi e João por uma águia.
Respectivamente estão associados os signos de Aquário, Leão,
Touro e Escorpião. Podemos fazer a analogia em relação ao
arquétipo de síntese do Cristo, uma vez que abarcou do anjo a
natureza humana, do boi a necessidade do sacrifício, do leão a sua
realeza e da águia a sua dimensão espiritual, que é o voo aos céus,
ou a ressurreição.[cxxxiii]
Essa estrutura quaternária está presente também no fascinante
quadro “A Última Ceia” do mestre renascentista Leonardo da Vinci.
Nele vemos o Cristo em uma mesa, entre seus doze apóstolos,
como sendo a representação simbólica dos doze signos zodiacais.
No quadro eles estão reunidos em quatro grupos, e em cada um
deles vemos três apóstolos; seis estão à direita do Cristo e seis à
sua esquerda. Vemos que na disposição geométrica da obra as
linhas diagonais incidem no coração do Cristo, e que o centro do
círculo do arco da porta coincide com a sua testa. O Cristo está ao
centro do quadro, representando o Sol, de onde emana toda a luz
do universo.
 
Última Ceia, de Leonardo da Vinci. Livro de Franco Berdini, Cenácolo, p.159

Há um escritor italiano que publicou uma obra muito profunda


sobre a Última Ceia de Leonardo, do ponto de vista hermético,
astrológico e matemático.[cxxxiv] Diz ele:
 
“A Santa Ceia, nesse sentido, é também uma ilustração do
conceito expresso do Tetrabiblos de Claudio Ptolomeu,
representando o mundo em miniatura, constituído dos doze
signos zodiacais, dos sete planetas, dos quatro signos de fogo,
ar, terra e água, e dos três elementos Cardinal, fixo e mutável,
enquanto exprime uma forma precisa mediante a qual a vida
desce do Céu à Terra. O afresco, desse ponto de vista,
representa também a divisão do tempo, e se apresenta aos
nossos olhos como um preciso calendário através da
identificação na composição do quaternário das estações, dos
sete dias da semana, dos doze meses e das doze horas do dia.
O segredo desta beleza no esquema prospectivo da Santa Ceia
é dado pela harmonia matemático-pitagórica e com seus
números de equilíbrio e a medida da forma”.[cxxxv]
 

Vamos encontrar a estrutura quaternária presente no


conhecimento hermético e também no contexto zodiacal, com os
três modos de ação, os quatro elementos, os quadrantes zodiacais
e as doze casas. A triplicidade consiste em três modos de ação,
que são: cardinal, fixo e mutável, e representam a divisão zodiacal
de acordo com os quatro elementos representados pelo fogo, ar,
terra e água. Assim, essa estrutura monta quatro triplicidades. A
triplicidade do fogo contém os signos de Áries, Leão e Sagitário. A
triplicidade do ar contém os signos de Gêmeos, Libra e Aquário. A
triplicidade de terra contém os signos de Touro, Virgem e
Capricórnio, e a triplicidades de água contém os signos de Câncer,
Escorpião e Peixes.
O mapa astrológico é também a representação de uma mandala
cujas posições planetárias, estão relacionadas ao dia e hora em que
o indivíduo nasceu. Apontam, de forma latente, os possíveis
caminhos de realização do indivíduo, como já vimos nos capítulos
anteriores. Nessa mandala cósmica estão simbolicamente
projetados a matéria, a alma e o espírito de um ser, cujo propósito
primordial irá desabrochar ao longo de sua vida. O desenvolvimento
contínuo é semelhante ao que os antigos chamaram de movimento
circular da alma, que se cumpre em seu destino único. De forma
análoga, como vimos no capítulo VII, o movimento circular dos
planetas tanto no céu quanto no mapa natal, expressa de forma
clara e inequívoca essa imagem cíclica e evolutiva dos indivíduos,
uma vez que tudo na natureza está em constante movimento. Numa
leitura bem-sucedida do mapa natal o cliente poderá viver um
encontro consigo mesmo, pois se reconhece e se apropria do ser
que é. Isso tem magia e encanto, pode mudar a sua visão de
mundo, acaba sendo mais do que uma revelação. É quando aquilo
que estava aparentemente sem ordem ou sentido passa a ter sua
razão de ser.
A partir do pressuposto que a mandala é um símbolo do SELF,
podemos ver no mapa de nascimento essa dimensão da totalidade
psíquica, quando observamos e interpretamos não só a natureza
dos signos zodiacais, mas a sua disposição individual, de acordo
com o horário e as coordenadas geográficas do local de
nascimento. Nesse arranjo celeste veremos os quadrantes da carta,
a ênfase planetária nos dois hemisférios, a distribuição dos quatro
elementos e outros elementos simbólicos ali presentes. Nossa
“impressão” celestial ali está e cada mapa e cada história ali contida
e contada é única. Posso dizer que sempre me encanto com essa
partitura cósmica e quão precisa é a sua melodia em relação ao
cliente que vem em busca de repostas ou decisões importantes.
E o que são as casas? No capítulo II pudemos ver a dimensão
simbólica da estrutura zodiacal, na qual se inserem os 12 signos.
Vimos como o cinturão zodiacal é uma referência espacial que
envolve a Terra, em que se movem os corpos celestes nas
diferentes constelações.
Mas como essa mecânica celeste do nosso sistema solar, tão
complexa, perfeita e precisa pôde ser configurada para um ser
humano, e projetada numa “mandala astrológica” numa simples
folha de papel? Como se deu essa transposição? Ou seja, como a
Vida universal e coletiva representada pelo Zodíaco vai se
manifestar numa forma individual?
O presente livro não tem como objetivo analisar pressupostos
espaciais, técnicos ou de cálculos baseados nas efemérides
planetárias. No entanto, há duas coisas fundamentais para a
compreensão e resposta mais simples a essa formulação.
A Terra possui dois movimentos; um deles é a rotação diária
axial, que é o movimento que ela faz em torno de seu próprio eixo,
totalizando 24 horas do dia. O outro vem a ser a rotação orbital,
um deslocamento espacial que a Terra e os demais planetas fazem
em torno do Sol. Portanto, os astrônomos da antiguidade
precisaram considerar e relacionar as duas coisas, ou seja, o
fenômeno dos planetas que se moviam ao redor do Sol e através
dos signos com o movimento da rotação axial terrestre. Desta feita,
foi estabelecida a divisão da rotação da Terra em 12 setores.
Essas divisões, que foram chamadas de doze casas,
representam doze setores de experiências humanas arquetípicas;
são as subdivisões da rotação axial da Terra, ou seja, em torno de
seu próprio eixo. Naturalmente, isso tudo demandou séculos de
observação e de cálculos astronômicos para ser normatizado dessa
forma. Sem a estrutura das doze casas, não seria possível trazer
para a Terra e para o indivíduo o significado dos eventos celestes.
De forma resumida, podemos dizer que o espaço foi dividido em
signos, o tempo em quatro quadrantes que por sua vez se
transformaram em doze casas.
O signo Ascendente é um dos 12 campos zodiacais que a cada
duas horas se levanta no horizonte leste da Terra; do ponto de vista
astronômico é o ponto de intersecção da eclíptica com o horizonte
do observador, ou seja, o encontro do céu com a Terra. Do ponto de
vista astrológico o signo Ascendente é considerado a casa UM do
mapa de nascimento; na carta natal o eixo que liga o signo
ascendente ao signo descendente é o eixo do horizonte. O
horizonte define claramente entre o que está acima e abaixo dele,
aquilo que é visível e invisível para nós. A primeira casa faz
oposição à sétima, que são os signos ascendente e descendente,
respectivamente.
Temos também o eixo do meridiano, que liga os eixos norte e
sul do mapa natal, chamados respectivamente de Meio do Céu e
Fundo do Céu, do latim Medium Coeli e Imum Coeli. O Meio do Céu
representa a décima casa e o Fundo do Céu representa a quarta
casa do mapa de nascimento; ambas fazem oposição entre si. Os
dois eixos representam a estrutura do espaço e tempo particular do
indivíduo ao nascer; a intersecção desses dois eixos forma os
quatro quadrantes do mapa natal, formando o que é considerado
por muitos astrólogos como a “cruz da encarnação.” Aqui temos,
também, um modelo arquetípico de quaternidade, já verificado nas
mandalas.
 
Roda de Casas, Ruperti  

 
Finalizando, o Zodíaco é uma representação de valores
universais, com experiências arquetípicas de toda a humanidade.
Porém, a definição das posições das 12 casas dentro do mapa
natal, é o que torna essa vivência única e particular; todos temos os
doze signos, mas o arranjo cósmico será vivido e experimentado de
forma individual. As casas zodiacais vão nos mostrar onde esse
vasto manancial simbólico vai se manifestar.
Doze setores da evolução humana
Não é possível entender ou interpretar as doze casas como
segmentos isolados, uma vez que o zodíaco é justamente um
círculo, símbolo de totalidade ou unidade. A sua compreensão, a
meu ver, deve acontecer através de um pensamento circular e que
vai integrando as partes que compõem o todo. As casas revelam a
totalidade do processo de desenvolvimento do ser humano a partir
do seu nascimento e a provável sequência evolutiva das suas
experiências. A cada nova etapa chegam novos desafios, que dizem
respeito ao que se entende por individuação, que na psicologia
junguiana vem a ser a realização do destino potencial que o
indivíduo trouxe consigo. Como vimos no capítulo II, os signos
mostram diferentes modos de funcionamento do ser e as casas
mostram onde as experiências vão acontecer. É importante
ressaltar que os diferentes planetas nas doze casas vão trazer um
colorido especial e diferente para essas vivências, e que todas as
combinações entre eles, planetas, signos e casas (o quê, como e
onde) são a quintessência da arte da interpretação astrológica. Isso
vale tanto para os planetas que estão na carta radical como para
trânsitos específicos que vão dinamizar determinados setores da
vida humana num determinado momento.
CASA UM
Equivale ao que chamamos de signo Ascendente, que
corresponde ao momento da primeira respiração, o ponto de partida,
o “start” da vida, quando o bebê entra em cena no palco da
existência. É a primeira vez que ele vê o mundo e vice-versa; é seu
caráter mais essencial e visível pelo mundo externo. É como o eu se
projeta no mundo, agora de forma encarnada, sua maneira
espontânea e natural de agir e se expressar. O Ascendente é o
impulso básico de vida, é também a aparência do indivíduo, seu
corpo e suas condições de saúde; o corpo é a identidade do eu em
ação.

CASA DOIS
Essa casa indica a relação que o indivíduo terá com seu corpo e
com a sua alimentação. A sensação de segurança pode estar muito
associada aos ganhos materiais, ao conforto, bem estar e ao
apreço pelo trabalho. A casa dois representa os valores pessoais do
indivíduo e a atitude que ele tem em relação àquilo que possui. Está
associada aos temas de dinheiro, sobrevivência e estabilidade
financeira; mostra a satisfação ou autoestima que se alcança com a
independência material.

CASA TRÊS
A terceira casa mostra as primeiras relações e informações
ambientais que a criança vai explorar, seja brincar, engatinhar,
imitar, falar e caminhar; vai surgindo a identificação dos sons. Aqui
vemos as experiências dos processos de adaptação social, a
curiosidade pelo novo, o convívio com irmãos, vizinhos e primos, a
escola, o ensino fundamental. O desenvolvimento da mente
concreta, capacidade de fazer associações, acumular informações
e conhecimento. A terceira casa diz respeito à capacidade de
comunicação, de interação e contínuo aprendizado.

CASA QUATRO
A família, o lar, as origens e influências dos antepassados;
atmosfera psíquica familiar, memórias afetivas, proteções maternais,
fantasias, desejos inconscientes, sentido de pertencimento, as
raízes parentais, a vida subjetiva. Diz respeito ao processo
psíquico da criança que vai, aos poucos, introjetando seus pais
enquanto modelos arquetípicos do masculino e feminino, a base da
segurança emocional. Muitos autores dizem que essa casa está
relacionada às condições da infância e também da velhice. A casa
quatro ou o Fundo do Céu representa as raízes do indivíduo, seus
alicerces, sua ancestralidade.

CASA CINCO
Aqui vemos o nascimento da individualidade e da consciência de
si mesmo: quem sou eu? Como o eu do indivíduo vai se expressar
de forma criativa não só para a família. Como ele vai despertar o
amor dos outros para se sentir especial? Aqui é o setor da
confiança, do brilho pessoal, da alegria de viver. É a casa da
expressão criativa, revela a importância do indivíduo que deseja
deixar a sua assinatura naquilo que faz. A quinta casa representa os
romances, as paixões, as crianças e os filhos.

CASA SEIS
O refinamento e o aperfeiçoamento do eu através da razão, da
técnica, da análise, senso crítico e pragmatismo. Condições ou
cuidados com a saúde, alimentação e higiene. O eu necessita
avaliar as próprias capacidades e percebe conexão entre e mente e
o corpo. Aqui nasce a percepção que trabalhar demais afeta a
saúde; a ausência desta prejudica o empenho no trabalho. A casa
seis tem a ver com a necessidade de servir, é o trabalho
cotidiano, habilidades manuais ou técnicas, a organização do
tempo e a relação com os subalternos. Também representa a
curiosidade e interesses pela diversidade dos elementos da
natureza, seja animal, vegetal ou mineral.

CASA SETE
O eu aperfeiçoado agora entra em relação com o mundo, e se
torna o eu social que se amplia através de parcerias e associações.
Esta é a casa da ação social, das relações, do senso de justiça e
equilíbrio, da cooperação, da diplomacia e das alianças. É o setor
do casamento, ou de uma união que implique em compromisso
recíproco ou com uma finalidade que pode ser de caráter afetivo ou
profissional. Os atributos que o indivíduo busca em seu parceiro/a. A
sétima casa diz respeito à capacidade de compartilhar, orientar e
aconselhar.

CASA OITO
O indivíduo necessita de segurança para sua alma e experimenta
a relação de intimidade sexual mais profunda e transformadora, pois
a fusão psíquica pode ser catalisadora de mudanças profundas.
Capacidade de transmutação interna, apreço pelo mundo oculto e
simbólico, sensibilidade e destreza para desvendar mistérios da
mente, trabalhar a alquimia dos processos anímicos, ver além da
matéria. Esse setor zodiacal representa os bens associados ao
matrimônio e às heranças familiares. Experiências de quase morte
física que levam à sensação de renascimento, físico ou espiritual.
Experiências traumáticas que possibilitam um renascimento. A casa
oito simboliza a capacidade de regeneração física, emocional e
espiritual do indivíduo.
CASA NOVE
O eu renascido e regenerado pode agora compreender e buscar
o significado de sua existência. A mente abstrata agora encontra
na filosofia ou na espiritualidade o sentido da vida ou o caminho a
ser seguido. A fé, a jurisprudência e a justiça divina vão guiar o
indivíduo em seus caminhos. É a casa do aperfeiçoamento do
conhecimento, da educação superior, das grandes viagens internas
e externas. Aqui surgem os desejos de elevação do ser, as nobres
aspirações éticas ou os grandes questionamentos religiosos ou
metafísicos. A casa nove representa a transcendência, a busca
pelos gurus ou mestres, que podem promover a expansão contínua
de novos horizontes existenciais e espirituais.

CASA DEZ
Aqui temos o nascimento do eu cósmico que quer realizar um
ideal, assumindo uma responsabilidade profissional ou uma ação
social voltada para o mundo. O trabalho vem a ser a realização de
um destino social, reputação, uma posição de elevação, de
autoridade conquistada pelo conhecimento adquirido. Este setor
representa os processos de cristalização e de organização social,
construídos pelas leis determinadas pela sociedade. A casa dez
manifesta o desejo de poder e a ambição em deixar um legado que
se eternize no tempo. É o zênite, o ponto mais alto do zodíaco
natural e da carta natal individual. É o ponto onde o sol se encontra
ao meio dia, no auge do seu brilho e calor.

CASA ONZE
O eu mais responsável e consciente de seu papel social vai
escolher seus semelhantes para compartilhar seus ideais
fraternos. Nesse setor zodiacal estão caracterizados os grupos, os
amigos, as associações, os clubes, a visão do futuro e a intuição
do vir a ser, que ensejam a busca por uma segurança intelectual.
Vemos aqui a força da consciência coletiva em busca da irradiação
do conhecimento que visa quebrar paradigmas ultrapassados que
não aceitam fronteiras ou limites. A casa onze representa a mente
universal, a liberdade, a utopia, o pioneirismo, as ações futuristas
voltadas para a humanidade.

CASA DOZE
Na última casa, o eu está encerrando sua caminhada evolutiva e,
por analogia, é como se olhássemos a chegada de todos os rios no
imenso oceano, que muitos entendem como sendo o Inconsciente
Coletivo. A sensação de unidade ou de síntese está
intrinsecamente relacionada a essa fase conclusiva, que abarca as
experiências vividas nas onze casas anteriores. Neste setor, essa
confluência psíquica se expressa pela busca da transcendência e da
paz através do misticismo e das aspirações espirituais. A casa
doze diz respeito à vida contemplativa, a interiorização, ao
sofrimento, ao sacrifício; é a sensibilidade psíquica que anseia
por uma síntese visando, assim, alcançar a libertação da matéria. É
um setor de reclusão, anonimato e filantropia.
Conclusão do Capítulo
Em suma, podemos observar que além dos signos que compõem
a mandala zodiacal, as casas, como setores específicos de
experiências humanas, mostram a totalidade ou finalidade da
existência, sinalizando as diferentes etapas de desenvolvimento
humano. Estes doze passos evolutivos expressam os diversos
conteúdos psíquicos que compõem o Self, em toda a sua plenitude.
Considero relevante o entendimento que o Self, como símbolo de
totalidade, está representado pelo zodíaco inteiro, pois é a
somatória de todos os elementos ali presentes.
Sobre essa intenção, ou seja, o projeto final da jornada humana,
o qual Jung definiu como individuação, diz Progoff:
 
“O Si-mesmo é o maior de todos os arquétipos que a psique
contém, pois encerra em si o propósito mais elevado que está
por trás não só dos arquétipos impessoais, mas ainda do
processo arquetípico através do qual o ego e a consciência
emergem. Pode-se dizer que o Self representa a essência, a
finalidade e o processo vivo pelo qual a psique realiza a sua
natureza íntima. Nesta condição o Self jamais pode ser contido
pelo ego ou por qualquer dos arquétipos específicos”.[cxxxvi]
 
Os planetas que são iluminados pelo Sol funcionam como uma
grande “equipe de apoio”, para que nossa aventura cósmica solar
possa ser cumprida. Ao seguir o conselho da entrada do templo de
Delfos, o indivíduo mais consciente daquilo que é ou deseja ser,
será mais exitoso, o grande protagonista do palco que compõe a
história de sua vida. Para isso a astrologia vem ao nosso alcance
quando nos informa com precisão sobre o ser que somos e que
poderemos efetivamente aperfeiçoar. Ainda que sejamos feitos da
mesma matéria-prima astrológica ( planetas, signos, elementos), a
vida, como uma obra de arte , é única e intransferível.
De forma análoga aos temas míticos, o herói solar terá que fazer
a sua travessia por pântanos, cavernas e florestas para alcançar
sua princesa ou um reino, e ele fará a sua trajetória com mais ou
menos bênçãos, vindas de ajudas auspiciosas de mestres ou anjos
que poderá encontrar em seu caminho.
Finalizando, a mandala astrológica é a representação viva e
espontânea dessa intenção original, nosso “mapa”, a direção
traçada, mostrando um caminho de realizações futuras. Ela abrange
nossos opostos entre consciência e inconsciência, conflitos,
contradições, frustrações, sonhos, ideais e esperanças e tudo isso
será vivenciado na sombra ou na luz.
Como símbolo de totalidade, ela representa para o indivíduo a
entrada no labirinto, onde há um vaivém de direções que parecem
desvios do percurso existencial, mas que ao mesmo tempo apontam
sutilmente a direção da chegada, para o centro dele mesmo, o
arquétipo central, do sentido da vida, o Self.
Termino com trecho de uma carta escrita ao astrólogo indiano
Bangalore Venkata Raman, em 1947, onde percebemos claramente
o apreço que Jung tinha pela astrologia e como lançava mão dela
como ferramenta de diagnósticos:
 
“Como eu sou um psicólogo, me interesso principalmente pela
luz especial que o horóscopo lança em certas complicações do
caráter. Em casos de difícil diagnóstico psicológico, eu
normalmente obtenho um horóscopo para ter uma perspectiva
mais profunda, de um ângulo totalmente diferente. Devo dizer
que, muito frequentemente, descobri que os dados astrológicos
elucidaram certos pontos que eu, de outra forma, teria sido
incapaz de compreender. De tais experiências formei a opinião
de que a astrologia é de particular interesse para o psicólogo”.
[cxxxvii]

 
 
Anima Mundi. No centro dessa figura da Natureza, vemos uma bela virgem
que está ligada à Deus por uma corrente. Ele á a Alma do Mundo (anima
mundi). Em seu seio há o Sol, em seu ventre, a Lua. Seu coração envia luz às
estrelas e aos planetas. Seu pé direito pousa sobre a terra, e o esquerdo está
na água. Aqui estão representados os reinos:  mineral, vegetal, animal e
angélico. Nos círculos das Artes Liberais vemos a astronomia, música,
geomancia, pintura, geometria, pintura, entre outras. (Robert Fludd: Ultriusque
Cosmi História, 1617.)
Emma de Mascheville (1903 – 1981[cxxxviii])

Considerações Finais

 “Acho que todos os meus pensamentos giram em torno de


Deus como os planetas em torno do Sol, e são da mesma forma
irresistivelmente atraídos por Ele. Eu me sentiria como o maior
pecador querer opor uma resistência a esta força”. (Carl G.
Jung)

“Para mim, a astrologia simplesmente devolve os eventos para


os Deuses. Ela depende de imagens tiradas do céu. Ela invoca
um sentido politeísta, mítico, poético, metafórico do que é
fatalmente real. É isto que torna a astrologia eficaz como um
campo, como uma linguagem, como um modo de pensar. Ela é
quem traz para o pensamento popular a grande tradição que
mantém que todos nós participamos de um cosmos inteligível,
desta maneira dando a questões humanas respostas maiores
que as humanas. Força-nos a pensar em termos psicológicos
complexos. Ela é politeísta e, consequentemente, move-se em
oposição ao pensamento dominante da história ocidental”.
(James Hillman)

A Astrologia psicológica não se afirma em detrimento da prática


psicoterápica. A leitura da carta natal sem dúvida propicia
revelações importantes e pode desencadear insights expressivos
para o cliente. Permite um caminho mais alargado para o
entendimento da dinâmica subjetiva do indivíduo dentro do processo
analítico, e isso abarca valores, motivações intrínsecas, mitos e
crenças, por vezes bem arraigadas. Ela pode jogar luz em áreas
obscuras e também sublinhar talentos e recursos ainda não
reconhecidos como tais. A interpretação adequadamente
compreendida dos símbolos de uma carta natal é certamente uma
ferramenta igualmente preciosa para o autoconhecimento.
Por outro lado, ao psicoterapeuta cabe a função de acolher,
orientar ou direcionar os conteúdos simbólicos que surgem no
processo. O apoio ou “corrimão” dado ao paciente é o suporte
emocional fundamental para a construção da confiança e
cumplicidade do trabalho analítico. Sem elas, as desejadas
mudanças muitas vezes não ocorrem.
 Entendo também que o fator tempo é essencial nesse processo,
uma vez que cada indivíduo tem seu próprio timing de elaboração,
ou seja, o ritmo e a profundidade de cada um precisam ser levados
em consideração. Sabemos que as urgências da alma demandam
cautela e paciência tanto do paciente quanto do analista, e que a
pressa não é uma boa conselheira. Certamente, o tempo qualitativo
verificado nos trânsitos e progressões pode sinalizar com mais
clareza períodos mais ou menos favoráveis para inúmeras coisas.
A consulta astrológica não substitui o processo terapêutico,
quando apreendemos que existe o kairós, ou o tempo oportuno para
que a borboleta possa sair de seu casulo e fazer seu vôo com
segurança. Ou seja, o processo analítico deve ser vivenciado e ele
se faz pelos labirintos da alma, com os picos e vales que todos
conhecemos.
Jung, o sábio de Zurich, bebeu a água da fonte de várias
tradições herméticas filosóficas e espirituais.  Seu amor e interesse
por elas é visível em toda a sua obra, assim como seu grande
empenho em decifrá-las, tornando-as mais acessíveis ao público
leigo. Não fosse isso, não estaríamos hoje tão familiarizados com os
fundamentos das religiões orientais, com a Alquimia, o I Ching,
Astrologia, Mitologia comparada ou a Kabala. Seu olhar de
pesquisador incansável se lançou do Oriente em direção ao
Ocidente, e igualmente do passado para o futuro, imaginando, quem
sabe, encontrar um Anthropos mais completo e universal, senhor de
sua razão e emoções.
Sabemos que Jung sofreu por ter feito suas investigações dentro
de uma “camisa de força” que predominou na visão cartesiana e
materialista de ciência do século XX. Foi renegado em seu meio,
sofreu com ofensas e com a incompreensão de seu tempo, como
acontece com todos os visionários. Mas não se curvou a ninguém,
seguiu o seu daemon e seu destino singular que se desenhara já na
infância, com sonhos e visões impressionantes.
Podemos afirmar que Jung foi precursor da Psicologia
Transpessoal, cujo pressuposto é uma abertura para conhecimentos
filosóficos de várias tradições religiosas. A abordagem transpessoal
está fundamentada na teoria holística da realidade, na qual se
verifica a união da pesquisa científica com as tradições esotéricas. E
nesse contexto de totalidade há uma busca de integração dos
aspectos físico, emocional e espiritual do ser humano. É importante
que se diga que há uma espiritualidade intrínseca que engloba
todas as formas de religiosidade e que ela é um fator básico,
presente na matriz psíquica da humanidade.
Jung escutou as vozes de seus antepassados com curiosidade e
reverência, mas, como todo intuitivo, era inquieto e criativo.
Perscrutou o amanhã, inaugurando novos paradigmas científicos
que permeiam as descobertas do século XXI. Esses encontram hoje
ressonância em sua teoria, tais como os postulados da
neurociência, da física quântica, dos campos morfogenéticos e dos
hologramas.
As questões do Bem e do Mal sempre o inquietaram e não
podemos esquecer o fato que ele vivenciou, no coração da Europa,
duas guerras mundiais devastadoras. Jung amava a natureza.
Costumava velejar no lago que ficava ao lado de sua casa em
Bollingen, apreciava ouvir o canto do vento nas árvores, esculpia em
pedras, rachava lenha para cozinhar e conversava com suas
panelas. Dizem também que sua gargalhada era inconfundível.
Foi um homem que vivenciou profundamente as agruras e dores
de sua psique. Atravessou o rio caudaloso de seu próprio
inconsciente com coragem e entrega. Seus belos desenhos e
percepções contidas no Livro Vermelho nos dão a dimensão da
intensidade com que viveu a experiência de caminhar nos desertos
de sua alma e mergulhar fundo em suas imagens internas. A base
teórica de sua fascinante psicologia analítica emergiu desse
encontro consigo mesmo, um trabalho de toda uma vida, como ele
mesmo afirmou. Acredito que o legado da sua vasta obra só será
realmente compreendido no século atual.
A majestosa representação do céu noturno com sua miríade de
estrelas e galáxias é para mim a somatória de tudo o que já somos
e ainda seremos. O fato de os deuses do panteão grego terem o
mesmo nome que os planetas que estão no céu certamente não é
obra do acaso. A “música das esferas” faz soar e nos encanta com
sua harmonia e beleza nas atividades humanas há milênios. Nesse
magnífico bailado cósmico está prefigurado o entrelaçamento do
nosso destino e arbítrio humano, esteja ele conjugado no singular
ou no plural, no indivíduo ou na coletividade.
Jung 1958 

No incomensurável Inconsciente Coletivo e suas imagens


arquetípicas encontramos uma “harmonia pré-estabelecida, sob o
desígnio e a proteção de Deus”, como disse Leibniz no século XVII.
E já no terceiro século da era cristã Plotino escreveu sobre a Alma
do Mundo que habita na fronteira entre o mundo inteligível e o
mundo espiritual. Essa Alma é o “berçário”, por assim dizer, onde
estão contidas todas as almas singulares de todos os seres dos
universos, e cada uma delas manifesta um modelo arquetípico único
ou singular no mundo específico que habita.
Contemplamos o magnífico espelhamento entre o cosmos e o
homem, desde sempre; a anima mundi é visível e palpável quando
erguemos os olhos encantados para o céu estrelado. E também
quando vivenciamos com o coração aberto as bênçãos da
Psicologia Analítica e da Astrologia, a “mãe das artes mânticas”.
Ambas me acolhem, como uma frondosa árvore-mãe, e irrigam com
sua seiva generosa a minha jornada existencial.
 
Tereza Kawall
Março 2021
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Esotérico da Comunhão do Pensamento : 100 anos- 1909-2009. São Paulo,
Pensamento, 2010.
RAMOS, Denise Gimenez. A Psique do Coração- uma leitura analítica do seu
simbolismo. São Paulo, Cultrix, 1995.
RUDHYAR, Dane. Astrologia da Personalidade. São Paulo, Pensamento,
1995.
------------------- Da Astrologia humanista à astrologia transpessoal. Rio de
Janeiro, Antares, 1985.
---------------------  As Casas Astrológicas. São Paulo, Pensamento, 1988.
RUPERTI, Alexander. A roda da experiência individual: as casas astrológicas.
São Paulo, Ágora, 1987.
-------------- Ciclos de Evolução- Modelos planetários de desenvolvimento. São
Paulo, Pensamento, 1986.
SASPORTAS, Howard. As doze casas. São Paulo, Pensamento 1988.
SASPORTAS, Howard. OS deuses da mudança. São Paulo, Siciliano 1991.
SAUAIA, Neusa et al. Os animais e a psique. Vol I. São Paulo, Summus,
2005.
SCHREIBER, David Servan. Curar. São Paulo, Sá Editora, 2004.
SICUTERI, Roberto, Astrologia e Mito – Símbolos e mitos do Zodíaco na
Psicologia profunda. São Paulo, Pensamento, 1994.
SILVEIRA, Nise. Imagens do Inconsciente. Rio de Janeiro, Alhambra, 1981.
----------------------- Jung: Vida e obra. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988.
SOMMERMAN, Américo. Corpus Hermeticum. São Paulo, Polar,  2019.
TABONE, Marcia. A Psicologia Transpessoal. São Paulo, Cultrix, 1988.
TARNAS, Richard. Cosmos and Psyche, New York, Penguim Group. 2007.
VALENTINE, Christine. Imagens da Psique. São Paulo, Siciliano, 1994.
ZACHARIAS, José Jorge de Morais. Tipos, a diversidade humana. São Paulo,
Vetor, 2006.
ZWEIG, Connie e ABRAMS, Jeremiah (orgs). Ao encontro da sombra – O
Potencial Oculto do Lado Escuro da Natureza Humana. São Paulo, Cultrix,
2001.
ZOJA, Luigi. A história da arrogância – Psicologia e limites do
desenvolvimento humano. São Paulo, Axis Mundi, 2000.
ZONDAG, Karen Hamaker. Astro-Psicologia. Rio de Janeiro, Nova Fronteira,
1988.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

casadoescritor.com
[i] Os ângulos entre os planetas são também denominados aspectos

planetários. Eles assinalam as distâncias entre os planetas dentro da carta


astrológica e têm significados diferentes, e esse entendimento é fundamental
para a leitura ou interpretação do mapa natal. Os mais relevantes são:
conjunção, sextil, quadratura, trígono e oposição. Em orbes aproximadas de
0°, 60°, 90°, 120° e 180°, respectivamente. 
 
[ii] Música: “Um violeiro toca” de autoria de Renato Teixeira e Almir Sater.
[iii] Renomados estudiosos que se destacaram na Europa, nesta época,

com suas pesquisas: WillhelmWundt (1832-1920); Franz Brentano ( 1838-


1917); Carl Stumpf (1848-1936); Georg Elias Müller (1850-1934); Edwald
Hering (1834- 1918); James Ward ( 1843-1925); William McDougall    (1871-
1938); Francis Galton (1822-1911).
[iv] GRINBERG, Luiz Paulo. Jung, o homem criativo. São Paulo, FTD, p.22,

2003.
[v] MARONI, Amnéris. Individuação e Coletividade. São Paulo, Ed.

Moderna, p.7, 1999.


[vi] GAMBINI, Roberto. A Voz e o Tempo – Reflexões para jovens

terapeutas.  São Paulo, Ateliê Editorial, p.71, 2008.


[vii] SILVEIRA, Nise da.  JUNG – Vida e Obra. Rio de Janeiro, editora Paz e

Terra.
[viii] SILVEIRA, Nise da. Imagens do Inconsciente. Rio de Janeiro,

Alhambra, 1981.
[ix] SILVEIRA, Nise da. Gatos, a emoção de lidar. Rio de Janeiro, editora

Leo Christiano, 1998.


[x] AGUIAR, Josélia. Artigo na Revista EntreLivros, São Paulo, Duetto

Editorial, 2006
[xi]MANN, A.T. The Round Art – The Astrology of Time and Space.

Dragon’s World Ltd, pag.15, 1979.


[xii] Mesopotâmia é uma região que fica entre dois rios Tigre e Eufrates. O

nome vem de mesos (meio) e potamos(rios), onde atualmente se localiza o


Iraque.
 
[xiii] GROF, Stanislav. Psicologia do futuro. Niterói, Ed. Heresis, p.283,

2000.
 
[xiv] A obra Corpus Hermeticum, como um vasto conjunto de quatorze

textos ou tratados dos séculos II e III d.C., é uma literatura “hermética” erudita,
escrita em forma de diálogos numa fusão de religião, alquimia, filosofia, magia
dos metais para o feitio de talismãs, e astrologia. A magia alquímica é
também astrológica, considerando que o alquimista trabalha com o tempo
qualitativo, que está associado aos planetas.
[xv] SOMMERMAN, Américo. Corpus Hermeticum- Hermes Trimegisto. São

Paulo, Polar, p.9, 2019.


[xvi]  FERNANDES, Fernando. Astrologia para um novo ser. São Paulo:

Roka, p.20, 2000.


[xvii] MARCUS, Cid. Localizado em: cidmarcus.blogspot.com
[xviii] O Almanaque do Pensamento é publicado até os dias de hoje. A

história deste Almanaque confunde-se certamente com a história da astrologia


no Brasil.
[xix] Antonio Carlos Bola Harres: Jornalista de Porto Alegre, em 1972

tornou-se aluno e colaborador da astróloga Emma Costet de Mascheville. Em


1976 fixou residência no Rio de Janeiro, onde já exercia o ofício de astrólogo
com consultas individuais. Em 1979 foi cofundador da Escola Júpiter em São
Paulo, e da revista de mesmo nome. Em 2005 fundou a CNA, a Central
Nacional de Astrologia. Destacou-se como professor, pesquisador,
conferencista e organizador de eventos, aos quais se dedica até os dias de
hoje. Sugestão para leitura e pesquisa: site www.constelar.com.br de autoria
de Fernando Fernandes. Para saber mais: site:
espacoastrologico.com.br/astrologia-no-brasil/ autor: Antonio Carlos S.
Harres. Mais referências importantes sobre a astrologia no Brasil, tais como
profissionais, escolas, associações, eventos e publicações relevantes.
[xx] JUNG, Carl G. O Segredo da flor de Ouro - um livro de vida chinês. Rio

de Janeiro, Vozes, p.28, 1984.


[xxi] JUNG, Carl G. Freud e a psicanálise. Rio de Janeiro: Vozes, Vol. IV, §

278.
[xxii]  KAWALLL, Tereza. Artigo para revista Jung e Corpo. São Paulo,

Sedes Sapientiae, 2006


[xxiii] JUNG, C.G. A Natureza da psique. Rio de Janeiro: Vozes, vol. VIII/2,

§s 241 a 243, 2003


[xxiv] SASPORTAS, Howard. O desenvolvimento da personalidade –

Seminários sobre Astrologia Psicológica.  São Paulo, Pensamento, p. 18,


1990.
[xxv] VON FRANZ, Marie-Louise. A interpretação dos contos de fadas. Rio

de Janeiro, ed.Achiamé, 1981.


[xxvi] JUNG, C. G. A natureza da psique. Rio de Janeiro: Vozes, Vol. VIII,

p.2, § 729, 2003.             


[xxvii] FREITAS, Luis Carlos Teixeira de. Astrologia Clínica - um método de

autoconhecimento. São Paulo, Círculo do Livro, 1992.


[xxviii] TARNAS, Richard. Cosmos and Psyche – Intimations of a New World
View. USA, A Plume Book, p. 77, 2007
 
 
[xxix] BRUNO, Giordano.  De la causa, principio e uno. Diálogos II e III; De

l’infinito universo e mondi, diálogo I, 1584. (Wikipedia)


[xxx] ZONDAG, Karen-Hamaker-. Astropsicologia- O simbolismo astrológico

e a psique humana. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, p. 83, 1988.


[xxxi] SICUTERI, Roberto. Astrologia e Mito - Símbolos e mitos do Zodíaco

na psicologia profunda. São Paulo, Pensamento, p.11, 1994.


[xxxii] 
 
 
 
 
Giordano Bruno, 1548-1600. Frade italiano, teólogo italiano do
Renascimento. Foi condenado à fogueira pela Inquisição, por defender o
panteísmo. Acusado de heresias e por sustentar opiniões contrárias ao ideário
católico daquela época. Tal qual Copérnico, defendeu ao longo da vida que a
verdade deveria prevalecer sobre qualquer crença ou ideologia. Concordava
com ele ao reafirmar que a Terra girava em torno do Sol, e não o contrário.
Visionário e rebelde, defendeu o “pluralismo cósmico”, afirmando que mais do
que pontos de luz, as estrelas eram como sóis distantes, com seu próprio
conjunto de planetas orbitando ao seu redor
[xxxiii] 

A eclíptica assinala o caminho aparente do Sol em torno da Terra. O plano


de eclíptica tem uma inclinação de 23 graus em relação ao plano do equador
terrestre. Devido a essa inclinação o giro do Sol em volta da Terra não segue
o equador, produzindo, assim, as quatro estações do ano. A intersecção entre
a eclíptica e o equador é o que determina os equinócios. Quando o Sol passa
nesses pontos de intersecção, a duração de tempo do dia e da noite é igual
(ou: a duração de tempo do dia é igual à duração de tempo da noite). O
equinócio da primavera, ou o Ponto Vernal, corresponde ao grau zero do
signo de Áries e ocorre no dia 21 de março de cada ano, aproximadamente. O
equinócio de Outono ocorre em 21 de setembro, onde está o grau zero do
signo do signo de Libra. O ponto mais distante ao sul da eclíptica e abaixo do
equador é chamado de trópico de Capricórnio. Quando o Sol atravessa esse
trópico em 21 de dezembro, temos o ponto de intersecção que marca o
Solstício do inverno, que fica no grau zero do signo Capricórnio. No ponto
mais distante ao norte da eclíptica e acima do equador, no grau zero do signo
Câncer, temos o trópico de Câncer, que corresponde ao Solstício de Verão, e
a passagem do Sol ali ocorre no dia 21 de junho do ano. Resumindo: nas
datas dos equinócios da primavera e do outono (Áries e Libra), o dia tem a
mesma duração que a noite. No solstício de verão (Câncer), temos o dia mais
longo do ano, em contraponto ao solstício de inverno (Capricórnio), que tem a
noite mais longa do ano. O Sol se move através da eclíptica em um grau por
dia, perfazendo o círculo todo em 365 e 1/4 dias, que vem a ser o ano solar.
Esse círculo imaginário ao redor de Terra, também chamado Zodíaco, tem 12
subdivisões ou seções de trinta graus cada uma. Assim, do ponto de vista da
Terra, o Sol se move através dos 12 signos zodiacais, simbolicamente
representados na Esfera Celestial pelas 12 constelações. No cálculo do mapa
astrológico individual, todas essas coordenadas astronômicas estão
presentes. São elas: as referências geográficas como a latitude e a longitude
do local, a posição dos planetas nos signos zodiacais do dia e da hora de
nascimento do indivíduo. O signo solar é aquele em que o Sol aparentemente
está atravessando a Esfera Zodiacal num determinado momento. As casas
zodiacais do mapa individual estão relacionadas ao movimento axial da Terra,
vale dizer, o movimento que ela faz em torno do seu próprio eixo. OBS: No
Hemisfério Sul essas datas e posições zodiacais são opostas às do
Hemisfério Norte, tanto como os ciclos que assinalam as quatro estações do
ano.
[xxxiv] JUNG, Carl Gustav.  A Natureza da psique. Rio de Janeiro, Vozes

Vol. VIII/2, §325, 1988.


[xxxv] JUNG, Carl Gustav. Cartas. Rio de Janeiro, Vozes, Vol.II. p.344,

2002.
[xxxvi] GROF, Stanislav. Psicologia do Futuro. Niterói, Ed. Heresis, p.

283,2007.
[xxxvii] JUNG, Carl G. Tipos Psicológicos. Petrópolis, Vozes, Vol. VI, §1031,

1991.
[xxxviii] BAIR, Deirdre.  Jung – uma biografia. São Paulo: Globo, Vol. I, p.

371, volume I, 2006.


[xxxix] Existe um teste bastante aplicado no contexto organizacional, que

avalia comunicação, liderança, motivação dos indivíduos entre outros. Este


teste, baseado na tipologia junguiana foi publicado pela primeira vez em 1942
e já passou por diversas modificações. É o MBTI (Myers-Briggs Type
Indicator). Esse indicador de tipos foi criado por duas norte-americanas,
Katharine Cook Briggs e Isabel Briggs Myers (mãe e filha). Temos também o
QUATI, Questionário de Avaliação Psicológica, um teste também
fundamentado na teoria dos tipos de Jung. Foi criado por José Jorge de
Morais Zacharias e editado pela editora Vetor, em 1995. É usado com êxito no
trabalho clínico, no RH das empresas, no aconselhamento escolar, vocacional
e aconselhamento familiar.
[xl] ZACHARIAS, J. J. de Morais. Tipos – A diversidade humana. São

Paulo, Vetor, p.55, 2006.


[xli] VON FRANZ, Marie Louise. Tipologia de Jung.São Paulo, Cultrix, p.83,

1995.
[xlii] VON FRANZ, Marie Louise. Tipologia de Jung.São Paulo, Cultrix, p.22,

1995.
[xliii] ZACHARIAS, J. J. de Morais. Tipos – a diversidade humana. São

Paulo, Vetor, 2006.


[xliv] ARROYO, Stephen.  Astrologia, Psicologia e os quatro elementos.

São Paulo, Ed. Pensamento, p.87, 1984.


[xlv] GREENE, Liz. Relacionamentos, São Paulo: Cultrix, p.56, 1988.
[xlvi] JUNG, C.G. A natureza da psique. Petrópolis, Vozes, § 204, 1988.
[xlvii] GRINBERG, Paulo. Jung, um homem criativo. São Paulo, FTD, p.

125, 2003.
[xlviii] JUNG, C. G.A Natureza da psique. Petrópolis,Ed. Vozes, Vol. VIII/2, §

253, 2003.
[xlix] SCHREIBER, David Servan-. CURAR: O stress, a ansiedade e a

depressão sem medicamento nem psicanálise.  São Paulo: Sá Editora, p.93,


2004.
[l] ASSAGIOLI, Roberto Assagioli, citado por FERRUCCI Piero, em O que

podemos vir a ser. São Paulo, ed. Totalidade, pag 48, 1967. 
[li] FERRUCCI, Piero. O que podemos vir a ser. São Paulo, ed. Totalidade,

p. 48, 1967.
[lii] GREENE, Liz. Relacionamentos. São Paulo: Pensamento, p.32, 1988.
[liii] SASPORTAS, Howard. O desenvolvimento da personalidade -

Seminários de Astrologia Psicológica, Editora Pensamento, ps. 160 e 161,


1990.
[liv] FERRUCCI, Piero. O que podemos vir a ser.São Paulo, ed. Totalidade,

p.57, 2001.
[lv] GREENE, Liz. Jung´s Studies in Astrology – Prophecy, Magic, and The

Qualities of Time. Routledge, Taylor & Francis Group,  NY, 2018


[lvi] JUNG, Carl Gustav. Mysterium Coniunctionis,Rio de Janeiro, Vozes,

CW XIV/1, § 302, 1985


[lvii]JUNG, C.G..The Tavistock lectures, pp 71-3 citado por Neville

Symington, The analytic experience, p. 219.                           


[lviii] Roberto Greco Assagioli foi o criador da Psicossíntese. Nasceu em Veneza em

1888. Diplomou-se em Medicina na Universidade de Florença e especializou-se em


psiquiatria. Posteriormente doutorou-se em psicanálise e a introduziu na Itália.
Rapidamente percebeu que essa escola não abarcava o entendimento da vida espiritual,
nem a criatividade e valores como compaixão, alegria e sabedoria. Em 1910 começa então
a formular uma teoria “integral” do homem. Em 1926 fundou o Instituto di Pscosintesi em
Roma. O estudo do pensamento oriental foi marcante em sua vida e visão de mundo. Entre
os escritos que o influenciaram temos o poema místico Bhagavad Gita, Sri Aurobindo e Sri
Shankara. A psicologia humanista e transpessoal emergente nos meados do século XX
muito contribuíram para a formulação de seus conceitos e técnicas psicoterápicas. A
característica básica da Psicossíntese vem a ser sua dupla raiz pautada tanto na psicologia
ocidental quanto na oriental. Seu pressuposto fundamental é a concepção espiritual do ser
humano e de sua natureza pluridimensional. Para Assagioli, o Eu espiritual é um centro
permanente de poder, que impulsiona o desenvolvimento da personalidade. A
Psicossíntese possui uma abordagem integradora, global e inclusiva que se propõe a
ajudar a liberar a energia do Self. O Self é o princípio organizador da vida, e inclui luz e
sombra, análise síntese. princípio organizador da vida, e inclui luz e sombra, análise e
síntese. Outros autores que foram importantes para Assagioli: o filosofo russo Ouspensky,
o poeta indiano Tagore, o professor zen-budista D.T. Suzuki, o psiquiatra Viktor Frankl, e o
próprio Jung.
[lix]JUNG, Carl G. A prática da psicoterapia. Petrópolis: Vozes, § 124, CW

XVI/1, 1981.
 
[lx]JUNG, Carl G. AION-Estudos sobre o simbolismo do si-mesmo.

Petrópolis: Vozes, vol. IX/2. 1998


[lxi] VON FRANZ, Marie Louise. Psicoterapia. São Paulo, Paulus, 1999.

 
[lxii] GREENE, Liz. Relacionamentos, Cultrix, pag 94, 1988.
[lxiii] GAMBINI, Roberto.  A voz e o Tempo. São Paulo: Ateliê Ed, p. 136,

2008.
 
[lxiv] BRANDÃO, Junito. Mitologia Grega. Petrópolis, Vozes, Vol.I, 1986
[lxv] GREENE, Liz. Relacionamentos. São Paulo, Cultrix, p. 96, 1988
[lxvi]SULLIVAN, Erin. Saturno em trânsito. São Paulo, Siciliano, 1992.
[lxvii]Os trânsitos e progressões serão melhor analisados no capítulo VII.
[lxviii] GREENE, Liz.  Astrologia do destino. São Paulo, Cultrix/Pensamento,

1989.
[lxix] SICUTERI, Roberto. Astrologia e Mito. São Paulo, Pensamento, 1994.

 
 
[lxx] ARROYO, Stephen. Astrologia, Karma e Transformação. Publicações

Europa-América, 1978.
[lxxi] SASPORTAS, Howard. Os deuses da mudança. São Paulo, Siciliano,

1991.
[lxxii] “Se eu quiser falar com Deus”, de Gilberto Gil, feita em 1980, no livro

“Todas as Letras”, organizado por Carlos Rennó, editora CIA das Letras, São
Paulo.
[lxxiii] RUDHYAR, Dane. Astrologia de Personalidade. São Paulo,
Pensamento, pag 94, 1992.
[lxxiv] VON FRANZ, Marie-Louise.  O Homem e seus Símbolos. Rio de Janeir,

Nova Fronteira, pag 162, 1977.


 
[lxxv] JUNG Carl G.; WILHELM Richard. O segredo de flor de ouro.

Petrópolis, Vozes, p. 31, 1984.


[lxxvi] CREMA, Roberto;  WEIL, Pierre; LELOUP, Jean-Yves.  Normose – a

patologia da normalidade  Campinas: Verus, 2003.


[lxxvii] JUNG Carl G.  A natureza da psique. Petrópolis: Vozes,  vol /2 VIII

parag 145, 1998


[lxxviii] GREENE, Liz; SASPORTAS, Howard. Os planetas interiores:

elementos estruturais da realidade pessoal. São Paulo, Roca, 1995.


[lxxix] MARONI, Amnéris. Figuras da Imaginação – Buscando compreender

a psique. São Paulo, Summus, 2001.


 
[lxxx] FREITAS, Luiz Carlos Teixeira de. Astrologia clínica – um método de

autoconhecimento. São Paulo : Círculo do Livro, p. 55,1992.


[lxxxi] Christine Valentine em: “Imagens da Psique – explorando os planetas

através da psicologia e do mito”, São Paulo, Siciliano pag 94, 1994.


[lxxxii] JUNG, Carl G. Os símbolos da Transformação. Petrópolis, Vozes, §

251, 1999.
[lxxxiii]  HILLMAN, James, O pensamento do coração e a alma do mundo.

Campinas:, Verus, p.19,  2010.


[lxxxiv] KAWALL, Tereza. Astrologia - Os doze portais mágicos. São Paulo,

Talento, 2001. Para efeito de referência bibliográfica: O livro do qual sou


coautora, Astrologia e o doze portais mágicos, tem doze autores: Marylou
Simonsen, Constantino K. Riemma, Rodrigo AraésCaldas Farias, Antonio
Carlos “Bola” Harres, Raul Varela Martinez, Graça Medeiros, Waldyr Bonadei
Fücher, Valdenir Benedetti, Luís Pellegrini, Cleide Guedes, Tereza Kawall,
Marcia Mattos.
 
[lxxxv] SICUTERI Roberto: Astrologia e Mito – Símbolos e mitos do Zodíaco

na psicologia profunda.  São Paulo: Pensamento, 1994.


[lxxxvi] RAMOS, Denise Gimenez; BIASE, Maria do Carmo de;

BALTHAZAR, Maria Helena Monteiro;  RODRIGUES, Maria Luiza Piva;


SAUAIA, Neusa Maria Lopes;  SAYEG, Roseli Ribeiro, MALTA, Stella Maria T.
Cerquinho. Os animais e a psique.  São Paulo, Summus Editorial, Vol. I, p.83,
2005.
[lxxxvii] VALENTINE Christine. Imagens da Psique. São Paulo, Siciliano, P.

88, 1994.
[lxxxviii] GREENE, Liz; SASPORTAS, Howard. A Dinâmica do Inconsciente.

São Paulo: Pensamento, Seminários sobre Astrologia Psicológica, p.198,


1990.
 
[lxxxix] GAMBINI, Roberto; DIAS, Lucy. Outros 500- Uma conversa sobre a

alma brasileira. São Paulo, SENAC, 1999.


 
[xc] JUNG, Carl G. A natureza da psique. Petrópolis, Vozes, CW VIII/2, §

392, 1998.
[xci]  KAWALL, Tereza. São Paulo: Revista Jung e Corpo nº6, Sedes

Sapientiae.
[xcii] Paul Patrick. Meditações sobre o Tratado da Pedra Filosofal de

Lambspring. São Paulo:  Ed. Polar, Volume I, pag 15, 2014.


 
[xciii]VON FRANZ, Marie Louise. A Contribuition to the Discussion of C.G.

Jung´s Syncronicity Hipothesis, citada por  CAPRIOTTI, Letícia: A construção


do conceito de sincronicidade na obra de Jung.  Monografia apresentada à
PUC/PR, 1998. site: www.symbolon.com.br
 
[xciv] BYINGTON, Carlos. São Paulo: Ed. Duetto, Revista Viver Mente e
Cérebro, Coleção Memória da Psicanálise. Edição Especial 2, pag. 11.
[xcv] JUNG,C. G.; WILHELM, R. O Segredo da flor de ouro – um livro de

vida chinês. Petrópolis,  Vozes, p.14, 1984.


 
[xcvi] GREENE, Liz; SASPORTAS, Howard. A Dinâmica do Inconsciente –

seminários sobre Astrologia psicológica. São Paulo  Ed. Pensamento, p.224,


1990.
[xcvii]  A palavra sinastria vem do grego syn que significa junto, ao lado de,

e astria, ou astros.  A sinastria estuda os mapas de nascimento comparados


entre casais, pais e filhos ou sócios. É o estudo dos potenciais da relação,
sejam compatibilidades ou dificuldades que elas possam ter. Nesta citada
pesquisa foram utilizados 360 horóscopos individuais, ou seja, 180
casamentos.
[xcviii]  Sugestão de Leitura: JUNG, Carl G. Sincronicidade. Rio de Janeiro,

Ed. Vozes, volume VIII/3 § 978 e 979


 
[xcix] VON FRANZ, Marie-Louise. Carl G Jung, seu mito em nossa época.

São Paulo: Ed. Cultrix,  p. 193,1994.


[c] A influência de Plotino e dos neoplatônicos sobre o pensamento cristão,

islâmico e judaico, bem como sobre os pensadores de proa do Renascimento,


foi enorme. Foram direta ou indiretamente influenciados por ele: Gregório de
Nazianzo, Gregório de Nissa, Agostinho, Dionísio Pseudo-Aeropagita, Boécio,
Scoto Erígena, Alberto Magno, Tomás de Aquino, Dante Alighieri, Mestre
Eckhart, Joahannes Tauler, Nicolau de Cusa, João da Cruz, Marsílio Ficino,
Pico de La Mirandola, Espinosa, Leibniz, Coleridge, Henri Bergson.” -
SOMMERMAN, Américo. Plotino - Tratados das Enéadas. São Paulo: Polar
Editora, 2018.
[ci]GREENE, Liz. Jung’s studies in Astrology – Profecy, Magic and the

Qualities of Time. New York, Routledge,Ps. 90, 91, 92, 2018.


[cii]TARNAS, Richard. Cosmos and Psyche – Intimations of a New World

View. New York, USA: Penguim Group, p. 58, 2007.


[ciii]  Atom and Archetype: ThePauli/Jung Letters, 1932-1958, citado por

POPOVA, Maria. Atom, Archetype, and the invention of Syncronicity. How


iconic Psychiatrist Carl Jung and the Nobel-Winning Physicist  Wolfgang Pauli
bridged Mind and Matter.Site: www.brainpickings.org. Publicação: 9 de março
de 2017.
[civ] CAPRIOTTI, Letícia: A construção do conceito de sincronicidade na

obra de Jung. Monografia apresentada à: PUC/PR. site:


www.symbolon.com.br. 1998
 
[cv] Nota do autor: O escaravelho é um símbolo egípcio relacionado ao

renascimento ou transformação.
[cvi]JUNG, Carl G. Sincronicidade. Petrópolis, Vozes,§ 972 CW
VIII/3.
[cvii] GREENE, Liz. Relacionamentos - guia astrológico para conviver com

os outros num pequeno planeta. São Paulo, Ed. Cultrix, p. 10, 1988.
 
[cviii] JUNG, Carl G. O espírito na arte e na ciência. Petrópolis, Ed. Vozes,

CW XV, § 82, 1985.


 
[cix] MANN, A.T. Dragon´s World Ltd, The Round Art, p 85 / CW 9 p 300,

1979.
 
[cx] GREENE, Liz. Astrologia do Destino. São Paulo, Ed. Cultrix, 1989.

 
[cxi] SASPORTAS, Howard. Deuses da Mudança- uma nova abordagem da

Astrologia. São Paulo: Siciliano, p.18, 1991.


[cxii] RUPERTI Alexander. Ciclos de evolução - modelos planetários de

desenvolvimento.  São Paulo, Ed. Pensamento, p.21, 1987.


[cxiii] SASPORTAS, Howard. Deuses da Mudança - uma nova abordagem

da Astrologia. São Paulo, Ed. Siciliano, p.18, 1991.


[cxiv] RUDHYAR, Dane. Da Astrologia Humanista à Astrologia

Transpessoal. Rio de Janeiro, ed. Antares, p. 54,1985.


 
[cxv]HAND, Robert. Planets in Transit. Para Research, Massachussets,

USA. p.5, 1976.


[cxvi] GREENE, Liz. Relacionamentos. São Paulo, Ed. Cultrix, p. 211 e 217,

1988.
 
[cxvii] FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido. Petrópolis: Ed. Vozes,

coleção Logoterapia, pag. 127, 1991.


[cxviii] E. Frankl nasceu em 1905, em Viena. Depois de vivenciar os

horrores de um campo de concentração e conseguir sobreviver, Frankl, que


era psiquiatra e neurologista, fundou um sistema ou escola de psicoterapia, a
Logoterapia, que prioriza a importância da busca pelo sentido da vida. Para
ele essa busca é uma realidade ontológica, e não uma criação cultural.
Publicou 32 livros e esteve no Brasil em 1984.
[cxix]JAFFÈ, Aniela. Word and Image, p.77, Bollingen Series

XCVII/2.Princeton University Press, New Jersey, USA, 1979.


[cxx]JUNG, Carl G. Word ad Image, Bollingen Series XCVII:2, pag 78,
Princeton University Press,  New Jersey, USA, 1979.
[cxxi] JUNG, Carl G. Os arquétipos e o Inconsciente Coletivo, Petrópolis,

Vozes CW IX/1, § 714, 2000.


[cxxii] VON FRANZ, Marie-Louise. C. G Jung- seu mito em nossa época.

São Paulo, Ed. Cultrix, p.119, 1992.


[cxxiii] O antropocentrismo é uma ruptura com o Zeitgeist da Europa

medieval, em que prevalecia a visão do Teocentrismo, ou seja, ideia de que


Deus era o centro do mundo e a religião seria valor central da vida humana. A
obra do “Homem Vitruviano” encontra-se na Galleria dell’ Accademia, em
Veneza, Itália.
[cxxiv] JUNG, G. C. Psicologia e Alquimia. Petrópolis, Vozes, CW XII, §

214,1990.
[cxxv] SILVEIRA, Nise da.Imagens do Inconsciente. Rio de Janeiro,  Ed.

Alhambra, p. 60 e 55, 1981.


[cxxvi] VON FRANZ, Marie Louise. Jung, seu mito em nossa época. São

Paulo, Cultrix,  p. 118, 1992.


[cxxvii] JUNG, C.G. Tipos Psicológicos. Petrópolis, Vozes, CW VI, § 902,

1991.
[cxxviii] VON FRANZ, Marie Louise.  A interpretação dos contos de fadas.

Rio de Janeiro, Ed. Achiamé, p. 90, 1981.


[cxxix] JUNG, Carl G. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis:

Vozes, CW IX/1, § 343, 2000.


[cxxx] JUNG, Carl G. Espiritualidade e Transcendência. Seleção e edição

de Brigitte Dorst, Petrópolis: Vozes, p. 133, 2015.


[cxxxi] Jacob Boehme (1575-1624) Nasceu na Alemanha, trabalhou como

sapateiro. Teve um processo de iluminação em 1600 com revelações sobre a


estrutura espiritual do mundo, insights teológicos profundos. Escreveu muitas
obras e seus tratados eram em sua maioria de natureza gnóstica, alquímica,
cabalista. É considerado o pai da Teosofia, um precursor do movimento da
Nova Era; afirmava que todas as religiões falavam sobre as mesmas coisas,
mas com palavras diferentes. Influenciou Madame Blavatsky e Aleister
Crowley, entre outros. Respeitado pelos filósofos Leibniz, Hegel, Schelling.
Sua primeira obra foi Aurora Nascente. Ele criava mentalmente mandalas que
representavam a cosmologia cristã, formada por duas realidades: matéria e
espírito. Os desenhos encontrados em seus livros foram feitos por seus
editores, segundo as visões que o autor tinha. Considerado como um dos
mais poderosos gênios metafísicos da história da humanidade. Sua obra é um
monumento de conhecimentos cosmológicos, cosmogônicos e escatológicos
do cristianismo.
[cxxxii]RUDHYAR, Dane. As doze casas astrológicas. São Paulo, Ed.

Pensamento, 1988.
[cxxxiii] Signos Fixos - Touro, Leão, Escorpião e Aquário  compõem os

signos fixos da Astrologia. Como diz o próprio termo que os define, eles são
geralmente firmes,  estáveis, dogmáticos, determinados, acumuladores,
conservadores ou convencionais. Por outro lado, podem ser teimosos e
inflexíveis.
[cxxxiv] O afresco da “Última Ceia”, de Leonardo da Vinci, está na igreja

Santa Maria delle Grazie, em Milão, Itália.


[cxxxv] BERDINI, Franco. Cenacolo di Leonardo. Roma,  Editália, 1982.
[cxxxvi] PROGOFF, Ira. Jung, Sincronicidade e o Destino Humano. São

Paulo, Cultrix,  pag 84, 1990.


[cxxxvii]GREENE, Liz. Jung´s Studies in Astrology - Profecy, Magic, and

Qualities of Time, Routledge. New York, pag 31, 2018.


[cxxxviii] A astróloga alemã Emma de Mascheville, radicada na Brasil no

início do século passado, desenvolveu um estudo fascinante, no qual traça


uma relação entre os 12 signos e os 12 apóstolos na Última Ceia, de
Leonardo da Vinci. Em seu livro, a autora construiu a teoria da Luz e Sombra,
observando que a estrutura zodiacal tem seis eixos de energias formados por
signos que estão em oposição entre si, num ângulo de 180º. Essas energias
opostas são complementares formando uma unidade harmônica. O primeiro
eixo é formado por Áries-Libra, o segundo por Touro-Escorpião, o terceiro por
Gêmeos-Sagitário, o quarto por Câncer-Capricórnio, o quinto por Leão-
Aquário e o sexto por Virgem-Peixes. Respectivamente cada um deles
representa: a força criadora, a matéria criada, a lei da evolução, a eternidade,
o amor e a sabedoria universal. Sugiro a leitura do livro “Luz e Sombra –
Elementos Básicos de Astrologia”, Editora Teosófica, Brasília, 1997.

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