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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

COMPARAÇÃO ENTRE ANÁLISES DE ESTABILIDADE DE UMA BARRAGEM


DE REJEITOS POR ELEMENTOS FINITOS E EQUILÍBRIO LIMITE

RYAN OLIVEIRA DA CUNHA

Rio de Janeiro
Outubro de 2022
ii

COMPARAÇÃO ENTRE ANÁLISES DE ESTABILIDADE DE UMA BARRAGEM


DE REJEITOS POR ELEMENTOS FINITOS E EQUILÍBRIO LIMITE

Ryan Oliveira da Cunha

Projeto de Graduação apresentado ao Curso


de Engenharia Civil da Escola Politécnica,
Universidade Federal do Rio de Janeiro,
como parte dos requisitos necessários à
obtenção do título de Engenheiro.

Orientador: Prof. Leonardo De Bona Becker

Rio de Janeiro
Outubro de 2022
iii

COMPARAÇÃO ENTRE ANÁLISES DE ESTABILIDADE DE UMA BARRAGEM


DE REJEITOS POR ELEMENTOS FINITOS E EQUILÍBRIO LIMITE

Ryan Oliveira da Cunha

PROJETO DE GRADUAÇÃO SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DO CURSO DE


ENGENHARIA CIVIL DA ESCOLA POLITÉCNICA DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS
NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE ENGENHEIRO CIVIL.

Examinado por:

Prof. Leonardo De Bona Becker, D. Sc.

Prof.ª Maria do Carmo Reis Cavalcanti, D. Sc.

Prof. Wagner Nahas Ribeiro, D. Sc.

RIO DE JANEIRO, RJ – BRASIL


OUTUBRO DE 2022
iv

Cunha, Ryan Oliveira da

Comparação entre Análises de Estabilidade de uma


Barragem de Rejeitos por Elementos Finitos e Equilíbrio
Limite/ Ryan Oliveira da Cunha – Rio de Janeiro:
UFRJ/Escola Politécnica, 2022.
xii, 53p.: il.; 29,7 cm.
Orientador: Leonardo De Bona Becker
Projeto de Graduação – UFRJ/ Escola Politécnica/ Curso de
Engenharia Civil, 2022.
Referências Bibliográficas: p. 64-67.
1. Introdução 2. Revisão Bibliográfica 3. Análises
numéricas 4. Resultados 5. Conclusões e Sugestões
I. Leonardo De Bona Becker. II. Universidade Federal do
Rio de Janeiro, Escola Politécnica, Curso de Engenharia Civil.
III. Comparação entre Análises de Estabilidade de uma
Barragem de Rejeitos por Elementos Finitos e Equilíbrio
Limite.
v

DEDICATÓRIA

Ao meu pai, Jurandir da Cunha (in memoriam).


À minha mãe, Cilene Oliveira.
vi

AGRADECIMENTOS

À minha mãe, Cilene Oliveira, a mulher mais resiliente que já conheci, por todo
amor incondicional, nos bons e nos dias ruins, por sempre ter acreditado em mim.
Ao meu pai, Jurandir da Cunha, o homem mais forte que eu tive o prazer de
conhecer, a pessoa que me mostrou de forma prática o real sentido da palavra amor.
Aos meus sobrinhos, Ester, Filipe e Pietro, por alegrarem a minha vida com as
suas presenças nos últimos anos.
Ao Black e à Belinha, animais de estimação da minha mãe e, que com o tempo,
também se tornaram meus, obrigado por tornarem o meu dia melhor.
Aos amigos que a UFRJ me deu, em especial Jônatas, Laylan e Marcos, por
estarem comigo desde o início, nas alegrias e dificuldades dessa caminhada, e por fazerem
dela menos difícil.
Aos meus professores e professoras, em especial ao corpo docente da
Geotecnia/UFRJ, pela maestria em lecionar e por despertarem em mim a paixão pela área.
Ao meu orientador, Leonardo Becker, pelas oportunidades que tive durante a
graduação, por toda a paciência, pelas aulas incríveis, também pela orientação acadêmica
em si, por sempre estar disposto a ajudar, sou eternamente grato.
À UFRJ, pelo ensino público e de qualidade.
Aos que vieram antes de mim e me permitiram chegar até aqui.
vii

Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/ UFRJ como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do grau de Engenheiro Civil.

COMPARAÇÃO ENTRE ANÁLISES DE ESTABILIDADE DE UMA BARRAGEM


DE REJEITOS POR ELEMENTOS FINITOS E EQUILÍBRIO LIMITE

Ryan Oliveira da Cunha

Outubro de 2022

Orientador: Leonardo De Bona Becker

As barragens de rejeito são estruturas comumente utilizadas para o represamento do


material resultante do processo de mineração, estando sujeitas à instabilidade em
decorrência de diversos fenômenos. Na análise de estabilidade dos taludes é comum
utilizar métodos com base no equilíbrio limite, todavia, é preciso cuidado em situações
em que há mecanismos de falha complexos ou ruptura progressiva. O presente trabalho
tem como objetivo comparar análises tensão-deformação por elementos finitos com
análises por equilíbrio limite. Para isso, foi analisada uma barragem de rejeito de minério
hipotética alteada à montante com inclinação 1V:3H e praia de rejeitos com 150m de
largura. O fator de segurança e a superfície crítica determinados por equilíbrio limite
(MORGENSTERN & PRICE, 1965) foram comparados com os resultados da redução
dos parâmetros de resistência no método dos elementos finitos (GRIFFITHS & LANE,
1999). O fator de segurança e a geometria da superfície crítica do método do equilíbrio
limite apresentaram boa concordância com os resultados do método dos elementos finitos.
As tensões normais efetivas e cisalhantes determinadas através dos dois métodos também
apresentaram concordância.

Palavras-chave: Barragem de Rejeitos, Estabilidade de Taludes, Equilíbrio Limite,


Redução da Resistência ao Cisalhamento.
viii

Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment of the


requirements for the degree of Engineer.

COMPARISON BETWEEN STABILITY ANALYSES OF A TAILINGS DAM BY


FINITE ELEMENTS AND LIMIT EQUILIBRIUM METHODS

Ryan Oliveira da Cunha

October 2022

Advisor: Leonardo De Bona Becker

Tailings dams are structures commonly used for storing the tailings resulting from the
mining process and may be subject to instability due to various phenomena. In a slope
stability analysis, it is common to use limit equilibrium methods. However, care must be
taken in situations in which complex failure mechanisms or progressive failure may take
place. This work compares finite element stress-strain analysis with limit equilibrium
analysis. A hypothetical upstream tailings dam with a 1V:3H slope and a 150m wide
tailings beach was analyzed. The factor of safety and critical slip surface determined by
limit equilibrium (MORGENSTERN & PRICE, 1965) were compared with the results of
strength reduction in the finite element method (GRIFFITHS & LANE, 1999). The factor
of safety and the shape of the critical slip surface of the limit equilibrium method are in
good agreement with the results of the finite element method. The effective normal and
shear stresses computed by both methods agree well.

Keywords: Tailings Dam, Slope Stability, Limit Equilibrium, Shear Strength Reduction.
ix

SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 13
1.1 CONTEXTO E MOTIVAÇÃO............................................................................... 13
1.2 OBJETIVOS DO TRABALHO .............................................................................. 15
1.3 METODOLOGIA DO TRABALHO ...................................................................... 16
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................... 17
2.1 REJEITOS DE MINÉRIO E MÉTODO DO ATERRO HIDRÁULICO ............... 17
2.2 MÉTODOS DE ALTEAMENTO DE BARRAGENS DE REJEITO .................... 19
2.3 MÉTODOS DE EQUILÍBRIO LIMITE ................................................................. 21
2.3.1 Método das fatias .......................................................................................... 26
2.3.2 Método de Morgenstern & Price (1965) ..................................................... 30
2.4 MÉTODO DOS ELEMENTOS FINITOS .............................................................. 38
2.4.1 Modelagem Numérica e Estudos de Tensão-Deformação......................... 40
2.4.2 Elasticidade ................................................................................................... 41
2.4.3 Plasticidade ................................................................................................... 43
2.4.4 Modelos constitutivos ................................................................................... 43
2.4.5 Fator de Redução dos Parâmetros de Resistência ao Cisalhamento ....... 45
2.5 DEFINIÇÃO DE PARÂMETROS GEOTÉCNICOS ............................................ 47
2.5.1 Dique de partida e alteamentos ................................................................... 48
2.5.2 Rejeito arenoso .............................................................................................. 48
2.5.3 Rejeito plástico .............................................................................................. 49
3 ANÁLISES NUMÉRICAS ...................................................................................... 51
3.1 CASO 1 ................................................................................................................... 53
3.2 CASO 2 ................................................................................................................... 57
4 RESULTADOS ........................................................................................................ 60
5 CONCLUSÕES E SUGESTÕES ........................................................................... 64
5.1 CONCLUSÕES ....................................................................................................... 64
5.2 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS .................................................. 65
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 66
x

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1.1 - PARTICIPAÇÕES POR SUBSTÂNCIAS NAS EXPORTAÇÕES DE MINÉRIO (IBRAM, 2022) ................................. 14
FIGURA 1.2 - MALHA DE ANÁLISE POR ELEMENTOS FINITOS DA ÚLTIMA ETAPA DE ALTEAMENTO...................................... 16
FIGURA 2.1 - SISTEMA DE CANHÕES UNIFORMEMENTE DISPOSTOS (ADAPTADO DE RIBEIRO, 2000) .............................. 18
FIGURA 2.2 - SISTEMA DE CANHÕES DISPOSTOS ISOLADAMENTE (ADAPTADO DE RIBEIRO, 2000).................................. 18
FIGURA 2.3 - MÉTODO DE ALTEAMENTO À MONTANTE (IBRAM, 2016) ................................................................... 19
FIGURA 2.4 - MÉTODO DE ALTEAMENTO À JUSANTE (IBRAM, 2016) ....................................................................... 20
FIGURA 2.5 - MÉTODO DE ALTEAMENTO POR LINHA DE CENTRO (IBRAM, 2016) ....................................................... 21
FIGURA 2.6 - EQUILÍBRIO ENTRE TENSÕES CISALHANTES INSTABILIZANTES E MOBILIZADAS (BECKER, 2016) ..................... 23
FIGURA 2.7 - FATOR DE SEGURANÇA EM FUNÇÃO DO NÍVEL DE SEGURANÇA (ABNT, NBR 11682)................................. 24
FIGURA 2.8 - FATORES DE SEGURANÇA MÍNIMO PARA BARRAGENS DE MINERAÇÃO (ABNT, NBR 13028) ....................... 25
FIGURA 2.9 - COMPORTAMENTO RÍGIDO-PERFEITAMENTE PLÁSTICO (BECKER, 2016) ................................................ 26
FIGURA 2.10 - ESQUEMA REPRESENTATIVO DO MÉTODO DE FATIAS (ADAPTADO DE GEO-RIO, 2014) ............................ 27
FIGURA 2.11 - ANÁLISE DE FORÇAS NUMA FATIA GENÉRICA “I” (BECKER, 2016) ....................................................... 28
FIGURA 2.12 - ANÁLISE DE MASSA DE SOLO POTENCIALMENTE INSTÁVEL (ADAPTADO DE MORGENSTERN & PRICE, 1965)
.......................................................................................................................................................... 31
FIGURA 2.13 - FORÇAS ATUANTES NUMA FATIA DE COMPRIMENTO INFINITESIMAL (ADAPTADO DE MORGENSTERN &
PRICE, 1965) ...................................................................................................................................... 32
FIGURA 2.14 - ELEMENTO INFINITESIMAL NA INTERFACE ENTRE DUAS FATIAS (ADAPTADO DE MORGENSTERN & PRICE,
1965) ................................................................................................................................................. 36
FIGURA 2.15 - TENSÕES NORMAIS E CISALHANTES EFETIVAS AGINDO NO ELEMENTO INFINITESIMAL (MORGENSTERN &
PRICE, 1965) ...................................................................................................................................... 37
FIGURA 2.16 - TRIÂNGULO DE BURLAND (ADAPTADO DE BURLAND, 1987) ............................................................. 41
FIGURA 2.17 - MODELO CONSTITUTIVO LINEAR ELÁSTICO-PERFEITAMENTE PLÁSTICO.................................................... 44
FIGURA 3.1 - LINHA PIEZOMÉTRICA DA ÚLTIMA ETAPA DE ALTEAMENTO PARA MEF ..................................................... 52
FIGURA 3.2 - FASE 1 DE ANÁLISE POR MEF, CONSTRUÇÃO DO DP E DEPOSIÇÃO DE RP (DRENADO) ................................ 53
FIGURA 3.3 - FASE 2 DE ANÁLISE POR MEF, DEPOSIÇÃO DE RA E RP (DRENADOS) ....................................................... 54
FIGURA 3.4 - FASE 3 DE ANÁLISE POR MEF, 1º ALTEAMENTO, DEPOSIÇÃO DE RA E RP (DRENADOS) ............................... 54
FIGURA 3.5 - FASE 4 DE ANÁLISE POR MEF, 2º ALTEAMENTO, DEPOSIÇÃO DE RA E RP (DRENADOS) ............................... 54
FIGURA 3.6 - FASE 5 DE ANÁLISE POR MEF, 3º ALTEAMENTO, DEPOSIÇÃO DE RA E RP (DRENADOS) ............................... 54
FIGURA 3.7 - FASE 6 DE ANÁLISE POR MEF, 4º ALTEAMENTO, DEPOSIÇÃO DE RA E RP (DRENADOS) ............................... 55
FIGURA 3.8 - FASE 7 DE ANÁLISE POR MEF, 5º ALTEAMENTO, DEPOSIÇÃO DE RA E RP (DRENADOS) ............................... 55
FIGURA 3.9 - FASE 8 DE ANÁLISE POR MEF, 6º ALTEAMENTO, DEPOSIÇÃO DE RA E RP (DRENADOS) ............................... 55
FIGURA 3.10 - FASE 9 DE ANÁLISE POR MEF, REDUÇÃO DOS PARÂMETROS, DEPOSIÇÃO DE RA E RP (DRENADOS) ............. 55
FIGURA 3.11 - DETALHE DAS PARTIÇÕES DA CAMADA DE REJEITO PLÁSTICO EM CONDIÇÃO DRENADA NA FASE SSR ............. 56
FIGURA 3.12 - ANÁLISE POR MEL UTILIZANDO A FASE 9 DA ANÁLISE PELO MEF COM RA E RP DRENADOS ....................... 57
xi

FIGURA 3.13 - FASE 9 DE ANÁLISE POR MEF, REDUÇÃO DOS PARÂMETROS, DEPOSIÇÃO DE RA (DRENADO) E RP (NÃO
DRENADO) ............................................................................................................................................ 58

FIGURA 3.14 - DETALHE DAS PARTIÇÕES DA CAMADA DE REJEITO PLÁSTICO EM CONDIÇÃO NÃO DRENADA NA FASE SSR ...... 58
FIGURA 3.15 - ANÁLISE POR MEL UTILIZANDO A FASE 9 DA ANÁLISE PELO MEF COM RA DRENADO E RP NÃO DRENADO.... 59
FIGURA 4.1 - TENSÕES VERTICAIS EFETIVAS AO FINAL DO ÚLTIMO ALTEAMENTO CONSIDERANDO COMPORTAMENTO DRENADO
.......................................................................................................................................................... 60
FIGURA 4.2 - MALHA DEFORMADA EM CONDIÇÃO DRENADA APÓS SSR ..................................................................... 60
FIGURA 4.3 - MALHA DEFORMADA EM NÃO CONDIÇÃO DRENADA (PARA O REJEITO PLÁSTICO) APÓS SSR ......................... 61
FIGURA 4.4 - SUPERFÍCIE CRÍTICA DO MEL SUPERPOSTA AO CAMPO DE DESLOCAMENTOS TOTAIS DA SSR PELO MEF PARA O
CASO DE CARREGAMENTO DRENADO .......................................................................................................... 61

FIGURA 4.5 - SUPERFÍCIE CRÍTICA DO MEL SUPERPOSTA AO CAMPO DE DESLOCAMENTOS TOTAIS DA SSR PELO MEF PARA O
CASO DE CARREGAMENTO NÃO DRENADO (PARA O REJEITO PLÁSTICO) .............................................................. 61

FIGURA 4.6 - TENSÕES NORMAIS EFETIVAS E CISALHANTES QUE ATUAM AO LONGO DA SUPERFÍCIE CRÍTICA DO MEL, PELO
PRÓPRIO MEL E PELO MEF – CARREGAMENTO DRENADO.............................................................................. 62

FIGURA 4.7 - TENSÕES NORMAIS EFETIVAS E CISALHANTES QUE ATUAM AO LONGO DA SUPERFÍCIE CRÍTICA DO MEL, PELO
PRÓPRIO MEL E PELO MEF – CARREGAMENTO NÃO DRENADO NO REJEITO PLÁSTICO .......................................... 63
xii

LISTA DE TABELAS

TABELA 2.1 - DADOS PARA ANÁLISE COM MODELO LINEAR ELÁSTICO-PERFEITAMENTE PLÁSTICO. .................................... 45
TABELA 2.2 - PARÂMETROS GEOTÉCNICOS PARA OS REJEITOS ................................................................................... 50
TABELA 3.1 - RESUMO DAS FASES DE SIMULAÇÃO NO MEF ..................................................................................... 53
TABELA 3.2 - MATERIAIS DE COMPORTAMENTO DRENADO UTILIZADOS NA ANÁLISE POR MEF COM RESPECTIVAS CORES ..... 56
TABELA 3.3 - MATERIAIS DE COMPORTAMENTO DRENADO UTILIZADOS NA ANÁLISE POR MEL COM RESPECTIVAS CORES...... 57
TABELA 3.4 - MATERIAIS DE COMPORTAMENTO NÃO DRENADO UTILIZADOS NA ANÁLISE POR MEF COM RESPECTIVAS CORES
.......................................................................................................................................................... 59
TABELA 3.5 - MATERIAIS DE COMPORTAMENTO DRENADO E NÃO DRENADO UTILIZADOS NA ANÁLISE POR MEL COM
RESPECTIVAS CORES ................................................................................................................................ 59

TABELA 4.1 - FS E SRF PARA AS ANÁLISES DRENADA E NÃO DRENADA ........................................................................ 62


13

1 INTRODUÇÃO

1.1 CONTEXTO E MOTIVAÇÃO

A atividade mineradora tem como principal objetivo extrair minérios da natureza tirando
assim proveito do valor econômico agregado a esse recurso natural. A exploração de minério
pode ser realizada a partir de um depósito mineral, sendo esse último, segundo ARAÚJO
(2006), um volume rochoso no qual substâncias minerais estão concentradas de modo anômalo
quando comparadas com sua distribuição média na crosta terrestre.
Na etapa anterior ao beneficiamento do minério, os solos e rochas sem valor econômico
e presença de minério, passam por processo de lavra onde são separados do mineral bruto, esse
último com valor econômico agregado. O mineral bruto, por sua vez, é beneficiado ao ser
purificado ou enriquecido. Esse procedimento divide o mineral bruto em duas partes:
concentrado e rejeito.
É comum que o processo de beneficiamento de muitos minérios gere grandes volumes
de rejeitos em decorrência da pequena quantidade de minério encontrado no mineral bruto. Em
nível nacional, o setor de mineração representa uma importante atividade econômica para o
país. De acordo com o Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM, 2022), a Produção Mineral
Brasileira (PMB) ainda no primeiro trimestre de 2022 alcançou o patamar de 200 milhões de
toneladas de minério. No quarto trimestre de 2021 o faturamento no setor mineral correspondeu
a R$ 81,5 bilhões, já no primeiro trimestre desse mesmo ano o lucro em exportações totais foi
de US$ 12,1 bilhões. Diversos foram os tipos de minério exportados pelo Brasil no início do
ano de 2022, o minério de ferro se destaca como sendo o mais exportado até o primeiro trimestre
de 2022, de acordo com a Figura 1.1.
14

Figura 1.1 - Participações por substâncias nas exportações de minério (IBRAM, 2022)

A grande quantidade de rejeitos provenientes do processo de mineração precisa de uma


disposição final, geralmente feita a partir das barragens de rejeito. Segundo a NBR 13028
(ABNT, 2017), as barragens para disposição de rejeito são estruturas que têm por finalidade
reter, de forma planejada, projetada e controlada, volumes de rejeitos advindos do processo de
beneficiamento de minério. Na última década, o Brasil presenciou dois grandes desastres
envolvendo a ruptura dessas estruturas. O primeiro aconteceu em 2015 na barragem de Fundão,
em Mariana (MG) e, o segundo, no ano de 2019 na barragem I da Mina Córrego do Feijão, em
Brumadinho (MG).
Estes eventos ressaltam a importância das análises de estabilidade de barragens de
rejeitos, em geral, feita com base no método do equilíbrio limite (MEL). Recentemente, o uso
do método dos elementos finitos (MEF) tem se tornado mais comum devido à disponibilidade
de diversos programas comerciais. Na prática da engenharia geotécnica, a utilização de métodos
com a abordagem de elementos finitos pode ser desnecessária se o problema analisado possuir
baixa complexibilidade ou se o conhecimento das deformações não for essencial. Em
contrapartida, em situações nas quais seja necessário conhecer as deformações, ou quando a
estrutura analisada possui geometria complexa e variedades de materiais, como no caso das
barragens de rejeito, a utilização desse método pode ser importante. Em alguns casos,
entretanto, a quantidade e qualidade de dados geotécnicos de propriedades do solo é tão baixa
na região estudada que não faz sentido a utilização de um método de maior complexidade. O
desafio para um engenheiro experiente é saber que tipo de problema se beneficiaria de um
15

tratamento a partir do método dos elementos finitos e quais não se beneficiariam (GRIFFITHS
& LANE, 1999).
Neste trabalho, foram realizadas análises de tensão-deformação pelo MEF de uma
barragem de rejeito de minério alteada à montante. Os resultados de redução de parâmetros de
resistência (Shear Strength Reduction, ou SSR, GRIFFITHS & LANE, 1999) foram
comparados com fator de segurança e superfície crítica de análises realizadas a partir do MEL
(MORGENSTERN & PRICE, 1965).

1.2 OBJETIVOS DO TRABALHO

O presente trabalho tem como objetivo comparar análises tensão-deformação por


elementos finitos com análises por equilíbrio limite de uma barragem de rejeito alteada à
montante. Será verificada a influência de uma camada de rejeito plástico com espessura
reduzida, na base do reservatório, quando submetido a um carregamento drenado e, por outro
lado, quando submetido a um carregamento não drenado, ambos gerados na última etapa
construtiva. Na Figura 1.2 é apresentado um esquema da seção analisada pelo MEF no software
RS2.
Geralmente os solos têm tendência a sofrer variações de volume durante a aplicação de
carregamentos ou descarregamentos, devido ao rearranjo das partículas. Quando os solos estão
saturados, estas variações de volume implicam entrada ou saída de água dos poros, pois os
sólidos e a água são muitíssimos menos compressíveis que o próprio solo. Entende-se por
comportamento drenado aquele em que a água tem tempo de fluir para dentro ou para fora dos
poros durante a aplicação do carregamento ou descarregamento, sem que haja alteração nas
poropressões. Ao contrário, comportamento não drenado é aquele que se caracteriza pela
variação das poropressões quando o solo é submetido a carregamento ou descarregamento. Essa
variação ocorre quando a velocidade de carregamento ou descarregamento é maior que a
velocidade com que a água pode sair ou entrar no solo.
16

Figura 1.2 - Malha de análise por elementos finitos da última etapa de alteamento

Vale ressaltar que o método de alteamento a montante foi proibido em território nacional
no ano de 2019 através da Resolução 4/2019 da Agência Nacional de Mineração (BRASIL,
2019). Todavia, esse sistema de alteamento ainda é utilizado em outros países, e no Brasil ainda
existem estruturas construídas a partir dessa metodologia, de forma que a análise de estabilidade
para esse tipo de barragem se mantém relevante.

1.3 METODOLOGIA DO TRABALHO

O trabalho foi desenvolvido a partir de 3 principais etapas, a saber:

Inicialmente, foi realizada a concepção da seção típica de barragem de rejeito utilizada.


Para isso, uma revisão bibliográfica inicial sobre o assunto foi desenvolvida visando conceber
um perfil que represente a análise desejada.
Posteriormente, foi feita uma revisão da literatura sobre parâmetros geotécnicos de
rejeitos de minério de ferro brasileiro para estabelecer quais os dados disponíveis seriam
representativos para as análises realizadas.
E, por fim, foram realizadas análises com foco na redução dos parâmetros de resistência
a partir do MEF (RS2) e análises baseadas no MEL (Slide2) verificando a influência da camada
de rejeito plástico na base.
17

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 REJEITOS DE MINÉRIO E MÉTODO DO ATERRO HIDRÁULICO

O rejeito é um material composto por parte sólida e líquida sendo gerado a partir do
processo de beneficiamento do minério. Esse procedimento, por sua vez, tem como objetivo
retirar do minério elementos de valor econômico agregado. Vale dizer que o rejeito apresenta
características que dependem do minério bruto e do processo industrial utilizado no
beneficiamento. Por conta disso, os rejeitos podem variar de grossos a finos. De acordo com
ARAÚJO (2006), o primeiro é em geral classificado como rejeito arenoso sendo constituído de
partículas de granulometria típica de areias finas a médias, não plásticas, de alta permeabilidade
e resistência ao cisalhamento e de baixa compressibilidade, enquanto o segundo constitui-se de
partículas de granulometria de siltes e argilas, possui difícil sedimentação, alta
compressibilidade e baixa plasticidade (por exemplo, no caso de rejeitos de minério de ferro,
MORGENSTERN et al., 2016 e ROBERTSON et al., 2019 reportaram IP= 5% a 20%).
No Brasil, é comum se adotar o método do aterro hidráulico para a disposição de rejeitos
em barragens. O procedimento consiste no bombeamento do rejeito em forma de polpa a partir
de tubulações responsáveis pela realização do transporte do material. RUSSO (2007) relata que
o método apresenta grande aplicabilidade para a concepção de projetos de barragens de rejeitos
de minério de ferro, já que é econômico e capaz de transportar e depositar diariamente rejeitos
de forma segura em grandes volumes.
Ao sair da planta de beneficiamento, o rejeito bruto pode sofrer separação em duas
parcelas, já que é constituído por parte granular e fina. Para isso, pode-se utilizar do processo
de ciclonagem realizado com o auxílio de hidrociclones.
Os hidrociclones funcionam utilizando o princípio da força centrífuga separando o
rejeito em duas parcelas fazendo com que as partículas de maior massa tenham movimento
descendente enquanto as de menor massa tenham movimento ascendente. A primeira parcela é
denominada de “underflow”, enquanto a segunda de “overflow”. Para RUSSO (2007), na
disposição final após o processo de ciclonagem, a parcela “overflow” deve ser direcionada para
um reservatório convencional já que apresenta elevada concentração de água e características
geotécnicas desfavoráveis do ponto de vista de estabilidade, adensamento e permeabilidade,
enquanto a parcela “underflow” pode ser utilizada como material de construção da barragem,
uma vez que apresenta água em menor quantidade e melhores características geotécnicas em
relação à parcela de granulometria fina.
18

O lançamento do rejeito na estrutura na etapa final de deposição pode ser feito de


diversas maneiras, por exemplo, utilizando um sistema de canhões uniformemente dispostos
como visto na Figura 2.1 ou por canhões isolados, como na Figura 2.2. De acordo com RUSSO
(2007), a primeira maneira de deposição tem como vantagem o lançamento simultâneo do
rejeito sobre a barragem, enquanto a segunda, possui apenas um ponto de deposição fazendo
com que o sistema seja realocado constantemente para que a condição final de deposição obtida
seja semelhante à da primeira maneira.

Figura 2.1 - Sistema de canhões uniformemente dispostos (adaptado de RIBEIRO, 2000)

Figura 2.2 - Sistema de canhões dispostos isoladamente (adaptado de RIBEIRO, 2000)


19

2.2 MÉTODOS DE ALTEAMENTO DE BARRAGENS DE REJEITO

No âmbito da engenharia geotécnica, destacam-se três metodologias construtivas de


barragens de rejeito, a saber: método de montante, método de jusante e método de linha de
centro.

(i) Método de montante

Segundo ARAÚJO (2006), a metodologia de construção de barragens por alteamento a


montante é a mais antiga, simples e econômica existente. A etapa inicial de execução desse tipo
de estrutura consiste na construção de um dique de partida, normalmente de material argiloso
ou enrocamento compactado. Finalizada essa etapa, o rejeito pode ser lançado por canhões em
direção a linha de simetria do dique, formando assim a praia de deposição, que se tornará a
fundação e eventualmente fornecerá material de construção para o próximo alteamento. O
processo é repetido até que a cota final prevista em projeto seja atingida, Figura 2.3.

Figura 2.3 - Método de alteamento à montante (IBRAM, 2016)

De acordo com o IBRAM (2016), as vantagens econômicas do método de alteamento a


montante estão associadas a redução do custo de implantação e também da distribuição do custo
de construção e operação ao longo do tempo.
Em contrapartida às vantagens econômicas, essa metodologia apresenta baixo controle
construtivo o que a torna crítica principalmente em relação à segurança quanto a estabilidade.
Isso acontece pelo fato de os alteamentos serem executados sobre materiais previamente
depositados e não consolidados. Em situações em que o material contido na estrutura se
apresenta em estado de compacidade fofo e sob condições saturadas, o rejeito tende a apresentar
baixa resistência ao cisalhamento e suscetibilidade à liquefação por carregamentos dinâmicos
e estáticos (ARAÚJO, 2006).
20

(ii) Método de jusante

Semelhante ao método de alteamento a montante, o método de alteamento a jusante tem


como etapa inicial a construção de um dique de partida geralmente formado por solo ou
enrocamento compactado. Os alteamentos posteriores, de acordo com a Figura 2.4, são
realizados a jusante do dique de partida até que a cota de projeto seja atingida.
Destaca-se positivamente em relação ao método de alteamento a montante pois permite
o controle do lançamento e compactação do material que compõe a estrutura (KLOHN, 1981
apud ARAÚJO, 2006). É importante ressaltar que os alteamentos subsequentes não são
construídos sobre o rejeito depositado e sim sobre os alteamentos anteriores. Outra observação
a se fazer diz respeito ao sistema de drenagem interna que pode ser instalado durante a execução
da estrutura, aumentando a estabilidade uma vez que se permite o controle da linha de saturação.

Figura 2.4 - Método de alteamento à jusante (IBRAM, 2016)

(iii) Método de linha de centro

É, de certa forma, uma solução intermediária às apresentadas anteriormente. Apesar


disso, de acordo com ASSIS & ESPÓSITO (1995), o comportamento geotécnico da estrutura
se assemelha às barragens de rejeito alteadas à jusante, sendo o alteamento da crista realizado
de forma vertical, com eixo vertical dos alteamentos coincidente com o eixo do dique de partida
conforme apresentado na Figura 2.5.
21

Figura 2.5 - Método de alteamento por linha de centro (IBRAM, 2016)

2.3 MÉTODOS DE EQUILÍBRIO LIMITE

Existem diversos métodos disponíveis na literatura para a realização de análises de


estabilidade de taludes por equilíbrio limite. Neste trabalho será revisado somente o método de
MORGENSTERN & PRICE (1965) que será empregado nas análises.
De acordo com MASSAD (2010), os métodos para análise de estabilidade de taludes
atualmente em uso, baseiam-se na hipótese de haver equilíbrio numa massa de solo, tomada
como corpo rígido-perfeitamente plástico, na iminência de entrar em um processo de
escorregamento. Daí a denominação de “métodos de equilíbrio limite”.
Conhecendo as forças instabilizantes, ou seja, aquelas que atuam na massa de solo
devido peso próprio, sobrecarga, etc, é possível determinar as tensões de cisalhamento
induzidas utilizando para isso as equações de equilíbrio. Compara-se então essas tensões com
a resistência ao cisalhamento do solo.

Os métodos de equilíbrio limite partem das seguintes hipóteses:

1. Superfície potencial de ruptura (SPR) arbitrada


2. Equilíbrio de forças (e/ou momentos, tensões) resistentes x instabilizantes ao longo
da superfície arbitrada.
3. Fator de Segurança (FS) definido em função da resistência ao cisalhamento
4. Comportamento rígido-perfeitamente plástico
5. Fator de Segurança (FS) “constante” ao longo da superfície arbitrada
22

1. Superfície potencial de ruptura (SPR) arbitrada

Esse tipo de problema é iniciado arbitrando-se uma superfície potencial de ruptura


(SPR), do tipo correto, adequada para o problema. Entende-se como superfície correta e
adequada aquela que representa da forma mais fiel possível a geometria da superfície de ruptura
típica para a configuração geológica-geotécnica do perfil analisado. A superfície potencial de
ruptura que leva ao menor fator de segurança é denominada superfície crítica. Após repetir o
procedimento para tipos e quantidades adequados de SPR, assume-se que o menor FS calculado
é o FScrítico e que a SPR correspondente é a superfície crítica.
Vale ressaltar que a suposição inicial do tipo de SPR é extremamente importante na
análise de estabilidade, visto que, em alguns casos, um erro de premissa pode levar a
informações que não representam a realidade, podendo a análise ser contra a segurança.
Exemplo: análises feitas considerando uma SPR planar quando na verdade a superfície real é
circular ou utilizar um método desenvolvido para superfícies circulares em superfícies planares.

2. Equilíbrio de forças (e/ou momentos, tensões) resistentes x instabilizantes ao longo da


superfície arbitrada.

O método do equilíbrio limite pressupõe que a massa de solo potencialmente instável


está na iminência da ruptura e que deve haver equilíbrio entre as tensões resistentes e as tensões
instabilizantes ao longo de cada SPR. É importante dizer que para que haja o equilíbrio a tensão
resistente não precisa estar mobilizada em sua totalidade, na verdade, o ideal é que numa
situação de equilíbrio estável as tensões mobilizadas sejam menores que as disponíveis (Figura
2.6).
23

Figura 2.6 - Equilíbrio entre tensões cisalhantes instabilizantes e mobilizadas (BECKER, 2016)

3. Fator de Segurança (FS) definido em função da resistência ao cisalhamento.

Na análise de estabilidade de taludes o fator de segurança é definido de forma diferente


do que é feito, por exemplo, em análises de fundações rasas, nas quais o FS é definido em
função do carregamento, sendo uma razão entre a carga última e a carga de trabalho (LOPES,
VELLOSO, 2010). Já nas análises de estabilidade de taludes, o fator de segurança é definido
em função da resistência ao cisalhamento.
Em taludes estáveis, a resistência disponível do solo é maior que a tensão cisalhante
instabilizante (devida ao peso e aos carregamentos). Entretanto, somente uma parcela desta
resistência é mobilizada para garantir o equilíbrio (caso contrário o sistema estaria
desequilibrado). O FS é o número pelo qual divide-se a resistência do solo para que haja
equilíbrio (Eq. 2.1, Eq. 2.2 e Eq. 2.3). De uma forma geral, quanto maior o fator de segurança,
menor a magnitude da parcela da resistência que precisa ser mobiliza para assegurar o equilíbrio
limite:

τmob = τinst Eq. 2.1


τff
= τinst Eq. 2.2
FS
c ′ σ′ff ∙ tanϕ′
+ = τinst Eq. 2.3
FS FS
24

sendo:
τmob = parcela mobilizada da resistência ao cisalhamento
τinst = tensão cisalhante instabilizante que atua na superfície potencial de ruptura, devido ao
peso do solo, sobrecarga, etc.
τff = tensão cisalhante que atua no plano de ruptura, no momento da ruptura (resistência ao
cisalhamento na SPR)
σ′ff = tensão normal efetiva que atua na SPR
c ′ , ϕ′ = parâmetros de resistência do solo em tensões efetivas.

A resistência mobilizada é igual a resistência disponível dividida pelo FS. Em situações


de iminência de ruptura, a resistência mobilizada é igual à disponível, ou seja, FS=1. Em casos
nos quais o FS>1 tem-se uma situação “estável”. Na prática, devido ao nível de acurácia dos
métodos de análise e às incertezas na determinação dos parâmetros de resistência, assume-se
“ruptura provável” para FS≤1,1.
No Brasil, a NBR 11682 (ABNT, 2009) recomenda a utilização de fatores de segurança
admissíveis com o objetivo de cobrir as incertezas naturais das diversas etapas de projeto e
construção. O valor do FS é dado em função do nível de segurança que se pretende alcançar
contra perda de vidas humanas e de danos materiais e ambientais (Figura 2.7). O FS admitido
por norma é chamado de FS admissível.

Figura 2.7 - Fator de segurança em função do nível de segurança (ABNT, NBR 11682)
25

Na Figura 2.8 é apresentada a tabela fornecida pela NBR 13028 (ABNT, 2017) na qual
são recomendados fatores de segurança mínimos que devem ser adotados para barragens de
mineração, “independentemente do tipo de análise e condição de carregamento”.
Vale ressaltar que o artigo 6º da Resolução 4/2019 da Agência Nacional de Mineração
(ANM), veda a fixação de um fator de segurança inferior a 1,3 para as análises de estabilidade
e estudos e susceptibilidade à liquefação, considerando parâmetros de resistência não drenada.

Figura 2.8 - Fatores de segurança mínimo para barragens de mineração (ABNT, NBR 13028)

4. Comportamento rígido-perfeitamente plástico

O método do equilíbrio limite baseia-se no modelo constitutivo rígido-perfeitamente


plástico, caracterizado pelo aumento de tensões sem que haja aumento de deformações até a
tensão de ruptura (Figura 2.9). O solo pode suportar todos os estados de tensões abaixo do
estado de ruptura e as deformações são desprezadas. No momento em que todos os elementos
ao longo da SPR atingissem a resistência, a deformação passaria de zero para infinito (colapso
súbito associado a deformações irrecuperáveis). Por isto, o MEL não pode ser utilizado para
calcular deformações e deslocamentos.
26

Figura 2.9 - Comportamento rígido-perfeitamente plástico (BECKER, 2016)

5. FS “constante” ao longo da superfície arbitrada

A mobilização da resistência ao cisalhamento ao longo da SPR não é uniforme, apenas


no momento da ruptura. Assume-se que só ocorrerá colapso do talude quando a resistência do
solo for integralmente mobilizada ao longo de todo o comprimento da SPR. Em termos práticos
o FS reflete uma média da mobilização da resistência ao longo da superfície analisa.
Vale ressaltar que podem ser feitas críticas às hipóteses 4 e 5 em situações em que o
solo exibe perda de resistência após pico, ou seja, em situações de ocorrência de ruptura
progressiva.

2.3.1 Método das fatias

Proposto por FELLENIUS (1927), consiste na divisão em n fatias verticais da massa de


solo potencialmente instável (Figura 2.10), o equilíbrio de forças e/ou momentos de cada fatia
ou da massa de solo potencialmente instável é analisado segundo as equações da estática (Eq.
2.4, Eq. 2.5 e Eq. 2.6), sendo o problema estaticamente indeterminado, ou seja, o número de
incógnitas da análise é maior do que o número de equações de equilíbrio. Por conta disso, é
possível realizar diversas abordagens teóricas a partir de hipóteses simplificadoras.

∑ FH = 0 Eq. 2.4

∑ FV = 0 Eq. 2.5

∑ MO = 0 Eq. 2.6
27

Figura 2.10 - Esquema representativo do método de fatias (adaptado de GEO-RIO, 2014)

Na Figura 2.10 analisa-se uma superfície potencial de ruptura arbitrária definida por um
raio R e centro em O, nesse caso, foi dividida em 9 fatias levando em consideração alguns
pontos:
- Realiza-se a divisão de forma que nenhuma fatia tenha o topo bi linear (interseção da fatia 4
e 5 na Figura 2.10).
- Para situações nas quais têm-se mais de um tipo de solo realiza-se a divisão de fatias de forma
que a base de cada uma esteja em contato com apenas um tipo de solo. O mesmo acontece em
situações em que se têm nível d’água, interseção entre fatia 7 e 8 (Figura 2.10).

Para um melhor entendimento da metodologia, analisa-se as forças atuantes numa fatia


genérica “i” (Figura 2.11).
28

Figura 2.11 - Análise de forças numa fatia genérica “i” (BECKER, 2016)

sendo:
Wi = peso da fatia atuando no centro de gravidade
Ei , X i = resultantes das tensões normais efetivas e cisalhantes atuantes na face esquerda
Ei+1 , X i+1 = resultantes das tensões normais efetivas e cisalhantes atuantes na face direita
Ud , Ue = resultantes da poropressão nas faces verticais
Ni′ = resultantes das tensões efetivas à base
Ti = resultantes das tensões cisalhantes mobilizadas na base
Ui = ui ∙ li resultante das poropressões na base, sendo ui a poropressão na base da fatia
xi = largura da fatia
li = comprimento da base da fatia
θi = inclinação da base da fatia em relação a horizontal
ai = braço de alavanca das resultantes das tensões normais à esquerda
ai+1 = braço de alavanca das resultantes das tensões normais à direita

Ni′ , Ui = são colineares (é uma hipótese simplificadora)


bi = metade do comprimento da base da fatia (é uma hipótese simplificadora)
29

Das grandezas apontadas até o agora, algumas são conhecidas, já outras são
desconhecidas:

Grandezas conhecidas pela geometria:


xi , li , Wi , θi

Grandezas conhecidas pela rede de fluxo:


Ud , U e , Ui

Quantidade de variáveis desconhecidas:


ai → n − 1
bi → n
Ei → n − 1
Xi → n − 1
Ni′ → n
FS → 1
Ti → n

A quantidade de variáveis desconhecidas, ou seja, a quantidade de incógnitas são


(somatório das variáveis desconhecidas):

6n − 2
Vale analisar com afinco a resistência ao cisalhamento mobilizada na base da fatia “i” dada
pela Eq. 2.7:

Ti = τmi ∙ li Eq. 2.7

sendo
τmi = a resistência ao cisalhamento mobilizada
li = o comprimento da base da fatia

Sabendo que o valor da resistência mobilizada é a resistência disponível dividida pelo


fator de segurança (Eq. 2.3), chega-se a Eq. 2.8:

c ′ ∙ li + σ′i ∙ tanϕ′ ∙ li c ′ ∙ li + N′ ∙ tanϕ′


Ti = τmi ∙ li = = Eq. 2.8
FS FS
30

É importante ressaltar que, o valor de Ti é dado em função de outras incógnitas e de


dados de entrada já conhecidos, de forma que ele não é uma incógnita propriamente dita.
Portanto, para cada fatia existem 5 incógnitas (ai , bi , Ei , Xi , Ni′ ), exceto para a enésima, que tem
3 incógnitas a menos (ai , Ei , Xi ). FS é uma incógnita igual para todas as fatias. Dessa forma, o
número de incógnitas é 5n − 3 + 1 = 5n − 2.
Vale lembrar que o número de equações de equilíbrio é 3n, já que existem 3 equações
da estática (Eq. 2.4, Eq. 2.5 e Eq. 2.6). Portanto, há 5n − 2 − 3n = 2n − 2 variáveis a mais do
que o número de equações, logo, o sistema é indeterminado. Para resolução do problema de
hiperasticidade faz-se necessário adotar novas hipóteses simplificadoras de forma a reduzir o
número de incógnitas. Ao longo da história, uma variedade de autores tem proposto diferentes
hipóteses e partir disso geraram métodos variados de análise por equilíbrio limite, todos eles
métodos de fatias.
Há dois principais tipos de métodos de fatias, os simplificados e os ditos rigorosos. Os
primeiros atendem somente a duas equações de equilíbrio: equilíbrio de forças ou equilíbrio de
força e momento. Exemplo: FELLENIUS (1936), BISHOP (1955), JANBU (1954); já os
demais atendem ao equilíbrio de forças em duas direções e ao equilíbrio de momentos.
Exemplo: MORGENSTERN & PRICE (1965), SPENCER (1967).
Fellenius introduziu ainda em 1936 o que seria o primeiro método de fatias que ficou
conhecido como o Método Sueco. Posteriormente, surgiram outras abordagens para métodos
de fatias. Para este trabalho não se fará uma explanação detalhada dessas metodologias, apenas
para o método de MORGENSTERN & PRICE (1965), objeto de estudo desse projeto de
graduação.

2.3.2 Método de Morgenstern & Price (1965)

Nesse método são satisfeitas as 3 equações de equilíbrio da estática, a superfície


potencial de ruptura arbitrada pode ser de qualquer formato. MORGENSTERN & PRICE
(1965), realizaram a análise do equilíbrio de uma massa de solo potencialmente instável como
apresentado na Figura 2.12. O desenvolvimento do método aqui mencionado é detalhado:
31

Figura 2.12 - Análise de massa de solo potencialmente instável (adaptado de MORGENSTERN &
PRICE, 1965)

Para essa análise e construção do método de MORGENSTERN & PRICE (1965), as


letras indicadas por setas na Figura 2.12 representam equações de equilíbrio, sendo elas:

y = y(x) → equação da superfície potencial de ruptura


y = z(x) → equação da superfície do talude
y = yt′ (x) → equação da posição da ação dos empuxos horizontais efetivos
y = h(x) → equação da posição da linha de empuxos internos das pressões de água

Por outro lado, as forças agindo numa fatia de comprimento infinitesimal dx na massa
de solo potencialmente instável são apresentadas na Figura 2.13 e descritas logo em seguida:
32

Figura 2.13 - Forças atuantes numa fatia de comprimento infinitesimal (adaptado de


MORGENSTERN & PRICE, 1965)

E ′ = empuxo lateral na face da fatia em tensões efetivas


X = força vertical tangencial na face da fatia
dW = peso da fatia
Pw = resultante das pressões de água na face da fatia
dPb = pressões de água na base da fatia
dN ′ = tensão normal efetiva
dS = força tangencial agindo ao longo da base da fatia
α = inclinação da base em relação a horizontal

A condição para que não haja nenhuma rotação da fatia é satisfeita se a soma dos
momentos em relação ao centro da base da fatia for igual a zero. Fazendo o somatório de
momento em relação ao ponto médio da base da fatia, tem-se:

dy dy
E ′ [(y − yt′ ) − (− )] + Pw [(y − h) − (− )]
2 2
dy dx
− (E ′ + dE ′ ) [y + dy − yt′ − dyt′ + (− )] − X
2 2 Eq. 2.9
dx dy
− (X + dX) − (Pw + dPw ) [(y + dy) − (h + dh) − ] − dPb
2 2
∙g=0
33

Depois de simplificar a Eq. 2.9 e prosseguir no limite tomando dx → 0, pode-se mostrar


facilmente que:
d ′ ′ dE ′ d dPw
X= (E ∙ yt ) − y + (Pw ∙ h) − y Eq. 2.10
dx dx dx dx

O equilíbrio na direção normal à base da fatia é dado por:


dN′ + dPb = dW cos α − dX cos α − dE ′ sin α − dPw sin α Eq. 2.11

O equilíbrio na direção tangencial à base da fatia é dado por:


dS = dE ′ cos α + dPw cos α − dX sin α + dW sin α Eq. 2.12

O critério de ruptura de Mohr-Coulomb pode ser expresso em termos de tensão efetiva


da seguinte forma:
1
dS = [c ′ dx sec α + (dN′ ) tan ϕ′] Eq. 2.13
F

onde:
c ′ = intercepto de coesão efetiva
ϕ′ = ângulo de atrito efetivo
F = fator de segurança

É importante perceber que a equação (Eq. 2.13) representa a definição do fator de


segurança com relação a resistência ao cisalhamento. É o valor pelo qual os parâmetros de
resistência ao cisalhamento são reduzidos de forma a levar a massa de solo analisada ao estado
de equilíbrio limite.
Eliminando dS das equações (Eq. 2.12) e (Eq. 2.13) chega-se à equação (Eq. 2.14) a
seguir:

1 ′
[c dx sec α + (dN′ ) tan ϕ′] = dE ′ cos α + dPw cos α − dX sin α + dW sin α Eq. 2.14
F
34

Elimina-se dN′ das equações (Eq. 2.11) e (Eq. 2.14), dividindo-as por dx cos α
chegando à equação (Eq. 2.15).

c′ tan ϕ′ dW dX dE ′ dPw dPb


sec 2 α + [ − − tan α − tan α − sec α]
F F dx dx dx dx dx
Eq. 2.15
dE ′ dPw dX dW
= + − tan α + tan α
dx dx dx dx

dy
No sistema de coordenadas adotado o valor de tan α = − , de forma que a equação
dx

(Eq. 2.15) se transforma em:

c′ dy 2 tan ϕ′ dW dX dE ′ dy dPw dy dW dy 2
[1 + ( ) ] + { − + + − ru [1 + ( ) ]}
F dx F dx dx dx dx dx dx dx dx
Eq. 2.16
dE ′ dPw dX dy dW dy
= + + −
dx dx dx dx dx dx

onde:

dPb = ru ∙ dW ∙ sec α Eq. 2.17

sendo ru a razão de poropressão definida por BISHOP & MORGENSTERN (1960)

Portanto, as duas equações diferenciais governando o problema são:

d ′ ′ dE ′ d dPw
X = (E ∙ yt ) − y + (Pw ∙ h) − y Eq. 2.18
dx dx dx dx

dE ′ tan ϕ′ dy dX tan ϕ′ dy
[1 − ]+ [ + ]=
dx F dx dx F dx
c′ dy 2 dPw tan ϕ′ dy
[1 + ( ) ] + [ − 1] Eq. 2.19
F dx dx F dx
dW tan ϕ′ dy dy 2 tan ϕ′
+ { + − −ru [1 + ( ) ] }
dx F dx dx F
35

Tratamento da Indeterminação Estática

Se o valor de y é especificado em função de x, tem-se, em geral, um problema


estaticamente indeterminado envolvendo as funções desconhecidas E′, X e yt′ e duas equações
diferenciais globais. A indeterminação decorre do desconhecimento das tensões na massa de
solo. Se as tensões pudessem ser determinadas, os deslocamentos poderiam ser previstos
utilizando uma relação tensão-deformação representativa para o problema. Isso evitaria a
necessidade de fazer análises por equilíbrio limite. É a incapacidade de obter uma análise de
tensão-deformação adequada que justifica a aplicação de métodos de equilíbrio limite. Ao
mesmo tempo, não conhecer as tensões torna necessário realizar simplificações para tornar o
problema estaticamente determinado.
Portanto, há três classes de simplificações que podem ser feitas para a resolução do
problema:
1. A distribuição das tensões normais ao longo da superfície de ruptura pode ser
assumida. A análise do círculo de atrito é um exemplo de método que adota esse
tipo de suposição. Optou-se, então, por eliminar a tensão normal das equações de
equilíbrio e, assim, deixar a indeterminação nas forças internas.
2. Uma suposição pode ser feita em relação à posição da linha de empuxo. Por
exemplo, se

y − yt = a(y − z) Eq. 2.20

A equação de equilíbrio de momento, desprezando os valores de poropressão, torna-se

dy d
X=E − a [E(y − z)] Eq. 2.21
dx dx

As equações (Eq. 2.21) e (Eq. 2.19) agora definem um problema do tipo estaticamente
determinado, onde as magnitudes de a e F devem ser encontradas satisfazendo as condições de
contorno apropriadas. Tentou-se obter soluções usando as equações (Eq. 2.19) e (Eq. 2.21) mas
funções mal condicionadas, associadas a dificuldades numéricas, surgem na solução das
equações diferenciais não tornando possível a obtenção de um procedimento numérico
satisfatório. Deve-se perceber que a magnitude de a na equação (Eq. 2.21) deve ser determinada
36

como parte da solução. Se for especificado no início como na solução de KENNEY (1956), não
é possível satisfazer todas as condições de equilíbrio e contorno.

3. Suposições devem ser feitas acerca da relação entre as forças E′ e X. Se um elemento


for isolado na interface entre duas fatias, como apresentado em Figura 2.14, as
tensões efetivas atuando nesse elemento será dado pelo apresentado na Figura 2.15.
Para uma determinada geometria e superfície de deslizamento as forças internas são
determinadas por:
y
E ′ = ∫ σ′x (y)dy Eq. 2.22
z

y
X = ∫ τxy (y)dy Eq. 2.23
z

Figura 2.14 - Elemento infinitesimal na interface entre duas fatias (adaptado de MORGENSTERN &
PRICE, 1965)
37

Figura 2.15 - Tensões normais e cisalhantes efetivas agindo no elemento infinitesimal


(MORGENSTERN & PRICE, 1965)

Assume-se então que:


X = λf(x)E ′ Eq. 2.24

Se f(x) for especificado, o problema é estaticamente determinado e λ e F podem ser


determinados a partir de uma solução das equações diferenciais que satisfaçam as condições de
contorno apropriadas. A função f(x) pode tomar qualquer forma em princípio. No entanto, o
comportamento do solo impõe certas limitações para que apenas uma certa gama de funções
seja razoável na prática. Estimativas da função podem ser obtidas a partir de teoria elástica.
Para simplificar as equações, foi considerado conveniente definir λf(x) usando a tensão
horizontal total E em vez da tensão horizontal efetiva E ′ . Portanto, define-se

E = E ′ + Pw Eq. 2.25

E o ponto de aplicação de yt da tensão total é:

Eyt = E ′ yt′ + Pw h Eq. 2.26

Então, Eq. 2.24 torna-se:

X = λf(x)E Eq. 2.27


38

Uma função f(x) geralmente utilizada é a metade positiva da função seno, já que é a que
menos influencia no valor final do fator de segurança (MORGENSTERN & PRICE, 1965).
Outras funções também podem ser utilizadas: constante, trapezoidal, etc.

2.4 MÉTODO DOS ELEMENTOS FINITOS

É sabido que há uma variedade de métodos de equilíbrio limite que são construídos
baseados em diferentes hipóteses simplificadoras. Tal fato pode levar a algumas dúvidas quanto
a razoabilidade dos resultados obtidos a partir dessas metodologias quando aplicadas, por
exemplo, na análise de estabilidade de taludes.
No passado, procurou-se então alternativas de análises que pudessem incorporar as
relações tensão-deformação dos solos, como é o caso dos Métodos de Elementos Finitos (MEF).
Entretanto, foram vários os fatores que impediram o uso do método, a saber: dificuldade de
acesso a computador, custo de processameto, conhecimento escasso a respeito da metodologia
e falta de estudos paramétricos entre MEL e MEF (SILVA, 2011).
Recentemente, o uso do método dos elementos finitos tem se tornado mais comum
devido às suas vantagens (conhecimento do comportamento de tensão-deformação de estruturas
geotécnicas) e à disponibilidade de diversos programas comerciais.
Segundo GRIFFITHS & LANE (1999) existem algumas vantagens na abordagem da
análise de estabilidade de taludes pelo MEF sobre os MEL:

(1) Nenhuma suposição precisa ser feita com antecedência sobre a forma ou localização da
superfície de ruptura. A ruptura ocorre "naturalmente" através das zonas dentro da
massa do solo em que a resistência ao cisalhamento do solo é incapaz de suportar as
tensões de cisalhamento aplicadas.
(2) Uma vez que não há conceito de fatias na abordagem pelo MEF, não há necessidade de
se fazer suposições acerca as forças laterais de fatia. O MEF preserva o equilíbrio global
até que o "ruptura" seja alcançada.
(3) Se parâmetros realistas de compressibilidade do solo estiverem disponíveis, as soluções
pelo MEF retornarão informações sobre deformações nos níveis de tensão de trabalho.
(4) O MEF é capaz de monitorar mecanismos de ruptura progressiva até a ruptura
generalizada por cisalhamento.
39

De uma forma geral, o método de elementos finitos tem como foco discretizar em vários
elementos de menores dimensões a estrutura analisada, fornecendo, por exemplo, dados de
tensão, deformação e deslocamento quando essa é submetida a um sistema de forças. Nesse
contexto, discretizar envolve definir geometria, distância, área e volume. Outros aspectos
importantes do método dizem respeito a definição das propriedades dos materiais utilizados e
das condições de contorno impostas à estrutura analisada (SIGMA W, 2021).
De acordo com ARAÚJO (2006), para a solução de um problema de tensão-deformação,
devem ser satisfeitas as condições de compatibilidade, equilíbrio das forças e tensões, além de
serem obedecidas as relações de tensão-deformação dadas por leis constitutivas.
Segundo POTTS & ZDRAVKOVIĆ (1999), o método de elementos finitos se estrutura
da seguinte forma: discretização dos elementos, definição de uma variável primária para
aproximação, determinação de equações elementares, combinação de equações elementares
para formação de equações globais, formulação de condições de contorno para modificação das
equações globais e, por fim, resolução das equações globais.
As etapas básicas das análises por elementos finitos podem ser organizadas da seguinte
forma (BECKER, 2006): pré-processamento, processamento e pós processamento.
O pré-processamento compreende: a discretização dos elementos, ou seja, a divisão do
contínuo em elementos finitos onde são interpoladas as variáveis de interesse; estabelecer as
matrizes de rigidez dos elementos, em função das propriedades do material, modelo
constitutivo; definir as forças de volume e as condições de contorno (cargas de superfície e
deslocamentos).
Já o processamento diz respeito a solução do sistema de equações, por exemplo:

[K]{u}={Q} Eq. 2.28

onde:
[K] = matriz de rigidez global
{u} = vetor de deslocamentos nodais global
{Q} = vetor de cargas global

A determinação das variáveis secundárias (tensões e deformações), é realizada a partir


das relações tensão-deformação e deformação-deslocamento, da seguinte forma:
40

{ε}=[B]{u} Eq. 2.29


{σ}=[C]{ε} Eq. 2.30

onde:
{ε} = vetor das deformações
[B] = matriz deformação-deslocamento
{σ} = vetor de tensões
[C] = matriz tensão-deformação

E, por último, o pós-processamento que compreende a apresentação e visualização dos


resultados das análises.
Vale ressaltar que, no presente trabalho, será utilizada a ferramenta de cálculo RS2 da
Rocscience que se baseia no método dos elementos finitos para análise de problemas em duas
dimensões (2D).

2.4.1 Modelagem Numérica e Estudos de Tensão-Deformação

Segundo BURLAND (1987), professor do Imperial College London, as dificuldades


encontradas por estudantes de mecânica dos solos poderiam ser reduzidas se quatro aspectos
fossem enfatizados várias vezes durante o processo de aprendizagem, são eles:

(i) Perfil do solo


(ii) Comportamento do solo
(iii) Modelagem
(iv) Empirismo

Ainda segundo BURLAND (1987), os três primeiros itens apontados acima formam os
vértices de um triângulo com o termo “empirismo” ocupando o centro do mesmo (Figura 2.16).
Todos os quatro aspectos são importantes para a mecânica dos solos estando interligados em
vários graus, sendo importante sempre fazer a distinção entre eles.
O perfil de solo pode ser obtido a partir de investigações de campo, já o seu
comportamento é definido com o auxílio de ensaios de laboratório e campo, por fim, a
modelagem, que envolve a análise de materiais idealizados.
41

Além de ser utilizado para fins didáticos, o triângulo de Burland também pode ser um
instrumento para melhor compreender os diversos componentes de uma modelagem numérica
a nível de engenharia geotécnica.

Figura 2.16 - Triângulo de Burland (adaptado de BURLAND, 1987)

Com o avanço tecnológico, atualmente, existe uma série de softwares que permitem, no
âmbito da engenharia geotécnica, a utilização de diferentes modelos constitutivos para
descrever o comportamento de tensão-deformação dos solos.

2.4.2 Elasticidade

Tradicionalmente, a relação proposta por Hooke pode ser utilizada para descrever o
comportamento elástico de tensão-deformação de solos (Eq. 2.31). Materiais elásticos seriam
aqueles que retornam ao seu estado de repouso após submetidos a um ciclo completo de
carregamento e descarregamento, sem apresentar deformações residuais em função desse
processo, desde que não excedam o limite de escoamento (TIMOSHENKO, 1970).

σ=Ε×ε Eq. 2.31


42

onde:
σ = tensão
Ε = módulo de elasticidade (módulo de Young)
ε = deformação

Na Eq. 2.31, o termo que relaciona a tensão com deformação é chamado de módulo de
elasticidade e corresponde a reta que define a inclinação dessa relação.
Vale ressaltar que a relação elasto-linear proposta por Hooke é construída sobre algumas
hipóteses básicas, as principais dizem respeito à homogeneidade e isotropia do material.
Entende-se por material homogêneo aquele que possui as mesmas propriedades em todos os
pontos, enquanto isotropia diz respeito ao material possuir mesmas propriedades em todas as
direções.
Para o estado plano de deformações, no qual as deformações segundo um dos eixos
cartesianos podem ser consideradas nulas, a Eq. 2.31 pode ser expressa da seguinte forma:

σx 1−ν ν 0 εx
Ε ν 1−ν 0
{ σy } = [ ε
1 − 2ν] { y } Eq. 2.32
τxy (1 + ν)(1 − 2ν) γxy
0 0
2
onde:
ν = coeficiente de poisson

Para uma situação mais geral, na qual o carregamento atua em todas as direções do
espaço, faz-se necessária utilizar a equação de Hooke generalizada (Eq. 2.33):

σx 1−ν ν ν 0 0 0 εx
σy ν 1−ν ν 0 0 0 εy
σz Ε ν ν 1 − ν 0 0 0 εz
τxy = (1 + ν)(1 − 2ν) 0 0 0 1 − 2ν 0 0 γ xy Eq. 2.33
τyz 0 0 0 0 1 − 2ν 0 γyz
{τxz } [ 0 0 0 0 0 1 − 2ν] {γxz }

Vale ressaltar que o estado plano de deformações (Eq. 2.32) é um caso particular da
solução mais geral (Eq. 2.33) onde εz = 0, γyz = 0 e γxz = 0. As constantes elásticas
apresentas nas Eq. 2.32 e Eq. 2.33, Ε e ν, relacionam-se ainda com uma outra constante, o
módulo cisalhante G, de acordo com a Eq. 2.34.
43

Ε
G= Eq. 2.34
2(1 + ν)

2.4.3 Plasticidade

Uma observação importante a se fazer sobre o comportamento plástico dos materiais


diz respeito ao seu ponto de escoamento, definido como o ponto de tensão que separa a região
elástica da plástica. O local exato desse ponto na curva tensão-deformação nem sempre é bem
definido, já que muitos materiais não apresentam uma separação bem clara. Vale ressaltar que
para um estado de tensão multiaxial o que define a separação da região plástica da elástica não
é um ponto e sim uma superfície de escoamento.
Ao atingir a tensão de escoamento, aqui definida como σy , de uma forma geral, o solo
pode apresentar três comportamentos: não apresentar encruamento (situação idealizada) de
forma que o limite de escoamento é constante na região plástica, amolecimento ou
endurecimento. O amolecimento ocorre quando ao se atingir a tensão de escoamento o seu valor
diminui com as deformações plásticas, analogamente acontece com o endurecimento, ou seja,
ao se atingir o patamar de escoamento ocorre um aumento de tensão com o aumento das
deformações plásticas.
Outra característica muito importante da plasticidade diz respeito a irreversibilidade das
deformações dos materiais quando submetidos a tensões próximas ou maiores que as de
escoamento.

2.4.4 Modelos constitutivos

Modelos constitutivos são formulações matemáticas que visam reproduzir a relação


tensão-deformação de um material levando em conta características de carregamento e
propriedades mecânicas. É importante frisar que os modelos constitutivos são formulados
dentro de determinadas condições específicas de utilização, de forma que esses não devem ser
empregados fora dessas condições para as quais foram desenvolvidos, com riscos de se obter
resultados irreais.
Existe uma grande variedade de modelos que buscam representar as características dos
solos, tais como: linear elástico, linear elástico-perfeitamente plástico, hiperbólico, modelo
cam-clay, etc. Foge do escopo desse trabalho a realização de revisão bibliográfica das
44

características de todos esses modelos, uma vez que as análises aqui realizadas dizem respeito
apenas ao modelo linear elástico-perfeitamente plástico.
O modelo linear elástico-perfeitamente plástico considera que as tensões e deformações
que ocorrem antes de σy (tensão de escoamento) são proporcionais e de origem elástica. As
deformações que ocorrem após se atingir a tensão de escoamento são de ordem plástica e
irreversíveis. Outra característica desse modelo constitutivo diz respeito ao trecho
perfeitamente plástico que é caracterizado pelo aumento de deformações sem que seja
necessário acréscimo de tensões (Figura 2.17).

Figura 2.17 - Modelo constitutivo linear elástico-perfeitamente plástico

O critério de ruptura de Mohr-Coulomb, utilizado nas análises desse trabalho, se


enquadra no comportamento do tipo linear elástico-perfeitamente plástico da (Figura 2.17).
Para aplicação desse modelo faz-se necessária a utilização de parâmetros de rigidez, associados
ao trecho linear elástico, e de dados de resistência, associados ao trecho perfeitamente plástico.
Um resumo desses parâmetros, que servem como dados de entradas para as análises, pode ser
encontrado na Tabela 2.1.
45

Tabela 2.1 - Dados para análise com modelo linear elástico-perfeitamente plástico.
Parâmetros Descrição
E Módulo de elasticidade
ν Coeficiente de Poisson
c Coesão do solo
ϕ Ângulo de atrito do solo

2.4.5 Fator de Redução dos Parâmetros de Resistência ao Cisalhamento

O princípio por trás da técnica de redução da resistência ao cisalhamento na análise de


estabilidade de taludes feita a partir do método de elementos finitos está ligada à redução dos
parâmetros de resistência c’ e tan ’ até que ocorra a ruptura do talude, que é definida quando
deformações cisalhantes são mobilizadas do pé à crista do talude (MATSUI & SAN, 1992).
A ruptura de talude no modelo de elementos finitos ocorre "naturalmente" através das
zonas em que a resistência ao cisalhamento do solo é insuficiente para resistir as tensões
cisalhantes solicitantes (GRIFFITHS & LANE, 1999).
A análise de estabilidade de taludes utilizando a técnica de redução da resistência ao
cisalhamento é frequentemente utilizada atualmente por conta do desenvolvimento
computacional. Essa técnica mostra que existe uma correlação entre o mecanismo de ruptura
de um talude e o desenvolvimento de deformações cisalhantes na zona de plastificação mais
solicitada que, por sua vez, possui boa aproximação com a superfície de ruptura no MEL. De
uma forma geral, as deformações cisalhantes aumentam com a redução da resistência ao
cisalhamento do solo (MATSUI & SAN, 1992).
O fator de segurança (SRF) na abordagem pelo MEF é definido como o número pelo
qual os parâmetros de resistência originais devem ser divididos para levar o talude à ruptura
(GRIFFITHS & LANE, 1999), (Eq. 2.35 e Eq. 2.36).
c
cr = Eq. 2.35
𝑆𝑅𝐹
tan ϕ
ϕr = arctan ( ) Eq. 2.36
𝑆𝑅𝐹

onde:
cr = coesão reduzida
ϕr = ângulo de atrito reduzido
46

Na técnica de redução da resistência ao cisalhamento (SSR) pelo MEF, o modelo elasto-


plástico pode ser utilizado para o solo que compõe o talude. A resistência ao cisalhamento dos
materiais é progressivamente reduzida até que ocorra o colapso. Para materiais analisados
baseados no modelo de Mohr-Coulomb, a resistência ao cisalhamento é reduzida e determinada
de acordo com a Eq. 2.37, ROCSCIENCE (2004):

τ c′ tan ϕ′
= + Eq. 2.37
𝑆𝑅𝐹 𝑆𝑅𝐹 𝑆𝑅𝐹

A Eq. 2.37 pode ser reescrita chegando em Eq. 2.38:

τ
= c ∗ + tanϕ∗ Eq. 2.38
𝑆𝑅𝐹

onde:
c′
c ∗ = 𝑆𝑅𝐹


tan ϕ′
ϕ = arctan ( )
𝑆𝑅𝐹

Os parâmetros de resistência ao cisalhamento reduzidos são utilizados como dados de


entrada na análise pelo MEF.
O programa de análise de elementos finitos utilizado nesse trabalho possui um algoritmo
básico com o passo a passo do método de redução dos parâmetros de resistência ao
cisalhamento (SSR) realizado de forma automática pelo software RS2. Para materiais que
obedecem ao critério de Mohr-Coulomb, os passos para a busca sistemática de SSR definidos
em ROCSCIENCE (2004) que levam o talude, anteriormente estável, à ruptura, são os
seguintes:

Passo 1: Desenvolver um modelo por elementos finitos para o talude analisado utilizando
parâmetros de deformação e resistência estabelecidas para os materiais analisados. Computar o
modelo e registrar a máxima deformação total do talude.

Passo 2: Aumentar o valor do SRF e calcular os parâmetros de resistência de Mohr-Coulomb


reduzidos conforme descrito na Eq. 2.37. Entrar com os parâmetros de resistência reduzidos no
47

modelo por elementos finitos para o talude analisado e recalcular registrando a máxima
deformação total do talude.

Passo 3: Repetir o Passo 2, utilizando incrementos sistemáticos do SRF, até que o modelo por
elementos finitos não convirja para uma solução, ou seja, continuar a reduzir a resistência ao
cisalhamento do material até que o talude rompa. O valor de SRF obtido imediatamente antes
da ruptura será o valor de redução da resistência ao cisalhamento crítico.

Ainda segundo GRIFFITHS & LANE (1999), existem diversas definições para ruptura.
Neste trabalho, será adotado o critério de não-convergência da solução (ZIENKIEWICZ &
TAYLOR, 1989).
Quando o algoritmo não pode convergir dentro de um número máximo de iterações
especificado pelo usuário, a implicação é que não se pode encontrar nenhuma distribuição de
tensão que seja simultaneamente capaz de satisfazer tanto o critério de ruptura de Mohr-
Coulomb quanto o equilíbrio global. Se o algoritmo não for capaz de satisfazer esses critérios,
diz-se que ocorreu a ruptura. A ruptura do talude e a não convergência numérica ocorrem
simultaneamente, e são acompanhadas por um aumento dramático nos deslocamentos nodais
da malha.

2.5 DEFINIÇÃO DE PARÂMETROS GEOTÉCNICOS

Para a realização das análises numéricas desse trabalho é necessário definir peso
específico e parâmetros de resistência dos materiais envolvidos quando na utilização de modelo
rígido-perfeitamente plástico (MEL) e, num outro momento, de peso específico, resistência e
deformabilidade quando se realizar análise do tipo linear elástica-perfeitamente plástica (MEF).
Vale lembrar que no capítulo 2.1 os materiais da barragem foram classificados em dois
principais grupos: rejeito arenoso (underflow) e rejeito plástico (overflow). O primeiro estará
submetido unicamente à condição do tipo drenada em todas as análises aqui realizadas,
enquanto o segundo, se comportará ora de maneira drenada ora de maneira não drenada. Para
isso, os parâmetros de resistência e deformabilidade utilizados como valores de entrada nas
análises numéricas foram definidos a partir de dados de ensaios de campo e laboratório dos
tipos drenado e não drenado, encontrados na literatura nacional e internacional para rejeitos de
minério de ferro.
48

Para melhor entendimento do problema, os parâmetros de resistência e deformabilidade


serão agrupados em função do tipo de material da barragem e das suas condições de
carregamento. Os valores utilizados tomam por base faixas de variação publicadas na literatura
e experiências prévias, não devendo ser interpretados como recomendação de projeto.

2.5.1 Dique de partida e alteamentos

- Parâmetros de Resistência

O intercepto de coesão efetiva (c’) adotado para o dique de partida e demais alteamentos
compactados foi de 10kPa.
Adotou-se um valor de ângulo de atrito efetivo (ϕ′ ) de 35°, próximo da média da faixa
de variação indicada por MARQUES (2021).

- Parâmetros de Deformabilidade

O módulo de elasticidade adotado foi de 8 MPa e do coeficiente de Poisson de 0,25.

2.5.2 Rejeito arenoso

- Parâmetros de Resistência

O intercepto de coesão efetiva (c’) de rejeitos arenosos é muito próximo de zero devido
aos processos industriais de britagem e moagem que são submetidos. Esses fazem qualquer
cimentação existente entre os grãos do material ser quebrada. Em função disso, o valor de c’ a
ser adotado nas análises para esse tipo de material será 0 kPa.
Foi adotado um valor de ângulo de atrito efetivo (ϕ′ ) de 35°, próximo da média da faixa
de variação indicada por MARQUES (2021).

- Parâmetros de Deformabilidade

O valor do módulo de elasticidade foi estimado a partir de resultados de ensaios triaxiais


de um rejeito de minério de ferro com granulometria arenosa para o qual relacionou-se as
49

tensões verticais efetivas (σ′v ) com o valor de E50 para diversas tensões. O resultado desse ajuste
pode ser observado na Eq. 2.39.

E50 = 46. ln(σ′v ) − 186 Eq. 2.39

onde:
E50 = módulo de elasticidade em MPa
σ′v = tensão efetiva de adensamento em kPa

Adotou-se um valor de coeficiente de Poisson (ν) igual a 0,25.

2.5.3 Rejeito plástico

- Parâmetros de Resistência

Para análises do tipo não drenada, na ausência de mais informações sobre o tipo de
rejeito plástico, admitiu-se uma resistência não drenada su = 0,22σ′v . O valor do ângulo de
atrito (ϕu ) foi definido como sendo nulo para as análises não drenadas.
Em condições drenadas, adotou-se um ângulo de atrito efetivo (ϕ′ ) correspondente a
30°, valor um pouco inferior ao estimado para o rejeito arenoso. Adotou-se um intercepto de
coesão efetiva nulo.

- Parâmetros de Deformabilidade

O valor do módulo de elasticidade drenado (E ′ ) para o rejeito plástico foi estimado como
sendo metade do valor do módulo de elasticidade para o rejeito arenoso. Já o módulo de
elasticidade não drenado foi estimado com base na resistência não drenada, adotando-se a
relação Eu = 25su .
O coeficiente de Poisson drenado (ν) adotado corresponde a 0,25 (igual ao rejeito
arenoso). Já o coeficiente de Poisson não drenado (νu ) adotado para o rejeito plástico foi de
0,49.
Um resumo dos parâmetros utilizados nas análises pode ser encontrado na Tabela 2.2.
50

Tabela 2.2 - Parâmetros geotécnicos para os rejeitos


c ′ ou su ϕ′ ou ϕu
Tipo de material Ε ′ ou Εu (MPa) ν′ ou νu Condição
(kPa) (º)
Dique de
10 35 8,0 0,25 Drenado
partida/Alteamentos

Rejeito arenoso 0 35 Ε50 = 46. ln(σ′v ) − 186 0,25 Drenado

0 30 0,5. Ε50,rej.arenoso 0,25 Drenado


Rejeito plástico
0,22.σ′v 0 25. su 0,49 Não dren.

Vale dizer que foi adotado um valor de peso específico natural igual a 22kN/m³ para
todos os materiais envolvidos nas análises, similar aos valores encontrados em rejeitos de
minério de ferro reportados por MORGENSTERN et al 2016 e ROBERTSON et al, 2019. Por
simplificação, inferiu-se ainda que peso específico natural é igual ao peso específico saturado.
Cabe ainda ressaltar que os valores apresentados na Tabela 2.2 se destinam a análises
comparativas de forma que não devem ser entendidos como recomendações de projeto.
51

3 ANÁLISES NUMÉRICAS

As análises realizadas no presente trabalho foram feitas utilizando os programas


computacionais Slide2 e RS2, para abordagens de MEL e MEF, respectivamente.
Nas análises pelo MEF, todos os materiais que compõem a barragem de rejeito foram
submetidos a condição drenada durante as fases que representam os alteamentos. Na fase final
de redução de parâmetros, entretanto, foram feitas duas análises distintas, numa das quais o
comportamento do rejeito plástico é drenado (CASO 1) e, na outra, não drenado (CASO 2).
Estas considerações simulam o que ocorreria em circunstâncias nas quais o último alteamento
fosse realizado de forma lenta ou rápida, respectivamente. Vale ainda ressaltar que tanto o
“CASO 1” quanto o “CASO 2” abordam análises numéricas pelo MEL e MEF.
Para ambas as situações foi utilizada uma geometria hipotética de barragem, um dique
de partida e 6 alteamentos de 10 m cada e inclinação do talude de 1V:3H. Foi adotada uma praia
de rejeitos com largura constante de 150 m e inclinação de 2%. Entre a praia e os alteamentos
considerou-se a existência de rejeitos arenosos não plásticos. Para distâncias maiores que 150m
do talude, admitiu-se a existência de rejeitos finos plásticos. Os diques de alteamentos são feitos
com o rejeito arenoso compactado.
Na parte inferior da seção em análise foi incorporada uma camada de rejeito plástico
para avaliar as consequências da presença deste material na base do reservatório. Por
simplicidade, e para evitar introduzir novas variáveis no problema, foi assumido que a fundação
seria muito rígida e não participaria de forma importante nas deformações da barragem. Para
tanto, foram introduzidos vínculos no fundo do reservatório restringindo movimentos. Em casos
nos quais a fundação fosse muito deformável ou participasse dos movimentos de forma
significativa, esta condição de contorno teria que ser revista.
Para as seções típicas analisadas nesse trabalho foram utilizados aproximadamente 2600
elementos triangulares de três nós para compor a malha. A base da malha teve os deslocamentos
restringidos nas direções horizontal e vertical, enquanto a região lateral direita (parte vertical)
teve o deslocamento restringido apenas na horizontal.
Foi utilizado o modelo constitutivo linear elástico-perfeitamente plástico para
representar o comportamento dos materiais. De forma a representar a variação do módulo de
rigidez e da resistência não drenada com o nível de tensões, foram criados vários materiais com
diferentes valores de E’, Eu e su para cada tipo de rejeito. Cada material foi atribuído a uma
camada específica, representativa de um certo nível de tensões. Isso explica as diferentes cores
das camadas apresentadas da Figura 3.2 a Figura 3.10 e também da Figura 3.13.
52

No total, a malha foi dividida em sete camadas, na vertical. Na base do reservatório foi
introduzida uma camada de rejeito plástico de 2 m de espessura que foi dividida em seis partes,
para considerar a variação de tensões devido ao talude.
Na análise de estabilidade de taludes pelo MEF utilizando a técnica de redução da
resistência ao cisalhamento (SSR), obtém-se um número equivalente ao FS do MEL, definido
como a razão entre a resistência ao cisalhamento disponível pela resistência ao cisalhamento
mínima para qual ainda se obtém convergência (Strength Reduction Factor, SRF).
As poropressões estacionárias foram estimadas a partir de linhas piezométricas. Para
cada alteamento utilizou-se uma linha piezométrica diferente. Isso foi feito para representar a
variação do nível d’água na barragem conforme se processam os alteamentos. A Figura 3.1,
com medidas em metros (m), apresenta a linha piezométrica correspondente ao último
alteamento.

Figura 3.1 - Linha piezométrica da última etapa de alteamento para MEF

A simulação dos alteamentos foi dividida em 9 fases. A Tabela 3.1 apresenta as fases
de simulação utilizadas no MEF. Para as análises do MEL foi utilizada a configuração da última
fase do MEF. Os resultados obtidos foram comparados com análises pelo MEL utilizando um
método de fatias (MORGENSTERN & PRICE, 1965).
53

Tabela 3.1 - Resumo das fases de simulação no MEF


Rejeito Modelo
Fase Ativação/ação Rejeito plástico
arenoso Constitutivo
1 DP, RP - Drenado
2 RA, RP Drenado Drenado
3 1° alteamento, RA, RP Drenado Drenado
4 2° alteamento, RA, RP Drenado Drenado linear elástico-
5 3° alteamento, RA, RP Drenado Drenado perfeitamente
6 4° alteamento, RA, RP Drenado Drenado plástico
7 5° alteamento, RA, RP Drenado Drenado
8 6° alteamento, RA, RP Drenado Drenado
9 Redução de parâmetros Drenado Drenado e não drenado
DP: dique de partida; RP: rejeito plástico; RA: rejeito arenoso

3.1 CASO 1

É caracterizado por apresentar comportamento drenado em todos os materiais e em


todas as etapas de alteamento na análise feita pelo MEF. Na abordagem utilizando o MEL, fez-
se o uso da última fase de alteamento da configuração pelo MEF, estando todos os materiais
submetidos a comportamento do tipo drenado.
Da Figura 3.2 a Figura 3.10 é possível visualizar as 9 fases com 6 etapas de alteamento
na análise feita pelo MEF, apresentando comportamento drenado na etapa de redução dos
parâmetros de resistência, que ocorre imediatamente após o último alteamento. Verifica-se
ainda na Figura 3.12 a seção representativa da análise pelo MEL obtida a partir da última etapa
de alteamento da análise pelo MEF.

Figura 3.2 - Fase 1 de análise por MEF, construção do DP e deposição de RP (drenado)


54

Figura 3.3 - Fase 2 de análise por MEF, deposição de RA e RP (drenados)

Figura 3.4 - Fase 3 de análise por MEF, 1º alteamento, deposição de RA e RP (drenados)

Figura 3.5 - Fase 4 de análise por MEF, 2º alteamento, deposição de RA e RP (drenados)

Figura 3.6 - Fase 5 de análise por MEF, 3º alteamento, deposição de RA e RP (drenados)


55

Figura 3.7 - Fase 6 de análise por MEF, 4º alteamento, deposição de RA e RP (drenados)

Figura 3.8 - Fase 7 de análise por MEF, 5º alteamento, deposição de RA e RP (drenados)

Figura 3.9 - Fase 8 de análise por MEF, 6º alteamento, deposição de RA e RP (drenados)

Figura 3.10 - Fase 9 de análise por MEF, redução dos parâmetros, deposição de RA e RP (drenados)

A Figura 3.11 apresentada a imagem ampliada da camada de rejeito plástico presente


na base do reservatório quando submetida a condição drenada na fase de redução da resistência
56

ao cisalhamento (SSR). Foi necessário dividir a camada horizontalmente para considerar a


variação da tensão normal efetiva causada pela presença do talude.

Figura 3.11 - Detalhe das partições da camada de rejeito plástico em condição drenada na fase SSR

A Tabela 3.2 resume os parâmetros geotécnicos de rigidez e resistência utilizados na


análise do tipo drenada por elementos finitos associando os materiais envolvidos com as
respectivas cores para melhor entendimento da configuração do problema exposto na Figura
3.10.
Verifica-se ainda mudanças consideráveis no valor de E ′ . Essas diferenças se devem à
dependência entre módulo de elasticidade e tensão efetiva e aos diferentes níveis de tensões aos
quais são submetidas as camadas.

Tabela 3.2 - Materiais de comportamento drenado utilizados na análise por MEF com respectivas
cores
Critério
γ
Material Cor ϕ′ (°) c ′ (kPa) E ′ (kPa) ν′ de Condição
(kN/m³)
ruptura
DP 22 35 10 8.000 0,25
RP 1 22 30 0 457 0,25
RP 2 22 30 0 25.262 0,25
RP 3 22 30 0 36.796 0,25
RP 4 22 30 0 44.393 0,25
RP 5 22 30 0 50.068 0,25
RP 6 22 30 0 54.599 0,25
Mohr-
RP 7 22 30 0 58.371 0,25 Drenado
Coulomb
RA 1 22 35 0 913 0,25
RA 2 22 35 0 50.524 0,25
RA 3 22 35 0 73.592 0,25
RA 4 22 35 0 88.787 0,25
RA 5 22 35 0 100.135 0,25
RA 6 22 35 0 109.197 0,25
RA 7 22 35 0 116.741 0,25
DP: dique de partida; RP: rejeito plástico; RA: rejeito arenoso
57

Na Tabela 3.3 verifica-se um resumo dos parâmetros utilizados nas análises por
equilíbrio limite. As características dos materiais são associadas a cores com o objetivo de
melhor identificar os tipos de materiais apresentados na Figura 3.12.

Tabela 3.3 - Materiais de comportamento drenado utilizados na análise por MEL com respectivas
cores
γ
Material Cor ϕ′ (°) c ′ (kPa) Critério de ruptura Condição
(kN/m³)
DP 22 35 10
RA 22 35 0 Mohr-Coulomb Drenado
RP 22 30 0
DP: dique de partida; RP: rejeito plástico; RA: rejeito arenoso

Figura 3.12 - Análise por MEL utilizando a fase 9 da análise pelo MEF com RA e RP drenados

3.2 CASO 2

Apresenta comportamento drenado em todos os materiais nas 8 fases iniciais (até o 6º


alteamento) de acordo com a Tabela 3.1, mas na última fase apresenta comportamento drenado
no rejeito arenoso e não drenado no rejeito plástico para análise realizada a partir do MEF.
Semelhante ao CASO 1, a análise a partir do MEL foi feita utilizando a última fase de
alteamento da abordagem pelo MEF, estando o material arenoso submetido a comportamento
drenado e o material plástico não drenado.
Da Figura 3.2 a Figura 3.9, é possível visualizar as 8 fases com 6 etapas de alteamento
da análise feita pelo MEF, idênticas ao “CASO 1”. Já na Figura 3.13, apresenta-se a etapa de
redução dos parâmetros de resistência na qual o rejeito plástico é simulado com comportamento
não drenado. Verifica-se ainda na Figura 3.15 a seção representativa da análise pelo MEL
utilizando a última etapa de alteamento da análise pelo MEF do “CASO 2”.
58

Figura 3.13 - Fase 9 de análise por MEF, redução dos parâmetros, deposição de RA (drenado) e RP
(não drenado)

A Figura 3.14 apresentada a imagem ampliada da camada de rejeito plástico presente


na base do reservatório quando submetida a condição não drenada na fase de redução da
resistência ao cisalhamento (SSR). Foi necessário dividir a camada horizontalmente para
considerar a variação da tensão normal efetiva causada pela presença do talude.

Figura 3.14 - Detalhe das partições da camada de rejeito plástico em condição não drenada na fase SSR

Parte da Tabela 3.2 e a totalidade da Tabela 3.4 resumem os parâmetros geotécnicos de


rigidez e resistência utilizados na análise do tipo não drenada por elementos finitos associando
os materiais envolvidos com as respectivas cores para melhor entendimento da configuração do
problema exposto na Figura 3.13. Cabe perceber que, apesar de serem utilizados materiais sob
condições drenadas na análise apresentada na Figura 3.13, apenas as características não
drenadas dos materiais são expostas na Tabela 3.4, isso acontece porque as características
drenadas da mesma análise já foram indicadas na Tabela 3.2.
Na Tabela 3.5 é apresentado um resumo dos parâmetros de resistência utilizados nas
análises do tipo drenada e não drenada por equilíbrio limite. As características dos materiais
são associadas a cores com o objetivo de melhor identificar os tipos de materiais apresentados
na Figura 3.15.
59

Tabela 3.4 - Materiais de comportamento não drenado utilizados na análise por MEF com respectivas
cores
Critério
γ
Material Cor ϕu (°) su (kPa) Eu (kPa) νu de Condição
(kN/m³)
ruptura
RP 1 22 0,5 122 3.000 0,49
RP 2 22 0,5 131,8 3.250 0,49
RP 3 22 0,5 141,6 3.500 0,49
Mohr-
RP 4 22 0,5 151,4 3.750 0,49 Não drenado
Coulomb
RP 5 22 0,5 161,2 4.000 0,49
RP 6 22 0,5 171 4.250 0,49
RP 7 22 0,5 181 4.500 0,49
RP: rejeito plástico; RA: rejeito arenoso

Tabela 3.5 - Materiais de comportamento drenado e não drenado utilizados na análise por MEL com
respectivas cores
γ Critério de
Material Cor ϕ′ ou ϕu (°) c ′ ou su (kPa) Condição
(kN/m³) ruptura
Dique 22 35 10
Drenado
RA 22 35 0 Mohr-Coulomb
RP 22 0 0,22.σ′v Não drenado
RP: rejeito plástico; RA: rejeito arenoso

Figura 3.15 - Análise por MEL utilizando a fase 9 da análise pelo MEF com RA drenado e RP não
drenado
60

4 RESULTADOS

A Figura 4.1 apresenta o campo de tensões verticais efetivas da última fase de


alteamento considerando comportamento drenado para todos os rejeitos, até aquela fase. Os
valores obtidos são próximos dos valores adotados inicialmente para a estimativa dos módulos
de ambos os rejeitos e da resistência não drenada do rejeito plástico, justificando os valores
adotados.

Figura 4.1 - Tensões verticais efetivas ao final do último alteamento considerando comportamento
drenado

A Figura 4.2 apresenta a malha deformada, com exagero de 18 vezes na escala


apresentada, após a redução de parâmetros (SSR) em condição inteiramente drenada,
simulando a condição de estabilidade da barragem em caso de carregamentos lentos.

Figura 4.2 - Malha deformada em condição drenada após SSR

Na Figura 4.3 simula-se uma condição na qual o último carregamento tenha sido
realizado de forma suficientemente rápida a ponto de provocar uma resposta não drenada do
rejeito plástico, mas lento demais para gerar excesso de poropressão no rejeito arenoso, pelo
menos em um primeiro momento, pois posteriormente o material arenoso poderia ser levado
a uma condição não drenada, em caso de liquefação. O exagero na escala apresentada
corresponde a 18 vezes.
61

Figura 4.3 - Malha deformada em não condição drenada (para o rejeito plástico) após SSR

A Figura 4.4 e a Figura 4.5 apresentam uma comparação entre o MEF e o MEL. A
superfície crítica obtida no MEL foi sobreposta ao campo de deslocamentos da fase de SSR do
MEF. Nota-se que há uma boa concordância entre a superfície crítica do MEL e a região de
maiores deslocamentos da análise pelo MEF, tanto para o caso no qual se assume que os dois
tipos de rejeito têm comportamento drenado (Figura 4.4), quanto para o caso no qual se admite
comportamento não drenado para o rejeito plástico (Figura 4.5).

Figura 4.4 - Superfície crítica do MEL superposta ao campo de deslocamentos totais da SSR pelo MEF
para o caso de carregamento drenado

Figura 4.5 - Superfície crítica do MEL superposta ao campo de deslocamentos totais da SSR pelo MEF
para o caso de carregamento não drenado (para o rejeito plástico)
62

Também se obteve excelente concordância entre o fator de segurança do MEL (FS) e


o fator de redução da resistência do MEF (SRF). No caso drenado, os valores são FS= 2,19 e
SRF = 2,16. No caso do rejeito plástico em comportamento não drenado, foram obtidos FS=
1,19 e SRF= 1,11, de acordo com a Tabela 4.1.

Tabela 4.1 - FS e SRF para as análises drenada e não drenada


FS SRF
Análise (MORGENSTERN & (Método dos Elementos
PRICE, 1965) Finitos)
Drenada 2,19 2,16
Não drenada 1,19 1,11

A Figura 4.6 apresenta as tensões normais efetivas e cisalhantes que atuam na superfície
crítica do MEL para a situação de carregamento drenado. A linha preta representa a própria
geometria da superfície crítica. Para fins de comparação, um caminho com a mesma
geometria da superfície crítica do MEL foi traçado na malha de elementos finitos. As tensões
normais efetivas e cisalhantes atuantes neste caminho apresentam boa concordância com os
valores obtidos pelo MEL.

Figura 4.6 - Tensões normais efetivas e cisalhantes que atuam ao longo da superfície crítica do MEL,
pelo próprio MEL e pelo MEF – carregamento drenado
63

A Figura 4.7 é análoga à anterior, mas apresenta os valores de tensões para a condição
de carregamento não drenado no rejeito plástico. Ressalta-se que, no trecho em que a
superfície crítica passa pelo rejeito plástico (48 m < x < 212 m), as tensões normais efetivas
apresentadas na Figura 4.7 correspondem à fase imediatamente anterior à redução de
parâmetros, pois a resistência não drenada do rejeito plástico é determinada com base nas
tensões (verticais) efetivas dessa fase. Nos demais trechos, são apresentadas as tensões
normais efetivas da fase SSR.
Nos dois casos, percebe-se boa concordância entre o MEL e o MEF, tanto para as
tensões normais quanto para as tensões cisalhantes

Figura 4.7 - Tensões normais efetivas e cisalhantes que atuam ao longo da superfície crítica do MEL,
pelo próprio MEL e pelo MEF – carregamento não drenado no rejeito plástico
64

5 CONCLUSÕES E SUGESTÕES

No presente item, serão apresentadas as conclusões para as análises realizadas nesse


projeto de graduação e também sugestões para trabalhos futuros.

5.1 CONCLUSÕES

Foram realizadas análises de uma barragem de rejeitos com geometria hipotética, pelo
MEL e pelo MEF. A comparação indicou que o fator de segurança pelo MEL foi muito similar
ao seu análogo pelo MEF (fator de redução de resistência), tanto no caso drenado quanto no
caso não drenado.
A geometria da superfície crítica do MEL apresentou boa concordância com o campo
de deslocamentos da fase de redução de parâmetros do MEF.
As tensões atuantes na superfície crítica do MEL foram bastante similares às tensões
obtidas pelo MEF, para a mesma região. Com exceção de algumas regiões onde foi possível
visualizar a existência de saltos, esses últimos caracterizados pela concentração de tensões em
algumas transições de camadas em decorrência de mudança abrupta do módulo de elasticidade.
O FS e o SRF sofreram grande redução quando se considerou o rejeito plástico indo de
condição drenada para condição não drenada. FS reduziu em aproximadamente 46%, já SRF
reduziu em 49%.
No caso do rejeito plástico em comportamento não drenado, o FS e o SRF são menores
que o mínimo preconizado pela NBR 13028 (ABNT, 2017), já considerando o artigo 6º da
Resolução 4/2019 da Agência Nacional de Mineração (ANM). N o caso drenado esses valores
foram superiores.
Tanto para a análise drenada quanto para a não drenada pode-se dizer que ambas as
geometrias da superfície crítica obtidas a partir de equilíbrio limite são do tipo multiplanar, em
alguns trechos tende a se aproximar de um arco de circunferência e em outros de uma a reta.
Em ambas as situações a superfície crítica tangencia a camada de rejeito plástico na base
da estrutura, o que era esperado, uma vez que essa região apresenta propriedades de resistência
ao cisalhamento inferiores aos outros materiais que compõem a barragem.
Vale dizer que, para a condição de carregamento não drenada no rejeito plástico, a
superfície crítica por equilíbrio limite desvia do dique de partida.
65

5.2 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS

Fazer uma análise de malha para as análises por elementos finitos e verificar a influência
da mudança no tipo e quantidade de elementos de malha na obtenção dos valores de
deslocamentos, deformações, tensões e no próprio SRF.
Utilizar um modelo constitutivo não linear elasto-plástico para os materiais utilizados
nas análises por elementos finitos.
Comparar a análise do tipo SSR com análises por equilíbrio limite que utilizem o estado
de tensões ao longo da superfície para determinar os fatores de segurança.
66

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