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UNIVERSIDADE LUSÍADA

Centro Universitário Lusíada ⎯ Norte


Campus do Porto

1.º Ciclo de Estudos em Direito

TEORIA DA LEI PENAL


[Turmas E e F]

2.º teste de avaliação contínua


24 de maio de 2023. 18h. Duração: 50 mn

António, português, e Bianka, ucraniana, de lua-de-mel, resolveram fazer um


cruzeiro pelo Mediterrâneo a bordo do paquete de luxo Sereia dos Mares, registado
na capitania do Porto do Pireu. De acordo com o pacote vendido pela agência de
viagens, no dia 12 de abril de 2022, a embarcação levantaria âncora do Porto de
Barcelona e, fazendo escala em vários portos do Mediterrâneo, regressaria ao ponto
de partida no dia 22 de abril. E assim aconteceu.
No dia 14 de abril, pelas 9h30, navegava o Sereia dos Mares a 20.300 metros do Porto
de Cagliari (no sul da Sardenha), quando, na cobertura, se faz ouvir um grande
burburinho: era António que, depois de entregar a Calina, cidadã russa, uma pen
drive contendo documentos classificados como segredo do Estado Português
relativos ao envolvimento da NATO na guerra da Ucrânia (que começou em 20 de
fevereiro de 2022), reclamava o pagamento dos 100.000€ prometidos. Como Calina
se recusava a pagar, António decidiu fazê-la pagar por isso; assim, quando o paquete
navegava em águas internacionais entre a Sardenha e a Sicília, António amordaçou
Calina, deu-lhe uma forte pancada na cabeça para a tornar inconsciente e atirou-a
ao mar onde esta morreu quase imediatamente por afogamento (art. 132.º, n.º 2, al.
g), CP). Foi com base nestes factos que, a cerca de 14 milhas marítimas (mm) do
Porto do Pireu, as autoridades gregas entraram a bordo da embarcação e
procederam à detenção de António.
Já em Atenas, em 16 de abril, Bianka consegue ludibriar as autoridades gregas e
libertar António, procurando ambos refúgio na Embaixada Portuguesa local. A
caminho, e com medo de ser denunciado por Bianka que desde o início reprovava
severamente a sua traição, António ministrou em Bianka um poderoso veneno que
lhe provocou a morte cerca de cinco minutos depois de franquearem as portas da
embaixada.
Chegado a Portugal cerca de dois meses depois, pergunta-se que leis aplicar a
António pelos crimes cometidos, considerando que a Grécia formulou o pedido da
sua extradição relativamente ao Crime de Evasão.
Para efeitos de resposta à questão anterior, admita que, quanto aos seguintes
crimes:
i. Violação de segredo de Estado (art. 316.º CP, pena de prisão de 2 a 8
anos – art. 5.º, n.º 1, al. a)); o facto, em Portugal, era punível em
conformidade com o disposto no art. 316.º, n.º 1; porém, em 2 de abril de
2022, pela Lei 2, a pena foi agravada em metade no seu limite mínimo e
máximo se os segredos respeitassem a conflito armado internacional em

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curso. O mesmo facto era punível, na Itália, com pena de prisão até três
anos, e na Grécia, com pena de prisão de 3 a 8 anos.

• Pelo art. 7.º, n.º 1, o facto foi praticado fora do território nacional (cfr.:
Tratado de Lisboa, Convénio de Limites, CNUDM e Convenção de
Viena sobre as Relações Diplomáticas), mais propriamente em
território italiano, pois 20.300 metros correspondem a 11 mm, o
que, pelos arts. 2.º e 3.º da CNUDM, corresponde ao mar territorial
italiano). Porém, a este crime, deve aplicar-se sempre a lei
portuguesa (art. 5.º, n.º 1, al. a)), mesmo que, como neste caso, no
lugar da prática do facto a lei seja mais favorável (art. 6.º, n.º 2 e n.º 3).
• Quanto à questão da sucessão de leis no tempo, e como no momento
da prática do facto (art. 3.º CP), a Lei 2, apesar de mais desfavorável,
já se encontrava em vigor, é esta que se aplica – princípio da legalidade
/ princípio da precedência ou da anterioridade da lei penal.

ii. Crimes de homicídio qualificado sobre Calina e sobre Bianka.


Os factos, em Portugal, são puníveis em conformidade com o disposto no
art. 132.º, n.º 2, al. g), CP, uma vez que estes homicídios se destinavam a
encobrir outros crimes. Porém, em 2 de abril de 2022, a Lei 2 agrava a
pena em metade no seu limite mínimo, se o homicídio se destinar a
encobrir Crimes contra a independência e integridade pessoais, o que foi o
caso. O mesmo facto era punível, na Itália, com pena de prisão de 8 a 16
anos, e, na Grécia, com pena de 10 a 20 anos.

• Quanto ao homicídio qualificado sobre Calina, o facto é praticado


fora do território nacional (art. 7.º), mas a lei penal portuguesa poderá
aplicar-se pelo art. 5.º, n.º 1, al. e) – demonstrar a verificação dos
pressupostos). E como este homicídio foi praticado em águas
internacionais, vigora o princípio do pavilhão grego. Logo, pelo art. 6.º,
n.º 2, aplica-se a António a lei grega (pena de prisão de 10 a 20 anos)
por ser mais favorável do que a lei portuguesa. Além disso, e por isso,
as autoridades gregas agiram bem pois, na sua Zona Contígua (art.
33.º, n.º 1, al. b)), detiveram António pelo crime praticado no seu
território (correspondente art. 4.º, al. b), CPG).

• Quanto ao homicídio qualificado sobre Bianka, porque esta morre


em território nacional (Embaixada de Portugal em Atenas), pelo artigo
7.º, n.º 1, o facto considera-se praticado em Portugal e, pelo art. 4.º,
n.º 1, al. a), aplica-se a lei portuguesa, mais concretamente a Lei 2,
apesar de mais gravosa (o agente preencheu o tipo (em 16 de abril))
quando a nova lei já estava em vigor (entrara em vigor no dia 2 de
abril).

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iii. Evasão de António (art. 352.º, n.º 1, prisão até 2 anos; art. 5.º, n.º 1, al.
e)).
• O facto foi praticado em Atenas, fora da Embaixada Portuguesa, e, por
isso, considerando os elementos determinantes do território nacional
(cfr.: Tratado de Lisboa, Convénio de Limites, CNUDM e Convenção de
Viena sobre as Relações Diplomáticas) o facto, à luz do art. 7.º,
considera-se praticado fora do território português. Porém, ao facto
poderá aplicar-se a lei portuguesa ao abrigo do disposto no art. 5.º,
n.º 1, al. e), pois: o facto foi praticado por um português, é também
punível pela legislação do lugar da prática do facto, o crime admite
extradição, mas esta não pode ser concedida ao abrigo do disposto no
art. 33.º, n. 3, da CRP. A lei portuguesa poderia ceder perante a lei
grega se esta fosse mais favorável, porém, não é o caso.

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