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19801

Brazilian Journal of health Review

Epilepsia e depressão: fatores neuropsicológicos e sociais

Epilepsy and depression: neuropsychological and social factors

DOI:10.34119/bjhrv3n6-354

Recebimento dos originais: 10/11/2020


Aceitação para publicação: 30/12/2020

Mariana Marques Teixeira


Acadêmica do Curso de Medicina
Centro Universitário Alfredo Nasser - UNIFAN
Rua R-18, N 187, Vila Itatiaia – Goiânia/GO - 74690430
med.marianamarques@gmail.com

Chrystianne Ferreira da Silva


Acadêmica do Curso de Medicina
Centro Universitário Alfredo Nasser - UNIFAN
Avenida Pedro Ludovico, N 536, Centro – Anápolis/GO - 75023150
chrystianneavlis@gmail.com

RESUMO
Entende-se que o impacto da epilepsia não é determinado apenas pelos aspectos clínicos e gravidade
das crises, mas também por fatores psicológicos e sociais. A imprevisibilidade, o controle ineficaz e
o comportamento durante e após as crises convulsivas, podem causar sentimento de culpa, vergonha
e dependência, levando as pessoas com epilepsia ao isolamento, o qual reforça o estigma social
construído historicamente em torno da doença. Para uma compreensão mais ampla do estado de saúde
dessas pessoas, é fundamental realizar uma abordagem holística que vise atingir seu bem-estar físico,
psíquico e social. O objetivo dessa revisão de literatura científica é buscar a relação entre epilepsia e
depressão, evidenciando aspectos que possuem impacto direto na qualidade de vida desses pacientes.
Como material e método para pesquisa, buscamos os descritores “epilepsia”, “depressão” e “estigma
social” nos bancos de dados bibliográficos Medline, Embase, LILACS e SciELO, além de
documentos oficiais. Como resultados, encontramos que aproximadamente 30% das pessoas com
epilepsia não respondem aos fármacos antiepilépticos, tornando-se mais vulneráveis aos transtornos
depressivos, os quais possuem prevalência variando entre 15% e 60%, cerca de 17 vezes maior que
na população geral. Ensaio Clínico que acompanhou 53 crianças com epilepsia do lobo temporal
resistente a medicamentos por 5 anos, observou que o grupo cirúrgico teve um aumento significativo
no QI e melhor resultado psicossocial. Depressão e epilepsia podem compartilhar mecanismos
patogenéticos, porém na prática clínica ocorre demora injustificável em tratar o transtorno de humor.
Conclui-se que existe uma relação direta e indireta entre epilepsia e depressão. Portanto, deve-se
referenciar precocemente esses pacientes para um centro especializado com equipes
multidisciplinares para definir melhores estratégias de tratamento. É necessário promover projetos
para orientação da comunidade, visando diminuir o estigma social, além de oferecer suporte aos
familiares, aos quais são pilares fundamentais para o sucesso da abordagem desses pacientes.

Palavras-chave: Epilepsia, Depressão, Estigma social

ABSTRACT
It is understood that the impact of epilepsy is not only determined by the clinical aspects and severity
of the attacks, but also by psychological and social factors. Unpredictability, ineffective control and
behavior during and after seizures can cause feelings of guilt, shame and dependence, leading people
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with epilepsy to isolation, which reinforces the social stigma built historically around the disease. For
a broader understanding of the health status of these people, it is essential to take a holistic approach
that aims to achieve their physical, psychological and social well-being. The purpose of this review
of the scientific literature is to seek the relationship between epilepsy and depression, highlighting
aspects that have a direct impact on the quality of life of these patients. As material and method for
research, we searched for the descriptors "epilepsy", "depression" and "social stigma" in the
bibliographic databases Medline, Embase, LILACS and SciELO, in addition to official documents.
As a result, we found that approximately 30% of people with epilepsy do not respond to antiepileptic
drugs, becoming more vulnerable to depressive disorders, which have a prevalence ranging between
15% and 60%, about 17 times higher than in the general population. Clinical trial that followed 53
children with drug-resistant temporal lobe epilepsy for 5 years, found that the surgical group had a
significant increase in IQ and a better psychosocial result. Depression and epilepsy can share
pathogenic mechanisms, but in clinical practice there is an unjustifiable delay in treating mood
disorder. It is concluded that there is a direct and indirect relationship between epilepsy and
depression. Therefore, these patients should be referred early to a specialized center with
multidisciplinary teams to define better treatment strategies. It is necessary to promote projects for
community orientation, aiming to reduce social stigma, in addition to offering support to family
members, who are fundamental pillars for the success of these patients' approach.

keywords: Epilepsy, Depression, Social stigma

1 INTRODUÇÃO
Crise epiléptica resulta da alteração súbita e transitória da função cortical, decorrente de
descargas neuronais sincrônicas, excessivas e autolimitadas, expressas por mudanças no movimento,
comportamento ou emoções. A Associação Brasileira de Epilepsia (ABE) propõe a definição de
epilepsia baseada na publicação pela Liga Internacional contra a Epilepsia (ILAE) em 2005, como
um distúrbio do cérebro caracterizado pela predisposição persistente em gerar crises epilépticas e
pelas consequências neurobiológicas, cognitivas e psicossociais desta condição.
O processo em que, após um insulto cerebral agudo, alterações patológicas e fisiológicas
gradualmente ocorrem em determinadas regiões cerebrais, levando à expressão de epilepsia, é
referido como hoje como epileptogênese. A epileptogênese deve-se a um desequilíbrio entre os
mecanismos de inibição e de excitação sináptica que atuam em uma população neuronal suscetível,
levando a um estado de hiperexcitabilidade e hipersincronia. Estas alterações podem ser devido à
predisposição genética ou alterações estruturais dos circuitos neuronais, sendo mediadas por
neurotransmissores e canais iônicos (DICHTER e WEIBERG, 1997). Uma das hipóteses é que as
crises são causadas por um aumento na ativação da via que utiliza o glutamato como neurotransmissor
excitatório e/ou uma diminuição na via que utiliza o GABA como neurotransmissor inibitório
(MORIMOTO et al., 2004).
As primeiras referências sobre epilepsia surgiram em torno do ano 2000 a.C. na antiga
Babilônia, atribuindo à epilepsia caráter mágico e sagrado, pois acreditava-se que ela era a
manifestação de espíritos do mal ou a expressão do descontentamento divino. (REYNOLDS, 1996).

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A primeira descrição da epilepsia como doença pode ser encontrada na coletânea conhecida como
Corpus Hippocraticum, uma coletânea composta por sessenta tratados do período da Grécia Clássica,
cerca de 400 a.C., em que Hipócrates afirmou que a causa da epilepsia não estava em espíritos
malignos, mas seria causada por um excesso de flegma no cérebro, que, quando em contato com o
sangue, provocaria as crises epilépticas (TEMKIN,1994).
A era da epileptologia, strictu sensu, começou em 1861, quando John Hughlings Jackson (1835-
1911), fundador da “epileptologia moderna”, correlacionou as crises convulsivas com uma disfunção
cerebral. Nos anos seguintes, novas hipóteses foram sendo feitas, até que em 1870 o seu conceito
mudou: as crises seriam originadas no córtex cerebral (JACKSON, 1873 e 1970).
A partir dos anos 1970, com a concretização dos conhecimentos anatomopatológicos,
eletrofisiológicos e neuropsicológicos adquiridos e dos resultados cirúrgicos obtidos nos anos
anteriores, associada a novos métodos de imagem, houve uma expansão mundial grandiosa na
abordagem das epilepsias (PASSOS, 2017).
Atualmente, o uso de todos os recursos disponíveis, por um grupo multidisciplinar dedicado
especificamente ao tratamento cirúrgico da epilepsia, é capaz de fazer um diagnóstico preciso,
identificar pontualmente a zona ictal primária e realizar a ressecção específica dessa área cerebral,
obtendo a maior taxa de controle das crises com os menores riscos de déficits funcionais (PASSOS,
2017).
Estima-se que a prevalência mundial de epilepsia ativa esteja em torno de 0,5% a 1,0% da
população. Nos países desenvolvidos, a prevalência da epilepsia aumenta proporcionalmente com o
aumento da idade, enquanto nos países em desenvolvimento geralmente atinge picos na adolescência
e idade adulta (BANERJEE et al., 2009). A probabilidade geral de um indivíduo ser afetado pela
epilepsia ao longo da vida é de cerca de 3%. (KWAN & BRODIE, 2000)
Um estudo importante sobre o risco de recorrência de crises epilépticas não provocadas foi feito
por Hauser et al. (1998). Os autores seguiram 204 indivíduos que apresentaram uma primeira crise
epiléptica por até 72 meses para verificação do risco de recorrência de novas crises. Após uma
primeira crise, observou-se que o risco de recorrência de uma segunda foi de 26% a 40%. Após duas
crises, o risco de uma terceira foi de 60% a 87%, e após a terceira crise, o risco de uma quarta foi
aproximadamente o mesmo (61% a 90%) e manteve-se estável.
Por essa razão, em 2014, a ILAE preconizou-se, a critério médico, o início do tratamento após
a segunda crise, e propôs uma definição operacional (prática) de epilepsia como uma doença do
cérebro caracterizada por uma das seguintes condições: Pelo menos duas crises não provocadas (ou
duas crises reflexas) ocorrendo em um intervalo superior a 24 horas; Uma crise não provocada (ou

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uma crise reflexa) e chance de ocorrência de uma nova crise estimada em pelo menos 60%;
Diagnóstico de uma síndrome epiléptica.
Sabe-se que o impacto da epilepsia não é determinado apenas pelos aspectos clínicos,
frequência e gravidade das crises, mas também por fatores psicológicos e sociais, e suas implicações
na qualidade de vida, que nesses casos refratários, são potencializados (ALBUQUERQUE &
SCORZA, 2007).
Os pacientes com epilepsia resistente ao tratamento medicamentoso são, em geral, dependentes
dos familiares e têm uma baixa qualidade de vida. Além dos efeitos colaterais consideráveis pelo uso
de medicação em doses máximas, é comum que elas se isolem na tentativa de evitar maior exposição,
o que pode gerar um estado de sofrimento psíquico permanente e graves consequências sociais, pela
perda de relacionamentos interpessoais e pelo abandono ou afastamento de atividade acadêmicas e
profissionais (DE BOER et al, 2008; VITEVA, 2013).
Assim, para uma compreensão mais ampla do estado de saúde dessas pessoas, é fundamental
conhecer suas condições de vida, as visões que têm acerca da doença, as dificuldades impostas e
como reagem a elas (ALBUQUERQUE & SCORZA, 2007), para então realizar uma abordagem
holística que vise atingir seu bem-estar físico, psíquico e social.

2 OBJETIVOS
O objetivo desse estudo é estabelecer a relação entre epilepsia e depressão, evidenciando a
importância do tratamento integral do paciente ao abordar os aspectos sociais e emocionais, os quais
possuem impacto direto na qualidade de vida.

3 MÉTODOS
Teorizamos nosso estudo a partir de bancos de dados bibliográficos da Biblioteca Virtual em
Saúde (BVS), selecionando informações para embasamento histórico e clínico até as últimas
atualizações sobre a Epilepsia, por meio de publicações da Literatura Internacional em Ciências da
Saúde (Medline), Literatura Latino Americana e do Caribeem Ciências da Saúde (LILACS),
Scientific Eletronic Library Online (SciELO ) e Excerpta Medica dataBASE (Embase), além do livro
Tratado de psiquiatria (2018) e documentos oficiais.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Mesmo após os avanços dos fármacos antiepilépticos, aproximadamente 30% dos pacientes não
respondem à terapêutica clínica, tornando-se refratários ao tratamento medicamentoso (LÖSCHER,
2002).

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A Liga Internacional contra a Epilepsia (ILAE) define Epilepsia Refratária ou de difícil
controle medicamentoso, como a persistência na frequência das crises epilépticas após o uso de pelo
menos duas medicações devidamente indicadas para o tipo de crise, utilizadas em monoterapia ou
combinação.
Indivíduos com epilepsia apresentam duas a três vezes mais chances de morrerem subitamente
quando comparados com indivíduos sem a patologia, sendo que a categoria de morte mais comum
nesses casos é o fenômeno da morte súbita e inesperada na epilepsia/SUDEP (HAUSER et al., 1996).
A incidência da SUDEP é considerada alta em pacientes com epilepsia crônica (1-2/1.000
pessoas/ano) e maior nos indivíduos refratários ao tratamento farmacológico (3-9/1.000 pessoas/ano)
(HEMB et al., 2013).
Uma Coorte Retrospectiva, realizada por Kwan & Brodie (2000), analisou 525 pacientes com
epilepsia e verificou que entre os pacientes que não tiveram resposta ao primeiro medicamento,
apenas 11% conseguiram o controle após o segundo medicamento, quando a falha do tratamento foi
devido à falta de eficácia, 41% quando devido a efeitos colaterais intoleráveis, e 55% quando devido
a reação idiossincrático. Portanto, crises recorrentes antes do início do tratamento, ou resposta
inadequada ao tratamento inicial com drogas antiepilépticas, são preditores de epilepsia refratária.
Entre as epilepsias refratárias, aquelas com origem no lobo temporal são as mais freqüentes
(BLÜMCKE et al., 1996). Nesses casos, além de aumentar, momentaneamente, a perda de controle,
torna tais pessoas mais suscetíveis a quedas e a ocorrência de traumatismos, o que pode comprometer
a sua autonomia e, portanto, gerar maior dependência de cuidados de outras pessoas (NGUGI et al.,
2010; NEWTON et al., 2012; KWAN et al, 2010).
Skirrow et al. (2011) acompanhou 53 crianças com epilepsia do lobo temporal resistente a
medicamentos, sendo que 42 crianças foram submetidas à cirurgia de ressecção do lobo temporal e
11 crianças não tiveram intervenção cirúrgica. Observaram um aumento significativo no QI e melhor
resultado psicossocial no grupo cirúrgico após 5 anos de acompanhamento, sendo associado à
cessação da medicação antiepiléptica e mudanças no volume de substância cinzenta. Essa mudança
não foi encontrada no grupo de comparação não cirúrgico.
Assim, os pacientes refratários ao tratamento clínico e que não realizaram abordagem cirúrgica,
seja por não se enquadrarem nos critérios de inclusão, ou por não terem sido encaminhados para
avaliação em centros especializados, possuem maiores chances sofrerem com problemas relacionados
a diversos aspectos de vida, bem como ao contexto social e cultural em que estão inseridos.
O estigma social é identificado como um aspecto importante a ser abordado durante o
tratamento desses pacientes. Sentimentos de desvalorização, vergonha e medo, decorrentes de visões

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negativas em torno da doença, podem resultar no isolamento social, o qual reforça preconceitos
construídos historicamente em torno dela (VITEVA, 2013).
Estudos que analisam preconceitos e estigmas relacionados à epilepsia apontam que a
imprevisibilidade da crise e a perda de controle que ela acarreta, tendem a expor os pacientes a
situações desconfortáveis, uma vez que, no pós-crise, ao recobrar a consciência, podem se deparar
com reações negativas por parte daqueles que a presenciaram (ELLIOTT et al, 2009; BOER et al,
2008).
Os pacientes com epilepsia referem uma constante sensação de serem diferentes,
desvalorizados e um incômodo para seus familiares (HOSSEINI et al, 2013; MAHRER-IMHOF et
al, 2012). Essas pessoas buscam incentivo, aceitação e apoio nas diversas relações pessoais e, em
especial, nas familiares. Famílias capazes de lidar de forma adequada com implicações decorrentes
da epilepsia tendem a ajudar o paciente a superar o medo, o isolamento e a dependência, contribuindo,
dessa forma, para melhorar sua qualidade de vida (CHONG et al, 2012).
Em relação aos amigos, a maioria refere haver um afastamento. Tais resultados corroboram
com achados em outras pesquisas a partir das quais foi possível verificar as dificuldades para
estabelecer relações interpessoais (HOSSEINI et al, 2013; SAENGSUWAN et al, 2012).
Dificuldades com o contexto de trabalho vêm sendo apontadas como prejudiciais, já que ter
um emprego e poder desempenhar uma atividade laboral não atendem, exclusivamente, a uma
necessidade financeira, mas estão diretamente relacionadas à autoestima, ao sentimento de
pertencimento a um grupo e à possibilidade de participação social (NICKEL et al, 2012). De qualquer
forma, mesmo quando empregadas, podem ser vítimas de preconceitos e/ou de situações
constrangedoras devido ao desconhecimento dos colegas de trabalho acerca da doença e da
incapacidade e receio de ajudar a pessoa durante uma crise (DE BOER, 2010).
Todas essas informações justificam os vários estudos que mostram que a prevalência de
transtornos depressivos em pacientes com epilepsia é significativa. Autores concordam que entre 15%
e 60% dos indivíduos que sofrem de epilepsia são acometidos também por depressão, cerca de 17
vezes maior que na população geral (HAJSZAN & MACLUSKY, 2006).
Entretanto, esses pacientes estão sujeitos à falha diagnóstica da depressão, que decorre de
inúmeros fatores, dentre eles: dificuldade de reconhecimento dos sintomas atípicos; tendência do
médico e do próprio paciente de minimizar os sintomas tanto por atribuição de caráter reacional à
epilepsia quanto ao medo de serem estigmatizados; e a preocupação de que os antidepressivos
diminuam o limiar convulsivo (KANNER & BALABANOV, 2002).
É importante considerar que a depressão e epilepsia podem compartilhar mecanismos
patogenéticos que facilitam a ocorrência de um na presença do outro. É frequentemente possível

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encontrar concordância cronológica entra um episódio depressivo e a primeira crise epiléptica.
(KANNER & BALABANOV, 2002) A diminuição da função noradrenérgica, GABAérgica e
serotoninérgica são identificados como fundamentais nos mecanismos patogenéticos da depressão. A
diminuição desses fatores e consequentemente das suas ações, são apontadas como facilitadoras do
processo de crises epilépticas, exacerbando a predisposição às crises (KANNER et al, 2004). Assim,
os fármacos antiepilépticos podem ter efeito negativo direto no humor. Da mesma forma, há suspeitas
de que o uso de medicações antidepressivas pode exercer influência na diminuição do limiar
convulsivo (GROSS et al, 2000).
No entanto, de forma geral, o uso de antidepressivos, quando utilizados na dosagem
recomendada, tem pouca chance de produzir ou exacerbar crises, e a introdução gradual das drogas
antiepilépticas parece ser capaz de prevenir a piora do humor (MARTINS & GONÇAVES, 2017).
Apesar da associação epilepsia-depressão já ser bastante documentada, observa-se na pratica
clínica uma demora injustificável em tratar o transtorno de humor nos indivíduos portadores de
epilepsia. A importância do tratamento concomitante da depressão nesses pacientes fica evidente
quanto ao efeito negativo na qualidade de vida dos pacientes.
É necessário que neurologistas e psiquiatras estejam preparados para conduzir
satisfatoriamente estes casos. Para isso, a disseminação de conhecimento sobre epilepsia, transtornos
mentais e dificuldades sociais associados a ela, é importante instrumento na luta contra o duplo
estigma, a falha diagnóstica e a lacuna de tratamento.

5 CONCLUSÃO
A partir da observação da realidade de pacientes com epilepsia refratária e dos estudos
realizados para embasamento teórico sobre a doença, podemos concluir que existe uma relação direta
e indireta entre epilepsia e depressão. Mesmo sendo difícil estabelecer com clareza a ligação
patogenética entre essas duas doenças, é importante reconhecer que causas neurológicas em comum
estão possivelmente relacionadas. Para oferecer melhor qualidade de vida para esses pacientes, deve-
se reforçar na classe médica os fatores clínicos preditores de epilepsia refratária, com o intuito de
referenciar precocemente esses pacientes para um centro especializado com equipes
multidisciplinares para definir melhores estratégias de tratamento e, consequentemente, diminuir as
taxas de morte súbita e comorbidades, como transtornos depressivos. Por fim, é necessário promover
projetos para orientação da comunidade, visando diminuir o estigma social, além de oferecer suporte
aos familiares, aos quais são pilares fundamentais para o sucesso da abordagem desses pacientes.

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