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A TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL COMO TRATAMENTO DA

ESCLEROSE MÚLTIPLA: POSSÍVEIS INTERVENÇÕES CLÍNICAS

Elaine Rose Pereira Matos1

RESUMO

A preocupação básica deste estudo é refletir sobre a influência da desregulação emocional sobre as
doenças autoimunes, especificamente a Esclerose Múltipla (EM) e possíveis intervenções
psicoterapêuticas. Este artigo tem como objetivo analisar e descrever a técnica da atenção plena
como ferramenta utilizada pela terapia cognitivo-comportamental (TCC) no tratamento da mesma.
Realizou-se uma pesquisa bibliográfica de caráter exploratória qualitativa cujo a base de dados foram
artigos, livros, revistas, e plataformas digitais, procurando entender e explicar como funciona a
relação das emoções com a patologia, bem como o Mindfulness (Atenção Plena) intervém de modo
positivo no quadro clínico do paciente. Concluiu-se que embora não haja estudos relacionando a
prática da atenção plena em pacientes com EM, existem várias pesquisas que demostram os
benefícios para sintomas associadas a esta doença, tais como: depressão, estresse e ansiedade, e
também, as possíveis contribuições terapia cognitiva. Logo, faz-se necessário a ampliação de
pesquisas voltadas a esta área, já que existe a possibilidade de maior adesão do paciente a esta
prática devido a seu baixo custo e acessibilidade.

Palavras-chave: Esclerose Múltipla. Mindfulness. Neuropsicologia. Terapia


Cognitivo-comportamental.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema a Esclerose Múltipla, doença autoimune,


e as possíveis intervenções clínicas no processo terapêutico, a partir de um
referencial bibliográfico. Nesta perspectiva, construiu-se questões que nortearam
este trabalho: 1) Qual a influência da desregulação emocional sobre a Esclerose
Múltipla, doença autoimune? 2) Quais principais técnicas e ferramentas da Terapia
cognitivo-comportamental para trabalhar a desregulação emocional?
Dada a forte relação entre o sistema nervoso, o sistema endócrino e o
sistema imunológico, o estudo do sistema cognitivo-comportamental da pessoa com
EM poderá contribuir no seu processo de tratamento e qualidade de vida, de forma
menos invasiva, pois trabalha-se a Cognição (pensamentos), através da percepção
e ressignificação do mesmo, já que segundo a neuroplasticidade, uma das formas
mais eficientes de estimular os circuitos cerebrais é por meio do próprio
pensamento.
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Conforme Valéria Alvim (2016), em sua teoria da neuroplasticidade, e onde a


Terapia cognitivo-comportamental pode atuar, “Doidge, defende uma tese
interessante: os circuitos cerebrais tendem a ficar dormentes e uma das formas mais
eficientes de estimulá-los é por meio do próprio pensamento.”
Neste contexto, o objetivo primordial deste estudo foi descrever e analisar a
influência da desregulação emocional sobre às doenças autoimunes (EM) e,
elaborar um tratamento para essas pessoas com base na Terapia cognitivo-
comportamental.
Para alcançar a temática aqui proposta, utilizou-se a pesquisa bibliográfica de
caráter exploratória qualitativa, realizada a partir da análise criteriosa de artigos,
livros, revistas, e das plataformas Scielo, Pepsico, Google Acadêmico, pesquisas na
web, dentre outros materiais publicados, envolvendo os temas esclerose múltipla,
neuropsicologia e terapia cognitivo-comportamental.

2 A ESCLEROSE MÚLTIPLA

A EM, segundo Catarina Marques (2011), é uma doença crônica, inflamatória


do Sistema Nervoso Central, autoimune, desmielinizante, de complexo diagnóstico,
por se apresentar de forma sutil e cujo sintomas se apresentam de forma transitória.
Nela o sistema imunológico do corpo ataca as células saudáveis confundindo-as
como “intrusas”, corroendo a bainha de mielina, provocando lesões que atingem o
cérebro, os nervos ópticos e a medula espinhal.
A Associação Brasileira de Esclerose Múltipla, 2013, informa que essa
doença acomete com maior frequência jovens adultos e na maioria, mulheres entre
20 e 50 anos de idade. É uma doença multifatorial que resulta da interação de
fatores genéticos, ambientais e imunológicos. Estudos apontam que as pessoas
acometidas por ela apresentam mudanças afetivas e cognitivas. Segundo Umphred
(2010, p.1952):

Em torno de 50% das pessoas com EM mostram evidência de algum


prejuízo cognitivo. A maioria desses indivíduos tem prejuízo leve, e
aproximadamente 10% a 20% mostram disfunção cognitiva significativa. As
pesquisas não dão suporte à ideia de que a ocorrência dos sintomas
cognitivos esteja relacionada à severidade dos sintomas físicos ou à
duração da doença. Especificamente, funções cognitivas que parecem ser
mais afetadas são memória de curta duração, raciocínio conceitual e
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Psicóloga, pela União Metropolitana de Educação e Cultura, especializando em Terapia Cognitivo-
comportamental pela Capacitar. E-mail: elainematos83@hotmail.com
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resolução de problemas. Fluência verbal e velocidade de processamento de


informação.

Charcot, em 1881, já havia observado alterações afetivas em seus pacientes,


como apatia, choro e risos imotivados, depressão e mania.
A Esclerose Múltipla é doença tida por muitos autores como desafiadora.
Nela, observa-se uma desregulação emocional que varia de acordo ao sujeito. O
índice de stress, ansiedade e depressão determina o quão difícil é a relação do
mesmo com a doença, exigindo uma maior atenção e energia de todos os
envolvidos no processo de resposta à mesma. Para Umphred (2010, p.1952):

A personalidade, história, vida cultural pregressa do indivíduo, e a família e


comunidade influenciam na resposta à doença. A natureza da incapacidade
em si também vai, evidentemente, influenciar a resposta emocional do
paciente. A EM é uma doença emocionalmente desafiante, e todos os
membros da família sentem esse impacto. Ansiedade e pesar, acompanham
o diagnóstico e podem aparecer e reaparecer com o curso da doença e com
as circunstâncias particulares do indivíduo.

O Canal Brasileiro de Notícias (CBN), 2016, afirma que segundo a


imunologista Ekaterine Simões Goudouri, estresse, alimentação inadequada, altos
índices de poluição acabam afetando o organismo, tornando-o mais sensível a
inflamações e desregulações.
As alterações psicológicas e comportamentais estão associadas a alterações
fisiológicas, evidenciando a comunicação entre os sistemas imune, endócrino e
nervoso durante o estresse. Não saber lidar com a situação adoecedor, agrava o
problema, tendo em vista o constante estado de alerta, que segundo Williams (2011,
p.17), “uma centelha de tristeza, frustração ou ansiedade pode trazer de volta
lembranças perturbadoras, e logo você estará perdido em emoções negativas e
pensamentos sombrios.” Que, consequentemente, reforça o comportamento
estressor. Para ele: “...certos padrões de pensamento podem transformar uma
tristeza ou um desânimo passageiro em um estado prolongado de infelicidade,
ansiedade, estresse e exaustão.”
Neste aspecto, Pagnini et al. (2014, 2015; apud Pimenta & Guilherme, 2018)
afirma que fatores psicológicos, tais como ansiedade e depressão comprometem a

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qualidade de vida do paciente, pois o diagnóstico da doença (EM) altera o seu dia-a-
dia.
Segundo Gaspar (2015), o músculo da mente pode ser treinado pelo
desenvolvimento da técnica meta-atenção, colocando a atenção na respiração e,
mediante distrações, o desafio passa por voltar a trazer, gentilmente, o foco para a
respiração. Que definida por Kabat-Zinn (1994, cit, por Young, S., 2011, p.75), é
“prestar atenção de forma particular com uma intenção, no momento presente e sem
julgamento”.
Kabat-Zinn criou o programa Mindfulness-Based Stress Reduction (MBSR),
de 8 semanas, cujos benefícios têm sido demonstrados tanto para a população em
geral, como para doenças crônicas (PIMENTA & GUILHERME et al., 2014).
Para Williams (2011, p.13),

“A prática da atenção plena não só previne a depressão, como afeta


positivamente os padrões cerebrais responsáveis pela ansiedade e pelo
estresse do dia a dia, fazendo com que, uma vez instalada, essa condição
se dissolva com mais facilidade.”

Alvim (2016), relata que em uma pesquisa realizada pelos cientistas da


Universidade da Califórnia, em Los Angeles, um grupo de pessoas que possuíam o
hábito de meditar entre dez e noventa minutos por dia, há no mínimo quatro anos, as
áreas associadas à regulação das emoções (hipocampo, córtex orbito frontal, tálamo
e o giro temporal inferior) eram maiores à daqueles que não praticaram com
regularidade.

“Pesquisas indicam que a meditação fortalece o sistema imunológico.” (WILLIAMS,


et al. 2011, p.14)

Segundo Beck, 1967, as cognições têm um papel importante no desenvolvimento e


manutenção da depressão.

A terapia cognitiva é um tratamento psicológico organizado e sistemático que ensina


as pessoas a mudarem os pensamentos, crenças e atitudes que desempenham um
papel importante em estados emocionais negativos como ansiedade ou depressão.
(BECK & CLARK, 2014)

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3 CONCLUSÃO

Para a TCC as cognições têm um papel importante no desenvolvimento e


manutenção da depressão. Nesta, permeia os pensamentos automáticos (PA) e
atitudes disfuncionais.
Esta abordagem utiliza-se de técnicas e instrumentos (questionamentos
socráticos, descoberta guiada, Advogado de defesa, Ativação comportamental,
Registro de Pensamentos Diários – RPD, Cartões de enfrentamento, Mindfulness,
entre outros) para identificar e modificar PA, comportamentos e crenças
disfuncionais.
A psicoterapia, no entanto, varia consideravelmente de acordo com o
paciente, a natureza de suas dificuldades, metas, habilidade de formar vínculo e o
grau de engajamento no processo.
Ela é composta de pilares conceituais que permitem perceber a construção
dos esquemas, as crenças centrais e intermediárias e os pensamentos automáticos
disfuncionais.
Diante do exposto, a TCC tem muito a contribuir no processo terapêutico do
paciente com EM e de seus cuidadores, de forma individual ou em grupo, com foco
na queixa principal, consequentemente no momento presente.
Sendo assim, conclui-se que, embora haja a necessidade de maiores
estudos relacionados ao tema, é possível desenvolver um plano de tratamento
fundamentado na atenção plena e na Terapia cognitiva, tanto para pessoas com
esclerose múltipla, quanto para seus cuidadores.
Por não ser um tratamento invasivo, ser de baixo custo e fácil acesso,
possibilita uma maior adesão ao processo por parte do paciente, proporcionando-o
uma determinada qualidade de vida.

4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FRANKEL, Debra I. Esclerose Múltipla. In: UMPHRED, Darcy A. Reabilitação


Neurológica, p.1952. Rio de Janeiro, 2010.

BECK, Aaron T. & CLARK, David A. Vencendo a Ansiedade e a Preocupação:


com a terapia cognitivo-comportamental. São Paulo. 2012.
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Psicóloga, pela União Metropolitana de Educação e Cultura, especializando em Terapia Cognitivo-
comportamental pela Capacitar. E-mail: elainematos83@hotmail.com
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PENMAN, Danny e WILLIAMS, Mark. Atenção Plena: Mindfulness. Rio de Janeiro,


2011.

GASPAR, Vasco. Aqui e agora: mindfulness. Matéria-Prima Edições. 2015.

ALVIM, Valéria. Como o cérebro ajuda a curar o corpo. O cérebro como aliado da
cura, São Paulo, Segmento, ANO XII, Nº286, p.20-25, nov. 2016.

MARQUES, Catarina E.V.C.M.C. Doenças autoimunes do sistema nervoso. In:


Mestrado em análises clínicas, Lisboa, 2011.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESCLEROSE MÚLTIPLA. Disponível em:


http://abem.org.br/esclerose/diagnostico/ . Acesso em 08 de ago. 2018.

CANAL BRASILEIRO DE NOTÍCIAS. Doenças autoimunes: a luta é dia a dia. Disponível


em: https://cbn.globoradio.globo.com/especiais/doencas-autoimunes/2016/11/07/
DOENCAS-AUTOIMUNES-A-LUTA-E-DIA-A-DIA.htm Acesso em 26 jun. 2018.

BIOSAÚDE. Estresse: revisão sobre seus efeitos no sistema imunológico. Disponível


em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/biosaude/article/view/24304 . Acesso em
14 mai. 2018.

GUILHERME, Inês Torres et al. Meditação mindfulness e esclerose amiotrófica


(ELA): uma revisão de literatura. Revista Hórus. V.5, n.2, p.210-221, 2010.
Disponível em: http://dx.doi.org/10.15309/18psd190109. Acesso em outubro de
2018.

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Psicóloga, pela União Metropolitana de Educação e Cultura, especializando em Terapia Cognitivo-
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