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de novelo de linha a manchester

paulista – fábrica têxtil e cotidiano


no início do século xx em
sorocaba

neide maria perez (organizadora)


paulo celso da silva
Inverno de 1999

Produção Editorial
TEASER DESIGN

REVISÃO
Armando Oliveira Lima

Capa
paulo celso da silva
infopoema novelo-manchester em p/b

Silva, Paulo Celso da


De novelo de linha a Manchester Paulista – Fábrica
Têxtil e Cotidiano no início do século XX em
Sorocaba / Silva, Paulo Celso da. Organização de Neide Maria
Perez – Sorocaba : Teaser Design, 1999

1. História de Sorocaba 2. Geografia de Sorocaba 3.


Economia 4. Movimento operário 5. Cotidiano I. Título

Índices para catálogo sistemático


1. História de Sorocaba : Industrialização

Proibida reprodução total ou parcial, por qualquer meio, sem o


prévio consentimento da editora
TEASER DESIGN
Agradecimentos:

. À Neide, Guilherme e Cássia que suspenderam meu


cotidiano.

. Ao Gilson Brizacco, amigo sempre nas horas mais


trabalhosas.

. Ao Professor Acassil José de Oliveira Camargo, mecenas.

. Ao casal Jacir e Eulza, meus pais, pelo apoio sem medida.

. Ao Nando e o Jotacê pela força.

. Ao Professor Armando Oliveira Lima, Mestre dos Mestres.

. A John, Paul, George, Ringo pelo fundo musical em todas as


horas.

. Àquela criança que se foi quando tudo estava começando,


provando que é “Tão grande ser tão pouco”.

. A todos aqueles que minha memória omite, mas ajudaram...


Dedicado:

À Professora Maria Lúcia de Amorim Soares que me colocou


na geografia com uma borracha...

À Genésia Mencacci (IN MEMORIAM) presença constante


para sempre.
“...Nosso programa é simples - basta entrarmos na
bandeira. Dar vida, força e sentido a um lemma que até hontem
parecia vasio e ironico - ORDEM E PROGRESSO. Milagre
das idéias chamadas subversivas.
...Dum paiz que possue a maior reserva de ferro e o
mais alto potencial hydraulico, fizeram um pais de sobremeza.
Café, assucar, fumo, bananas.
Que nos sobrem ao menos aos bananas!”
Ordem e Progresso in O homem do Povo - SP, 27/3/1931 no. 01 (coleção
completa e fac-similar dos jornais escritos por Oswald de Andrade e
Patrícia Galvão (PAGU) Imprensa Oficial do Estado S. Paulo 1984.

“No passado, não trabalhar não era essa coisa do outro mundo
que é hoje”

Jorge Guinle
Revista Isto É, no 1253, p. 6.
6/10/93
No interrogatório, comunicam-lhe que a vão expulsar.
- Você é estrangeira!
Mas ela não conhece outro país. Sempre dera o seu
trabalho aos ricos do Brasil, sorri numa amargura. Vão levá-la
para sempre do Brás...Que importa? Ela ouvira dos próprios
defensores do presídio social: - Pobre não tem pátria!
Mas deixar o Brás! Para ir aonde?
...Que importa! Se em todos os países do mundo
capitalista ameaçado, há um Brás.
Outros ficarão...
. ... BRÁS DO BRASIL. BRÁS DE TODO O MUNDO.

Mara Lobo (Pagu ) - Parque Industrial 1933


(CONTRACAPA)

“APOIO INSTITUCIONAL DA PREFEITURA


MUNICIPAL DE SOROCABA “ – Lei n° 5.736/98
Dissertação apresentada como exigência parcial
para a obtenção do grau de Mestre em Geografia
Humana à Comissão Julgadora da Universidade
de São Paulo, sob a orientação do Professor Dr.
Paulo Pedro Perides.
Agradecimento Especial:

. Ao PROF. DR. PAULO PEDRO PERIDES pelo incansável apoio no


caminho a ser percorrido.
Agradecimentos:

. À Neide, Guilherme e Cássia que suspenderam meu cotidiano.

. Ao Gilson Brizacco, amigo sempre nas horas mais trabalhosas.

. Ao Professor Acassil José de Oliveira Camargo, mecenas.

. Ao casal Jacir e Eulza, meus pais, pelo apoio sem medida.

. Ao Nando e o Jotacê pela força.

. Ao Professor Armando Oliveira Lima, Mestre dos Mestres.

. A John, Paul, George, Ringo pelo fundo musical em todas as horas.

. Àquela criança que se foi quando tudo estava começando, provando que é “Tão grande ser tão
pouco”.

. Ao CNPQ, pelo financiamento parcial das pesquisas.

. A todos aqueles que minha memória omite, mas ajudaram...


Dedicado:

À Professora Maria Lúcia de Amorim Soares que


me colocou na geografia com uma borracha...

À Genésia Mencacci (IN MEMORIAM) presença


constante para sempre.
“...Nosso programa é simples - basta entrarmos na bandeira. Dar vida, força e sentido a um
lemma que até hontem parecia vasio e ironico - ORDEM E PROGRESSO. Milagre das idéias
chamadas subversivas.
...Dum paiz que possue a maior reserva de ferro e o mais alto potencial hydraulico, fizeram
um pais de sobremeza. Café, assucar, fumo, bananas.
Que nos sobrem ao menos aos bananas!”

Ordem e Progresso in O homem do Povo - SP,


27/3/1931 no. 01 (coleção completa e fac-similar
dos jornais escritos por Oswald de Andrade e
Patrícia Galvão (PAGU) Imprensa Oficial do
Estado S. Paulo 1984.

“No passado, não trabalhar não era essa coisa


do outro mundo que é hoje”
Jorge Guinle
Revista Isto É, no 1253, p. 6.
6/10/93

No interrogatório, comunicam-lhe que a vão expulsar.


- Você é estrangeira!
Mas ela não conhece outro país. Sempre dera o seu trabalho aos ricos do Brasil, sorri numa
amargura. Vão levá-la para sempre do Brás...Que importa? Ela ouvira dos próprios defensores do
presídio social: - Pobre não tem pátria!
Mas deixar o Brás! Para ir aonde?
...Que importa! Se em todos os países do mundo capitalista ameaçado, há um Brás.
Outros ficarão...
. ... BRÁS DO BRASIL. BRÁS DE TODO O MUNDO.

Parque Industrial
Mara Lobo (Pagu)
1933
1
ÍNDICE

I. INTRODUÇÃO....2
II - ORIGEM DAS FEIRAS E DO REGISTRO DE ANIMAIS DE
SOROCABA....12
III. A MANUFATURA E O ARTESANATO LIGADOS ÀS
FEIRAS....19
IV. A PRIMEIRA EXPERIÊNCIA FABRIL TÊXTIL EM SOROCABA -
1852....28
V. A ECONOMIA DO ALGODÃO EM SOROCABA...31
. LUIZ MATHEUS MAYLASKY: UM MITO....32
. A “ESTRADA DO ALGODÃO”....36
. UM POUCO MAIS SOBRE A “ECONOMIA DO ALGODÃO” EM
SOROCABA....39
. ALINHAVOS NECESSÁRIOS..42
VI. A CONSTRUÇÃO DA CIDADE INDUSTRIAL....45
. MANCHESTER PAULISTA X MOSCOU PAULISTA....67
. NO RÍTMO DO APITO..79
VII. PONTOS FINAIS...91
VIII. BIBLIOGRAFIA....97
IX. ANEXOS....106
2
I. INTRODUÇÃO

O tema deste trabalho é decorrente de outro de maior


amplitude intitulado ‘A gênese da industrialização em
Sorocaba’.
Por várias razões não desenvolvemos tal empreitada.
Vejamos porque.
Havia uma grande expectativa em compreender a
totalidade do processo de industrialização em Sorocaba, pois
este apresentava-se a priori como “independente” do restante
do Estado de São Paulo.
Assim, a hipótese a ser comprovada era até que ponto
essa independência - a priori - havia ocorrido ou não na
cidade.
Recorrendo às fontes históricas locais, oficiais,
periódicos, jornais, etc, constatamos: o caminho a percorrer
seria árduo, não existiam muitos dados sobre o tema no
período da gênese industrial, demarcado por nós entre 1880 -
1930.
Pensávamos em verificar, dentro do tema, a relação
entre urbanização ⇔ industrialização : a localização industrial
e a expansão da cidade, infra estrutura para fixação industrial,
produção, relação indústria ⇔ agricultura, formação da classe
empresarial, classe trabalhadora. Enfim, vários itens cabíveis
em um trabalho sobre industrialização.
Um dado nos chamou a atenção: nos artigos e trabalhos
sobre a industrialização sorocabana, a preocupação maior -
ou única - era sempre falar ou do proprietário ou dos prédios
fabris. Poucos trabalhos, mesma temática.
O operariado era visto e revisto, não como agente no
processo industrial, sujeito da história por ele construída,
quando muito um ator coadjuvante sem maiores
conseqüências para o enredo.

“Já está chegando o machinismo para a fábrica de tecer do


Sr. Manoel José de Oliveira”
Diário de Sorocaba n o. 21631/8/1881 - 4 a. feira
Naquela quarta-feira, o jornal local dava ênfase às
3
máquinas e seu proprietário, como manchete. A oferta de
empregos para seleção será feita nos classificados do mesmo
jornal.
Como nosso trabalho incluía o operariado, começamos
a buscar informações. O novo tema surgiu.
Percebemos que estávamos incorrendo no mesmo “erro”
da historiografia local, o operário seria ‘coadjuvante”.
Ao travar contato com o cotidiano operário no início do
século, nosso trabalho começou a ganhar vida.
Imaginamos: se o trabalho pretendia ser uma
contribuição à geografia mesmo pequena, porque não poderia
ser também uma contribuição para a historiografia de
Sorocaba?
Afinal, é toda uma vida de classe operária e neto de
imigrantes ligada a essa cidade.
Redefinimos o tema que passou a ser ‘De novelo de
linha a Manchester Paulista - Fábrica têxtil e cotidiano no
início do século XX em Sorocaba’.
Houve, temos consciência, uma redução nos objetivos a
serem alcançados e demonstrados. Mas, por outro lado, o
trabalho ganhou, a nosso ver, em profundidade, pois poderia
ser apenas uma abordagem panorâmica no final.
No título aparecem duas alcunhas dadas à cidade,
“Novelo de Linha” e “Manchester Paulista”. A primeira
relacionada ao surto algodoeiro depois de 1875, nome dado
pelos ituanos de forma pejorativa, que era rebatido no mesmo
tom pelos sorocabanos que os chamavam de “tachos de mel”.
A segunda, quase um título até hoje para a cidade, a partir de
um discurso em 1904 do diretor da Estrada de Ferro
Sorocabana (hoje FEPASA). Que a burguesia local fez
questão de preservar.
Há ainda um terceiro, omitido no título: “Moscou Paulista ou
Brasileira”. Omitido propositalmente, este título era dado pelo
operariado, embora dele se servissem também os adversários
quando atacavam os trabalhadores.
O objetivo do trabalho passa a ser a verificação da formação e
condição do operário na indústria têxtil no começo do século em
Sorocaba.
Algumas questões surgem:
4
1) Chama atenção a função comercial da cidade desde o
advento das feiras de muares. Que ligações podemos
fazer entre feiras - algodão - indústria?
2) Qual o papel da burguesia na construção da cidade
industrial?
3) E do operário? Como era o imaginário dessa classe social?
4) E a cidade? Que cidade é essa que se industrializa? De
São Paulo, de Sorocaba do período das feiras a
Manchester Paulista, como isso foi possível?
5) E a cidade? Que cidade é essa que o movimento operário
anarquista e comunista chama de Moscou Paulista ou
Brasileira?
6) Como vivem operários e burgueses nas “cidades” de seu
imaginário?

Na busca das respostas algumas categorias emergem. A


categoria lugar parece-nos importante para o entendimento da
cidade, pois esta guarda especificidades que explicam o movimento
na relação com o geral e na construção do espaço.

“A partir do estudo do lugar é que procedemos à análise geográfica


do espaço...
O entendimento dessa categoria da análise - o lugar - nos
possibilitou [possibilita] desvendar o infinito na sua generalidade
mas, a partir do particular na sua universalidade .... o ... fundamental
... é a procura das diversas particularidades na qual a tendências
1
gerais se manifestam.”

No caso sorocabano o processo industrial é marcado, de um


lado pela existência de uma economia agrário-exportadora do
algodão que possibilitará investimentos na indústria, tal como
aconteceu em algumas áreas cafeeiras. Por outro lado a existência
de manufaturas e artesanatos foi impulsionada pelas feiras de
muares, e além disso, essas atividades eram urbanas, sendo que

1
LENCIONE, Sandra. Agricultura e Urbanização - A intensificação do capital no campo e a nova
Relação Rural Urbano no Estado de São Paulo. In:__________. Revista do
Departamento de Geografia n o . 4. FFLCH/USP, 1985:43
nas áreas cafeeiras foram rurais.
5
Esses fatos - ou particularidades - sugerem uma interpretação
além daquela que MARTINS (1990:106) o chama de binômio café -
indústria, isto é, uma relação causa - efeito que quer dar conta de
TODO processo industrial em São Paulo.
Todavia, o processo industrial em Sorocaba está articulado
com o geral.
...”a industrialização capitalista na América Latina é
específica e ... sua especificidade está duplamente
determinada: por seu ponto de partida .... e por seu momento,
o momento em que o capitalismo monopolista se torna
dominante em escala mundial, isto é, em que a economia
mundial capitalista já está constituída. É a esta
2
industrialização capitalista que chamamos retardatária.”
Dessa forma, se as particularidades do lugar sugerem
interpretações diferentes daquelas da economia cafeeira, isso
não significa descartá-las a priori, para não perdermos a
totalidade do processo capitalista brasileiro.

“Consideramos que no lugar o todo se nega mas também se


afirma cada vez mais, porque o lugar não é uma parte, é o
3
todo mesmo concretado no local.”

Ainda que não seja nossa preocupação a análise da


gênese industrial, deve ficar claro que não tomamos o lugar
em si mesmo, pois estaríamos abstraindo, quando a teia de
relações mostra a concretude espacial do lugar.
Outra categoria utilizada é o cotidiano. A ligação entre
lugar e cotidiano é muito forte, já que este é pessoal e
a.
intransferível. A nível do lugar, “O cotidiano é ...[a] 5
dimensão do espaço”, isto é, “... a espessura, a profundidade
do acontecer.” (SANTOS, 1993:21).

2
MELLO, João Manuel Cardoso. O Capitalismo T ardio. São Paulo : Brasiliense, 8 a. ed., 1991,
p. 98.
3
SILVEIRA, Maria Laura. Totalidade e fragmentação: o espaço global, o lugar e a questão
metodológica, um exemplo argentino. In:__________. O novo mapa do mundo - Fim de
século e Globalização. (vários organizadores). São Paulo : Hucitec, 1993, p. 205.
Em nosso trabalho, o acontecido e registrado, pois
6
muito desse acontecer se perdeu. O cotidiano do período
estudado mostra a busca de uma identidade nas várias faces
da realidade social: Manchester Paulista x Moscou Paulista ou
Brasileira. O imaginário burguês conseguiu impor-se, não sem
resistências.
As lutas são diárias, cotidianas, sem armas. Nem por
isso menos lutas. Lutas para realizar a manutenção da força
de trabalho.
Apesar das lutas, a memória do operário é a memória
do tempo trabalhado, “... o tempo de lembrar traduz-se enfim,
pelo tempo de trabalhar...” (BOSI, 1987 : XV).
Os operários e suas vidas nas fábricas, ou como
preferem alguns deles: os operários e suas fábricas. No seio
da resistência, o operário acaba fortalecendo a ideologia do
trabalho, do progresso industrial e da ordem necessária à
seriação fabril.

“O processo que produz o assalariado e o capitalista tem


suas raízes na sujeição do trabalhador. O progresso consiste
4
numa metamorfose dessa sujeição...”
5
Sujeição diária, cotidiana, sem data precisa , mas que
está no tempo e produz e reproduz a existência dos indivíduos
reproduzindo o social, pois, está em jogo a própria
sobrevivência. “Na vida cotidiana o homem aprende as
relações sociais e as reproduz enquanto instrumento de
sobrevivência” (NETO e FALCÃO, 1987:25).

4
MARX, Karl. O Capital. Livro I, vol. II. Brasil : Bertrand, 1988, p. 831
5
Conforme LEFEBVRE “...o cotidiano é o humilde e o sólido, aquilo que vai por si mesmo, aquilo
cujas partes e fragmentos se encadeiam num emprego do tempo. E isso sem que o interessado
tenha de examinar as articulações dessas partes. É portanto aquilo que não tem data”.
LEFEBVRE, Henri. A vida cotidiana no mundo moderno. São Paulo : Ática, 1991, p. 31.
E tanto é assim, que o homem dentro da nova
7
relação social capitalista “aprende” o valor (?) do trabalho
6
seriado, da disciplina fabril, então alheios a ele .
Então, na vida cotidiana, o operário, estaria destinado
sempre a sujeição sem possibilidades de superação?

“Há, segundo Agnes Heller,


quatro formas de suspensão da vida cotidiana, de passagem
do meramente singular ao humano genérico. São elas: o
trabalho, a arte, a ciência e a moral.
Esta suspensão da vida cotidiana não é fuga: é um circuito,
porque se sai dela e se retorna de forma modificada...”
“Esta suspensão é temporária, mas a apreensão de plenitude
obtida permite ganhos de consciência e possibilidade de
7
transformação do cotidiano singular e coletivo”

De outra forma não poderíamos falar em devir, em


programa de ação.
Qual seria a suspensão do cotidiano operário?
A greve, a tomada da rua para manifestações e festa,
em uma comunhão entre si e para si. Nessas horas afloraram,
mesmo inconscientemente, aqueles atributos, que para Marx
definem a essência humana: trabalho, sociabilidade,
universalidade, consciência e liberdade, “...estes atributos
encontram-se em potência, podendo ou não se converterem
8
em realidade. São possibilidades.”
Há que se atentar ainda: o cotidiano também é o reino
da alienação pela repetição do trabalho, dos gestos, do apito
que chama, feito um relógio coletivo, todos de uma vez. A sua
superação é possibilidade.

6
Um exemplo interessante e detalhado de desobediência pode ser lido no capítulo 7 da obra
“Subúrbio - Vida Cotidiano e História... (ver bibliografia) onde o operário Paolo Michelini
(ferramenteiro) assassina a tiros duas personagens da sociedade local. MARTINS conclui
“...Michelini se insurgia contra a dominação pessoal do patrão, os mecanismos de controle
e a disciplina subserviente que lhe queria impor.” (p. 353).
7
NETTO, José Paulo e FALCÃO, Maria do C. Cotidiano Conhecimento e Crítica. 2 a. ed.,
Cortes Editora, 1987, p. 27.
8
Idem, p. 28.
8
O corpo do trabalho

Em linhas gerais podemos dividir o trabalho em duas


partes:
. A primeira, da Origem das feiras e do Registro de Animais à
A Economia do Algodão em Sorocaba .
. A segunda, A construção da Cidade Industrial encerrando-se
com a Conclusão.
Nosso recorte temporal iniciando o estudo com o
Registro e as Feiras não é arbitrário. Pareceu-nos que
abordagem iniciando desde a fundação de Sorocaba, em
1654, seria desnecessária pois não contribuiria para o tema
proposto e os objetivos do trabalho.
Assim, parece certo dizer, nos preocupamos com dois
momentos da economia que realmente tiveram peso nas
transformações espaciais e sociais, embora a separação entre
feiras e algodão tenha apenas caráter explicativo, ambas
ocorrendo ao mesmo tempo histórico.
De apenas mais uma vila, Sorocaba vai tornar-se
caminho de tropas, pousada e depois receber um registro
para, primeiro, contagem dos animais, depois, cobrança de
impostos.
Os documentos levam a que a feira aconteceu
“naturalmente”motivada pelo registro na Ponte Rio Sorocaba.
Mas, nada é natural em economia.
O comércio de animais era necessário para a economia
nacional, única forma de transporte para a produção chegar
aos portos rumo à metrópole.
No dizer, até romântico de Deffontaines “Sorocaba está
9
localizada entre o país da erva e das árvores”.
O lugar parecia adequado para o comércio, já que sendo
local de pousada os animais estariam em condições e tendo o
registro, o pagamento dos impostos ficaria por conta do
comprador.

9
Santos, Elina - A Industrialização de Sorocaba Bases Geográficas - tese de Doutoramento
apresentada a cadeira de Geografia Física da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da
USP, 1950 pág 39.
Logo a população percebeu a fonte de renda que
9
eram as feiras e ofereciam diversos produtos a viajantes,
tropeiros, compradores, jogadores.
A vila começa a ser reconhecida pelas feiras anuais que
duraram 131 anos (1766-1897) com seu auge por volta de
1850.
A feira será responsável pela elevação de Sorocaba à
categoria de cidade em 1842.
Um fator externo irá incentivar uma atividade que já
vinha ocorrendo em Sorocaba: o cultivo do algodão.
A diferença porém é que agora o cultivo do
algodão será incentivado pela Inglaterra e as sementes são
do tipo herbáceo que possibilita melhor colheita. Um outro tipo
de algodão, o arbóreo, já era conhecido por ser nativo no
Brasil.
A nova atividade econômica em Sorocaba possibilita a
participação da cidade no comércio exterior, com a
exportação do algodão e ainda, mantendo-a na economia
interna, com os negócios das feiras.
Uma burguesia agrário-exportadora se forma.
Essa classe irá “incentivar” o pequeno produtor, a maioria na
região de Sorocaba, adiantando pagamentos, ensinando sobre
o plantio e colheita, para assim, garantir seus compromissos
com os consumidores europeus. Ao mesmo tempo investe na
compra do maquinário para beneficiar o algodão.
Além do comércio de animais e do algodão, destacam-
se também o artesanato e a manufatura surgidas para atender
a demanda tropeira nos meses da feira, e uma fábrica de
chapéus.
Esse primeiro momento do trabalho coloca as bases
para o processo industrial futuro, com o predomínio da
industria têxtil de grande porte e nos moldes capitalistas.
A segunda parte trata da construção da cidade
industrial: as transformações urbanas, a ótica de proletários e
burgueses, marcada pela ideologia dos mesmos na
construção da cidade.
Àquela cidade movimentada querem alguns autores
decadente. Com a chegada da ferrovia (1875) e o declínio dos
negócios do muar, “...tudo isso teve influência enorme na vida
de Sorocaba trazendo decadência e ruína para aquela
10
cidade”(GOULART, 1961:162).
Será mesmo decadente?
Adiantamos que não. Mapas, números, levantamento
comercial, gravuras nos ajudam a comprovar essa afirmativa.
A redação incursiona pela literatura quando abordamos
o cotidiano operário, principalmente.
De que outra maneira poderíamos falar dessa “legião de
anônimos”?
O movimento das pessoas corresponde à etapa da
produçào que está se dando naquele momento. Todos
são produtores - o operário, o artista de teatro, o
vendedor... etc., mesmo quem não está diretamente no
processo de produção, já que também consome. É a
maneira com que se dá a produção, e o intercâmbio
10
entre os homens que dá um aspecto a paisagem.
Vários personagens do dia-a-dia que a historiografia
local esqueceu.
Esqueceu também as contradições entre as
classes e sugere uma Sorocaba pacata.
Um sorocabano relata: “Pobre Papai! Morreu moço...
sucumbiu ao desumano regime então imperante na indústria”.
...“Vieram então, dias de grande dor e trabalho, pois mamãe...
precisou ir trabalhar na “Santa Rosália...” (PENTEADO,
1965:30)
Vê-se pelo relato que “papai e mamãe” não tem nomes.
São muitos papais e mamães operários assim. Não podemos
esquecer da crianças operárias sem nome habitando em
fábricas com nome.
É a ideologia dominante: do trabalho fabril ao
intelectual. Construções nomeadas, construtores anônimos.
Procuramos porém, com nossa incursão literária, não
perder de vista o caráter crítico-científico a que se destina
nossa dissertação.
Os caminhos das pesquisas nos fizeram um Flâneur, e a
conclusão é o percurso dele pela Sorocaba em seus

10
SANTOS, Milton - Metamorfoses do Espaço Habitado - Ed. Hucitec, SP, 1988, pág 72
momentos tirando conclusões, levantando novos
11
questionamentos tão necessários... ainda que implícitos.
II - ORIGEM DAS FEIRAS E DO REGISTRO DE
12
ANIMAIS DE SOROCABA

1. Um capítulo sobre tropeiros

A América espanhola já utilizava o transporte por tropa de


muares desde o século XVI. No Brasil, é a partir do descobrimento
de minérios nas Gerais , como conseqüência da necessidade de um
transporte para os minérios e ainda na carência de produtos para a
própria subsistência dos mineiros devido a falta de uma estrutura
nesse sentido nas localidades das minas, que o muar começa a ser
utilizado como solução para os problemas enfrentados na região
mineira.
A dificuldade era conduzir os animais das áreas produtoras do
sul do país para as Gerais. Era necessária a abertura de uma
estrada ligando o sul a São Paulo (mais especificamente: São Paulo
- Curitiba; Curitiba - Viamão). Em 1727, Francisco de Souza Faria
conclui o trecho Curitiba - São Paulo e em 1732 o Cel. Cristovão
Pereira de Abreu parte do Rio Grande do Sul para retificar e
melhorar os caminhos, inclusive esse aberto em 1727, levando um
rebanho de animais incluindo muares, mais resistentes que os
cavalos para regiões difíceis como a Serra do Mar e de Minas
Gerais. Citando Ellis Jr. temos que “talvez a estrada do Rio Grande a
São Paulo tenha sido a rota de maior importância do Brasil, pois sem
ela não teria havido o ciclo de ouro, não teria havido o do café e nem
11
a unidade nacional teria sido levada a cabo” e ainda “...sem o muar
não teria sido possível a vida econômica do planalto, de 1750 a
12
1850”.
É considerado como o primeiro nome do ciclo do tropeiro, o
Cel. Cristóvão Pereira de Abreu. Esse tropeiro passou por Sorocaba
em 1733 após concluir o caminho que ficou conhecido como “rota de
muar”, abrindo um ciclo econômico para a Vila de Sorocaba que já

11
ELLIS JR, Alfredo. O ciclo do muar. Revista Histórica n o. 01 - Jan-Mar/1950, p 87
12
ELLIS JR, Alfredo e ELLIS, Myriam. A economia paulista no século XVIII. Boletim 115 da
FFLC : USP, 1950, p. 57
havia participado do período Bandeirante, tendo sua fundação
13
ligada a Baltazar Fernandes, um bandeirante natural de Parnaíba.
Solicitou Cristovão Pereira de Abreu como pagamento pela
“reconstrução” do caminho do Sul”, o recebimento de parte dos
impostos cobrados nos Registros de Animais junto ao Conselho
Ultramarino, responsável pela estrada e pela criação dos Registros.
O Conselho montou o Registro de Animais de Curitiba, por
onde os tropeiros deveriam passar e pagar os impostos devidos, e o
Registro de Itu para fiscalização dos documentos relativos aos
pagamentos em Curitiba. O Registro de Itu foi uma sugestão do
próprio Cristovão Pereira de Abreu.
Porém, o Registro que seria em Itu, acabou sendo instalado
em Sorocaba em 1750, e em 1756 começou a ser cobrado um “novo
imposto” para ajudar a reconstruir a cidade de Lisboa, vitimada por
um terremoto.
Os preços cobrados no Registro de Sorocaba eram “$ 100 réis
por cabeça de gado vacum, $ 200 réis por gado cavalar e $ 340 réis
por mula que passasse [pelo registro]. Esses “Novos Impostos”
decretados por 10 anos, perduraram até a República, que em 1890
fechou o registro de Animais. O preço desses impostos é importante
para se aquilatar o valor dos animais na época. Cada mula valia dois
13
cavalos ou três bois e meio”.

O número de Animais registrados na Vila de Sorocaba foi


14
assim computado por Almeida.
De 1750 a 1780 - 5.000 animais por ano
1780 a 1800 - 10.000 animais por ano
1800 a 1826 - 20.000 animais por ano
1826 a 1845 - 30.000 animais por ano
1845 a 1855 - 50.000 animais por ano
1855 a 1860 - 100.000 animais por ano

13
VIEIRA, Rogick. O papel do tropeiro na integração cultural do Brasil. In:__________
T ropeirismo e identidade cultural da região de Sorocaba. Cadernos da Academia
Sorocabana de Letras, 1983, p. 20.
14
Apud ELLIS, op. cit. citado por Elina Oliveira Santos. A industrialização de Sorocaba (Bases
Geográficas). Tese de doutoramento. FFLCH : USP, 1950, p. 40.
Salientamos que não há muita concordância quanto ao
14
número de animais/ano para a fase do apogeu do ciclo entre 1845 -
1860. A tradição oral eleva os números a 200 e 300 mil, enquanto os
jornais da época apontam 100 mil animais/ano.

1.2 - As rotas

A posição de Sorocaba favoreceu a implantação, tanto do


Registro de Animais (este fôra implantado junto a Ponte de Rio
Sorocaba dificultando o contrabando e facilitando a fiscalização)
quanto das feiras de muares.
Autores que trataram do assunto do tropeirismo parecem de
acordo com a posição de Sorocaba. Deffontaines chegou a afirmar
que “Sorocaba era a cidade eixo entre o país da árvore e o da erva,
15
por isso tornou-se centro das feiras de animais”.
Apontaremos algumas cidades que se constituíram no
caminho dos tropeiros.

“O caminho do Sul, considerado a partir do Rio Grande do Sul se


iniciaria em Viamão... Cruz Alta, Passo Fundo... Sendo que aqueles
que estivessem trazendo os animais da região de Corrientes
(Argentina) partiam de Cruz Alta... Lajes e Mafra, em Santa
Catarina... Rio Negro onde havia um Registro de Animais e Lapa...
São José dos Pinhais e Curitiba... Palmeira, Ponta Grossa, Castro e
Jaguariaiva,... Itararé, Itapeva, Buri, Itapetininga, Alambari... Campo
16
Largo (atual Araçoiaba da Serra) e finalmente Sorocaba”.
“Note-se que a estrada de Itapetininga, Pilar do Sul, Piedade, Ibiúna
e Cotia era conhecida desde os tempos bandeirantes, mas seu uso
para o trânsito de tropas fôra proibido pela Coroa... De Sorocaba os
tropeiros partiam para São Paulo pela estrada que se iniciava em
Sorocaba, seguindo por Aparecidinha, Varejão, Parnaíba e
17
Pinheiros”.

15
DEFFONTAINES, Pierre. Geografia Humana do Brasil. citado por Elina O. Santos. Rio de
Janeiro : Revista Brasileira de Geografia, ano I, n os . 1, 2, 3.
16
JOB, Vera R. Origens e Importância do ciclo do tropeiro. In:__________ T ropeirismo e
identidade cultural da região de Sorocaba. Cadernos da Academia Sorocabana de
Letras, 1983, p. 7
17
VIEIRA, Rogick. op. cit., p. 20.
15
Também pelo fato de a estrada de São Paulo ligar-se a
Sorocaba é que o Registro de Animais tenha sido instalado na vila,
pois, reduzia em trinta quilômetros o trajeto para os tropeiros que
não precisariam ir até Itu e retornar para pegar o caminho a São
Paulo.

1.3 - As Feiras de Sorocaba

“Desde o momento que se iniciou para o Brasil a era do


transporte animal, implantou-se nova forma de atividades
econômicas na região de Sorocaba, representada pelo comércio de
gado, principalmente muar”. (SANTOS, 1950:40)
A Vila de Sorocaba vai se destacar dentro da economia da
capitania por sua atividade principal estar no comércio de muares e
não na agricultura exportadora, como eram as ordens da metrópole
portuguesa para o governador da capitania O Morgado de Mateus
(1765-1775) que deveria incrementar a lavoura de cana de açúcar e
de algodão.
Devemos dizer que a capitania de São Paulo havia perdido
sua autonomia administrativa em 1748, ficando 17 anos subordinada
à jurisdição da capitania do Rio de Janeiro. Somente com o Morgado
de Mateus é que a agricultura da capitania vai ter um impulso para
sair do estado caótico em que se encontrava.
Porém, mesmo com o incentivo governamental, Sorocaba
fugirá da regra geral da capitania, serão as feiras de muares e não a
agricultura o que proporcionará o desenvolvimento econômico da
vila. Mesmo assim, a vila ainda fará parte do “quadrilátero do
Açúcar” juntamente com as vilas de Piracicaba, Moji-Guaçu e
Jundiaí, sem grande expressão como as outras três, devemos dizer.
Em relação ao algodão, esse produto somente terá alguma
expressão na econômia sorocabana entre 1860-1865, período da
Guerra Civil americana. A partir do restabelecimento da produção
americana o algodão plantado em Sorocaba reduzirá cada vez mais
sua exportação e, a baixa dos preços no mercado internacional
aliado a uma produção grande, serão fatores para o início da
industrialização local.
“Não é... a agricultura que constitui a riqueza de Sorocaba, sim
16
o comércio de muares não domesticado, o comércio de que a
18
cidade é verdadeiramente o entreposto.”

Servindo de suporte às feiras, que possivelmente tiveram sua


primeira edição em 1766, outras atividades começaram a se
desenvolver: o comércio da alimentação; a “hotelaria” (que não
passava de um quarto alugado dentro das próprias residências dos
sorocabanos), as oficinas de selaria, a ourivesaria, ferreiros,
tecelagem de redes e panos rústicos.
Os agentes econômicos no ciclo dos muares em Sorocaba
foram descritos por Deffontaines:

“Os habitantes mais ricos de Sorocaba eram estes alquiladores que


partiam por cinco ou seis meses para o sul, afim de buscar tropas;
vinham em seguida os hoteleiros; a cidade contava com mais de
cem hospedarias; finalmente os artesãos que trabalhavam
sobretudo o couro. A importância das compras e vendas, sempre
pagas em dinheiro de contado tinham multiplicado as casas de
19
tavolagem.”

Taunay fala da importância da figura do tropeiro como um


“mensageiro da civilização”, seria a pessoa que transmitia os
acontecimentos sociais, políticos, culturais, etc. das regiões por onde
transitava. E “...em regra, pertencia à gente melhor da Província para
compra das tropas, para registro e direção de sua indústria, era
conveniente possuir certa instrução e algum capital, exigência que
limitava o recrutamento dos membros de sua categoria e a fixava na
20
classe dos mais abastados. Seleção profissional e social portanto.”

18
CESAR, Adilson. Notas para a lavoura canavieira em Sorocaba. Sorocaba : Fundação Dom
Aguirre, 1984, p. 22
19
DEFFONTAINES, Pierre. op. cit., p. 267.
20
TAUNAY, Afonso de. História do café no Brasil. Rio de Janeiro : Departamento Nacional do
Café, Tomo II, 1939, p. 370-1
21
Baseados em Muller , apresentamos um quadro
17
estatístico sobre a função secundária da agricultura em Sorocaba
que ilustra a importância das Feiras:

AGRICULTURA (1836)
Café 770 arrobas
Açúcar = 2.930 arrobas
Arroz = 3.342 alqueires
Feijão = 5.565 alqueires
Milho = 170.972 alqueires
Fumo = 428 arrobas
Algodão em ramo = 704 arrobas

CRIAÇÃO DE ANIMAIS (1836)

Apesar do comércio, a criação de animais também não era


expressiva:

= 40
Gado muar = 4
Gado vacum = 77
Porcos = 556

Propriedades = 450 (sítios)


Especializadas = 2 = 1 café
1 criação

Conforme demonstramos, as feiras foram a base econômica


da vila de Sorocaba; no auge do ciclo do muar, Sorocaba foi elevada
à categoria de cidade (1842).
O muar havia participado no início do século XVIII no
transporte de metais e produtos para sobrevivência dos mineiros; no
princípio do século XIX, no surto cafeeiro, será o meio de transporte
para alcançar os portos; no ciclo do açúcar e depois, do café em São
Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, o muar transportará aos
portos os produtos e trará sal e “fazendas do mar em fora” (o que

21
MULLER, Daniel P. Ensaio dum quadro Estatístico da Província de São Paulo, Seção de
Obras “d’O Estado de São Paulo”. 1923, citado por Elina O. Santos, op. cit. p. 41.
incluía também produtos importados diversos); serviu de
18
correio e de meio de transporte para viajantes em geral; estabeleceu
uma ligação entre o sul do nordeste do país.
O ciclo do muar em Sorocaba não se restringiu apenas ao
ciclo do ouro. A última edição da Feira de Sorocaba será em 1897,
porém já um ciclo econômico decadente que desde
aproximadamente 1860, estava sendo superado pela cultura do
algodão e depois pela industrialização que se iniciaria em 1882.
III. A MANUFATURA E O ARTESANATO LIGADOS ÀS
19
FEIRAS

Durante o período das feiras de muares, entre abril e junho, o


comércio local apresentava muitos produtos fabricados na cidade,
nas manufaturas, e também de forma artesanal. Todos voltados à
necessidade dos tropeiros em suas viagens.
Assim descreve Zaluar em 1862:

“Além de uma bela fábrica de chapéus, existe aqui uma montada em


grande escala de tecer algodão, e pertence ao Sr. Coronel Manoel
Lopes de Oliveira. As rêdes e os baixeiros fabricados em Sorocaba
são conhecidos em todo o império pela perfeição e solidez com que
são tecidos. Outra indústria não menos para admirar-se é a dos
arreios de couro e chicotes entrançados, que se fazem aqui do mais
delicado e apuradíssimo trabalho. Os ourives da prata, que são em
grande número, manufaturam obras de grande primor, entre elas
arreios e chicotes de formas e desenhos diversos, e de muito gosto.
Basta o estudo do desenvolvimento a que têm chegado estes
importantes ramos da indústria, para provar que a cidade de
22
Sorocaba uma das mais importantes da província”.

A descrição de um viajante estrangeiro, sobre sua impressão


das atividades e a importância da cidade na província, atestam a
movimentação nesses meses.
Além das manufaturas e artesanatos, o viajante dá conta da
existência de duas fábricas, uma de chapéus e uma de tecidos
“montado em grande escala”.
Essa primeira fábrica de chapéus, fundada por Antônio Rogick
de origem húngara, em 1852, que se manteve como proprietário até
1879, quando a comprou o médico inglês Dr. João Henrique Adans,
funcionava com mão-de-obra escrava, na certa pela simplicidade da
tecnologia empregada, pelo custo da mão-de-obra e pela
necessidade dessa indumentária naquela época e os baixos
investimentos nessa atividade.

1
ZALUAR, Augusto E. Peregrinação pela Província de São Paulo 1860-61. São Paulo :
Cultura, 1943, p. 179-80.
A partir de 1887 é formada a firma Pereira e Vilela com
20
a compra da fábrica de chapéus por Francisco de Souza Pereira e
Manoel Pereira Vilela.
Conforme anúncio, citado por VIEIRA, temos os seguintes
tipos de chapéus produzidos pela fábrica:

“CHAPELARIA NOVA - Rua do


Comércio - 23 - Chapéus para
homens, senhoras, meninos e
meninas - flexíveis, modernos, de
lebre, castor e nútria - chapéus finos,
abas duras - também faz sob
23
medida”

A fábrica de chapéus, fundada em 1852, fechou em 1932


24
sendo então proprietário o Cel. João Evangelista Fogaça
Em 1870, outro imigrante, Teodoro Kaysel, funda uma
segunda fábrica de chapéus que em 1900 passa a ser propriedade
de Simão Raszl, também fechada nos anos 30.
A década de 70 do século passado marca o início do declínio
do comércio dos muares e encontramos muitas atividades
comerciais girando em torno das feiras. Vemos na cidade (VIEIRA,
1988:10):
- 2 empresas de carros de aluguel,
- 2 hotéis,
- 3 funileiros,
- 2 relojoarias;
- 2 vidraceiros;
- 1 fotógrafo;
- 2 depósitos de cal;
- 26 lojas de fazendas, ferragens e armarinhos,
- 122 armazéns de molhados;
- 29 tavernas;
- 10 botequins;
- 5 padarias;

23
VIEIRA, Rogick. Sorocaba não esperou o 13 de Maio - A luta pela libertação dos escravos
no Interior Paulista. Sorocaba : FUA - Fundação Ubaldino do Amaral, 1988, p. 10.
24
ALMEIDA, Aluísio. História de Sorocaba. Sorocaba : IHGG, 1969, p. 276.
- 11 ferreiros;
21
- 3 ferradores;
- 7 bilhares e alfaiates;
- 3 armadores;
- 4 barbeiros;
- 2 dentistas;
- 50 açougues
- 1 “Centro Comercial” (casa comercial variada)”.

Essa “estatística” é de 1888 e pela quantidade de


estabelecimentos comerciais parece indicar um próspero mercado
consumidor (!)
Como podemos falar em declínio?
Notícias do jornal local Diário de Sorocaba de 1890 dão conta
de uma crise no setor manufatureiro, “cujos manufatureiros, em falta
de capitães que possam eleva-la mais alto contentam-se com o
nada que dá suficiente para açúcar parcamente a sua subsistência.
Nesse número estão incluídas as indústrias de fabricação de redes,
cestas, tranças, etc., muito communs entre as classes pobres da
25
cidade.”

Dias depois o mesmo jornal, num interessante artigo,


informava sobre uma possível organização que aproveitaria os
ramos existentes da manufatura local.

“Infelizmente, parece que isso não passou de um symptoma


característico da febre de emprezas. [...].
Mas si a idéa, o primeiro ímpeto, como nos affiançaram, partiu do
coração da cidade e fazendo nós nos períodos acima apreciações
relativas não só ao movimento industrial, não há razão por que não
se leve a effeito, quando nada, para Sorocaba apresentar uma
iniciativa própria , uma vez que é unicamente escolhida como ponto
de partida de iniciativas extranhas...
A idéa está de pé e acreditamos que aquelle que a tomar
novamente sobre si pode, além dos lucros pecuniários que lhe

25
Diário de Sorocaba, 26/10/1890.
advirão, colher encomios e agradecimentos, juros importantes
22
26
do capital de seu tempo empregado em tam humanitária obra”

Vale lembrar que a primeira fábrica têxtil de Sorocaba, a


Fábrica de Tecidos Nossa Senhora da Ponte, havia sido inaugurada
em 1882 já dentro do modo de produção capitalista. E no mesmo
ano do artigo, foram inauguradas as fábricas de tecido Santa
Rosália, Santa Maria e Votorantim, aliás é à essa última que o jornal
se refere quando afirma ser a cidade “unicamente escolhida como
ponto de partida de iniciativas extranhas”...
Não entendeu o articulista “que uma das leis principais do
27
capital é a de não fazer favores a quem quer que seja.”
Imaginava ele que uma “cooperativa de manufatureiros”
resolveria a crise que alguns atravessavam.
Para o capital, era justamente o contrário que deveria se
processar. A diminuição das manufaturas, daquelas com menos
possibilidades pelo menos, liberaria mão-de-obra, podendo ou não
ser aproveitada nas fábricas.
Além do que a possível “cooperativa”, pelo que o texto dá a
entender, seria não dos manufatureiros, mas de um ou mais
capitalistas e de toda forma a proletarização estaria em curso.
A organização de nada resolveria o problema dos
manufatureiros e artesãos, ao contrário, tiraria o produto final de
suas mãos.
Quanto ao “...symptoma característico da febre de
emprezas”..., este se refere ao chamado “Encilhamento” ou a política
inflacionária do início da república, onde ocorreu ...”a emissão de
papel-moeda, a farta distribuição de crédito por bancos públicos e
privados, a formação de inúmeras sociedades por ações reais e
fictícias...” O Encilhamento “...proporcionou à indústria têxtil um
volume de capital líquido que, em outras circunstâncias, exigiria um
28
período de tempo muito mais longo para ser acumulado.”
Porém, como alerta Martins:

26
Diário de Sorocaba, 4/11/1890.
27
MARTINS, José de Souza. O cativeiro da terra. São Paulo : Hucitec, 4 a. ed., 1990, p. 114.
28
STEIN, Stanley J. Origens e evolução da indústria têxtil no Brasil 1850/1950. Rio de
Janeiro : Campus, 1979, p. 99.
“A principal característica das mudanças ocorridas foi o
23
simples “inchaço” do capital de cada estabelecimento, sem qualquer
aumento proporcional nos meios de produção. Em outras palavras,
o mesmo nível de produtividade anterior ao “Encilhamento” teve que
29
remunerar maior número de unidades de capital”

Conforme indicam as notícias locais, parece que o


encilhamento não trouxe o desenvolvimento econômico às
manufaturas e artesanatos mas sim, possibilitou a fixação de outras
indústrias têxteis.
Com o declínio das atividades nas feiras de muares, o
artesanato e a manufatura sofreram uma retração nas vendas, por
estarem ligadas diretamente à elas.
Ainda assim, não é possível falar em declínio comercial na
cidade, pois, como já indicamos antes, a força comercial era muito
grande.
Era um comércio regional e não apenas local. Comércio este
que se manterá apesar da retração, já que, a utilização de animais
como transporte e trabalho será substituído gradualmente, mantendo
as manufaturas e artesanatos em atividade.
Em outro periódico sorocabano - o Jornal Autonomista - de
1897, vamos encontrar o seguinte levantamento para o ano:

Freios de Ferro 40:000$000


Estribos de Ferro e Metal 40:000$000
Esporas 30:000$000
Cabeções 10:000$000
Artigos de couro 250:000$000
Trançados 40:000$000
Redes 100:000$000
Baixeiros 15:000$000
Sola curtida 100:000$000
30
TOTAL 625:000$000

29
MARTINS, José de Souza. Conde Matarazzo - O empresário e a empresa. 2 a. ed, 2 a.
reimpressão. São Paulo : Hucitec, 1976, p. 27.
30
Citado por ALMEIDA, História de Sorocaba, op. cit. p. 271. MARTINS ainda alerta para o fato
de que “A despeito da visão pessimista oferecida por TAUNAY não só a propósito do evento,
mas também do período do “ensilhamento”, que tem sido incorporada pelos historiadores da
24
Pelos valores anuais atingidos em 1897 podemos constatar
que as atividades relacionadas ao muar, principalmente o couro,
mantinham-se.
Note-se também que o ano de 1897 marca o fim das feiras de
muares em Sorocaba. Apesar dos preparativos, a notícia da febre
amarela fez com que os tropeiros e comerciantes se retirassem da
cidade.
Encontramos no Almanach de Sorocaba para 1902 um
levantamento de “pequenas indústrias de manufacturas de redes,
arreios, baixeiros, freios, estribos, etc., exercidas individualmente
31
cuja produção annual é calculada em cerda de ... 600.000$000”
O mesmo Almanach apresenta a lista de “estabelecimentos
industriais”:

05 fábricas de cerveja
02 fábricas de licores e xaropes
03 fábricas de massas alimentares
08 fábricas de água ardente
03 cortumes
01 fábrica de sabão e sabonete
01 fábrica de móveis
01 fábrica de louças de barro
01 fábrica de vellas
05 fábricas de tijolos e telhas
04 casas especiaes de artigos para montaria (officinas
32
annexas)
Tudo parece indicar que a situação das manufaturas e
artesanatos na cidade ia bem, ou pelo menos se mantinha
comparando os totais de 1897 e 1902.
Porém, vejamos outros números indicados pelos “Dados
Gerais do Estado 1890 - 1938 para o município de Sorocaba:

economia brasileira, o significado dessa época só poderá ser avaliado quando forem
conhecidos os seus saldos positivos.
31
Almanach de Sorocaba, 1902, p. 83.
32
Idem, p. 106-7.
25
33
DADOS ECONÔMICOS

Receita Despesas
1896
Campo Largo (C) 8:775$280 8:312$041
Sorocaba 236:222$233 258:934$892
1902
Campo Largo 16:680$140 16:680$140
Sorocaba - -
1908
Campo Largo 7:570$754 7:570$754
Sorocaba 998:355$900 994:753$240
1914
Campo Largo 10:000$000 10:000$000
Sorocaba 335:784$960 351:681$950
1920
Campo Largo 28:986$650 28:892$850
Sorocaba 496:757$780 485:463$430

Atentando aos Dados Econômicos vemos que, possivelmente, o


jornal o Autonomista exagerou no seu levantamento sobre as atividades
ligadas ao muar quando indicava 625:000$000 contos de réis.
Porém, não foi possível encontrar que taxas municipais essas
atividades repassavam aos cofres públicos, por falta de dados nos
Arquivos da Prefeitura Municipal de Sorocaba.
Fica registrado nosso ceticismo em virtude do valor da Receita
do Município para 1896.
Provavelmente, se tivéssemos outros levantamentos (mesmo
imprecisos como o do Autonomista) para as manufaturas e

33
Dados Gerais do Estado 1890-1938. Publicação do Depto Estadual de Estatística. São
Paulo, 1939, p. 79.
Campo Largo - atual cidade de Araçoiaba da Serra.
artesanatos, veríamos a diminuição dos valores nas décadas
26
seguintes.
Os estudos de ALMEIDA (durante as décadas de 30, 40) o
levaram a concluir que apenas uma fábrica de facas, localizada no
centro da cidade ainda tinha alguma relação com as Feiras. “... O
artesanato de arreios progrediu até tornar-se fábrica (Oliveira e
Ferreira & Cia) e depois desapareceu. Sorocaba não tem mais
indústrias causadas pela feira.” (ALMEIDA, 1969:276)
A última tropa de muares a passar por Sorocaba foi em 1933
34
com destino ao Rio de Janeiro.
O surto algodoeiro na cidade que poderia ter dado outro
desenvolvimento às atividades manufatureiras, ao contrário facilitou
a fixação industrial em Sorocaba, ao menos quanto a matéria prima
e capitais.
Antes de encerrarmos este capítulo, falemos da primeira
tentativa fabril - em 1852, pela importância pioneira na cidade e
ainda, no momento histórico em que se encontrava.

34
Sérgio Coelho de Oliveira colheu depoimento de alguns ex-tropeiros, entre eles, Durvalino
Coelho de Oliveira que “em...1933 trouxe a última tropa do Rio Grande do Sul para São
Paulo... com 350 mulas para entregar ao Serviço de Limpeza Pública do Rio de Janeiro”...
conta Durvalino que ...nessa época as Companhias de Cerveja, como a Antártica, também
usavam carroções puxados a mula para a distribuição de bebidas em São Paulo. OLIVEIRA,
Sérgio Coelho. O Tropeirismo após as feiras de Sorocaba. In:__________ T ropeirismo e
identidade cultural da Região de Sorocaba. Sorocaba : Academia Sorocabana de Letras,
1983, p. 15.
27
IV. A PRIMEIRA EXPERIÊNCIA FABRIL TÊXTIL EM
SOROCABA - 1852

A primeira fábrica têxtil montada em Sorocaba acontece em


1852 por iniciativa do agricultor Manoel Lopes de Oliveira.
Embora não tenha passado de uma tentativa fabril, a
experiência de Oliveira chegou a produzir “300 onças de fio por dia”
35
em 1857 , ainda que não se tenham notícias sobre o período
produzido (número de dias) e se foi comercializado ou não.
O insucesso da fábrica estaria ligado a não especialização dos
escravos que trabalhavam como operários. (ALMEIDA, 1969:236)
Porém, é necessário que observemos, não motivos isolados,
mas as relações econômicas no âmbito local, pois, naquele
momento o centro da economia girava em torno das feiras de
muares e nas atividades à ela ligadas.
Observando o gráfico 1, vemos que as décadas de 50 a 70 do
século XIX marcam o apogeu das feiras.
Assim, não era um problema técnico apenas - ainda que ele
existisse - mas de lucratividade.
“Segundo o depoimento do próprio Manoel Lopes de Oliveira,
enviado ao Ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas em
1864, o seu estabelecimento só havia fabricado fio de algodão, pois
este dava mais lucro do que se fosse tecido”...
“... Para uma vara de algodão fabricada em Minas são necessárias
oito onças de algodão e é vendida por 400 rs n’essa corte o que
equivale ao preço de 25$000 por arroba entretanto o algodão da 28$
36
e 29$000”
Outro problema enfrentado por Manoel Lopes de Oliveira foi o
da matéria-prima, que era o algodão arbóreo*, nativo da terra. Diz
ele:

35
CANABRAVA, Alice. O Algodão em São Paulo. 1861-1875. 2 a. ed. São Paulo : TA Queiroz,
editor, 1984, p. 278
36
Idem, p. 280.
CANABRAVA, idem p. 50.
“A qualidade do algodão que outr’ora aqui se cultivava não
28
quis dar mais sem dúvida pela degeneração das sementes e
também porque essa cultura estava entregue a pessoas que não
indagavam as causas e nem procuravam remediar o mal tão
37
prejudicial a uma cultura de primeira necessidade (...)

Tudo indica que a conjuntura econômica do período, em


Sorocaba, limitou o sucesso da fábrica: matéria-prima de baixa
qualidade, lucratividade reduzida, mão-de-obra não qualificada e,
poderíamos incluir, um restrito mercado consumidor que
provavelmente se limitaria aos pobres e escravos.
Fica a dúvida se a fábrica de Oliveira atenderia também os
tropeiros. Já que as manufaturas estavam estruturadas para atender
esse segmento consumidor e a produção alcançada, durante o curto
período não parece sugerir uma “concorrência” entre a fábrica e as
manufaturas.
Na conclusão de Segura: “A exportação oferecia ganhos
maiores e Lopes de Oliveira passou a dedicar-se apenas à
38
agricultura.”

37
Idem, p. 280.
*O algodão arbóreo é: “Uma árvore aparentemente selvagem, quase escondida no meio de
outras de gênero diferente. Provavelmente...da espécie G. Brasiliense.
38
SEGURA, Ailton J. PIABIRU - uma odisséia T upiniquim, a saga de uma ferrovia. 1990, 1 a.
edição
29
V. A ECONOMIA DO ALGODÃO EM SOROCABA

“A importância que o algodão assumirá, junto com o artesanato dele


derivado, pode ser perfeitamente percebida no anedotário da época.
Como é comum acontecer entre as povoações vizinhas, afloram
gratuitas rivalidades. Os de Itu conferem aos sorocabanos o epiteto
jocoso de novelos de fio e a resposta não se faz esperar. Os
39
sorocabanos revidam: vocês são mel do tanque!”

Pode-se aceitar a “Economia do Algodão” em Sorocaba como


um dos fatores responsáveis pela formação de capitais e
experiências que possibilitaram a primeira fase da industrialização
local, ou seja, no momento de sua implantação nas últimas décadas
do século XIX.
O algodão arbóreo é considerado nativo no Brasil, tendo sido
utilizado pelos índios e depois na confecção de roupas rústicas para
escravos e classes pobres do país.
Foi também esse tipo de algodão o primeiro utilizado nas
roupas e artefatos dos tropeiros, produzidos e comercializados nas
Feiras de Sorocaba.
As primeiras sementes do algodão tipo herbáceo, de
qualidade superior ao nativo, foram plantadas na cidade em 1861, com
sementes distribuídas pela Associação para o Suprimento do Algodão
de Manchester e “...esta data pode ser tomada como marco inicial da
expansão das novas variedades de algodão na província, após o
rompimento da Guerra Civil Americana [1860-1865]. A adoção daquela
data implica também em reconhecer Sorocaba como o primeiro centro
de expansão da cultura do algodão herbáceo na Província de São
Paulo.” (CANABRAVA, 1984:53)
O algodão será de grande importância para a economia local,
porém, devido a “natureza do cultivo”, “...o tipo predominante de produtor
foi o do caipira ou lavrador pobre, que cultivava a fibra basicamente com
mão-de-obra familiar sem deixar de produzir sua alimentação”
(LOUREIRO, 1987:26)

39
CÉSAR, Adilson. op. cit. p. 40.
Algumas plantações podem ser considerados em “larga
30
escala”, como a do agricultor Manoel Lopes de Oliveira, que, em 1864,
chegou a cultivar quatro alqueires de sementes com uma produção de
“...250 arrobas por alqueire nas terras boas e 150 arrobas por alqueire
nas terras fracas” (CANABRAVA, 1984:174)
Outro agricultor que causou espanto nessa época foi Roberto
Dias Baptista que cultivou “sete alqueires” (de sementes na sua
fazenda no Salto de Pirapora e ...” na década de 90 sua fazenda foi
a preça (sic) e apareceram terras velhas e safáras, campos, tapéras,
40
máquinas ao abandono.. Também o algodão foi dendroclasta”
Em conseqüência dos bons preços alcançados pelo algodão
no mercado externo, iniciou-se um processo de mecanização com
as máquinas de descaroçar algodão.
“Possivelmente Sorocaba deve ter sido uma das primeiras
cidades do interior da Província de São Paulo a instalar
estabelecimento desse gênero” (CANABRAVA, 1984:189)
Em 1872 o município já contava com 24 descaroçadores e
muitos associados também ao enfardamento.
Somente em 1874 é que a Câmara Municipal proibirá essas
máquinas na cidade devido ao perigo de incêndio como o ocorrido
no estabelecimento de L.M. Maylasky e Cia (Canabrava, 1984:194)
Cabe, dentro da economia do algodão local, uma ressalva a
Luiz Matheus Maylasky que, conforme CANABRAVA, será o grande
incentivador da cultura em Sorocaba.

. LUIZ MATHEUS MAYLASKY: UM MITO

A história de Luiz Matheus Maylasky em Sorocaba é marcada por


mitificações à sua pessoa e suas ações.
A crônica local resgata o cotidiano desse imigrante húngaro, que
chegou ao Brasil em 1865, e é povoada de estórias.
Assim relata um biógrafo sobre a chegada de Maylasky:

40
GASPAR, Antonio Francisco. Vultos Fundadores da Estrada de Ferro Sorocabana -
Esboços biográficos. Composto e impresso nas oficinas da Editora Cupolo Ltda, 1958,
São Paulo, p. 116.
“Em São Paulo, segundo tradição oral, foi acolhido pelos de São
31
Bento. Queria trabalho. Exerceu ali as atividades de copeiro. E, também
aprendeu as primeiras regras da gramática portuguesa entesourando na
memória feliz os primeiros vocábulos. Ainda, nesse ano, fins de agosto
e setembro, ouviu a palavra Sorocaba, cidade das feiras e entreposto
comercial de grande movimento... foi a Pinheiros, oferecendo-se para ir
auxiliando os arreios e peões...andou perambulando pela cidade, sem
saber o que fazer, pois ninguém o conhecia...não lhe davam atenção.
...após de uma noite passada ao relento, passou ele, pelo largo de São
41
Bento...teve uma idéia: bater a porta do mosteiro.”

Em outra crônica temos uma “versão um pouco diferente” da


chegada de Maylasky:
“Nascido na cidade de Kassa, Hungria, a 21 de agosto de 1838 foi
oficial engenheiro de artilharia em sua pátria. Em 1865 veio para o
Brasil. Recomendado ao superior do convento de São Bento, do Rio
de Janeiro, e, não o encontrando na Capital Federal, pois o mesmo
se achava em Sorocaba naquela ocasião, para aqui veio afim de
entregar suas credenciais, chegando em Sorocaba causou tão boa
impressão ao reitor do convento, que este resolveu ajuda-lo.
...Iniciou sua atividade plantando algodão nas terras pertencentes
aos Frades de São Bento...Pioneiro da exportação da fibra nacional,
enviando amostras de algodão para a Inglaterra, recebeu, com
surpresa, uma grande encomenda do produto, à vista de sua
42
excelente qualidade.”

A tradição oral ainda conservou o apelido como era conhecido


Maylasky: o “estrangeiro misterioso”. Pois fazia questão de não
revelar à população sua verdadeira nacionalidade.
O “estrangeiro misterioso” possivelmente tenha imigrado
juntamente com outros engenheiros e técnicos europeus que
buscavam trabalho devido as transformações que se operavam na

41
GASPAR, Antonio F. Bodas de Brilhantes. colaboração de Antonio Francisco Gaspar em
homenagem ao Progresso e grandeza da E.F. Sorocabana, no seu 75 o. aniversário da Entrega
do tráfego ao Público do trecho São Paulo a Sorocaba em 1875” - composto e impresso nas
oficinas gráficas da Ed. Cupolo Ltda, São Paulo, 1950, p. 35.
42
GASPAR, Antonio F. Vultos Fundadores, op. cit. p. 114-16.
43
indústria e no próprio capitalismo onde, “...depois de 1870, o
32
recrutamento de trabalhadores especializados ingleses foi facilitado
pela depressão e a concorrência na indústria têxtil
européia”...(STEIN, 1979:65)

Porém, Maylasky ao chegar não irá se ocupar como técnico e


nem no comércio nas feiras de muares. O algodão interessou mais
ao “Estrangeiro Misterioso”.
A “surpresa”, conforme sugere GASPAR, possivelmente não
tenha “surpreendido” tanto a Maylasky que tinha conhecimento da
falta do produto nos mercados ingleses, abalado com a Guerra Civil
Americana.
Podemos afirmar que também conhecia os mecanismos de
exportação, pois, um ano após sua chegada em Sorocaba,
anunciava no jornal local:

“156b - Rua da Penha - 156.


Participa aos senhores lavradores e
a todos aqueles que quizerem
machinas de descaroçar algodão, ou
de qualquer espécie de vapores
(locomóvel) feitos nos Estados
Unidos e Inglaterra, dirijam-se ao
anunciante que achando-se
relacionado com os proprietários das
melhores fábricas da América e da
Europa, está autorizando a receber
todas as encomendas para qualquer
ponto...
...Recebe igualmente algodão
enfardado para remeter a Santos,
Rio de Janeiro e Europa afim de ser
vendido por conta dos donos, e
adianta algum dinheiro por conta do

43
O companheiro de viagem de Maylasky foi outro engenheiro, Herrmann Von Puttkammer.
GASPAR, Bodas de Brilhantes. p. 36.
algodão que receber mediante um prêmio
33
44
módico e razoável.

Analisando o anúncio, com base nos registros históricos de


Sorocaba, temos que na verdade Maylasky estava mais interessado
no algodão do que nas máquinas. Não se tem notícias ou dados que
comprovem a venda de máquinas.
Quanto ao adiantamento sobre a produção, Maylasky
realmente o fez, assim como certa “ajuda técnica” sobre a maneira
de plantar, cuidar e colher o algodão (CANABRAVA, 1984:XIII)
A partir de 1867, Maylasky “estabeleceu-se com um grande
armazém... comprava algodão e depois de o beneficiar o remetia
45
para os centros industriais e para o estrangeiro.”
Contudo, o fim da Guerra Civil Americana traz o
restabelecimento da produção do algodão naquele país e,
consequentemente, a volta do produto no mercado europeu.
A queda dos preços do algodão no mercado internacional
atinge a produção sorocabana marcada por pequenos agricultores
que passam a cultivar outros produtos de venda imediata no
comércio local.
Em 1874 as encomendas da Luís Maylasky & Cia com a
Petropolitana no Rio de Janeiro, não puderam ser remetidas pela
insuficiência do produto. (STEIN, 1979:59)
O fato atesta que a base da produção local, que eram os
pequenos proprietários, havia diminuído ou mesmo abandonado o
algodão com a queda dos preços no mercado internacional.
Em 1880, Maylasky deixa a cidade rumo a Mogy-Mirim. Anos
antes inicia e conclui seu principal empreendimento: a Estrada de
Ferro Sorocabana.

44
ALMEIDA, Aluísio. Luiz Matheus Maylasky (Visconde de Sapucahy). Tomo I Maylasky em
Sorocaba (1865-1880). São Paulo, 1938, p. 28
45
GASPAR, Antonio F. Bodas de Brilhantes. op. cit, p. 32.
. A “ESTRADA DO ALGODÃO”
34
Consta da biografia de Maylasky que a ferrovia ligando
Sorocaba a São Paulo foi criada a partir da negativa da Cia Ituana de
construir um ramal que ligasse Itú a Sorocaba, em 1869.
De maneira um tanto folclórica assim descreve GASPAR a
fundação da ferrovia:

“Foi num dêsses festivos e atraentes domingos d’antanho, em 1869,


quando se discutia em levar à efeito a formação de uma Companhia
com o fim de ligar Sorocaba a Capital por via férrea que...alguns
capitalistas sorocabanos...entre os quais segundo a tradição oral,
notavam-se Antônio Lopes de Oliveira, Roberto Dias Batista, Vicente
Euphrásio da Silva Abreu, Olivério Pilar, Ubaldino do Amaral e
outros, discutiam êles, sobre as vantagens de uma linha férrea.
Maylasky, com sua calma habitual, meteu os dedos no bôlso do
colete, dêle tirou uma moeda de quarenta réis que no momento
veio-lhe a mão e exclamou entre os amigos:
“Aqui está o meu capital subscrito!...Para a formação da Companhia
Sorocabana, é êste dinheiro que subscrevo com satisfação, além
46
das propriedades que possuo”

Na verdade, a Sorocabana surgiu em função de uma dissidência de


interesses entre grupos econômicos locais, que alijados de um ramal
ferroviário que ligasse Sorocaba a Itu e Jundiaí e consequentemente ao
Porto através da Santos-Jundiaí, desenvolveram esforços para a
construção de uma ferrovia que atendesse aqueles interesses.
A idéia era chegar ao porto de Santos, viabilizar uma economia de
exportação e garantir o mercado inglês ressentido da falta do algodão por
causa da guerra civil americana.
Vê-se que não há nada de folclórico na iniciativa de Maylasky e
seus companheiros. Naquele momento estava em jogo uma soma
considerável de lucros criada pelo comércio do algodão, que era
necessário se manter.
A ferrovia, além dos lucros de sua exploração, deveria servir como
uma forma de incentivo para que os agricultores continuassem produzindo
algodão.

46
GASPAR, Antonio F. Bodas de Brilhante. op. cit. p. 45.
Mas, as idéias da burguesia local não deram muito certo, ao
35
menos nos primeiros anos.
Conforme relata Almeida:

“Os efeitos da via férrea sobre o comércio e indústria de Sorocaba não


foram imediatos. Percebeu isso o arguto comerciante e levantou tenda”
47
(sic)

O “arguto comerciante” a que se refere é Maylasky que em 1880


deixa a presidência da Estrada de Ferro Sorocabana e se muda para
Mogy-Mirim.
As dificuldades da Estrada de Ferro eram grandes. Em 1876 já
havia projeto da Estrada de Ferro Sorocabana ser encampada pela Cia
Ituana. Havia até mesmo uma proposta de “...arrancar os trilhos da
Estrada...um tal procedimento provaria de nossa parte muito critério e bom
48
senso.”
Com a saída de Maylasky, assume a presidência Francisco de
Paula Mayrink, permanecendo nela por treze anos.
Afirma em Relatório à Assembléia Geral dos Accionistas de 1.893,
seu parecer sobre a situação de 1880 quando tomou a frente da Estrada
de Ferro:

“Era em 1.880 quando a atual Diretoria tomou conta de sua direção,


paupérrima e desacreditada, coberta de dívidas, das quaes uma
delas, a de ouro, contraída para regularizar contas pouco ou nada
claras entre o presidente de então Luiz Matheus Maylasky e o
49
extinto Banco Alemão”

47
ALMEIDA, Aluísio. Luiz Matheus Maylasky, op. cit. p. 141.
48
Discursos proferidos na Assembléia Provincial pelo sr. Dr. Ignácio W allace da Gama Cockrane
por ocasião de discutir-se o projeto de encampação - linhas férreas Ituana e Sorocabana
(1876) São Paulo. São Paulo : Typografia do Diário, 1876, p. 7.
(Ignácio W . da Gama Cockrane - deputado provincial nas legislaturas de 1870 a 1871, 1874 a
1879, era engenheiro com participação na SP Raylway, E F do Estado de São Paulo conforme
Dicionário de História de São Paulo, p. 140).
49
Relatório apresentado à Assembléia Geral dos Acionistas da Cia União Sorocabana e Ituana na
sua reunião ordinária em 18 de março de 1893 pela sua diretoria Francisco de Paula Mayrink
e Visconde do Socorro - Cia Impressora Rio de Janeiro, 1893, p. 10
A fusão da Cia Ituana com a Cia Sorocabana deu-se
36
em 20 de fevereiro de 1892, como forma de resolver questões de
tarifas nas proximidades de Botucatu e de prolongamentos.
“Para cabalmente realisar o seu desideratum fez a nova empresa a
ligação de São Manoel a Botucatu. Tomou Porto Martins...Em
Mayrink ligou a Sorocabana a Ituana... Para realizar todas essas
construcções teve a Empresa que fazer grandes empréstimos que
acarretaram juros superiores a sua renda, resultando a sua falência.
Foi então que o governo federal chamou a si a responsabilidade das
debentures emitidas, começando a explorar a estrada.
Posteriormente, o Estado de São Paulo, de acordo com o governo
da União, passou a gerir a Sorocabana, cedendo finalmente a
50
Sorocabana Railway Company, mediante arrendamento.”
o.
No Annexo n 15 do Relatório de 1893 da União Sorocabana
e Ituana encontramos entre os maiores acionistas Francisco de
Paula Mayrink com 33.481 ações e Luiz Matheus Maylasky ainda
51
aparece com apenas 41 ações.
Pode-se inferir que a “ferrovia do Algodão” idealizada por
Maylasky, em seu começo, não teve muita tranqüilidade econômica
e somente com Mayrink é que, na segunda década de existência,
pode deslanchar.
Como já dissemos, Maylasky deixa a cidade em 1880 e sabe-
se que em Mogy Mirim “...fundou com capitais franceses, a Estrada
52
de Ferro de “Sapucahy”

. UM POUCO MAIS SOBRE A “ECONOMIA DO ALGODÃO”


EM SOROCABA

Apesar de todas as dificuldades que a produção do algodão


atravessava: a volta dos EUA como fornecedor, o cultivo no Egito, a
50
CESAR, F. Camargo. A Sorocabana Railway Company. In:__________ Almanach Ilustrado de
Sorocaba (repositório histórico, literário e recreativo com illustrações). Anno I - Editado pela
Typografia W erneck - Sorocaba, 1914, p. 256-7).
51
Relatório apresentado à .... p. 4 e 6 do Annexo n o. 15. Lista dos Srs. Accionistas da Cia União
Sorocabana e Ituana em 12 de janeiro de 1893.
52
GASPAR, Antonio F. Bodas de Brilhantes. op. cit. p. 27.
baixa dos preços no mercado internacional, Sorocaba
37
continuou produzindo algodão.
A primeira indústria têxtil - com êxito - usará apenas o algodão
da região de Sorocaba.
Afirma Godoy que, com o término da guerra civil americana”...
surgiu em Sorocaba, Itu e outros centros de produção da fibra a
consciência de que não havia outra saída para a crise a não ser
53
transformar o algodão em pano e vendê-lo no mercado interno”
Nossa opinião é de que esta “consciência”, apontada por
GODOY, tem alguns inconvenientes para podermos entender como
se fixaram as indústrias têxteis na cidade a partir da década de 80.
O primeiro dos inconvenientes é sugerir uma generalização
onde todos os envolvidos com o algodão (produtores,
beneficiadores, comerciantes) tenham se tornado industriais. Fato
que não ocorreu.
Vale lembrar que algumas vezes produtor, beneficiador,
comerciante eram a mesma pessoa, é o caso de Maylasky, porém,
54
que não chegou a ser industrial.
Ainda que se considere o caso de Manoel José da Fonseca,
comerciante de tecidos e algodão (foi sócio de Maylasky), depois
a.
fundador da 1 indústria em 1881, um caso isolado não justifica a
generalização.
Um outro inconveniente é a natureza da plantação do algodão:
na grande maioria uma plantação em pequena escala, ...”o tipo
predominante do produtor foi o do caipira ou lavrador pobre, que
cultivava a fibra basicamente com mão-de-obra familiar, sem deixar
de produzir sua alimentação”. (LOUREIRO, 1987:26)
Daí não terem condições de investimentos no setor fabril.
Mesmos os - considerados - “grandes” produtores de algodão
em Sorocaba, como Roberto Dias Batista citado anteriormente,”... na
década de 90 sua fazenda foi a preça (sic) e apareceram terras
velhas e safáras, campos, tapéras, máquinas ao abandono...

53
GODOY, Antonio Carlos. Votorantim - Estudo sobre a formação da empresa industrial no
Brasil. Dissertação de Mestrado USP/DCS, 1975, p. 1
54
Para esta fábrica que não se concretizou, Luiz Matheus Maylasky chegou a comprar em
Campos - RJ o maquinário em 1868 formando com outros sorocabanos uma sociedade por
ações. Citado por CANABRAVA, op. cit. p. 284.
55
também o algodão foi dendroclasta” . Assim como Maylasky,
38
não tornou-se industrial.
Como se vê, a generalização sobre “transformar algodão em
pano” não confere empiricamente.
O que podemos depreender da importância do algodão para a
acumulação de capitais e experiências é que a “...pequena produção
mercantil serviu de instrumento de acumulação para o capital
comercial dominante.” (LOUREIRO, 1987:54)
Os “adiantamentos” que Maylasky oferecia serviam para, cada
vez mais, subordinar o pequeno produtor de algodão aos
comerciantes.
A economia mercantil sorocabana “expande-se”, de um
mercado interno (nacional) com os negócios nas feiras de muares,
para a exportação do algodão, conseguindo assim, a ascendência
de uma burguesia comercial ou mesmo agrário-comercial que não
havia se destacado anteriormente dentro do tropeirismo.
O comércio de algodão altera a forma de acumulação de
capitais dominado pelas feiras. Entra na divisão internacional do
trabalho, como fornecedora de um produto agrícola.
O outro lado dessa nova forma de acumulação, foi, de certa
maneira, um “atraso” das forças produtivas que o artesanato e a
manufatura possibilitavam, ainda que de maneira frágil.
Como salienta Silva: “A preponderância do capital comercial é,
em primeiro lugar, o resultado do desenvolvimento ainda fraco das
56
relações de produção capitalistas no Brasil.”
Não estamos, com isso, querendo propor uma “mecanização”
dos modos de produção, na clássica seqüência artesanato =>
manufatura => indústria, pois, como alerta Martins: “É fácil explicar a
origem e o desenvolvimento da indústria destacando apenas aquilo
que repete o já ocorrido nos países industrializados e que são
57
elementos de sua universalidade”

55
GASPAR, Antonio F. Vultos fundadores... op. cit. p. 64.
56
SILVA, Sérgio. Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. Alfa-Omega, 7 o. ed.,
1986, p. 55
57
MARTINS, José de Souza. Subúrbio. Vida Cotidiana e História na cidade de São Paulo: São
Caetano do Império ao fim da República Velha. São Paulo : Hucitec, 1992, p. 8.
Em Sorocaba, os modos de produção ocorrem ao
39
mesmo tempo, diversos momentos históricos num mesmo lugar e
consequentemente, várias técnicas de trabalho juntas.
O que vemos no decorrer da economia local é que “a
economia industrial surgiu no contexto de relações mercantis em
58
dissolução”
Realmente, no caso de Sorocaba, as feiras já não geravam
tantos lucros, o algodão tentava manter-se com a ajuda do capital
comercial, a manufatura e o artesanato, possivelmente em
conseqüência das feiras, também decaíram.
Os anos 80 apresentam um novo quadro econômico em
Sorocaba, o processo de industrialização já estava em curso.

“O processo de industrialização em qualquer região supõe, como


pré-requisito, a existência de certo grau de desenvolvimento
capitalista e, ...supõe a preexistência de uma economia mercantil e
correlatamente implica um grau relativamente desenvolvido da
divisão social do trabalho. Este último processo...resulta na
formação de um mercado especial, o da força de trabalho...
Contudo, estes pré-requisitos são criados pela organização
59
capitalista que antecede a produção propriamente industrial”

. ALINHAVOS NECESSÁRIOS

58
MARTINS, José de Souza. Conde Matarazzo o empresário e a empresa. São Paulo :
Hucitec, 1976, p. 6.
59
MELO, João Manuel C. de. O Capitalismo Tardio. 8 a. ed. São Paulo : Brasiliense, 1991, p. 99.
Citação do livro Condições Sociais da industrialização: o caso de São Paulo. In:
__________ Mudanças sociais na América Latina. Ed. Difel, 1969, p. 188-9.
Antes de prosseguirmos para a construção da cidade
40
industrial, devemos nos deter sobre o significado do comércio das
feiras e da economia do algodão para Sorocaba.
A economia da cidade ligada às feiras não possibilitou que a
acumulação de capitais fosse revertida em outras atividades, ou
mesmo não existia interesse por parte dos donos de tropas,
60
preferindo estes investir em terras.
O próprio caráter de mercado interno constitui uma
particularidade local, já que à metrópole portuguesa e depois à coroa
brasileira interessava mais a agricultura exportadora. Ainda que os
impostos cobrados no Registro de Sorocaba fossem uma fonte de
renda considerável ao governo.
Caso possamos falar em “Acumulação Primitiva do Capital”,
ela estaria no que chamamos de Economia do Algodão. Afirma Marx
que “... a chamada acumulação primitiva é apenas o processo
histórico que dissocia o trabalhador dos meios de produção. É
considerada primitiva porque constitui a pré-história do capital e do
61
modo de produção capitalista.”
Tentamos demonstrar através dos primeiros textos como a
economia local, articulada com a paulista e nacional no mínimo, vai
transformando-se. O declínio do comércio muar tem ligação com a
solução para o transporte nas áreas cafeeiras principalmente as
ferrovias a partir de 1865.
Nesse mesmo período um acontecimento externo - a Guerra
Civil Americana - possibilita a economia local tomar novos rumos,
agora visando o mercado exterior com o algodão colocada na
Inglaterra.
Foi uma mudança importante pois trouxe o início da
mecanização com os descaroçadores de algodão, e também
“separou” uma classe social proprietária das máquinas - e da
tecnologia - mas principalmente detentora do capital, implicando
novas relações sociais na cidade. Fazendo uma analogia com
CHÂTELET quando fala da manufatura, “...não é um simples produto

60
DELGADO, Aurélio. O tropeirismo e a dinâmica sócio-econômica em São Paulo no Século
XVIII (mimeo, Sorocaba, 1991, p. 3, transcrição da conferência proferida pelo autor, na
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Sorocaba a 25/05/88. Não revisto pelo
autor).
61
MARX, Karl. O Capital. livro 1, Vol. II. Brasil : Bertrand, Rio de Janeiro, 1988, p. 830.
de um novo modo de produção”, mas ... resulta de uma
41
operação de poder, concertado, por um grupo social, que captou a
62
oportunidade e que na impôs.
Realmente, uma classe percebeu a possibilidade de
transformar e ampliar seus capitais e se impôs.
Ainda que nesta “Acumulação Primitiva do Capital” não tenha
ocorrido a expropriação do pequeno produtor, ao contrário, o capital
comercial assistia o pequeno produtor se utilizando de formas
consideradas pré-capitalistas, como foi o caso dos adiantamentos
pela produção do algodão, o que pode ser considerado
particularidade do capitalismo nacional.
Mesmo quando afirmamos com SILVA o fraco
desenvolvimento das relações de produção capitalistas no Brasil em
63
conseqüência do capital comercial temos consciência de que seria
difícil, em Sorocaba, se repetir o modelo europeu de acumulação e
da seqüência de modos de produção, pelas próprias características
64
da economia brasileira em que estava naturalmente inserida a
cidade.
Na interpretação de MARTINS:

“... O processo básico de acumulação primitiva, que leva à


separação do trabalhador de seus meios de produção, resultando na
sua transformação em homem livre sem outro recurso que não seja
a venda da sua força de trabalho no mercado, ocorreu fora da
65
sociedade brasileira.

Ou seja, a separação deu-se nos países de origem dos


imigrantes que aqui vieram para trabalhar diretamente na indústria.
Mas, a contradição e o antagonismo entre as classes sociais
manifesta-se em cada cidade de forma própria: exatamente na

62
CHÂTELET, François. O Capital (Livro 1). Análise Crítica. Universidade de Paris VIII. Hatier
Paris, 1955 - Tradução Edmundo Fernandes Dias. IFCH : UNICAMP, 1991, p. 105.
63
Conforme nota 18 de A economia do algodão em Sorocaba.
64
Sobre essas características podemos lembrar sobre o “Capitalismo Tardio” brasileiro e latino-
americano, que se estrutura quando “a economia mundial já está consolidada”, conforme
MELLO, op. cit. Ainda sobre a especificidade da economia brasileira ver as obras de
MARTINS, CANO, SILVA, p. ex. na bibliografia deste trabalho.
65
MARTINS. O cativeiro... op. cit. p. 118.
construção de seu espaço. No significado que dá ao seu
66
42
lugar, mesmo que possamos - e podemos - encontrar e fazer
generalidades sobre cidades industriais, vilas operárias, ruas, etc..
o.
Só que, na casa n 05 da Vila Santa Maria moravam operários
únicos, de uma casa e vila única, de Sorocaba!
Estes esclarecimentos alinhavam a primeira com a segunda
parte do trabalho, justificando a diferença de estilos entre uma e
outra. A primeira mais descritiva e histórica e a segunda mais
“literária”, por exigência do próprio conteúdo.

66
Conforme PIGNATARI “...O significado é o uso”...ou ... “O significado é uma relação entre o
interpretante do receptor.
PIGNATARI, Décio. Informação. Linguagem. Comunicação. São Paulo : Perspectiva, s.d.,
p. 30-3
43

VI. A CONSTRUÇÃO DA CIDADE INDUSTRIAL

As fotos registram o momento, vários “presentes” num duplo


sentido: de presença e de tempo.
O momento registrado na fotografia perde sua realidade,
como num documentário gravado e repassado anos a fio. Já não é
mais o real e sim, o virtual. Uma abstração. Agora, também nossa.\

“Desde logo, devemos admitir “o espaço enquanto natureza em si”,


como existência objetiva anterior ao homem, manifestação de
formas de materialidade inorgânica e orgânica. Engendrado numa
história natural, onde as transformações ocorrem sem a impulsão
finalística.
... Em termos lógicos e históricos, admitimos que é nesta realidade
que se forma o ser social, forma mais elevada da materialidade. Este
transforma teleologicamente (com finalidade) o mundo externo
através do seu trabalho. Apropria e transforma o espaço natural,
imprimindo-lhe sua marca... O apropriar-se de espaço concreto
implica a elaboração de categorias lógicas sobre o espaço...
Mediatizada pelo processo histórico de instalação da humanidade
sobre o globo, a apreensão do espaço se faz calcada na
apropriação, este é posto como categoria histórico-concreta,
remetendo a um ser em movimento. O ser já não é uma “natureza
em si” mas uma natureza para o homem e cada vez mais um
trabalho do homem” (MORAES, 1979:36).

Posta a concretude do espaço como natureza apropriada e


transformada via trabalho pelo homem, devemos verificar como
Sorocaba foi sendo apropriada e transformada nesses momentos
diferentes (tropeiro, algodão, indústria) citados anteriormente. “O
espaço deve ser considerado como uma totalidade, a exemplo da
própria sociedade que lhe dá vida” (SANTOS, 1988:5). Ao mesmo
tempo a cidade será totalidade - enquanto objeto empírico - e
fragmento de um espaço maior nacional e mesmo internacional: “...
as cidades são partes de um sistema econômico e social total
44
que não é somente nacional mas igualmente internacional”
(SANTOS, 1990:122)
Atentando para o Mapa do primeiro arruamento de Sorocaba
de 1661 e a planta da cidade de 1842, portanto 181 anos depois e
dois momentos econômicos de relevância para a cidade, o
bandeirantismo e o tropeirismo, vemos a ampliação. Já cidade,
motivada pelo segundo momento econômico. Ampliação necessária
para passagem dos animais, principalmente.

O gráfico 1 mostra o número de animais que passaram por


Sorocaba onde observamos que na elevação da Vila de Sorocaba à
categoria de cidade em 1842 o número de animais girava em torno
67
de 50.000 animais.

67
os números levantados por ALMEIDA não são exatos, mas em um levantamento parcial que
fizemos no Arquivo do Estado do Livro de Barreiras para 1826 pudemos constatar que a
aproximação desse autor não deve estar muito incorreta. Deve-se ainda acrescentar que
um levantamento minucioso demandaria muitos anos e uma grande equipe para cobrir
quase 130 anos da existência do registro (1750-1889) considerando que os livros são
diários.
45

Um desenho de 1831 mostra a Vila de Sorocaba (IRMÃO 1992:15)


com certa aglomeração de casas no centro da cidade e casas
espalhadas, ou no dizer de Martim Francisco, a vila “...não tinha
regularidade alguma...”, não tendo ainda ruas “...porque as casas
estão aqui e acolá” (1808) e Saint Hilare (1820) a “vila emprestava à
paisagem (de matos e campos) uma perspectiva encantadora,
embora em seu conjunto, fosse de má aparência: de ruas sem
calçamento, com profundos buracos aos lados, com casas, de
ordinário, pequenas, poucas com um andar, cobertas de telhas, de
terra socada, com amplos quintais de laranjeiras e
bananeiras...sendo a cidade de má aparência no seu conjunto”
(IRMÃO, 1922:14)
46

Na ilustração publicada em 1863 no livro de MEDEIROS,


Curiosidades Brasileiras, e datada de 1850, aparece uma tropa
atravessando o Rio Sorocaba (conforme ALMEIDA, para não
estragar a ponte. 1981:50) A iconografia ainda mostra o centro da
cidade (na colina a direita) e o caminho para São Paulo (atual
Avenida São Paulo, a esquerda). Foi preocupação do ilustrador
apenas a passagem da tropa e não o centro da vila, o que é
plausível, pois o Registro de Animais, era uma fonte de renda para o
município e, portanto, importante na cidade.
47

Conforme a “Lista Nominal”, em 1846 a cidade contava com


14 ruas:
“Rua da Contagem (atual Rampa ao lado da Ponte Francisco
Delloso)
Rua do Comércio (atual Rua Souza Pereira)
Rua da Ponte (atual Rua XV de Novembro)
Rua de São Bento ( manteve a mesma denominação)
Rua da Boa Vista (atual Rua Nogueira Martins)
Rua do Rozário (atuais Rua Padre Luiz e Rua Santa Clara)
Rua da Constituição (atual Rua Coronel Cavalheiros)
Rua da Santa Cruz (manteve a mesma denominação)
Rua da Cadêa (atual Rua Barão do Rio Branco)
Rua das Flores (atual Rua Monsenhor João Soares)
Rua do Espital (atual Rua Álvaro Soares)
Rua do Supiriri (atual Rua Comendador Oeterer)
Rua de Santa Clara (manteve a mesma denominação)
68
Rua da Penha (manteve a mesma denominação)”
Porém, nos estudos de ALMEIDA, encontramos relacionadas,
além das citadas acima, outras ruas e algumas dessas
desmembradas:
“Rua Atras de São Bento (atual Rua Cesário Mota)
Rua do Pinheiro, nova a sair da Penha (atual Rua Professor
Toledo)

68
Lista Nominal dos Habitantes Livres do distrito desta cidade de Sorocaba - 1846 “LATA” 174
Arquivo do Estado de São Paulo.
Rua do Rocio da Penha até a Vossoroca (atual Rua Sete de
48
Setembro)
Rua de Santo Antonio até o rio grande (a mesma do hospital)
Rua do Supiriri de cima (atual fim da Rua Padre Luiz)
Rua do Supiriri do meio (atual Rua Comendador Oeterer)
Rua do Supiriri para o hospital (atual D. Antonio Alvarenga)
Rua da Amargura (atual Rua José Bonifácio)
Travessa da Direita do hospital (atual Rua Anita Garibaldi)
Travessa da Matriz a Santo Antonio (atual Rua Cel. Benedito Pires)
Rua do Portão ou dos Morros (atual Rua Cel. Nogueira Padilha)
Rua do Além Ponte (atual Avenida São Paulo)
Travessa da Boa Vista ao Curral do conselho (atual Rua Ubaldino do
69
Amaral)
Assim, das 14 ruas apontadas na “Lista Nominal” passamos a
24 ruas quando somadas às citadas por ALMEIDA.
Também em relação aos bairros, a “Lista Nominal” aponta 23
bairros mas relaciona 28 bairros, mais a Freguesia de Campo Largo
(atual Aracoiaba da Serra):
“Bairro da Aparecidinha (ainda pertencente a Sorocaba)
Bairro do Ipiranga (atualmente perto da Zona Industrial no Éden)
Bairro do Piragibú (atual Distrito do Éden)
Bairro de Nhuaúva (bairro pertencentes ao Distrito de Brigadeiro
Tobias)
Bairrodo Passa Tres (atual Distrito de Brigadeiro Tobias)
Bairro da Boa Vista (bairro onde está localizada a Pref. Municipal
de Sorocaba)
Bairro da Caputera e Morros (final da Rua Nogueira Padilha)
Bairro do Rio Acima, Pereatuba e Itapeva (pertencentes a cidade
de Votorantim)
Bairro de Pirapora Acima (atual Salto de Pirapora)
Bairro de Pirapora do meio (idem)
Bairro de Piedade (atual cidade de Piedade)
Bairrode Lavras Velha
Bairrodo Rocio da Penha (possivelmente um bairro da cidade de
Votorantim)
Bairro de Vossoroca e Lavras Velha e Iacarupava (idem)
Bairro de Nhambiru (bairro da atual cidade de Salto de Pirapora)

69
ALMEIDA, História de Sorocaba op. cit. Pag 228, 229
Bairro de Salto e Sarapohi e Sarapohi do meio (atuais
49
cidades Salto de Pirapora e Sarapuí)
Baierro de Terra Vermelha (atual Bairro de Vila Angélica em
Sorocaba)
Bairro do Itangoa (manteve o mesmo nome)
Bairro do Caguaçu (manteve o mesmo nome)
70
Bairro do Itavovu, Jundiacanga, Jundiaquara e Utinga”
Muitos bairros arrolados na Lista Nominal para 1846 fazem
parte hoje de outras cidades. No ano de 1957, Piedade, Salto e
Campo Largo emanciparam-se de Sorocaba, assim os bairros
citados nesses lugares passaram a nova administração. As ruas
apontadas pela Lista Nominal são todas centrais (Ver Mapa pag.45,
Sor. 1842) e muito provavelmente não existissem ruas nos bairros
mas apenas caminhos ligando os sítios.
A população até 01/12/1847 estava dividida
Homens = 3.549
Mulheres = 4.570
Total = 8.119
distribuida em 2023 fogos (casas), sendo que desse total apenas 20
71
eram eleitores . Devemos lembrar que a população considera eram
os livres de TODO município, na cidade provavelmente residissem
em torno de 2.500 pessoas.
Um outro dado estatístico aponta para 1.839 os seguintes
números de habitantes (sem Campo Largo):
“Na vila 3.428
nos bairros 8.053
72
total 11.481
Afirma GOULART que “Sorocaba como que existia em função
das feiras. A indústria mais florescente era a dos objetos
necessários aos condutores de muares... A hierarquia economico-
financeira existente na cidade tinha como ápice os alquiladores...
em seguida os hoteleiros... por último os artesãos, que trabalhavam
sobretudo o couro.” (GOULART, 1961:160)
70
Lista Nominal... op. cit. Arquivo do Estado de São Paulo
71
Lista Nominal... op. cit. Arquivo do Estado de São Paulo
72
ALMEIDA, História de Sorocaba, op. cit. pag. 137
Como as fontes consultadas não coincidem - os números citados por ALMEIDA para 1839
são maiores que os números de 1847 da “Lista Nominal” - nossa afirmação de 2.500
pessoas na cidade acompanhou esse diferença de 30% entre uma e outra fonte.)
Adiante conclui que o fim das feiras de muares está
50
relacionada a cultura do algodão no local, e ainda,...” iniciou-se a
decadência da indústria açucareira e da aguardente, as minas deram
sinal de esgotamento”. (Idem, idem) E mais do que tudo isso o trem
de ferro deu o golpe mortal nas tropas e acabou com as estradas de
burros. (Idem, idem)
Tudo isso teve influência enorme na vida de Sorocaba
trazendo decadência e ruína para aquela cidade. As ricas
habitações foram abandonadas o mato invadiu as ruas; as
hospedarias fecharam as portas. Hoje industrializada, Sorocaba é
sede de um dos mais importantes municípios do Estado de São
Paulo. (Idem pág 162, grifo nosso)
Discordamos da conclusão do autor, pois conforme já
demonstramos anteriormente quando tratamos das manufaturas, é
difícil falar em decadência pelos valores de 1897 (ver pág. 19) e
conforme o Almanach de Sorocaba para 1902 os valores das
manufaturas mantinham - se (idem, idem). Parece-nos meio
precipitada a conclusão quanto a Estrada de Ferro como “golpe
mortal nas tropas” também.
Em relação ao estado de abandono citado por GOULART, a
situação não se mostra tão caótica quando examinamos mais
detalhadamente a cidade.
A cidade cresceu, ruas foram ampliadas e abertas, o estatuto
de cidade veio em 1842 em decorrência do comércio de muares nas
feiras sorocabanas, a manufatura desenvolveu-se, uma fábrica de
chapéus fundada em 1852 e outra em 1870, além do comércio de
algodão desde 1870.
Tudo seria abandonado com o fim das feiras de muares?
O provável ano de “ruína para aquela cidade” é 1875 com a
inauguração da ferrovia. Já apresentamos a ferrovia e seus objetivos
anteriormente e vimos que até 1880 a mesma não apresentou os
resultados esperados pela burguesia que a idealizou. Um outro
detalhe importante é que a última edição da feira de muares de
Sorocaba foi em 1897 e não 1875, portanto vinte anos após a
inauguração da ferrovia. Atentando para o gráfico 1 vemos que a
partir de 1860 o número de animais passando pela cidade decaí de
100 (1855-60) para 20 mil (1975-1900) mostrando sinais da
decadência independente da inauguração da ferrovia na cidade.
Conta a historiografia sorocabana que motivo para o fim
51
das feiras de muares foi o surto de febre amarela em 1897:

No mês de março de 1897 um caxeiro-viajante da firma Santos


Neves estabelecida á Rua do hospital (atual Álvaro Soares), por
nome Lameira chegou de São Carlos, enfermado logo de febre
violenta, “com todos os sintomas que caracterizam a epidemia que
lavra no Oeste do Estado”...
Seis dias depois teve alta o Sr. Lameira,, mas o vírus da febre já
havia invadido a cidade.
Estava a feira anual de animais em seu auge. Foram vendidas
cerca de 30.000 (sic) bestas em abril. Mas os negociantes trataram
de escapar-se...
Foi a última feira de animais em Sorocaba...
Os dois surtos de febre amarela - 1897 e 1889 - segundo os
analistas, constituiram -se nos dois primeiros golpes a contribuir para
o desaceleramento do rítmo alucinante de progresso que envolvia a
73
cidade.

E continua sua descrição sobre a cidade diante do surto de


febre amarela:

“Sorocaba havia se transformado num deserto...Os seus


moradores haviam tomado o caminho dos sítios mais distantes e
também da Aparecida (bairro da Aparecidinha) tão próxima e tão
livre do contágio.
A maioria dos retirantes povoo Ipanema por haver ali mais casas,
trens e telégrafos”. As pessoas de mais posse transferiram-se para
São Paulo até que fosse debelada a peste que grassava a cidade.
Nesses dias de maio, Sorocaba não fez outra coisa senão
cuidar dos seus doentes e enterrar seus mortos...
No dia 31 de maio, o surto epidêmico havia passado, deixado
74
sobre a cidade uma aura de suspeita.”

Provavelmente a epidemia ou surto de febre amarela tenha


contribuido para o fim das feiras de muares naquele ano e

73
OLIVEIRA, São Paulo de Sorocaba, op. Cit. Pag. 21
74
idem, pág. 22
posteriores, mas não é o único motivo e nem o principal. Toda
52
a economia estadual e mesmo nacional estava alterando sua forma
de acumulação desde a década de setenta XVIII entrando
definitivamente para um modelo de acumulação capitalista. O
próprio Oliveira mais adiante no artigo, afirma que... “Sorocaba volta
a sua vida normal e em 16 de outubro (1897) está em festas para
inaugurar a sua primeira fábrica de calçados a vapor, enquanto que
Votorantim começa a funcionar um estabelecimento para extração e
75
preparação de mármores das caieiras de Itupararanga.”
Assim, a cidade em 1897 e anteriormente, não poderia estar
“tão decadente” como sugere GOULART, do contrário não haveria
motivo para investimentos, como a fábrica de calçados e a
marmoraria da Votorantim.
Em relação ao fim das feiras motivado pelo surto ou epidemia
de febre amarela devemos alertar que, nesse ano de 1897, a cidade
contava com 5 fábricas texteis e as várias manufaturas. Portanto, a
direção da economia tomara outro rumo aproveitando--se da matéria
prima local - o algodão - e a mão de obra feminina, infantil e
posteriormente imigrante sendo, conforme ALMEIDA, a colônia
Espanhola a primeira a fixar-se em Sorocaba na além-ponte
(ALMEIDA, 1969)
As feiras que ampliaram as ruas da cidade e geraram uma
economia mercantil importante, deixam de ser o centro das
atenções. A industrialização nascente agora será a responsável pela
ampliação da cidade, não apenas ampliando ruas mas criando
bairros operários para a massa de proletários que movimentam a
futura Manchester Paulista.
O Mapa da Localização Industrial a partir de 1882 mostra as
fábricas Santa Maria um pouco afastada da Ponte do Rio Sorocaba
e dos trilhos da Estrada de Ferro Sorocabana e a São Paulo logo
após a ponte no caminho para São Paulo (atual Avenida São Paulo).
As demais fábricas no Além Linha e, com exceção da Fábrica Santa
Rosália, e Votorantim, fora do perímetro urbano da cidade.

75
idem, idem
53

A partir de um mapa elaborado por GASPAR em 1909


localizamos as vilas operárias de Sorocaba onde também predomina
a maior fixação da população operária no Além Linha.
O mapa do Crescimento da cidade em 190 anos (1800-1990)
comprova a tendência de crescimento para o Norte e Oeste
“contornando” as margens do Rio Sorocaba.
O Rio Sorocaba foi um dos problemas para o crescimento da
cidade, principalmente e na porção Leste (O Rio corta a cidade de
Sul a Norte). Isso porque na porção Sul, a menos de 10 Km do
76
centro de Sorocaba, localizava-se Distrito de Votorantim . Um outro
fator que “atrapalhou” o crescimento e a urbanização de Sorocaba
foram os trilhos da Estrada de Ferro Sorocabana (atual FEPASA)
que conforme vemos no Mapa da Vilas Operárias cortam a cidade
no sentido Leste-Oeste. Dificuldade que ainda persiste no
planejamento urbano atual.
As administrações municipais apenas recentemente - a partir
da década de setenta - começaram a se preocupar com o
crescimento das cidades vizinhas como Itu, São Roque, Votorantim,

76
O Distrito de Votorantim emancipado em 1956 encontra-se hoje conurbado com a cidade de
Sorocaba impossibilitando o avanço da mesma para a porção Sul, o mesmo já está
ocorrendo com a cidade de Itu que tem seus limites próximos ao Distrito de Cajuru.
Araçoiaba da Serra levando melhorias urbanas até as áreas
54
77
limítrofes da cidade .
Em relação ao crescimento atual da cidade podemos notar,
apenas passeando pelos locais, que as regiões norte e oeste tiveram
seu crescimento baseado em loteamentos populares e de baixa
renda, fato que elevou a concentração de pessoas nesses locais e
na porção sul os loteamentos foram para as classes mais altas e
médias altas e percebemos pouquíssimas casas antigas e de baixas
rendas com tendências a desaparecem, dando lugar a edifícios de
alto padrão ou mesmo grandes residências como as vizinhas.*
Verifica-se uma tendência histórica no crescimento da cidade
que deixou na própria urbanização da cidade, passada e presente.

77
Conforme funcionários da Prefeitura Municipal de Sorocaba que preferiram não se identificar, a
mudança do prédio para o Alto da Boa Vista, está relacionada a “briga”com a prefeitura de
Itu sobre a questão do limite dos municípios. O prédio da prefeitura situava-se na Rua
Brigadeiro Tobias no centro da cidade. O bairro Alto da Boa Vista seria estratégico pois
localiza-se tanto nas margens da Rodovia Sorocaba-Itu como nas margens da Castelinho
(Rod. Senador José Ermírio de Moraes acesso à Rod. Castelo Branco).
* Os Estudos urbanísticos e demográficos da Proesp comprovam esta constatação empírica.
PROESP CTR - 088/94 Pág 2. 28
55
56
Ao observarmos o centro da cidade, por exemplo, vemos que
ele pouco mudou desde o final do século dezenove, com suas ruas
estreitas e tortas, demonstrando pouca preocupação com o
planejamento naquele momento passado.
Hoje, é praticamente inviável economicamente a
desapropriação para reurbanização da área central, tendo algumas
de suas ruas mais antigas - e estreitas - transformadas em
boulevares - como as Rua Barão do Rio Branco, Dr. Braguinha e
parte da Cel. Benedito Pires. Cabe ao centro ainda, nas Ruas XV de
Novembro e São Bento, concentrar o capital financeiro com agências
centrais dos mais importantes bancos da cidade.
Já em 1950 afirmava SANTOS que “No próprio traçado da
cidade pode-se identificar o velho centro urbano do século passado
com sua feição tradicional e os blocos anexados durante os últimos
cinquenta anos, e consequência do desenvolvimento industrial. O
centro antigo, organismo de crescimento natural, encerra um
amontoado de pequenas ruas e vielas, além da grande praça matriz
com sua enorme igreja de linhas coloniais. Os núcleos recentes,
muito mais heterogêneos, são verdadeiros marcos do crescimento
da cidade e da progressivo industrialização regional, do século
78
atual”.
O mapa a seguir nos mostra ruas onde estava localizado as
principais casas comerciais arroladas pelo censo de 1872. Nota-se o
maior número de estabelecimentos na Rua da Penha, oferecendo
serviços diversificados, desde loja de fazendas até máquina de
descaroçar algodão. Em seguida aparece a Rua da Ponte (atual Rua
XV de Novembro) e sua continuação a Rua de São Bento
(permaneceu a mesma denominação) onde está atualmente a
capital financeiro.

78
SANTOS, Elina - A industrialização de Sorocaba, op. cit. pág. 67
57

Com relação às melhorias urbanas no final do século XIX, a


população local vai assistir a implantação da energia elétrica em
substituição ao gás carbônico.
O jornal Dário de Sorocaba do dia 17 e 18 de dezembro de
1890 (nº 2376 e 2377) publica o contrato “celebrado entre a
Intendência Municipal e o Sr. Francisco José Speers... para
iluminação pública e particular, a luz elétrica pelo sistema Westing
House pelo tempo e privilégio de 50 anos.”
Aceitava a Intendência Municipal as vantagens oferecidas
pela luz elétrica, entre elas:
- Ser “... Livre de todo e qualquer perigo de incêndio ou desastre” e
ainda,
- Economia notável, comparando-se com qualquer outra iluminação”.
No mesmo jornal do dia 17/12 um leitor que se identifica como
Z. D aponta desvantagens sobre as “vantagens” da luz elétrica
indicadas pela intendência.

“Levado dos mais patrióticos sentimentos, consta-nos, a


Intendência Municipal, ao empossar-se, pretende dotar a nossa
população com importantes melhoramentos. Entra no nº deles, um
sistema mais aperfeiçoado de iluminação pública, isto é, a luz
elétrica.
Não duvidamos proibidade e dedicação, que envidarão todos
os esforços possíveis para bem compensar a confiança do governo,
escolhendo-os para os primeiros a manterem a autonomia do
Município. Entretanto, convém pensar antes de fazer, de estudar
antes de obrar.
A luz elétrica, por exemplo, levada por uma errônea
apreciação à altura de um grande cometimento, tem provado quanto
são falsos os seus argumentos.
Não discutimos. Chamamos para testemunhar as judiciosas
considerações insertas num dos últimos números do estimado Diário
Popular. Leiam, meditem e depois façam.
Segundo o noticiaram as folhas públicas, está pendente da
aprovação do governo do Estado de São Paulo, uma proposta da
Cia de Luz Elétrica para iluminar esta Capital por meio de
58
eletricidade, em substituição ao gáz carbônico.
Não tenho a mínima dúvida a suficiência e o zelo com que o
digno superintendente das obras públicas, Sr. Engº Paula Souza,
examinará este negócio, que lhe será sem dúvida submetido pelo
honrado governador do Estado, e se venho falar nele Sr. Redator por
intermédio de seu conceituado Jornal, é pela circunstância de haver
lido ultimamente, no Jornal pariziense Le Soleil, de 11/9 próximo
passado, uma notícia um tanto desanimadora sobre a nova
iluminação.
Não há mais de um ano e meio que eu deixei a Europa, tenho
residido durante oito anos em vários países daquele Continente, e
em nenhuma das cidades que eu visitei, a luz elétrica é ainda
empregada, regularmente, na iluminação pública.
Não quero de maneira alguma estorar este, nem
melhoramento algum no meu País; ao contrário, desejo
sinceramente vê-lo na vanguarda da civilização. Por isso, penso que
devemos proceder sempre com ciência e prudência não nos
arriscarmos em experiênciae inovações que não tenham ainda a
sanção da prática máxima, quando se trata de melhoramentos que
interessam particularmente a comodidade das populações e custam
bom preço. O inscucesso de tais experiências traz ordinariamente
desanimo e atraso.
Eis aqui a notícia do Le Soliel sobre as experiências de
iluminação elétrica feitas nos boulevards de Paris:
“Fundavam-se grandes esperanças sobre a nova iluminação
elétrica que funciona a alguns meses nos grandes boulevards. Mas
os resultados esperados não se produziram. Seriam pueril querer
dissimular: é uma decepção.”
“Esta iluminação esbranquiçada, não oferece a sensação de
luz que se esperava.”
Se ajuntarmos a isto as variações de intensidade, as extinções
que se produzem assaz frequentemente, chegaremos a concluir que
a questão de iluminação elétrica está longe de ter achado sua
fórmula definitiva.
A eletricidade tem seus caprichos, não se pode contar com
ela. Não se pode quase usá-la sem conservar alguns bicos de gáz
por segurança.
Ultimamente no teatro da Ópera foi preciso iluminar a
59
sala a gáz, durante toda apresentação, por ter falhado a eletricidade.
Estes e outros inconvenientes desaparecerão com aparelhos
mais aperfeiçoados e uma produção de eletricidade mais constante.
É licito esperá-lo porque as outras aplicações da eletricidade,
o telégrafo e o telefone funcionam ao longo tempo sem dificuldades.
Enquanto, porém, isto não acontecer, os defeitos da nova
iluminação saltam aos olhos, e o gáz não parece ainda dever ceder-
lhe o lugar.
Sob o ponto de vista da despeza é interessante citar alguns
algarismos: O bico de gáz intensivo custa por hora 21 centimos
(cerca de 80 reis) 1 lâmpada elétrica custa 60 centimos (cerca de
220 reis por hora), isto é, quase três vezes mais.
O resultado da nova iluminação esta longe de ser proporcional
ao sacrifício que teria de fazer o contribuinte.
Não me consta que depois da experiência parisiense, de
setembro último, viessem os fatos estabelecer a luz elétrica como
meio regularmente seguro de iluminação pública, corrigindo-se os
defeitos apontados pela citada folha francesa.
Eu digo que sei, e estimarei conhecer a opinião dos que
sabem mais ou melhor.”

Z. D.

Mas, já em 1895 a concessão está com João e Vicente


Lacerda (engenheiros sorocabanos) que conseguem iluminar a
cidade de forma irregular. Apenas no final de 1900 os irmãos
Lacerda perdem a concessão tendo o contrato sido considerado
caduco pela Câmara Municipal.
Outros ainda tiveram a concessão de fornecimento, como A.
J. Bington, depois Bernardo Lichtenfelds Jr. e Manoel José da
Fonseca que, sem represa, canalizaram a água do Salto do
Ituparanga com força de 2000 CV.
Em 1911 venderam a concessão à São Paulo Eletric CO, que
no ano seguinte iniciou a construção da represa. Esta viria a
funcionar em 26/5/1914, gerando energia e protestos, pelas altos
custos do aluguel particular (medidores 3$000 por mês, jóia 10$000
mais o consumo).
Reclamações já comuns em outros locais - como Rio de
60
79
Janeiro e São Paulo
Afirma ALMEIDA que “... a Estamparia só pode funcionar em
1913, porque a Light não facilitou muito o fornecimento de energia e
foi preciso construir no ribeirão do Turvo em Pilar do sul uma
represa. Por muitos anos, Salto de Pirapora via passar nas ruas os
fios de eletricidade da Estamparia e não podia ter luz elétrica, por ser
80
a Light a privilegiada por lei em Sorocaba”
Em 1915 a Light passa a controlar também o transporte de
bondes, inaugurando em 31/12/1915 a primeira linha. Ficou a cargo
dessa companhia até 1951 quando o governo municipal assumiu.
Em fevereiro de 1959, o serviço de bondes foi extinto.

O mapa a seguir mostra o itinerário inicial dos bondes da São


Paulo Eletric CO.

Posteriormente, (em Janeiro de 1920) a São Paulo Eletric. Co.


Anunciou a ampliação das linhas, que se efetivam apenas em 1927.

79
Em 1909 declarava o jornal “A Notícia” (2/03/1909) em um artigo sobre a concorrência entre a
Light e a Guinle: “a capital paulista vai ter o benefício enorme da concorrência de
iluminação e energia elétrica. Em vez de monopólio, de fato, que hoje gozava a Light...
está fechada a época em que os lucros despropositados da Light só se explicam pelo
abuso da taxa elevadíssima.” Citado por CARONE, Edgard e PERAZZO, Priscila F. - São
Paulo lutas contra o monopólio IN Revista Memória nº7, Ab/Maio/Jun/90, pág 42 -
Publicação do Depto de Patrimônio Histórico da EletroPaulo.
80
ALMEIDA, Aluísio - Presença Inglesa nas Antigas Tecelagens - artigo para o Jornal Cruzeiro do
Sul, 15/8/78.
Houve aumento das ruas servidas pelos bondes no
61
Além Ponte e Cerrado assim como a reforma nos carros.
Depois disso nada mais mudou, até que, no dia 14/07/1951 a
São Paulo Elétric Co. Passou todo o serviço para a Prefeitura
Municipal que pagaria pelo aluguel dos postes e da energia. Todo
serviço de reforma deveria ser feito nas oficinas da E.F.
Sorocabana.
Publica o Cruzeiro do Sul do dia 15/07/1951 um aumento no
preço da passagem, mantido inalterado desde 1915 em Cr$ 0,20
para Cr$ 0,50. Possivelmente tenha havido reclamações, por parte
da população - que já reclamava da precariedade dos bondes.
Em 1 de março de 1959 o mesmo Cruzeiro do Sul anuncia:
“Era dos Bondes Elétricos em Sorocaba já havia terminado”, pois a
Prefeitura optou pela desativação em 28/02/59.
Sobre o fim dos bondes, diz um sorocabano ferroviário
aposentado da Sorocabana:
“O Prefeito Lozano fez apenas duas coisas que ninguém mais
esqueceu: acabou com os bondes e emancipou Votorantim. A
primeira atrapalhou os trabalhadores e a segunda o caixa da própria
Prefeitura, pois a fábrica Votorantim era uma grande fonte de renda
para a cidade. Logicamente que a família Ermírio de Morais estava
81
por tráz disso.”
REDE DE ÁGUA E ESGOTO
Devido as duas epidemias de febre amarela (1897 e 1900) a
população sorocabana passou a exigir redes de esgotos e água
encanada no lugar das latrinas de fossas e dos “pipieiros”
(carroceiros vendedores de água retirada do Rio Sorocaba)
Somente em 1903 a cidade terá as redes de água e esgoto e
em 1908 completou-se o bairro Além-Ponte com essas melhorias,
sendo nesse ano construida a Adutora de Itupararanga (foto). Em
1911 a Light pode construir sua represa ... “com a condição de
fornecer água, 80 litros por segundo e, oportunamente, 12 Kms (sic)
82
de canos até o Cerrado”. A segunda caixa d’água (a 1ª foi a do
83
Cerrado) foi inaugurada apenas em 1948

81
Depoimento do Sr. Jacir da Silva, ferroviário aposentado, em fevereiro de 1994
82
ALMEIDA - História de Sorocaba op. cit. pag. 266
83
Conforme estudos da PROESP, a cidade hoje é atendida em 97,5% de ligações de esgoto e
97% de água CTR - 088/94 pág 1.2.
Outras melhorias urbanas que podemos destacar no
62
início do século XX são:

1889 - “Carros de Praça” de aluguel (tração animal)


1899 - Nova Santa Casa de Misericórdia
1906 - Cinematógrafo ambulante
1907 - Primeiro automóvel
1907 - Empresa Telefônica Sul Paulista
1909 - Ginásio Sorocabano (municipal, fechado em 1911)
1910 - Primeiro cinema
1911-1912 - Primeiros automóveis de aluguel (em 1913 a Prefeitura
implanta as primeiras leis de trânsito: “Onde houver acumulação de
84
pessoas a velocidade será de um homem a passo”
1912 - Primeiras ligações telefônicas com São Paulo
1913 - Grupo Escolar Antonio Padilha
1921 - Início do calçamento (paralelepípedo)
1924 - Escola do Comércio
1929 - Ginásio do Estado

Em relação às escolas, temos para o ano de 1912,


matriculados 820 alunos na instrução pública municipal (372
85
masculinos e 448 femininos entre 7 a mais de 12 anos) e,,
conforme o mapa VI, Sorocaba ficaria entre as cidades do interior
com maior número de alunos matriculados (Santos, Campinas,
Ribeirão Preto, São Carlos são algumas das cidades à frente de
Sorocaba).
No ensino público estadual noturno o número é pequeno e apenas
cursos para o sexo masculino. Aparece o mapa IX: 4 escolas, 180
86
alunos matriculados e 130 alunos frequentes em 1912.
Atentando mais para a população do município,
predominantemente urbana, vamos ter um crescimento na faixa de
87
2,5% ano . O que exigia melhoramentos e infra-estrutura para

84
ALMEIDA, História de Sorocaba op. cit. pág. 270
85
Anuário Estatístico de São Paulo (Brasil) 1912 Vol I pág. 167
86
idem pág 173.
87
Por falta de dados mais precisos, elaboramos um cálculo tendo por base o gráfico “População -
Município de Sorocaba (1890 - 1940) e o mappa III (Mappa dos nascimentos registrados nos
annos de
atender a população crescente. Não somente escolas mas,
63
saneamento, saúde, transportes, lazer.
Conforme indica NEGRI (1989:61) a cidade atingirá a década
de 20 com 44,9% dos operários da região, ou seja, 7.850
trabalhadores apenas no ramo têxtil 1.8996 trabalhadores em outros
ramos (calçados, chapéus, Ferrovia, etc) e 988 ligadas ao

1893 a 1900 e de 1901 a 1906) do Anuário Estatístico - 1906 - Vol I pág. 89. Porém nossos
cálculos
consideraram para o crescimento populacional apenas nascimentos servindo como um “guia”
para nossas
análises do urbano. Apesar do nosso cálculo ir até 1906, seguindo o Gráfico de População
utilizado
verificamos que nosso índice não está muito diferente. Estudos efetuados pela PROESP nos
decênios de
1940 até 1991 apresentam números parecidos até a década de 60
1940/50 - 2,34%
1950/60 - 2,97%
1960/70 - 3,02%
1970/80 - 4,13%
1980/91 - 3,30% (CTR - 088/94 pág. 2.6.)
Considerando o decênio 1893 a 1902 teremos um crescimento de 2,35%.
SOROCABA NASCIMENT OS
( A )

1893 a 1900 1901 1902 1903 1904 1905 1906 TOTAL


4.145 296 714 750 913 872 896 8.586
CRESCIMENT O
o o * *
2,5% + 1,03% 2,49% 2,61% 3,11% 2,9% 3% 35,14%
o * *
média de 519 nasc/ano

*com base no ano de 1907 - 29.284 hab.


o
com base no ano de 1902 - 28.669 hab. ( B )
+ média com a soma dos anos posteriores

(A) Anuário Estatístico São Paulo 1906 pág 89


(B) Gráfico População Município de Sorocaba
1970/80 - 4,13%
1980/91 - 3,30% (CTR - 088/94 pág. 2.6.)
88
comércio . Aproximadamente 24% da população indicada
64
nos Dados Gerais do Estado 1890 - 1938 (43.588 habitantes).
A concentracão de pessoas na cidade propicia vantagens
para a instalação fabril, pois, existe uma mão-de-obra liberada para
o assalariamento e ainda, consumidores em potencial para os
produtos fabricados
..."Porém se historiamente, as cidades preexistiram às
indústrias, ocorreria que a partir do momento em que o capital
industrial chegou a dominar todas as demais atividades econômicas,
89
ele passou também a determinar toda a expansão urbana”
Isso não aconteceu de imediato, ou com a inauguração da
primeira fábrica têxtil em 1822. O processo terá maior ênfase a partir
de 1910 quando outras fábricas têxteis estão em funcionamento, o
comércio de muar é pequeno (as feiras) deixam de acontecer no
início do século) e economicamente sem peso local.
A expansão urbana impulsionada pelas indústrias pode ser
verificada na formação de novos bairros - ou vilas, como dizem os
moradores - alguns tipicamente operários como são os casos da Vila
Santana, Santa Rosália, Santa Maria, Vila Angélica,Vila Carvalho.
Esses bairros surgem ao redor ou próximos de fábricas:
Vila Santana - bairro formado na sua maioria por ferroviários da E.F.
Sorocabana,
Santa Rosália - bairro formado pela própria Santa Rosália para
seus empregados,
Santa Maria - Também uma vila operária, construída pela Fábrica
Santa Maria,
Vila Angélica - bairro que agrupava operários de diversas fábricas.
Consta em projeto municipal que esta Vila e a Vila Barão teriam
Vilas operárias o que não ocorreu,
Vila Carvalho - formada por operários devido à proximidade das
fábricas NS da Ponte, Santo Antonio e oficinas da E. F. Sorocabana
A localização das fábricas, no começo da industrialização, se
dava no perímetro urbano, exceto a Santa Rosália e a Votorantim
distantes 7 Km do centro de Sorocaba.

88
Recenseamento de 1920 - Vol IV (5ª parte) - TOMO II pág. 799
89
HARDMAN, Francisco Foot. T rabalho Urbano e vida operária IN MENDES JR, Antonio e
MARANHÃO, Ricardo (organizadores) Brasil História, texto e consulta: HUCITEC, pag.
276, cap LXXV.
Desde 1904 a cidade fica conhecida como a
65
“Manchester Paulista”, apelido dado por Alfredo Maia, em discurso,
na festa da construção da barragem no Rio Sorocaba para a usina
de energia elétrica, numa alusão à cidade têxtil inglesa.
Anos depois, o operariado a partir de idéias anarquistas e
socialistas “rebatizaria”a cidade de “Moscou Brasileira” ou “Moscou
Paulista”.
É interessante recuperar o caminho da construção dessas
duas cidades do imaginário sorocabano, pois são elas, junto com
outros fatores subjetivos na criação do espaço - diferenciado do
90
proletário e da burguesia

. MANCHESTER PAULISTA X MOSCOU PAULISTA

As fábricas sorocabanas serviram-se muito das máquinas


produzidas na Inglaterra. A primeira fábrica que prosperou na cidade
em 1882, a Nossa Senhora da Ponte, comprou todo maquinário da
empresa Curtis Sons e Co., de Manchester. Com o desenvolvimento
industrial inglês era interessante ampliar o mercado de máquinas
novas ou mesmo ultrapassadas para as indústrias inglesas.
A cidade de Sorocaba que vinha fornecendo algodão àquele
país, agora também começa a consumir máquinas inglesas.
Em 1904, quando Alfredo Maia chama Sorocaba de
Manchester Paulista, a cidade conta com quatro fábricas têxteis de
“grande porte”.
. 1.882 - Nossa Senhora da Ponte
. 1.890 - Votorantim e Santa Rosália
. 1.896 - Santa Maria, além de duas fábricas de chapéus,
manufaturas e artesanatos.

Interessante analisar que, atrás de um discurso inflamado está


a ideologia da classe burguesa, nesse momento (1904) tentando

90
“... chamados fatores subjetivos e políticos expressos através das associações de classe,
formas de consciência, movimentos próprios, níveis de organização e papel histórico das
direções políticas... Fatores objetivos e subjetivos combinavam-se de forma dialética: os
períodos de ascenção das lutas operárias eram a comprovação histórica desta relação”.
HARDMAN, op. cit. pág. 286 cáp. LXXV.
firmar-se como uma “classe para si..., pois esta...não
66
91
conseguira formular um projeto político próprio.”
Eram imigrantes ligados ao comércio, como Manoel José da
Fonseca (algodão e tecidos); a Estrada de Ferro, como Frank
Speers, George Oetterer, Francisco de Paula Mayrink, fundadores
da Santa Rosália; e bancos, como o Banco União proprietário da
Votorantim e também técnicos da indústria têxtil como o inglês
Marchísio, ex-gerente da N.S. da Ponte que associado com outros
comerciantes fundou a Santa Maria.
Retornando um pouco na história, vemos que o uso de
trabalhadores livres está ligado à construção da ferrovia, “...a lei que
definiu a nova política ferroviária em 1852 já vedava expressamente
92
a utilização do braço escravo nos trabalhos da estrada” . A ferrovia
em Sorocaba foi fundada em 1870 e inaugurada para o tráfego em
1875.
Em 1882 a fábrica Nossa Senhora da Ponte anunciava no
jornal local:

“Precisa-se contractar rapazes de 12


a 15 anos e mulheres para o serviço
da machina de tecidos do Sr. Manoel
José da Fonseca. Para tratar na
mesma machina com o Sr.
93
Alexandre Marchísio.”

“Entre os meses de maio até novembro desse mesmo ano o


94
Sr. Fonseca organizava e disciplinava o trabalho na sua indústria..”
Em 2 de dezembro de 1882 a fábrica foi oficialmente inaugurada.
Assim, mesmo antes da abolição, eram trabalhadores livres os
ferroviários, têxteis, pedreiros e uma gama de manufatureiros e
artesãos de Sorocaba.
91
LEONARDI, Victor. Primeiras fábricas e forma do capital industrial. In: __________ MENDES
JR, Antonio e MARANHÃO, Ricardo. Brasil História T exto e Consulta. São Paulo :
Hucitec, p. 213, cap. LXIX.
92
MATOS, Odilon Nogueira de. Vias de Comunicação. In: ____________ História Geral da
Civilização Brasileira. Tomo II, v. 4, p. 46-51, apud LEONARDI, op. cit. p. 218.
93
Diário de Sorocaba, Anno II, n o. 227, p. 4, 1/3/1882.
94
SCHRÖDER, Adelaide da Fonseca F. Manoel José da Fonseca - Pioneiro da nossa
indústria. Sorocaba, 1960, p. 25.
No final dos anos 80 do século passado a luta pela
67
abolição acirra-se dentro do processo racional de trabalho, o escravo
“atrapalhava” a burguesia (enquanto capital empregado na compra)
e os proletários (que não conseguiam se organizar como classe e
lutar pelos seus direitos).
Nesse momento burgueses e proletários “lutam numa batalha
comum”: a libertação dos escravos. Libertação que, na verdade,
liberaria essas duas classes sociais para travarem a luta de seus
interesses antagônicos.
Em 1887, um grupo da burguesia comercial e industrial ligado
à Casa Maçônica Perseverança III consegue em dezembro a
libertação de todos os escravos locais.
Perceberam os burgueses que as relações de trabalho
precisavam ser alteradas, “..daí que a liberdade do escravo não
tenha se constituído em liberdade para o escravo e sim em liberdade
para o burguês, isto é, para o capital... o que importava salvar não
era a pessoa do cativo, mas sim o capital” (MARTINS, 1990:110)
Sabiam também as dificuldades que a liberação da mão-de-
obra escrava traria aos seus proprietários.
A 27 de dezembro de 1887 noticiava o jornal Diário de
Sorocaba:

“SOROCABA REDIMIDA -
Domingo,
25 do corrente, reuniram-se no
Paço da Câmara Municipal
muitos senhores de escravos que
haviam sido convocados pela
95
Comissão Emancipadora .
Aclamado presidente da Assembléia
o Dr. Ferreira Braga, convidou para
secretário o Ten. Cel. Cavalheiros e
o cap. Joaquim Firmino.”
95
Faziam parte da Comissão Emancipadora em Sorocaba: A.J. Ferreira Braga, Manoel José da
Fonseca, Eduardo A. da C. Vieira, José T. Cavalheiro, José Loureiro de Almeida, Francisco de
Souza Pereira, Manoel Nogueira Padilha, Olivério Pilar, Joaquim F. de Toledo Penteado,
Christiano Exel. “Tinham o objetivo de resolver pacificamente a emancipação completa dos
escravos... sem desorganização do trabalho”.
VIEIRA, Rogick. Sorocaba não esperou o 13 de maio, op. cit. p. 50.
Dizia o presidente da Assembléia “Não há
68
dúvida que a transição do trabalho
escravo para o trabalho livre, traria
em começo dificuldades, mas que a
prudência e a inteligência do paulista
havia de vencer logo máxime
aqueles que, convencendo-se que
não pode haver meia liberdade para
os escravos concederam-lhe
liberdade incondicional e salário,
como aqui alguns fazendeiros
adotaram já, estendendo-se sobre o
assunto com muito critério e
lembrando medidas justas para
regular o estado entre os senhores e
os libertos”
o.,
A 1 de janeiro de 1888 foram entregues as cartas de
liberdade para os 940 escravos inscritos em março de 1886 na
cidade. (VIEIRA, 1988:53)
Apesar do número reduzido de escravos inscritos - se
comparado a outras cidades - vemos que, se alguns fazendeiros
tiveram problemas, por outro lado, a libertação adiantada começa a
resolver questões e tensões que vinham se agravando no sistema
como um todo, entre elas, a da formação do mercado de trabalho
96
livre.
Mas, essa libertação adiantada não significa que o negro será
absorvido de imediato pela indústria que nascia; ao contrário, muitos
continuaram com seus ex-senhores ou marginalizados por uma
sociedade que se modernizava tecnicamente, preferindo a mão-de-
obra especializada do imigrante.
A ‘Manchester Paulista’ da burguesia era o centro da cidade,
local de sua morada e das decisões, local da vida social e dos
melhoramentos urbanos exigidos pelas “pessoas de nossa
sociedade.”

96
Ademir GEBARA no seu estudo “Escravidão: Fugas e Controle Social”, apresenta as tensões
entre o homem livre - escravo em diversas cidades do Estado de São Paulo, entre elas
Sorocaba. Cadernos IFCH : UNICAMP n o. 12 2/84.
Conforme nos alerta Martins, em sua obra sobre o
69
cotidiano no subúrbio de São Paulo, “...a história de São Paulo tem
sido escrita do centro para a periferia.. mesmo quando se estuda a
história da classe operária, que sempre viveu nos bairros e no
97
subúrbio, prevalece essa orientação fora de contexto.”
A “Manchester Paulista” era um “Centro Industrial”
independente da localização física de suas fábricas. E mais,
independente do local de moradia dos operários.
No imaginário burguês centro industrial e centro da cidade
estavam metamorfoseados, por isso independia da localização
física.
Como acontece com a burguesia dos países de
industrialização tardia, o centro comercial de Sorocaba estava mais
ligado ao centro comercial inglês do que ao resto da própria cidade.
No que diz respeito à vida social, o bucólico é sempre
resgatado pelos escritos de hoje, como é o exemplo de Ângelo Vial,
ex-operário e depois industrial em Sorocaba, referindo-se a cidade
como “pacata cidade surpresa com a agitação dos trabalhadores,
98
seus discursos e comícios” . Outros retratavam apenas o progresso
industrial, “...Sorocaba indiscutivelmente cresce com a realidade,
ocupando o primeiro lugar, já não se exceptuando cidade alguma do
99
interior, já atendendo-se à relação entre a própria capital”
As referências ou são bucólicas ou ufanistas. O operariado,
quando aparece, é citado como favorecido pela indústria local, “...
um dos mais importantes núcleos do trabalho do nosso paiz, situado
na Vila Industrial [Votorantim] e que facilita o meio de subsistência a
100
mais de quatro mil pessoas.” ou como agitadores.
A Manchester Paulista, no imaginário burguês, repetia na sua
vida quotidiana a “ordem e o progresso” das fábricas, vez ou outra
afetada pela agitação de um ou outro operário mais inflamado.

“O operário era concebido pela burguesia ou como um agitador e


marginal perigoso, espécie de bandido infiltrado na fábrica ou, na
97
MARTINS, José de Souza. Subúrbio - Vida. op. cit. p. 9.
98
OLIVEIRA, Sérgio C. São Paulo de Sorocaba. IN: IPESI Grupo Gilberto Huber, São Paulo,
1986, p. 23.
99
CESAR, F. Camargo. Sorocaba Industrial. In: __________ Almanach Ilustrado de Sorocaba,
Editado pela Typographia W erneck. Sorocaba, 1912, p. 42.
100
CESAR, F. Camargo. Sorocaba Industrial. op. cit. p. 42. grifo nosso.
melhor das hipóteses, como um ignorante ou débil mental que
70
101
necessitava da proteção do capitalista”

A esse marginal ou ignorante “...era necessário reprimí-lo ou


102
controlá-lo, sob as ordens capitalistas, dentro e fora da fábrica”
O paternalismo era patente na relação burguesia-operariado
“...Fonseca...amparava a pobreza de tôdas as formas. Quando sabia
algum dos seus operários doentes, ia logo visitá-lo pessoalmente,
ou mandava alguém levar o necessário para a sua cura e seu
sustento, e da família” (SCHRÖDER, 1960:41). O proprietário da
primeira fábrica têxtil de Sorocaba (Manoel José da Fonseca), como
os outros industriais sorocabanos, tinham “consciência” da
necessidade da manutenção da força de trabalho para o operário
continuar produzindo...e pobre.
Nos anos que se seguiram, outros comerciantes e pequenos
industriais iriam aumentar o número de indústrias em Sorocaba.
Alguns sobrenomes começam a se destacar na sociedade
sorocabana como Scarpa e Pereira Ignácio, que se tornariam
nacionalmente conhecidos como grandes industriais em diversos
ramos. O primeiro com mais de 40 fábricas de tecidos, óleo,
calçados, farinha, telefone, explosivos e o segundo adquire, com a
falência do Banco União, a Fábrica Votorantim, em 1917, ampliando
suas propriedades industriais em vários setores.
A cidade industrializada cresce, os melhoramentos urbanos
auxiliam com a infra-estrutura necessária: até 1903 foram-se
completando as ligações domiciliares de água e esgotos, o serviço
telefônico em 1912, a energia elétrica em 1914, e os bondes em
1915.
Da inauguração da primeira fábrica em 1882 até,
aproximadamente, 1915, outras indústrias instalam-se e algumas
modificações ocorreram nas já existentes. Cronologicamente
podemos descrever:

1882 - Manoel José da Fonseca inaugura a primeira


fábrica de tecidos.

101
HARDMAN, op. cit. p. 287.
102
Idem, idem.
71
1883 - Francisco Matarazzo abre uma pequena fábrica de
banha.
1890 - O Banco União de São Paulo, presidido pelo
Cel. Lacerda Franco, constrói a Fábrica
de Tecidos Votorantim.
1890 - Construída com capitais de Francisco de
Paula Mayrink a Fábrica Santa Rosália,
dirigida por Jorge Oetterer e Frank
Speers.
1890 - A firma Marchisio Loureiro, Silverio e Cia.
funda a fábrica Santa Maria.
1891 - Votorantim é ampliada com estamparia.
1897 - Fábrica de Chapéus Souza Pereira.
1900 - Francisco Matarazzo inaugura o Moinho e
encerra sua atividades em Sorocaba com
a banha.
1902 - Votorantim se amplia com tecelagem e
fiação.
1902 - A fábrica Santa Maria passa para Ernesto
Zscoeckel.
1904 - A fábrica Santa Maria passa para Campos,
Kenwort e Cia.
1905 - A Pereira Ignácio e Reynaldo Coutinho e Cia.
monta a Fábrica de Óleo Santa Helena.
1909 - Fundada a Fábrica de Chapéus Bandeirantes.
1909 - Criada a CIANÊ (Cia. Nacional de
Estamparia) abrangendo as fábricas
Santo Antônio e São Paulo.
1909 - Fundada a Fábrica de Malhas São José de J.
e Cia..
1910 - A fábrica de Óleo passa a ser Cia. Paulista de
Fiação, tecelagem e Óleos, formada
pelas firmas Pereira Ignácio e Cia. e
João Soares Hungria e Filho, com filiais
em Tatuí, Boituva e Conchas.
1912 - Fábrica de Calçados Soares.
1912 - Manoel José da Fonseca deixa de ser dono
da fábrica Nossa Senhora da Ponte e
mantém-se como acionista da S.A.
Nossa Senhora da Ponte organizado por Bernardo
72
Lichtenfels e Bernardo Lichtenfls Jr.
1913 - É inaugurada a Fábrica Santo Antônio, da
CIANÊ.
1914 - Nicolau Scarpa adquire a fábrica Nossa
Senhora da Ponte.
1915 - Criada a Fábrica de Enxadas Nossa Senhora
Aparecida.
1917 - O Banco União de São Paulo abre falência e
Antônio Pereira Ignácio adquire as
fábricas da Votorantim, fundando a S. A.
Votorantim.

Devemos relembrar que falamos das indústrias principais - as


têxteis, formando um parque monoindustrial importante - mas havia
fábricas menores e mesmo manufaturas e artesanatos diversos.
No estudo sobre as bases físicas da industrialização de
Sorocaba, na década de 50, Santos afirmava: “...as antigas fábricas
de tecidos da cidade de Sorocaba viram-se às voltas apenas com
melhoramentos internos e renovação da maquinária e são estas
mesmas fábricas que constituem hoje, o grupo têxtil de Sorocaba”.
(SANTOS, 1950:58)
Podemos acrescentar ainda que novas sociedades se
formaram em diversos momentos adquirindo ou apenas alterando a
razão social das antigas fábricas.

“A Indústria aparecera na região numa época em que era preciso


contar apenas com a matéria prima e com a mão de obra...
Sorocaba que teve as primeiras grandes indústrias do Estado e uma
das primeiras usinas hidro-elétricas de vulto no sul do país, viu-se,
na segunda década do século XX, rapidamente ultrapassada pelo
103
parque industrial paulistano” .

Como terá sido considerado o papel do operariado nessa fase


da decadência, com a hegemonia do parque industrial paulistano?

103
SANTOS, A industrialização... op. cit. p. 58.
Um fator considerado, senão único, o mais importante
73
para essa “parada no desenvolvimento industrial” é justamente o “da
culpa do operário”...

“Já nos primeiros anos do século XX, quando um surto industrial


tomava conta da cidade, aparece, ao lado das fábricas e dos
operários, a figura do anarquista, liderando “paredes”. E tal
comportamento, como seria de se esperar, alarmou a classe
empresarial sorocabana, constituindo-se num dos fatores limitantes,
104
daí para frente, da crescente industrialização da cidade”

A construção do imaginário fabril da Moscou Brasileira ou


Moscou Paulista, entretanto, não foi tarefa fácil.
Apesar da ocorrência das greves, manifestações e
“agitações”, devemos lembrar que nesses mesmos “primeiros anos
do século XX”, havia por parte do operariado interesse de que a
industria conseguisse se manter.
Um exemplo disso podemos ver na imprensa local, quando a
noticia d envio, ao Congresso, de um documento solicitando a
proteção para a indústria nacional, acrescentando que “... é o instinto
105
de conservação que impele os abaixo assinados”...
Mas, analisemos melhor a afirmação de Coelho, citada acima.
Conforme o articulista, “aparece ao lado das fábricas e dos
operários, a figura do anarquista”. O líder não faz parte do meio
operário, está fora do movimento, apenas quer agitar, tirar o operário
da passividade e obediência que convém à burguesia ou que
imaginava a burguesia.
Mais adiante diz o articulista:

“Sempre vanguardeira, Sorocaba foi o maior espaço para o início do


domínio dos vermelhos”... “buscando em seguida um lugar ao sol na
106
política sorocabana”.

104
OLIVEIRA, São Paulo de Sorocaba. op. cit. p. 23.
105
Jornal “O 15 de novembro” - 2/8/1905.
106
OLIVEIRA. São Paulo de Sorocaba. op. cit. p. 23, grifo nosso.
Assim, sugere este autor que a liderança operária
74
queria mesmo era ascender socialmente para a burguesia e
desfrutar ao “Sol do Capital”.
Anteriormente, havíamos transcrito palavras do ex-operário e
107
depois industrial Angelo Vial que afirmava o susto dos
sorocabanos com a “agitação operária”.
Como uma cidade operária pode ser pacata?
Conforme o levantamento de Genésio Machado para o
“Almanaque de Sorocaba (1950)” intitulado “Sorocaba no Século
XX”, a cidade não era tão pacata quanto imaginam alguns.
Vejamos:

“1901 - Apareceram com abundância jornais críticos e literários, na


108
sua maioria compostos na Casa Durski.
1902 - Declara-se a primeira greve dos operários da Cia. de Estrada
de Ferro Sorocabana. O jornal “Comercio de Sorocaba”,
que tinha como redator o jornalista Henrique Lopes, foi
um dos incentivadores intelectuais desse movimento. As
autoridades interviram e tudo retomou a paz.
1907 - A 21 de julho, numa das exibições da pantomina, que era um
tanto realista, alguns espectadores protestaram com
violência degenerando esse protesto em conflito, com
troca de tiros entre os populares e a polícia, resultando
vários feridos.
1910 - A 20 de junho, às 21 horas mais ou menos, quando uma
passeata política de desagravo fronteava o edifício do
jornal “Cruzeiro do Sul”...verificou-se violento tiroteio
sendo os manifestantes dispersados, constatando-se
que, além de numerosos feridos, haviam perdido a vida
os integrantes Lino, Gastão e Belmiro.
1911 - A 29 de setembro, às 20:30 horas, mais ou menos, foi
baleado o ...Dr. Braguinha, como era chamado, que

107
Conforme nota n o. 11
108
Conforme BONADIO, “... uma bem montada tipografia de Sorocaba que, entre outras
impressões está a revista “Fim de Século de idéias socialistas”. BONADIO, Geraldo. “O
Partido Democrata Socialista e o Jornal A Conquista do Bem 1907 - uma tentativa de
organização política dos trabalhadores na indústria”. Sorocaba : Academia Sorocabana de
Letras, 1992, p. 15.
comandava a política de oposição ao governo e
75
109
era um dos líderes dos trabalhadores .

Essas poucas notícias do cotidiano sorocabano podem


mostrar-nos que a cidade não era tão pacata, mas sim, um cotidiano
marcado por acontecimentos que “movimentavam a cidade”.
A vida social, parece acertado, tinha ingredientes que
atestavam o descontentamento das classes operárias e pobres.
Acontecimentos que, na sua essência, questionavam a
sociedade de classes da realidade do começo do século.
Mas a Moscou Brasileira ou Paulista do imaginário “obrero”
não era a mesma Manchester Paulista do imaginário burguês.
No mesmo artigo de Machado encontramos:

1909 - Diversas pessoas da nossa sociedade fizeram uma


representação à Câmara, fazendo sentir a necessidade
da criação de um ginásio, em Sorocaba, equiparado ao
110
Ginásio Nacional

As tais “pessoas da nossa sociedade”, que altruísticamente


não queriam aparecer; diferente dos muitos Linos, Gastões e
Belmiros que surgiam entre as classes mais pobres; solicitavam e
eram atendidas: um prédio no centro da cidade, local da burguesia
industrial e comercial.
A Moscou Brasileira ou Paulista não cabia no centro da
cidade. Ela partia do bairro, das vilas operárias.
Assim descreve o mesmo Almanaque de Sorocaba 1950:

“Vilas Operárias

A Cia. Nacional de Estamparia edificou para seus operários em


Santa Rosália, uma verdadeira cidade-jardim, com cerca de 500
“bungalows”(sic) e que constitui passeio obrigatório de todo visitante
de Sorocaba.

109
MACHADO, Genésio. Sorocaba no Século XX. IN: Almanaque de Sorocaba, 1950, Sorocaba,
s. ed., 1950, p. 41-2.
110
Idem, idem
Amplas avenidas arborizadas, igreja, grupo escolar, hospital,
76
estádio, jardins, lojas, posto de abastecimento caracterizam bem o
verdadeiro burgo que ali cresceu. Além da Vila Santo Antônio
111
próxima a fábrica do mesmo nome, conta com 200 residências”.

Acrescentamos ainda as Vilas operárias da Santa Maria e da


Votorantim.
Realmente, ainda que o articulista estivesse utilizando uma
figura de linguagem, o “verdadeiro burgo”, refletia a situação do
operariado local em relação ao patronato: dependência.
“A vida operária nessas vilas era um prolongamento da rígida
disciplina imposta no regime de trabalho fabril... Além da presença
paternalista conservadora dos patrões, o controle social sobre as
famílias de trabalhadores, nessas vilas operárias, se fazia presente
através de escolas para as crianças, creches, armazéns e capelas,
112
onde se veiculava a ideologia dominante”
Apenas para ilustrar a dominação e o controle do patronato
sobre os operários, citamos alguns trechos das entrevistas que
fizemos com moradores dos atuais bairros operários.

“Lá na Votorantim, o gerente de crianças resolvia até as brigas de


crianças e seus pais corriam o risco de levar suspensões ou
advertências conforme a gravidade do caso. O gerente ficava de
113
janela aberta vendo a gente brincar no páteo.”

O ano em que isso se passou foi 1967...


Outro relato de uma moradora da Vila Santa Maria:

“Minha mãe era viúva com cinco filhos pequenos. Os maiores


trabalhavam com ela na fábrica, na Santa Maria. Eram tantas horas
que a gente dormia escondida embaixo das máquinas. Coisa de
criança.
O que a gente ganhava ia direto para minha mãe. Não ficava com
nada. Ela era muito ajudada pelos donos, eles gostavam dela. Ela

111
Almanaque de Sorocaba 1950, Sorocaba, s.ed, 1950, p. 121.
112
HARDMAN, op. cit. p. 290.
113
Depoimento de uma funcionária da Fábrica Votorantim que não quis se identificar
saia da fábrica e ia direto fazer janta na casa deles. Que ano
77
114
foi? Ah! acho que 44 ou 45.”

Os relatos usados mostram que a situação da classe operária


em Sorocaba ficou marcada muito tempo pela dominação,
paternalismo, assistencialismo dos empresários locais.
Outro ingrediente da Moscou Brasileira ou Paulista eram os
apitos...

. NO RITMO DO APITO

RELÓGIO
As coisas são
As coisas vêm
As coisas vão
As coisas
Vão e vêm
Não em vão
As horas
Vão e vêm
Não em vão
(Oswald de Andrade)

“Quando o apito da fábrica de


tecidos vem ferir meus ouvidos eu
me lembro de você...”
Noel Rosa
“Três Apitos”

Nas crônicas sobre o início da industrialização o apito é o


relógio da cidade, o que “regulava a vida dos sorocabanos... Os
115
apitos... eram uma marca registrada da vida urbana de Sorocaba”.

114
Depoimento da Sra. Eulza T.C. da Silva, ex-moradora da Vila Santa Maria em fevereiro de
1994
115
Sorocaba 337 anos - caderno/revista publicado pelo Cruzeiro do Sul - jornal diário em
15/8/91, p. 84.
A cronista Neide B. Mantovani recorda seu cotidiano em
78
Sorocaba quando criança:

“Vinte e duas horas. Soava o último apito do dia. Era a Santa Maria
a.
que no seu silvo longo avisava o pessoal da 3 turma que o seu dia
de trabalho iria começar.
Lembro-me de que na minha infância, geralmente a essa hora nós
crianças já estávamos na cama e... fazíamos aposta para ver quem
ouvia o apito por mais tempo...
Depois que ficamos mais crescidos, nas noites quentes de verão,
tínhamos permissão para brincar na rua até apitar 10 horas.
Este sinal também valia para, quando já moças, saíamos para
116
passear na praça ou namorar...”

Estórias como essa são comuns por toda a cidade.


A ideologia do trabalho seriado e obediente é incorporado pela
classe trabalhadora, em todos os níveis de sua existência. A ditadura
do relógio - do patrão - regula a vida do trabalho, do lazer, das
refeições, do amor, e assume o caráter simbólico da presença
constante do patrão: “A cidade era calma e os apitos podiam ser
117
ouvidos a longa distância”
Novamente a idéia da cidade pacata e o bucólico.
Na verdade, o apito que se ouve a longa distância pode ser
reconhecido como a voz do patronado ou “chamando” para o
trabalho, ou “alertando” os operários para o fim do lazer e hora do
descanso diário.
Descansar para retomar, noutro dia, o trabalho e a produção.

“O horário de trabalho era bem amargo. Os operários entravam às


cinco horas da manhã, com as estrelas bem visíveis. Tinham
quarenta e cinco minutos para o almoço, às onze horas. Depois
continuavam sua faina até às oito horas da noite, voltando para seus
118
tugúrios ainda sob a luz das estrelas”

116
Idem, idem
117
Ibidem
118
PENTEADO, Jacob. Belenzinho, 1910 (retrato de uma época). São Paulo : Livraria Martins
Fontes, 1965, p. 29.
Pelo relato pessoal do autor sorocabano, nascido em
79
1900, morador da vila operária de Santa Rosália, ou como ele se
119
refere, Distrito de Nossa Senhora do Rosário , na vida do operário
o apito cabia mais para retornar ao trabalho do que para retirá-lo do
lazer.
Em nome da ordem e da pontualidade, criou-se o apito e suas
variações, cabendo ao operário aprende-los e responder
prontamente a eles.
Conta-se entre os ferroviários de Sorocaba que durante uma
greve, ocorreu um incêndio na Sorocabana e o “apito de incêndio” foi
soado chamando os operários para ajudar a contê-lo e, eles
responderam prontamente ao chamado.
Como eles mesmos aceitam, ‘é um misto de amor e
necessidade que fez os ferroviários largarem a greve nessa hora.”
O apito institui entre o operariado o dever da pontualidade e o
“respeito pelo chefe”, no caso os donos das empresas.
Continuando com o relato de Jacob, vemos mais um pouco do
cotidiano no ritmo do apito.
“Pobre papai! Morreu moço. Organismo não muito resistente,
trabalhando sem cessar, sucumbiu ao desumano regime então
imperante na indústria!
Faleceu em 1903, deixando-me com três anos de idade, e a minha
mãe, parturiente, com uma criança que nasceu no mesmo dia em
que expirava o pai, no quarto contíguo.
Vieram então, dias de grande dor e trabalho, pois mamãe, ainda não
refeita do profundo golpe que sofrera nem tampouco da recente
maternidade, precisou ir trabalhar na “Santa Rosália”, a fim de
sustentar-se e às duas criancinhas que lhe ficaram na desolada
viuvez.
Vejo-a ainda, quando, em plena madrugada, eu também acordava,
ao apito da fábrica¸ cujo som ecoava, no silêncio da colina, como um
doloroso chamado. Meio insone, pois passava as noites cuidando do
pequeno Antoninho, levantava-se, preparava às pressas seu magro
café, vestia-se, beijava-nos e seguia para seu calvário. Aos
domingos, dia de folga para todos, esfalfava-se em lavar a roupa da
semana, à beira do Rio Sorocaba, que corria aos pés do morro..

119
”A poucos quilômetros do centro da cidade, ergue-se uma aprazível colina, conhecida por
Santa Rosália, embora figure oficialmente como Distrito de N.S. do Rosário”. Idem, p. 28.
..A vida em Santa Rosália, não apresentava novidades...Eram
80
quase todos italianos ou espanhóis.
120
Viviam em boa paz, talvez por que o sofrimento os irmanasse.”

O cotidiano do apito não é de alegria, pois o rítmo não era de


festa, mas da máquina. Da modernidade aberta com o ‘século do
tecelão’ na cidade, modernidade para alguns, precaridade para a
maioria.
Quando os articulistas gabavam-se de títulos como ‘O apito
das fábricas governa a cidade’, não estavam apenas intitulando
gratuitamente um texto, mas relatando uma situação real do
operariado sorocabano.
Uma metáfora do imaginário fabril.
A condição operária no início do século, em Sorocaba, não
diferenciava muito da maioria do Brasil: péssima.
Não havia leis previdenciárias, regularização das horas de
trabalho dos homens, mulheres e crianças e ainda, nenhuma
estabilidade ou garantia da permanência no emprego.
O próprio relato de Penteado, citado anteriormente, dá uma
prova disso. Seu pai faleceu e a mãe foi obrigada a assumir o
sustento da casa, sem grandes auxílios (ou nenhum) por parte da
empresa.
Havia ainda, no caso de demissão, a possibilidade de o
operário perder sua moradia, já que esta pertencia à fábrica.
Mas o operariado reage, manifesta suas necessidades e
descontentamentos tentando unir-se em associações mutualistas.
121
Na sua maioria são imigrantes italianos, espanhóis e portugueses.
As Sociedades atestam essas origens:

1885 - Societá Operaria Italiana Umberto


1886 - Societá Italiana de Mutuo Soccorso i beneficensa
1890 - Sociedade Beneficente e Protetora dos Chapeleiros
1896 - Sociedade Beneficente dos Empregados da Cia União
Sorocabana e Ytuana

120
PENTEADO, Belenzinho... op. cit. p. 30 (grifo nosso).
121
Conforme Aluísio de Almeida, “...a colônia espanhola principiando a chegar em 93 ou 95,
primeiro operário, fez além ponte uma espécie de Brás. Citado por GODOY, op. cit. p. 42, nota
n o. 81.
1903 - Liga de Resistência Operária
81
1912 - Comitato da Societá Dante Alighieri
1912 - Real Sociedade Portuguesa Beneficente Vasco da Gama
1912 - Conferência de São Vicente de Paulo.

Como não encontramos datas precisas da inauguração das


três últimas sociedades, adotamos a data que primeiro aparece no
122
Anuário Estatístico de São Paulo , provavelmente tenham sido
inauguradas anteriormente.
As associações garantiam o direito a “...cada associado e
respectiva família...a serviços médicos e farmacêuticos, ajuda em
dinheiro durante doença, invalidez ou desemprego, além de pensões
123
às viúvas, velhos e orfãos.” Algumas possuíam escola e
promoviam conferências em suas sedes.
Às vezes, o próprio operário tinha que chamar seus
companheiros à luta, como vemos no artigo de um jornal local:
“Um jornal local, o Cruzeiro do Sul, grita continuamente contra o
abuso systemático desta administração local convidando o povo a
protestar, mas é como si clamasse no deserto; o trabalhador daqui
não se envolve em política...
...Agora faço apello por intermédio do “Avante” a todos os meus
companheiros...a deixar em paz as questões pessoaes, porque a
União é indispensável à propaganda do nosso ideal.
124
“Avante, operários, uni-vos”

Havia um grande número de crianças e mulheres nas fábricas,


como atestam as imagens fotográficas da época, recebendo salários
muito baixos e trabalhando muitas horas por dia.
O trabalho infantil era tido como uma “caridade da parte dos
patrões”. Conforme citamos anteriormente, a primeira fábrica têxtil
em 1/3/1882 fazia um anúncio solicitando “rapazes de 12 a 15 anos
125
e mulheres”
Em 1899 diz o jornal O 15 de Novembro sobre a Fábrica
Santa Rosália no setor de fiação:
122
Annuário Estatístico de São Paulo, Vol. I, 1912, p. 318.
123
GODOY, op. cit. p. 44.
124
Cruzeiro do Sul, 13/9/1903 - Sorocaba. O “Avante” foi uma publicação do jornalista italiano
Vicente Vacirca, de linha socialista; conforme PENTEADO op. cit. p. 146
125
Conforme nota n o. 6 de A construção da cidade industrial.
82
“Nestas últimas machinas só operam crianças, meninos ágeis que é
uma viva satisfação ver para alli ocupados, aproveitando
santamente, o tempo em que outras malboratam na ociosidade e na
126
préciosidade do vício”

O trabalho das crianças era visto como pedagógico e


educativo e evitava que a criança se “desviasse do bom caminho”...
Assim descreve Jorge Street a saída dos seus pequenos
operários: “É uma verdadeira revoada alegre e gitante que sai a
127
frente dos maiores, correndo e brincando” .
Vejamos o que diz Penteado em suas lembranças sobre a
fábrica têxtil:
“Nos dias em que não havia aulas, mamãe levava-me consigo para
a fábrica...
Nos primeiros dias, aquilo, para mim, foi uma festa, uma novidade.
Olhava para aquelas centenas de teares, cujos braços batiam
incessantemente... Para não permanecer inativo, davam-me restos
de espulas para cortar... ia retirando os poucos fios que ainda
ficavam enrolados na espuma, quando esta não servia mais para a
lançadeira. Esta peça, então, era uma constante ameaça para as
tecelãs, pois de quando em quando, escapava do tear e ia projetar-
se, com incrível velocidade, para os lados. Como possuía uma ponta
de ferro bastante aguda, em forma de peão, constituía realmente um
128
perigo”

E completa suas impressões:

“Após algumas horas de fábrica, eu ficava inquieto e começava a


perambular pelas várias secções.
... e, de cinco em cinco minutos, consultava o relógio, numa ânsia de
ver-me livre daquela prisão a que fora condenado pela minha mãe e
129
por minha avó...”

126
O 15 de Novembro, 3/8/1899
127
CARMO, Paulo S. do. A ideologia do trabalho. 4 a. ed.. São Paulo : Moderna, p. 70.
128
PENTEADO, op. cit. p. 62.
129
Idem, idem
Pelo relato vemos que o trabalho infantil não era tão
83
alegre e a correria da saída não era uma brincadeira, mas sim, fuga
da prisão diária.
O trabalho infantil servia como complemento dos baixos
salários das famílias operárias. Um complemento necessário à
sobrevivência familiar.
O inconveniente do trabalho infantil, e também feminino, a
nível de classe operária, era que este dificultava a organização
operária e ampliava o exército de reserva, o que levava a queda dos
salários dos homens na ativa.
Além da questão infantil, outro agravante da situação operária
eram os atrasos no pagamento.
Em 1903 no mesmo artigo, já citado anteriormente, onde o
operário chama seus companheiros à luta, há a reclamação sobre o
atraso de três meses da Cia Sorocabana.
Quando não, eram obrigados a comprar gêneros nos
armazéns das fábricas, onerando cada vez mais o operariado.
Em 1914 como não havia dinheiro para o pagamento dos
salários, os industriais reuniram-se para achar a solução. Criaram
vales que poderiam ser trocados por mercadoria no comércio local.
Novamente o operário saiu lesado: as lojas começaram a
cobrar ágio, alterando, o preço das mercadorias.
A seguir, anexamos uma tabela com os gastos de uma família
operária, feito por Hélio Negro e Edgar Levenroth
“Segundo o antigo operário e historiador Everardo Dias, a
partir deste cálculo mínimo, havia um déficit no orçamento de uma
família de operários urbanos de cerca de 100%, ou seja, o consumo
130
era o dobro do que se ganhava normalmente”

“CONSUMO DE UMA FAMÍLIA OPERÁRIA URBANA


(HOMEM, MULHER E DUAS CRIANÇAS)

130
LEUENROTH, Edgar e NEGRO, Hélio. O que é o Maximismo ou Bolchevismo. São Paulo,
1919 apud HARDMAN, Trabalho urbano..., op. cit. p. 297-8.
84
Alimentação
12 quilos de arroz de segunda 9$600
12 quilos de feijão 4$200
18 quilos de batatas 5$400
15 quilos de pão 7$500
10 quilos de farinha de mandioca 4$000
05 quilos de macarrão 5$000
10 quilos de carne 10$000
07 quilos de toucinho ou banha 11$200
07 ½ quilos de açúcar 7$000
03 quilos de café 3$000
15 litros de leite 9$000
Verduras 6$000
Cebolas, alhos, sal,
pimenta, vinagre, 28$000
querosene, vassoura, e
outras miudezas
Soma
89$900

Alojamento
Aluguel de dois cômodos, com cozinha 45$000
Outras necessidades
Sabão 6$000
03 sacos de carvão 9$000
Fósforo, cigarros, mensalidade ao
barbeiro e à sociedade de socorro 17$000
mútuos
Soma 32$000

Vestuário
Homem (por ano)
2 ternos de roupa de pano ordinário 80$000
2 pares de sapatos 24$000
2 chapéus 14$000
3 camisas 12$000
3 ceroulas 9$000
meias etc 12$000
Mulher
85
3 vestidos de chita 60$000
2 pares de sapatos ou chinelos 24$000
3 camisas 15$000
3 saias brancas 21$000
12 pares de meias 18$000
Duas Crianças
Roupa e calçado 100$000
Outras necessidades
Móveis, louça, e outros objetos
necessários, durante o ano (imprevistos) 100$000
Total anual 489$000
ou seja, por mês 40$000

Resumo
Alimentação 89$900
Alojamento 45$000
Outras necessidades 32$000
Vestuário, calçado e demais imprevistos 40$750
Soma 207$650

Como se vê, nestas despesas não estão incluídos quaisquer


divertimento, bebidas, bonde, luz, educação das crianças, nada
absolutamente que vá além do que é estritamente necessário à vida
de quatro entes humanos.
Foi calculada uma alimentação parca, da mais inferior
qualidade, e só para quatro pessoas, não obstante as famílias de
operários serem geralmente mais numerosas.
Supomos também que o chefe da família trabalha desde o
primeiro dia do ano, embora saibamos que há as paragens forçadas
por doenças, desemprego, greve etc.
Recaíra ainda sobre a precária condição de vida do operário
sorocabano, o peso psicológico de, em 1917, ser considerado o
responsável pela falência da Votorantim. Diz ALMEIDA:
“Aconteceu, então , que após uma greve geral de todas as
fábricas de Sorocaba em agosto de 1917 a fábrica Votorantim não
reabriu O “Banco União” não pode pagar o aumento de salário...” E
alude, sem muita ênfase, que também não pagou “por dificuldades
advindas da Primeira Grande Guerra, faliu.” (ALMEIDA, 1969:274)
Conforme os estudos de GODOY, vemos que a culpa
86
estava mais ligada ao empresariado que aos operários.

“A fábrica Votorantim, apesar de ser efetivamente uma das maiores


da América do Sul, era em 1913 - dois decênios depois de sua
131
fundação - uma promessa.”

Várias tentativas foram feitas para “ salvar “ a empresa e o


próprio Banco União de São Paulo da falência: empréstimos,
mudanças na diretoria, redução das despesas.
Mas, “...o ano de 1917 seria o último de funcionamento para o
Banco União. A falência não pôde ser evitada. E suas causas podem
ser explicadas pelos seguintes fatores:
a) as dificuldades encontradas por todas as empresas
industriais para funcionar num sistema econômico
caracterizado por uma racionalidade comercial,
b) a falta de capital de giro;
c) a incapacidade administrativa dos principais acionistas;
132
d) a política cambial do estado”
Porém, o que ficou na memória popular e na historiografia
local foi a greve como a culpada pela falência.
Não só isso, também o operariado, nem tanto organizado, foi
acusado de impedir ou limitar a fixação de outras indústrias como já
citamos anteriormente...
Na luta ideológica entre as duas classes sociais, que queriam
se firmar, ficou a Manchester Paulista: cidade das indústrias - mas
não do operário - e do progresso. Cidade que soube lutar pelo seu
desenvolvimento.
À Moscou Paulista coube o esquecimento, a “culpa”, por
querer melhores condições de vida, a “vergonha” por não enriquecer
trabalhando.

131
GODOY, op. cit. p. 25.
132
Idem, p. 27.
87

Até logo, até logo, companheiro,


Guardo-te no meu peito e te
asseguro:
O nosso afastamento passageiro
É sinal de um encontro no futuro.

Adeus, amigo, sem mãos nem


palavras.
Não faças um sobrolho pensativo.
Se morrer, nessa vida, não é novo,
Tampouco há novidade em estar
vivo.

1925
Sierguéi Iessiênin
(Tradução de Augusto de Campos)
88
VII. PONTOS FINAIS

Chegamos a um ponto que quer ser final.


Durante o percurso do texto chegamos a algumas conclusões
sobre o processo de industrialização, ou melhor, a gênese do
processo industrial em Sorocaba. Um trabalho com tal pretensão
chega ao fim sem atingir seu objetivo. Aparentemente.
Andamos durante todo o tempo atrás de respostas. Respostas
que o nosso viver acadêmico queria satisfatórias. E por que não,
perfeitas. Mas a leitura do texto revela-nos que formulamos
questões, invertemos os questionamentos. Conforme íamos
redigindo o texto, ele se ia fazendo, por conta da liberdade que nos
permitimos. Falar sobre o operariado e seu cotidiano no final do
133
século XIX e começos do XX, é mergulhar como um flâmeur pela
cidade, como nos sugere Walter Benjamin, em meio a diferença por
ele apontada entre o contador de estórias e o romancista. Ë que o
primeiro tem quem o ouça.
No momento em que mergulhamos pela cidade, primeiro
cidade das feiras de muares agitada, alegre, com um comércio que
movimentava a vila local ao mesmo tempo em que encarecia a
subsistência de uma parcela da população, pois todos queriam
acumular rápido, já que a Feira durava apenas três meses, ouvimos
histórias de viajantes, alguns maravilhados, outros preocupados com
a “farra”, as mulheres de vida fácil, e alguns sorocabanos, da
sociedade local, dando graças com o fim das feiras, clamando pela
“moral e bons costumes”, que não eram respeitados durante esses
meses.
Num segundo momento, observamos o deslocamento das
atividades econômicas para o comércio do algodão. Comércio
exportador, contatos com a Inglaterra, com o Porto de Santos,
133
”O Flâmeur é aquele que vaga pela cidade num derivé. Mas não é somente o espaço da cidade
que está à disposição do flâmeur, é também sua história...A flânerie o conduz para um
tempo desaparecido, cada rua para ele é uma ladeira que desce em direção ao passado -
o dele e o da cidade”.
ROUANET, Sérgio Paulo. “É a cidade que habita os homens ou são eles que moram nela?” In:
_________Dossiê Walter Benjamin. Revista USP, nº 15, set/out/nov 92, p. 50
muitas libras enriquecendo alguns sorocabanos, e o pequeno
89
lavrador de algodão ocupando toda família nesse cultivo, para
garantir sua subsistência. A cidade começa a modificar-se junto aos
manufatureiros e artesãos. Ligadas, principalmente, às feiras,
surgem máquinas de descaroçar algodão, início da mecanização.
Até mesmo a fábrica de chapéus, despercebida como fábrica, de tão
comum no dia-a-dia das pessoas aquele complemento do vestuário,
ainda que muito importante à época.
Antes de adentrar o novo século a cidade já possuía fábricas
têxteis. A profa. Dra. Elina O. Santos, na tese de doutoramento,
página 69, aborda a arquitetura de Sorocaba, mostrando suas
mudanças, afirmando: “Quem mudou muito foi a população que lhe
dá vida. O ciclo industrial com a introdução do operário criou novas
condições de vida para sua sociedade. Com o aumento progressivo
do operariado estendeu-se a área urbanizada ao mesmo tempo que
134
adquiria a cidade aspecto de centro industrial”.
Realmente, quem mudou muito foi a população que constitui a
cidade nos fins do século XIX e anos posteriores, é diferente daquela
que vivia, por exemplo, das feiras de muares ou da agricultura.
Durante, porque já não está dispersa pelos sítios como os
produtores de algodão; diferente porque não tem as ferramentas de
artesão ou uma oficina, muito menos um comércio exclusivamente
ligado aos tropeiros e às feiras. A “nova” população está
concentrada em bairros próprios, as vilas operárias, sua única
propriedade, porém, é a força de trabalho.
Todos, por certo, lutavam pela sobrevivência. Mas outra é,
agora, a relação social. Não têm mais a liberdade produtiva do
artesão e do manufatureiro. Além do trabalho serial, o resultado final
não lhe pertence. Não tem mais a liberdade de horário, seu dia
começa e termina com as estrelas, e é marcado pelo apito que o
intima para o trabalho diuturnamente. Igual aos demais, sua
condição de vida é péssima, ao contrário de uma classe privilegiada
que sempre existiu..
Contudo, diferente dos demais, o operário luta, põe em relevo
o antagonismo entre as duas classes sociais: proletários e
burgueses. Tenta se organizar em sociedades mutualistas e de
resistência, sabe que a luta é coletiva. Mostra à burguesia e à toda a

134
SANTOS, Industrialização de Sorocaba... op. cit., p. 69
sociedade que o progresso não é geral, mas unilateral.
90
Somente a Manchester Paulista progride; a Moscou Paulista ainda é
um devir. “O cotidiano da classe operária em São Paulo revela ao
135
mesmo tempo atitudes alternadas de conformismo e rebeldia”.
Não apenas em São Paulo, mas também no interior a luta dos
operários jamais foi linear, avanços e recuos se sucediam. Para
garantir o avanço do processo industrial na cidade, o operário solicita
ao Congresso Nacional apoio à indústria brasileira. De outra feita,
aceita os valores como forma de pagamento mensal, para garantir
tanto seu trabalho e sustento, quanto a mais-valia do patrão. Em
outros momentos revolta-se, vai à greve, faz denuncias.
Entrementes, faz festa.
É o momento - imaginam - de ganhar as ruas centrais,
suprimir a visão idílica que cabia ao interior, mesmo tendo de
carregar o peso da responsabilidade da falência da fábrica. Ou,
então, ser preso, como o “...marceneiro Joseph Joubert... que
...chegou a agredir o delegado de polícia da cidade. Foi julgado e
136
condenado a 4 meses de prisão”.
Aliás, o operariado era coisa de polícia, mesmo! Na falta de
um departamento e de leis que regulamentassem as relações entre
patrões e empregados, ambos recorriam à polícia. As “fichas de
solicitação de emprego” eram feitas na delegacia. Uma forma de
racionalização do trabalho e de controle da população proletária.
Tudo indica, porém, que pouco adiantava aos operários
recorrer à polícia ou ao delegado, reivindicando qualquer coisa que
fosse. À polícia cabia “manter a ordem” e o operariado era visto
como marginal, indisciplinado, quase-coisa. Os patrões, ao contrário,
eram tidos como benfeitores das massas pobres e tinham direito de
solicitar (sempre atendidos) uma intervenção policial quando
achassem necessário.
Da análise, resulta que a formação do empresariado industrial,
assim como o proletariado, foi possível graças à articulação e depois
dissolução das atividades, feiras, algodão, de cunho comercial. Não
que as indústrias tenham eliminado essas atividades. Bem ao
contrário, irão se aproveitar delas. Das feiras, podemos inferir que

135
DECCA, Maria A.G. de. Cotidiano de trabalhadores na República São Paulo - 1889/1940.
São Paulo : Ed. Brasiliense - Col. tudo é História n o. 130, 1990, p. 16.
136
OLIVEIRA, São Paulo de Sorocaba...op. cit. p. 23.
91
foram importantes na infra estrutura urbana, abrindo caminhos
novos, novas ruas para a passagem das tropas e até mesmo
favorecendo a elevação da vila à categoria de cidade, em 1842.
Entretanto, os “ares de vila” só mudarão a partir de 1870-
1880 quando novas coonstruções - como a Estação da E.F.
Sorocabana, o primeiro prédio de tijolos da cidade começaram a
substituir as construções de taipa.
A cidade havia se ampliado, mas ainda, não era esteticamente
moderna. As fábricas trazem o estilo inglês na arquitetura de seus
prédios desoando dos restantes de simplicidade colonial num
modelo português.
A Manchester Paulista de operários e empresários, muito mais
desses últimos, é uma cidade que se moderniza com sua
infraestrutura urbana sendo melhorada para atender às
necessidades da população e do capital industrial e comercial nela
aplicados.
As redes de água, esgoto e iluminação reclamadas pela
população temerosa com as duas epidemias de febre amarela
certamente não demorariam visto ser também do interesse dos
industriais, como forma de garantir e melhorar a produção e
consequentemente seus lucros.
O interesse se comprova no primeiro contrato de 1890 com
Frank Speers (Francisco José Speers) que foi um dos fundadores da
Fábrica Santa Rosália (Oetterer e Speers e Cia.).
A cidade cresce realmente. No período do auge das Feiras de
Muares as ruas foram sendo prolongadas ou abertas, o comércio
tomava impulso, mas, é com a industrialização que a cidade irá se
tornar um “centro regional”, recebendo população e oferecendo um
comércio diversificado.
Diferente do período das feiras, quando a movimentação era
maior durante alguns meses apenas, a Sorocaba industrial recebe e
oferece ventagens, à população da região próxima, o ano todo.
Da cidade era comercializado e enviado o algodão ao porto,
depois passa a ser transformado e comercializado ali mesmo.
Podemos inferir ainda, que a população pobre e os operários
sorocabanos foram, junto com os de muitos lugares, fundamentais
para a aceitação dos produtos nacionais (principalmente tecidos,
produtos básico), já que estavam impossibilitados de consumir
produtos estrangeiros.
Mas nem tudo, em uma cidade, é apenas concretude.
92
O imaginário, criado pela população, também constrói o
espaço social, morada do cidadão.
Criam-se os mitos. Pessoas ou situações no caso: Maylasky,
o “Estrangeiro Misterioso”e Sorocaba, a Manchester Paulista.
A manutenção do primeiro está em suas ações e
empreendimentos. A da segunda, no espaço.
Prova disso é o interesse e o orgulho pelos bondes que
começam a trafegar pelas ruas e o alarde modernista anunciado
pelos jornais. As chaminés com sua negra fumaça do progresso
exaltadas nos almanaques. A comparação com a cidade inglesa
ajuda na ideologia do trabalho seriado tão necessária ao capitalismo
aos capitalistas. O espaço se altera para fazer jus a essa posição de
cidade fabril, moderna, à frente nas iniciativas empreendedoras.
Antes “Novelo de Linha”, agora Manchester Paulista. A cidade
cresceu realmente...
Porém, essa posição de destaque, primeiras décadas do
século, não perduraria, sendo suplantada por Campibnas, Ribeirão
Preto, por exemplo
Ficou a alcunha. O cartão postal comercializado na cidade
confirma isso (Ver foto).
Daquela Sorocaba textil pouco sobrou no espaço rugosidades
(SANTOS, 1990:138)
Prédios vazios e semidestruídos no centro da cidade ou
transformados conforme o interesse público ou privado, mostram o
passado.
O tropeiro é lembrado anualmente com a “Semana do
Tropeiro”:
O operário têxtil não tem semana, nem dia, nem memória.
A construção da Manchester Paulista deixou no anonimato
seus construtores e as marcas no espaço estão acabando.
Desfazem-se os velhos mitos. Criam-se outros...
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MANUSCRITOS

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Casa de Aluísio de Almeida.

Arquivo do Estado de São Paulo.

IX. ANEXOS

LEVANTAMENTO DO COMÉRCIO SOROCABANO EM 1890


FONTE: ALLMANAQUE DA PROVÍNCIA DE SÃO PAULO, 1890,
PÁG 377 A 385

RUA DA PENHA
LOJAS DE FAZENDAS
Antonio Bernardo Vieira
Antonio José Araujo
Antonio Marciano da Silva
Araújo e Vieira
Carlos Ranier
Francisco Ferreira Leão
Luiz Matheus Maylasky
Manoel José da Fonseca
Manoel Maria X. De Araújo
Soares e Irmão
103
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Francisco Ferreira Leão
Gaspar José Ferreira de Paiva

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


Amancio Padilha de Oliveira
Antonio Fernandes da Rosa
Antonio Nogueira Custódio
Antonio Rodrigues da Costa
Bento José de Almeida
João Ribeiro Mendes
Manoel Marin

ALFAIATES
Henrique Rodrigues Costa

ARMADORES
José Manoel de Oliveira Leme

BARBEIROS
Serafim de Madureira

RUA DO COMÉRCIO
LOJA DE FAZENDAS
Antonio de Moraes e Silva
Eduardo Antero da C. Vieira
João de Oliveira Guimarães
Teixeira e Guimarães

ARMAZÉNS E ARMARINHOS
José Rodrigues Jorge

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


Antonio Maria de Góes
Francisco Antunes de Góes
Joaquim Pereira Guimarães
José Rodrigues de Oliveira
104
José Teixeira Cavalleiro
Luiz Rodrigues dos Santos
Paulino de Camargo
ALFAIATES
Benedito José de Almeida
Pedro Rodrigues de Mello
RUA DE SÃO PAULO
LOJA DE ARREIOS
Carlos Jacob Seraibrik

ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Antonio Pandorf
João Mathias Cleis
Joaquim Antonio Machado

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


Antonio Siryno da Silveira
Domingos Ildefonso Lopes
Joaquim Antonio Cardoso
Joaquim Antonio Machado
José da Costa Hortinha
José Sendy
Manoel Luiz Mendes
Manoel Pinto
Pedro José Sanger

ALFAIATES
José Alexandre da Silva

CONFEITARIAS
Joaquim Antonio Cardoso

FERRADORES
João Pedro Jacob Seraibrik

HOTÉIS
Manoel Luiz Mendes
Manoel Pinto
105
RUA DO HOSPITAL
ARMMAZÉNS E ARMARINHOS
Antonio Barnabé da Rosa
Luiz Bueno de Godoy
Manoel Vieira Rodrigues

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


Estanislão José de Mattos
Estanislão Joaquim de Almeida
João Marçal de Oliveira
Manoel da Costa e Souza
Manoel da Rocha Camargo
Prudencio Mart. De Souza Prestes
Vidal Rodr. Pacheco Gato

HOTÉIS
Ignácio Moreira da Silva

MARCINEIROS
João Carlos Gromas

OURIVES
Florentino Garcia Vieira
Francisco de Paula Oliveira
SELEIROS
Jacob Bauer

SERIGOTEIROS
Antonio Delfino de Arruda
Manoel da Costa e Souza

RUA DA PENHA
COLCHOEIRO
Adão de Paula

FÁBRICAS DE SEGES E TROLYS


Francisco Alves
106
LOMBILHEIROS
Ignácio Pereira de Campos

MACHINAS DE DESCAROÇAR ALGODÃO


Luiz Matheus Maylasky

MARCINEIROS
Frederico Schepe
José Messias da Costa Nunes

OUVIRES
Antonio José da Rosa
Antonio Martins de Oliveira
Antonio Machado de Moraes
Antonio Messias da Costa Nunes
José de Mascarenhas Camello
José Narciso Pacheco
RELOJOEIROS
Frederico Hummel

SERRALHEIRO
Hemrique Veuteroff

TIPOGRAPHIA
Julio Ribeiro

RUA DE SÃO PAULO


LOMBILHEIRO
Pedro José Sanger Jr.

OUVIRES
Antonio da Silva Oliveira

PEDREIROS
Antonio Francisco de Campos

SELEIROS
Serafim de Paula Rosa
107
SERIGOTEIROS
Antonio Fogaça de Almeida

RUA DAS FLORES


LOJAS DE FAZENDAS
João Aguiar de Barros

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


Hippolyto Cassino da Silva
João Joaquim de Oliveira

ALFAIATE
Irinêo Severino de Almeida

MACHINAS DE DESCAROÇAR ALGODÃO


Ten. Cel. Francisco Gonçalves de O. Machado

RELOJOEIROS
Francisco F. Hach

TYPOGRAPHIA
Francisco de Paula Oliveira Abreu

PEDREIROS
Adolpho Lippel

ADVOGADOS
José Leite Penteado
Ubaldino do Amaral Fontoura

MÉDICOS
Dr. João Henrique Adams
Dr. Pedro Dias Carneiro

CAPITALISTAS
D. Antonia Candida de Camargo
Ten. Cel. Fernando Lopes de Souza Freire
108
RUA DA PONTE
LOJA DE FAZENDAS
João da Cruz X. De Araújo

ARREIOS
Jeremias Wenderico

ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Antonio Fogaça de Almeida
Carlos Opts
Christiano Exel
José Barbosa

ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Domingos Paschoal
João Rodrigues Costa
Joaquim Cardoso da Costa
Raphael Cassiani

ALFAIATES
Manoel Dias da Cruz e Comp.

CONFEITARIAS
Dona Julia da Costa

FÁBRICA DE CHAPÉOS
Teodoro Kaisel (sic)

FÁBRICA DE VELAS DE CÊRA


Rosa Maria das Neves Vieira

FERRADORES
Antonio Jacob Seraibrik
Jeremias Serabrik

RUA DE SÃO BENTO


ARMAZÉNS A ARMARINHOS
Antonio Joaquim Dias
109
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Antonio Dangas
Maximiliano Martins Garibaldi

FERRADORES
José Antonio de Souza Bertholdo
Manoel Augusto de Souza

MARCINEIROS
Henrique Wast
Pedro Batista Der

RETRATISTA
Camilo Pijard

PHARMACEUTICOS
José Joaquim de Carvalho Mascarenhas

RUA DIREITA
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Camillo Rodrigues de Barros
José Antonio Galvão

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


Antonio Antunes de Oliveira Dias
Domingos Mobilla
João Venâncio Gomes
Joaquim Antunes de Oliveira Dias
Luiz Antunes de Góes
Pedro Meleville

CONFEITARIAS
Joaquim Teixeira Cavalleiros
D. Maria das Dores Pinto

PADARIAS
Pedro Meuville
TYPOGRAPHA
110
Manoel Januário de Vasconcellos

CAPITALISTAS
José Gabriel de Carvalho

RUA DA PENHA
PEDREIROS
Daniel Lippel

SELEIROS
Felippe Endres de Paula
José Bento de Macedo e Castro

SERIGOTEIROS
Candido José de Almeida

CAPITALISTAS
Antonio Marciano da Silva
Francisco Ferreira Leão

RUA DA PONTE
HOTÉIS
Manoel Furtado Côrte-Real

MACHINAS DE DESCAROÇAR ALGODÃO


Antonio Joaquim de Sant’Anna

MARCINEIROS
Carlos Opts
Germano Petcolt

SERIGOTEIROS
Antonio Luiz de Almeida

ADVOGADOS
Antonio José Ferreira Braga
Vicente Eufrásio da Silva Abreu
Joaquim Manoel Gonçalves
111
DENTISTAS
Joaquim Pacheco de Araújo

CAPITALISTAS
Antonio Joaquim de Sant’Anna
Cap. Francisco Xavier de Barros

RUA DE SANTA CLARA


ARMAZÉNS DE SECOS E MOLADOS
Bento Manoel de Almeida
Francisco Leme de Souza

LOMBILHEIROS
Francisco Feliciano de Barros
Manoel de Medeiros Barros

MARCINEIROS
Luiz Antonio de Sant’Anna

RUA DOS MORROS


ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Floriano Leme de Souza
Genoveva Maria de Quevedo
João de Barros Leite
Manoel Augusto de Castro Vasconcellos
Maria da Conceição

RUA DO CEMITÉRIO
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Antonio Gregório Martins

RUA MUNICIPAL
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Bárbara Ferraz de Camargo

RUA DO BOM JESUS


COCHEIRAS
Joaquim Antunes de Oliveira
RUA DA BOA MORTE
112
MÉDICO
Dr. Antonio José da Silva Braga

RUA DE SANTO ANTONIO


CONFEITARIAS
Jacob Bauer

RUA DA INDEPENDÊNCIA
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
José Thomaz da Silveira

RUA DA SANTA CLARA


ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Pedro Celestino de Assumpção

ARMADORES
José Caetano Prestes

SERIGOTEIROS
Joaquim Antonio da Trindade
José Anselmo Pereira

RUA DA CONSTITUIÇÃO
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
José Antonio de Barros

LARGO DA MATRIZ
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
José Leite de Freitas Broxado
Manoel Nogueira Padilha
Salvador Rodrigues dos Santos

ALFAIATES
José Joaquim dos Santos
113
BARBEIROS
Francisco Antonio de Sant’Anna
José Joaquim dos Santos

CASAS DE JOGOS DE VESPORA (LOTO)


Francisco Antonio de Sant’Anna

CONFEITARIAS
d. Carolina Der
D. Clementina do Amaral F. Ribas
João de Queiroz

DOURADOR E PRATEADOR
Antonio Tristão de Rezende

PADARIAS
D. Clementina do Amaral Ferreira Ribas

CAPITALISTAS
Lázaro Manoel Freire

RUA DO PIQUE
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Francisco das Chagas de Jesus Martins
Francisco Vieira de Pontes

RUA DO ROSÁRIO
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
João Kenipel

FÁBRICAS DE CHAPÉOS
Antonio Rogick e Comp.

FÁBRICAS DE SEGES E TROLYS


José Maia

FERRADORES
Bento José de Almeida Lima
114
MACHINAS DESCAROÇAR ALGODÃO
Te. Cel. João Teixeira de Miranda

PADARIAS
João Kenipel

PEDREIROS
Frederico Lippel

MÉDICOS
Dr. Virgílio Augusto de Araújo

PHARMACÊUTICOS
Joaquim Rodrigues da Fonseca Rosa

CAPITALISTAS
Antonio Rogick
Camillo José de Mattos Ellias Manoel Freire

RUA DOS PRAZERES


ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Floriano Quintino Torres

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


Florencio Paulino Ayres

RUA DA MARGEM
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Fontoura e Irmão
Redondo e Coelho

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


José de Almeida Tavares Maria Ferraz de Sampaio
Pedro José Fontoura
Pedro José Rodrigues de Camargo
CASAS DE JOGO DE VESPORA (LOTO)
115
Joaquim Vicente de Almeida

LOMBILHEIROS
Luiz Antunes

MARCINEIROS
Francisco Félix Fogaça
Jeronymo Antonio Lopes
Joaquim Vicente de Almeida
José Moreira Claro
Laurindo Antonio de Almeida
Raphael Isidoro Padilha
Salvador Laudate

RUA DA BOA VISTA


ARMAZÉNS E ARMARINHOS
João Joaquim de Camargo
José Pedro de Quevedo

ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS


Anna Aff
Felippe Wenderico
Joaquim Manoel de Oliveira Coelho
Mathias Antonio Mollitor
Pedro Samuel Stumber

COCHEIRAS
Agostinho Antonio de Oliveira Dias

OUVIRES
Guilherme Severiano da Costa Oliveira

SERIGOTEIROS
Antonio Maximiano de Godoy
Pedro Samuel Stumbek

RUA DE SÃO FRANCISCO


ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Antônio Ferreira de Paula
116

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