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REVISÃO
Armando Oliveira Lima
Capa
paulo celso da silva
infopoema novelo-manchester em p/b
“No passado, não trabalhar não era essa coisa do outro mundo
que é hoje”
Jorge Guinle
Revista Isto É, no 1253, p. 6.
6/10/93
No interrogatório, comunicam-lhe que a vão expulsar.
- Você é estrangeira!
Mas ela não conhece outro país. Sempre dera o seu
trabalho aos ricos do Brasil, sorri numa amargura. Vão levá-la
para sempre do Brás...Que importa? Ela ouvira dos próprios
defensores do presídio social: - Pobre não tem pátria!
Mas deixar o Brás! Para ir aonde?
...Que importa! Se em todos os países do mundo
capitalista ameaçado, há um Brás.
Outros ficarão...
. ... BRÁS DO BRASIL. BRÁS DE TODO O MUNDO.
. Àquela criança que se foi quando tudo estava começando, provando que é “Tão grande ser tão
pouco”.
Parque Industrial
Mara Lobo (Pagu)
1933
1
ÍNDICE
I. INTRODUÇÃO....2
II - ORIGEM DAS FEIRAS E DO REGISTRO DE ANIMAIS DE
SOROCABA....12
III. A MANUFATURA E O ARTESANATO LIGADOS ÀS
FEIRAS....19
IV. A PRIMEIRA EXPERIÊNCIA FABRIL TÊXTIL EM SOROCABA -
1852....28
V. A ECONOMIA DO ALGODÃO EM SOROCABA...31
. LUIZ MATHEUS MAYLASKY: UM MITO....32
. A “ESTRADA DO ALGODÃO”....36
. UM POUCO MAIS SOBRE A “ECONOMIA DO ALGODÃO” EM
SOROCABA....39
. ALINHAVOS NECESSÁRIOS..42
VI. A CONSTRUÇÃO DA CIDADE INDUSTRIAL....45
. MANCHESTER PAULISTA X MOSCOU PAULISTA....67
. NO RÍTMO DO APITO..79
VII. PONTOS FINAIS...91
VIII. BIBLIOGRAFIA....97
IX. ANEXOS....106
2
I. INTRODUÇÃO
1
LENCIONE, Sandra. Agricultura e Urbanização - A intensificação do capital no campo e a nova
Relação Rural Urbano no Estado de São Paulo. In:__________. Revista do
Departamento de Geografia n o . 4. FFLCH/USP, 1985:43
nas áreas cafeeiras foram rurais.
5
Esses fatos - ou particularidades - sugerem uma interpretação
além daquela que MARTINS (1990:106) o chama de binômio café -
indústria, isto é, uma relação causa - efeito que quer dar conta de
TODO processo industrial em São Paulo.
Todavia, o processo industrial em Sorocaba está articulado
com o geral.
...”a industrialização capitalista na América Latina é
específica e ... sua especificidade está duplamente
determinada: por seu ponto de partida .... e por seu momento,
o momento em que o capitalismo monopolista se torna
dominante em escala mundial, isto é, em que a economia
mundial capitalista já está constituída. É a esta
2
industrialização capitalista que chamamos retardatária.”
Dessa forma, se as particularidades do lugar sugerem
interpretações diferentes daquelas da economia cafeeira, isso
não significa descartá-las a priori, para não perdermos a
totalidade do processo capitalista brasileiro.
2
MELLO, João Manuel Cardoso. O Capitalismo T ardio. São Paulo : Brasiliense, 8 a. ed., 1991,
p. 98.
3
SILVEIRA, Maria Laura. Totalidade e fragmentação: o espaço global, o lugar e a questão
metodológica, um exemplo argentino. In:__________. O novo mapa do mundo - Fim de
século e Globalização. (vários organizadores). São Paulo : Hucitec, 1993, p. 205.
Em nosso trabalho, o acontecido e registrado, pois
6
muito desse acontecer se perdeu. O cotidiano do período
estudado mostra a busca de uma identidade nas várias faces
da realidade social: Manchester Paulista x Moscou Paulista ou
Brasileira. O imaginário burguês conseguiu impor-se, não sem
resistências.
As lutas são diárias, cotidianas, sem armas. Nem por
isso menos lutas. Lutas para realizar a manutenção da força
de trabalho.
Apesar das lutas, a memória do operário é a memória
do tempo trabalhado, “... o tempo de lembrar traduz-se enfim,
pelo tempo de trabalhar...” (BOSI, 1987 : XV).
Os operários e suas vidas nas fábricas, ou como
preferem alguns deles: os operários e suas fábricas. No seio
da resistência, o operário acaba fortalecendo a ideologia do
trabalho, do progresso industrial e da ordem necessária à
seriação fabril.
4
MARX, Karl. O Capital. Livro I, vol. II. Brasil : Bertrand, 1988, p. 831
5
Conforme LEFEBVRE “...o cotidiano é o humilde e o sólido, aquilo que vai por si mesmo, aquilo
cujas partes e fragmentos se encadeiam num emprego do tempo. E isso sem que o interessado
tenha de examinar as articulações dessas partes. É portanto aquilo que não tem data”.
LEFEBVRE, Henri. A vida cotidiana no mundo moderno. São Paulo : Ática, 1991, p. 31.
E tanto é assim, que o homem dentro da nova
7
relação social capitalista “aprende” o valor (?) do trabalho
6
seriado, da disciplina fabril, então alheios a ele .
Então, na vida cotidiana, o operário, estaria destinado
sempre a sujeição sem possibilidades de superação?
6
Um exemplo interessante e detalhado de desobediência pode ser lido no capítulo 7 da obra
“Subúrbio - Vida Cotidiano e História... (ver bibliografia) onde o operário Paolo Michelini
(ferramenteiro) assassina a tiros duas personagens da sociedade local. MARTINS conclui
“...Michelini se insurgia contra a dominação pessoal do patrão, os mecanismos de controle
e a disciplina subserviente que lhe queria impor.” (p. 353).
7
NETTO, José Paulo e FALCÃO, Maria do C. Cotidiano Conhecimento e Crítica. 2 a. ed.,
Cortes Editora, 1987, p. 27.
8
Idem, p. 28.
8
O corpo do trabalho
9
Santos, Elina - A Industrialização de Sorocaba Bases Geográficas - tese de Doutoramento
apresentada a cadeira de Geografia Física da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da
USP, 1950 pág 39.
Logo a população percebeu a fonte de renda que
9
eram as feiras e ofereciam diversos produtos a viajantes,
tropeiros, compradores, jogadores.
A vila começa a ser reconhecida pelas feiras anuais que
duraram 131 anos (1766-1897) com seu auge por volta de
1850.
A feira será responsável pela elevação de Sorocaba à
categoria de cidade em 1842.
Um fator externo irá incentivar uma atividade que já
vinha ocorrendo em Sorocaba: o cultivo do algodão.
A diferença porém é que agora o cultivo do
algodão será incentivado pela Inglaterra e as sementes são
do tipo herbáceo que possibilita melhor colheita. Um outro tipo
de algodão, o arbóreo, já era conhecido por ser nativo no
Brasil.
A nova atividade econômica em Sorocaba possibilita a
participação da cidade no comércio exterior, com a
exportação do algodão e ainda, mantendo-a na economia
interna, com os negócios das feiras.
Uma burguesia agrário-exportadora se forma.
Essa classe irá “incentivar” o pequeno produtor, a maioria na
região de Sorocaba, adiantando pagamentos, ensinando sobre
o plantio e colheita, para assim, garantir seus compromissos
com os consumidores europeus. Ao mesmo tempo investe na
compra do maquinário para beneficiar o algodão.
Além do comércio de animais e do algodão, destacam-
se também o artesanato e a manufatura surgidas para atender
a demanda tropeira nos meses da feira, e uma fábrica de
chapéus.
Esse primeiro momento do trabalho coloca as bases
para o processo industrial futuro, com o predomínio da
industria têxtil de grande porte e nos moldes capitalistas.
A segunda parte trata da construção da cidade
industrial: as transformações urbanas, a ótica de proletários e
burgueses, marcada pela ideologia dos mesmos na
construção da cidade.
Àquela cidade movimentada querem alguns autores
decadente. Com a chegada da ferrovia (1875) e o declínio dos
negócios do muar, “...tudo isso teve influência enorme na vida
de Sorocaba trazendo decadência e ruína para aquela
10
cidade”(GOULART, 1961:162).
Será mesmo decadente?
Adiantamos que não. Mapas, números, levantamento
comercial, gravuras nos ajudam a comprovar essa afirmativa.
A redação incursiona pela literatura quando abordamos
o cotidiano operário, principalmente.
De que outra maneira poderíamos falar dessa “legião de
anônimos”?
O movimento das pessoas corresponde à etapa da
produçào que está se dando naquele momento. Todos
são produtores - o operário, o artista de teatro, o
vendedor... etc., mesmo quem não está diretamente no
processo de produção, já que também consome. É a
maneira com que se dá a produção, e o intercâmbio
10
entre os homens que dá um aspecto a paisagem.
Vários personagens do dia-a-dia que a historiografia
local esqueceu.
Esqueceu também as contradições entre as
classes e sugere uma Sorocaba pacata.
Um sorocabano relata: “Pobre Papai! Morreu moço...
sucumbiu ao desumano regime então imperante na indústria”.
...“Vieram então, dias de grande dor e trabalho, pois mamãe...
precisou ir trabalhar na “Santa Rosália...” (PENTEADO,
1965:30)
Vê-se pelo relato que “papai e mamãe” não tem nomes.
São muitos papais e mamães operários assim. Não podemos
esquecer da crianças operárias sem nome habitando em
fábricas com nome.
É a ideologia dominante: do trabalho fabril ao
intelectual. Construções nomeadas, construtores anônimos.
Procuramos porém, com nossa incursão literária, não
perder de vista o caráter crítico-científico a que se destina
nossa dissertação.
Os caminhos das pesquisas nos fizeram um Flâneur, e a
conclusão é o percurso dele pela Sorocaba em seus
10
SANTOS, Milton - Metamorfoses do Espaço Habitado - Ed. Hucitec, SP, 1988, pág 72
momentos tirando conclusões, levantando novos
11
questionamentos tão necessários... ainda que implícitos.
II - ORIGEM DAS FEIRAS E DO REGISTRO DE
12
ANIMAIS DE SOROCABA
11
ELLIS JR, Alfredo. O ciclo do muar. Revista Histórica n o. 01 - Jan-Mar/1950, p 87
12
ELLIS JR, Alfredo e ELLIS, Myriam. A economia paulista no século XVIII. Boletim 115 da
FFLC : USP, 1950, p. 57
havia participado do período Bandeirante, tendo sua fundação
13
ligada a Baltazar Fernandes, um bandeirante natural de Parnaíba.
Solicitou Cristovão Pereira de Abreu como pagamento pela
“reconstrução” do caminho do Sul”, o recebimento de parte dos
impostos cobrados nos Registros de Animais junto ao Conselho
Ultramarino, responsável pela estrada e pela criação dos Registros.
O Conselho montou o Registro de Animais de Curitiba, por
onde os tropeiros deveriam passar e pagar os impostos devidos, e o
Registro de Itu para fiscalização dos documentos relativos aos
pagamentos em Curitiba. O Registro de Itu foi uma sugestão do
próprio Cristovão Pereira de Abreu.
Porém, o Registro que seria em Itu, acabou sendo instalado
em Sorocaba em 1750, e em 1756 começou a ser cobrado um “novo
imposto” para ajudar a reconstruir a cidade de Lisboa, vitimada por
um terremoto.
Os preços cobrados no Registro de Sorocaba eram “$ 100 réis
por cabeça de gado vacum, $ 200 réis por gado cavalar e $ 340 réis
por mula que passasse [pelo registro]. Esses “Novos Impostos”
decretados por 10 anos, perduraram até a República, que em 1890
fechou o registro de Animais. O preço desses impostos é importante
para se aquilatar o valor dos animais na época. Cada mula valia dois
13
cavalos ou três bois e meio”.
13
VIEIRA, Rogick. O papel do tropeiro na integração cultural do Brasil. In:__________
T ropeirismo e identidade cultural da região de Sorocaba. Cadernos da Academia
Sorocabana de Letras, 1983, p. 20.
14
Apud ELLIS, op. cit. citado por Elina Oliveira Santos. A industrialização de Sorocaba (Bases
Geográficas). Tese de doutoramento. FFLCH : USP, 1950, p. 40.
Salientamos que não há muita concordância quanto ao
14
número de animais/ano para a fase do apogeu do ciclo entre 1845 -
1860. A tradição oral eleva os números a 200 e 300 mil, enquanto os
jornais da época apontam 100 mil animais/ano.
1.2 - As rotas
15
DEFFONTAINES, Pierre. Geografia Humana do Brasil. citado por Elina O. Santos. Rio de
Janeiro : Revista Brasileira de Geografia, ano I, n os . 1, 2, 3.
16
JOB, Vera R. Origens e Importância do ciclo do tropeiro. In:__________ T ropeirismo e
identidade cultural da região de Sorocaba. Cadernos da Academia Sorocabana de
Letras, 1983, p. 7
17
VIEIRA, Rogick. op. cit., p. 20.
15
Também pelo fato de a estrada de São Paulo ligar-se a
Sorocaba é que o Registro de Animais tenha sido instalado na vila,
pois, reduzia em trinta quilômetros o trajeto para os tropeiros que
não precisariam ir até Itu e retornar para pegar o caminho a São
Paulo.
18
CESAR, Adilson. Notas para a lavoura canavieira em Sorocaba. Sorocaba : Fundação Dom
Aguirre, 1984, p. 22
19
DEFFONTAINES, Pierre. op. cit., p. 267.
20
TAUNAY, Afonso de. História do café no Brasil. Rio de Janeiro : Departamento Nacional do
Café, Tomo II, 1939, p. 370-1
21
Baseados em Muller , apresentamos um quadro
17
estatístico sobre a função secundária da agricultura em Sorocaba
que ilustra a importância das Feiras:
AGRICULTURA (1836)
Café 770 arrobas
Açúcar = 2.930 arrobas
Arroz = 3.342 alqueires
Feijão = 5.565 alqueires
Milho = 170.972 alqueires
Fumo = 428 arrobas
Algodão em ramo = 704 arrobas
= 40
Gado muar = 4
Gado vacum = 77
Porcos = 556
21
MULLER, Daniel P. Ensaio dum quadro Estatístico da Província de São Paulo, Seção de
Obras “d’O Estado de São Paulo”. 1923, citado por Elina O. Santos, op. cit. p. 41.
incluía também produtos importados diversos); serviu de
18
correio e de meio de transporte para viajantes em geral; estabeleceu
uma ligação entre o sul do nordeste do país.
O ciclo do muar em Sorocaba não se restringiu apenas ao
ciclo do ouro. A última edição da Feira de Sorocaba será em 1897,
porém já um ciclo econômico decadente que desde
aproximadamente 1860, estava sendo superado pela cultura do
algodão e depois pela industrialização que se iniciaria em 1882.
III. A MANUFATURA E O ARTESANATO LIGADOS ÀS
19
FEIRAS
1
ZALUAR, Augusto E. Peregrinação pela Província de São Paulo 1860-61. São Paulo :
Cultura, 1943, p. 179-80.
A partir de 1887 é formada a firma Pereira e Vilela com
20
a compra da fábrica de chapéus por Francisco de Souza Pereira e
Manoel Pereira Vilela.
Conforme anúncio, citado por VIEIRA, temos os seguintes
tipos de chapéus produzidos pela fábrica:
23
VIEIRA, Rogick. Sorocaba não esperou o 13 de Maio - A luta pela libertação dos escravos
no Interior Paulista. Sorocaba : FUA - Fundação Ubaldino do Amaral, 1988, p. 10.
24
ALMEIDA, Aluísio. História de Sorocaba. Sorocaba : IHGG, 1969, p. 276.
- 11 ferreiros;
21
- 3 ferradores;
- 7 bilhares e alfaiates;
- 3 armadores;
- 4 barbeiros;
- 2 dentistas;
- 50 açougues
- 1 “Centro Comercial” (casa comercial variada)”.
25
Diário de Sorocaba, 26/10/1890.
advirão, colher encomios e agradecimentos, juros importantes
22
26
do capital de seu tempo empregado em tam humanitária obra”
26
Diário de Sorocaba, 4/11/1890.
27
MARTINS, José de Souza. O cativeiro da terra. São Paulo : Hucitec, 4 a. ed., 1990, p. 114.
28
STEIN, Stanley J. Origens e evolução da indústria têxtil no Brasil 1850/1950. Rio de
Janeiro : Campus, 1979, p. 99.
“A principal característica das mudanças ocorridas foi o
23
simples “inchaço” do capital de cada estabelecimento, sem qualquer
aumento proporcional nos meios de produção. Em outras palavras,
o mesmo nível de produtividade anterior ao “Encilhamento” teve que
29
remunerar maior número de unidades de capital”
29
MARTINS, José de Souza. Conde Matarazzo - O empresário e a empresa. 2 a. ed, 2 a.
reimpressão. São Paulo : Hucitec, 1976, p. 27.
30
Citado por ALMEIDA, História de Sorocaba, op. cit. p. 271. MARTINS ainda alerta para o fato
de que “A despeito da visão pessimista oferecida por TAUNAY não só a propósito do evento,
mas também do período do “ensilhamento”, que tem sido incorporada pelos historiadores da
24
Pelos valores anuais atingidos em 1897 podemos constatar
que as atividades relacionadas ao muar, principalmente o couro,
mantinham-se.
Note-se também que o ano de 1897 marca o fim das feiras de
muares em Sorocaba. Apesar dos preparativos, a notícia da febre
amarela fez com que os tropeiros e comerciantes se retirassem da
cidade.
Encontramos no Almanach de Sorocaba para 1902 um
levantamento de “pequenas indústrias de manufacturas de redes,
arreios, baixeiros, freios, estribos, etc., exercidas individualmente
31
cuja produção annual é calculada em cerda de ... 600.000$000”
O mesmo Almanach apresenta a lista de “estabelecimentos
industriais”:
05 fábricas de cerveja
02 fábricas de licores e xaropes
03 fábricas de massas alimentares
08 fábricas de água ardente
03 cortumes
01 fábrica de sabão e sabonete
01 fábrica de móveis
01 fábrica de louças de barro
01 fábrica de vellas
05 fábricas de tijolos e telhas
04 casas especiaes de artigos para montaria (officinas
32
annexas)
Tudo parece indicar que a situação das manufaturas e
artesanatos na cidade ia bem, ou pelo menos se mantinha
comparando os totais de 1897 e 1902.
Porém, vejamos outros números indicados pelos “Dados
Gerais do Estado 1890 - 1938 para o município de Sorocaba:
economia brasileira, o significado dessa época só poderá ser avaliado quando forem
conhecidos os seus saldos positivos.
31
Almanach de Sorocaba, 1902, p. 83.
32
Idem, p. 106-7.
25
33
DADOS ECONÔMICOS
Receita Despesas
1896
Campo Largo (C) 8:775$280 8:312$041
Sorocaba 236:222$233 258:934$892
1902
Campo Largo 16:680$140 16:680$140
Sorocaba - -
1908
Campo Largo 7:570$754 7:570$754
Sorocaba 998:355$900 994:753$240
1914
Campo Largo 10:000$000 10:000$000
Sorocaba 335:784$960 351:681$950
1920
Campo Largo 28:986$650 28:892$850
Sorocaba 496:757$780 485:463$430
33
Dados Gerais do Estado 1890-1938. Publicação do Depto Estadual de Estatística. São
Paulo, 1939, p. 79.
Campo Largo - atual cidade de Araçoiaba da Serra.
artesanatos, veríamos a diminuição dos valores nas décadas
26
seguintes.
Os estudos de ALMEIDA (durante as décadas de 30, 40) o
levaram a concluir que apenas uma fábrica de facas, localizada no
centro da cidade ainda tinha alguma relação com as Feiras. “... O
artesanato de arreios progrediu até tornar-se fábrica (Oliveira e
Ferreira & Cia) e depois desapareceu. Sorocaba não tem mais
indústrias causadas pela feira.” (ALMEIDA, 1969:276)
A última tropa de muares a passar por Sorocaba foi em 1933
34
com destino ao Rio de Janeiro.
O surto algodoeiro na cidade que poderia ter dado outro
desenvolvimento às atividades manufatureiras, ao contrário facilitou
a fixação industrial em Sorocaba, ao menos quanto a matéria prima
e capitais.
Antes de encerrarmos este capítulo, falemos da primeira
tentativa fabril - em 1852, pela importância pioneira na cidade e
ainda, no momento histórico em que se encontrava.
34
Sérgio Coelho de Oliveira colheu depoimento de alguns ex-tropeiros, entre eles, Durvalino
Coelho de Oliveira que “em...1933 trouxe a última tropa do Rio Grande do Sul para São
Paulo... com 350 mulas para entregar ao Serviço de Limpeza Pública do Rio de Janeiro”...
conta Durvalino que ...nessa época as Companhias de Cerveja, como a Antártica, também
usavam carroções puxados a mula para a distribuição de bebidas em São Paulo. OLIVEIRA,
Sérgio Coelho. O Tropeirismo após as feiras de Sorocaba. In:__________ T ropeirismo e
identidade cultural da Região de Sorocaba. Sorocaba : Academia Sorocabana de Letras,
1983, p. 15.
27
IV. A PRIMEIRA EXPERIÊNCIA FABRIL TÊXTIL EM
SOROCABA - 1852
35
CANABRAVA, Alice. O Algodão em São Paulo. 1861-1875. 2 a. ed. São Paulo : TA Queiroz,
editor, 1984, p. 278
36
Idem, p. 280.
CANABRAVA, idem p. 50.
“A qualidade do algodão que outr’ora aqui se cultivava não
28
quis dar mais sem dúvida pela degeneração das sementes e
também porque essa cultura estava entregue a pessoas que não
indagavam as causas e nem procuravam remediar o mal tão
37
prejudicial a uma cultura de primeira necessidade (...)
37
Idem, p. 280.
*O algodão arbóreo é: “Uma árvore aparentemente selvagem, quase escondida no meio de
outras de gênero diferente. Provavelmente...da espécie G. Brasiliense.
38
SEGURA, Ailton J. PIABIRU - uma odisséia T upiniquim, a saga de uma ferrovia. 1990, 1 a.
edição
29
V. A ECONOMIA DO ALGODÃO EM SOROCABA
39
CÉSAR, Adilson. op. cit. p. 40.
Algumas plantações podem ser considerados em “larga
30
escala”, como a do agricultor Manoel Lopes de Oliveira, que, em 1864,
chegou a cultivar quatro alqueires de sementes com uma produção de
“...250 arrobas por alqueire nas terras boas e 150 arrobas por alqueire
nas terras fracas” (CANABRAVA, 1984:174)
Outro agricultor que causou espanto nessa época foi Roberto
Dias Baptista que cultivou “sete alqueires” (de sementes na sua
fazenda no Salto de Pirapora e ...” na década de 90 sua fazenda foi
a preça (sic) e apareceram terras velhas e safáras, campos, tapéras,
40
máquinas ao abandono.. Também o algodão foi dendroclasta”
Em conseqüência dos bons preços alcançados pelo algodão
no mercado externo, iniciou-se um processo de mecanização com
as máquinas de descaroçar algodão.
“Possivelmente Sorocaba deve ter sido uma das primeiras
cidades do interior da Província de São Paulo a instalar
estabelecimento desse gênero” (CANABRAVA, 1984:189)
Em 1872 o município já contava com 24 descaroçadores e
muitos associados também ao enfardamento.
Somente em 1874 é que a Câmara Municipal proibirá essas
máquinas na cidade devido ao perigo de incêndio como o ocorrido
no estabelecimento de L.M. Maylasky e Cia (Canabrava, 1984:194)
Cabe, dentro da economia do algodão local, uma ressalva a
Luiz Matheus Maylasky que, conforme CANABRAVA, será o grande
incentivador da cultura em Sorocaba.
40
GASPAR, Antonio Francisco. Vultos Fundadores da Estrada de Ferro Sorocabana -
Esboços biográficos. Composto e impresso nas oficinas da Editora Cupolo Ltda, 1958,
São Paulo, p. 116.
“Em São Paulo, segundo tradição oral, foi acolhido pelos de São
31
Bento. Queria trabalho. Exerceu ali as atividades de copeiro. E, também
aprendeu as primeiras regras da gramática portuguesa entesourando na
memória feliz os primeiros vocábulos. Ainda, nesse ano, fins de agosto
e setembro, ouviu a palavra Sorocaba, cidade das feiras e entreposto
comercial de grande movimento... foi a Pinheiros, oferecendo-se para ir
auxiliando os arreios e peões...andou perambulando pela cidade, sem
saber o que fazer, pois ninguém o conhecia...não lhe davam atenção.
...após de uma noite passada ao relento, passou ele, pelo largo de São
41
Bento...teve uma idéia: bater a porta do mosteiro.”
41
GASPAR, Antonio F. Bodas de Brilhantes. colaboração de Antonio Francisco Gaspar em
homenagem ao Progresso e grandeza da E.F. Sorocabana, no seu 75 o. aniversário da Entrega
do tráfego ao Público do trecho São Paulo a Sorocaba em 1875” - composto e impresso nas
oficinas gráficas da Ed. Cupolo Ltda, São Paulo, 1950, p. 35.
42
GASPAR, Antonio F. Vultos Fundadores, op. cit. p. 114-16.
43
indústria e no próprio capitalismo onde, “...depois de 1870, o
32
recrutamento de trabalhadores especializados ingleses foi facilitado
pela depressão e a concorrência na indústria têxtil
européia”...(STEIN, 1979:65)
43
O companheiro de viagem de Maylasky foi outro engenheiro, Herrmann Von Puttkammer.
GASPAR, Bodas de Brilhantes. p. 36.
algodão que receber mediante um prêmio
33
44
módico e razoável.
44
ALMEIDA, Aluísio. Luiz Matheus Maylasky (Visconde de Sapucahy). Tomo I Maylasky em
Sorocaba (1865-1880). São Paulo, 1938, p. 28
45
GASPAR, Antonio F. Bodas de Brilhantes. op. cit, p. 32.
. A “ESTRADA DO ALGODÃO”
34
Consta da biografia de Maylasky que a ferrovia ligando
Sorocaba a São Paulo foi criada a partir da negativa da Cia Ituana de
construir um ramal que ligasse Itú a Sorocaba, em 1869.
De maneira um tanto folclórica assim descreve GASPAR a
fundação da ferrovia:
46
GASPAR, Antonio F. Bodas de Brilhante. op. cit. p. 45.
Mas, as idéias da burguesia local não deram muito certo, ao
35
menos nos primeiros anos.
Conforme relata Almeida:
47
ALMEIDA, Aluísio. Luiz Matheus Maylasky, op. cit. p. 141.
48
Discursos proferidos na Assembléia Provincial pelo sr. Dr. Ignácio W allace da Gama Cockrane
por ocasião de discutir-se o projeto de encampação - linhas férreas Ituana e Sorocabana
(1876) São Paulo. São Paulo : Typografia do Diário, 1876, p. 7.
(Ignácio W . da Gama Cockrane - deputado provincial nas legislaturas de 1870 a 1871, 1874 a
1879, era engenheiro com participação na SP Raylway, E F do Estado de São Paulo conforme
Dicionário de História de São Paulo, p. 140).
49
Relatório apresentado à Assembléia Geral dos Acionistas da Cia União Sorocabana e Ituana na
sua reunião ordinária em 18 de março de 1893 pela sua diretoria Francisco de Paula Mayrink
e Visconde do Socorro - Cia Impressora Rio de Janeiro, 1893, p. 10
A fusão da Cia Ituana com a Cia Sorocabana deu-se
36
em 20 de fevereiro de 1892, como forma de resolver questões de
tarifas nas proximidades de Botucatu e de prolongamentos.
“Para cabalmente realisar o seu desideratum fez a nova empresa a
ligação de São Manoel a Botucatu. Tomou Porto Martins...Em
Mayrink ligou a Sorocabana a Ituana... Para realizar todas essas
construcções teve a Empresa que fazer grandes empréstimos que
acarretaram juros superiores a sua renda, resultando a sua falência.
Foi então que o governo federal chamou a si a responsabilidade das
debentures emitidas, começando a explorar a estrada.
Posteriormente, o Estado de São Paulo, de acordo com o governo
da União, passou a gerir a Sorocabana, cedendo finalmente a
50
Sorocabana Railway Company, mediante arrendamento.”
o.
No Annexo n 15 do Relatório de 1893 da União Sorocabana
e Ituana encontramos entre os maiores acionistas Francisco de
Paula Mayrink com 33.481 ações e Luiz Matheus Maylasky ainda
51
aparece com apenas 41 ações.
Pode-se inferir que a “ferrovia do Algodão” idealizada por
Maylasky, em seu começo, não teve muita tranqüilidade econômica
e somente com Mayrink é que, na segunda década de existência,
pode deslanchar.
Como já dissemos, Maylasky deixa a cidade em 1880 e sabe-
se que em Mogy Mirim “...fundou com capitais franceses, a Estrada
52
de Ferro de “Sapucahy”
53
GODOY, Antonio Carlos. Votorantim - Estudo sobre a formação da empresa industrial no
Brasil. Dissertação de Mestrado USP/DCS, 1975, p. 1
54
Para esta fábrica que não se concretizou, Luiz Matheus Maylasky chegou a comprar em
Campos - RJ o maquinário em 1868 formando com outros sorocabanos uma sociedade por
ações. Citado por CANABRAVA, op. cit. p. 284.
55
também o algodão foi dendroclasta” . Assim como Maylasky,
38
não tornou-se industrial.
Como se vê, a generalização sobre “transformar algodão em
pano” não confere empiricamente.
O que podemos depreender da importância do algodão para a
acumulação de capitais e experiências é que a “...pequena produção
mercantil serviu de instrumento de acumulação para o capital
comercial dominante.” (LOUREIRO, 1987:54)
Os “adiantamentos” que Maylasky oferecia serviam para, cada
vez mais, subordinar o pequeno produtor de algodão aos
comerciantes.
A economia mercantil sorocabana “expande-se”, de um
mercado interno (nacional) com os negócios nas feiras de muares,
para a exportação do algodão, conseguindo assim, a ascendência
de uma burguesia comercial ou mesmo agrário-comercial que não
havia se destacado anteriormente dentro do tropeirismo.
O comércio de algodão altera a forma de acumulação de
capitais dominado pelas feiras. Entra na divisão internacional do
trabalho, como fornecedora de um produto agrícola.
O outro lado dessa nova forma de acumulação, foi, de certa
maneira, um “atraso” das forças produtivas que o artesanato e a
manufatura possibilitavam, ainda que de maneira frágil.
Como salienta Silva: “A preponderância do capital comercial é,
em primeiro lugar, o resultado do desenvolvimento ainda fraco das
56
relações de produção capitalistas no Brasil.”
Não estamos, com isso, querendo propor uma “mecanização”
dos modos de produção, na clássica seqüência artesanato =>
manufatura => indústria, pois, como alerta Martins: “É fácil explicar a
origem e o desenvolvimento da indústria destacando apenas aquilo
que repete o já ocorrido nos países industrializados e que são
57
elementos de sua universalidade”
55
GASPAR, Antonio F. Vultos fundadores... op. cit. p. 64.
56
SILVA, Sérgio. Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. Alfa-Omega, 7 o. ed.,
1986, p. 55
57
MARTINS, José de Souza. Subúrbio. Vida Cotidiana e História na cidade de São Paulo: São
Caetano do Império ao fim da República Velha. São Paulo : Hucitec, 1992, p. 8.
Em Sorocaba, os modos de produção ocorrem ao
39
mesmo tempo, diversos momentos históricos num mesmo lugar e
consequentemente, várias técnicas de trabalho juntas.
O que vemos no decorrer da economia local é que “a
economia industrial surgiu no contexto de relações mercantis em
58
dissolução”
Realmente, no caso de Sorocaba, as feiras já não geravam
tantos lucros, o algodão tentava manter-se com a ajuda do capital
comercial, a manufatura e o artesanato, possivelmente em
conseqüência das feiras, também decaíram.
Os anos 80 apresentam um novo quadro econômico em
Sorocaba, o processo de industrialização já estava em curso.
. ALINHAVOS NECESSÁRIOS
58
MARTINS, José de Souza. Conde Matarazzo o empresário e a empresa. São Paulo :
Hucitec, 1976, p. 6.
59
MELO, João Manuel C. de. O Capitalismo Tardio. 8 a. ed. São Paulo : Brasiliense, 1991, p. 99.
Citação do livro Condições Sociais da industrialização: o caso de São Paulo. In:
__________ Mudanças sociais na América Latina. Ed. Difel, 1969, p. 188-9.
Antes de prosseguirmos para a construção da cidade
40
industrial, devemos nos deter sobre o significado do comércio das
feiras e da economia do algodão para Sorocaba.
A economia da cidade ligada às feiras não possibilitou que a
acumulação de capitais fosse revertida em outras atividades, ou
mesmo não existia interesse por parte dos donos de tropas,
60
preferindo estes investir em terras.
O próprio caráter de mercado interno constitui uma
particularidade local, já que à metrópole portuguesa e depois à coroa
brasileira interessava mais a agricultura exportadora. Ainda que os
impostos cobrados no Registro de Sorocaba fossem uma fonte de
renda considerável ao governo.
Caso possamos falar em “Acumulação Primitiva do Capital”,
ela estaria no que chamamos de Economia do Algodão. Afirma Marx
que “... a chamada acumulação primitiva é apenas o processo
histórico que dissocia o trabalhador dos meios de produção. É
considerada primitiva porque constitui a pré-história do capital e do
61
modo de produção capitalista.”
Tentamos demonstrar através dos primeiros textos como a
economia local, articulada com a paulista e nacional no mínimo, vai
transformando-se. O declínio do comércio muar tem ligação com a
solução para o transporte nas áreas cafeeiras principalmente as
ferrovias a partir de 1865.
Nesse mesmo período um acontecimento externo - a Guerra
Civil Americana - possibilita a economia local tomar novos rumos,
agora visando o mercado exterior com o algodão colocada na
Inglaterra.
Foi uma mudança importante pois trouxe o início da
mecanização com os descaroçadores de algodão, e também
“separou” uma classe social proprietária das máquinas - e da
tecnologia - mas principalmente detentora do capital, implicando
novas relações sociais na cidade. Fazendo uma analogia com
CHÂTELET quando fala da manufatura, “...não é um simples produto
60
DELGADO, Aurélio. O tropeirismo e a dinâmica sócio-econômica em São Paulo no Século
XVIII (mimeo, Sorocaba, 1991, p. 3, transcrição da conferência proferida pelo autor, na
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Sorocaba a 25/05/88. Não revisto pelo
autor).
61
MARX, Karl. O Capital. livro 1, Vol. II. Brasil : Bertrand, Rio de Janeiro, 1988, p. 830.
de um novo modo de produção”, mas ... resulta de uma
41
operação de poder, concertado, por um grupo social, que captou a
62
oportunidade e que na impôs.
Realmente, uma classe percebeu a possibilidade de
transformar e ampliar seus capitais e se impôs.
Ainda que nesta “Acumulação Primitiva do Capital” não tenha
ocorrido a expropriação do pequeno produtor, ao contrário, o capital
comercial assistia o pequeno produtor se utilizando de formas
consideradas pré-capitalistas, como foi o caso dos adiantamentos
pela produção do algodão, o que pode ser considerado
particularidade do capitalismo nacional.
Mesmo quando afirmamos com SILVA o fraco
desenvolvimento das relações de produção capitalistas no Brasil em
63
conseqüência do capital comercial temos consciência de que seria
difícil, em Sorocaba, se repetir o modelo europeu de acumulação e
da seqüência de modos de produção, pelas próprias características
64
da economia brasileira em que estava naturalmente inserida a
cidade.
Na interpretação de MARTINS:
62
CHÂTELET, François. O Capital (Livro 1). Análise Crítica. Universidade de Paris VIII. Hatier
Paris, 1955 - Tradução Edmundo Fernandes Dias. IFCH : UNICAMP, 1991, p. 105.
63
Conforme nota 18 de A economia do algodão em Sorocaba.
64
Sobre essas características podemos lembrar sobre o “Capitalismo Tardio” brasileiro e latino-
americano, que se estrutura quando “a economia mundial já está consolidada”, conforme
MELLO, op. cit. Ainda sobre a especificidade da economia brasileira ver as obras de
MARTINS, CANO, SILVA, p. ex. na bibliografia deste trabalho.
65
MARTINS. O cativeiro... op. cit. p. 118.
construção de seu espaço. No significado que dá ao seu
66
42
lugar, mesmo que possamos - e podemos - encontrar e fazer
generalidades sobre cidades industriais, vilas operárias, ruas, etc..
o.
Só que, na casa n 05 da Vila Santa Maria moravam operários
únicos, de uma casa e vila única, de Sorocaba!
Estes esclarecimentos alinhavam a primeira com a segunda
parte do trabalho, justificando a diferença de estilos entre uma e
outra. A primeira mais descritiva e histórica e a segunda mais
“literária”, por exigência do próprio conteúdo.
66
Conforme PIGNATARI “...O significado é o uso”...ou ... “O significado é uma relação entre o
interpretante do receptor.
PIGNATARI, Décio. Informação. Linguagem. Comunicação. São Paulo : Perspectiva, s.d.,
p. 30-3
43
67
os números levantados por ALMEIDA não são exatos, mas em um levantamento parcial que
fizemos no Arquivo do Estado do Livro de Barreiras para 1826 pudemos constatar que a
aproximação desse autor não deve estar muito incorreta. Deve-se ainda acrescentar que
um levantamento minucioso demandaria muitos anos e uma grande equipe para cobrir
quase 130 anos da existência do registro (1750-1889) considerando que os livros são
diários.
45
68
Lista Nominal dos Habitantes Livres do distrito desta cidade de Sorocaba - 1846 “LATA” 174
Arquivo do Estado de São Paulo.
Rua do Rocio da Penha até a Vossoroca (atual Rua Sete de
48
Setembro)
Rua de Santo Antonio até o rio grande (a mesma do hospital)
Rua do Supiriri de cima (atual fim da Rua Padre Luiz)
Rua do Supiriri do meio (atual Rua Comendador Oeterer)
Rua do Supiriri para o hospital (atual D. Antonio Alvarenga)
Rua da Amargura (atual Rua José Bonifácio)
Travessa da Direita do hospital (atual Rua Anita Garibaldi)
Travessa da Matriz a Santo Antonio (atual Rua Cel. Benedito Pires)
Rua do Portão ou dos Morros (atual Rua Cel. Nogueira Padilha)
Rua do Além Ponte (atual Avenida São Paulo)
Travessa da Boa Vista ao Curral do conselho (atual Rua Ubaldino do
69
Amaral)
Assim, das 14 ruas apontadas na “Lista Nominal” passamos a
24 ruas quando somadas às citadas por ALMEIDA.
Também em relação aos bairros, a “Lista Nominal” aponta 23
bairros mas relaciona 28 bairros, mais a Freguesia de Campo Largo
(atual Aracoiaba da Serra):
“Bairro da Aparecidinha (ainda pertencente a Sorocaba)
Bairro do Ipiranga (atualmente perto da Zona Industrial no Éden)
Bairro do Piragibú (atual Distrito do Éden)
Bairro de Nhuaúva (bairro pertencentes ao Distrito de Brigadeiro
Tobias)
Bairrodo Passa Tres (atual Distrito de Brigadeiro Tobias)
Bairro da Boa Vista (bairro onde está localizada a Pref. Municipal
de Sorocaba)
Bairro da Caputera e Morros (final da Rua Nogueira Padilha)
Bairro do Rio Acima, Pereatuba e Itapeva (pertencentes a cidade
de Votorantim)
Bairro de Pirapora Acima (atual Salto de Pirapora)
Bairro de Pirapora do meio (idem)
Bairro de Piedade (atual cidade de Piedade)
Bairrode Lavras Velha
Bairrodo Rocio da Penha (possivelmente um bairro da cidade de
Votorantim)
Bairro de Vossoroca e Lavras Velha e Iacarupava (idem)
Bairro de Nhambiru (bairro da atual cidade de Salto de Pirapora)
69
ALMEIDA, História de Sorocaba op. cit. Pag 228, 229
Bairro de Salto e Sarapohi e Sarapohi do meio (atuais
49
cidades Salto de Pirapora e Sarapuí)
Baierro de Terra Vermelha (atual Bairro de Vila Angélica em
Sorocaba)
Bairro do Itangoa (manteve o mesmo nome)
Bairro do Caguaçu (manteve o mesmo nome)
70
Bairro do Itavovu, Jundiacanga, Jundiaquara e Utinga”
Muitos bairros arrolados na Lista Nominal para 1846 fazem
parte hoje de outras cidades. No ano de 1957, Piedade, Salto e
Campo Largo emanciparam-se de Sorocaba, assim os bairros
citados nesses lugares passaram a nova administração. As ruas
apontadas pela Lista Nominal são todas centrais (Ver Mapa pag.45,
Sor. 1842) e muito provavelmente não existissem ruas nos bairros
mas apenas caminhos ligando os sítios.
A população até 01/12/1847 estava dividida
Homens = 3.549
Mulheres = 4.570
Total = 8.119
distribuida em 2023 fogos (casas), sendo que desse total apenas 20
71
eram eleitores . Devemos lembrar que a população considera eram
os livres de TODO município, na cidade provavelmente residissem
em torno de 2.500 pessoas.
Um outro dado estatístico aponta para 1.839 os seguintes
números de habitantes (sem Campo Largo):
“Na vila 3.428
nos bairros 8.053
72
total 11.481
Afirma GOULART que “Sorocaba como que existia em função
das feiras. A indústria mais florescente era a dos objetos
necessários aos condutores de muares... A hierarquia economico-
financeira existente na cidade tinha como ápice os alquiladores...
em seguida os hoteleiros... por último os artesãos, que trabalhavam
sobretudo o couro.” (GOULART, 1961:160)
70
Lista Nominal... op. cit. Arquivo do Estado de São Paulo
71
Lista Nominal... op. cit. Arquivo do Estado de São Paulo
72
ALMEIDA, História de Sorocaba, op. cit. pag. 137
Como as fontes consultadas não coincidem - os números citados por ALMEIDA para 1839
são maiores que os números de 1847 da “Lista Nominal” - nossa afirmação de 2.500
pessoas na cidade acompanhou esse diferença de 30% entre uma e outra fonte.)
Adiante conclui que o fim das feiras de muares está
50
relacionada a cultura do algodão no local, e ainda,...” iniciou-se a
decadência da indústria açucareira e da aguardente, as minas deram
sinal de esgotamento”. (Idem, idem) E mais do que tudo isso o trem
de ferro deu o golpe mortal nas tropas e acabou com as estradas de
burros. (Idem, idem)
Tudo isso teve influência enorme na vida de Sorocaba
trazendo decadência e ruína para aquela cidade. As ricas
habitações foram abandonadas o mato invadiu as ruas; as
hospedarias fecharam as portas. Hoje industrializada, Sorocaba é
sede de um dos mais importantes municípios do Estado de São
Paulo. (Idem pág 162, grifo nosso)
Discordamos da conclusão do autor, pois conforme já
demonstramos anteriormente quando tratamos das manufaturas, é
difícil falar em decadência pelos valores de 1897 (ver pág. 19) e
conforme o Almanach de Sorocaba para 1902 os valores das
manufaturas mantinham - se (idem, idem). Parece-nos meio
precipitada a conclusão quanto a Estrada de Ferro como “golpe
mortal nas tropas” também.
Em relação ao estado de abandono citado por GOULART, a
situação não se mostra tão caótica quando examinamos mais
detalhadamente a cidade.
A cidade cresceu, ruas foram ampliadas e abertas, o estatuto
de cidade veio em 1842 em decorrência do comércio de muares nas
feiras sorocabanas, a manufatura desenvolveu-se, uma fábrica de
chapéus fundada em 1852 e outra em 1870, além do comércio de
algodão desde 1870.
Tudo seria abandonado com o fim das feiras de muares?
O provável ano de “ruína para aquela cidade” é 1875 com a
inauguração da ferrovia. Já apresentamos a ferrovia e seus objetivos
anteriormente e vimos que até 1880 a mesma não apresentou os
resultados esperados pela burguesia que a idealizou. Um outro
detalhe importante é que a última edição da feira de muares de
Sorocaba foi em 1897 e não 1875, portanto vinte anos após a
inauguração da ferrovia. Atentando para o gráfico 1 vemos que a
partir de 1860 o número de animais passando pela cidade decaí de
100 (1855-60) para 20 mil (1975-1900) mostrando sinais da
decadência independente da inauguração da ferrovia na cidade.
Conta a historiografia sorocabana que motivo para o fim
51
das feiras de muares foi o surto de febre amarela em 1897:
73
OLIVEIRA, São Paulo de Sorocaba, op. Cit. Pag. 21
74
idem, pág. 22
posteriores, mas não é o único motivo e nem o principal. Toda
52
a economia estadual e mesmo nacional estava alterando sua forma
de acumulação desde a década de setenta XVIII entrando
definitivamente para um modelo de acumulação capitalista. O
próprio Oliveira mais adiante no artigo, afirma que... “Sorocaba volta
a sua vida normal e em 16 de outubro (1897) está em festas para
inaugurar a sua primeira fábrica de calçados a vapor, enquanto que
Votorantim começa a funcionar um estabelecimento para extração e
75
preparação de mármores das caieiras de Itupararanga.”
Assim, a cidade em 1897 e anteriormente, não poderia estar
“tão decadente” como sugere GOULART, do contrário não haveria
motivo para investimentos, como a fábrica de calçados e a
marmoraria da Votorantim.
Em relação ao fim das feiras motivado pelo surto ou epidemia
de febre amarela devemos alertar que, nesse ano de 1897, a cidade
contava com 5 fábricas texteis e as várias manufaturas. Portanto, a
direção da economia tomara outro rumo aproveitando--se da matéria
prima local - o algodão - e a mão de obra feminina, infantil e
posteriormente imigrante sendo, conforme ALMEIDA, a colônia
Espanhola a primeira a fixar-se em Sorocaba na além-ponte
(ALMEIDA, 1969)
As feiras que ampliaram as ruas da cidade e geraram uma
economia mercantil importante, deixam de ser o centro das
atenções. A industrialização nascente agora será a responsável pela
ampliação da cidade, não apenas ampliando ruas mas criando
bairros operários para a massa de proletários que movimentam a
futura Manchester Paulista.
O Mapa da Localização Industrial a partir de 1882 mostra as
fábricas Santa Maria um pouco afastada da Ponte do Rio Sorocaba
e dos trilhos da Estrada de Ferro Sorocabana e a São Paulo logo
após a ponte no caminho para São Paulo (atual Avenida São Paulo).
As demais fábricas no Além Linha e, com exceção da Fábrica Santa
Rosália, e Votorantim, fora do perímetro urbano da cidade.
75
idem, idem
53
76
O Distrito de Votorantim emancipado em 1956 encontra-se hoje conurbado com a cidade de
Sorocaba impossibilitando o avanço da mesma para a porção Sul, o mesmo já está
ocorrendo com a cidade de Itu que tem seus limites próximos ao Distrito de Cajuru.
Araçoiaba da Serra levando melhorias urbanas até as áreas
54
77
limítrofes da cidade .
Em relação ao crescimento atual da cidade podemos notar,
apenas passeando pelos locais, que as regiões norte e oeste tiveram
seu crescimento baseado em loteamentos populares e de baixa
renda, fato que elevou a concentração de pessoas nesses locais e
na porção sul os loteamentos foram para as classes mais altas e
médias altas e percebemos pouquíssimas casas antigas e de baixas
rendas com tendências a desaparecem, dando lugar a edifícios de
alto padrão ou mesmo grandes residências como as vizinhas.*
Verifica-se uma tendência histórica no crescimento da cidade
que deixou na própria urbanização da cidade, passada e presente.
77
Conforme funcionários da Prefeitura Municipal de Sorocaba que preferiram não se identificar, a
mudança do prédio para o Alto da Boa Vista, está relacionada a “briga”com a prefeitura de
Itu sobre a questão do limite dos municípios. O prédio da prefeitura situava-se na Rua
Brigadeiro Tobias no centro da cidade. O bairro Alto da Boa Vista seria estratégico pois
localiza-se tanto nas margens da Rodovia Sorocaba-Itu como nas margens da Castelinho
(Rod. Senador José Ermírio de Moraes acesso à Rod. Castelo Branco).
* Os Estudos urbanísticos e demográficos da Proesp comprovam esta constatação empírica.
PROESP CTR - 088/94 Pág 2. 28
55
56
Ao observarmos o centro da cidade, por exemplo, vemos que
ele pouco mudou desde o final do século dezenove, com suas ruas
estreitas e tortas, demonstrando pouca preocupação com o
planejamento naquele momento passado.
Hoje, é praticamente inviável economicamente a
desapropriação para reurbanização da área central, tendo algumas
de suas ruas mais antigas - e estreitas - transformadas em
boulevares - como as Rua Barão do Rio Branco, Dr. Braguinha e
parte da Cel. Benedito Pires. Cabe ao centro ainda, nas Ruas XV de
Novembro e São Bento, concentrar o capital financeiro com agências
centrais dos mais importantes bancos da cidade.
Já em 1950 afirmava SANTOS que “No próprio traçado da
cidade pode-se identificar o velho centro urbano do século passado
com sua feição tradicional e os blocos anexados durante os últimos
cinquenta anos, e consequência do desenvolvimento industrial. O
centro antigo, organismo de crescimento natural, encerra um
amontoado de pequenas ruas e vielas, além da grande praça matriz
com sua enorme igreja de linhas coloniais. Os núcleos recentes,
muito mais heterogêneos, são verdadeiros marcos do crescimento
da cidade e da progressivo industrialização regional, do século
78
atual”.
O mapa a seguir nos mostra ruas onde estava localizado as
principais casas comerciais arroladas pelo censo de 1872. Nota-se o
maior número de estabelecimentos na Rua da Penha, oferecendo
serviços diversificados, desde loja de fazendas até máquina de
descaroçar algodão. Em seguida aparece a Rua da Ponte (atual Rua
XV de Novembro) e sua continuação a Rua de São Bento
(permaneceu a mesma denominação) onde está atualmente a
capital financeiro.
78
SANTOS, Elina - A industrialização de Sorocaba, op. cit. pág. 67
57
Z. D.
79
Em 1909 declarava o jornal “A Notícia” (2/03/1909) em um artigo sobre a concorrência entre a
Light e a Guinle: “a capital paulista vai ter o benefício enorme da concorrência de
iluminação e energia elétrica. Em vez de monopólio, de fato, que hoje gozava a Light...
está fechada a época em que os lucros despropositados da Light só se explicam pelo
abuso da taxa elevadíssima.” Citado por CARONE, Edgard e PERAZZO, Priscila F. - São
Paulo lutas contra o monopólio IN Revista Memória nº7, Ab/Maio/Jun/90, pág 42 -
Publicação do Depto de Patrimônio Histórico da EletroPaulo.
80
ALMEIDA, Aluísio - Presença Inglesa nas Antigas Tecelagens - artigo para o Jornal Cruzeiro do
Sul, 15/8/78.
Houve aumento das ruas servidas pelos bondes no
61
Além Ponte e Cerrado assim como a reforma nos carros.
Depois disso nada mais mudou, até que, no dia 14/07/1951 a
São Paulo Elétric Co. Passou todo o serviço para a Prefeitura
Municipal que pagaria pelo aluguel dos postes e da energia. Todo
serviço de reforma deveria ser feito nas oficinas da E.F.
Sorocabana.
Publica o Cruzeiro do Sul do dia 15/07/1951 um aumento no
preço da passagem, mantido inalterado desde 1915 em Cr$ 0,20
para Cr$ 0,50. Possivelmente tenha havido reclamações, por parte
da população - que já reclamava da precariedade dos bondes.
Em 1 de março de 1959 o mesmo Cruzeiro do Sul anuncia:
“Era dos Bondes Elétricos em Sorocaba já havia terminado”, pois a
Prefeitura optou pela desativação em 28/02/59.
Sobre o fim dos bondes, diz um sorocabano ferroviário
aposentado da Sorocabana:
“O Prefeito Lozano fez apenas duas coisas que ninguém mais
esqueceu: acabou com os bondes e emancipou Votorantim. A
primeira atrapalhou os trabalhadores e a segunda o caixa da própria
Prefeitura, pois a fábrica Votorantim era uma grande fonte de renda
para a cidade. Logicamente que a família Ermírio de Morais estava
81
por tráz disso.”
REDE DE ÁGUA E ESGOTO
Devido as duas epidemias de febre amarela (1897 e 1900) a
população sorocabana passou a exigir redes de esgotos e água
encanada no lugar das latrinas de fossas e dos “pipieiros”
(carroceiros vendedores de água retirada do Rio Sorocaba)
Somente em 1903 a cidade terá as redes de água e esgoto e
em 1908 completou-se o bairro Além-Ponte com essas melhorias,
sendo nesse ano construida a Adutora de Itupararanga (foto). Em
1911 a Light pode construir sua represa ... “com a condição de
fornecer água, 80 litros por segundo e, oportunamente, 12 Kms (sic)
82
de canos até o Cerrado”. A segunda caixa d’água (a 1ª foi a do
83
Cerrado) foi inaugurada apenas em 1948
81
Depoimento do Sr. Jacir da Silva, ferroviário aposentado, em fevereiro de 1994
82
ALMEIDA - História de Sorocaba op. cit. pag. 266
83
Conforme estudos da PROESP, a cidade hoje é atendida em 97,5% de ligações de esgoto e
97% de água CTR - 088/94 pág 1.2.
Outras melhorias urbanas que podemos destacar no
62
início do século XX são:
84
ALMEIDA, História de Sorocaba op. cit. pág. 270
85
Anuário Estatístico de São Paulo (Brasil) 1912 Vol I pág. 167
86
idem pág 173.
87
Por falta de dados mais precisos, elaboramos um cálculo tendo por base o gráfico “População -
Município de Sorocaba (1890 - 1940) e o mappa III (Mappa dos nascimentos registrados nos
annos de
atender a população crescente. Não somente escolas mas,
63
saneamento, saúde, transportes, lazer.
Conforme indica NEGRI (1989:61) a cidade atingirá a década
de 20 com 44,9% dos operários da região, ou seja, 7.850
trabalhadores apenas no ramo têxtil 1.8996 trabalhadores em outros
ramos (calçados, chapéus, Ferrovia, etc) e 988 ligadas ao
1893 a 1900 e de 1901 a 1906) do Anuário Estatístico - 1906 - Vol I pág. 89. Porém nossos
cálculos
consideraram para o crescimento populacional apenas nascimentos servindo como um “guia”
para nossas
análises do urbano. Apesar do nosso cálculo ir até 1906, seguindo o Gráfico de População
utilizado
verificamos que nosso índice não está muito diferente. Estudos efetuados pela PROESP nos
decênios de
1940 até 1991 apresentam números parecidos até a década de 60
1940/50 - 2,34%
1950/60 - 2,97%
1960/70 - 3,02%
1970/80 - 4,13%
1980/91 - 3,30% (CTR - 088/94 pág. 2.6.)
Considerando o decênio 1893 a 1902 teremos um crescimento de 2,35%.
SOROCABA NASCIMENT OS
( A )
88
Recenseamento de 1920 - Vol IV (5ª parte) - TOMO II pág. 799
89
HARDMAN, Francisco Foot. T rabalho Urbano e vida operária IN MENDES JR, Antonio e
MARANHÃO, Ricardo (organizadores) Brasil História, texto e consulta: HUCITEC, pag.
276, cap LXXV.
Desde 1904 a cidade fica conhecida como a
65
“Manchester Paulista”, apelido dado por Alfredo Maia, em discurso,
na festa da construção da barragem no Rio Sorocaba para a usina
de energia elétrica, numa alusão à cidade têxtil inglesa.
Anos depois, o operariado a partir de idéias anarquistas e
socialistas “rebatizaria”a cidade de “Moscou Brasileira” ou “Moscou
Paulista”.
É interessante recuperar o caminho da construção dessas
duas cidades do imaginário sorocabano, pois são elas, junto com
outros fatores subjetivos na criação do espaço - diferenciado do
90
proletário e da burguesia
90
“... chamados fatores subjetivos e políticos expressos através das associações de classe,
formas de consciência, movimentos próprios, níveis de organização e papel histórico das
direções políticas... Fatores objetivos e subjetivos combinavam-se de forma dialética: os
períodos de ascenção das lutas operárias eram a comprovação histórica desta relação”.
HARDMAN, op. cit. pág. 286 cáp. LXXV.
firmar-se como uma “classe para si..., pois esta...não
66
91
conseguira formular um projeto político próprio.”
Eram imigrantes ligados ao comércio, como Manoel José da
Fonseca (algodão e tecidos); a Estrada de Ferro, como Frank
Speers, George Oetterer, Francisco de Paula Mayrink, fundadores
da Santa Rosália; e bancos, como o Banco União proprietário da
Votorantim e também técnicos da indústria têxtil como o inglês
Marchísio, ex-gerente da N.S. da Ponte que associado com outros
comerciantes fundou a Santa Maria.
Retornando um pouco na história, vemos que o uso de
trabalhadores livres está ligado à construção da ferrovia, “...a lei que
definiu a nova política ferroviária em 1852 já vedava expressamente
92
a utilização do braço escravo nos trabalhos da estrada” . A ferrovia
em Sorocaba foi fundada em 1870 e inaugurada para o tráfego em
1875.
Em 1882 a fábrica Nossa Senhora da Ponte anunciava no
jornal local:
“SOROCABA REDIMIDA -
Domingo,
25 do corrente, reuniram-se no
Paço da Câmara Municipal
muitos senhores de escravos que
haviam sido convocados pela
95
Comissão Emancipadora .
Aclamado presidente da Assembléia
o Dr. Ferreira Braga, convidou para
secretário o Ten. Cel. Cavalheiros e
o cap. Joaquim Firmino.”
95
Faziam parte da Comissão Emancipadora em Sorocaba: A.J. Ferreira Braga, Manoel José da
Fonseca, Eduardo A. da C. Vieira, José T. Cavalheiro, José Loureiro de Almeida, Francisco de
Souza Pereira, Manoel Nogueira Padilha, Olivério Pilar, Joaquim F. de Toledo Penteado,
Christiano Exel. “Tinham o objetivo de resolver pacificamente a emancipação completa dos
escravos... sem desorganização do trabalho”.
VIEIRA, Rogick. Sorocaba não esperou o 13 de maio, op. cit. p. 50.
Dizia o presidente da Assembléia “Não há
68
dúvida que a transição do trabalho
escravo para o trabalho livre, traria
em começo dificuldades, mas que a
prudência e a inteligência do paulista
havia de vencer logo máxime
aqueles que, convencendo-se que
não pode haver meia liberdade para
os escravos concederam-lhe
liberdade incondicional e salário,
como aqui alguns fazendeiros
adotaram já, estendendo-se sobre o
assunto com muito critério e
lembrando medidas justas para
regular o estado entre os senhores e
os libertos”
o.,
A 1 de janeiro de 1888 foram entregues as cartas de
liberdade para os 940 escravos inscritos em março de 1886 na
cidade. (VIEIRA, 1988:53)
Apesar do número reduzido de escravos inscritos - se
comparado a outras cidades - vemos que, se alguns fazendeiros
tiveram problemas, por outro lado, a libertação adiantada começa a
resolver questões e tensões que vinham se agravando no sistema
como um todo, entre elas, a da formação do mercado de trabalho
96
livre.
Mas, essa libertação adiantada não significa que o negro será
absorvido de imediato pela indústria que nascia; ao contrário, muitos
continuaram com seus ex-senhores ou marginalizados por uma
sociedade que se modernizava tecnicamente, preferindo a mão-de-
obra especializada do imigrante.
A ‘Manchester Paulista’ da burguesia era o centro da cidade,
local de sua morada e das decisões, local da vida social e dos
melhoramentos urbanos exigidos pelas “pessoas de nossa
sociedade.”
96
Ademir GEBARA no seu estudo “Escravidão: Fugas e Controle Social”, apresenta as tensões
entre o homem livre - escravo em diversas cidades do Estado de São Paulo, entre elas
Sorocaba. Cadernos IFCH : UNICAMP n o. 12 2/84.
Conforme nos alerta Martins, em sua obra sobre o
69
cotidiano no subúrbio de São Paulo, “...a história de São Paulo tem
sido escrita do centro para a periferia.. mesmo quando se estuda a
história da classe operária, que sempre viveu nos bairros e no
97
subúrbio, prevalece essa orientação fora de contexto.”
A “Manchester Paulista” era um “Centro Industrial”
independente da localização física de suas fábricas. E mais,
independente do local de moradia dos operários.
No imaginário burguês centro industrial e centro da cidade
estavam metamorfoseados, por isso independia da localização
física.
Como acontece com a burguesia dos países de
industrialização tardia, o centro comercial de Sorocaba estava mais
ligado ao centro comercial inglês do que ao resto da própria cidade.
No que diz respeito à vida social, o bucólico é sempre
resgatado pelos escritos de hoje, como é o exemplo de Ângelo Vial,
ex-operário e depois industrial em Sorocaba, referindo-se a cidade
como “pacata cidade surpresa com a agitação dos trabalhadores,
98
seus discursos e comícios” . Outros retratavam apenas o progresso
industrial, “...Sorocaba indiscutivelmente cresce com a realidade,
ocupando o primeiro lugar, já não se exceptuando cidade alguma do
99
interior, já atendendo-se à relação entre a própria capital”
As referências ou são bucólicas ou ufanistas. O operariado,
quando aparece, é citado como favorecido pela indústria local, “...
um dos mais importantes núcleos do trabalho do nosso paiz, situado
na Vila Industrial [Votorantim] e que facilita o meio de subsistência a
100
mais de quatro mil pessoas.” ou como agitadores.
A Manchester Paulista, no imaginário burguês, repetia na sua
vida quotidiana a “ordem e o progresso” das fábricas, vez ou outra
afetada pela agitação de um ou outro operário mais inflamado.
101
HARDMAN, op. cit. p. 287.
102
Idem, idem.
71
1883 - Francisco Matarazzo abre uma pequena fábrica de
banha.
1890 - O Banco União de São Paulo, presidido pelo
Cel. Lacerda Franco, constrói a Fábrica
de Tecidos Votorantim.
1890 - Construída com capitais de Francisco de
Paula Mayrink a Fábrica Santa Rosália,
dirigida por Jorge Oetterer e Frank
Speers.
1890 - A firma Marchisio Loureiro, Silverio e Cia.
funda a fábrica Santa Maria.
1891 - Votorantim é ampliada com estamparia.
1897 - Fábrica de Chapéus Souza Pereira.
1900 - Francisco Matarazzo inaugura o Moinho e
encerra sua atividades em Sorocaba com
a banha.
1902 - Votorantim se amplia com tecelagem e
fiação.
1902 - A fábrica Santa Maria passa para Ernesto
Zscoeckel.
1904 - A fábrica Santa Maria passa para Campos,
Kenwort e Cia.
1905 - A Pereira Ignácio e Reynaldo Coutinho e Cia.
monta a Fábrica de Óleo Santa Helena.
1909 - Fundada a Fábrica de Chapéus Bandeirantes.
1909 - Criada a CIANÊ (Cia. Nacional de
Estamparia) abrangendo as fábricas
Santo Antônio e São Paulo.
1909 - Fundada a Fábrica de Malhas São José de J.
e Cia..
1910 - A fábrica de Óleo passa a ser Cia. Paulista de
Fiação, tecelagem e Óleos, formada
pelas firmas Pereira Ignácio e Cia. e
João Soares Hungria e Filho, com filiais
em Tatuí, Boituva e Conchas.
1912 - Fábrica de Calçados Soares.
1912 - Manoel José da Fonseca deixa de ser dono
da fábrica Nossa Senhora da Ponte e
mantém-se como acionista da S.A.
Nossa Senhora da Ponte organizado por Bernardo
72
Lichtenfels e Bernardo Lichtenfls Jr.
1913 - É inaugurada a Fábrica Santo Antônio, da
CIANÊ.
1914 - Nicolau Scarpa adquire a fábrica Nossa
Senhora da Ponte.
1915 - Criada a Fábrica de Enxadas Nossa Senhora
Aparecida.
1917 - O Banco União de São Paulo abre falência e
Antônio Pereira Ignácio adquire as
fábricas da Votorantim, fundando a S. A.
Votorantim.
103
SANTOS, A industrialização... op. cit. p. 58.
Um fator considerado, senão único, o mais importante
73
para essa “parada no desenvolvimento industrial” é justamente o “da
culpa do operário”...
104
OLIVEIRA, São Paulo de Sorocaba. op. cit. p. 23.
105
Jornal “O 15 de novembro” - 2/8/1905.
106
OLIVEIRA. São Paulo de Sorocaba. op. cit. p. 23, grifo nosso.
Assim, sugere este autor que a liderança operária
74
queria mesmo era ascender socialmente para a burguesia e
desfrutar ao “Sol do Capital”.
Anteriormente, havíamos transcrito palavras do ex-operário e
107
depois industrial Angelo Vial que afirmava o susto dos
sorocabanos com a “agitação operária”.
Como uma cidade operária pode ser pacata?
Conforme o levantamento de Genésio Machado para o
“Almanaque de Sorocaba (1950)” intitulado “Sorocaba no Século
XX”, a cidade não era tão pacata quanto imaginam alguns.
Vejamos:
107
Conforme nota n o. 11
108
Conforme BONADIO, “... uma bem montada tipografia de Sorocaba que, entre outras
impressões está a revista “Fim de Século de idéias socialistas”. BONADIO, Geraldo. “O
Partido Democrata Socialista e o Jornal A Conquista do Bem 1907 - uma tentativa de
organização política dos trabalhadores na indústria”. Sorocaba : Academia Sorocabana de
Letras, 1992, p. 15.
comandava a política de oposição ao governo e
75
109
era um dos líderes dos trabalhadores .
“Vilas Operárias
109
MACHADO, Genésio. Sorocaba no Século XX. IN: Almanaque de Sorocaba, 1950, Sorocaba,
s. ed., 1950, p. 41-2.
110
Idem, idem
Amplas avenidas arborizadas, igreja, grupo escolar, hospital,
76
estádio, jardins, lojas, posto de abastecimento caracterizam bem o
verdadeiro burgo que ali cresceu. Além da Vila Santo Antônio
111
próxima a fábrica do mesmo nome, conta com 200 residências”.
111
Almanaque de Sorocaba 1950, Sorocaba, s.ed, 1950, p. 121.
112
HARDMAN, op. cit. p. 290.
113
Depoimento de uma funcionária da Fábrica Votorantim que não quis se identificar
saia da fábrica e ia direto fazer janta na casa deles. Que ano
77
114
foi? Ah! acho que 44 ou 45.”
. NO RITMO DO APITO
RELÓGIO
As coisas são
As coisas vêm
As coisas vão
As coisas
Vão e vêm
Não em vão
As horas
Vão e vêm
Não em vão
(Oswald de Andrade)
114
Depoimento da Sra. Eulza T.C. da Silva, ex-moradora da Vila Santa Maria em fevereiro de
1994
115
Sorocaba 337 anos - caderno/revista publicado pelo Cruzeiro do Sul - jornal diário em
15/8/91, p. 84.
A cronista Neide B. Mantovani recorda seu cotidiano em
78
Sorocaba quando criança:
“Vinte e duas horas. Soava o último apito do dia. Era a Santa Maria
a.
que no seu silvo longo avisava o pessoal da 3 turma que o seu dia
de trabalho iria começar.
Lembro-me de que na minha infância, geralmente a essa hora nós
crianças já estávamos na cama e... fazíamos aposta para ver quem
ouvia o apito por mais tempo...
Depois que ficamos mais crescidos, nas noites quentes de verão,
tínhamos permissão para brincar na rua até apitar 10 horas.
Este sinal também valia para, quando já moças, saíamos para
116
passear na praça ou namorar...”
116
Idem, idem
117
Ibidem
118
PENTEADO, Jacob. Belenzinho, 1910 (retrato de uma época). São Paulo : Livraria Martins
Fontes, 1965, p. 29.
Pelo relato pessoal do autor sorocabano, nascido em
79
1900, morador da vila operária de Santa Rosália, ou como ele se
119
refere, Distrito de Nossa Senhora do Rosário , na vida do operário
o apito cabia mais para retornar ao trabalho do que para retirá-lo do
lazer.
Em nome da ordem e da pontualidade, criou-se o apito e suas
variações, cabendo ao operário aprende-los e responder
prontamente a eles.
Conta-se entre os ferroviários de Sorocaba que durante uma
greve, ocorreu um incêndio na Sorocabana e o “apito de incêndio” foi
soado chamando os operários para ajudar a contê-lo e, eles
responderam prontamente ao chamado.
Como eles mesmos aceitam, ‘é um misto de amor e
necessidade que fez os ferroviários largarem a greve nessa hora.”
O apito institui entre o operariado o dever da pontualidade e o
“respeito pelo chefe”, no caso os donos das empresas.
Continuando com o relato de Jacob, vemos mais um pouco do
cotidiano no ritmo do apito.
“Pobre papai! Morreu moço. Organismo não muito resistente,
trabalhando sem cessar, sucumbiu ao desumano regime então
imperante na indústria!
Faleceu em 1903, deixando-me com três anos de idade, e a minha
mãe, parturiente, com uma criança que nasceu no mesmo dia em
que expirava o pai, no quarto contíguo.
Vieram então, dias de grande dor e trabalho, pois mamãe, ainda não
refeita do profundo golpe que sofrera nem tampouco da recente
maternidade, precisou ir trabalhar na “Santa Rosália”, a fim de
sustentar-se e às duas criancinhas que lhe ficaram na desolada
viuvez.
Vejo-a ainda, quando, em plena madrugada, eu também acordava,
ao apito da fábrica¸ cujo som ecoava, no silêncio da colina, como um
doloroso chamado. Meio insone, pois passava as noites cuidando do
pequeno Antoninho, levantava-se, preparava às pressas seu magro
café, vestia-se, beijava-nos e seguia para seu calvário. Aos
domingos, dia de folga para todos, esfalfava-se em lavar a roupa da
semana, à beira do Rio Sorocaba, que corria aos pés do morro..
119
”A poucos quilômetros do centro da cidade, ergue-se uma aprazível colina, conhecida por
Santa Rosália, embora figure oficialmente como Distrito de N.S. do Rosário”. Idem, p. 28.
..A vida em Santa Rosália, não apresentava novidades...Eram
80
quase todos italianos ou espanhóis.
120
Viviam em boa paz, talvez por que o sofrimento os irmanasse.”
120
PENTEADO, Belenzinho... op. cit. p. 30 (grifo nosso).
121
Conforme Aluísio de Almeida, “...a colônia espanhola principiando a chegar em 93 ou 95,
primeiro operário, fez além ponte uma espécie de Brás. Citado por GODOY, op. cit. p. 42, nota
n o. 81.
1903 - Liga de Resistência Operária
81
1912 - Comitato da Societá Dante Alighieri
1912 - Real Sociedade Portuguesa Beneficente Vasco da Gama
1912 - Conferência de São Vicente de Paulo.
126
O 15 de Novembro, 3/8/1899
127
CARMO, Paulo S. do. A ideologia do trabalho. 4 a. ed.. São Paulo : Moderna, p. 70.
128
PENTEADO, op. cit. p. 62.
129
Idem, idem
Pelo relato vemos que o trabalho infantil não era tão
83
alegre e a correria da saída não era uma brincadeira, mas sim, fuga
da prisão diária.
O trabalho infantil servia como complemento dos baixos
salários das famílias operárias. Um complemento necessário à
sobrevivência familiar.
O inconveniente do trabalho infantil, e também feminino, a
nível de classe operária, era que este dificultava a organização
operária e ampliava o exército de reserva, o que levava a queda dos
salários dos homens na ativa.
Além da questão infantil, outro agravante da situação operária
eram os atrasos no pagamento.
Em 1903 no mesmo artigo, já citado anteriormente, onde o
operário chama seus companheiros à luta, há a reclamação sobre o
atraso de três meses da Cia Sorocabana.
Quando não, eram obrigados a comprar gêneros nos
armazéns das fábricas, onerando cada vez mais o operariado.
Em 1914 como não havia dinheiro para o pagamento dos
salários, os industriais reuniram-se para achar a solução. Criaram
vales que poderiam ser trocados por mercadoria no comércio local.
Novamente o operário saiu lesado: as lojas começaram a
cobrar ágio, alterando, o preço das mercadorias.
A seguir, anexamos uma tabela com os gastos de uma família
operária, feito por Hélio Negro e Edgar Levenroth
“Segundo o antigo operário e historiador Everardo Dias, a
partir deste cálculo mínimo, havia um déficit no orçamento de uma
família de operários urbanos de cerca de 100%, ou seja, o consumo
130
era o dobro do que se ganhava normalmente”
130
LEUENROTH, Edgar e NEGRO, Hélio. O que é o Maximismo ou Bolchevismo. São Paulo,
1919 apud HARDMAN, Trabalho urbano..., op. cit. p. 297-8.
84
Alimentação
12 quilos de arroz de segunda 9$600
12 quilos de feijão 4$200
18 quilos de batatas 5$400
15 quilos de pão 7$500
10 quilos de farinha de mandioca 4$000
05 quilos de macarrão 5$000
10 quilos de carne 10$000
07 quilos de toucinho ou banha 11$200
07 ½ quilos de açúcar 7$000
03 quilos de café 3$000
15 litros de leite 9$000
Verduras 6$000
Cebolas, alhos, sal,
pimenta, vinagre, 28$000
querosene, vassoura, e
outras miudezas
Soma
89$900
Alojamento
Aluguel de dois cômodos, com cozinha 45$000
Outras necessidades
Sabão 6$000
03 sacos de carvão 9$000
Fósforo, cigarros, mensalidade ao
barbeiro e à sociedade de socorro 17$000
mútuos
Soma 32$000
Vestuário
Homem (por ano)
2 ternos de roupa de pano ordinário 80$000
2 pares de sapatos 24$000
2 chapéus 14$000
3 camisas 12$000
3 ceroulas 9$000
meias etc 12$000
Mulher
85
3 vestidos de chita 60$000
2 pares de sapatos ou chinelos 24$000
3 camisas 15$000
3 saias brancas 21$000
12 pares de meias 18$000
Duas Crianças
Roupa e calçado 100$000
Outras necessidades
Móveis, louça, e outros objetos
necessários, durante o ano (imprevistos) 100$000
Total anual 489$000
ou seja, por mês 40$000
Resumo
Alimentação 89$900
Alojamento 45$000
Outras necessidades 32$000
Vestuário, calçado e demais imprevistos 40$750
Soma 207$650
131
GODOY, op. cit. p. 25.
132
Idem, p. 27.
87
1925
Sierguéi Iessiênin
(Tradução de Augusto de Campos)
88
VII. PONTOS FINAIS
134
SANTOS, Industrialização de Sorocaba... op. cit., p. 69
sociedade que o progresso não é geral, mas unilateral.
90
Somente a Manchester Paulista progride; a Moscou Paulista ainda é
um devir. “O cotidiano da classe operária em São Paulo revela ao
135
mesmo tempo atitudes alternadas de conformismo e rebeldia”.
Não apenas em São Paulo, mas também no interior a luta dos
operários jamais foi linear, avanços e recuos se sucediam. Para
garantir o avanço do processo industrial na cidade, o operário solicita
ao Congresso Nacional apoio à indústria brasileira. De outra feita,
aceita os valores como forma de pagamento mensal, para garantir
tanto seu trabalho e sustento, quanto a mais-valia do patrão. Em
outros momentos revolta-se, vai à greve, faz denuncias.
Entrementes, faz festa.
É o momento - imaginam - de ganhar as ruas centrais,
suprimir a visão idílica que cabia ao interior, mesmo tendo de
carregar o peso da responsabilidade da falência da fábrica. Ou,
então, ser preso, como o “...marceneiro Joseph Joubert... que
...chegou a agredir o delegado de polícia da cidade. Foi julgado e
136
condenado a 4 meses de prisão”.
Aliás, o operariado era coisa de polícia, mesmo! Na falta de
um departamento e de leis que regulamentassem as relações entre
patrões e empregados, ambos recorriam à polícia. As “fichas de
solicitação de emprego” eram feitas na delegacia. Uma forma de
racionalização do trabalho e de controle da população proletária.
Tudo indica, porém, que pouco adiantava aos operários
recorrer à polícia ou ao delegado, reivindicando qualquer coisa que
fosse. À polícia cabia “manter a ordem” e o operariado era visto
como marginal, indisciplinado, quase-coisa. Os patrões, ao contrário,
eram tidos como benfeitores das massas pobres e tinham direito de
solicitar (sempre atendidos) uma intervenção policial quando
achassem necessário.
Da análise, resulta que a formação do empresariado industrial,
assim como o proletariado, foi possível graças à articulação e depois
dissolução das atividades, feiras, algodão, de cunho comercial. Não
que as indústrias tenham eliminado essas atividades. Bem ao
contrário, irão se aproveitar delas. Das feiras, podemos inferir que
135
DECCA, Maria A.G. de. Cotidiano de trabalhadores na República São Paulo - 1889/1940.
São Paulo : Ed. Brasiliense - Col. tudo é História n o. 130, 1990, p. 16.
136
OLIVEIRA, São Paulo de Sorocaba...op. cit. p. 23.
91
foram importantes na infra estrutura urbana, abrindo caminhos
novos, novas ruas para a passagem das tropas e até mesmo
favorecendo a elevação da vila à categoria de cidade, em 1842.
Entretanto, os “ares de vila” só mudarão a partir de 1870-
1880 quando novas coonstruções - como a Estação da E.F.
Sorocabana, o primeiro prédio de tijolos da cidade começaram a
substituir as construções de taipa.
A cidade havia se ampliado, mas ainda, não era esteticamente
moderna. As fábricas trazem o estilo inglês na arquitetura de seus
prédios desoando dos restantes de simplicidade colonial num
modelo português.
A Manchester Paulista de operários e empresários, muito mais
desses últimos, é uma cidade que se moderniza com sua
infraestrutura urbana sendo melhorada para atender às
necessidades da população e do capital industrial e comercial nela
aplicados.
As redes de água, esgoto e iluminação reclamadas pela
população temerosa com as duas epidemias de febre amarela
certamente não demorariam visto ser também do interesse dos
industriais, como forma de garantir e melhorar a produção e
consequentemente seus lucros.
O interesse se comprova no primeiro contrato de 1890 com
Frank Speers (Francisco José Speers) que foi um dos fundadores da
Fábrica Santa Rosália (Oetterer e Speers e Cia.).
A cidade cresce realmente. No período do auge das Feiras de
Muares as ruas foram sendo prolongadas ou abertas, o comércio
tomava impulso, mas, é com a industrialização que a cidade irá se
tornar um “centro regional”, recebendo população e oferecendo um
comércio diversificado.
Diferente do período das feiras, quando a movimentação era
maior durante alguns meses apenas, a Sorocaba industrial recebe e
oferece ventagens, à população da região próxima, o ano todo.
Da cidade era comercializado e enviado o algodão ao porto,
depois passa a ser transformado e comercializado ali mesmo.
Podemos inferir ainda, que a população pobre e os operários
sorocabanos foram, junto com os de muitos lugares, fundamentais
para a aceitação dos produtos nacionais (principalmente tecidos,
produtos básico), já que estavam impossibilitados de consumir
produtos estrangeiros.
Mas nem tudo, em uma cidade, é apenas concretude.
92
O imaginário, criado pela população, também constrói o
espaço social, morada do cidadão.
Criam-se os mitos. Pessoas ou situações no caso: Maylasky,
o “Estrangeiro Misterioso”e Sorocaba, a Manchester Paulista.
A manutenção do primeiro está em suas ações e
empreendimentos. A da segunda, no espaço.
Prova disso é o interesse e o orgulho pelos bondes que
começam a trafegar pelas ruas e o alarde modernista anunciado
pelos jornais. As chaminés com sua negra fumaça do progresso
exaltadas nos almanaques. A comparação com a cidade inglesa
ajuda na ideologia do trabalho seriado tão necessária ao capitalismo
aos capitalistas. O espaço se altera para fazer jus a essa posição de
cidade fabril, moderna, à frente nas iniciativas empreendedoras.
Antes “Novelo de Linha”, agora Manchester Paulista. A cidade
cresceu realmente...
Porém, essa posição de destaque, primeiras décadas do
século, não perduraria, sendo suplantada por Campibnas, Ribeirão
Preto, por exemplo
Ficou a alcunha. O cartão postal comercializado na cidade
confirma isso (Ver foto).
Daquela Sorocaba textil pouco sobrou no espaço rugosidades
(SANTOS, 1990:138)
Prédios vazios e semidestruídos no centro da cidade ou
transformados conforme o interesse público ou privado, mostram o
passado.
O tropeiro é lembrado anualmente com a “Semana do
Tropeiro”:
O operário têxtil não tem semana, nem dia, nem memória.
A construção da Manchester Paulista deixou no anonimato
seus construtores e as marcas no espaço estão acabando.
Desfazem-se os velhos mitos. Criam-se outros...
VIII. BIBLIOGRAFIA
93
ALMANAQUE, da Província de São Paulo - 1890
AMARAL, Antonio Barreto. “Dicionário de História de São Paulo”.
Governo de São Paulo, 1980.
KARL, Marx. O Capital. Rio de Janeiro : Livro 1 Vol. II, Ed. Bertrand
Brasil, 1988.
ESPECÍFICOS
SALES, Clarisse.
JORNAIS
IX. ANEXOS
RUA DA PENHA
LOJAS DE FAZENDAS
Antonio Bernardo Vieira
Antonio José Araujo
Antonio Marciano da Silva
Araújo e Vieira
Carlos Ranier
Francisco Ferreira Leão
Luiz Matheus Maylasky
Manoel José da Fonseca
Manoel Maria X. De Araújo
Soares e Irmão
103
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Francisco Ferreira Leão
Gaspar José Ferreira de Paiva
ALFAIATES
Henrique Rodrigues Costa
ARMADORES
José Manoel de Oliveira Leme
BARBEIROS
Serafim de Madureira
RUA DO COMÉRCIO
LOJA DE FAZENDAS
Antonio de Moraes e Silva
Eduardo Antero da C. Vieira
João de Oliveira Guimarães
Teixeira e Guimarães
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
José Rodrigues Jorge
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Antonio Pandorf
João Mathias Cleis
Joaquim Antonio Machado
ALFAIATES
José Alexandre da Silva
CONFEITARIAS
Joaquim Antonio Cardoso
FERRADORES
João Pedro Jacob Seraibrik
HOTÉIS
Manoel Luiz Mendes
Manoel Pinto
105
RUA DO HOSPITAL
ARMMAZÉNS E ARMARINHOS
Antonio Barnabé da Rosa
Luiz Bueno de Godoy
Manoel Vieira Rodrigues
HOTÉIS
Ignácio Moreira da Silva
MARCINEIROS
João Carlos Gromas
OURIVES
Florentino Garcia Vieira
Francisco de Paula Oliveira
SELEIROS
Jacob Bauer
SERIGOTEIROS
Antonio Delfino de Arruda
Manoel da Costa e Souza
RUA DA PENHA
COLCHOEIRO
Adão de Paula
MARCINEIROS
Frederico Schepe
José Messias da Costa Nunes
OUVIRES
Antonio José da Rosa
Antonio Martins de Oliveira
Antonio Machado de Moraes
Antonio Messias da Costa Nunes
José de Mascarenhas Camello
José Narciso Pacheco
RELOJOEIROS
Frederico Hummel
SERRALHEIRO
Hemrique Veuteroff
TIPOGRAPHIA
Julio Ribeiro
OUVIRES
Antonio da Silva Oliveira
PEDREIROS
Antonio Francisco de Campos
SELEIROS
Serafim de Paula Rosa
107
SERIGOTEIROS
Antonio Fogaça de Almeida
ALFAIATE
Irinêo Severino de Almeida
RELOJOEIROS
Francisco F. Hach
TYPOGRAPHIA
Francisco de Paula Oliveira Abreu
PEDREIROS
Adolpho Lippel
ADVOGADOS
José Leite Penteado
Ubaldino do Amaral Fontoura
MÉDICOS
Dr. João Henrique Adams
Dr. Pedro Dias Carneiro
CAPITALISTAS
D. Antonia Candida de Camargo
Ten. Cel. Fernando Lopes de Souza Freire
108
RUA DA PONTE
LOJA DE FAZENDAS
João da Cruz X. De Araújo
ARREIOS
Jeremias Wenderico
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Antonio Fogaça de Almeida
Carlos Opts
Christiano Exel
José Barbosa
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Domingos Paschoal
João Rodrigues Costa
Joaquim Cardoso da Costa
Raphael Cassiani
ALFAIATES
Manoel Dias da Cruz e Comp.
CONFEITARIAS
Dona Julia da Costa
FÁBRICA DE CHAPÉOS
Teodoro Kaisel (sic)
FERRADORES
Antonio Jacob Seraibrik
Jeremias Serabrik
FERRADORES
José Antonio de Souza Bertholdo
Manoel Augusto de Souza
MARCINEIROS
Henrique Wast
Pedro Batista Der
RETRATISTA
Camilo Pijard
PHARMACEUTICOS
José Joaquim de Carvalho Mascarenhas
RUA DIREITA
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Camillo Rodrigues de Barros
José Antonio Galvão
CONFEITARIAS
Joaquim Teixeira Cavalleiros
D. Maria das Dores Pinto
PADARIAS
Pedro Meuville
TYPOGRAPHA
110
Manoel Januário de Vasconcellos
CAPITALISTAS
José Gabriel de Carvalho
RUA DA PENHA
PEDREIROS
Daniel Lippel
SELEIROS
Felippe Endres de Paula
José Bento de Macedo e Castro
SERIGOTEIROS
Candido José de Almeida
CAPITALISTAS
Antonio Marciano da Silva
Francisco Ferreira Leão
RUA DA PONTE
HOTÉIS
Manoel Furtado Côrte-Real
MARCINEIROS
Carlos Opts
Germano Petcolt
SERIGOTEIROS
Antonio Luiz de Almeida
ADVOGADOS
Antonio José Ferreira Braga
Vicente Eufrásio da Silva Abreu
Joaquim Manoel Gonçalves
111
DENTISTAS
Joaquim Pacheco de Araújo
CAPITALISTAS
Antonio Joaquim de Sant’Anna
Cap. Francisco Xavier de Barros
LOMBILHEIROS
Francisco Feliciano de Barros
Manoel de Medeiros Barros
MARCINEIROS
Luiz Antonio de Sant’Anna
RUA DO CEMITÉRIO
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Antonio Gregório Martins
RUA MUNICIPAL
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Bárbara Ferraz de Camargo
RUA DA INDEPENDÊNCIA
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
José Thomaz da Silveira
ARMADORES
José Caetano Prestes
SERIGOTEIROS
Joaquim Antonio da Trindade
José Anselmo Pereira
RUA DA CONSTITUIÇÃO
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
José Antonio de Barros
LARGO DA MATRIZ
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
José Leite de Freitas Broxado
Manoel Nogueira Padilha
Salvador Rodrigues dos Santos
ALFAIATES
José Joaquim dos Santos
113
BARBEIROS
Francisco Antonio de Sant’Anna
José Joaquim dos Santos
CONFEITARIAS
d. Carolina Der
D. Clementina do Amaral F. Ribas
João de Queiroz
DOURADOR E PRATEADOR
Antonio Tristão de Rezende
PADARIAS
D. Clementina do Amaral Ferreira Ribas
CAPITALISTAS
Lázaro Manoel Freire
RUA DO PIQUE
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
Francisco das Chagas de Jesus Martins
Francisco Vieira de Pontes
RUA DO ROSÁRIO
ARMAZÉNS DE SECOS E MOLHADOS
João Kenipel
FÁBRICAS DE CHAPÉOS
Antonio Rogick e Comp.
FERRADORES
Bento José de Almeida Lima
114
MACHINAS DESCAROÇAR ALGODÃO
Te. Cel. João Teixeira de Miranda
PADARIAS
João Kenipel
PEDREIROS
Frederico Lippel
MÉDICOS
Dr. Virgílio Augusto de Araújo
PHARMACÊUTICOS
Joaquim Rodrigues da Fonseca Rosa
CAPITALISTAS
Antonio Rogick
Camillo José de Mattos Ellias Manoel Freire
RUA DA MARGEM
ARMAZÉNS E ARMARINHOS
Fontoura e Irmão
Redondo e Coelho
LOMBILHEIROS
Luiz Antunes
MARCINEIROS
Francisco Félix Fogaça
Jeronymo Antonio Lopes
Joaquim Vicente de Almeida
José Moreira Claro
Laurindo Antonio de Almeida
Raphael Isidoro Padilha
Salvador Laudate
COCHEIRAS
Agostinho Antonio de Oliveira Dias
OUVIRES
Guilherme Severiano da Costa Oliveira
SERIGOTEIROS
Antonio Maximiano de Godoy
Pedro Samuel Stumbek