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Os Conselhos de Políticas Públicas são, atualmente, um dos principais mecanismos

de controle social do Brasil. A Constituição Federal de 1988 determinou a criação de


conselhos nas áreas de saúde, assistência social e educação em todas as esferas
governamentais, que estimularam o surgimento de conselhos em outras áreas. Os
conselhos de saúde são, talvez, os mais regulamentados pelas Leis federais (pela
Resolução nº 453/2012), consideravelmente mais do que aqueles que são de caráter
consultivo ou não obrigatório. Entretanto, mesmo na saúde é possível observar
grandes divergências na composição, atuação e participação social mesmo em
conselhos da mesma área.
Passador e Silva (2018) ressaltam a importância dos conselhos para a participação,
enquanto apontam a possível falta de concretude desses instrumentos:
“Com isso, chega-se à conclusão de que os conselhos de saúde constituem uma
inovação institucional essencial no campo da saúde pública, principalmente, no que
se refere ao espaço de formulação e implementação das políticas públicas de saúde
na esfera municipal. No entanto, outras análises devem ser levadas em
consideração, para que seja observado se na prática do cotidiano dos conselhos, as
regras e as normas que os estruturam são de fato seguidas”
Sendo assim, é difícil generalizar a efetividade dos conselhos no alcance desse
parâmetro e se faz mais oportuno analisar de forma específica, caso a caso. Para o
seguimento desse exercício consideramos o Conselho Municipal de Saúde de Juiz
de Fora segundo Magalhães e Xavier (2019) e o Conselho Municipal de Política
Cultural de Campinas (CMPC) segundo Baltazar (2022), além de algumas
comparações com a experiência empírica na formação do Conselho Municipal de
Política Cultural de Lavras, através do Observatório de Políticas Públicas.
Na pesquisa acadêmica foi possível identificar uma complexo cruzamento entre
esses parâmetros na realidade dos Conselhos de Políticas Públicas, dessa forma
alguns deles serão analisados de forma conjunta, buscando entender como se
relacionam na promoção do controle social.
O Conselho Municipal de Saúde de Juiz de Fora
No Conselho Municipal de Saúde de Juiz de Fora possui representação
quadripartite, sendo a metade dos representantes (27 de 54) usuários dos serviços
do SUS e os demais representantes do governo, profissionais de saúde e
conselheiros titulares. É um número bastante elevado, que supera o de Belo
Horizonte, por exemplo. Além do Conselho Municipal de Saúde existem na cidade
também 12 conselhos regionais e 62 conselhos locais.
Os conselheiros entrevistados por Magalhães e Xavier (2012) relatam que o
Conselho exerce significativa influência sobre a formulação de políticas de saúde e
que gozam de participação efetiva no Conselho. Portanto, é natural assumir que a
participação da sociedade seja efetiva, entretanto, ao analisarmos o aspecto do
engajamento dos participantes é revelada uma nova dimensão dessa participação.
Os entrevistados relatam duas questões que são fundamentais para compreender a
realidade da participação social nesse Conselho. A primeira é a falta de abertura
para posicionamentos divergentes ou relativos a temas polêmicos, onde ressaltam
curto tempo para exposição de novas pautas e obstrução de determinadas falas,
além de uma certa resistência a novos conselheiros.
A segunda questão são as pautas discutidas pelo Conselho. Diferentes
entrevistados, até mesmo um representante do poder público, expuseram que em
sua maioria as pautas discutidas pelo Conselho são propostas pelo próprio governo.
Essa ausência de abertura para a inserção de pautas da sociedade reduz o
Conselho a um papel de avaliação das propostas governamentais, bem diferente do
seu esperado caráter propositivo e deliberativo.
Sendo assim, é difícil afirmar que existe participação social efetiva, engajamento dos
participantes e até implementação das decisões do conselho, uma vez que essas
propostas emanam do próprio governo e são apenas discutidas pelo Conselho.
Entra em questão também, pelo mesmo motivo, a pertinência das deliberações, pois
apesar da maioria dos conselheiros reforçarem a importância do conselho e de suas
deliberações, as pautas discutidas não emanam da sociedade e de suas demandas.
Por mais que os assuntos discutidos sejam válidos e que os conselheiros acreditem
participar efetivamente do Conselho, se não há a inserção das pautas levantadas
pelos representantes da sociedade civil é difícil afirmar que essas deliberações são
pertinentes.
Apesar dessas falhas, o Conselho Municipal de Saúde de Juiz de Fora tem seus
êxitos. Ele é o Conselho Municipal de Saúde com o maior número de representantes
do Estado, conta com reuniões ordinárias quinzenais e se reúnem de 3 a 4 vezes
por mês (entre reuniões ordinárias e extraordinárias), além de ser um dos 4
Conselhos analisados por Passador e Silva (2018) cujo regimento é adequado à
legislação vigente e ouvidoria. Esse Conselho também possui uma elevada
presença de usuários nas reuniões e assiduidade dos representantes, o que atenua
um pouco essa grande influência do governo.
O Conselho Municipal de Política Cultural de Campinas (CMPC)
A trajetória do CMPC é um tanto diferente do Conselho abordado na seção anterior.
Desde 2013 havia uma movimentação popular por integração socioterritorial,
artística e cultural, protagonizada pelo Fórum Permanente de Cultura de Campinas
(FPCC), com a reivindicação da construção de políticas inclusivas e democráticas.
Em decorrência dessa movimentação, em 2020 a Câmara Legislativa de Campinas
aprova o Plano Municipal de Cultura e a instituição do CMPC em substituição ao
Conselho de Cultura. Diferente de seu antecessor, o CMPC é um conselho
deliberativo.
A preocupação com a inclusão e democratização do Conselho fica evidente nos
relatos dos conselheiros entrevistados por Baltazar (2022). O CMPC é integrado por
representantes do poder público e da sociedade civil, sendo estes oriundos de
diversas Câmaras Setoriais e Territoriais e de entidades de pesquisa.
Em 2021, quando aconteceram as eleições para representantes do CMPC, apenas
324 eleitores da sociedade civil se cadastraram e nas 7 Câmaras Territoriais houve
praticamente uma chapa por território, além de poucos votantes. No primeiro ano de
atuação do Conselho, 3 chapas eleitas da sociedade civil recusaram a
representação.
A realidade dos Fóruns Setoriais de Cultura para a criação do Conselho Municipal
de Cultura de Lavras foram bastante semelhantes. O Observatório de Políticas
Públicas em parceria com a Secretaria Municipal de Cultura, Esporte, Lazer e
Turismo tentaram promover fóruns setoriais que incentivassem a participação social
nos assuntos culturais do município. Apesar dos extensos esforços de mobilização,
que incluíram a ampla divulgação dos fóruns e tentativas de contato com os
principais atores da Cultura do município, a presença desses atores nos fóruns e
oficinas propostas deixou muito a desejar.
Isso poderia ser indicativo de uma baixa efetividade da participação social,
entretanto, no caso do CMPC, os conselheiros entrevistados descrevem justamente
o contrário.
A atuação do CMPC garantiu, já para 2022, um aumento do orçamento da pasta da
Cultura além da conquista de políticas de financiamento de projetos culturais. Os
conselheiros entrevistados e a autora não desprezam a importância de aumentar a
participação popular, especialmente nas Câmaras Territoriais, mas ressaltam as
conquistas alcançadas pelo Conselho em um pequeno tempo de atuação e o
fortalecimento tanto da sociedade civil quanto do poder público na discussão das
políticas culturais e PPA do município. Dessa forma entende-se que há efetividade
na participação daqueles atores sociais que buscam representação no Conselho e
implementação se suas decisões pelo poder público, entretanto há uma falha de
engajamento desses atores.
O estudo de Baltazar (2022) indica que em 2021 o principal ator responsável por
determinar as pautas do CMPC foi a sociedade civil, que tinha a presidência. O
Conselho promoveu também a abertura para fiscalização do poder público, que
garantiu a destinação apropriada dos recursos da Cultura. Os entrevistados,
representantes tanto do poder público quanto da sociedade civil, concordam na
percepção de um ambiente de cooperação e sinergia dentro do CMPC entre os
setores, o que propulsiona o desenvolvimento democrático de suas pautas e sua
defesa por parte dos representantes do setor público.
Levando em consideração as conquistas do CMPC logo em seu primeiro ano de
atuação e a preocupação de seus conselheiros com a defesa dos interesses da
sociedade civil e dos produtores de cultura do município, acredito ser possível
afirmar que suas deliberações são, sim, pertinentes. É claro que ainda há muito
espaço para crescimento e melhorias, especialmente no que tange a participação
dos representantes da sociedade civil, mas não cabe desconsiderar o avanço das
pautas culturais de interesse social promovido pelo CMPC.
As reuniões do Conselho Municipal de Política Cultural acontecem quinzenalmente e
todas as atas de reuniões estão disponíveis no site da Prefeitura de Campinas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BALTAZAR, Márcia. A tentativa de uma macropolítica de cultura na cidade de


Campinas. Urdimento – Revista de Estudos em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 3, n.
45, dez. 2022

PASSADOR, Cláudia S.; SILVA, Edson A. Gestão da Saúde Pública em Minas


Gerais Sob a Ótica Dos Conselhos Gestores Municipais. Rev. eletrôn. adm, 2018
MAGALHÃES, Fernanda G. G. P.; XAVIER, Wescley S. Processo Participativo no
Controle Social: Um Estudo de Caso do Conselho Municipal de Saúde de Juiz de
Fora (MG). Rev. eletrôn. adm, 2019

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