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Crianças e Adolescentes e aos Conselhos Tutelares.

Primeiramente, a capacitação
técnica e política, depois a efetiva participação na elaboração e execução do orçamento
público, pois é no planejamento orçamentário que se estipulam em grande parte as
políticas públicas que garantem os direitos das crianças e adolescentes. Por isso,
reforçamos a importância da participação efetiva na construção, no monitoramento e
na avaliação das políticas orçamentárias municipais, estaduais e federais.

CONSELHOS DE DIREITOS E DE POLÍTICAS PÚBLI-


CAS
Os Conselhos compõem o conjunto de instrumentos e mecanismos de
Controle Social da gestão pública. Então, o que são Conselhos? Apresentamos aqui
três conceitos.
Moroni (2009, p. 114-115) entende os Conselhos de Políticas Públicas
(...) como espaço fundamentalmente político, institucionalizado,
funcionando de forma colegiada, autônomo, integrante do poder
público, de caráter deliberativo, composto por membros do governo
e da sociedade civil, com as finalidades de elaboração, deliberação e
controle da execução das políticas públicas.

Na mesma direção, Siraque (2009, p. 128) entende esses Conselhos como


“instrumentos concretos de partilha de poder entre os governantes e a sociedade
para a democratização da elaboração e gestão das políticas públicas, servindo de
mecanismos de controle social das atividades estatais”. Carneiro e Costa (2001)
conceituam os conselhos como canais institucionalizados de participação, que
marcam uma “reconfiguração das relações entre Estado e sociedade e instituem uma
nova modalidade de controle público sobre a ação governamental e, idealmente, de
corresponsabilização sobre o desenho, monitoramento e avaliação de políticas”.
Os Conselhos são canais institucionais, formados por representantes da
sociedade civil e do poder público, vinculados à estrutura do Poder Executivo ao qual
cabe garantir as condições necessárias para o seu funcionamento. Porém não são
subordinados a ele, pois são autônomos nas suas decisões e gestão.
Os Conselhos fazem parte de um processo de descentralização
administrativa e de ampliação da democracia por meio de participação direta da
população, são importantes para a consolidação da cultura cidadã, pois constituem
um espaço pedagógico privilegiado para exercitar a participação, o agir coletivo para
a construção de uma consciência coletiva. A participação não é um fim em si próprio
e sim está em função de um projeto de sociedade. Dessa forma, o Conselho é uma
instância política que envolve construção de um projeto de sociedade. Por isso, é
um espaço de disputa, de negociação e de compartilhamento de responsabilidade
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da sociedade civil com o Estado na elaboração, efetivação e avaliação das políticas
públicas. Nesse sentido, é fundamental a qualidade da participação dos Conselhos,
tanto técnica como politicamente.
De acordo com Ciconello (2008), para que o Conselho de Política Pública
atinja seus objetivos, é necessário que ele seja:
• paritário (igualdade no número de representantes governamentais e
representantes da sociedade civil);
• deliberativo (com atribuições de deliberar sobre a formulação, as prioridades e
o orçamento da política);
• com gestão compartilhada da política, permitindo o controle social por parte das
organizações e movimentos da sociedade civil (monitoramento e avaliação);
• implantado nas três esferas da Federação (União, estados e municípios),
formando uma estrutura de gestão federativa das políticas públicas.
A finalidade principal dos Conselhos é ser um instrumento para garantir
a participação popular no controle social e na gestão, no planejamento, no
acompanhamento da execução e avaliação das políticas e dos serviços públicos.
As decisões dos conselhos em torno de uma política ou demanda social poderão
ser de caráter fiscalizador, mobilizador, deliberativo e ou consultivo perante o
órgão governamental a quem cabe a execução da decisão. As decisões deliberativas
são de acatamento obrigatório para o órgão responsável pela execução da decisão,
que podem ser reivindicadas judicialmente quando não acatadas. As decisões de
caráter consultivo cabem ao órgão gestor das políticas acatar ou não as propostas
ou sugestões do conselho. Quanto às decisões de caráter consultivo, cabe ao órgão
gestor das políticas acatar ou não as propostas ou sugestões do conselho.
Quando as decisões dos conselhos tiverem caráter deliberativo, devem ser
manifestadas por meio de resoluções e homologadas (aprovadas) pelo chefe do poder
executivo – Prefeito, Governador, Presidente ou alguém da máquina administrativa
nomeado para esse fim.
O papel deliberativo do Conselho é exercido quando ele define e aprova
propostas orçamentárias, principalmente, as referentes aos Fundos a que tiver
vinculado, transferência de recursos financeiros, diretrizes para políticas públicas,
convocação de Conferências com a finalidade de avaliar e formular políticas setoriais,
criação de comissões permanentes ou provisórias etc., como observado a seguir:
O escopo deliberativo dos conselhos gestores de políticas públicas,
de fato, muito tem que se desenvolver. Como visto, os conselhos
gestores de políticas públicas apresentam limitações — baixa
representatividade dos gestores públicos, incapacitação dos
conselheiros, assuntos periféricos e não abrangentes e dependência
da boa vontade política dos governantes — que impõe barreiras à
concretização da deliberação pública nesses espaços (VALE, 2013,
p. 52).

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O caráter consultivo do Conselho é exercido por meio de recomendações e
moções que são manifestações de advertência ou posicionamento que ultrapassam o
poder deliberativo do Conselho. Sua atuação como órgão consultivo acontece quando
ele acompanha a autoridade local ou de outra esfera em visitas de verificação in
loco, quando emite recomendação sobre o planejamento do órgão público a que tiver
vinculado.
Os Conselhos se utilizam de comunicações, dossiês, relatórios e
representações na sua atuação com caráter fiscalizador. Sua atuação fiscalizadora
acontece na verificação da aplicação dos recursos financeiros no âmbito de sua
respectiva atuação, principalmente no acompanhamento e no controle dos Fundos,
exame e investigação de fatos denunciados ao Conselho, etc., conforme a seguir:
Os conselhos podem desempenhar conforme o caso, funções de
fiscalização, de mobilização, de deliberação ou de consultoria.
A função fiscalizadora dos conselhos pressupõe o acompanhamento
e o controle dos atos praticados pelos governantes.
A função mobilizadora refere-se ao estímulo à participação
popular na gestão pública e às contribuições para a formulação e
disseminação de estratégias de informação para a sociedade sobre
as políticas públicas.
A função deliberativa, por sua vez, refere-se à prerrogativa dos
conselhos de decidir sobre as estratégias utilizadas nas políticas
públicas de sua competência.
A função consultiva relaciona-se à emissão de opiniões e sugestões
sobre assuntos que lhe são correlatos (CGU, 2008, p. 21).

A atuação dos Conselhos deve acontecer de forma transversal e intersetorial


com os outros conselhos, com o conjunto de políticas públicas e com as entidades
sociais e órgãos públicos em vista da universalização da política por ela atendida:
Está cada vez mais clara a relevância da atuação dos Conselhos de
Assistência Social ser articulada com as diversas áreas temáticas
das políticas públicas nos estados e municípios, tais como Educação,
Saúde e Direitos das Crianças e Adolescentes e do Idoso, uma vez
que há situações que exigem ações intersetoriais. Nesse sentido,
é necessário que os representantes do governo nos Conselhos
desenvolvam ações ligadas a estas áreas. De acordo com o Censo
SUAS 2013, todos os Conselhos Estaduais e Municipais possuem
representantes das áreas de Assistência Social, Educação e de Saúde,
e 96,2% dos Conselhos Estaduais e 58,1% dos Conselhos Municipais
possuem representantes de outras áreas (SUAS, 2013, p. 104).

A composição dos conselhos deve seguir o princípio da paridade, e a


indicação de seus membros deve refletir o dispositivo constitucional da participação
direta da população, por meio de segmentos e de organizações representativas

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ligadas à área de atuação de cada conselho. Assim, o governo deve escolher os
representantes do Executivo, e à sociedade civil cabe escolher seus representantes
em fóruns próprios, que representam os respectivos segmentos.
A legitimação dos Conselhos, bem como as suas competências e atribuições,
estão definidas na Lei ou Decreto de criação e no seu Regimento Interno. Tornam-se
assim, instâncias formais, institucionais, sistemáticas e permanentes, em que os
conselheiros são investidos de autonomia e independência, como representantes do
Estado e da Sociedade. Cabe ao órgão público a que o Conselho estiver vinculado
proporcionar infraestrutura adequada para que possa exercer plenamente suas
funções e realizar suas atividades, como hospedagens, ajuda de custo, custeio de
locomoção, assessoria técnica etc.
Os Conselhos possuem, basicamente, as seguintes atribuições e poderes:
• deliberar sobre formulação, estratégias, diretrizes e execução das políticas
públicas;
• acompanhar a execução do plano da temática ou segmento que representa;
• convocar e organizar conferências;
• assessorar o órgão legislativo, executivo, judiciário e as entidades sociais no
diagnóstico de problemas;
• acompanhar, analisar e emitir parecer sobre a elaboração de leis específicas;
• utilizar como parâmetro de sua atuação defesa, promoção e garantia dos
direitos humanos;
• encaminhar aos órgãos competentes petições, denúncias e reclamações
formuladas ao Conselho, exigindo do órgão competente a adoção de medidas
efetivas de proteção e reparação;
• criar comissões técnicas ou grupos de trabalho para discutir temas específicos
e apresentar sugestões ou recomendações destinadas a subsidiar decisões do
Conselho;
• propor e ou executar programas educativos ou campanhas de sensibilização e
de conscientização da população;
• articular-se com outros Conselhos, instituições e órgãos públicos e colegiados
afins;
• conhecer programas e serviços públicos e sociais existentes visando à
integração do atendimento;
• estabelecer diálogo com a sociedade civil organizada e com os fóruns que
atuam em defesa de direitos;
• contribuir para a efetiva participação dos usuários nas decisões do Conselho;
• participar ativamente dos espaços de elaboração dos orçamentos do poder
público para que seja compatível com as reais necessidades sociais;
• divulgar os direitos e os mecanismos de exigibilidade dos direitos;
• ter comprometimento com a defesa da democracia e dos direitos da população;
• fiscalizar os Fundos a que tiver vinculado.

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Além das atribuições e poderes acima elencados, relacionamos abaixo
alguns princípios que devem nortear as ações dos Conselhos.

Descentralizar o poder do Estado por meio da


participação direta na formação, execução e avaliação
das políticas públicas. O poder do Estado não é
monopólio dos governos. Isso contribui para:
- combate das oligarquias, do patrimonialismo e da
falta de democracia no trato da coisa pública;
Descentralização
- promoção da formação de novas lideranças sociais
e políticas;
- corresponsabilização entre sociedade e Estado na
definição da gestão pública;
- fortalecimento do controle social sobre o poder
Executivo, Legislativo e Judiciário.
Esse princípio cumpre o preceito constitucional de que
“todo poder emana do povo, que o exerce por meio
de representantes eleitos ou diretamente, nos termos
desta Constituição”.
A participação nos conselhos se dá na escolha,
Participação em foro próprio, dos representantes da sociedade
civil, contemplando a diversidade dos segmentos
sociais. Além dos representantes da sociedade civil
organizada, o Conselho deve proporcionar livremente
a participação geral da população em suas diversas
formas de participação.
Esse princípio caracteriza a composição dos conselhos
por meio do critério de sua formação ser por igual
número de representantes da sociedade civil e
do poder público, representado por pessoas com
representatividade e legitimidade para defender as
Paridade na questões que representam. O representante, tanto do
Representatividade poder público como da sociedade civil, não representa
a si mesmo e sim o pensamento ou posição da
instituição que representa. Os representantes do poder
público precisam ter poder de decisão em seus órgãos
para que as decisões do Conselho sejam exequíveis
nas instâncias do poder público.
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Os Conselhos em suas instâncias nacionais, estaduais,
municipais necessitam de clareza das atribuições de
cada um. Apesar de serem similares, elas não podem
sobrepor-se, gerando, assim, conflito de funções e
atribuições e, consequentemente, a ineficiência das
Comando Único
suas atividades. Eles também precisam perceber as
oportunidades e os espaços para a atuação integrada e
conjunta entre os Conselhos nas suas três instâncias,
quando se trata da mesma temática e de forma
transversal e intersetorial com os outros Conselhos.
O Conselho deve ter identidade própria e autonomia
para tomar suas decisões como órgão colegiado. A
autonomia não é gratuita, ela precisa ser conquistada
por meio de sua atuação competente e sua capacitação
técnica, com respeito e observância dos princípios
e da legislação que regem o Conselho; também
Autonomia pela responsabilidade e comprometimento com as
demandas sociais da temática ou segmento social que
representa.
Suas diretorias são eleitas entre os conselheiros
que garantem ao Conselho poder deliberativo,
de fiscalização e de tomar as decisões de forma
independente.
Os cinco princípios a seguir fazem parte dos Princípios
da Administração Pública, conhecidas como LIMPE
(Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade
e Eficiência).
O princípio da legalidade significa a submissão e o
respeito à lei. Ou seja, na atuação do Conselho, não há
liberdade nem vontade pessoal, ela está limitada àquilo
Legalidade
que a lei permite.
Na Administração Pública, somente é lícito fazer o
que a lei permite, enquanto na administração da vida
particular você pode fazer tudo o que a lei não proíbe:
“Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de lei” (art. 5º, inciso
II da CF).
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Os fins a serem alcançados pelo Conselho não podem
visar ao benefício pessoal do conselheiro e sim o
interesse de todos, o interesse público. É vedada
qualquer promoção pessoal ou corporativa em nome do
Conselho: “A publicidade dos atos, programas, obras,
Impessoalidade
serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter
caráter educativo, informativo, ou de orientação social,
dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens
que caracterizem promoção pessoal de autoridade ou
servidores públicos” (art. 37, §1º da CF).
A moralidade está relacionada à boa administração
daquilo que é público. Deve-se observar e ter clareza
Moralidade
daquilo que é lícito e do que é ilícito, do justo e do
injusto e dos princípios éticos na atuação do Conselho.
As atividades exercidas pelos Conselhos devem
ser publicitadas, levadas ao conhecimento geral de
forma transparente, como forma de controle social e
fiscalização popular da atuação do Conselho. Para que
as normas e os atos estabelecidos pelos conselhos
produzam efeitos e validade, elas precisam ser
publicadas, principalmente no Diário Oficial.
Os Conselhos precisam buscar a diversidade de meios
Publicidade
para divulgar suas ações e prestar contas ao público
sobre sua atuação: “Todos têm direito a receber
dos órgãos públicos informações de seu interesse
particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão
prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade,
ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à
segurança da sociedade e do Estado” (art. 5º, inciso
XXXIII da CF).
Eficiência significa qualidade nos serviços com
racionalidade de gastos.
O Conselho deve buscar continuamente o
aperfeiçoamento da sua atuação por meio da
Eficiência
capacitação técnica e política, com um bom diagnóstico
da realidade, com planejamento e com compromisso e
responsabilidade na defesa e garantia dos direitos ao
público a que se destina.
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Como estão hoje esses espaços de participação?

Eles têm contribuído com a implementação de políticas públicas que


garantam os direitos humanos e a diminuição da desigualdade social? A sociedade
tem conseguido contribuir qualitativamente na formulação e no controle social das
políticas públicas? Tatagiba (2004, p. 366), ao analisar os conselhos municipais de
políticas públicas na cidade de São Paulo, afirma que
No caso de as correlações de força dentro dos Conselhos serem
muito desfavoráveis, ele pode ser levado ao isolamento, passando a
uma existência meramente formal, porque obrigatória. Quando isso
acontece, em vez de atuar no sentido de reinvenção institucional,
os conselhos gestores podem constituir-se como institucionalidade
paralela, com pouco ou nenhum efeito democratizante sobre as
instituições estatais. Esse é um dos problemas frequentemente
apontados nos estudos de caso: conselhos fragilizados que não
conseguem se legitimar como instâncias de participação, que
acabam sendo renegados à função de legitimadores das decisões de
órgãos executivos.

Contudo esses espaços conquistados são importantes para a ampliação da


democracia, principalmente por ter atraído novos protagonistas nas discussões das
políticas públicas, tomando assento nos conselhos e participando de conferências
e audiências públicas, contemplando assim a pluralidade da sociedade brasileira.
Porém a participação da sociedade nesses espaços tem-se concentrado basicamente
em representantes da sociedade civil organizada e não aos usuários, que são os
verdadeiros destinatários das políticas públicas. Muitas vezes, essas representações
colocam os interesses de seus grupos, igrejas, entidades e partidos políticos acima
das discussões sobre as políticas públicas. Por outro lado, muitos representantes do
poder público são pouco representativos, possuem poucas informações e têm pouco
poder de se manifestar em nome do órgão que representa.
Outro desafio que grande parte dos conselhos enfrenta é o baixo nível de
informação e transparência do poder público, dificultando a atuação qualitativa dos
seus membros.
A partir da Constituição de 1988, inaugura-se uma nova concepção social
e jurídica sobre criança e adolescente, denominada Doutrina da Proteção Integral e,
dessa forma, foi consagrando o princípio da prioridade absoluta no atendimento de
seus direitos. Nesse contexto, os Conselhos de Direitos da Criança e Adolescente
possuem uma importância especial no desempenho de sua dupla finalidade: a
deliberação na elaboração das políticas que assegurem o atendimento dos direitos
das crianças e dos adolescentes; e o controle na execução dessas políticas. Assim,
para todo projeto de governo que vise ao atendimento dos direitos da criança e do
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adolescente, a ser executado com recursos públicos, torna-se imprescindível sua
aprovação pelo Conselho. Não cabe ao Conselho executar essas políticas e sim
controlar sua execução pelo poder executivo.

NOVO MARCO REGULATÓRIO DAS ORGANIZAÇÕES DA


SOCIEDADE CIVIL

A Democracia precisa ser financiada pelo Estado. Se quisermos manter e


ampliar o Estado Democrático de Direito com a participação efetiva da sociedade
nos destinos da Nação, dos Estados e Municípios, faz-se necessário o financiamento
da organização da sociedade civil e dos mecanismos, espaços e instrumentos de
participação direta do cidadão. O Estado mantém com um custo alto a democracia
representativa e tem investido pouco na democracia direta e na politização da
sociedade.
É com essa finalidade que as Organizações da Sociedade Civil (OSCs) vêm
há trinta anos lutando por uma lei específica que regulamente o repasse de recursos
públicos para elas. Essa luta resultou na aprovação e sanção da Lei nº 13.019/2014,
publicada no Diário Oficial da União no dia 1º de agosto de 2014, que institui normas
gerais para regular as parcerias voluntárias firmadas pela administração pública com
organizações da sociedade civil de projetos de interesse público. Ela veio aperfeiçoar
o ambiente jurídico e institucional relacionado às OSCs e tornar mais justas as suas
relações de parceria com o Estado.
Com a aprovação dessa lei, há um reconhecimento do Estado brasileiro, por
meio do direito ao acesso a recursos públicos, da importância das nossas organizações
da sociedade civil na construção da cidadania e na garantia da democracia, bem
como o reconhecimento da capacidade de executar políticas públicas.
Vejamos o que diz o art. 5º:
O regime jurídico de que trata esta Lei tem como fundamentos a
gestão pública democrática, a participação social, o fortalecimento da
sociedade civil e a transparência na aplicação dos recursos públicos,
devendo obedecer aos princípios da legalidade, da legitimidade, da
impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da economicidade, da
eficiência e da eficácia, além dos demais princípios constitucionais
aplicáveis e dos relacionados a seguir:
I - o reconhecimento da participação social como direito do cidadão;
II - a solidariedade, a cooperação e o respeito à diversidade para a
construção de valores de cidadania e de inclusão social e produtiva;
III - a promoção do desenvolvimento local, regional e nacional,
inclusivo e sustentável;
IV - o direito à informação, à transparência e ao controle social das
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ações públicas;
V - a integração e a transversalidade dos procedimentos, mecanismos
e instâncias de participação social;
VI - a valorização da diversidade cultural e da educação para a
cidadania ativa;
VII - a promoção e a defesa dos direitos humanos;
VIII - a preservação, a conservação e a proteção dos recursos hídricos
e do meio ambiente;
IX - a valorização dos direitos dos povos indígenas e das comunidades
tradicionais;
X - a preservação e a valorização do patrimônio cultural brasileiro, em
suas dimensões material e imaterial.

Com o regime de Convênio até então utilizado para repasse de recursos


públicos, as OSCs eram tratadas como se fossem Estados ou Municípios, apesar de
possuírem a natureza jurídica de direito privado, principalmente quando se tratava do
pagamento de pessoal para desenvolver os projetos. Outro problema era a ausência
de regras claras, em que muitas vezes os órgãos públicos firmavam os convênios
diretamente com organizações, sem passar por um processo público de seleção.
Agora, os órgãos governamentais são obrigados a abrirem chamamento público, e
as organizações e seus projetos precisam se inscrever para serem selecionados.
Com essas novas regras, evidenciam-se a transparência e a isonomia no processo de
seleção e no acesso aos recursos públicos, pondo fim a uma das principais polêmicas
quanto à forma de escolha das OCSs pelo poder público.
É importante salientar que essa lei se aplica aos três entes federativos: União, Estados
e Municípios. As organizações da sociedade civil que receberão tais transferências
serão selecionadas por meio de um procedimento denominado chamamento público
e, após escolhida, assinarão um termo de colaboração ou um termo de fomento com
a administração pública. O art. 2º, XII da referida Lei, especifica o que é chamamento
público:
Procedimento destinado a selecionar organização da sociedade
civil para firmar parceria por meio de termo de colaboração ou de
fomento, no qual se garanta a observância dos princípios da isonomia,
da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade,
da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao
instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são
correlatos.

Qual é a diferença entre Termo de Colaboração e Termo de Fomento? No


Termo de Colaboração, o Plano de Trabalho é proposto pelo poder público e a OSC
irá colaborar com a finalidade de interesse e relevância pública que a administração
pública propôs. Já no Termo de fomento, o Plano de Trabalho é proposto pela OSC e
a gestão pública irá fomentar a finalidade de interesse e relevância públicos proposta
por ela. As OSCs que poderão celebrar o Termo de Fomento e o Termo de Colaboração
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são as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos.
Essa Lei veio implementar mecanismos de combate à malversação de
recursos públicos pelos agentes do poder público ou mesmo por agentes sociais.
Para dar maior transparência e possibilitar o exercício do controle social e maior
clareza acerca da aplicação dos recursos públicos em parceria com OSCs, prevê-se
que todas as etapas da parceria, até a prestação de contas, sejam registradas em uma
plataforma eletrônica. Atualmente, no governo federal, essa plataforma é o Sistema
de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse (SICONV), criado pelo Ministério
do Planejamento, Orçamento e Gestão, que vem sendo reformulado para atender às
necessidades do novo regime jurídico de repasse de recursos financeiros para as
OSCs. Os estados e municípios poderão criar seus próprios sistemas de controle e
acompanhamento ou aderir ao SICONV. As OSCs também precisam rever, se for o
caso, seus estatutos e procedimentos para adequar a essa legislação, conforme o art.
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Para poder celebrar as parcerias previstas nesta Lei, as organizações
da sociedade civil deverão ser regidas por estatutos cujas normas
disponham, expressamente, sobre:
I - objetivos voltados à promoção de atividades e finalidades de
relevância pública e social;
II - a constituição de conselho fiscal ou órgão equivalente, dotado de
atribuição para opinar sobre os relatórios de desempenho financeiro e
contábil e sobre as operações patrimoniais realizadas;
III - a previsão de que, em caso de dissolução da entidade, o respectivo
patrimônio líquido seja transferido a outra pessoa jurídica de igual
natureza que preencha os requisitos desta Lei e cujo objeto social
seja, preferencialmente, o mesmo da entidade extinta;
IV - normas de prestação de contas sociais a serem observadas pela
entidade, que determinarão, no mínimo:
a) a observância dos princípios fundamentais de contabilidade e das
Normas Brasileiras de Contabilidade;
b) que se dê publicidade, por qualquer meio eficaz, no encerramento
do exercício fiscal, ao relatório de atividades e demonstrações
financeiras da entidade, incluídas as certidões negativas de débitos
com a Previdência Social e com o Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço - FGTS, colocando-os à disposição para exame de qualquer
cidadão.

Portanto, esse novo marco regulatório, ao entrar em vigor, irá fortalecer a


atuação das entidades organizadas da sociedade civil para uma atuação mais efetiva
no controle social e na construção da cidadania e da democracia. Cabe às OSCs
conhecerem a Lei, se adequarem a ela e planejarem seus projetos institucionais e
sociais.

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CONCLUSÃO

Pelo que vimos neste caderno, os conselhos de políticas públicas, quando


empoderados e capacitados técnica e politicamente, possuem condições para
contribuir na construção da democracia e de políticas que efetivamente garantam
os direitos humanos. Essa contribuição se dá pela formulação de políticas públicas e
pelo exercício do controle social por meio do seu monitoramento e avaliação dessas
políticas.
O Brasil possui um amplo arranjo institucional que possibilita a participação
social na deliberação, na execução, no monitoramento e na avaliação das políticas
públicas. Esses espaços de participação direta do cidadão na gestão pública precisam
ser continuamente avaliados, potencializados e ampliados para que concretamente
cumpram seu papel de controle social e não fiquem apenas a reboque do poder
público, endossando e fortalecendo somente os interesses dos grupos hegemônicos
que estão no poder, no governo.
Esperamos que este caderno tenha contribuído para a capacitação dos
Conselhos de Direitos da Criança e Adolescente e dos Conselhos Tutelares no sentido
de qualificar sua atuação, ampliando, assim, a democracia participativa, que permite
à sociedade demandar o Estado suas reais necessidades em relação à garantia dos
seus direitos, estabelecidos pelo Estado Democrático de Direito.

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