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2017

UFCD EVOLUÇÃO E PERSPETIVAS DA


3242 DINÂMICA FAMILIAR

COMPETIR - Formação e Serviços S.A.


Índice

Introdução ................................................................................................... 7

Âmbito do manual ..................................................................................... 7


Objetivos .................................................................................................. 7
Conteúdos programáticos .......................................................................... 7
Carga horária ............................................................................................ 7
1.História da dinâmica familiar ...................................................................... 8

2.Cultura em transformação ........................................................................ 14

3.Novas formas de família ........................................................................... 21

3.1.Casal, casamento e união de facto ..................................................... 24


3.2.Monoparentalidade ............................................................................ 28
3.3.Famílias de acolhimento..................................................................... 31
3.4.Adopção e parentalidade ................................................................... 34
4.Envolvimento parental na educação de crianças com necessidades educativas

especiais (nee) ........................................................................................... 37

Bibliografia ................................................................................................. 42
Introdução

Âmbito do manual

O presente manual foi concebido como instrumento de apoio à unidade de


formação de curta duração nº 3242 – Evolução e perspetivas da dinâmica
familiar, de acordo com o Catálogo Nacional de Qualificações.

Objetivos

Reconhecer a evolução histórica da dinâmica familiar, as novas formas


de família e o envolvimento parental na educação de crianças com
necessidades educativas especiais

Conteúdos programáticos

História da dinâmica familiar


Cultura em transformação
Novas formas de família
o Casal, casamento e união de facto
o Monoparentalidade
o Famílias de acolhimento
o Adoção e parentalidade
Envolvimento parental na educação de crianças com necessidades
educativas especiais (nee)

Carga horária

25 horas
1.História da dinâmica familiar

A família é um sistema social que tem evoluído de forma progressiva ao longo


dos tempos. Não existe uma definição clara e consensual de família. A família
possui uma diversidade de representações, que a torna ambígua, imprecisa e,
mesmo contraditória e com paradoxos no tempo e no espaço.

As definições de família variam de acordo com o paradigma da respetiva área:


Legal, que engloba as relações estabelecidas por laços de sangue,
adoção, tutela ou por casamento;
Biológica, englobando as redes biológicas entre as pessoas;
Sociológica, envolvendo grupos de pessoas que vivem juntas;
Psicológica, cuja definição engloba grupos de pessoas com fortes laços
emocionais

Família é um sistema vivo, aberto, composto por vários elementos com laços
entre si, no qual o todo é mais que a soma de todas as partes e, onde reina
entre os elementos constituintes um sentimento de pertença.

Cada família é um sistema mas também é parte de sistemas mais vastos, nos
quais se integra e, com os quais evolui (a comunidade e a sociedade). Dentro
de cada sistema familiar existem subsistemas mais pequenos que formam o
todo.

Estes subsistemas estão relacionados com as interações existentes entre os


indivíduos, os papéis que desempenham, os estatutos ocupados, as suas
finalidades e, os objetivos e as normas transacionais que se vão gradualmente
construindo.

Numa família podem distinguir-se quatro subsistemas:

O subsistema individual, composto pelo nível mais básico, o indivíduo,


que para além dos papéis que desempenha no sistema familiar, ocupa
noutros sistemas, funções e estatutos que vão interagir com o seu
desenvolvimento individual.

O subsistema parental, é constituído normalmente pelos pais que


possuem funções executivas, estando as funções de proteção e
educação das gerações mais jovens a seu cargo. Por vezes este
subsistema pode incluir uma avó/avô, um tio/tia ou mesmo um padrinho.
Os pais podem não integrar esta estrutura.

O subsistema conjugal, que engloba o casal, no qual a


complementaridade e a adaptação recíproca são aspetos importantes do
seu funcionamento. As principais funções deste subsistema são o
desenvolvimento de limites e fronteiras que protejam o núcleo familiar
da intrusão por outros elementos, de modo a proporcionar a satisfação
das suas necessidades psicológicas.

O subsistema fraternal, composto pelos irmãos e representa


principalmente um meio propício de socialização e de experimentação de
papéis em relação ao mundo extrafamiliar. É neste subsistema que as
crianças expandem as suas capacidades relativamente aos seus pares,
experienciando o apoio mútuo, a competição, o conflito e a negociação.

A forma como estes subsistemas se organizam e, o tipo de relações que


desenvolvem entre eles, corresponde à estrutura da família, ou seja, as funções
que ocupam e os papéis que desempenham, traduzindo as interações no seio
da família.

A família deve ser compreendida somente dessa forma holística, sob a pena de
se realizar uma avaliação desvirtuada e sem sentido.

Central na vida de todos os indivíduos, a família tem merecido a atenção das


ciências sociais que procuram compreender as transformações por que tem
passado ao longo da história.

Com efeito, a família tem sofrido alterações profundas, sobretudo nas décadas
mais recentes e este processo acelerado de mudanças familiares assentam na
sua relação com a sociedade, tendo impacto nas relações que ocorrem no seio
familiar, nos papéis e nas funções dos seus membros.

Existem sociedades nas quais este conceito não tem aplicabilidade, pois a
estrutura da organização das relações entre as pessoas é diferente, o que não
significa inexistência de laços e regras familiares, traduz sim, normas diferentes
de organização das relações homem – mulher, crianças – adultos.

No século XVIII, no ocidente europeu, no seio da burguesia urbana surge uma


nova maneira de ver a criança, no seio da família que também tem vindo a
sofrer transformações em torno de duas ideias centrais: amor e privacidade.

Quando comparada com a família tradicional do Antigo Regime, a família


moderna é caracterizada pela afetividade apresentando-se mais fechada numa
esfera privada, rompendo os laços que a prendiam á vizinhança, à rede de
parentesco e á Igreja.

A família conjugal tornou-se no modelo da estrutura familiar na grande maioria


das sociedades industrializadas, passando a ser um espaço restrito, composto
por pais e filhos, autonomizando-se da família de origem.

Surge então um novo sentimento da infância, numa sociedade onde se


começam a impor e valorizar novos valores sociais, onde se começa a aprender
a controlar a fecundidade e onde, devido á melhoria das condições de higiene e
saúde começam a baixar as taxas de mortalidade infantil. A criança passa a ser
vista como um ser único e vulnerável, merecedora de carinho, respeito e
proteção.

Surge também, para ela, um novo lugar de socialização: a escola, onde


juntamente com as outras crianças, além de se instruírem, aprendem
competências sociais e morais que lhes permitirá no futuro integrar o mundo
dos adultos.
Historicamente, esta proposta rompe com modos e costumes do modelo de
família patriarcal que caracterizava as sociedades antigas. A oposição com o
papel e o estatuto da criança nas sociedades não industriais é evidente, ao
serem encaradas como “adultos em miniatura” eram postas a trabalhar junto
dos mais velhos na agricultura e nas tarefas domésticas.

Este facto, frequente na época, não constituía uma situação de graves


consequências afetivas. A família não era, neste período, um lugar de
afetividade mas sim um espaço de entreajuda que tinha como fim a
sobrevivência.

Desta forma, só muito recentemente se adquiriu uma conceção de infância


como esfera autónoma da vida social, conceção que não existia, por exemplo,
na Idade Média.

Pode-se afirmar que só a partir do século XIX as crianças se assumem e são


representadas por uma identidade própria e de modos de vida distintos dos
adultos, mais adaptados às suas próprias necessidades, começando a
constituir-se como um grupo social, ou seja, o espaço social da infância é um
espaço construído – infância como construção social – nas suas várias
dimensões.

Até aos anos cinquenta/sessenta, a ideia de família ocidental baseava-se no


conceito parsoniano, que a reconhecia como um espaço de estabilização
emocional dos adultos e de socialização das crianças, isto é, transmissão dos
valores culturais e sociais da sociedade em que nasceram.

Na convivência com o pai e a mãe a criança aprende como se deve comportar,


o que lhe é permitido e proibido, bem como os papéis sociais que cabem aos
diferentes elementos que constituem a família. Não sendo única a família é, na
nossa sociedade, a primeira e mais forte instituição com carácter de
socialização, em que a aprendizagem se realiza através da própria experiência
da vida familiar.

Os papéis sociais estavam bem demarcados, os homens trabalhavam fora de


casa e asseguravam o sustento das famílias, às mulheres competia o trabalho
doméstico e a socialização dos novos membros. Todos os elementos estavam
subordinados ao chefe de família, esta autoridade não era apenas económica
mas também moral.

A década de sessenta foi um marco de viragem na história da família das


sociedades ocidentais. Num mundo em que as mulheres ocupavam postos de
trabalho ao lado dos homens, já não era justificável a supremacia dos mesmos
no interior do lar.
Nesta época as mulheres reivindicaram o reconhecimento de direitos iguais aos
dos homens em todos os planos da vida social, impondo o reconhecimento da
partilha das tarefas familiares, uma vez que ambos exerciam profissões no
exterior.

Atualmente, vivemos um período de grande mudança de valores e de


organização social, decorrentes de uma série de fatores, como por exemplo o
aumento da longevidade, a inversão da pirâmide demográfica, a emergência de
novos valores e comportamentos, a dissociação entre casamento e iniciação
sexual e a exigência do reconhecimento dos casamentos homossexuais de que
já falamos.

A família de hoje já não traduz a construção mental que faz parte de cada um
de nós, pai, mãe e filhos. Cada vez mais encontramos famílias “normais”, à luz
dos novos paradigmas, em que os membros nem sempre partilham a mesma
residência, nem sempre os descendentes são filhos dos adultos da família e
nem sempre os adultos são de sexos diferentes.

A família é uma rede complexa de emoções e relações que não são passíveis de
ser pensadas como instrumentos criados para o estudo dos indivíduos isolados.

Ainda que se tenham assumido novos paradigmas, referentes às novas


estruturas de família e à igualdade de papéis na estruturação das suas
atividades para todos os seus membros, é na mulher que continua a recair a
maior parte das funções alusivas à organização interna da vida familiar; os
trabalhos domésticos, os cuidados com as crianças e com as pessoas
dependentes.

Estas considerações, a diversidade de modelos familiares, ao longo dos tempos


e nas diferentes culturas, torna difícil atingirmos um consenso de definição
única de família, mesmo que, intuitivamente, todos tenham em mente uma
conceção e até uma atitude básica em relação a ela.

Segundo o Instituto Nacional de Estatística a família é: “O conjunto de


indivíduos que residem no mesmo alojamento e que têm relações de
parentesco (de direito ou de facto) entre si, podendo ocupar a totalidade ou
parte do alojamento.

Considera-se também como família clássica qualquer pessoa independente que


ocupa uma parte ou a totalidade de uma unidade de alojamento. Os
empregados domésticos residentes no alojamento onde prestam serviço são
integrados na respetiva família”.

Em suma, a aproximação ao conceito fica distante daquela família como


“unidade universal”, é assim um termo com limites, muitas definições, uns
privilegiam alguns elementos, outros privilegiam outros, estabelecem-se por
vezes algumas clivagens entre os que pertencem e os que não pertencem.

No entanto, é claro que a família procura estabilizar e perpetuar aspetos chave


nos números e tipos de família. O conceito de família é relativo, não absoluto,
qualquer definição é sempre incompleta e condicionada.
2.Cultura em transformação
A família vem considerada como sendo um “grupo social no qual os membros
coabitam unidos por uma complexidade muito ampla de relações interpessoais,
com uma residência comum, colaboração económica e no âmbito deste grupo
existe a função da reprodução”.

Deste modo, e segundo esta visão, a família é considerada como sendo o


primeiro grupo humano organizado e como unidade-base da sociedade.

Daí a importância que no passado e no presente se tem dado à família e às


mudanças que a têm caracterizado na sua estrutura, nas relações dentro e fora
dela, com influências recíprocas na mudança encontrar-se explicações para as
novas conceções do grupo familiar, atribuindo-as às mudanças sociais.

Evidentemente que a evolução e a mudança que caracterizaram de modo


significativo o mundo atual não exclui a família.

Embora considerada uma das instituições mais persistentes no tempo, a


mudança social reflete-se amplamente na família, arrastando-a desde os
processos da industrialização e urbanização para novas realidades, às quais tem
procurado adaptar-se.

Porém, e dada a visibilidade que a família assume na sociedade, também esta


procura ajustar as instituições às exigências e necessidades da família.

Para se entender esta aceção, da natureza e da dinâmica da mudança, convirá


singularizar algumas características mais evidentes do fenómeno e que são: os
níveis da mudança, o ritmo e a grandeza ou extensão da mudança.

Os níveis da mudança sugerem-nos que façamos referência às componentes da


vida social. Estas tornam-se evidentes no aspeto relacional, a nível bilateral ou
multilateral – relação entre dois indivíduos ou grupos –, até às relações entre as
sociedades globais.

No aspeto socioeconómico dá-se a passagem da evolução dos processos


produtivos tradicionais ou clássicos, aos novos e dependentes do
desenvolvimento tecnológico atual.

No aspeto sociocultural temos a presença de novos valores relacionados com os


processos culturais da inculturação, aculturação, e socialização. De referir ainda
uma nova conceção da vida, da organização social e das organizações em
geral, uma nova visão da comunicação social e um crescimento dos mesmos
meios.
Outras manifestações no aspeto cultural mas de menos visibilidade são: o
tempo livre e o uso respetivo, todas as formas de evolução ou ocupação
diferenciada dos tempos, tendo em conta as diferentes culturas e sociedades.

Quanto ao ritmo da mudança, salienta-se que as manifestações das mudanças


apontadas, além da variedade dos seus aspetos, referem-se à velocidade com
que acontecem. O ritmo obriga a adaptações rápidas e contínuas, tornando- -se
irreversível e por vezes incalculável, advertindo os mais distraídos para a
abertura à mudança.

A família tem-se afirmado como uma instituição universal sendo, nos nossos
dias, um claro reflexo das sociedades ocidentais contemporâneas possuindo
novas configurações e novos papéis. Se há a instituição que se tem adaptado
às diferentes formas de viver em sociedade, demonstrando a plasticidade e
flexibilidade das suas formas de organização, ela é certamente a família

Alguns dos principais fundamentos teóricos associados à evolução e à mudança


conduziram a novas conceções de família, novas dinâmicas, novos valores,
diferentes tipos com identidade própria, construindo uma história de vida que
não se pode replicar. As transformações levaram a alterações na família que
deixou de ser um modelo tradicional prevalente, aparecendo novas formas de
organização familiar tornando-se um fenómeno de carácter global e complexo.

Novos conceitos de família, novas composições e funções, variação nas


relações, estabilidade, diferente organização, a saída da mulher de casa para
trabalhar fora e ter uma atividade económica, mesmo não sendo uma
alternativa ao trabalho de casa, ou participar noutras ações sociais e políticas,
foram consequências herdadas da mudança.

Evidentemente, que a evolução e a mudança que caracterizam de modo


significativo o mundo atual não excluem a família. Embora considerada uma
das instituições mais persistentes no tempo, a mudança social reflete-se
amplamente na instituição familiar, arrastando-a desde os processos da
industrialização e urbanização para novas realidades às quais tem procurado
adaptar-se.

Esquematizando esta evolução que conduziu à mudança vemos como se


alteraram as conceções de família, as dinâmicas e os valores (figura):
O ciclo vital da família inicia-se com a formação do casal, ou seja constrói-se a
partir do namoro, um período composto por magia, de planos futuros, mas
também tem por característica ser um tempo curto. O novo Sistema aparece
quando há o casamento, dando lugar a uma nova família, ou seja ao
subsistema conjugal.

Tornar-se um casal, ou seja, o casamento é uma das tarefas mais difíceis e


complexas do ciclo de vida familiar. Quando duas pessoas resolvem casar, não
são apenas elas que casam, existe também a união de duas famílias. Podemos
dizer que é a união de dois sistemas imensamente complexos.

Cada família tem costumes próprios, valores e maneiras de viver a vida


diferentes se não existir tolerância entre o casal é muito provável a existência
de conflitos dentro do casamento.

Aquilo que se pensa, o que se espera e o que se vai praticando no casamento


dependem de dimensões contextuais — recursos, tempo histórico, momento do
ciclo de vida, culturas — e de dimensões existenciais e identitárias.

A própria organização da vida conjugal está condicionada pela divisão social e


sexual do trabalho no plano da sociedade.

Nas sociedades desenvolvidas do mundo ocidental o estádio adulto atinge-se


cada vez mais tarde devido ao prolongamento da formação necessária para o
desempenho das tarefas profissionais.

Durante a sua vida profissional, o adulto vive estados de permanente


questionamento. Os momentos de questionamento não são momentos de
exceção na vida adulta; pelo contrário, situam-se constantemente no centro
quotidiano da vida no trabalho.

Assim, são apresentados três grandes períodos durante a vida profissional:

1) O primeiro é o período de entrada e exploração no mundo do


trabalho, onde o indivíduo se dá conta da grande distância existente
entre as aprendizagens escolares e as que são requeridas para a prática
profissional (20-35 anos);

2) O segundo período é caracterizado pelo processo reflexivo do


indivíduo acerca do seu percurso profissional ajudando-o a definir o seu
próprio caminho pessoal (35-50 anos);

3) No terceiro período o adulto procura criar as condições para uma


retirada proveitosa do mundo trabalho.

Ao longo destes três períodos, o adulto vai atravessando nove etapas que se
alternam segundo um ciclo de questionamento e estabilização: a vida adulta é,
pois, caracterizada por um constante dinamismo.

Constituem-se famílias recompostas através de segundos casamentos, ou


através de novas relações que envolvem filhos de relações anteriores. As
pessoas optam cada vez mais por viver em coabitação antes do casamento, ou
em alternativa ao casamento.

Sendo o casamento o primeiro momento que marca a constituição de uma nova


família, o segundo momento do ciclo de vida da família é quando a família tem
filhos, ou seja quando nasce o primeiro filho. Nesta etapa surgem dois
subsistemas (parental e filial), assumem-se novas funções, tarefas e uma
reorganização relacional.

A família com filhos na escola, é a terceira etapa do ciclo vital familiar. Existe
um encontro de dois sistemas (família e escola). A entrada dos filhos para
escola constitui para a família “o primeiro grande teste ao cumprimento da sua
função externa, e através dela, sua função interna.”

A quarta etapa do ciclo vital surge quando a família tem filhos adolescentes,
sendo a etapa mais difícil e longa. No desafio da gestão da relação entre pais e
filhos, os pais devem adquirir e manter funções executivas, não esquecendo
que o período da adolescência é conturbado, caracterizado por mudanças e
dúvidas. Nesta fase assume lugar de destaque o grupo de pares, decorrendo
frequentemente conflitos geracionais.
A família com filhos adultos constitui a última etapa do ciclo vital familiar. Esta
fase é cheia de mudanças, de movimento familiar, caracteriza-se por saídas e
por entradas e novas relações e novos papéis.

É a partir de 1970, que em Portugal, se começam a registar alterações


profundas na realidade familiar. A descida da taxa de nupcialidade, o aumento
dos divórcios, a subida dos casamentos pelo registo civil, a diminuição da taxa
de natalidade, a presença das mulheres no mercado de trabalho e a subida da
escolaridade feminina foram as mudanças mais evidente.

As práticas de controlo de natalidade generalizam-se e com elas novas formas


de viver o casamento e o lugar dos filhos.

A sociedade portuguesa está presente um duplo movimento que se pode


designar por familialismo renovado, caracterizado pelo maior nível de
nupcialidade, rejuvenescimento da idade média do casamento, menos celibato
definitivo, menos crianças nascidas fora do casamento e em consequência
deste movimento, a redução de mães sozinhas com filhos ilegítimos e o
aumento dos casais com ou sem filhos, sobretudo nas camadas mais pobres da
população.

Apesar da falada ‘crise da família’, a verdade é que a maioria dos indivíduos


considera a família um pilar importante na sua vida, sendo cada vez mais
valorizada.

Reforçando esta ideia sempre, sempre que em inquéritos sobre valores sociais
são confrontados os portugueses com questões relacionadas com a importância
da vida familiar ou casamento os resultados revelam que em Portugal a família
e o casamento são muito valorizados, acentuando essa valorização na lógica
dos novos padrões: a perspetiva simétrica em que homens e mulheres devem
trabalhar fora de casa e partilhar as tarefas domésticas e os cuidados com os
filhos.

Não se pode negar que a mais pequena mudança na estrutura da família ou na


sua forma de organização traz enormes consequências para a forma como a
criança é encarada e vivida pela família.

Desta forma, outro aspeto importante na realidade familiar é o lugar e a função


que os filhos representam na família. Hoje existe a tendência dos casais terem
filhos em menor número, de forma planeada e para satisfazerem as
expectativas afetivas.

A constatação dos afetos, a desvalorização de algumas funções de cariz


instrumental e a aproximação de cenários tanto dos aspetos afetivos como de
uniformização de expectativas são questões importantes para justificar a
existência dos filhos.
As mudanças revelam-se também a nível dos valores e dos comportamentos e
se, para muitos a família funciona como um lugar de bem-estar, por outro tem
cada vez mais visibilidade o pior lado das relações familiares.

Situações como a violência psicológica e sexual sobre mulheres e crianças


parecem estar associadas à diversidade de transformações sociais e
psicológicas que envolvem diferentes dimensões da sexualidade e da
afetividade nos relacionamentos entre homens e mulheres.
3.Novas formas de família

3.1.Casal, casamento e união de facto


3.2.Monoparentalidade
3.3.Famílias de acolhimento
3.4.Adopção e parentalidade
Foram os fatores económicos, políticos, sociais, culturais, demográficos e
tecnológicos que contribuíram de forma decisiva para as alterações na estrutura
e dinâmica familiar. Estes fatores tiveram incidência na organização, nas
funções, nas relações, na complexidade e globalidade ao longo do
desenvolvimento familiar, refletindo a evolução da época social, vivenciando
estados diferentes.

Ao longo do tempo modificou profundamente a estrutura, a dinâmica da família


na sua organização interna, como por exemplo: diminuição do número médio
de filhos, diminuição da fecundidade, aumento do número de pessoas sós,
diminuição das famílias numerosas, aumento das famílias recompostas, em
virtude do aumento do número de divórcios, aumento das uniões de facto e
uniões livres, e, mais recentemente o aparecimento das famílias homossexuais.

Assistimos na evolução das famílias, e segundo o Fórum Democracia Aberta


(2008), a motivos que como vemos originam novas configurações como se
pode observar na Figura.

Os diferentes tipos de família são entidades dinâmicas com a sua própria


identidade, compostas por membros unidos por laços de sanguinidade, de
afetividade ou interesse e que convivem por um determinado espaço de tempo
durante o qual constroem uma história de vida que é única e irreplicável.

A família nuclear, constituída por dois adultos de sexo diferente e os respetivos


filhos biológicos ou adotados, já não é para muitos o modelo de referência,
embora continue a ser o mais presente.

As uniões de facto, trata-se de uma realidade semelhante ao casamento, no


entanto não implica a existência de qualquer contrato escrito.
As uniões livres, não são muito diferentes das uniões de facto, apenas nestas
nunca está presente a ideia de formar família com contratos.

As famílias recompostas são constituídas por laços conjugais após o divórcio ou


separações. É frequente a existência de filhos de casamentos ou ligações
diferentes ocasionando meios-irmãos.

As famílias monoparentais são compostas pela mãe ou pelo pai e os filhos. São
famílias fruto de divórcio, viuvez ou da própria opção dos progenitores, mães
solteiras, adoção por parte das mulheres ou dos homens sós, recurso a técnicas
de reprodução.

O aumento dos divórcios fez aumentar o número deste tipo de famílias já que
nesta situação os filhos ficam a viver com um dos progenitores. Na maioria das
vezes este progenitor é a mãe, embora já haja alguns homens.

Por fim, as famílias homossexuais constituídas por duas pessoas do mesmo


sexo com ou sem filhos.

Se a evidência, no que concerne a um número crescente de diferentes tipos de


famílias, é incontestável, estas novas formas de estrutura e dinâmica familiar
não se despem, a nosso ver, da sua essência: a família como grupo social em
que os seus membros coabitam ligados por uma ampla complexidade de
relações interpessoais.
3.1.Casal, casamento e união de facto

Existem muitas teorias acerca da escolha do parceiro(a). Algumas destas


teorias centram-se em aspetos da relação social, como a procura de uma
pessoa semelhante que não cause muito stress; as vantagens e desvantagens
que implica uma relação; a igualdade desse intercâmbio e a complementaridade
das necessidades mútuas.

O casal é a união de duas famílias que se interinfluenciam e criam uma rede


complexa de subsistemas. Em qualquer casal existem três partes, eu, tu e nós,
que se possibilitam e facilitam mutuamente.

É o modo como estas três partes funcionam que possibilita a função do Amor.
Deste modo, a identidade do casal implica que a relação seja sentida como
privilegiada, diferenciando-se das relações extrafamiliares de cada um dos
elementos, permitindo, paralelamente, que no sistema intrafamiliar se
diferenciem um do outro.

Logo, “a união conjugal é um processo que envolve duas pessoas, procurando


o equilíbrio entre proximidade e distância; entre desejo de pertença e de
autonomia, equilíbrio esse que exige uma permanente adaptação e mudança
face ao outro.

Para que serve então o casal? “O casal serve para fazer durar o amor”. A união
amorosa assenta num contrato de relação, não escrito, composto de
expectativas e promessas individuais, conscientes e inconscientes; assenta num
“jogo” interativo, unindo os parceiros nas áreas concordantes.

Afinal, o que é o Amor? Muitos poetas procuraram dar a sua resposta, contudo
os cientistas insistem em “objetivar” as qualidades do amor, assim como as
suas características, componentes e vicissitudes, surgindo, assim, as teorias do
amor.

Vários autores referem como componentes essenciais do amor, a paixão, a


intimidade e o compromisso. A paixão é componente que se refere aos
elementos de carácter motivacional, conducentes ao romance e atracão física e
sexual. Inclui atributos cognitivos, emocionais e comportamentais.

A intimidade inclui revelação mútua de informações próprias, escuta recíproca


de confidências, preocupação e cuidados com o outro, conforto com a
proximidade e com o contacto físico, amizade, compreensão mútua, apoio
emocional, bem-estar com o outro, etc..

O compromisso é uma componente de carácter cognitivo que parece estar


fortemente associado quer à permanência e continuidade da relação amorosa
quer à estabilidade e à satisfação na relação. o compromisso envolve a decisão
de que se ama o outro e o desejo de o continuar a amar.

Apesar de todas estas considerações acerca do casamento, alguns


investigadores consideram que o matrimónio enquanto instituição se encontra
em crise. Esta afirmação é baseada numa elevada percentagem de divórcios,
na preferência por “viver juntos” sem a formalidade do casamento e na elevada
incidência de monoparentalidade.

Nas últimas décadas, registou-se uma evolução acentuada das modalidades de


formação do casal e de constituição da família. Enquanto que no passado o
casamento marcava a passagem do tempo de juventude na família de origem
para a entrada na vida adulta, atualmente, os jovens atravessam esta fase de
forma mais progressiva e contínua.

A vida a dois começa, muitas vezes, desde os primeiros encontros que fixam,
desde logo, um quadro de mudanças. É, muitas vezes, a regularidade das
relações sexuais que leva à coabitação.

Afinal, o que é que significa uma união de facto/coabitação? “A União de facto


ou coabitação, é definida como um casal que vive numa relação emocional e
sexual sem estarem casados.

Podemos apontar várias razões para o crescimento da união de facto:


1) Tolerância Social – noutros tempos eram apenas moralmente aceites
as relações sexuais dentro do casamento. Hoje em dia, os valores morais
mudaram, e muitas pessoas olham para as relações sexuais entre um
casal, quer estejam casados ou não, como sendo um comportamento
permissivo;

2) Igualdade feminina – muitas mulheres, hoje em dia, trabalham e são


economicamente independentes e não precisam de depender de um
casamento ou de um marido como suporte financeiro;

3) Impermanência do casamento – devido às altas taxas de divórcio, faz


com que o casamento seja uma alternativa.

Tanto os parceiros que estão casados e os que vivem em união de facto,


parecem demonstrar uma visão idêntica da conceção de casal. O modo de vida
é semelhante, estando um dos cônjuges no plano ativo profissional,
respeitando sempre a individualidade do parceiro.

As maiores diferenças são sentidas, ao nível das uniões de facto, pela recusa do
“peso” da institucionalização e das tarefas domésticas (rituais próprios do
casamento), pondo em causa a valorização íntima quer dos laços conjugais
quer da definição de casal enquanto tal.

Muitos coabitantes acreditam que a união de facto vai fornecer uma habilidade
para escolher um melhor parceiro para o casamento. Contudo, tem sido
constantemente demonstrado que comparando casais que não coabitam, com
casais que coabitam antes do casamento, existe uma taxa muito elevada de
separação do casal e divórcio, naqueles que escolheram coabitar antes do
casamento.

Quais as explicações para a união de facto ser um maior risco para a dissolução
do casamento / divórcio?

Uma das explicações é que os casais que escolhem coabitar em vez de se


casar, percecionam-se a si próprios ou a relação com níveis pobres de felicidade
a longo prazo e compromisso e aqueles que eventualmente se casam, podem
continuar a ter problemas e baixa qualidade nas relações, comparativamente
aos casais que não sentiram necessidade de testar a sua relação.

Ou seja, o facto da coabitação envolver maior autonomia do que


interdependência, pode fazer com que as pessoas se tornem menos
convencionais e diminuam o seu compromisso para manterem uma relação
amorosa de longa duração.

Uma outra explicação é que as pessoas que coabitam têm maior probabilidade
de possuir características que também são fatores de risco para o divórcio
assim como, divórcio dos pais, nível baixo de educação, ser jovem, gravidez,
etc. Os jovens adultos com menor nível de religiosidade e com uma maior
aceitação a nível do divórcio, têm maior probabilidade de entrar numa relação
de união de facto.

Os coabitantes que posteriormente se casam mostram mais felicidade e menos


instabilidade nas suas relações, menos desacordos e estratégias de resolução
de problemas caracterizadas por discussões mais calmas, comparando com os
parceiros que ainda coabitam.

Contudo, os coabitantes que têm intenção de se casar, vivenciam níveis de


satisfação conjugal semelhantes aos coabitantes que já se casaram, podendo
concluir-se que a união formal não implica necessariamente um aumento na
qualidade da relação.
3.2.Monoparentalidade

O conceito de família monoparental em Portugal surge com as estatísticas de


recenseamento, chamando a atenção para a expressão numérica deste tipo de
família.

Tendo em consideração os principais indicadores demográficos da última


década, observamos um número cada vez maior de famílias com apenas um
dos progenitores, o pai ou a mãe, que coabitam sós com os seus filhos.

Logo, designam-se por monoparentais, as famílias onde a geração dos pais está
apenas representada por um único elemento. Esta situação pode acontecer por
vários motivos, ou porque um dos progenitores abandona o lar e o outro não
volta a casar, ou porque a mãe solteira fica com o(s) filho (s), ou adota uma
criança.

A monoparentalidade tradicional explica-se com base em três causas: o


falecimento de um dos cônjuges, o celibato associado à procriação de filhos
fora do casamento e a ausência/emigração do cônjuge. A monoparentalidade
por rutura conjugal, deve-se essencialmente às mudanças de perspetiva face ao
divórcio.

Torna-se pertinente referir que as famílias monoparentais não constituem um


grupo homogéneo, pois pode existir dentro destas uma enorme diversidade de
situações. Por exemplo, há famílias monoparentais que vivem isoladas e outras
que vivem com familiares, mães solteiras muito novas com filhos pequenos e
mães viúvas a viver com filhos adultos, pais inseridos no mercado de trabalho e
outros que nunca trabalharam.
Deste modo, é essencial perceber a quantidade de trajetórias possíveis que
estas pessoas sós podem adotar, bem como a variedade de situações
abrangidas pelo conceito.

A monoparentalidade é em Portugal, uma situação essencialmente vivido no


feminino, podendo ser assim conceptualizada como uma dimensão da
fragilidade social das famílias. Esta situação pode ser explicada por uma razão
principal: após um nascimento fora do casamento (ou de união de facto) e
depois da separação ou um divórcio, são quase sempre as mulheres que ficam
com os filhos à sua guarda.

Existem três aspetos principais que traçam o perfil das famílias monoparentais
em Portugal.

Um aspeto tem a ver com o contexto específico de mudança familiar com que
nos estamos a deparar, pois tendo em conta a evolução dos indicadores
demográficos, podemos aferir que a proporção de mães e pais sós, separados
/divorciados tenderá a aumentar.

Outro aspeto mostra-nos que existe em Portugal três situações distintas de


monoparentalidade:

Pais e mães sós, geralmente viúvos, que vivem com os filhos adultos,
estando pouco inseridos no mercado de trabalho, em especial as
mulheres e cuja fonte de rendimento familiar exclusiva é na maior parte
das vezes uma pensão mensal da Segurança Social;

Mães solteiras com menos de 24 anos, a viverem sozinhas com seus


filhos menores e com elevada participação no mercado de trabalho, e
por fim;

Mães e pais divorciados a viverem com um ou dois filhos, possuindo um


nível de instrução mais elevado e estando mais fortemente inseridos no
mercado de trabalho.

O perfil atual destas famílias próximo do dos países da Europa do Sul, onde
existe por um lado, uma grande proporção do pais e mães sós a viver com os
seus filhos, e por outro lado uma inserção domestica caracterizada pela
proporção elevada destas famílias para viverem com outras pessoas,
nomeadamente com outros familiares formas de apoio familiar prestadas a
estas famílias, para que assim estas possam ser inseridas no mercado de
trabalho.

Assim os problemas apresentados refletem inteiramente a sociedade na qual


vivemos.

Existe hoje uma consciência menos responsável e consciente da vida familiar,


embora exista também uma maior fragilidade nas relações, consequência da
“separação” familiar. Paralelamente, assiste-se a uma menor estigmatização. M

A monoparentalidade é em muitos casos sentida como um fracasso,


provocando um processo de marginalização social que se reflete num
sentimento de inferioridade e de desvalorização pessoal sobretudo pela mulher
que é, maioritariamente a responsável pela família monoparental.

Esta fragilidade emocional não é de forma alguma sentida apenas pela mulher.
A figura paterna encontra-se quase sempre ausente nestas famílias, porque se
demitiu das suas funções devido ao afastamento (voluntário, imposto pela mãe
ou família materna).

No entanto, é importante salientar que a Família Monoparental não é


necessariamente uma família de risco nem tão pouco oriundas desta, estão
sujeitas a fatores de risco. Tudo depende do modo como a rutura é gerida
pelos cônjuges e de outras problemáticas sociais associadas que aumentam o
grau de vulnerabilidade destas famílias, nomeadamente a precariedade
económica.
3.3.Famílias de acolhimento

O acolhimento familiar consiste, especificamente, na atribuição da confiança da


criança ou do jovem a uma pessoa singular ou a uma família, que sejam
consideradas habilitadas para esse efeito.

O acolhimento tem como objetivo a integração da criança ou do jovem em


meio familiar e a prestação de cuidados adequados às suas necessidades e
bem-estar e a educação necessária ao seu desenvolvimento integral.

Refira-se se considera que constituem uma família duas pessoas casadas entre
si ou que vivam uma com a outra há mais de dois anos em união de facto ou
parentes que vivam em comunhão de mesa e habitação.

Com as novas regras publicadas em 2008, o acolhimento familiar passa a ser


profissionalizado, ou seja, as famílias de acolhimento não podem ter relações
de parentesco com as crianças ou jovens que acolhem, ao contrário do que
antes poderia suceder. É inclusive obrigatória a inscrição do responsável pelo
acolhimento familiar na respetiva repartição de finanças como trabalhador
independente. As pessoas ou famílias de acolhimento também não podem ser
candidatas a adoção.

Segundo a tipologia presente na lei de proteção, o acolhimento familiar é uma


medida de colocação temporária que pode ser de curta duração – sempre que o
retorno da criança à sua família biológica seja previsível num prazo não
superior a seis meses - ou de longa duração – nas situações em que se
ultrapassa os seis meses de duração.
O tempo é uma dimensão crucial na análise das intervenções sociais, nestes
casos, os prazos são de especial relevância, evitando que o acolhimento e a
adoção se confundam na mente dos seus intervenientes.

O acolhimento familiar é uma resposta social especialmente útil de apoio à


criança é à família. É assegurado, desta forma, a proteção à criança ou jovem
do risco a que estão sujeitos no seu contexto de origem, proporcionando-lhes
os cuidados necessários e oferendo-lhes uma oportunidade de acesso a modos
relacionais distintos dos vivenciados no seu contexto familiar de origem.

Simultaneamente, é um recurso social e de apoio disponível para as famílias


que estão impedidas de desempenhar as suas funções normais.

Neste cenário de parentalidades cruzadas a proximidade entre as famílias


biológicas e de acolhimento deve ser inclusiva, permitindo que ambos ocupem
o lugar devido e desempenhando os papéis que lhe competem na relação com
os menores: os pais biológicos não se desresponsabilizam pela educação das
crianças, mantendo-se presentes e ativos no seu quotidiano; a família de
acolhimento, por sua vez, obtém um conhecimento mais profundo da origem da
criança, podendo desta forma desempenhar de forma mais adequada a sua
função.

Não obstante o crescimento desta resposta nos últimos anos, trata-se ainda de
um recurso escasso. De acordo com um estudo realizado pelo Ministério da
Justiça e pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade existem alguns fatores
que contribuem para o estado de “semiabandono” que se encontra esta medida
de colocação.

Destacam-se: a fraca promoção da medida, a ausência de critérios de seleção


específicos das pessoas envolvidas ao nível das suas motivações e do seu
equilíbrio emocional, a falta de formação prévia e acompanhamento técnico, a
existência de critérios demasiado restritivos na definição dos níveis etários das
crianças a serem acolhidas, bem como para as famílias acolhedoras.

Existem posições diferentes no que respeita ao acolhimento familiar, os


defensores desta medida afirmam que é fundamental para o desenvolvimento
da criança ou do jovem a sua integração num ambiente familiar que permita o
desenvolvimento da sua autoestima e autonomia, contribuindo assim para a
construção da sua identidade.

As qualidades do acolhimento familiar que lhe confere capacidades para


satisfazer um conjunto diversificado de necessidades dos menores são: oferta
de um espaço familiar; mantém a criança na comunidade; oferece à criança a
oportunidade de desenvolver relações estreitas com a família de acolhimento;
permite à criança continuar vinculada e identificada com a família biológica;
inclui a família biológica na proteção da criança; oferece apoio na transição
para a vida adulto; proporciona acompanhamento e apoio na medida de
enquadramento para a criança e para a família de acolhimento.

Por outro lado, o acolhimento familiar, pode defrontar-se com alguns riscos,
entre os quais: a separação do agregado familiar de origem, o risco da
parentalização da relação educativa que se estabelece entre a família de
acolhimento e as crianças ou jovens acolhidos, podendo mesmo chegar à
apropriação em relação ao menor, a conflitualização acrescida da vida da
criança ou jovem, e a rutura da família de acolhimento com as consequentes
colocações sucessivas da criança/jovem.
3.4.Adoção e parentalidade

O parentesco, no seu sentido estrito, é fundado nas relações genealógicas e em


sistemas de descendência e, em sentido lato, engloba também aquelas relações
criadas pelo casamento.

Estes laços não são definidos apenas por relações sociais mas, primariamente,
por uma relação de sangue que define a pertença a uma cadeia de gerações e
as solidariedades e alianças entre pessoas.

A adoção é o “caso clássico e universalmente difundido de uma atribuição


completamente social da consanguinidade e das relações de parentesco,
mesmo nas suas consequências sobre o tabu do incesto. A adoção assenta
numa verdade afetiva e sociológica, diferente da verdade biológica, fundadora
do parentesco, mas que é tão válida como esta.

Os discursos acerca do parentesco possuem uma linguagem muito específica, e


por isso dão a ilusão de se tratar de teoria sociológica quando, na verdade,
podem não passar de abstrações do senso comum e projeções dos nossos
pressupostos culturais. A natureza dos laços de parentesco nas sociedades
contemporâneas está ainda muito ligada à noção de sangue e de “natural”.

Conclui-se, sobretudo, que as relações de parentesco são imprevisíveis, porque


não são reguladas do exterior para o interior e por obedecerem a linhas de
conduta próprias e, logo, impossíveis de controlar. “As relações de parentesco
traçam (...) uma fronteira entre aqueles relativamente aos quais tais obrigações
morais existem e os outros”.
Campo de complexidades e paradoxos, o parentesco está sujeito a esta
avaliação do senso comum que nem sempre tem espelho na realidade. Na
sociedade moderna, o progresso técnico no campo da procriação medicamente
assistida vem alterar completamente as ideias tradicionais acerca de gestação,
nascimento e filiação. Os debates acerca da parentalidade biológica e social
ganham neste terreno uma nova e importante dimensão.

O interesse da sociedade contemporânea pelo biológico é uma obsessão


recente, sendo que o sangue, até há pouco tempo, não legitimava uma relação
filial, era o casamento que tinha esse papel. Os avanços na genética só vieram
reforçar o biologismo, ao introduzir novas ferramentas, como o meio de prova
de paternidade.

Uma das pressões da modernidade implica que ser-se pessoa está, em muito,
relacionado com a capacidade de se reproduzir, e não tentar, perante uma
falha biológica, é considerado ser-se menos pessoa, dadas as opções
tecnológicas disponíveis.

Os decisores institucionais são mais propensos a caracterizar o parentesco


adotivo como inferior ao biológico do que a comunidade em geral. A ausência
de filhos numa família é vista como estigma, que já vem de longe e que vários
estudos demonstram não ter sido alterado.

Os casais sem filhos continuam a ser olhados com desaprovação, seja esta
ausência da criança por escolha (e daí egoísta) ou por questões biológicas (e,
por isso, dignos de pena). A mulher adulta que não concebe ou encontra uma
forma alternativa de maternidade é vista de forma depreciativa por não estar a
cumprir a função normativa da maturidade feminina.

Existem três grandes fatores de estigmatização:

1) As famílias adotivas são consideradas inferiores porque o laço


biológico é assumido como sendo importante para a plena ligação filial;
2) O passado genético obscuro dos adotados é visto com desconfiança,
sendo, assim, estas crianças de segunda classe;

3) Por não estarem ligados por sangue aos seus filhos, os pais adotivos
são considerados pais menos bons.

Outro fator será a existência de fatores de ordem cultural que conduzem a que
as instituições e os técnicos esgotem até à exaustão as soluções legais que
possibilitem a manutenção da ligação da criança à família biológica, mostrando
grande dificuldade em cortar com essas relações.
Estes dados sugerem a existência, entre os técnicos responsáveis, de uma
conceção de família e parentesco assente nos laços de sangue e de uma
“prevalência do biológico”.

Após uma conturbada história legislativa, com avanços e recuos, Portugal


apresenta hoje uma lei de adoção com prazos estreitos para a reaproximação à
família biológica (três meses de manifesto desinteresse), com uma forte
incidência no estabelecimento atempado de Projetos de Vida. A nova lei parece
ter sido um passo em frente na proteção das crianças em perigo.

A lei afirma expressamente que a adoção visa realizar o superior interesse da


criança, algo que já estava subjacente ao espírito do anterior regime jurídico da
adoção, mas cuja consagração expressa, nas normas do código civil, tem um
importante valor simbólico suscetível de fornecer orientações concretas ao
intérprete e de o vincular a uma conceção da adoção, como o instituto centrado
nos interesses da criança e no seu direito a ter uma família.

Também na equiparação da filiação biológica com a filiação afetiva houve uma


evolução, ao centrar a análise dos laços afetivos no ponto de vista da criança e
não no dos pais.
4.Envolvimento parental na educação de crianças
com necessidades educativas especiais (nee)

Na nossa sociedade é frequente os pais investirem muito, quer em termos


materiais quer em termos emocionais, enquanto esperam o nascimento de um
filho. O casal deseja ter um filho saudável, uma criança robusta, que seja a sua
auto imagem e, ao mesmo tempo, que assegura a continuação do nome e a
tradição da família.

A par dos sonhos do casal juntam-se, frequentemente, crenças e receios, pois


uma criança que vai nascer é um ser desconhecido. É evidente que o interior do
sistema familiar vai sofrer alterações e a consciência desse facto lança algumas
dúvidas.

Desde o início da gestação que se colocam questões, do género “Como será o


meu filho?” ou “Será que é perfeito e saudável?”.

O tempo passa e eis que chega o dia tão esperado: a criança sonhada e
idealizada finalmente nasceu! Mas os factos, por vezes, contrariam os sonhos e
os desejos dos pais. O “fantasma” do filho com deficiência torna-se realidade.
Dar à luz um filho com deficiência é um acontecimento inesperado para o qual
a família não está preparada. É um acontecimento na vida dos pais que sempre
ficará marcado e produzirá mudanças no seio familiar. Nesta situação ocorrem
questões, tais como:

“Porque nos aconteceu isto?” ou “Que mal fizemos nós para merecer tal
castigo?”. As esperanças dos pais desfazem-se e o futuro avizinha-se cheio de
receios, privações e incertezas.

O nascimento de uma criança “diferente” coloca os pais diante de um facto que


lhes pode despertar várias reações. Segundo alguns atores, este acontecimento
promove três etapas de adaptação no seio da família, a saber: experimentação
de um período de desorganização emocional, incluindo sentimentos de ira,
culpa, depressão, vergonha e fraca autoestima; repulsa pela criança ou
superproteção e por último, os pais acabam por aprender a aceitar o seu filho
“diferente”.

As reações dos pais à informação de que o seu filho é uma criança com NEE
têm sido comparadas às experiências de perda de alguém amado, por morte ou
separação. Assim, também os pais atravessam um período de luto pela perda
do filho idealizado.

De facto, houve como que a perda de um filho, a morte de um filho desejado e


sonhado, e receberam em seu lugar um outro completamente diferente, para o
qual não estão preparados a aceitar.

A forma de os pais conviverem com os seus sentimentos é através da criação


de mecanismos de defesa: negação (os pais não aceitam que há algo de errado
com os filhos), superproteção (os pais tentam proteger demasiado os filhos) e
projeção (os pais colocam as responsabilidades em técnicos e outros
profissionais). Todavia estes padrões de defesa são tomados sobre grande
tensão e exigem um enorme desgaste de energia.

Alguns atores consideram que não existem apenas atitudes negativas face ao
nascimento de uma criança com deficiência. Muitos pais conseguem ajustar-se
à situação e assumem uma atitude de aceitação. Eles referem que existe um
padrão de reação que passa por vários estádios e culmina na aceitação.

Assim, a adaptação da família à nova situação vai depender da aceitação dos


pais, que podem dar muito amor e respeitar o ritmo de desenvolvimento desse
filho que, na sua evolução, é diferente dos outros.

As famílias com crianças com NEE podem e devem procurar ajuda junto de
profissionais (médicos, psicólogos, educadores e outros técnicos), que devem
proporcionar todo o apoio possível, pois elas necessitam de informação sobre a
deficiência e, sobretudo, que as ajudem a aceitar essas crianças, que lhes
demonstrem solidariedade, para que em nenhum momento se sintam sós,
desamparadas e isoladas.

Os profissionais devem fomentar o vínculo afetivo entre pais e filhos, de modo


a favorecer a harmonia que deve existir entre ambos.

Relativamente à criança “diferente”, é importante sentir-se amada e fazer parte


integrante da família, o que proporcionará equilíbrio e estimulação para o seu
desenvolvimento.

Para as crianças terem uma boa experiência educativa é necessário que os pais
sejam envolvidos no processo educativo. A participação e colaboração dos pais
no processo educacional dos alunos com NEE é um fator primordial para
favorecer o seu desenvolvimento”.

Mas, embora todos estejam de acordo quanto à importância da participação


dos pais é, no entanto, preciso delimitar quais as possibilidades de intervenção
dos pais, quais os seus direitos e quais os aspetos educacionais em que pode
haver uma margem ampla de colaboração.

Esta intervenção dos pais, de acordo com os dados apresentados pelo


Departamento de Educação Especial, vai incidir, essencialmente, em aspetos
como a avaliação, a programação e a planificação.

No que se refere à avaliação, os pais colaboram oferecendo informação


pormenorizada sobre o seu filho através de dados resultantes da avaliação
pessoal; disponibilizando dados provenientes de relatórios clínicos, psicológicos
ou pedagógicos e participando na avaliação com educadores ou professores dos
progressos verificados.

No âmbito da programação e planificação é fundamental a colaboração dos


pais, porque estes podem informar a escola sobre as características do contexto
familiar de modo a que possam ser contempladas no processo educativo.

Assim, os pais colaboram no processo de planeamento e de programação


educativa, participando ativamente nas reuniões para as quais forem
convocados, transmitindo expectativas e dando o seu parecer e sugestões
sobre as competências e estratégias; informando a escola sobre os recursos do
meio em que a criança vive e que podem ser úteis para o seu processo
educativo, participando, quando necessário, numa aproximação entre a escola
e serviços médicos ou outros que tenham interferência na orientação do seu
filho e, ao mesmo tempo, assegurem os cuidados de saúde, segurança, higiene,
socialização, oportunidade de experiências diversificadas e, sobretudo, uma
relação afetiva adequada.
O apoio educacional às crianças com deficiências deve iniciar-se o mais
precocemente possível. Neste âmbito, toda a educação deve começar
precocemente, mesmo a da criança que evolui e progride normalmente.

É extremamente importante iniciar a intervenção precoce desde as primeiras


semanas de vida em relação à criança com problemas de desenvolvimento pois,
de acordo com vários estudos efetuados, conclui-se que as influências
ambientais no comportamento e desenvolvimento da criança nos seus primeiros
anos de vida são muito fortes.

Deste modo, o diagnóstico precoce dos problemas de desenvolvimento, que em


alguns casos é feito logo à nascença, contribui para orientar, adequadamente,
programas educacionais durante esse período. Neste sentido, deve existir uma
articulação urgente e necessária entre os serviços de saúde e da educação em
relação à intervenção precoce.

A família como primeiro agente de educação e de socialização de qualquer


criança, incluindo a portadora de deficiência, desenvolve um papel relevante no
âmbito da intervenção precoce. É, muitas vezes, a família (essencialmente a
mãe devido a uma maior proximidade com o filho), que deteta as «diferenças»
em relação às crianças com necessidades especiais.

Assim, temos de salientar a importância fundamental da educação no âmbito


familiar, especialmente no início do desenvolvimento da criança. É à família que
compete intervir de modo a desenvolver na criança todas as suas capacidades.

A participação dos pais nos programas de intervenção precoce conduz a


resultados favoráveis no desenvolvimento de capacidades na criança. Deste
modo, no que se refere à intervenção precoce, é necessário envolver os pais
ativamente, pois eles poderão ser os primeiros intervenientes na criação de
estímulos e outras condições básicas de aprendizagem.

Para que uma criança, portadora ou não de qualquer deficiência, possa atingir
uma fase de desenvolvimento, ela necessita de ser estimulada. No caso da
criança com deficiência, a estimulação assume um papel ainda mais relevante.
Compete aos pais efetuar essa estimulação, num ambiente adequado, dando
carinho e atenção, de modo a proporcionar um bom desenvolvimento global da
criança.

Contudo, estes pais sentem-se, frequentemente, incapazes de desenvolver,


convenientemente, as suas funções em relação à criança. Assim, é necessário
um apoio de técnicos para acompanhar, com o objetivo de os preparar para
que possam proporcionar o melhor desenvolvimento possível ao seu filho. Esta
preparação deve contemplar um apoio psicoterapêutico.
Nenhuma família está preparada para receber no seu seio uma criança com
deficiências em que o choque, a surpresa humilhante e culpabilizadora, podem
organizar atitudes negativas dos pais, poderão ser reduzidas e transformadas
em atitudes favoráveis ao desenvolvimento da criança, capaz de lhe
proporcionar um envolvimento afetivo e emocional ajustado, que poderá, de
certo modo, minimizar as suas debilidades».

Para que a intervenção dos pais se possa realizar, é preciso que estes sejam,
convenientemente, informados acerca das deficiências dos filhos, o que nem
sempre acontece. Neste âmbito, os mesmos autores, salientam que a
informação fornecida pelos profissionais, que deveria ser clara e precisa, é
inadequada e confusa.

Acrescentam ainda, que muitos desses profissionais carecem de um


conhecimento aprofundado no domínio da deficiência, quer no que se refere ao
diagnóstico e prevenção, quer à sua orientação e intervenção.

Por vezes, os pais tentam proteger os filhos portadores de deficiência, não lhes
permitindo que estes desenvolvam as suas capacidades. No entanto, é da
responsabilidade dos pais, essencialmente nos primeiros anos de vida, estimular
a criança e criar condições que possibilitem que esta desenvolva todas as suas
potencialidades de modo a tornar-se um indivíduo o mais independente e
autónomo possível.

O apoio regular aos pais, nos primeiros anos de vida da criança, poderá ser
realizado sobretudo pelos serviços de saúde. Quando a criança se encontra em
idade escolar, essa função compete ao professor de educação especial, que
assume o papel de mediador entre os pais e os serviços.
Bibliografia

Almeida, Ana Isabel, A família e a intervenção educativa face à criança com


NEE, Dissertação de Mestrado em Ciências da Educação, Escola Superior de
Educação Almeida Garrett, 2012

Dias, “A família numa sociedade em mudança: problemas e influências


recíprocas”, Gestão e Desenvolvimento, 9 (2000), 81-102

Leandro, Maria, Sociologia da Família nas Sociedades Contemporâneas, Ed.


Universidade Aberta, 2001

Oliveira, José, Psicologia da Família, Ed. Universidade Aberta, 2002

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