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Tópicos Especiais em Geotecnia

OBRAS DE TERRA:
Estruturas de Contenção
Ana Cristina Castro Fontenla Sieira

CONTEÚDO

1 EMPUXOS DE TERRA..................................................................................................................... 1

1.1 GENERALIDADES .......................................................................................................................... 1


1.2 DEFINIÇÃO................................................................................................................................... 3
1.3 COEFICIENTE DE EMPUXO NO REPOUSO ........................................................................................ 3
1.3.1. TEORIA DA ELASTICIDADE ..................................................................................................... 4
1.3.2. CORRELAÇÕES EMPÍRICAS ................................................................................................... 5
1.4 ESTADOS DE EQUILÍBRIO LIMITE .................................................................................................... 6
1.5 DEFORMAÇÕES ASSOCIADAS AOS ESTADOS DE EQUILÍBRIO LIMITE ................................................. 9

2 TEORIA DE RANKINE ................................................................................................................... 12

2.1 HIPÓTESES E FORMULAÇÃO GERAL ............................................................................................. 12


2.2 APLICAÇÃO A CASOS EM QUE EXISTEM SOBRECARGAS UNIFORMES ................................................. 15
2.3 APLICAÇÃO A MACIÇOS ESTRATIFICADOS ...................................................................................... 16
2.4 APLICAÇÃO A MACIÇOS COM NÍVEL FREÁTICO ................................................................................ 17
2.5 APLICAÇÃO A MACIÇOS COESIVOS ................................................................................................ 18
2.6 APLICAÇÃO A MACIÇOS COM SUPERFÍCIE INCLINADA ...................................................................... 20
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1 Empuxos de Terra

1.1 Generalidades
Nos problemas de fundações, a interação das estruturas com o solo implica na transmissão de
forças predominantemente verticais. Contudo, são também inúmeros os casos em que as estruturas
interagem com o solo através de forças horizontais. Neste último caso, as interações dividem-se em duas
categorias.
A primeira categoria verifica-se quando determinada estrutura é construída para suportar um maciço
de solo. Neste caso, as forças que o solo exerce sobre as estruturas são de natureza ativa. O solo
“empurra” a estrutura, que reage, tendendo a afastar-se do maciço. Na Figura 1.1 estão apresentadas
algumas obras deste tipo.
Na segunda categoria, ao contrário, é a estrutura que é empurrada contra o solo. A força exercida
pela estrutura sobre o solo é de natureza passiva. Um caso típico deste tipo de interação solo-estrutura é o
de fundações que transmitem ao maciço, forças de elevada componente horizontal, como é o caso de
pontes em arco (Figura 1.2).
Em determinadas obras, a interação solo-estrutura pode englobar simultaneamente as duas
categorias referidas. É o caso da Figura 1.3, onde se representa um muro-cais ancorado. As pressões do
solo suportado imediatamente atrás da cortina são equilibradas pela força Ft de um tirante de aço
amarrado em um ponto perto do topo da cortina e pelas pressões do solo em frente à cortina. O esforço de
tração no tirante tende a deslocar a placa para a esquerda, isto é, empurra a placa contra o solo,
mobilizando pressões de natureza passiva de um lado e pressões de natureza ativa no lado oposto.
O cômputo da resultante e da distribuição das pressões, sejam de natureza ativa, sejam de natureza
passiva, que o solo exerce sobre a estrutura, assim como do estado de deformação associado, é quase
sempre muito difícil. Contudo, a avaliação do valor mínimo (caso ativo) ou máximo (caso passivo) é um
problema que pode ser resolvido de forma satisfatória através das teorias de Rankine e Coulomb.
Nas teorias propostas, admite-se que a resistência ao cisalhamento do solo é integralmente
mobilizada, ou seja, que o maciço encontra-se em um estado de equilíbrio limite. Por isso, as teorias de
Rankine e Coulomb são genericamente designadas por “Teorias dos Estados de Equilíbrio Limite”.

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(a) Muros de gravidade (b) Muro de proteção contra a erosão superficial


Figura 1.1 – Exemplos de obra em que as pressões do solo são de natureza ativa

Figura 1.2 – Exemplos de obra em que as pressões do solo são de natureza passiva

Figura 1.3 – Muro-cais ancorado – caso em que se desenvolvem pressões ativas e passivas.

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1.2 Definição
Entende-se por empuxo de terra a ação produzida por um maciço de solo sobre as obras com ele
em contato.
A determinação do valor do empuxo de terra é fundamental para a análise e o projeto de obras como
muros de arrimo, cortinas de estacas-prancha, construção de subsolos, maciços de solo reforçado,
encontro de pontes, etc. O valor do empuxo de terra, assim como a distribuição de tensões ao longo do
elemento de contenção, depende da interação solo-elemento estrutural durante todas as fases da obra. O
empuxo atuando sobre o elemento estrutural provoca deslocamentos horizontais que, por sua vez, alteram
o valor e a distribuição do empuxo, ao longo das fases construtivas da obra.

1.3 Coeficiente de Empuxo no Repouso


O coeficiente de empuxo lateral no repouso é definido como a relação entre as tensões efetivas
horizontal e vertical, sob condição de deformações horizontais nulas (Bishop, 1958).
'h
ko  (1.1)
' v

onde: ’h = tensão principal horizontal efetiva;


’v = tensão principal vertical efetiva.

Esta expressão é válida somente para a hipótese de semi-espaço infinito horizontal.


A tensão efetiva vertical (’v) depende dos valores da tensão total (v) e da poropressão (u). Esses
valores, em muitos casos, não são conhecidos sem erro apreciável. Admite-se então, que:
1. A tensão vertical é uma tensão principal;
2. A tensão vertical é obtida através do peso das camadas de solo sobrejacentes;
3. A poropressão é conhecida;
4. A tensão horizontal é simétrica em relação ao eixo vertical;
A determinação do coeficiente de empuxo no repouso está relacionada ao problema geral da
determinação das características iniciais de tensões e deformações do solo. Este coeficiente pode ser
determinado a partir da teoria da elasticidade, por correlações empíricas, ensaios de laboratório e ensaios
de campo. No entanto, a sua determinação exata torna-se difícil principalmente por dois fatores: alteração
do estado inicial de tensões e amolgamento, provocados pela introdução do sistema de medidas. Estes
dois fatores também influenciam o comportamento de amostras utilizadas em ensaios de laboratório.
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1.3.1. Teoria da Elasticidade


Considere um elemento de solo a uma profundidade z, em um maciço semi-infinito de superfície livre
horizontal, constituído por um solo homogêneo, isotrópico e elástico (Figura 1.4). Se sobre este ponto, for
aplicada uma tensão vertical (’z) sob a condição de deformações horizontais nulas (x = y = 0), tem-se:
' x 
ko   (1.2)
'z (1   )

onde:  = coeficiente de Poisson;

Esta expressão representa uma condição pouco realista, uma vez que perfis de solo são
normalmente anisotrópicos, não homogêneos e de comportamento não-elástico.
A incerteza do conhecimento prévio das tensões e deformações correspondentes, as quais
permitem obter diretamente ko, e as limitações da teoria da elasticidade, têm contestado a avaliação de ko
através de . O coeficiente de empuxo no repouso é uma característica do material e, principalmente, do
processo de formação do solo.

Dedução da equação (2):

x 
1
E
 
' x (' y  ' z )

y 
1
E
 
' y (' x  ' z )

z 
1
E

'z (' y  ' x )
Considerando a condição de repouso (x = y = 0) e que as tensões horizontais são iguais
(’y = ’x), obtém-se:
1
0 ' x (' x ' z )
E z
   ’z
' x   .' z
 1   ’y
' x    ’x
   ko
' z  1   

Figura 1.4 – Tensões em um elemento de


solo

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1.3.2. Correlações Empíricas


O valor de ko depende de vários parâmetros geotécnicos do solo, dentre os quais podemos citar:
ângulo de atrito (), índice de vazios (e), razão de pré-adensamento (OCR), etc. A partir desta constatação,
diversas correlações empíricas têm sido propostas.
Jaky (1944) apresentou a seguinte correlação para areias normalmente adensadas:
 2   1  sen ' 
k o  1  sen ' .  (1.3)
 3   1  sen ' 

Em geral, esta expressão é substituída pela forma simplificada:


k o  1  sen ' (1.4)

Existe uma explicação física para que o valor de ko seja dependente de ’: as duas propriedades
dependem do atrito entre as partículas. O ângulo de atrito dos solos costuma ser tanto menor quanto mais
argiloso for o solo, confirmando a tendência de ko ser tanto maior quanto mais plástico o solo.
Para argilas pré-adensadas, o atrito entre as partículas age no sentido de impedir o alívio da tensão
horizontal quando as tensões verticais são reduzidas. Em conseqüência, o coeficiente de empuxo no
repouso é tanto maior quanto maior for a razão de pré-adensamento, podendo ser superior a 1,0. Dados de
diversos pesquisadores permitiram a extensão da fórmula de Jaky, para esta situação, que pode ser
apresentada da seguinte forma:
k o  (1  sen ' )(OCR ) sen ' (1.5)

Sendo ’ geralmente próximo de 30º, é comum que o valor de ko seja estimado pela equação:
k o  0,5(OCR ) 0,5 (1.6)

Alpan (1967) concluiu que, para solos pré-adensados, o valor de ko aumenta com o valor de OCR,
resultando a seguinte formulação:
k o (OC)  k o (NC).OCR  (1.7)
onde: ko (OC) = valor de Ko do material pré-adensado;
ko (NC) = valor de ko do material normalmente adensado;
 = constante, em regra entre 0,4 e 0,5.

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1.4 Estados de Equilíbrio Limite


A solução de um problema de previsão do empuxo de terra e de deformação deve considerar as
condições iniciais de tensões, a relação tensão-deformação do solo e as condições de contorno que
descrevem a interação solo-estrutura. A solução deste problema é extremamente complexa, sendo
utilizados, na prática, métodos simplificados.
Se a estrutura de contenção não é capaz de se deformar devido ao empuxo lateral de terra, ela é
considerada uma estrutura rígida. Neste caso, apenas os movimentos de rotação e translação são
permitidos.
No entanto, se a estrutura se deforma devido ao empuxo lateral, a estrutura é dita flexível e a
deformação da estrutura influenciará na magnitude e distribuição do empuxo de terra.
Considere um maciço não coesivo no estado de repouso e com superfície horizontal (Figura 1.5).
Imagine que uma parte do maciço seja eliminada e substituída por uma parede imóvel, indeformável e sem
atrito. Nestas condições, a tensão atuante sobre a parede será horizontal, crescerá com a profundidade z e
valerá:
' ho  k o .' vo  k o ..z (1.8)

onde: ’ho = tensão efetiva horizontal inicial;


’vo = tensão efetiva vertical inicial;
ko = coeficiente de empuxo no repouso;
 = peso específico do solo;
z = profundidade do ponto considerado.

Obs: a equação não considera a presença de água.

Figura 1.5 – Estado de tensões no repouso

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O estado de tensão em qualquer ponto a uma profundidade z pode ser representado pela
circunferência de Mohr de diâmetro AB ilustrada na Figura 1.6.
Suponha agora que a estrutura rígida se afasta progressivamente do solo (Figura 1.7a). Em
conseqüência, o maciço se deforma e aparecem tensões de cisalhamento, conduzindo a uma diminuição
da tensão horizontal, sem alteração da tensão vertical. Para este deslocamento da estrutura, o maciço
sofrerá deformações de tração.

Figura 1.6 – Círculos de Mohr representativos dos estados limites e de repouso

Figura 1.7- Estados ativo e passivo

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Neste caso, as tensões verticais e horizontais continuarão sendo as tensões principais máxima e
mínima, respectivamente. Os círculos de Mohr correspondentes aos sucessivos estados de tensão têm
como ponto comum o ponto A, enquanto o ponto representativo da tensão principal menor se desloca para
a esquerda (Figura 1.6). Este processo tem um limite, que corresponde à situação para a qual o maciço
entra em equilíbrio plástico e, por maiores que sejam os deslocamentos da parede, não é possível reduzir
mais o valor da tensão principal menor (’ha). Neste caso, o solo terá atingido a condição ativa de equilíbrio
plástico.
O coeficiente de empuxo ativo é definido como a razão entre a tensão efetiva horizontal no estado
ativo e a respectiva tensão efetiva vertical, ou seja:
' ha
ka  (1.9)
' v

Se, ao contrário, houver um deslocamento da parede de encontro ao maciço (Figura 7b), se


observará um acréscimo de h, sem alteração de v. O ponto B se deslocará para a direita, mantendo-se
fixo o ponto A (Figura 1.6). Se o movimento prosseguir, a tensão h aumentará até que a razão h/v atinja
o limite superior e consequentemente, a ruptura. Neste caso, o solo terá atingido a condição passiva de
equilíbrio plástico.
Cabe ressaltar, que em dada fase do movimento da parede, a tensão horizontal se iguala à tensão
vertical, instalando-se no maciço um estado de tensões hidrostático ou isotrópico. Nos estágios seguintes,
a tensão principal maior passa a ser horizontal, ou seja, ocorre uma rotação das tensões principais.
Define-se o coeficiente de empuxo passivo, kp, como a razão entre a tensão efetiva horizontal no
estado passivo (’hp) e a correspondente tensão efetiva vertical (’v):
' hp
kp  (1.10)
' v

A Figura 1.6 permite determinar as direções das superfícies de ruptura nos estados de equilíbrio
limite ativo e passivo, ou seja, as direções dos planos onde a resistência ao cisalhamento do solo é
integralmente mobilizada. Em ambos os casos, as superfícies de ruptura fazem um ângulo de 45º'/2
com a direção da tensão principal máxima (que no caso ativo é a tensão vertical e no caso passivo é a
tensão horizontal).
A seguir, serão apresentadas as deduções das expressões de ka e kp, com base nos círculos de
Mohr ilustrados na Figura 1.6.

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Dedução da expressão de ka:


R = raio do círculo de Mohr
' v ' ha ' v k a ' v 1  k a 
R=   ' v
2 2 2
' ha 1 ka
ka  OP  ' v R  ' v
' v 2

R = OP sen '
1 k a 1 k a
' v  ' v sen '
2 2
1  sen '  k a (1  sen ' )

1  sen '
ka 
1  sen '

Dedução da expressão de kp:


' hp ' v k p ' v ' v k p  1
R=   ' v
2 2 2
' hp 1 k p
kp  OP  ' v R  ' v
' v 2

R = OP sen '
kp  1 1 k p
' v  ' v sen '
2 2
(k p  1)  (1  k p ) sen '

k p (1  sen ' )  (1  sen ' )

1  sen '
kp 
1  sen '

1.5 Deformações Associadas aos Estados de Equilíbrio Limite


Na definição dos estados de equilíbrio limite, foi referido o seguinte:
i) A evolução do estado de repouso para o estado limite ativo verifica-se se mantendo a
tensão efetiva vertical (tensão principal maior) constante e diminuindo-se
progressivamente a tensão efetiva horizontal (tensão principal menor);

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ii) A evolução do estado de repouso para o estado limite passivo verifica-se se mantendo a
tensão efetiva vertical constante e aumentando-se progressivamente a tensão efetiva
horizontal.
A Figura 1.8 apresenta as trajetórias de tensões efetivas correspondentes à mobilização dos estados
limites ativo e passivo. Estas trajetórias podem ser obtidas a partir da execução de ensaios de compressão
traixial (com diminuição da tensão média) e ensaios de extensão triaxial (com aumento da tensão média)
em amostras consolidadas sob o estado de tensão efetiva no repouso.

Figura 1.8 – Trajetórias de tensões efetivas associadas aos estados ativo e passivo

Na Figura 1.9, estão apresentados os resultados de dois ensaios sobre amostras de uma areia
compacta em que foram seguidas as duas trajetórias. A partir dos resultados, pode-se observar que:
i) São necessárias deformações muito pequenas, da ordem de 0,5%, para atingir o estado
limite ativo;
ii) Deformações horizontais da ordem de 0,5% são necessárias para mobilizar metade da
resistência passiva;
iii) São necessárias deformações da ordem de 2%, para atingir o estado limite passivo.

Resultados deste tipo são característicos de solos granulares compactos. Em solos fofos, as
deformações correspondentes à mobilização da resistência ao cisalhamento são mais elevadas.

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Figura 1.9 - Resultados de ensaios triaxiais em uma areia compacta sob trajetórias de tensões do tipo ativo
e passivo (Lambe e Whitman, 1969)

De certa forma, é intuitivo concluir que as deformações necessárias para mobilizar o estado ativo
devem ser menores do que as necessárias para mobilizar o estado passivo. No estado ativo, o solo sofre
uma solicitação de tração. No estado passivo, ocorre a compressão do solo. Os solos possuem resistência
à compressão, mas não suportam esforços de tração. Sendo assim, basta um pequeno alívio de tensões
horizontais para que ocorra a ruptura do solo por tração. A Tabela 1.1 apresenta as deformações mínimas
necessárias para a mobilização dos estados plásticos.

Tabela 1.1 – Deformações mínimas para mobilização dos estados plásticos

SOLO ESTADO MOVIMENTO / H (%)  Erro!


Ativo Translação 0,1 Indicador
não
Areia Rotação do pé 0,1 definido.
Passivo Translação 5,0 rotação do pé

Rotação do pé > 10,0


Argila Ativo Translação 0,4 translação
Rotação do pé 0,4

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2 Teoria de Rankine

2.1 Hipóteses e Formulação Geral


O método de Rankine (1857) considera o solo em estado de equilíbrio plástico e baseia-se nas
seguintes hióteses:

1) Solo isotrópico;
2) Solo homogêneo;
3) Superfície de ruptura plana;
4) Superfície do terreno plana;
5) A ruptura ocorre em todos os pontos do maciço simultaneamente;
6) A ruptura ocorre sob o estado plano de deformação;
7) Muro perfeitamente liso (atrito solo-muro:  = 0)

Considere um maciço não coesivo no estado de repouso e com superfície horizontal (Figura 2.1a).
Imagine que uma parte do maciço seja eliminada e substituída por uma parede imóvel, indeformável e sem
atrito. Nestas condições, a tensão atuante sobre a parede será horizontal, crescerá com a profundidade z e
valerá:
’ho = ko ..z (2.1)

Admitindo-se que a parede AB se afaste do terreno, a pressão horizontal ’h diminuirá até atingir um
valor mínimo:
’ha = ka ..z (2.2)

1  sen '  ' 


com: k a   tan 2  45 º   (2.3)
1  sen '  2

Se o deslocamento da parede AB prosseguir, deixará de haver continuidade das deformações e se


produzirá o deslizamento do solo ao longo da linha BC. Como comentado anteriormente, a superfície de

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ruptura forma um ângulo de 45º-’/2 com a direção da tensão principal maior, ou 45º +’/2 com a direção
da tensão principal menor.

(a) ATIVO (b) PASSIVO


Figura 2.1 – Distribuição das tensões ao longo da parede

O valor do empuxo ativo Ea é igual à área do triângulo ABD e pode ser obtido pela expressão:
h
h 2 .k a

E a  k a ..z.dz 
o
2
(2.4)

O ponto de aplicação do empuxo, caso o maciço seja homogêneo estará a uma profundidade de
2/3h.
Admitindo-se agora, que a parede se desloque contra o terrapleno (Figura 2.1b). Para que se
produza o deslizamento, o empuxo deverá ser maior do que o peso do terrapleno. Assim, pode-se supor
que a tensão principal maior seja a horizontal. Neste caso, o coeficiente de empuxo passivo será dado por:
1  sen '  ' 
kp   tan 2  45 º   (2.5)
1  sen '  2

O valor do empuxo ativo Ep é igual a área do triângulo ABD e pode ser obtido pela expressão:
h
h 2 .k p

E p  k p ..z.dz 
o
2
(2.6)

Na Tabela 2.1 indicam-se valores de ka e kp para diferentes valores de ângulo de atrito. Pode-se
observar que:
kp = 1/ka (2.7)

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Tabela 2.1 – Valores de ka e kp:

’ ka kp
0 1,00 1,00
30 0,33 3,00
45 0,17 5,83
60 0,07 13,90

Em síntese, as pressões sobre a parede a uma profundidade z, serão como indica a Figura 2.2:
’h(z) = K. ’v(z) = K..z (2.8)

onde: K é o coeficiente de empuxo (ativo ou passivo, conforme o caso). As expressões de K podem ser
obtidas pelas equações (2.3) e (2.5).

No caso de maciços homogêneos, o diagrama de pressões é triangular e linearmente crescente com


a profundidade, uma vez que  e ’(logo, K) são constantes.
A resultante das pressões atuantes até certa profundidade z=h, constitui o chamado empuxo (ativo
ou passivo, conforme o caso) e calcula-se a partir da expressão:

h
h 2 .K

E  K..z.dz 
o
2
(2.9)

Figura 2.2 – Hipóteses referentes à formulação original do Método de Rankine


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2.2 Aplicação a casos em que existem sobrecargas uniformes


Se existe uma sobrecarga uniformemente distribuída, q, aplicada na superfície do terreno (Figura
2.3), a tensão vertical em qualquer ponto do maciço aumenta naturalmente de igual valor. Assim:

’(z) = .z + q (2.10)


Caso o maciço se encontre em equilíbrio limite, a tensão horizontal (ativa ou passiva) sobre a parede
a uma profundidade z passa a ser:

’h(z) = K. ’v(z) = K..z + K.q (2.11)


Conclui-se então, que a existência de uma sobrecarga uniformemente distribuída na superfície do
terreno implica, em uma situação de equilíbrio limite de Rankine, a existência de um diagrama retangular
de pressões. A tensão horizontal será definida pelo produto da sobrecarga aplicada pelo coeficiente de
empuxo correspondente ao estado de equilíbrio limite em questão.
O efeito da sobrecarga pode ser também considerado como uma altura equivalente de aterro (ho):
q
ho  (2.12)

onde:  é o peso específico do solo.

Neste caso, a tensão horizontal a uma profundidade z, será dada por:


’h(z) = K. ’v(z) = K..z + K. .ho (2.13)

Figura 2.3 – Aplicação do Método de Rankine a casos em que existe uma sobrecarga uniforme
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2.3 Aplicação a maciços estratificados


Considere o maciço estratificado apresentado na Figura 2.4. Cada estrato apresenta um valor de
peso específico () e ângulo de atrito (’), consequentemente, cada estrato apresenta um valor de
coeficiente de empuxo (K) distinto.
A tensão horizontal no ponto imediatamente acima da superfície de separação dos estratos é
calculada pela expressão 2.8, e vale K1.1.h1. No cálculo das tensões para as profundidades
correspondentes ao estrato 2, o estrato 1 pode ser considerado como uma sobrecarga uniformemente
distribuída de valor 1.h1, dando origem a um diagrama retangular de valor K2.1.h1. Este diagrama soma-
se ao das tensões associadas ao estrato 2, que, a uma profundidade h2 valem K2.2.h2.
Ressalta-se que, pelo fato de K1 e K2 serem diferentes, o diagrama resultante apresenta uma
descontinuidade à profundidade de separação dos estratos. Neste caso, o ponto de aplicação do empuxo
deve ser calculado a partir do equilíbrio das forças resultantes de cada um dos diagramas.

Figura 2.4 – Aplicação do Método de Rankine a maciços estratificados

É interessante notar que, no ponto de contato entre as duas diferentes camadas de solo, a tensão
horizontal vale K1..h1 no ponto imediatamente acima e K2.1.h1 no ponto imediatamente abaixo, gerando a
descontinuidade. Em maciços estratificados, devem-se calcular as tensões horizontais nas interfaces entre
os diferentes solos, de forma a levar em consideração as descontinuidades.

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2.4 Aplicação a maciços com nível freático


No caso de existência de um nível freático, o problema pode ser resolvido como se houvessem dois
estratos, um acima do nível freático, de peso específico , e outro abaixo do nível freático, de peso
específico sub.
A Figura 2.5 esquematiza o processo de cálculo. O diagrama (1) é referente ao solo acima do nível
freático. A tensão horizontal cresce com a profundidade até a altura do nível d’água. A partir daí, o
diagrama permanece constante, já que o estrato superior pode ser considerado como uma sobrecarga
uniformemente distribuída de valor (h-hw). O diagrama (2) refere-se ao solo abaixo do nível freático. O
diagrama (3) é o das pressões hidrostáticas.
Ressalta-se que, uma vez que se trata do mesmo solo, o diagrama resultante apresenta uma quebra
no nível freático, mas não uma descontinuidade.
Outra forma de calcular a distribuição das tensões horizontais seria calcular a tensão efetiva vertical
no ponto coincidente com a linha freática e na base da camada, e posteriormente, somar com o diagrama
das pressões hidrostáticas. Ou seja:
1. No ponto coincidente com a linha freática:
’v = .(h - hw)
’h = K. .(h - hw)
2. Na base da camada:
’v = .(h - hw) + .hw - w.hw
’h = K.[.(h - hw) + .hw - w.hw ] = K..(h-hw) + K.sub.hw

Figura 2.5 – Aplicação do Método de Rankine a maciços com nível freático

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2.5 Aplicação a maciços coesivos


No caso de solos coesivos, as tensões horizontais ’ha e ’hp) representativas dos estados ativo e
passivo, podem ser obtidas a partir das expressões:
’ha = ka .’v – 2.c’. k a (2.14)

’hp = kp .’v + 2.c’. k p (2.15)

Considere as distribuições das tensões horizontais (’ha e ’hp) apresentadas na Figura 2.6. Como
pode ser observado, quando o solo apresenta uma componente coesiva, o valor da tensão horizontal no
estado ativo (’ha ) se anula para z = zo, sendo negativa acima dessa profundidade.
As tensões que resultarem negativas são desconsideradas, uma vez que o solo não resiste à tração.
O valor de zo pode ser estimado por semelhança de triângulos:
zo H  zo
 (2.16)
2.c' k a k a ..(H  z o )

2.c'
zo  (2.17)
ka
Os valores de empuxo ativo e passivo são dados, portanto, por:
1 2
Ea  k a ..(H2  z o )  2c ' k a .(H  z o ) (2.18)
2
1
Ep  k p ..H2  2c' k a .H (2.19)
2
A seguir, serão apresentadas as deduções das equações de ’ha e ’hp para o caso de maciços coesivos.

2. c'.ka 2.c'.kp

Ep1
H

Ea
H/2 Ep2
H/3
(H - zo)/3

ka. .H k p.  .H

ESTADO ATIVO ESTADO PASSIVO

Figura 2.6 - Aplicação do Método de Rankine a maciços coesivos


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Tópicos Especiais em Geotecnia

Dedução da expressão de ’ha para maciços coesivos:


A partir dos círculos de Mohr apresentados na Figura 16, obtém-se:
  c'' tan ' (1)
1   3
 cos ' (2)
2
 1   3 1   3
  sen ' (3)
2 2
Substituindo (2) e (3) em (1):
1   3     3 1   3 
cos '  c' 1  sen ' . tan '
2  2 2 

1   3     3 1   3  sen '
cos '  c ' 1  sen ' .
2  2 2  cos '

Multiplicando por cos ’:


1   3    3 
 c'. cos ' 1  sen '
2  2 
1 
(1  sen ' )  c. cos ' 3 (1  sen ' )
2 2
2.c '. cos ' (1  sen ' )
3    1
1  sen ' (1  sen ' )

 1  sen '  1  sen '


 3   1    2c '
 1  sen '  1  sen '

 3  1.k a  2c' k a

Assumindo: ’v = 1 e ’h =  3:

' h  ' v .k a  2c ' k a

O valor de ’hp pode ser deduzido de maneira análoga. No entanto, assume-se


que: ’v = 3 e ’h =  1.

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Tópicos Especiais em Geotecnia

2.6 Aplicação a maciços com superfície inclinada


Considere um maciço não coesivo com uma superfície inclinada de um ângulo  em relação à
horizontal (Figura 2.7). Analisando o equilíbrio de um prisma infinitesimal de geratrizes verticais, cuja face
superior é o terrapleno, pode-se concluir que:
1. As forças que se exercem nas faces paralelas à superfície de ruptura são puramente
verticais;
2. As forças que se exercem nas faces verticais são paralelas à superfície.

Sendo assim, os círculos de Mohr representativos das tensões nas duas faces do prisma pertencem
a retas que passam pela origem e têm uma inclinação  em relação à horizontal, como ilustrado na Figura
18.
Os valores dos empuxos ativo e passivo serão, segundo dedução analítica de Rankine,
respectivamente:

1 2 cos   cos 2   cos 2 


Ea  h cos . (2.20)
2 cos   cos 2   cos 2 

1 2 cos   cos 2   cos 2 


Ep  h cos . (2.21)
2 cos   cos 2   cos 2 

Para solos coesivos, a solução não pode ser expressa analiticamente.

Figura 2.7 – Maciço não coesivo com superfície inclinada

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zcos 



Figura 2.7 – Aplicação do Método de Rankine para maciços com superfície inclinada

Dedução da expressão de Ea para maciços com superfície inclinada:

A partir do círculo de Mohr apresentado na Figura 2.7, pode-se escrever:


OB OE  BE OC. cos   CB. cos w cos   sen . cos w
  
OA OE  BE OC. cos   CB. cos w cos   sen . cos w

Como:

sen  sen 2 
sen w  e, portanto, cos w  1 
sen  sen 2 

2 2
cos   cos   cos 
OB  P a   . z . cos  .
2 2
cos   cos   cos 

O empuxo ativo será aplicado no terço inferior da altura, paralelamente à


superfície do terreno e terá como módulo:
H
1 cos   cos 2   cos 2 

E a  Pa .dz 
0
2
.H 2 . cos .
cos   cos 2   cos 2 

Analogamente, obtém-se o valor de p:

1 cos   cos 2   cos 2 


Ep  .H2 . cos .
2 cos   cos 2   cos 2 

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Exercícios

1) Determine o empuxo atuante sobre o muro indicado na Figura 2.8.


2) Suponha agora a existência de uma sobrecarga uniformemente distribuída na superfície do terreno
e que o solo inferior apresente as seguintes características: (t = 20kN/m3 e  = 35º)
3) Deduza a expressão de kp para maciços coesivos.

6,1m

3,6 m

Figura 2.8 – Muro de Contenção

4) Para um muro com paramento vertical e retroaterro inclinado de 14,5º, pede-se, para um ponto
situado a 2,80m de profundidade:
a) Desenhar os círculos ativo e passivo;
b) Determinar os planos de ruptura para as condições ativa e passiva;
c) Determinar a direção dos planos principais.
Considere o solo com =18kN/m3, ’ = 35º e c’=0.

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Tópicos Especiais em Geotecnia

Resolução do Exercício 4:
Caso ativo
Na condição ativa, a tensão vertical a uma profundidade z, em um plano de inclinação  com a horizontal é
dada por:
 z = .z.cos18.2,80.cos14,5º = 48,79kN/m2 (Este ponto está representado graficamente na
Figura 2.9 – ponto A)
Se a condição de movimentação do solo mobiliza o equilíbrio plástico, haverá um círculo de Mohr
passando pelo ponto A e tangenciando a envoltória de ruptura. Passando pelo ponto A uma reta com
inclinação  encontra-se o pólo coincidente com o ponto B.
Assim, passando uma vertical por B, determina-se a tensão correspondente ao empuxo ativo Ea.
Graficamente, determinamos Ea = 14,86kN/m2.
Analiticamente, determina-se Ea pela expressão:
H
1 cos   cos 2   cos 2 

E a  Pa .dz 
0
2
.H 2 . cos .
2
cos   cos   cos  2
= 14,86kN/m2

Pelo Círculo de Mohr, verifica-se que a tensão principal menor 3 é igual a 14,48kN/m2 e atua em um
plano que faz 63º com o plano horizontal.
Em relação à tensão principal maior (1), observa-se graficamente que apresenta magnitude de
53,42kN/m2 e atua a 153º com o plano horizontal.

Figura 2.9 – Representação Gráfica: Caso Ativo

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Tópicos Especiais em Geotecnia

Caso Passivo
Na condição passiva, a tensão vertical a uma profundidade z, em um plano de inclinação  com a
horizontal é dada por:
 z = .z.cos18.2,80.cos14,5º = 48,79kN/m2 (No entanto, trata-se agora de uma tensão horizontal
máxima. Este ponto está representado graficamente na Figura 2.10 – ponto A)
Se a condição de movimentação do solo mobiliza o equilíbrio plástico, haverá um círculo de Mohr
passando pelo ponto A e tangenciando a envoltória de ruptura. Passando pelo ponto A uma reta com
inclinação  encontra-se o pólo coincidente com o ponto B.
Assim, passando uma vertical por B, determina-se a tensão correspondente ao empuxo ativo Ep.
Graficamente, determinamos Ep = 160,14kN/m2.
Analiticamente, determina-se Ea pela expressão:

1 cos   cos 2   cos 2 


Ep  .H2 . cos . = 160,14kN/m2
2 2
cos   cos   cos  2

Pelo Círculo de Mohr, verifica-se que a tensão principal menor 3 é igual a 47,53kN/m2 e atua em um
plano que faz 70º com o plano vertical.
Em relação à tensão principal maior (1), observa-se graficamente que apresenta magnitude de
175,36kN/m2 e atua a 20º com o plano vertical.

Figura 2.10 – Representação Gráfica: Caso Passivo

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