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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


FACULDADE DE HISTÓRIA
HISTÓRIA DA AMÉRICA COLONIAL

ANA BEATRIZ DA SILVA MATOS


BRUNA CIBELLY LEAL DUARTE
EVELLYN FRANCO SILVA
HIAGO DO ROSÁRIO CARVALHO
JENIFER VITÓRIA FURTADO DE MENEZES
MARINARA COSTA LEÃO
RAYANA GERUSA PIANI DE CASTRO
THAIS BARROS PAMPOLHA
THAIS KALINDA TELES FRAZÃO

RESENHA CRÍTICA: “A MINERAÇÃO NA AMÉRICA ESPANHOLA COLONIAL”


DE PETER BAKEWELL

BELÉM/PA
2023
RESENHA CRÍTICA: “A MINERAÇÃO NA AMÉRICA ESPANHOLA COLONIAL”
DE PETER BAKEWELL

INTRODUÇÃO
“O ouro é o metal mais sublime e mais admirado que a terra produz... Entre outras
virtudes que a natureza lhe conferiu, uma é singular: a de confortar a fraqueza do coração e
provocar alegria e magnanimidade, afastar a melancolia e clarear os olhos na
escuridão...”1. É com este trecho da obra de Juan de Arfe, que Peter Bakewell inicia o
capítulo 3 da coletânea “América Latina Colonial – Vol. II” (1997) organizada por Leslie
Bethel. No capítulo em questão, reservado ao processo de mineração na América Espanhola
Colonial, Bakewell escolhe focar especialmente na mineração do ouro, prata e mercúrio em
diversas províncias da América Espanhola, além de perpassar por diversos tópicos
importantes para compreensão não só do processo de mineração, mas também da História da
América Espanhola Colonialcomo um todo.
Ao longo dessa resenha crítica, serão analisados cada um destes tópicos levando em
consideração o objetivo do autor, o contexto histórico, sua contribuição para essa área de
pesquisa e suas limitações.

AS TÉCNICAS DE EXTRAÇÃO

O PROCESSAMENTO
O processamento, ou seja, como ocorria a extração dos minérios ouro e prata
funcionava da seguinte forma: para eliminar o material desnecessário que vinha junto a prata
quando extraída nas minas, a prata era fragmentada, após isso, o minério estava pronto para
ser processado, o que era feito através da amalgamação nas chamadas casas de fundição, onde
na Nova Espanha eram chamadas de Haciendas. Nas Haciendas o minério era triturado em um
triturador de pilão movido a água até alcançar uma consistência fina semelhante a areia, para
que o minério de prata ficasse o máximo possível em contato com o mercúrio durante a
amalgamação. Como fonte de energia para essas máquinas de trituração, poderiam ser
utilizados água, cavalos ou mulas – ou, como início da década de 1570, a força de humanos.
Já processamento do ouro tinha como objetivo o separar de qualquer material
encontrado nele, como por exemplo areia, lama e cascalhos. Os principais métodos utilizados

1
VILLAFAÑE, Juan de Arfe. Quilatador de la plata, oro y piedras. Valladolid, 1572; reprodução em fac-símile,
Madrid, 1976.
para tal atividade em primeiro momento era o bateamento e a lavagem em calhas. No segundo
caso, era necessário triturar o material extraído do veio, o que podia ser feito em um triturador
de pilão. E por fim, viria o processo de amalgamação para reunir o ouro do material triturado.

AS MATÉRIAS PRIMAS
As matérias-primas necessárias para a mineração na América espanhola eram
limitadas, dentre elas: sal, ferro, madeira, água e, o mais importante, mercúrio. Todos esses
elementos eram encontrados em pouca quantidade ou só em outras localidades da América;
como no caso da madeira, usada para construção das casas, moinhos e estruturas para a
mineração. A água, essencial para transformar o cinábrio em mercúrio líquido e para limpar
os metais dos sedimentos, era uma matéria-prima escassa, em especial nos Altos Andes. Com
a iniciativa de Bartolomeu Medina em vir à América Espanhola em 1530 para implementar a
técnica de usar o mercúrio para separar prata dos outros materiais, só em 1590 Álvaro Alonso
Barba leva a Potosí a ideia de fusão na caldeira, aproveitando ainda mais os materiais. O
controle da coroa espanhola na produção e distribuição do mercúrio afetou diretamente no
valor da prata já refinada e transformada em lingote. Apenas no final do século XVIII, com a
queda do preço do mercúrio que houve um aumento na produção de prata, e então, o Reino
Espanhol conseguiu enriquecer através da exploração dos materiais e da subjugação dos
povos que viviam nas regiões.

OS SISTEMAS DE TRABALHO
A mineração apoiava-se principalmente no trabalho indígena. Os negros, escravos e
livres tinham uma participação menor, exceto na mineração de ouro onde constituíam a
grande maioria da força de trabalho. No início do século XVI, além do ouro pilhado, o bem
mais precioso que os espanhóis poderiam dispor era o trabalho das comunidades indígenas. Já
no século XVIII, era possível encontrar mestiços empregados em tarefas físicas de mineração,
mas quanto mais se pareciam com os espanhóis, mais raramente eram empregados nesses
trabalhos. O mais próximo que os homens brancos chegaram do trabalho físico da mineração
foi na prospecção: em geral eram supervisores e proprietários. O texto menciona dois sistemas
de trabalho na mineração no período colonial: o Mita e o Encomienta. O sistema mita era
baseado no trabalho forçado dos povos indígenas, que eram obrigados a trabalhar nas minas
por um período determinado. Já o sistema de encomienta envolvia a distribuição de terras para
os povos indígenas, mas também a exploração por parte dos encomenderos, que eram
responsáveis por supervisionar os trabalhos dos nativos e coletar tributos em troca. Vale
ressaltar que ambos os sistemas eram extremamente exploratórios e desumanos, levando em
condição as condições de trabalhos perigosas e insalubres nas minas, além de terem causado
danos irreparáveis às comunidades indígenas.

AS CONDIÇÕES DE TRABALHO
As condições de trabalho nas minas eram deploráveis e perigosas, porém, havia
diferença no caso de especialização. Os barreteiros trabalhavam na escavação dos minérios e
tinham salários maiores que os dos trabalhadores comuns, o que não quer dizer que este
trabalho era simples, pois seus “ambientes de trabalho” eram lugares mal ventilados, mal
iluminados, e muito quentes. Os trabalhadores não especializados geralmente ficavam no
cargo de carregadores, transportando os minérios do fundo da mina até a superfície, fazendo
um percurso longo e perigoso, correndo risco de quedas, desabamentos e doenças. Tais
perigos matavam vários trabalhadores e deixavam graves sequelas em muitos outros.
A mineração do ouro era dependente da mineração do mercúrio, e esses dois tipos
tinham seus perigos individuais. Por exemplo, a mineração do ouro era comumente feita em
aluviões e dessa forma os trabalhadores eram obrigados a passar muito tempo dentro d’água
tornando o trabalho desconfortável. Já os que estavam encarregados da mineração de
mercúrio frequentemente se expunham a gases venenosos e devido a fragilidade das rochas
que envolviam o mercúrio, desabamentos eram comuns – além do perigo da entoxicação por
mercúrio que colocava em risco não somente os trabalhadores, mas toda a população da
região que a mineração estivesse ocorrendo.

AS REPERCUSSÕES SOCIAIS
A mineração, para um imigrante ou colono pobre, poderia ser um fácil caminho para
ascensão social e fazia com que muitos chegassem a altos patamares em suas regiões, porém,
essa riqueza não tendia a durar muito pois uma série de problemas poderiam acontecer nas
minas que as tornaria inviáveis para fazer a extração do minério. No entanto, quem mais
sofria com as consequências da mineração eram os povos nativos da região, já que foram
forçados a sair de suas cidades natais para ir trabalhar nas minas e acabavam por ficar
isolados de suas culturas fazendo com que eles adotassem costumes europeus e perdessem
suas identidades por necessidade de sobrevivência nas áreas urbanas dominadas pelos
espanhóis. O povo nativo sofreu com a perda de seus integrantes para os perigos da
mineração, o que levou ao decrescimento populacional indígena em relação as cidades
dedicadas a mineração, que tiveram uma explosão na sua população por conta dos milhares de
trabalhadores que lá teriam que viver.

A MINEIRAÇÃO E O ESTADO
A mineração pagava direitos à coroa, e ao estimular o comércio, produzia impostos
sobre as vendas e taxas alfandegárias. Com isso, os indígenas logo passaram a ser pagos em
espécie, o que certamente deu dinamismo a muitos setores da economia colonial. Portanto,
não surpreende que a coroa demonstrasse um ávido interesse pelos destinos da indústria.
Na produção de mercúrio a coroa sempre preservou um interesse direto. Este
procedimento aliviou o governo dos custos de produção e ao mesmo tempo estimulou a
prospecção ativa. A propriedade das Jazidas de Almadém e de Huoncocélica registrada
totalmente nas mãos do rei, embora até 1645 em Almadén e até 1782 em Huoncocélica as
minas foram realmente exploradas por contratantes dos quais a coroa comprava o mercado a
um preço negociado. Os Bourbons remodelaram o governo imperial, e centralizaram o
mecanismo de controle e modernizaram a burocracia. Criaram-se vice-reinados e outras
unidades administrativas, nomearam-se novos funcionários, os intendentes, tentaram-se novos
métodos do governo e implicaram igualmente uma vigilância mais rigorosa da população.

O CAPITAL
Parte fundamental para entender o funcionamento da mineração na América vem do
entendimento do Capital. A mineração começa com a produção inicial de fundição da prata
encontrada em minérios na superfície, onde é nessa etapa que as fornalhas se tornam material
necessário para que essa fundição ocorra. Com o encontro do ouro nas aluviões, a rápida
mudança para esse tipo de minério foi possível na colônia. No início, a mão de obra utilizada
para a retirada desse ouro era a mão de obra indígena. No entanto, na fase posterior, torna-se a
mão de obra escrava Africana. Essa mão de obra trazia prejuízos pois era cara, devido à
distância das instalações do ouro para com o local aonde esses escravos chegavam da África.
Tudo isso somado com os investimentos feitos nos materiais para extração do ouro, o tornava
caro. Galeria de acessos eram caras, refino exigiu grandes conjuntos de edifícios, trituradores
poderosos eram necessários, energia movida a animais ou água, reserva de mercúrio, entre
outros. O preço de tudo isso variava de acordo com o local e o tempo.
Em Potosí, nos primeiros anos de amalgamação, 30 a 40% do lucro era usado pra criar
novas casas de refino, pois no início máquinas eram baratas e davam lucro. Essa produção
autônoma de Potosí durou 2 ou 3 décadas. Então, quando o minério foi esgotando, procurou-
se investimentos através dos comerciantes. A partir desse ponto, surge a figura do Aviador,
que se tratava de um fornecedor de suprimentos e créditos para esses locais de extração da
prata. O aviador comprava prata bruta não-cunhada, e cobrava impostos por isso. Esse sistema
de comércio durou por bastante tempo na colônia, onde os comerciantes da prata compravam
dos aviadores, que por sua vez compravam do refino, tornando um ciclo de comércio
chamado de sistema Avío. Esses comerciantes foram grandes figuras e protagonistas no
século XVII e nos séculos posteriores. Então, os comerciantes predominaram até o fim do
período colonial.

ANÁLISE E CONCLUSÃO
A mineração na América colonial desempenhou um papel significativo no
desenvolvimento econômico e social da região. Tanto a extração de prata quanto de ouro
foram atividades de extrema importância, atraindo investimentos, mão de obra e
estabelecendo relações comerciais complexas. A riqueza mineral contribuiu para o
enriquecimento da coroa espanhola e financiou sua expansão e influência na época.
Para além das consequências ambientais, a mineração de ouro também teve um
impacto significativo nas estruturas sociais e econômicas da América colonial. Entretanto, é
fato que o autor, entre vários parágrafos, foca muito mais no âmbito técnico do tema, do que
na análise das relações sociais, por exemplo. Em alguns momentos, a sensação foi a de que o
autor dá mais prioridade ao processo técnico e pouca às questões sociais: enquanto ele utiliza
de artifícios como equações para explicar o processamento dos minérios, ao falar das relações
sociais, ele disponibiliza “literais” duas páginas para o tópico. Consideramos que o autor
passa mais tempo falando da parte química do tema, assim como do funcionamento das
máquinas, ao passo que peca ao explicar como a produção da prata influenciou nas relações
sociais – tópico que consideramos fundamental entender. Não obstante, não houve
aprofundamento do autor sobre a relação do comerciante e do aviador: o texto torna-se
superficial neste ponto. Diante do exposto, o texto torna-se, então, muito mais algo
relacionado ao campo da geologia (tendo em vista as especificações e superficialidades do
autor ao escrevê-lo), e os efeitos da mineração na vida e sociedade, que deveriam ser o foco
do texto, acabam por ficar em segundo plano.
Sendo assim, embora o texto falhe em alguns aspectos, pode-se concluir que a
mineração na América colonial teve um papel complexo e multifacetado. Enquanto trouxe
riqueza e desenvolvimento econômico para a região, também resultou em impactos
ambientais, exploração de mão de obra e desigualdades sociais. A mineração moldou a
história e as estruturas sociais das colônias, deixando um legado duradouro até os dias de
hoje.

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