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BRASIL COLÔNIA:

INTERIORIZAÇÃO DO
TERRITÓRIO
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BRASIL COLÔNIA: INTERIORIZAÇÃO DO TERRITÓRIO


Em 1674, saiu de São Paulo a bandeira comandada pelo bandeirante Fernão Dias Pais Leme
em direção à Serra de Itaberaba, onde foram achados sinais da existência de ouro. Em 1694, outro
bandeirante paulista, Bartolomeu Bueno da Siqueira, descobriu ouro na mesma Serra de Itaberaba. A
notícia da descoberta de ouro atraiu gente de toda a colônia para a região das Minas. Desde o início
do século XVIII, a população dessa região ia crescendo, conforme surgiam notícias de descoberta de
mais minas. Diante disso e desejando ficar com a maior parte desse ouro, Portugal resolveu orga-
nizar a sua exploração. Após décadas de crise econômica, Portugal finalmente realizava o sonho de
extrair ouro de sua colônia, a exemplo do que os espanhóis já faziam desde que chegaram à América.
Para o Brasil, a extração aurífera representou mudanças significativas na organização social e
econômica, pois começou a existir maior mobilidade social, além de um mercado interno de con-
sumo. O Centro-Sul passou a ocupar o posto de região mais importante do Brasil, ultrapassando
o nordeste. A população nas áreas das minas (Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso) aumentou de
forma vertiginosa, efetivando a ocupação de boa parte do interior da colônia. Isso leva a pensar que
a atividade de extração de ouro no Brasil foi um divisor de águas em sua história colonial.

ORGANIZAÇÃO DA EXPLORAÇÃO AURÍFERA


A exploração do ouro não exigia grande investimento, e as técnicas utilizadas eram bastante
rudimentares. O minério obtido nessa época foi basicamente o chamado “ouro de aluvião”, aquela
que fica na superfície dos leitos dos rios ou do solo.
A organização da produção deu-se por meio de unidades conhecidas como datas ou lotes,
representadas de duas formas, sendo elas as lavras, unidades grandes que possuíam aparelhos mais
sofisticados e usavam grande número de escravos e as faisqueiras, lotes pequenos, trabalhados
pelos próprios interessados ou por mineradores com poucos escravos.
Já em 1702, o governo português promulgou um regimento que definia a forma da exploração
dos metais. Em linhas gerais, as minas eram repartidas da seguinte forma: o seu descobridor tinha
direito a uma data. A Coroa portuguesa também ficava com uma data, as demais eram sorteadas
ou distribuídas entre mineradores interessados. Os candidatos donos de mais escravos tinham mais
chance de obter as melhores datas.
O Regimento de 1702 criou a Intendência das Minas, um órgão administrativo que tinha
como principais tarefas reprimir o contrabando e a sonegação de impostos e cobrar o quinto. Esse
imposto, que correspondia a 20% das riquezas encontradas, deveria ser pago pelos mineradores ao
rei de Portugal. A propósito, Portugal cobrava muitos outros impostos sobre a atividade mineradora
e sobre o comércio que circulava nas áreas das minas. Não existem registros seguros sobre o mon-
tante de ouro que era extraído e não era comunicado à Intendência: era contrabandeado para não
pagar o quinto. Pelo total de ouro brasileiro que chegou à Europa durante o século XVIII, calcula-se
que a quantidade de ouro exportada de forma clandestina equivale à que foi legalmente registrada.
Os colonos usavam os mais variados disfarces para retirar o ouro da região das Minas e levá-
-lo aos portos, onde era embarcado para a Europa. O disfarce mais conhecido foi o santo do pau
oco – imagem religiosa aparentemente esculpida em madeira maciça, mas que era oca e tinha seu
interior recheado de ouro ou de pedras preciosas.
Assim como o contrabando foi uma das características da exploração mineira, também o
foram as tentativas dos portugueses de acabar com ele. Em 1720, começaram a funcionar as Casas
de Fundição, que tinham a função de transformar o ouro em pó em barras marcadas com o selo
da Fazenda real. Somente podiam circular barras devidamente seladas. As que fosse pegas sem a
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chancela oficial eram consideradas contrabando, e seus donos eram condenados por praticarem
o comércio ilegal do ouro.
No momento da fundição, já era descontada a parte correspondente a 20%, o quinto, que,
pela lei, pertencia ao rei de Portugal. A fundição não garantiu o fim do contrabando de ouro e a
consequente sonegação dos impostos, pois os colonos insatisfeitos com a grande quantidade de
impostos que pagavam, encontravam alternativas para burlar a lei.
Como a fundição oficial não resolveu o problema da sonegação, o então rei luso D. José I, por
intermédio de seu principal ministro, o marquês de Pombal, fixou, em 1750, uma taxa anual de cem
arrobas (aproximadamente 1500 quilos) de ouro a ser pago como imposto. As Casas de Fundição
de Vila Rica, Sabará, São João del Rei e Vila do Príncipe eram encarregadas de fazer a coleta das
cem arrobas. Até 1762, os mineiros conseguiram pagar a totalidade do imposto, mas, a partir do
ano seguinte, isso não foi mais possível, porque o volume de ouro extraído começava a diminuir,
já que as minas estavam se esgotando. O governo português, inconformado com essa situação e
extremamente necessitado do ouro para saldar suas dívidas com outros países, criou a derrama,
exigindo que todos os mineradores que tivessem impostos atrasados com a Coroa deveriam ser
cobrados de maneira violenta. Para tanto, os soldados tinham autorização para entrar nas casas e
levar à força o ouro que encontrassem. Essa atitude de violência, numa época em que o desânimo
tomava conta dos mineiros por causa do esgotamento das lavras, gerou revolta e a consciência
política de libertar o Brasil de Portugal.

A INTERIORIZAÇÃO DO TERRITÓRIO
A área mineradora viveu um surto urbanizador, com a constituição de várias vilas e cidades no
interior. A população colonial cresceu rapidamente e atividades de suporte eram necessárias para
tal concentração humana, principalmente no que diz respeito à alimentação.
Dessa forma, grupos intermediários surgiram nessa sociedade colonial, atendendo à atividade
mais importante. Os tropeiros, mercadores que transportavam gado e uma grande variedade de arti-
gos como cachaça, vinho e queijo do Nordeste e do Sul, atendiam toda a região mineradora. A vida
colonial se intensificava, possibilitando a integração das várias partes do que chamamos de Brasil.
Uma das principais integrações regionais promovidas pela ação dos tropeiros foi o caminho
que ligava a cidade de Viamão, no Rio Grande do Sul, a Sorocaba, em São Paulo. Por esse caminho,
conhecido também como Estrada da Mata, os tropeiros transportavam suas mercadorias para serem
vendidas na região mineradora. Cidades importantes surgiram ao longo destas trilhas: Mafra, Lapa,
Castro, Ponta Grossa, Piraí, Jaguariaíva, Itararé e Sorocaba.
Outra trilha que contribuiu para a integração das regiões brasileiras e que surgiu do caminho
dos tropeiros foi a Estrada das Missões. As principais cidades, que serviam de ponto de parada
para os mercadores, foram São Borja, Santo Ângelo, Xanxerê, Palmas, Chapecó e União da Vitória.
A principal mão de obra empregada na atividade mineradora foi a dos escravos africanos, o
que fez reacender o tráfico negreiro com os altos lucros por ele gerados aos seus realizadores e à
Coroa portuguesa. Apesar da predominância do trabalho escravo, não era incomum homens livres
e escravos trabalharem lado a lado nas minas, pois muitos mineradores não tinham escravos, nem
por isso estavam impedidos de extrair ouro. Além disso, era muito comum os escravos comprarem
sua liberdade, porque conseguiam se apropriar de pequenas quantidades – nem sempre com a
permissão de seus donos – e as guardavam para obter a soma que tornava possível a compra da
liberdade por meio da alforria.
Dentro da pesada carga tributária a que estava submetida a população das minas, havia a
capitação, um imposto sobre o escravo utilizado na mineração. Eram cobrados 17 gramas de ouro
por escravo (por cabeça). Além do trabalho nas minas, era muito comum os escravos serem apro-
veitados em outros tipos de trabalho pesado, como na construção de pontes e estradas. Havia, na
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região mineradora, em pequena escala, os escravos de ganho. Estes eram aproveitados pelos seus
proprietários para realizar atividades variadas como vendedores de alimentos e carregadores. A
maior parte do dinheiro ganho por esses cativos ficava com seu senhor. A parte que cabia ao escravo
muitas vezes era utilizada para a compra da alforria.
Não podemos esquecer que os diamantes também fazem parte deste contexto. Assim como
outros sítios, no começo do século XVIII, a região localizada na Serra do Espinhaço, comarca de
Serro Frio, cujo centro administrativo era o Arraial do Tijuco, foi um lugar de extração de ouro, até
que, em 1726, foram encontrados diamantes nessa localidade. Conhecida, a partir de então, por
Distrito Diamantino, a região passou a ser alvo da Coroa portuguesa. A princípio, a Coroa atuou, sem
muito sucesso, no sentido de monopolizar a extração de diamantes. Outro meio para a extração
foi o sistema de arrematação por contrato, até que, em 1771, a Coroa instituiu o estanco sobre a
atividade, por meio da Real Extração, situação que perdurou até o início do século XIX.
Desta forma, o processo de interiorização, principalmente com o processo de urbanização
da região sudeste e com a exploração de ouro e diamantes na região centro-oeste, ocorreu desta
maneira, a partir do século XVIII, sendo extremamente importante para a ampliação do território
brasileiro.

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