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Walkyria Magno e Silva

Elaine Ferreira do Vale Borges


Organizadoras

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Complexidade em
R
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ambientes de ensino
aC
e de aprendizagem de
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

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línguas adicionais
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Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
Walkyria Magno e Silva
Elaine Ferreira do Vale Borges
(Organizadoras)

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Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

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COMPLEXIDADE EM AMBIENTES
DE ENSINO E DE APRENDIZAGEM
a re

DE LÍNGUAS ADICIONAIS
itor
par
Ed
são
ver

EDITORA CRV
Curitiba - Brasil
2016
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação e Capa: Editora CRV
Revisão: Os Autores
Conselho Editorial:
Profª. Drª. Andréia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR) Prof. Dr. João Adalberto Campato Junior (FAP - SP)

V
r
Prof. Dr. Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ) Prof. Dr. Jailson Alves dos Santos (UFRJ)
Prof. Dr. Carlos Alberto Vilar Estêvâo Prof. Dr. Leonel Severo Rocha (UNISINOS)

uto
- (Universidade do Minho, UMINHO, Portugal) Profª. Drª. Lourdes Helena da Silva (UFV)
Prof. Dr. Carlos Federico Dominguez Avila (UNIEURO - DF) Profª. Drª. Josania Portela (UFPI)
Profª. Drª. Carmen Tereza Velanga (UNIR) Profª. Drª. Maria de Lourdes Pinto de Almeida (UNICAMP)
Profª. Drª. Maria Lília Imbiriba Sousa Colares (UFOPA)

R
Prof. Dr. Celso Conti (UFSCar)
Prof. Dr. Paulo Romualdo Hernandes (UNIFAL - MG)

a
Prof. Dr. Cesar Gerónimo Tello
Prof. Dr. Rodrigo Pratte-Santos (UFES)
- (Universidad Nacional de Três de Febrero - Argentina)
Profª. Drª. Maria Cristina dos Santos Bezerra (UFSCar)
Profª. Drª. Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL) Prof. Dr. Sérgio Nunes de Jesus (IFRO)

do
Prof. Dr. Élsio José Corá (Universidade Federal da Fronteira Sul, UFFS) Profª. Drª. Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA)
Profª. Drª. Gloria Fariñas León (Universidade de La Havana – Cuba) Profª. Drª. Sydione Santos (UEPG PR)
aC
Prof. Dr. Francisco Carlos Duarte (PUC-PR) Prof. Dr. Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA)

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


Prof. Dr. Guillermo Arias Beatón (Universidade de La Havana – Cuba) Profª. Drª. Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)
são
Este livro foi aprovado pelo Conselho Editorial.

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)


CATALOGAÇÃO NA FONte
i
rev

C728

Complexidade em ambientes de ensino e de aprendizagem de línguas adicionais.


or

/ Walkyria Magno e Silva, Elaine Ferreira do Vale


Borges (Organizadoras). – Curitiba: CRV, 2016.
298 p.
ara

Bibliografia
ISBN: 978-85-444-1014-1
t

1. Educação 2. Livros didáticos 3. Educação 4. Línguas adicionais I. Silva,


Walkyria Magno e. org. II. Borges, Elaine Ferreira do Vale, org. III. Título IV.
i

Série.
op
d

CDD 407

Índice para catálogo sistemático


1. Ensino de línguas 407
E

ver

2016
Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
Todos os direitos desta edição reservados pela:
Editora CRV
Tel.: (41) 3039-6418
www.editoracrv.com.br
E-mail: sac@editoracrv.com.br
SUMÁRIO

PREFÁCIO
PREFACIANDO UM EFEITO BORBOLETA DA

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r
COMPLEXIDADE NA LINGUÍSTICA APLICADA BRASILEIRA............... 9
Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva (UFMG/CNPq)

uto
APRESENTAÇÃO
AS CONDIÇÕES INICIAIS NA CONSTRUÇÃO

R
DE UMA REDE DE IDEIAS E REFLEXÕES............................................. 15

oa
Walkyria Magno e Silva (UFPA)
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)

INTRODUÇÃO
aC
ENTRELAÇAMENTO DE TEMAS NA COMPREENSÃO
DE SISTEMAS CAÓTICOS ....................................................................... 19
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Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)


Walkyria Magno e Silva (UFPA)
visã
PARTE I
PRÁTICAS SOCIAIS DE LINGUAGEM NA
PERSPECTIVA DA COMPLEXIDADE
a re
itor

CAPÍTULO 1
COMPETÊNCIA COMUNICATIVA E COMPETÊNCIA SIMBÓLICA:
um olhar sobre a complexidade no desenvolvimento linguístico.................. 33
Rafael Vetromille-Castro (UFPEL)
par

CAPÍTULO 2
GRUPO COMO SISTEMA ADAPTATIVO COMPLEXO:
um estudo das práticas de ensino e aprendizagem
Ed

no contexto do Facebook.............................................................................. 49
são

Valdir Silva (UNEMAT)

CAPÍTULO 3
AFFORDANCES NO DESENVOLVIMENTO DA PRODUÇÃO
ORAL EM LÍNGUA INGLESA: considerações a partir
ver

da abordagem ecológica............................................................................... 69
Kelly Cristina M. Gaignoux (UFPa/Bragança)
Michell Gadelha Moutinho (Escola de Aplicação/UFPa)
PARTE II
LIVROS DIDÁTICOS COM FOCO NA TEORIA DA COMPLEXIDADE

CAPÍTULO 4
POTENCIALIDADES DA ABORDAGEM COMPLEXA NO USO DA
COLEÇÃO “ALIVE! INGLÊS” – Ensino Fundamental................................. 93

V
r
Leonardo dos Santos Pereira (CEBRAC)

uto
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)

CAPÍTULO 5
TRANSDISCIPLINARIDADE NO ENSINO DO ESPANHOL:

R
uma análise do livro didático Enlaces – Ensino Médio................................. 115

a
Kelly Cristinna Frigo Nakayama (IFPR)
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)

do
aC
PARTE III

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ACONSELHAMENTO LINGUAGEIRO COMO
são
SISTEMA ADAPTATIVO COMPLEXO

CAPÍTULO 6
O EFEITO DO ACONSELHAMENTO LINGUAGEIRO
i
NA TRAJETÓRIA DE APRENDIZAGEM DE UMA
rev

ESTUDANTE DE INGLÊS.......................................................................... 139


Eduardo Castro dos Santos Junior (UFPA)
or

Walkyria Magno e Silva (UFPA)

CAPÍTULO 7
ara

A EMERGÊNCIA DE COMPORTAMENTOS AUTÔNOMOS


NO ACONSELHAMENTO LINGUAGEIRO: um estudo
t

segundo a teoria da complexidade............................................................... 159


Larissa Dantas Rodrigues Borges (UFPA)
i

Jhonatan Allan de Andrade Rabelo (UFPA)


op
d

CAPÍTULO 8
ESTADOS ATRATORES EM TRAJETÓRIAS DE
ACONSELHAMENTO LINGUAGEIRO NA
E

APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS.................................. 179


Maria Clara Vianna Sá e Matos (UFPA)
ver

Sádie Saady Morhy (UFPA)

CAPÍTULO 9
CONSELHEIROS LINGUAGEIROS COMO POTENCIAIS
PERTURBADORES DE SUAS PRÓPRIAS TRAJETÓRIAS
NO SISTEMA DE APRENDIZAGEM ......................................................... 199
Walkyria Magno e Silva (UFPA)
PARTE IV
CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS COMPLEXAS

CAPÍTULO 10
COMPLEXIDADE BIOLÓGICA NO ENSINO/APRENDIZAGEM
DE LÍNGUAS ADICIONAIS......................................................................... 223

od V
r
Rodrigo Camargo Aragão (UESC)

uto
CAPÍTULO 11
INTERFACES ENTRE A ABORDAGEM COMPLEXA E O

R
BILINGUISMO MULTIDIMENSIONAL NA EDUCAÇÃO DE SURDOS......241

oa
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)
Eliziane Manosso Streiechen (UNICENTRO)

À GUISA DE CONCLUSÃO
aC
AO FINAL DE UMA ROTA, BIFURCANDO PARA
NOVAS CONDIÇÕES INICIAIS ................................................................. 261
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Walkyria Magno e Silva (UFPA)


Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)
visã
REFERÊNCIAS............................................................................................ 265

SOBRE OS AUTORES ............................................................................... 291


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PREFÁCIO

PREFACIANDO UM EFEITO
BORBOLETA DA COMPLEXIDADE NA

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LINGUÍSTICA APLICADA BRASILEIRA

uto
Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva (UFMG/CNPq)

R
oa
A primeira vez que li o artigo de Larsen-Freeman (1997), intitulado
Chaos/complexity science and second language acquisition foi por sugestão
do colega Hilário Bohn que percebeu uma visão epistemológica promissora
aC
naquele texto. Li e reli várias vezes, pois senti dificuldades para entender
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o artigo devido a uma série de informações novas. Alguns anos depois,


com a leitura do livro de Lewin (1994), presente de minha colega Laura
visã
Miccoli, consegui fazer algumas conexões e iniciei as primeiras reflexões
em meu memorial (PAIVA, 2002), apresentado em meu concurso para
professora titular. Hilário e Laura foram os primeiros elos de uma rede
que, posteriormente, incluiu também Larsen-Freeman e Cameron, que, por
a re

iniciativa de Junia Braga, aceitaram participar com nosso grupo de pesquisa


itor

de um simpósio do Congresso da AILA em Essen, na Alemanha, em 2008.


Walkyria Magno e Elaine Borges, autoras deste livro, são elos fortes nesta
rede sempre em expansão, junto com Rafael Vetromille-Castro, Valdir Silva
e Rodrigo Aragão, autores desta obra e também meus interlocutores em
par

tantos momentos acadêmicos.


O artigo de Larsen-Freeman (1997) foi e continua sendo referência para
mim e para a Linguística Aplicada brasileira, como podemos comprovar
Ed

neste livro ao ver o texto citado pela maioria de seus autores.


são

Larsen-Freeman não previu o efeito borboleta que seu trabalho causaria


no mundo acadêmico, especialmente na Linguística Aplicada brasileira.
A metáfora efeito borboleta, criada a partir de um texto do meteorologista
Lorenz (1963), se caracteriza por um comportamento imprevisível que é
ver

causado por uma ínfima mudança nas condições iniciais de um sistema. A


metáfora inicial era: “uma batida de asas de uma gaivota seria suficiente
para alterar o curso do tempo para sempre”1. Mais tarde, aconselhado por
colegas, Lorenz, passou a usar, em suas palestras, a metáfora do bater das
asas de uma borboleta, no lugar das asas da gaivota, para defender a ideia
1 Esta e todas as outras traduções são de responsabilidade da autora.
10

de que uma pequena alteração nas condições iniciais pode ocasionar efeitos
desproporcionais no sistema. Segundo Ghys (2002), o termo apareceu pela
primeira vez, na palestra de Lorenz intitulada “Does the flap of a butterfly’s
wings in Brazil set off a tornado in Texas?”, na 130ª reunião da American
Association for the Advancement of Science.

V
r
A própria Larsen-Freeman não acreditava no efeito que seu artigo cau-

uto
saria na Linguística Aplicada. Ela mesma explica que o artigo era uma versão
revisada de uma apresentação feita, em 1994, no Second Language Research
Forum, em Montreal, e que ela só tornou a publicar sobre o tema em 2002

R
(LARSEN-FREEMAN, 2007), ou seja 8 anos depois de lançada a primeira

a
semente da complexidade na Linguística Aplicada. O texto ao qual ela se
refere é um capítulo no livro de Kramsch (2002), onde Larsen-Freeman re-

do
visita a controvérsia nas teorias de aquisição alimentada pelas perspectivas
psicolinguísticas e sociolinguísticas e conclui que uma perspectiva caótica/
aC
complexa “apoia claramente a visão da participação social de aquisição de

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são
segunda língua; no entanto, ela não o faz à custa da exclusão da visão aqui-
sicionista da perspectiva psicológica” (LARSEN-FREEMAN, 2002, p.43).
Larsen-Freeman (2007, p.35) dá duas razões para o hiato entre suas
publicações sobre o tema da complexidade. O primeiro foi o fato de poucos
i
pesquisadores terem compartilhado seu entusiamo e acrescenta que “preci-
rev

samos de parceiros de conversa” para fazer ciência. A segunda razão, diz ela,
“as ideias precisavam de tempo para amadurecer”.
or

E as ideias amadureceram e seduziram cada vez mais outros pesqui-


sadores, inclusive no Brasil, como podemos ver neste livro e nos números
ara

especiais em periódicos de ponta em nossa área que começaram a surgir com


conjuntos de trabalhos na perspectiva do caos e da complexidade. Primeiro,
t

foi o periódico Developmental Review, n. 25, em 2005. O número especial,


i

organizado por Mark L. Howe e Marc D. Lewis, se intitulava Development


op

as Self-organization: New Approaches to the Psychology and Neurobiology


d

of Development.
Em 2007, foi a vez de Bilingualism: Language and Cognition editado
E

por Green et al. A revista publicou um artigo de De Bot, Lowie e Verspoor


(2007), intitulado A Dynamic Systems Theory approach to second language
acquisition e convidou vários pesquisadores para comentarem o texto em
ver

pequenos artigos. Dentre eles, estava Larsen-Freeman (2007).


Em 2008, foram publicados números especiais em dois periódicos:
Educational Philosophy and Theory, editado por Mark Mason (2008) e The
Modern Language Journal.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 11

No primeiro, destaco o artigo de Lemke e Sabelli (2008) onde eles


tentam responder a pergunta “Como poderíamos, de forma útil, utilizar con-
ceitos e procedimentos derivados do estudo de outros sistemas dinâmicos
complexos para analisar a mudança sistêmica na educação?” Os autores
defendem a importância de uma mudança de paradigma na nossa forma de

od V
r
pensar sobre pesquisa em educação.

uto
No segundo periódico, conforme informa De Bot (2008), foram re-
unidos artigos derivados de apresentações no congresso anual das asso-
ciações americana e canadense de Linguística Aplicada (AAAL and CAAL),

R
em 2006. Dentre os artigos, destaco o de Larsen-Freeman e Cameron (2008a)

oa
que discutem princípios metodológicos gerais para a pesquisa sobre o desen-
volvimento da língua na perspectiva dos sistemas complexos. O artigo é uma
pequena amostra do conteúdo do livro de ambas (LARSEN-FREEMAN;
aC
CAMERON, 2008b), ainda no prelo na ocasião da publicação do artigo,
mas que foi publicado no mesmo ano desse número especial do The Modern
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Language Journal.
Em 2009, Language Learning publicou um suplemento, editado por
visã
Ellis e Larsen-Freeman (2009a), celebrando o 60º aniversário do periódico.
O suplemento foi intitulado Language as a complex adaptive system. Os
organizadores publicaram um position paper, que já havia circulado na
Internet, de autoria do Five Graces Group, intitulado Language is a complex
a re
itor

adaptive system.
Na introdução, os editores explicam que os trabalhos reunidos naquele
número especial foram submetidos ao periódico e avaliados à luz das dis-
cussões ocorridas no evento e que passaram pelo processo padrão de ava-
par

liação. Eles explicam a origem do tema desse número especial e o nome do


grupo da seguinte forma:
Ed

Este tema teve origem em um seminário com colegas em reunião no


Instituto Santa Fé em março de 2007. Como resultado desse workshop,
são

o “Five Graces Group” (nome dado em homenagem às acomodações


bastante especiais naquele local) produziu um “position paper”,
Língua como um sistema adaptativo complexo, que circulou entre os
10 cientistas, que foram convidados a se concentrar sobre as questões
ver

ali apresentadas, ao considerar suas áreas específicas de linguagem no


congresso do 60º aniversário e em seus trabalhos na edição especial
de Language Learning. (ELLIS; LARSEN-FREEMAN, 2009b, p. VI)
12

O texto do grupo The Five Graces Group2 (BECKNER et al., 2009) foi
produzido por 10 autores e apresenta conceitos básicos sobre a lingua(gem)
como um sistema adaptativo complexo e sobre aquisição de primeira e se-
gunda língua.
Em 2013, foi a vez do Brasil. A Revista Brasileira de Linguística

V
r
Aplicada, organizou um número especial com chamada pública e os textos

uto
aprovados foram publicados no número 2, do volume 13, em 2013. O
número incluiu autores brasileiros e estrangeiros e foi prefaciado por Larsen-
Freeman que conclui que

R
a
a contribuição fundamental de perspectivas da complexidade reside
no seu potencial para oferecer formas alternativas de pensar e abrir

do
nossos olhos para diferentes maneiras de ver nossas salas de aula. Elas
me fizeram questionar e examinar, criticamente, minhas suposições
aC
sobre aspectos de aprendizagem e ensino que foram, inadvertida-

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mente, conceituadas em termos de padrões simplistas, unidirecionais,
são
lineares e geraram uma maior consciência de minha parte sobre a ne-
cessidade de ser flexível, adaptável e sensível à dinâmica em sala de
aula (LARSEN-FREEMAN, 2013, p. 372-373).
i
Outro número especial de periódico brasileiro está, no momento da es-
rev

crita deste texto, com chamada aberta. Trata-se da Revista Virtual de Estudos
or

da Linguagem (REVEL) que publicará, no segundo semestre de 2016, um


número especial com o tema Linguística e Sistemas Complexos.
Assim como Larsen-Freeman (1997) não previu o efeito borboleta de
ara

suas primeiras reflexões, eu também não imaginaria que estaria, em 2016,


imersa em uma rede de linguistas aplicados brasileiros, interessados na pers-
t

pectiva da complexidade, que agrega colegas de vários estados brasileiros.


i

Não previ também que estaria prefaciando o segundo livro3 brasileiro


op

sobre o tema, “Complexidade em ambientes de ensino e de aprendizagem


d

de línguas adicionais”, organizado por amigas queridas e pesquisadoras


competentes, “parceiras de conversas” que fizeram estágio pós-doutoral na
E

Universidade Federal de Minas Gerais.


O pós-doutoramento de Walkyria Magno e de Elaine Borges na UFMG
ver

foram desenvolvidos em épocas diferentes. Ambas deixaram suas marcas


em nosso grupo de pesquisa e contribuíram com ricas reflexões acadêmicas.
2 Como é esclarecido pelos autores, o nome “The Five Graces” se refere ao local onde o grupo de pesquisadores ficou
hospedado em Santa Fé. Vale a pena mencionar, que no site do The Inn of Five Graces, ficamos sabendo que “The Five
Graces” se refere à filosofia Tibetana que diz que fomos agraciados com cinco sentidos para experienciar o esplendor do
mundo” (http://fivegraces.com/about/faqs/)
3 O primeiro livro sobre o tema foi organizado por mim e por Milton do Nascimento (PAIVA; NASCIMENTO, 2009) e teve
financiamento da FAPEMIG.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 13

Fico feliz de ter sido de alguma forma, o elo entre elas e outros pesquisa-
dores, que adotam o caos e a complexidade como uma nova forma de pensar
e que marcam presença neste livro.
Mas como o sistema está sempre em desenvolvimento, é uma alegria
ver que as duas, ao desenvolverem seus próprios grupos de pesquisa, criam

od V
r
novos elos na rede, se associaram e ofereceram a oportunidade para seus

uto
orientandos, jovens pesquisadores, apresentarem suas pesquisas.
“Complexidade em ambientes de ensino e de aprendizagem de línguas
adicionais” apresenta algumas respostas para a pergunta de Lemke e Sabelli

R
(2008): “Como poderíamos, de forma útil, utilizar e conceitos e procedi-

oa
mentos derivados do estudo de outros sistemas dinâmicos complexos para
analisar a mudança sistêmica na educação?” Além das relevantes reflexões
teóricas, o leitor encontrará bons exemplos do uso dos conceitos advindos
aC
dos sistemas dinâmicos complexos na análise de práticas de linguagem, evi-
dências de desenvolvimento de competências em línguas adicionais, análise
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de livro didático, e o aconselhamento linguageiro como um elemento que


dinamiza o sistema de aprendizagem.
visã
Chamo atenção especial para a introdução do livro, onde as organiza-
doras apresentam, de forma clara e precisa, os principais conceitos do caos/
complexidade e que se constituem em fonte de referência para todos que têm
interesse nessa perspectiva.
a re
itor

Acredito que os leitores, serão positivamente atraídos para essa rede


complexa de conhecimentos, e que, depois da leitura desse conjunto de
textos, a exemplo de Larsen-Freeman (2013) quando confrontada com as
perspectivas da complexidade, também se questionem e examinem, critica-
par

mente, seus pressupostos sobre aspectos de aprendizagem e ensino.


Ed
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APRESENTAÇÃO

AS CONDIÇÕES INICIAIS NA CONSTRUÇÃO


DE UMA REDE DE IDEIAS E REFLEXÕES

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uto
Walkyria Magno e Silva (UFPA)
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)

R
No encontro das organizadoras deste livro, proponentes do simpósio

oa
sobre complexidade e aprendizagem de línguas ocorrido no IX Congresso da
Associação Brasileira de Linguística (ABRALIN) em Belém do Pará, surgiu
a ideia de transformar as comunicações apresentadas em um livro que as reu-
nisse, acompanhadas do trabalho desenvolvido por membros dos grupos de
aC
pesquisa coordenados por ambas. A intenção, acalentada ao sabor do tucupi
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em visita acadêmica de Elaine ao Pará logo após o evento, consolida-se no


desenho deste volume para o qual acorreram nossos colegas simposiastas e
visã
demais colaboradores convidados.
Ambas as organizadoras, professoras universitárias, são advindas, em
épocas diferentes, de um pós-doutoramento na Universidade Federal de Minas
Gerais no qual puderam aprofundar os conhecimentos que já tinham sobre
a re

complexidade. A partir desse passo acadêmico, passaram a oferecer, em suas


itor

universidades de origem, cursos ou partes de cursos na pós-graduação sobre o


tema. Ainda, incorporaram ideias desse paradigma em suas aulas na graduação.
Walkyria coordena o grupo de pesquisas intitulado Processos de
par

aconselhamento na aprendizagem de línguas, autonomia e motivação na


perspectiva da complexidade. Este grupo, que congrega alguns colegas da
Faculdade de Letras Estrangeiras Modernas da Universidade Federal do
Pará, seus orientandos de doutorado e mestrado, além de alguns alunos de
Ed

iniciação científica, estuda o aconselhamento em aprendizagem de línguas


são

sob a perspectiva da complexidade. Como objetivo geral deste projeto


espera-se compreender sob o paradigma da complexidade processos mo-
tivacionais, de autonomização e de aconselhamento na aprendizagem de
línguas estrangeiras. São utilizados como instrumentos de pesquisa: sessões
ver

de aconselhamento gravadas (para posterior audição reflexiva), observações


tanto participantes quanto não participantes, produções do aconselhado, nar-
rativas de início e de final de semestres, questionários e entrevistas gravadas
a partir dos quais são posteriormente descritos os sistemas de aprendizagem
de aconselhados e seus subsistemas aninhados.
16

Elaine coordena o grupo de pesquisas Abordagem complexa de ensino


de línguas: estudo e aperfeiçoamento o qual visa um aprofundamento da
compreensão para aperfeiçoamento e/ou modificações de elementos consti-
tutivos da denominada abordagem complexa de ensino de línguas(BORGES;
PAIVA, 2011; BORGES, 2015). O grupo preocupa-se com temas tais como

V
r
linguagem e aquisição de segunda língua como sistema adaptativo com-

uto
plexo; a natureza do ensino/aprendizagem de língua como multifacetado,
orientado pela dinâmica reconstrutiva desse processo como postulado em
diferentes reflexões sobre a construção do conhecimento e pelo processo

R
dialético evolutivo do desenvolvimento da linguagem; o professor como

a
um dos elementos que dá dinamicidade ao processo de ensino e aprendi-
zagem; o desempenho na língua sendo adquirida (e não mais na compe-

do
tência), entendendo-o como individual e auto-organizável: modelo dinâmico
de desempenho; as práticas sociais da linguagem como elementos essenciais
aC
no processo de aquisição de língua; as múltiplas identidades, entendendo-as

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são
como um sistema adaptativo complexo e como fractalizadas; o planejamento
semiótico-ecológico; o ensino e a interação entre professor e aluno como
construtores e restritores de affordances; e a organização autopoiética ou
o produzir-se a si mesmo. Este projeto envolve alunos de mestrado (como
i
também coorientação de doutorado) e de iniciação científica na Universidade
rev

Estadual de Ponta Grossa, no Paraná.


Alguns colegas professores de outras universidades e pesquisadores
or

da aprendizagem de línguas como um sistema adaptativo complexo foram


convidados a colaborar com este volume. Abrangemos assim uma vasta dis-
ara

tribuição geográfica tendo como epicentro a Universidade Federal de Minas


Gerais, que, direta ou indiretamente, contribui para a formação dos autores
t

deste livro. Os pontos de concentração são, naturalmente, as universidades


i

de origem das organizadoras. No entanto, contribuem também colegas do


op

extremo sul, do nordeste e do centro-oeste do país.


d

Os objetivos desta coletânea são divulgar o paradigma da comple-


xidade no ensino e aprendizagem de línguas adicionais, bem como as pes-
E

quisas desenvolvidas, em diferentes vertentes, no âmbito do arcabouço em


questão, pelos grupos e colaboradores aqui destacados. Não há como falar
em complexidade nesta seara sem mencionar os estudos fundadores de
ver

Dianne Larsen-Freeman no panorama mundial e de Vera Menezes no Brasil.


Ambas serão bastante comentadas nos capítulos que se seguem. Entre os
objetivos específicos, buscamos mostrar de que maneira essa nova visão de
desenvolvimento da linguagem pode ser construída em diferentes espaços e
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 17

com diferentes públicos; e como a concepção inovadora da aprendizagem


de línguas como um sistema adaptativo complexo auxilia na explicação de
fenômenos de outra forma de difícil compreensão.
O livro destina-se a alunos de graduação de Letras, pós-graduandos
e professores que nunca deixam de estar em formação. Todos poderão en-

od V
r
contrar nestas páginas um rico material para reflexão. A partir do diálogo

uto
consigo próprios suscitado por este volume poderão talvez compreender
melhor os acontecimentos do cotidiano em suas salas de aula entendidas
como sistemas adaptativos complexos, com inúmeros subsistemas aninhados

R
que as compõem.

oa
Resolvemos dividir o volume em quatro partes: a primeira, intitulada
Práticas de linguagem na perspectiva da complexidade apresenta textos
sobre o desenvolvimento de competências em línguas adicionais, com a
aC
emergência de significados na compreensão escrita, produção oral e no uso
de redes sociais; a segunda, Livros didáticos com foco na teoria da comple-
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xidade, aborda como a visão abraçada pelo volume já se faz presente neste
recurso de aprendizagem na sala de aula do Ensino Fundamental e Médio;
visã
a terceira, Aconselhamento linguageiro como sistema adaptativo complexo,
traz à discussão o elemento do conselheiro na sua relação com o aconse-
lhado no sistema de aprendizagem; e, finalmente, a quarta, Considerações
teóricas complexas, comporta dois capítulos que prescindem de dados para
a re
itor

tecer reflexões com foco na biologia do conhecer e no bilinguismo na edu-


cação do surdo. Devido à coincidência de diversas referências utilizadas
pelos diferentes autores, elas foram agrupadas ao final do volume. Por ser
esta uma obra inovadora em seu tema e abrangência, resolvemos incluir um
par

índice remissivo, o qual poderá ser útil na compreensão da tessitura entre os


capítulos.
Na primeira parte agrupamos os textos a respeito da construção de
Ed

competências e práticas em línguas adicionais, ressaltando como o contexto,


compreendido como parte do sistema, pode contribuir para esse desenvol-
são

vimento. No capítulo um, Rafael Vetromille-Castro aborda a construção


da competência simbólica. Em seguida, capítulo dois, Valdir Silva trata da
aprendizagem em grupos por meio da interação virtual. Finalizando a pri-
ver

meira parte com o capítulo três, Kelly Gaignoux e Michell Gadelha utilizam
a abordagem ecológica para descrever os propiciamentos (affordances) uti-
lizados por alunos de um campus do interior do Pará para aprender inglês.
No capítulo quatro, Leonardo Pereira e Elaine Borges analisam o po-
tencial da abordagem complexa de ensino de língua em atividades propostas
em um livro didático de inglês fundamentado na perspectiva da complexidade.
18

No próximo capítulo, quinto, Kelly Nakayama e Elaine Borges exploram a


interconexão existente entre atividades de um livro didático de espanhol que
se apresenta subsidiado pela transdisciplinaridade.
No sexto capítulo, Eduardo Santos Junior e Walkyria Magno e Silva
descrevem o efeito do aconselhamento na trajetória de uma aluna sob a

V
r
perspectiva de outros agentes de seu sistema de aprendizagem. Segue-se o

uto
sétimo capítulo de Larissa Dantas Borges e Jhonatan Rabelo que trata da
emergência de comportamentos autônomos de aconselhados. A seguir, Maria
Clara Matos e Sádie Morhy exploram os estados atratores na trajetória de

R
aconselhados no capítulo oito; e, encerrando a terceira parte, capítulo nove,

a
o texto de Walkyria Magno e Silva estuda o papel do conselheiro como um
agente no sistema de aprendizagem e seus impactos desse aconselhamento

do
na sua própria trajetória.
Na continuação, o capítulo dez é escrito por Rodrigo Aragão que ex-
aC
plora as conexões entre a complexidade e a Biologia do Conhecer. O outro

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
texto desta quarta parte, escrito por Elaine Borges e Eliziane Streiechen trata
da educação de surdos sob a ótica da complexidade, o que muito pode acres-
centar a esse campo de estudos.
Completam o volume, um capítulo inicial com uma breve explicação
i
dos conceitos fundamentais da complexidade usados nos capítulos (que pode
rev

servir como um pequeno glossário) e um capítulo final, com um balanço do


que os estudos que compõem este livro podem trazer para o avanço desse
or

paradigma no Brasil, bem como projeções de novas pesquisas.


Esperamos somar esforços para que os sistemas educacionais, desde o
ara

nível micro até o nível macro, possam se desenvolver em uma trajetória fa-
vorável, seguindo uma agenda positiva de compreensão e crescimento cons-
t

cientes. É claro que as falhas, embora tratadas, mas possivelmente existentes


i

neste volume, são de total responsabilidade das organizadoras.


op
d

Belém do Pará e Ponta Grossa, Paraná.


Maio de 2016.
E

ver
INTRODUÇÃO

ENTRELAÇAMENTO DE
TEMAS NA COMPREENSÃO

od V
r
DE SISTEMAS CAÓTICOS

uto
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)

R
Walkyria Magno e Silva (UFPA)

oa
Desde o artigo seminal de Diane Larsen-Freeman, Chaos/Complexity
Science and Second Language Acquisition (1997), muitas e novas inquie-
tações surgiram no campo de estudos da linguagem na perspectiva dos sis-
aC
temas dinâmicos caóticos. O livro da mesma autora, em parceria com Lynne
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Cameron, Complex Systems and Applied Linguistics (2008b), consolida o


paradigma da complexidade nas pesquisas na área da Linguística Aplicada
visã
(LA). Em mesma rota, bifurcando para o contexto brasileiro, Vera Menezes
(PAIVA, 2002; 2005a; 2005b) nos convida à reflexão com a proposição de
um modelo fractal de aquisição de segunda língua, seguido por reflexões de
outros temas no âmbito da complexidade como autonomia, metáfora, meto-
a re

nímia, narrativas de aprendizagem, ambientes virtuais, entre outros. A partir


itor

dessas referências – motivadoras dos trabalhos desenvolvidos neste livro em


diferentes vertentes – outras tantas foram surgindo e hoje podemos encontrar
um entrelaçamento de pesquisas em diferentes linhas e tópicos no âmbito da
par

complexidade e linguagem.
Nesta introdução, visamos discutir brevemente e de maneira inter-
-relacionada os principais conceitos e temas que emergem nos capítulos
apresentados neste livro. Para tanto, lançamos mão de algumas referências
Ed

importantes em diferentes áreas do conhecimento e do nosso próprio conhe-


são

cimento sobre a complexidade adquirido como estudiosas dessa temática


há alguns anos. Algumas discussões também foram feitas com especialistas
da área de ciências exatas para uma melhor compreensão e apresentação de
conceitos advindos dessas áreas específicas.
ver

O objetivo desta introdução é uniformizar as definições terminológicas


de uso geral nos capítulos que compõem este livro evitando, assim, repe-
tições desnecessárias e proporcionando uma leitura mais fluida para nossos/
as interlocutores/as. Os/as leitores/as mais experientes na área da comple-
xidade não precisam se demorar nestas páginas, podendo passar, de imediato,
aos capítulos que lhes interessam. Todavia, esta introdução poderá servi-lhes
20

como um pequeno glossário. Alguns conceitos mais específicos, não tratados


aqui, serão devidamente discutidos nos capítulos em que emergem de forma
mais particularizada e contextualizada com as temáticas que os englobam,
momento que ganharão a devida explanação.
Os temas e conceitos aqui expostos e comentados são os que seguem:

V
r
complexidade, emergência, sistema, sistema fechado, sistema aberto,

uto
sistema complexo, sistema não linear, sistema dinâmico, sistema dinâmico
não linear, sistema caótico, sistema adaptativo complexo, linearidade, não li-
nearidade, (co)adaptação, auto-organização, caos, caos determinístico, caos

R
não-determinístico, entropia, condição inicial, variável de estado, dimensio-

a
nalidade, espaço de fases, atrator, bacia atratora, atrator de ponto fixo, atrator
periódico, atrator caótico, fractal, bifurcação e transdisciplinaridade.

do
Feito esse breve preâmbulo, passamos ao detalhamento dos termos
acima apresentados. Para iniciar, gostaríamos de citar uma passagem do
aC
texto de Davis e Sumara (2006, p. 17, itálico e aspas dos autores) que nos

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
insere na discussão terminológica ao sinalizarem que

Atualmente, o movimento que referimos como “pensamento com-


plexo” é mais comumente chamado de ciência da complexidade, um
i
termo que foi adotado no final do século 20 para substituir “teoria da
rev

complexidade”. As razões para a mudança de “teoria” para “ciência”


giraram em torno do desejo de representar a pesquisa complexa como
or

uma abordagem acadêmica e rigorosa para a investigação1.

Em posse da explicação de Davis e Sumara, devemos salientar


ara

que o uso de um ou outro conceito vai depender do jogo de linguagem


t

(WITTGENSTEIN, 1986 [1953]) estabelecido em cada ciência, ou seja,


o significado das palavras é constituído pela função que desempenham no
i
op

contexto de uso. Em um jogo de linguagem, a palavra “não é algo que é


d

representado, mas é um meio de representação” (p. 25). Portanto, qualquer


área do conhecimento tem o seu próprio jogo de linguagem e isso pode ex-
plicar o surgimento de diferentes termos em diferentes ciências cujos signi-
E

ficados são similares. E na LA, ao se discutir a complexidade, não poderia


ser diferente.
ver

Dessa forma, a compreensão geral é de que o que se denomina comple-


xidade, paradigma da complexidade, pensamento complexo e/ou teoria da
complexidade é, na verdade, um movimento científico, uma ciência da com-
plexidade (também denominada nova ciência (GLEICK, 1991)), uma forma
de observar os fenômenos científicos, um complexus de teorias de diferentes
1 Essa e outras traduções nesta introdução são de nossa responsabilidade.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 21

campos de investigação como, por exemplo, as consideradas “progenitoras”


(LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b)2 na emergência desse para-
digma, quais sejam:

1. Matemática: a dinâmica não linear de Henri Poincaré (1880), a ci-

od V
r
bernética de John von Neumann e Norbert Wiener (1940), a teoria

uto
da catástrofe de René Thom (1960) e a geometria fractal de Benoît
Mandelbrot (1975);
2. Física Quântica: o modelo atômico de Niels Bohr (1913) e o prin-

R
cípio da incerteza de Werner Heisenberg (1927);

oa
3. Biologia: a embriologia genética de Conrad Waddington (1940), a
teoria geral dos sistemas de von Bertalanffy (1950) e a teoria da
autopoiese de Humberto Maturana e Francisco Varela (1970);
aC
4. Meteorologia: a teoria do caos de Edward Lorenz (1960);
5. Química: a teoria das estruturas dissipativas (com foco na auto-
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-organização e irreversibilidade) de Ilya Prigogine (1970) – premio


Nobel de Química em 1977;
visã
6. Física Teórica: a teoria da transdisciplinaridade3 de Basarab
Nicolescu (1996);
7. Ciências Cognitivas e Neurociência: a sinergética de J. A. Scott
Kelso e Hermann Haken (1980) e as redes neurais de Timothy van
a re
itor

Gelder e Robert F. Port (1990);


8. Filosofia: o paradigma da complexidade de Edgar Morin (1980);
9. Estudos Multidisciplinares: pesquisas teórico-aplicadas em sis-
temas adaptativos complexos do Instituto Santa Fé no Novo
par

México, Estados Unidos (1980).

Nesse panorama, é no entrelaçamento, principalmente, das teorias


Ed

acima citadas – mas indo além delas, ao conciliar distintas teorias – que
podemos entender o comportamento emergente (resultado de múltiplas e
são

diferentes interações entre vários elementos internos e externos) de sistemas


classificados como dinâmicos caóticos. É, ainda, por meio do pensamento
complexo que emerge uma “nova atitude no estudo de tipos particulares
ver

de fenômenos que é capaz de reconhecer ideias de outras tradições, sem


se amarrar em termos absolutos ou universais” (DAVIS; SUMARA, 2006,

2 Larsen-Freeman; Cameron (2008), no entanto, não citam todas as teorias enfatizadas aqui, como o modelo atômico de
Bohr, o princípio da incerteza de Heisenberg, a geometria fractal de Mandelbrot, a transdisciplinaridade de Nicolescu e a
complexidade de Morin. Entendemos que as teorias acrescentadas são igualmente importantes na contextualização da
emergência do/a paradigma/teoria da complexidade.
3 O termo transdisciplinaridade foi cunhado e primeiramente citado pelo psicólogo Jean Piaget em 1970.
22

p. 4). À vista disso, ainda segundo os autores, é indiscutível que “o pensa-


mento complexo agora oferece uma alternativa poderosa a abordagens redu-
cionistas e lineares de investigação que têm dominado as ciências por meio
milênio – e a pesquisa educacional para mais de um século” (p. xi).
De acordo com Bertalanffy (2009[1968], p. 11), o conceito de sistema

V
r
“pode ser definido e desenvolvido de diferentes formas como requerido

uto
pelos objetivos da pesquisa, e como refletindo diferentes aspectos da noção
central”. De forma geral, porém, um sistema é um conjunto de componentes
cuja interação configura-se em algo maior que seus componentes tomados

R
isoladamente; ou, em outras palavras, é um fenômeno dinâmico que emerge

a
da interação “de muitos subcomponentes ou agentes, cujas ações são, por sua
vez, ativadas e compelidas por contextos similarmente dinâmicos” (DAVIS;

do
SUMARA, 2006, p. x).
No contexto da teoria geral dos sistemas (BERTALANFFY,
aC
2009[1968]), sistemas fechados são sistemas isolados de seu ambiente e,

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são
em contrapartida, um sistema aberto (todo organismo vivo, por exemplo)
é aquele que “se mantém em um contínuo fluxo de entrada e de saída, em
um estado de equilíbrio químico e termodinâmico” (p. 65). Ainda, de acordo
com Bertalanffy, um sistema é um complexo de elementos, sendo a carac-
i
terística somativa ou constitutiva desses elementos que especifica a pro-
rev

priedade do complexo do qual o sistema se constitui. Por um lado, sistemas


que possuem uma característica somativa (linear) mostram um complexo
or

marcado pela soma de elementos considerados isoladamente em um enten-


dimento de que o todo se constitui pela soma das partes ou de que é possível
ara

conhecer o todo ao se compreender as características das partes. O teorema


da superposição, advindo da física clássica, explica a linearidade4 que sub-
t

sidia esse tipo de sistema ao expor que, por exemplo, em um circuito linear
i

com vários geradores de tensão, a soma da corrente gerada isoladamente por


op

cada gerador em um ramo do circuito é igual à corrente total que flui no cir-
d

cuito (BOYLESTAD; NASHELSKY, 1994). Por outro lado, os elementos de


um sistema de característica constitutiva (não linear) são reconhecidos pelas
E

relações entre as suas variáveis, compreendendo-se que o todo é mais que a


soma das partes; ou seja, as características das partes isoladas não explicam
as particularidades do complexo que emerge nas relações que são estabele-
ver

cidas. Esse tipo de sistema se distingue pela sua não linearidade e, do ponto
de vista da física moderna, um sistema não linear é definido como aquele

4 Em álgebra – ramo da matemática que estuda operações matemáticas – uma função (tipo particular de relações) linear,
cujo resultado é uma reta, apresenta a noção de proporcionalidade em qualquer ponto ao longo da reta. Esse conceito
não é verdadeiro em funções não lineares pois estas sempre produzem como resposta comportamentos curvos,
ondulatórios, ou outras estruturas mais complexas.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 23

que não obedece ao princípio da superposição. Neste último caso, temos


também os denominados sistemas dinâmicos não lineares e sistemas caó-
ticos. Sistemas dinâmicos (lineares e não lineares) são aqueles que mudam
ao longo do tempo em referência a seus estados atuais, cuja trajetória de
evolução é especificada pelas condições iniciais. Sistemas caóticos, uma

od V
r
subcategoria de sistema dinâmico não linear, são aqueles altamente sensíveis

uto
às condições iniciais.
O uso do termo sistema adaptativo complexo (SAC), por sua vez, é
mais comum nas ciências biológicas, sociais e da linguagem para salientar

R
uma das principais características dos sistemas vivos, que “aprendem” nas in-

oa
terações com seus elementos internos e externos: a (co)adaptação. Um SAC
é um sistema aberto, complexo, dinâmico, não linear e caótico – que muda ao
longo do tempo – em trocas constantes de energia com o seu ambiente micro
aC
e macro, possibilitando-lhe contínuas (co)adaptações e auto-organizações
culminantes em emergências de padrões peculiares de comportamento (atra-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

tores caóticos) também em permanente mudança. Outras características


importantes de um SAC são a não linearidade, a sensibilidade à variação
visã
das condições iniciais e a imprevisibilidade a longo prazo, sendo que a ins-
tabilidade dos sistemas complexos às pequenas ou grandes mudanças pode
levá-los a comportamentos inesperados, imprimindo-lhes a caoticidade.
Cabe ressaltar que é comum encontrarmos, em diferentes áreas do
a re
itor

conhecimento, como já discutido acima, o uso intercambiável dos termos


sistema dinâmico, sistema caótico, sistema não linear, sistema complexo e
sistema adaptativo complexo. Apesar do inevitável jogo de linguagem pre-
sente nas distintas ciências que se apropriam dessa nomenclatura e seus sig-
par

nificados, existe uma diferença básica, pontuada pelas ciências exatas, entre
cada conceito que está diretamente relacionado às características do sistema
que se quer tratar. A Figura 1 (de nossa inteira responsabilidade) é uma ten-
Ed

tativa de detalhamento dos tipos de sistemas como tratados na matemática e


na física, principalmente.
são
ver
24

Figura 1 - Tipos de sistemas

Simples Característica Somativa LINEAR


NÃO-DINÂMICO
Fechado Complexo Característica Constitutiva NÂO-LINEAR
SISTEMA
Aberto
Simples Característica Somativa LINEAR
DINÂMICO NÃO-CAÓTICO

V
Complexo NÂO-LINEAR

r
Característica Constitutiva
altamente sensíveis
CAÓTICO às condições iniciais

uto
Fonte: Produção das autoras

Na figura em questão, podemos verificar que um sistema não linear pode


ser não-caótico, assim como um sistema complexo pode ser não-dinâmico

R
a
(questões que não vamos aprofundar aqui), sendo esse o motivo pelo qual
optamos pelo uso do termo “sistemas caóticos” no título desta introdução

do
– tendo em vista que englobam a não linearidade e a complexidade, sendo,
ainda, adaptáveis já que altamente sensíveis às condições iniciais. Nos di-
aC
ferentes capítulos que compõem este livro, todavia, poder-se-á aparecer

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


nomenclaturas como sistema complexo, sistema dinâmico, sistema caótico
são
e/ou sistema adaptativo complexo (SAC), mas a noção que se discute em
todas elas – compondo o jogo de linguagem da LA – está fundamentalmente
baseada na compreensão de fenômenos e/ou sistemas cujas características,
i
em seu conjunto, refletem um sistema vivo, aberto, adaptável, complexo,
rev

dinâmico, não linear, caótico e sensível às condições iniciais.


A auto-organização é uma propriedade espontânea e emergente em
or

uma enorme variedade de sistemas (BUSHEV, 1994). Os estudos desse tipo


de fenômeno na natureza emergiram principalmente pelo desenvolvimento da
ara

teoria das estruturas dissipativas (não-equilíbrio) de Prigogine (1977) que des-


creveu a auto-organização “como um processo de formação de estruturas dis-
t

sipativas” (p. 6) pautada pela irreversibilidade. No entanto, conforme Bushev,


i
op

O primeiro uso do termo “sistema de auto-organização” foi feito


d

provavelmente por W. R. Ashby em um artigo de 1947 dedicado à


cibernética. A auto-organização no contexto da cibernética denota a
manutenção (com base nos princípios de retroalimentação) de um de-
E

terminado nível de organização, ou o auto-aperfeiçoamento de sis-


temas que são capazes de acumular experiência passada e dela fazer
ver

uso (p. 7).

Assim, em linhas gerais, a auto-organização em sistemas caóticos


ocorre independentemente das estruturas internas dos componentes cons-
titutivos do sistema, afetando (ou não) essas estruturas no desenvolvimento
de novos níveis de conexões. Em outras palavras, é a forma como o sistema
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 25

reage aos estímulos do ambiente em diferentes escalas e momentos. No en-


tanto, a reação do sistema a essas excitações (gerando seus comportamentos
e revelando possíveis atratores) é marcada pela imprevisibilidade, uma vez
que esse tipo de sistema descreve trajetórias não lineares instáveis que vão
surgindo e se bifurcando em contato com as condições dadas (condições

od V
r
iniciais) pelo próprio ambiente conforme o sistema se desenvolve, e em con-

uto
sequência desse desenvolvimento.
Em matemática, a teoria da bifurcação conceitua a bifurcação como “a
ramificação de soluções estáveis (ou periódicas) em mudanças suaves dos pa-

R
râmetros que caracterizam as influências externas” (BUSHEV, 1994, p. 12);

oa
tendo sido Henri Poincaré, in 1885, o precursor no uso dessa terminologia no
contexto da dinâmica não linear de sistemas, mostrando que esse fenômeno
ocorre quando da mudança na topologia no espaço de fases de um sistema
aC
dinâmico alterando sua estrutura que, por sua vez, é instável (MONTEIRO,
2006, p. 313). Ainda, a bifurcação (cruzamento devido à falha em avançar ao
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

longo de um único caminho) tem um papel importante no grau de evolução


dos sistemas dinâmicos, tendo anexada a ela as fases pré-bifurcação (adap-
visã
tação às variações lentas externas, tendendo à volta ao estado estacionário
inicial) e pós-bifurcação (mudança de atrator) (BUSHEV, 1994).
Os processos subjacentes à auto-organização e à bifurcação, dentre
outros, podem explicar como um sistema passa de uma dada organização
a re
itor

(ordem) a outra (caos), de um tipo de atrator a outro. Em sistemas dinâmicos


o caos é descrito pelo denominado atrator estranho ou atrator caótico, ou
seja, “um sistema dinâmico que apresenta comportamento caótico possui um
atrator estranho no seu espaço de fases” (MONTEIRO, 2006, p. 420, itálico
par

do autor) – questões discutidas nos próximos parágrafos.


A compreensão de caos está potencialmente vinculada ao entendi-
mento entre ordem e desordem e de instabilidade constante em que pequenas
Ed

mudanças iniciais podem provocar variações subsequentes com o tempo.


Caos, ainda, pode ser de vários tipos e de diferentes graus de ordenação,
são

visto que “desordem não é a ausência de qualquer ordem, mas a ausência


de um tipo específico de ordem” (BUSHEV, 1994, p. 96). No entanto, na
mecânica newtoniana, a noção de caos se refere à transgressão da ordem,
ver

não à falta dela, em uma dada relação em que a ordem é primária (permeia o
mundo) e o caos secundário (superficial); ou seja, caos, na ciência clássica,
é a ausência de um tipo específico de ordem, um desvio das regularidades
previstas no que podemos denominar caos determinístico. Na física mo-
derna o critério quantitativo de caos é fornecido pela entropia (grandeza
termodinâmica) – o caos não determinístico – em que a relação causa e
consequência é de natureza estocástica. Nesse último caso, pelos menos em
26

certos sistemas dinâmicos, a ordem é secundária e apenas uma restrição de


caos, já que o caos está dentro da ordem e a ordem no âmago do caos. A
entropia, por sua vez, é “uma medida de degradação de energia” (mensura
o grau de desordem/ irreversibilidade de um sistema) que pode crescer ou
permanecer constante, nunca retroceder, sendo que “quanto maior a entropia

V
r
de um corpo menos trabalho ele é capaz de fazer” – o estado máximo de

uto
entropia é a morte do sistema (BUSHEV, 1994, p. 122). A entropia fornece o
estado atual do sistema, sua evolução (ordem e caos) e estrutura (quantidade
de informação), dentre outras informações.

R
A compreensão do que vem a ser determinístico ou não-determinístico

a
no caos leva-nos também ao que Gleick (1991[1987], p. 19, itálico do autor)
pontua como sendo “a ordem mascarada de aleatoriedade” em sistemas

do
caóticos ou a aparente desordem do caos, sendo necessário voltarmos um
pouco na história da física clássica e moderna. A concepção determinística
aC
dos acontecimentos no mundo e o modelo mecânico do universo, subsi-

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são
diados pelas três leis de movimento (inércia, força e ação e reação) e pela
lei de gravitação universal5 (dinâmica de sistemas de corpos massivos) de
Isaac Newton, foram os pilares da física clássica até o início do século XX.
Todavia, com o advento da física quântica6 e os estudos da dinâmica não
i
linear na mecânica celeste7, pode-se comprovar: a) por um lado, que o com-
rev

portamento das partículas subatômicas não obedecia a lógica newtoniana


sobre o movimento dos corpos; b) por outro lado, que ao se incluir uma
or

terceira órbita nos estudos de corpos celestes com condições iniciais ligeira-
mente diferentes não seria mais possível determinar seus comportamentos a
ara

longo prazo (VOLCHAN, 2007). As contribuições de Poincaré na mecânica


celeste preconizam os fundamentos da teoria do caos que, por sua vez, nos
t

mostra (já nos estudos meteorológicos de Lorenz) que pequenas perturbações


i

(condições iniciais) em um sistema podem gerar grandes consequências – o


op

chamado efeito borboleta. Porém, é somente a partir das condições iniciais


d

dadas que o sistema dilui “o determinismo, tornando o resultado da atividade


do sistema imprevisível” (LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b, p.
E

75) – em todo caso, o estado futuro de um sistema “depende de alguma


forma no estado presente do sistema” e, nesse sentido, “sistemas dinâmicos
são determinísticos” (p. 75).
ver

Para a compreensão do comportamento e/ou estado de um sistema


caótico e da trajetória de seus atratores (um dos estados possíveis do
sistema) é necessário conhecer suas variáveis intrínsecas ou fundamentais,

5 Fundamentada pelo modelo heliocêntrico e das três leis do movimento planetário de Johannes Kepler.
6 Desencadeada pelos estudos de Max Planck, seguidos pelos de Niels Bohr e Werner Heisenberg.
7 Irrompida pelas pesquisas sobre os três corpos celestes de Henri Poincaré.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 27

também chamadas de variáveis de estado, a partir das quais quaisquer


outras variáveis do sistema podem ser determinadas (BOSSEL, 2007).
Por sua vez, a complexidade de um sistema está relacionada ao número
de variáveis de estado necessárias para sua descrição, o que remete à ideia
de dimensionalidade. A dimensão do sistema é definida pelo número de

od V
r
variáveis de estado que o representa, ou seja, o sistema é dito unidimensional

uto
se apresenta uma única variável de estado e n-dimensional se apresenta n
variáveis de estado. Normalmente, cada variável de estado pode assumir
um valor diferente dentro de uma faixa determinada de valores (a faixa de

R
valores é definida de tal forma a produzir resultados fisicamente realizáveis

oa
para o sistema). Assim, qualquer combinação única de valores destas
variáveis resulta em um estado do sistema. Com isso, podemos mapear
todos os estados possíveis do sistema em uma única representação gráfica
aC
em função de suas variáveis de estado. Essa representação (ou mapeamento)
é denominada espaço de fases ou, muitas vezes, espaço de estados – neste
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livro, usaremos os termos como sinônimos entre si. Assim e de forma geral,
o espaço de fases “proporciona uma maneira de transformar números em
visã
imagens, extraindo todas as informações essenciais de um sistema de partes
móveis, mecânicas ou fluídas, e traçando um flexível mapa rodoviário de
todas as suas possibilidades” (GLEICK, 1991[1987], p. 135).
Com base no exposto acima, um atrator pode ser definido como sendo
a re
itor

um comportamento ou estado possível de um sistema dentro de seu espaço


de fases, sendo que sua bacia atratora (SAADATPOUR et al, 2010, p. 643)
é definida como “o conjunto de todos os estados que, se escolhidos como os
estados iniciais do sistema” conduzirá o sistema ao atrator. Uma vez na bacia
par

atratora, o sistema será levado à sua posição de equilíbrio (atrator), estabili-


zando-se até que novas perturbações (novas condições iniciais) ocorram. Os
atratores são classificados em três tipos: ponto fixo, de ciclo limite/ peri-
Ed

ódico e caótico/ estranho (GLEICK, 1991 [1987]) – sendo esse último o que
nos interessa nas discussões neste livro. Os atratores de ponto fixo e perió-
são

dicos mostram, respectivamente, comportamentos que chegam a um regime


estacionário ou que se repetem de forma ininterrupta, sendo essencialmente
estáveis; já os atratores caóticos ou estranhos apresentam comportamentos
ver

instáveis, não previsíveis e, portanto, sensíveis a quaisquer perturbações


(grandes ou pequenas). Apesar do comportamento imprevisível, os atratores
caóticos se auto-organizam em emergentes ordem e estrutura.
Ao discutir sistemas caóticos e atratores estranhos, devemos entender
a caracterização geométrica da dinâmica caótica na natureza. A geometria é
um ramo antigo da matemática que surge para responder como o ser humano
percebe matematicamente o mundo à sua volta em termos de dimensões
28

espaciais. A geometria clássica euclidiana foi precursora no tratamento axio-


mático dessa disciplina científica, estipulando teoremas matemáticos e fi-
guras geométricas planas e simples (retas e círculos, construídos com réguas
e compassos, respectivamente) para a descrição precisa do mundo físico.
A geometria euclidiana trabalha dimensões espaciais dadas por números

V
r
naturais (inteiros) que restringem a descrição de formas mais complexas

uto
encontradas na natureza como, por exemplo, litorais, montanhas e nuvens
(VOSS, 1988). A geometria fractal de Benoît Mandelbrot surge como um
modelo matemático capaz de delinear dimensões fracionadas, fractalizadas,

R
intermediárias àquelas definidas pela geometria clássica, podendo descrever

a
superfícies e formas na natureza em “escalas infinitesimalmente pequenas”
(escalas atômicas), sendo que uma “figura com essa característica é chamada

do
de fractal” (MONTEIRO, 2006, p. 420, itálico do autor). Assim, segundo
Gleick (1991, p. 90),
aC

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são
[a] nova geometria espelha um universo que é irregular, e não re-
dondo; áspero, e não liso. É uma geometria das reentrâncias, de-
pressões, do que é fragmentado, torcido, emaranhado e entrelaçado.
[...] As reentrâncias e os emaranhados são mais do que imperfeições
i
deformantes das formas clássicas da geometria euclidiana. São,
rev

muitas vezes, as chaves para a essência das coisas.


or

No contexto da geometria fractal, fractais são formas geométricas


cujas partes irregulares se autoassemelham (não necessariamente exibindo
a mesma estrutura) em diferentes escalas. Em sistemas caóticos, “fractais
ara

ocorrem nos limites da bacia atratora, onde o sistema está equilibrado em


t

estado crítico na beira do caos, como o monte de areia pouco antes de entrar
em colapso” (LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b, p. 63). Ao final,
i
op

mas não menos importante, discutiremos a transdisciplinaridade.


d

A transdisciplinaridade, embora dissonante das discussões terminoló-


gicas (abordadas acima) sobre sistemas caóticos no panorama das ciências
exatas, se faz necessária no âmbito filosófico. Para o estudo, compreensão e
E

tratamento de fenômenos complexos na esfera educacional, principalmente,


a complexidade é abordada pelo viés transdisciplinar como um procedi-
ver

mento metodológico na compreensão da realidade e na elaboração do conhe-


cimento. A metodologia transdisciplinar “interessa-se pela dinâmica gerada
pela ação de vários níveis de Realidade ao mesmo tempo”, sendo que os
níveis de realidade emergem das diferentes disciplinas; o que mostra que a
transdisciplinaridade “alimenta-se da pesquisa disciplinar que, por sua vez,
é iluminada de maneira nova e fecunda pelo conhecimento transdisciplinar”
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 29

(NICOLESCU, 2000[1996], p. 35-36, itálico do autor). Assim, a transdis-


ciplinaridade “diz respeito àquilo que está ao mesmo tempo entre as dis-
ciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina”,
visando à pluralidade complexa, “[à] compreensão do mundo presente,
para o qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento” (op. cit,

od V
r
p. 35, itálico do autor). A transdisciplinaridade, ainda, objetiva ultrapassar a

uto
concepção da divisão do conhecimento em disciplinas (fragmentação, para-
digma da simplicidade), indo além da interdisciplinaridade (integralização
de conteúdos disciplinares), enxergando o conhecimento como uma rede de

R
interconexões que atravessa e contempla todo o saber já constituído ou em

oa
iminência de formalização.
Com base no que foi exposto acima, esta introdução, como já salientado,
buscou apresentar e discutir os principais conceitos que emergirão na leitura
aC
dos capítulos que compõem este livro, sem, no entanto, ambicionar o esgo-
tamento da compreensão subjacente a cada termo enfatizado. Ainda, poderá
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servir como um pequeno glossário sobre a complexidade.


Na tentativa de um maior acerto na explanação dos termos – envolvendo-
visã
-os, muitas vezes, em uma definição mais técnica – houve uma preocupação
com a consulta à literatura na área de matemática e física, entre outras, bem
como uma discussão, mesmo que breve, com profissionais alinhados a esses
campos de conhecimento8. A par da descrição terminológica mais técnica –
a re
itor

aproximada às suas ciências de origem – o/a leitor/a poderá notar a adequação


e fluidez dos termos nas redações dos capítulos, uma vez assimilados e já
compondo o grande jogo de linguagem nos estudos da linguagem. Entretanto,
nossa inquietação em apresentar uma formalização mais técnica nesta intro-
par

dução é respaldada na preocupação do rigor à apropriação adequada dessa ter-


minologia na LA, principalmente, para a construção de um arcabouço teórico
robusto e correto para o campo, como ora sinalizado por Larsen-Freeman e
Ed

Cameron (2008b) e exposto a seguir para o fechamento desta seção.


Se por um lado, a aceitação do paradigma da complexidade nas ciências
são

humanas e sociais está em plena ascensão no universo científico mundial;


por outro, os avanços de pesquisa nesse paradigma no contexto brasileiro
também se mostram em várias publicações provenientes de estudos de dife-
ver

rentes grupos de pesquisa nas universidades brasileiras. Todavia, a maioria


dos conceitos sobre sistemas caóticos, discutidos aqui, provêm das ciências
exatas, entrando no jogo de linguagem nas demais ciências como metáforas
para a reflexão dos fenômenos socialmente compartilhados entendidos como

8 Agradecemos as profícuas discussões com o Prof. Dr. Ben-Hur Viana Borges do Departamento de Engenharia Elétrica e
Computação da Universidade de São Paulo.
30

sistemas adaptativos complexos. O uso metafórico desses conceitos na LA,


por sua vez, (que pode ser estendido a outras ciências) traz uma questão
importante levantada por Larsen-Freeman e Cameron (2008b) e que deve ser
levada em consideração: não estariam os linguistas aplicados apenas sendo
metafóricos ao discutirem e escreverem utilizando-se das ideias da comple-

V
r
xidade? Entendemos que a resposta é não, considerando a ênfase, dada pelas

uto
próprias autoras, ao ponto levantado por Lakoff e Johnson (2001, p. 124) de
que metáforas se constituem em um domínio conceitual que governa nossos
pensamentos, sendo que “o que fazemos todos os dias é uma questão de

R
metáfora”. Aqui voltamos a Wittgenstein (1986[1953]) para salientar que os

a
linguistas aplicados (e estudiosos da área de humanas em geral) certamente
utilizam-se da terminologia dos sistemas caóticos como mais do que metá-

do
foras porque a nova nomenclatura passa a fazer parte do jogo de linguagem da
LA (ou da ciência que o pesquisador faz parte). Larsen-Freeman e Cameron
aC
(2008b, p. 15) colocam, ainda, que “a teoria da complexidade servirá ao

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são
linguista aplicado como mais do que uma metáfora se ela funcionar como
uma ponte que nos leva a uma nova maneira de pensar ou a um arcabouço
teórico que é rigorosamente desenvolvido no campo”. Enxergamos, então,
que só conseguiremos atravessar a ponte se a compreensão dos conceitos da
i
complexidade for assertiva e, por esse motivo, nos empenhamos no desen-
rev

volvimento desta introdução que se converte nessa ponte para a leitura dos
capítulos que seguem, principalmente para os leitores menos aclimatados
or

com a complexidade.
ara
di t op
E

ver
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ver
Ed
são
itor
par aC
PARTE I
a re
visã R
od V
oa
uto
r
PRÁTICAS SOCIAIS DE LINGUAGEM
NA PERSPECTIVA DA COMPLEXIDADE
E d
ver

i t or op
ara aC
rev
i são R V
do
a uto
r
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CAPÍTULO 1

COMPETÊNCIA COMUNICATIVA E
COMPETÊNCIA SIMBÓLICA:

od V
r
um olhar sobre a complexidade no

uto
desenvolvimento linguístico

R
oa
Rafael Vetromille-Castro (UFPEL)

1 Introdução
aC
Conforme é apresentado na introdução da presente obra, desde a publi-
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cação do artigo de Larsen-Freeman na Applied Linguistics em 1997, os mais


diversos fenômenos da linguagem, especialmente aqueles ligados a seu uso
visã
social, tem sido estudados pela perspectiva das Teorias da Complexidade
e do Caos (TC/C). Formação de professores, desenvolvimento linguístico,
práticas docentes e discentes em sala de aula de língua são apenas algumas
das temáticas já observadas pelo prisma da Complexidade. Há na literatura
a re

inúmeras motivações para a aplicação de um olhar complexo sobre questões


itor

da Linguística Aplicada, mas, pessoalmente me é bastante caro como justi-


ficativa o posicionamento de Morin (MORIN; LE MOIGNE, 2000, p.201),
que declara que o pensamento complexo não recusa resultados oriundos da
ciência clássica, mas dialoga com eles e os complementa, quando procura
par

atuar em seus “buracos negros”. Em minha ótica, uma das “zonas de sombra”
do paradigma clássico é a tendência de competição, de sobreposição ou de
descarte de conceitos anteriormente desenvolvidos frente a novas propo-
Ed

sições. É dentro desse contexto que contesto eventual divergência conceitual


são

e, ao contrário, busco estabelecer pontos de contato entre conceitos já am-


plamente reconhecidos no campo do desenvolvimento linguístico, como os
de competência comunicativa, e o de competência simbólica, pioneiramente
proposto por Kramsch em 2006 e 2008, dentro de uma perspectiva com-
ver

plexa. Pretendo argumentar sobre como aspectos da competência comuni-


cativa desempenham papeis importantes ligados à epistemologia complexa
para o desenvolvimento da competência simbólica. Em outras palavras, to-
mando o uso social da linguagem como uma manifestação ecológica (VAN
LIER, 2004), entendo que a competência comunicativa e seus constituintes
34

(CANALE; SWAIN, 1980) podem propiciar a emergência da competência


simbólica, a qual aparentemente surge como mais maleável e sensível aos
contextos sociais.

2 A competência simbólica: breve histórico, estado da arte e primeiras

V
r
aproximações complexas

uto
Quando Kramsch apresentou, em 2006, o conceito de competência sim-
bólica, no artigo From Communicative Competence to Symbolic Competence,

R
ele veio como resposta à suposta insuficiência do conceito de competência

a
comunicativa para lidar com situações que vão além da mera comunicação,
mas que envolviam, entre outras habilidades, a capacidade de o usuário de

do
dada língua em mover-se nos jogos de poder estabelecidos pela linguagem.
aC
Um dos argumentos que sustentava a proposta era o de que a competência
comunicativa havia sido reduzida à modalidade falada e tal redução estaria

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são
sendo usada como desculpa para eliminar a gramática e retirar muita da
responsabilidade instrucional do professor. Outro argumento era o de que
a educação em língua estrangeira abandonara questões primordiais ligadas
ao Ensino Comunicativo de Línguas (doravante CLT1), como a busca por
i
justiça social por meio da competência comunicativa, para servir a objetivos
rev

instrumentais, em nome da demonstração de evidências da eficácia da abor-


or

dagem (KRAMSCH, 2006, p. 250-1).


Em minha leitura, Kramsch pretendia, de certo modo, que o conceito de
competência simbólica contribuísse para o resgate da “agenda educacional
ara

do Ensino Comunicativo de Línguas” (KRAMSCH, 2006, p. 250). A autora


defendia que os três componentes2 da competência simbólica “levariam
t

professores a ver língua e cultura, vocabulário e suas conotações culturais,


i

textos e seus pontos de vista, como inseparáveis3” (op. cit., p. 252).


op

Em 2008, Kramsch publicou ao lado de Whiteside o artigo Language


d

Ecology in Multilingual Settings. Towards a Theory of Symbolic Competence,


no qual apresentam a seguinte definição para competência simbólica:
E

ver

1 Opto por usar a sigla do termo em inglês Communicative Language Teaching por ser amplamente conhecido na área de
Linguística Aplicada.
2 Os três componentes da primeira versão de Competência Simbólica: Produção de Complexidade, Tolerância a
Ambiguidade e Forma como Significado.
3 Trecho original: “These three components of a symbolic competence should lead teachers to view language and culture,
that is, grammar and style, vocabulary and its cultural connotations, texts and their points of view, as inseparable. In turn,
language learners should slowly understand that communicative competence does not derive from information alone, but
from the symbolic power that comes with the interpretation of signs and their multiple relations to other signs. Essa e todas
as demais traduções são de responsabilidade do autor.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 35

“A habilidade de não apenas aproximar-se ou apropriar-se da língua


de outros, mas de modificar o contexto no qual a língua é aprendida e
usada”4. (KRAMSCH; WHITESIDE, 2008, p. 664)

“A competência simbólica poderia assim ser definida como a habilidade

od V
r
de dar forma ao jogo multilíngue no qual se investe – a habilidade de
manipular as categorias convencionais e normas sociais de veracidade,

uto
legitimidade, seriedade, originalidade – e reenquadrar o pensamento e a
ação humanos”5. (KRAMSCH; WHITESIDE, 2008, p. 667)

R
Três anos mais tarde, em 2011, Kramsch coloca a competência sim-

oa
bólica como a habilidade de manipular as três dimensões do discurso como
um sistema simbólico: a representação simbólica, a ação simbólica e o poder
simbólico. No mesmo artigo, a autora declara que a competência simbólica
aC
extrapola a competência semiótica (VAN LIER, 2004 apud KRAMSCH,
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

2011, p. 359) quando pressupõe que o usuário da língua vá além da inter-


pretação de “eventos conforme verdades acordadas por convenção”. A com-
visã
petência simbólica permitiria ao usuário o engajamento no jogo de poder
simbólico que a linguagem estabelece, ao ponto de ser capaz de “confrontar
significados estabelecidos e redefinir o real” (KRAMSCH, 2011).
Ainda no texto de 2011, a pesquisadora trata do ensino de línguas
voltado para a competência simbólica a partir de sua observação em salas
a re
itor

de aula e das implicações do conceito para a formação de professores de


línguas. Também desenvolverei minha reflexão em torno da sala de aula,
tratando dos desdobramentos de um possível plano de atividades de compre-
ensão textual e buscando estabelecer pontos de contato com meu argumento,
par

a saber, a competência simbólica como sistema adaptativo complexo (do-


ravante SAC) emerge a partir de elementos da competência comunicativa.
Por enquanto, o que é importante na breve revisão feita acerca do conceito
Ed

de Kramsch é perceber o quanto a competência simbólica é uma entidade


são

maleável, sensível ao contexto, dependente de interação seja ela verbal, se-


miótica ou emocional6.
4 Trecho original: “the ability not only to approximate or appropriate for oneself someone else’s language, but to shape the
ver

very context in which the language is learned and used”.


5 Trecho original: “Symbolic competence could thus be defined as the ability to shape the multilingual game in which one
invests—the ability to manipulate the conventional categories and societal norms of truthfulness, legitimacy, seriousness,
originality—and to reframe human thought and action”.
6 Hoje, mais do que em qualquer tempo, temos inúmeros exemplos dos mais variados tipos de interação, os quais extrapolam
aquela de natureza verbal. Porém, quando são observadas aulas ministradas sob a perspectiva do CLT, tendo, portanto, o
objetivo de desenvolvimento da competência comunicativa, o que se vê na maior parte dos casos é a prevalência, quase
exclusividade, do trabalho com interação verbal. É deixado em segundo plano (quando chega a ser abordado) o trato de
questões semióticas (VAN LIER, 2004) e emocionais (GARDNER; HATCH, 1989; MAYER; ROBERTS; BARSADE, 2008)
na comunicação em qualquer idioma ou cultura, questões que influenciam direta e fortemente o desenvolvimento da
competência simbólica.
36

Essa sensibilidade ao contexto e a dependência da interação traz à tona


uma primeira semelhança que a competência simbólica guarda com um
SAC: a imprevisibilidade. É consenso entre professores de línguas, mor-
mente aqueles que trabalham dentro do arcabouço teórico e metodológico
do CLT, que grande parte da interação que acontece em ambiente formal de

V
r
aprendizagem consegue ser nada além de uma simulação, de um ensaio, de

uto
mise-en-scène, para aquilo que, de fato, pode acontecer em contextos reais
de comunicação. No mesmo sentido, vários linguistas aplicados (PAIVA,
2010; VAN LIER, 2004) veem o desenvolvimento linguístico7 como um

R
fenômeno decorrente de affordances (as quais podem estar dentro ou fora

a
da sala de aula). As affordances, “naturais ou culturais, diretas ou indiretas,
são relações de possibilidade entre usuários da língua. Elas podem ser postas

do
em prática para tornar outra ação linguística possível”8 (VAN LIER, 2004,
p. 95). Em sendo possíveis, com o perdão pela obviedade, poderão ou não
aC
receber a materialidade da expressão ou compreensão na língua. Nessa ótica,

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são
dentro daquilo que lhe cabe no confinamento do espaço de aula (presencial
ou a distância, faça-se o registro), o professor de línguas simplesmente
fornece affordances por meio das atividades que propõe, não importa o
quanto de aproximação com a realidade elas tragam. Assim, o trabalho do
i
professor sobre a competência simbólica como conteúdo de sala de aula, de
rev

instrução formal, não passa de um conjunto de atividades, de possibilidades,


que poderá levar à emergência da competência simbólica na interação do in-
or

divíduo em dado contexto. Entendo que esse entendimento encontra suporte


importante também na definição que Van Lier faz mais adiante no mesmo
ara

texto de 2004:
t

“[Affordances] são relações de possibilidade, o resultado da percepção


de um objeto, enquanto co-percebendo a si mesmo. Em outras pa-
i
op

lavras, o que eu percebo é percebido da forma como aquilo é relevante


d

para mim. Nessa visão, a percepção, ação e interpretação são parte


de um processo dinâmico”9 10. (p. 105)
E

ver

7 Ao longo do texto, dou preferência para o uso do termo desenvolvimento linguístico em vez de aprendizagem de línguas
por compartilhar com Larsen-Freeman e Cameron (2008, p.115) o entendimento de que a competência em línguas (L1
ou L2) é um processo em constante modificação, não havendo um constructo definido, estanque e perene que permita
declarar que o indivíduo aprendeu ou não dado idioma de forma definitiva.
8 Trecho original: “[...] language affordances, whether natural or cultural, direct or indirect, are relations of possibility
between language users. They can be acted upon to make further linguistic action possible”.
9 Grifo meu.
10 Trecho original: “They are relationships of possibility, the result of perceiving an object while co-perceiving oneself. In other
words, what I perceive is perceived as it is relevant to me. In this view, perception, action and interpretation are part of one
dynamic process”.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 37

Em suma, além de aquilo que é oferecido e consumido na sala de aula


ser fruto da percepção e ela ser um processo individual sensível ao contexto, a
passagem de affordance para realização é um processo dinâmico. Dinâmico,
que se opõe a estático, define o comportamento dos sistemas adaptativos
complexos e/porque demonstra, entre outras qualidades, seu caráter impre-

od V
r
visível e de constante mutação. Portanto, a competência simbólica, como

uto
realização de dadas affordances, é um processo dinâmico, uma emergência
possível, sistêmica, contextual e imprevisível.
A seguir, me dedico ao argumento central do capítulo, a saber, como

R
compreendo que a competência comunicativa e seus elementos constituintes

oa
são condições para a emergência da competência simbólica. Para tal fim,
pretendo abordar características dos SAC e alguns exemplos de uma sala
de aula baseada em princípios do CLT, além de, obrigatoriamente, tratar de
aC
outros aspectos do jogo de poder simbólico que inexoravelmente faz parte
do uso social da linguagem.
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3 Competência comunicativa e a emergência da competência simbólica


visã
Em 2015, Kramsch e Whiteside realizaram conferência no Berkeley
Language Center11, reapresentando a noção de competência simbólica e
discutindo como ela tem sido abordada no campo da Linguística Aplicada
a re
itor

desde 2008. Na ocasião, Kramsch declarou que a competência simbólica


tem sido compreendida por diferentes autores e trabalhos basicamente como
constructo teórico, habilidade de jogar o jogo de poder simbólico na vida
cotidiana e prática pedagógica de sala de aula. Para meu propósito aqui,
par

concentrarei minhas considerações especialmente em torno da prática de


sala de aula, embora fique evidente, ao longo do texto, suas implicações para
a habilidade do jogo de poder simbólico cotidiano.
Ed
são

3.1 Complexidade e competência comunicativa: contextualizando a perspectiva

Antes, porém, é preciso tratar de dois aspectos centrais: o arcabouço


teórico da Complexidade que será utilizado (além do que já consta na in-
ver

trodução da obra) e a definição de competência comunicativa que dará


base às considerações a que me proponho tecer. Em relação ao primeiro,
é inescapável referir ao trabalho de Larsen-Freeman e suas reverberações

11 O evento da Universidade da Califórnia/Berkeley, realizado em 20 de novembro de 2015, pode ser acessado em: <http://
blc.berkeley.edu/2015/08/19/lectures-by-c-kramsch-a-whiteside-november-20-2015/>. Há a íntegra do evento, bem como
materiais relacionados.
38

(LARSEN-FREEMAN, 1997; MALLOWS, 2002; MEARA, 2006;


LARSEN-FREEMAN & CAMERON, 2008b; PAIVA, 2006; 2008; 2015;
PAIVA; BRAGA, 2008; VETROMILLE-CASTRO, 2008; 2011; 2013) pelo
pioneirismo da aproximação entre Linguística Aplicada e Complexidade,
mas especialmente porque o retrato dos fenômenos da linguagem traçados

V
r
por ela sob a perspectiva complexa outrora ainda os descreve de modo sa-

uto
tisfatório. Isso quer dizer que poderá ser feita menção a características como
não linearidade, sensibilidade a condições iniciais, abertura, sensibilidade
a feedback, auto-organização, além da imprevisibilidade, da qual já tratamos

R
anteriormente. Meu propósito aqui, ressalto, não é associar todos traços de

a
um SAC e um objeto e descrevê-lo peremptoriamente como um sistema
– seja a interlíngua, a sala de aula ou mesmo a competência simbólica.

do
Primeiro, porque isso já foi feito quando se fala de interlíngua (NUNES,
2014) e sala de aula (VETROMILLE-CASTRO, 2008; MARTINS, 2009).
aC
Segundo, porque já parto do pressuposto – demonstrado pelas considerações

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são
que faço desde o início do capítulo – de que a competência simbólica é um
sistema aberto, suscetível a feedback, movido pelas condições iniciais e sen-
sível ao contexto, auto organizado de modo não linear e imprevisível.
A reboque, também vejo como fundamental remeter ao pensamento
i
de Bertalanffy (1973), em sua Teoria Geral dos Sistemas, quando diz que
rev

os sistemas são regidos por regras de baixo nível. Tais regras, de natureza
pouco maleável, seriam responsáveis por estabelecer limites que propi-
or

ciariam a emergência de comportamentos sistêmicos. As regras de baixo


nível, em minha ótica, guardam semelhança com as restrições possibilita-
ara

doras (DAVIS; SIMMT, 2003), as quais são comparadas com regramentos


de um jogo que, por limitarem certas ações, permitem que tal jogo aconteça.
t

No mesmo trabalho, Davis e Simmt apontam outras condições para a emer-


i

gência sistêmica, as quais também serão aludidas: diversidade interna, re-


op

dundância, controle descentralizado e interações locais. De maneira breve,


d

apresento, a seguir, cada uma delas.


Conforme a perspectiva complexa adotada por Davis e Simmt, as
E

“regras do jogo”, as restrições possibilitadoras, permitem que certos com-


portamentos sistêmicos emirjam. Entretanto, as interações locais que
levam à emergência e concorrem para sua sobrevivência ou falência são
ver

propiciadas pela constante alternância entre equilíbrio e desequilíbrio ou,


em outras palavras, pelo estado de equilíbrio dinâmico. Ainda que hajam
restrições possibilitadoras influenciando os comportamentos dentro de um
dado sistema, o poder descentralizado que é inerente e exercido por cada
elemento sistêmico é imprevisível, gerando ora agrupamentos, ora tensões.
A tendência do sistema em buscar esse equilíbrio é a auto-organização em
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 39

cena, motivada pelas semelhanças que os elementos sistêmicos guardam


entre si. Tal semelhança é a redundância demandada para que as partes in-
terajam e se organizem como um complexo. Entretanto, são as diferenças
que os componentes possuem – a diversidade interna – que causam o de-
sequilíbrio e a consequente busca por novo equilíbrio e que, como decor-

od V
r
rência desse processo, leva o sistema a desenvolver-se. Ou seja, os sistemas

uto
complexos necessitam do poder agregador da redundância, mas demandam
igualmente de diversidade interna para serem levados ao limite do caos e
atingirem novos estados de desenvolvimento.

R
Buscando demonstrar que a competência simbólica é uma emergência

oa
da competência comunicativa, será preciso estabelecer relações principal-
mente entre a última, seus constituintes e os diversos elementos ligados à
Complexidade. Entretanto, é essencial declarar qual competência comu-
aC
nicativa usaremos como referência na argumentação, uma vez que desde
os anos 70 o termo tem recebido inúmeras releituras (HYMES, 1972;
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CAMPBELL & WALES, 1970; CANALE & SWAIN, 1980; CANALE,


1983; CELCE-MURCIA, 2007), algumas vezes complementares, outras,
visã
conflitantes. Aqui, opto por aludir ao trabalho de Canale e Swain (1980), à
adição feita por Canale (1983) e à versão de Celce-Murcia (2007). Assim,
durante a argumentação, faço menção livre a competências como a grama-
tical, sociolinguística, estratégica, discursiva, sociocultural e interacional
a re
itor

como constituintes de uma única competência comunicativa. Faço isso por


entender que, em relação aos trabalhos supracitados, as noções apresentadas
pelos autores se somam e não se contrapõem.
par

3.2 “Warrior” ou “terrorist”? A emergência da competência simbólica


em uma atividade de leitura
Ed

Passo então a observar uma possível atividade de sala de aula para


aprendizes de inglês como língua adicional. Trata-se de uma atividade de
são

compreensão textual, baseada em um texto publicado em 5 de janeiro de


1993 no jornal britânico The Independent. O artigo, integrante da seção
“Mundo” e assinado por Robert Fisk, traz o título “Anti-Soviet warrior puts
ver

his army on the road to peace: The Saudi businessman who recruited mu-
jahedin now uses them for large-scale building projects in Sudan. Robert
Fisk met him in Almatig12”. Em resumo, a publicação mostra a história de
um empresário saudita que recrutara e treinara árabes para confronto com

12 “Guerreiro anti-soviético coloca seu exército na estrada para a paz: empresário saudita que recrutou mujahedin agora os
utiliza para projetos de construção de larga escala no Sudão. Robert Fisk o encontrou em Almatig”.
40

a já extinta União Soviética e, após vencida a batalha, deslocara-se com


seu exército para o Sudão, onde construía estradas e outras obras de grande
porte para o povo daquele país13. Já no título, é possível vislumbrar ativi-
dades que busquem desenvolver a competência estratégica, como a proposta
aos aprendizes para que identifiquem cidades e países (Sudan, Almatig) a

V
r
partir de letras maiúsculas. De forma associada, poderá vir a associação com

uto
adjetivos pátrios (Soviet, Saudi). Ainda em se tratando de estratégias, há a
exploração da palavra mujahedin14, a qual provavelmente demandaria a adi-
vinhação de palavras pelo contexto ou uma pergunta para ser respondida

R
com a leitura da matéria completa.

a
O título ainda dá espaço para a exploração do nome do jornalista.
Dependendo do grupo de alunos, seus interesses e conhecimento prévio,

do
pode ser interessante e relevante explorar quem é Robert Fisk – um jornalista
inglês renomado, ganhador de inúmeros prêmios pelo seu trabalho como
aC
correspondente no Oriente Médio e que mora há mais de 25 anos em Beirute.

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
Essa informação pode levar o aluno-leitor a estabelecer relações importantes
entre o título e a matéria como um todo, já que há repetidas referências a
países como Afeganistão e Arábia Saudita.
Penso que seja bastante evidente o papel que também a competência
i
gramatical e seu desenvolvimento tem em toda a atividade de compreensão
rev

textual, uma vez que, em associação com outras competências, e ela que
permitirá em maior ou menor grau que o aprendiz-leitor perceba a estrutura
or

frasal e a identificação de sujeito, verbo e objeto, a conjugação verbal, os


diferentes tempos verbais e suas influências na narrativa. Essa consideração
ara

é válida para todo o texto, inclusive no título, quando há a alternância entre


presente simples e o passado simples. Em tempo, parece plausível consi-
t

derar que a discussão sobre o uso do presente para tratar de fato passado
i

seja também uma forma de trabalhar com a competência sociolinguística


op

na identificação de gêneros textuais e suas implicações, já que esse tipo de


d

artifício é bastante comum no gênero jornalístico.


Aspectos de coesão e coerência – típicos da competência discursiva –
E

emprestam ao leitor recursos importantes quando ele é capaz ou levado a


construir a habilidade de estabelecer as relações entre os fatos da narrativa,
como eles se desenrolam no texto jornalístico e são tecidos pelos meca-
ver

nismos de linguagem empregados pelo autor. As descrições da vestimenta,


do cenário em que se dá a entrevista, a pontuação escolhida e outros aspectos

13 O texto completo em sua versão eletrônica pode ser acessado em: <http://www.independent.co.uk/news/world/anti-soviet-
warrior-puts-his-army-on-the-road-to-peace-the-saudi-businessman-who-recruited-mujahedin-1465715.html>.
14 Mujahedin é o termo plural traduzido do árabe como combatente, alguém que se empenha na luta, podendo ter conotação
religiosa ou não.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 41

que são detectáveis no âmbito do discurso e que concorrem para a compre-


ensão textual (do artigo dessa atividade e, desejosamente, de outros lidos
pelo aluno futuramente).
Todas as estratégias acima ganham sentido especial, quando ou se for
possível recorrer a competência sociocultural, fazendo alusão, por exemplo, ao

od V
r
conflito que está implícito na notícia – a Guerra do Afeganistão (1979-1989).

uto
A influência que a competência sociocultural pode ter fica ainda mais evidente
quando o leitor é capaz de trazer para o seu processo de compreensão o histórico
do principal personagem da reportagem, principalmente se lhe for dado acesso à

R
versão impressa da notícia (o que ajudaria muito aqueles que porventura tenham

oa
pouca memória para nomes), cuja imagem15 reproduzo:

Figura 1 – imagem da matéria publicada no The Independent


aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

visã
a re
itor
par
Ed
são

Fonte: acesso livre via Google a partir de pesquisa com o título da matéria.

Via de regra, uma aula de compreensão textual em língua inglesa


em que fosse possível articular as competências que rapidamente ilustrei
ver

(e que certamente podem ser aprofundadas em uma aplicação real) seria


considerada como pelo menos “aceitável” conforme os princípios do CLT.
Possivelmente, haveria debate (ou debates) ao longo da aula, desejosa-
mente na língua alvo, com uma possível proposta de produção oral (afinal,

15 A versão impressa apresenta uma foto do “guerreiro anti-soviético” ilustrando o texto, o que não acontece na versão online.
42

é altamente recomendável que se integre as quatro habilidades!): o “julga-


mento simulado” do personagem, com alunos formando grupos que se po-
sicionariam contra Bin Laden pelos seus crimes contra a humanidade ou
a favor pelo seu altruísmo nas construções de infraestrutura em um país
africano.

V
r
Entretanto, ao considerar que é preciso permitir ao aluno o engajamento

uto
no jogo de poder simbólico que a linguagem estabelece, ao ponto de ser capaz
de “confrontar significados estabelecidos e redefinir o real” (KRAMSCH,
2011), entendo como fundamental explorar os mecanismos por meio dos

R
quais tal jogo acontece nesse texto. Tal exploração poderia acontecer como

a
produção oral ou escrita, mas consideraria especialmente importante que se
abordasse o fato de o jornalista ter utilizado, em 1993, palavras como anti-

do
-Soviet warrior (termo quase épico!), businessman, construction engineer,
agriculturalist e Saudi entrepeneur. O que isso significa? Por que não foram
aC
usadas palavras como terrorrist, rebel, mercenary ou mesmo uma menos es-

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são
tigmatizante como dissident, todas amplamente usadas para referir a Osama
Bin Laden dez anos após a publicação em tela? Que estranhamento e inter-
pretações são possíveis em torno do fato de a palavra “peace” aparecer como
resultado da obra do ora “guerreiro” Bin Laden? Outras questões relevantes
i
se colocam em torno da origem do texto. Quem era o jornalista? Teria havido
rev

algum erro de julgamento na escolha das palavras, mesmo sendo um pro-


fissional experiente e reconhecido por sua cobertura dos fatos no Oriente
or

Médio? E o jornal que publicou a matéria, haveria alguma implicação de


sua linha editorial ou nacionalidade sobre o conteúdo? Aqui temos aspectos
ara

que podem propiciar ao leitor a percepção de que o uso de certos termos em


detrimento de outros, em associação com elementos aparentemente extra-
t

textuais, leva à compreensão do jogo de poder simbólico que é estabelecido.


i

Saber que o The Independent é um jornal inglês, “de centro-esquerda [...]


op

mas que tende a posições pró-mercado em questões econômicas16”, e que o


d

Reino Unido era, à época, alinhado com os Estados Unidos na Guerra Fria e
apoiador do Afeganistão na guerra contra União Soviética permite (embora
E

não garanta) que o leitor perceba que a escolha de termos não negativos (e
até épicos, como “warrior”) para referir a Bin Laden em 1993 não é gratuita,
tampouco isenta. Isenção não existe quando se fala em uso da linguagem,
ver

principalmente quando se tem Bourdieu (1991)17 nas bases da noção de com-


petência simbólica.

16 Original retirado da Wikipedia: “The Independent is regarded as coming from the centre-left, on culture and politics, but
tends to take a more pro-market stance on economic issues” (https://en.wikipedia.org/wiki/The_Independent).
17 Uma das questões postas por Bourdieu e que tem ligação direta com o conceito de competência simbólica é aquela que
vê a manifestação por meio da linguagem como uma prática moldada e gerada pelo habitus – um conjunto de disposições
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 43

Não resta dúvida quanto ao fato de que haveria muitos outros aspectos
a explorar no que tange à competência simbólica, assim como em relação
à competência comunicativa na hipotética atividade apresentada: a profun-
didade da discussão, o nível de proficiência do grupo, tempo de aula, dentre
tantos mais. Entretanto, esse não é o propósito aqui. Em primeiro lugar, há a

od V
r
intenção de demonstrar que a competência simbólica que pode emergir das

uto
reflexões propostas acima é uma ação linguística. A compreensão, pelo aluno-
-leitor, de parte ou da totalidade das implicações decorrentes das escolhas do
jornalista (e do editor, talvez), acontece porque/quando os indivíduos con-

R
seguem materializá-la por meio da linguagem. Porém, para além disso está

oa
o próprio posicionamento crítico que o indivíduo venha a assumir a partir da
compreensão que construiu, o qual poderá ser expressado – pela linguagem
– no seu grupo de amigos, na mesa de bar, na rede social, na própria sala de
aC
aula ou quando assistir o jornal na TV. Em suma, a compreensão e o posi-
cionamento crítico a que refiro aqui denotam competência simbólica e são
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

ações linguísticas, auto organizadas complexamente por meio das interações


entre conhecimento prévio, nível de interlíngua, historicidade, ética e outros
visã
elementos sistêmicos em cada aprendiz.
Colocada a competência simbólica como ação linguística, retomo a
referência a Van Lier (2004, p. 95), que vê as affordances como relações
de possibilidade que podem ser postas em prática para tornar outra ação
a re
itor

linguística possível. A competência simbólica que cada aprendiz venha a


construir nesse cenário hipotético só terá sido possível porque compreendeu
em grau minimamente elaborado as estruturas frasais, os tempos verbais, o
léxico, elementos típicos da competência gramatical. Ou seja, remetendo às
par

condições para a emergência sistêmica nos moldes de Davis e Simmt (2003),


a redundância entre aquilo que o aluno encontrou no texto e aquilo que já
sabia permitiu que processo de compreensão emergisse.
Ed

As próprias regras gramaticais podem ser vistas como as restrições pos-


sibilitadoras de Davis e Simmt (2003) ou, referindo a Bertalanffy (1973),
são

como as regras de baixo nível, vistas como menos maleáveis e mais perenes
do que condições iniciais. Parece-me a metáfora da maleabilidade bastante
propícia ao tratar das regras da língua – é sabido que mudanças (sintáticas,
ver

semânticas, morfológicas ou de outras ordens) na organização do sistema


linguístico acontecem, mas demandam movimento robusto, constante e de
médio ou longo prazo no uso que dado grupo faz da linguagem18 (além de o
movimento ser imprevisível, outro traço complexo).

inculcadas durante um longo processo de experiência do indivíduo em dado contexto social. Mais sobre habitus pode ser
encontrado na seção Editor’s Introduction de Language and Symbolic Power (BOURDIEU, 1991, p. 12-13).
18 Em português, um exemplo comum é o desenvolvimento do pronome de tratamento vossa mercê, utilizado no século XV,
44

Da mesma forma contribuíram para a compreensão ações ligadas à


competência estratégica, quando o indivíduo consegue lidar com palavras
desconhecidas como mujahedin a partir de seu conhecimento prévio ou do
contexto no qual a palavra se insere. Aqui, temos a condição de diversidade:
aquilo que é diferente, que é novo no sistema, o perturba, causa seu desequi-

V
r
líbrio, o empurra para o limite do caos, condição essencial para as modifi-

uto
cações sistêmicas.
Ao mesmo tempo em que condições iniciais podem ser identificadas
no suposto plano de aula e suas instruções e restrições possibilitadoras na

R
própria estrutura da língua que limita aquilo que é escrito, lido e dito, cada

a
indivíduo gerará desdobramentos únicos, regidos pela sua própria condição
e historicidade, demonstrando o quanto o poder da aprendizagem é, de fato,

do
descentralizado. Não falo aqui do poder simbólico exercido pelo professor,
pela instituição, pelos diferentes status que orbitam em um grupo social.
aC
Aqui trata-se de um poder que se pode apenas provocar, mas não controlar,

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são
que é o poder propiciado pelas condições psicológicas, históricas, sociais,
intelectuais. O que resulta das interações locais – do indivíduo com o texto,
do indivíduo com as questões do professor, do indivíduo com os demais
colegas em aula – é imprevisível e regido por esse poder descentralizado.
i
As eventuais contribuições que cada aluno traz para a discussão sobre
rev

a história de Bin Laden, as questões provocativas do professor sobre o peri-


ódico e sobre a escolha das palavras, a colocação de dados geopolíticos no
or

processo de reflexão, representam uma variedade de elementos que se vin-


culam à competência sociocultural. Aliás, aqui, penso que seja válido uma
ara

breve reflexão sobre o que se entende (ou deveria ser entendido) por compe-
tência sociocultural. É lugar comum o discurso entre profissionais do ensino
t

de línguas frisar a importância de os aprendizes conhecerem as peculiaridades


i

da sociedade e da cultura dos países nos quais se fala a língua em estudo.


op

Entretanto, em um mundo cada vez mais conectado e que tem idiomas, como
d

o inglês, considerados como “língua dos negócios” ou “língua da ciência”,


vejo como alerta pertinente que se entenda a importância de se expandir o
E

escopo da competência sociocultural para além dos grupos que usam a língua
alvo como língua materna, incluindo aqueles que a utilizam como língua
adicional ou são por ela retratados. Nesse cenário, portanto, pode ser insu-
ver

ficiente conhecer o poder de ironia do povo inglês; mais proveitoso talvez


fosse entender a relação entre mujahedin, jihad e muçulmanos da Croácia19.
De qualquer forma, os aspectos da competência sociocultural trazidos para

para o pronome você (ou até mesmo cê, comum na produção oral em certos contextos informais).
19 Aqui, seleciono livremente três termos usados no texto que podem ter relação estabelecida para fins de leitura da matéria,
mas que não possuem ligação direta ou especial com minha argumentação no capítulo.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 45

o momento da aula se associam àqueles das demais competências em um


processo ao mesmo tempo coletivo (porque pode ser influenciado por todos
os alunos e professor) e individual (porque a historicidade de cada aluno é
única) e, como affordance, poderá permitir a emergência de novos compor-
tamentos, de um novo espaço de fase que contempla, entre outras novidades,

od V
r
também a eventual competência simbólica.

uto
4 Competência simbólica: dos rudimentos à obra prima de cada dia

R
Um dos pontos a favor do qual procurei argumentar e que merece ser

oa
retomado é o fato de a competência simbólica ser um construto que se cons-
titui de modo complexo e, portanto, emerge a partir das interações entre
diversos elementos e outras affordances que o contexto oferece. Dentre esses
aC
elementos, estão as ações (planejadas pelo professor ou não) em torno das
diversas competências constituintes da competência comunicativa as quais
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

entregam affordances para o usuário, de forma que ele possa individual e


visã
contextualmente constituir-se competente em relação a um dado jogo de
poder simbólico.
Prossigo minha retomada sobre essa construção complexa fazendo re-
ferência a um programa especial da BBC em homenagem a David Bowie
em ocasião de sua morte. No documentário20, o ex-produtor Tony Visconti
a re
itor

mostra o processo de criação da canção Heroes, revelando, por exemplo, que


toda a melodia foi concebida antes de haver uma letra ou um título. Além de
outras curiosidades especialmente interessantes para aqueles que gostam de
música ou do artista, o produtor isola, por meio de canais de uma mesa de
par

engenharia de som, cada inserção instrumental feita e indica em que ponto


da música eles foram inseridos, conforme o autor ia percebendo a interação
entre os elementos da canção. Em dado momento, até um rolo metálico de
Ed

fita para gravação foi utilizado e “tocado” pelo produtor na gravação original
como se fosse um cow bell21.
são

Se fossem ignorados o histórico e a intenção do programa e fosse acom-


panhado cada instrumento ou som separadamente, como foram gravados, não
se consideraria como obra prima o que seria ouvido de cada canal da mesa
ver

de som. E isso se deve ao fato de cada som em separado não se constituir


como obra prima sozinho. É nesse aspecto que a imagem da canção Heroes
se aproxima da forma como vejo a relação entre competência comunicativa
e competência simbólica: questões gramaticais, estratégicas, socioculturais

20 O programa completo, com duração de 20 minutos, pode ser acessado em: http://www.bbc.co.uk/programmes/
p03g18sx?ns_mchannel=social&ns_campaign=bbc_arts&ns_source=twitter&ns_linkname=scotland
21 Instrumento de percussão que produz som semelhante aos sinos que costumavam colocar nos pescoços das vacas.
46

e de discurso são básicas e por isso primordiais para que o indivíduo possa
engajar-se no jogo de poder simbólico que a linguagem estabelece, ao ponto
de ser capaz de “confrontar significados estabelecidos e redefinir o real”
(KRAMSCH, 2011). Entretanto, a obra prima de cada aula só pode surgir,
aos olhos de professor e alunos, quando o uso da linguagem transcende o

V
r
que é palpável em cada elemento da competência comunicativa e se organiza

uto
como um caleidoscópio, de maneira única, em capacidade de pensamento
crítico, de confronto ao que está estabelecido pela linguagem, de redefinição
do real. Nesse aspecto, a competência simbólica que emerge encontra eco na

R
frase aristotélica que recorrentemente define organizações complexas – “o

a
todo é maior do que a simples soma das suas partes”. Ou seja, não é apenas
a pronúncia, as quatro habilidades comunicativas, o conhecimento sociocul-

do
tural, mas a forma como tudo isso se amarra individual e contextualmente a
partir das affordances que o meio provê e da historicidade de cada indivíduo.
aC
Quando se percebe a competência simbólica como uma possibilidade de

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
emergência da competência comunicativa, se permite ao professor o desem-
penho não apenas de facilitador ou provedor de conhecimento, mas aquele de
perturbador (VETROMILLE-CASTRO, 2011). As perturbações geradas pelo
professor tem a função de propiciar affordances, que gerarão resultados impre-
i
visíveis. As perturbações são propiciadas por meio de cada atividade proposta
rev

(como as diversas atividades e questões que propus no plano hipotético), das


suas falas, das suas reações, manifestações as quais podem contribuir para
or

que o aluno construa suas competências. Ao causar múltiplos desequilíbrios,


o docente está levando os aprendizes ao limite do caos e, desejosamente, à
ara

reorganização sistêmica em outro espaço fase, a novos atratores. De modo


mais prático, a atuação do professor como perturbador pode ser compreendida
t

como aquilo que Park (2015, p. 11) sugere como ação do professor de línguas:
i

a inculcação de uma consciência crítica entre os alunos, através da transfor-


op

mação da sala de aula em um espaço de questionamento acerca da linguagem


d

e de suas conexões com relações de poder.


Ao abordar a aula de leitura que trouxe para o capítulo, procurei de-
E

monstrar que os rudimentos da língua – identificados aqui como os diversos


elementos que caracterizam a competência comunicativa – são fundamentais,
mas é possível e desejável ir além e perseguir a obra prima que pode ser a aula
ver

de cada dia. Como educador, também vejo no entendimento da competência


simbólica como uma emergência da competência comunicativa uma possibi-
lidade de ressignificação do papel do professor de línguas. Quando o docente
desempenha a função de perturbador e transcende a posição mercadológica
de um mero especialista em determinada língua que provê conteúdos a quem
não os tem, o professor está também se reposicionando dentro dos diversos
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 47

jogos de poder simbólico nos quais está imbricado, mas deixo essa discussão
para outro momento. Em suma, parar naquilo que chamo aqui de rudimentos
é limitar o acesso dos aprendizes e dos professores a affordances, ignorar
aquilo em que eles podem se constituir – cidadãos mais independentes para
contextos globais – e deixar a obra-prima que se pretende ter ao final de cada

od V
r
aula incompleta.

uto
Agradecimento

R
O presente capítulo é resultado de pesquisa desenvolvida em estágio

oa
pós-doutoral na Universidade da Califórnia, em Berkeley, sob a supervisão
da Dra. Claire Kramsch e com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (CAPES), processo n. 99999.000774/2015-04.
aC
Presto meu agradecimento à pesquisadora pela riqueza da interlocução e à
agência de fomento pelos recursos financeiros essenciais para a realização
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da pesquisa.
visã
a re
itor
par
Ed
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rev
i são R V
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a uto
r
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
CAPÍTULO 2

GRUPO COMO SISTEMA


ADAPTATIVO COMPLEXO:

od V
r
um estudo das práticas de ensino e

uto
aprendizagem no contexto do Facebook

R
oa
Valdir Silva (UNEMAT)

Considerações iniciais
aC
As profundas e significativas transformações sociais, econômicas, polí-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

ticas, culturais e tecnológicas que estamos vivenciando no mundo atual são,


em sua grande maioria, efeitos das tecnologias digitais: a internet, os compu-
visã
tadores pessoais e, mais recentemente, os dispositivos móveis, como os tablets
e os celulares smartphones. Estas tecnologias estão moldando a sociedade
contemporânea e contribuindo para a emergência e consolidação daquilo que
Weinberger (2003) denomina de era da conexão, caracterizada pela emer-
a re

gência da computação ubíqua e difusa possibilitada pelas tecnologias móveis.


itor

Para o autor, ser “conectado está no cerne da nossa democracia e nossa eco-
nomia. Quanto maior e melhor forem essas conexões, mais fortes serão nossos
governos, negócios, ciência, cultura e educação” (p. 1).1
Estar conectado significa estar em rede, ou seja, interligado por nós
par

que tornam possível a união, a comutação, a troca, a transformação. Estar


conectado através das tecnologias vigentes é uma das características da
sociedade contemporânea. É uma perspectiva que permite dizer que a era
Ed

da conexão é um conceito que se alinha ao pensamento do físico Stephen


são

Hawking, quando diz que o século XXI é o século dos estudos da comple-
xidade. Podemos dizer, a partir desse entendimento, que o físico defende,
então, que se produzam pesquisas amparadas por modelos teóricos e me-
todológicos que não negligenciem – apaguem – a natureza complexa dos
ver

fenômenos do mundo, sejam eles químicos, físicos, biológicos ou sociais.


Como apresentado na Introdução deste livro, a ciência da comple-
xidade, conforme Souza (2015, p. 9):

1 Esta e todas as demais traduções de citações neste texto são de minha responsabilidade.
50

[...] é uma abordagem relativamente nova na ciência, que integra co-


nhecimentos de diferentes áreas, na busca por entender o comporta-
mento coletivo em sistemas vivos e fenômenos que abrangem muitos
elementos com diferentes formas de inter-relação e com efeitos em
várias escalas.

V
r
Como se pode verificar, trata-se de uma proposição que se aplica

uto
também aos estudos dos processos de interações sociais efetivados em todos
os contextos sociais. No caso deste trabalho, o foco está nas trocas ocorridas
no contexto de um grupo constituído no Facebook (doravante FB), voltado

R
a
para as práticas de ensino e aprendizagem sobre linguagem e tecnologia em
um curso de licenciatura em Letras.

do
Para Sued (2010, p. 60), o FB é “um espaço emergente da convergência
de meios de comunicação preexistentes, culturas colaborativas e audiências
aC
participativas”. Nessa direção, Santaella (2014, p. 38) diz que, em sua arqui-

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


tetura, o FB:
são
[...] incentiva o usuário a ver e prestar atenção no que fazem, pensam,
dizem, querem e sentem seus amigos. É possível, inclusive, compar-
tilhar e disseminar essas informações. Nesse ambiente, o usuário nunca
i
está só. Seu perfil é um lugar social entre seus amigos, de modo que as
rev

identidades são construídas na soma das interações com os outros.


or

De acordo com Paiva (2016, p. 68), o FB é uma “boa amostra virtual do


mundo real” por conter vários aspectos análogos às redes sociais dos con-
ara

textos presenciais. Em linhas gerais, uma rede social é uma construção social
constituída de pessoas ou organizações conectadas por um ou vários tipos de
t

relações e que compartilham entre si, valores e objetivos comuns. Recuero


i

(2006, p. 26) reforça esse entendimento quando diz que “[...] uma rede social
op

é definida como um conjunto de dois elementos: atores (pessoas, instituições


d

ou grupos; os nós da rede) e suas conexões (interações ou laços sociais)”.


No entendimento da autora, as conexões se configuram como umas das prin-
E

cipais propriedades de uma rede social. Logo, são as conexões que precisam
ser tomadas como foco para estudos, pois são as variações das conexões que
ver

alteram as estruturas dessas redes. É evidente que as duas modalidades de


rede sociais – real e virtual – apresentam características que precisam ser
estudadas em seus próprios termos.
O FB é uma rede social inerentemente complexa e dinâmica, já que sua
estrutura está em constante mutação, em função das interações e interativi-
dades dos sujeitos que podem, em virtude de suas ações internas, provocar a
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 51
emergência de novos estados organizacionais do sistema da rede. É uma rede
dependente de dinamizadores linguísticos, ou seja, sua materialidade na tela
dos suportes digitais é de língua(gem) em todas as suas modalidades e plas-
ticidade. Trata-se de um espaço de práticas sociais que vai ao encontro do
conceito de cibercultura de Levy (2010, p. 168) quando diz que os modelos
de estruturas sociais contemporâneos conduzem à imagem de um sistema

od V
r
que se apresenta aberto, contínuo, em fluxo, não linear, que se organiza de

uto
acordo com os objetivos ou contextos decorrentes das posições que os su-
jeitos ocupam ou querem ocupar dentro dele, através de ações linguageiras,
como, por exemplo, postagem de mensagens, ideogramas, imagens, vídeos,

R
links e ações como visualizações, cutucadas e compartilhamentos.

oa
Sobre isso, é pertinente a ponderação de Paiva (2016, p. 68), quando diz
que se trata de um sistema que “[...] está em constante processo de mudança
e de adaptação. O sistema é sensível a feedback. Os participantes aprendem
aC
uns com os outros e reagem a retornos. Assim, o sistema aprende, muda
evolui e se adapta [...]”. Um exemplo desse processo de adaptação ocorreu
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

recentemente com o próprio FB, ao disponibilizar para os seus usuários,


novos botões para expressarem suas reações. Ou seja, para além de seu
visã
icônico (curti), agora é possível também expressar os seguintes sen-
timentos: (amei), (haha), (uau), (triste) e (Grr). Em
outros termos, estes botões apontam que a estrutura técnica do FB está su-
jeita a modificações e, consequentemente, a uma amplificação de seus níveis
a re
itor

de complexidade em decorrência dos processos de interação social. Por


exemplo, o botão (triste) pode ser agora utilizado para expressar tristeza
ou condolências para uma situação de luto, pois antes, o único emoticon dis-
par

ponível para expressar tais sentimentos era (curti). Há ainda, a inserção


de botões temporários para que os usuários reajam em datas comemorativas,
como foi o caso do botão (flor) em homenagem ao dia das mães.
Estas mudanças mostram que o FB é uma ferramenta de interação social
Ed

sujeita a adaptações, como efeito direto e indireto das dinâmicas produzidas


são

pelos milhões de sujeitos que nele se inscrevem. É um processo que carac-


teriza o FB um Sistema Adaptativo Complexo (SAC).
Os SAC, de acordo com Holland (1995), dizem respeito aos sistemas
ver

que são capazes de se autoconfigurarem para se adaptarem às características


correntes do processo ou do ambiente em que estão inseridos, ou seja, sis-
temas que atingem a solução através de sucessivos ajustes e interações.
Conforme Silva e Silva (2015, p. 294), nos SAC torna-se contradi-
tória a vigência da dinâmica centralizadora e hierarquizada, uma vez que
não se tem apenas um sujeito dinamizador, mas um conjunto deles e todos
52

estão aptos para contribuir na solução de um problema, compartilhar infor-


mações ou conhecimentos de interesse do sistema. Nesse sentido, a diver-
sidade (HOLLAND, 1995; VAN LIER, 2004) e a redundância (DAVIS;
SUMARA, 2006) se configuram em dois aspectos cruciais para a dinâmica
e complexidade do sistema. Quanto maior a diversidade dentro do sistema,

V
r
mais robusto ele é. Ou seja, a ambiguidade, o paradoxo e a contradição

uto
configuram-se em forças que criam novas possibilidades para a evolução do
sistema. Por seu turno, a redundância, refere-se à capacidade dos sujeitos,
enquanto agentes do sistema, substituírem funcionalmente o outro em si-

R
tuação de desestabilização do sistema. Conforme Silva (2008), trata-se de

a
uma assunção espontânea e, portanto, imprevisível como mecanismo de ma-
nutenção da estabilidade do sistema. Nesta direção, os SAC abrigam uma

do
inteligência distribuída, que na definição de Lévy (1998, p. 28), configura-se
em “uma inteligência distribuída por toda parte do sistema, incessantemente
aC
valorizada, coordenada em tempo real, que resulta em uma mobilização

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
efetiva das competências” e da dinâmica complexa do sistema, no caso deste
trabalho, da rede social FB.
Nessa direção, o FB é um sistema que abriga em seu interior uma das
mais importantes propriedades de um sistema adaptativo complexo: a emer-
i
gência. A emergência, conforme Holland (1995, p. 28), refere-se a ideia de
rev

que “a ação do todo é maior do que a soma das partes”. Nos termos de Morin
(1977, p. 137), a emergência “configura-se como sendo as qualidades ou as
or

propriedades de um sistema que apresenta um caráter de novidade com re-


lação às qualidades ou propriedades dos componentes isolados ou dispostos
ara

diferentemente em outro tipo de sistemas”. Para Gomes (2015, p. 187), com


base em seus estudos sobre rede evolutiva marcada pela heterogeneidade
t

entre agentes e interação local, como é o caso do FB, diz que nestas redes:
i
op

[...] os agentes aprendem, adaptam-se e evoluem à medida que vão


d

estabelecendo relações uns com os outros, e não há qualquer tendência


para que o sistema permaneça numa posição de equilíbrio, uma vez
que os agentes podem sempre voltar a uma posição de sentimento
E

anterior, dependendo de com quem vão interagir em seguida. Este


resultado de ausência de equilíbrio demonstra como a complexidade
ver

pode emergir a partir de um pequeno conjunto de regras de interação.

Apesar de o FB não ter sido concebido como um espaço para as práticas


de produção formal de conhecimento, como é o caso, por exemplo, da pla-
taforma Moodle e Teleduc, nos últimos anos tem sido exponencial o número
de pesquisas referenciadas no âmbito das redes sociais, em especial o FB,
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 53

como é possível de se verificar em Araújo e Leffa (2016), entre outros. Essa


apropriação é decorrente de nossa percepção e constatação sobre como esse
sistema é estruturado e o que nele é possível de se produzir. Ou seja, somos
nós que vemos e apropriamo-nos dele para significá-lo como um espaço
legítimo de práticas de ensino e aprendizagem, pelo fato de se tratar de um

od V
r
sistema dependente das tramas tecidas pelos sujeitos que nele se inscrevem

uto
por meio da linguagem. Um perfil criado no FB para práticas de ensino e
aprendizagem pode ter o mesmo funcionamento ecológico de uma sala de
aula de uma instituição educacional. Tudo vai depender do projeto de curso

R
concebido pelo professor e legitimado pelos alunos.

oa
Nessa direção, Sartori e Roesler (2014, p. 126) dizem que o FB:

[...] possibilita a experimentação de novas abordagens metodológicas,


aC
a aprendizagem colaborativa que extrapola o trabalho realizado em
sala, principalmente o desenvolvimento de habilidades relacionadas à
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comunicação e produção coletiva, como escrever de modo objetivo,


esperar a resposta do outro, realizar a síntese do que foi exposto.
visã
[...] por envolver a contribuição de todos os envolvidos e reunir in-
formações de diversas fontes e linguagens, o ambiente do Facebook
proporciona a construção de conhecimentos além dos propostos pelo
professor, diversificando a discussão, viabilizando aprendizagens di-
ferentes para contextos pessoais diferentes dos estudantes.
a re
itor

Fundamentado em Schaller (2008, p. 69), posso dizer que o FB con-


figura-se de fato em um lugar propício a aprendizagem, pois os sujeitos
o transformam em “uma realização, uma produção, uma criação coletiva,
par

um projeto comum, fundador de laços sociais e recriador de um imaginário


social”. Para o autor, cada elo da rede pode se tornar um evento, uma bi-
furcação, traduzindo a inteligência coletiva dos atores e os processos de
Ed

historização aos quais se submetem as práticas, as experiências e as ações


transformadoras desses sujeitos.
são

Norteado pelas reflexões sobre a apropriação do FB como um sistema


virtual de aprendizagem, à luz dos Sistemas Adaptativos Complexos, tenho
por objetivo analisar e dar visibilidade aos processos de resiliências adapta-
ver

tivas e os níveis de complexidade de dez pequenos grupos constituídos por


alunos matriculados na disciplina Linguagem e Tecnologia, ofertada na mo-
dalidade semipresencial no VIII semestre do Curso de Licenciatura Letras/
UNEMAT2/Cáceres, no segundo semestre de 2014. Ou seja, pretendo ana-
lisar, em primeiro lugar, em que medida as decisões tomadas pelos

2 Universidade do Estado de Mato Grosso


54

participantes afetaram a dinâmica organizacional interna dos pequenos


grupos (os encontros presenciais e virtuais; os espaços físicos; as mídias
utilizadas; as pesquisas realizadas; o processo de delimitação do conteúdo;
a colaboração; os métodos, as estratégias e os procedimentos didáticos ado-
tados; a mediação dos debates, etc.) e, em segundo, os efeitos desses grupos

V
r
para a dinâmica e complexidade do grande grupo Linguagem e Tecnologia.

uto
Toda a análise será conduzida com base: a) nas respostas dadas pelos alunos
no questionário aplicado no final da disciplina; b) nas mensagens postadas no
Grupo Linguagem e Tecnologia pelos alunos/grupos ao longo da disciplina; c)

R
nos dados quantificados das ações realizadas pelos alunos em cada um dos semi-

a
nários e; d) nos relatos dos alunos realizados nos encontros presenciais.
Tendo em vista que toda discussão aqui proposta terá como foco a

do
dinâmica complexa e adaptativa dos pequenos grupos constituídos para a
disciplina Linguagem e Tecnologia, torna-se pertinente, então, a pergunta: o
aC
que é um grupo?

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
Conforme Rodrigues (2004), o termo grupo é de origem alemã e signi-
ficava cacho, molho, pilha, saco, ou seja, sugere um conjunto de coisas ou de
pessoas. Ocorre que um grupo, em particular o constituído de pessoas, é algo
muito mais complexo do que um simples agrupamento de pessoas. Para Kurt
i
(1988), um grupo não se define pela simples proximidade ou soma dos seus
rev

membros, mas como um conjunto de pessoas interdependentes.


De acordo com Hansen, Warner e Smith (1976, p. 5), para se ter um
or

grupo, torna-se necessário que haja dois ou mais sujeitos interdependentes se


inter-relacionando com propósitos em comum. Para os autores:
ara

[...] os integrantes de um grupo partilham atitudes e valores comuns,


t

aceitam-se uns aos outros e relacionam-se uns com os outros. Aceitam


a pertença no grupo para lidar com os problemas que têm em comum,
i
op

assim como para satisfazer algumas necessidades individuais.


d

Para Kurt (n/d[1948]), “o caráter de interdependência dos sujeitos de um


grupo é que o transforma num todo dinâmico”. Segundo o autor, isso significa
E

que qualquer mudança em uma das subpartes do grupo irá modificar o estado
de todas as suas outras partes. Com base nesses entendimentos, um grupo pode
ver

ser compreendido como um sistema complexo, adaptativo e dinâmico. Isso


significa dizer que um grupo é muito mais do que a simples soma dos seus
componentes, conforme assinala Hartley (1997, p. 157). Com o propósito de
explicar o conceito de grupo dentro de uma perspectiva complexa, o autor faz
uma interessante analogia entre grupo e as propriedades da água:
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 55

[...] não podemos trabalhar as características da água, simplesmente


conhecendo tudo acerca do hidrogénio e do oxigénio, que são os seus
componentes. É o modo como as moléculas se combinam, que dá à
água a sua característica distintiva. Também as pessoas serão pro-
priedade de grupos sociais, que não podem ser simplesmente previ-

od V
r
síveis, somando as características dos componentes individuais, exis-
tindo processos de grupo que podem ser descritos e que não dependem

uto
simplesmente das características individuais dos membros do grupo.

Frente ao exposto e com o propósito de apresentar o contexto sistêmico

R
oa
de atuação dos grupos, nas seções que seguem apresento uma descrição do
funcionamento da disciplina Linguagem e Tecnologia, para, na sequência,
produzir uma série de análises para mostrar os diferentes níveis de funciona-
mento sobre a dinâmica, adaptabilidade e complexidade dos grupos.
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

1 As condições iniciais: em meio às (in)certezas visã


A opção de trabalhar com o FB teve início na constatação de os alunos
terem algum tipo de tecnologia digital móvel (notebooks, tablets e celu-
lares smartphone). Dos 38 alunos, 68% se conectavam a internet via ce-
lular smartphone. Trata-se de um percentual que corrobora os números da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (BRASIL, 2013), mostrando
a re
itor

que 53,6% dos domicílios acessam a internet através de telefones celulares


e 17,2% via tablet, e, dos 28 milhões de estudantes do país, 68% das escolas
públicas e 96,3% das escolas privadas utilizavam a internet. Devido à preca-
riedade do sistema de rede sem fio disponibilizado pela instituição, constatei
par

que os alunos se conectavam à internet por meio de serviços de operadoras


de telefonia.
Para o desenvolvimento do trabalho foi criado no FB um grupo privado
Ed

denominado Linguagem e Tecnologia3. Essa modalidade de grupo permite


são

que apenas as pessoas adicionadas se conectem umas com as outras, postem


e compartilhem mensagens, fotos, vídeos, arquivos, entre outras funções dis-
ponibilizadas pelo sistema.
A primeira atividade com os alunos consistiu na apresentação deta-
ver

lhada do Plano de Trabalho previsto para o semestre (60 horas), tais como:
a) a adoção da modalidade semipresencial; b) o uso do FB como espaço
de práticas de ensino e aprendizagem; c) o trabalho com grupos para os
seminários on-line e presenciais; d) os temas definidos para os seminários;
e) o cronograma para a realização dos seminários e para as aulas simuladas;

3 <www.facebook.com/groups/1478272225764624>.
56

f) os prazos a serem cumpridos para o envio dos planos de trabalho dos


grupos (seminários e aulas simuladas) e os formulários de avaliação. Após a
apresentação teve início uma conversa com o propósito de debater e dirimir
todas as dúvidas dos alunos, pois a proposta de trabalho era diferenciada e,
em certa medida, estranha para eles.

V
r
Esse rigor no planejamento da disciplina pode parecer contraditório no

uto
âmbito dos Sistemas Adaptativos Complexos, porém, trata-se de uma esta-
bilidade importante para a organização sistêmica do trabalho. O que não se
pode perder de vista é o fato de estar lidando com um sistema que pode se

R
desestabilizar em virtude da diversidade e dinâmica das partes e do todo que

a
conformam um sistema complexo. Ou seja, trata-se de um sistema sujeito
aos efeitos das contradições, ambiguidades e paradoxos que configuram as

do
forças que criam novas possibilidades para a emergência de novos estados
de reorganização. Nessa direção, pensar em restrições possibilitadoras,
aC
como sugerem Davis e Sumara (2006), torna-se uma perspectiva bastante

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
pertinente para se compreender a dinâmica de um sistema. Esse conceito
pode até parecer incongruente, mas faz sentido quando tomado pela lente
da complexidade porque reconhece que os sistemas sociais são governados
por normas – ordem instaurada – que estão sempre sujeitas a eventos que
i
possibilitam novas reconfigurações sistêmicas.
rev

Para que a proposta de trabalho funcionasse como eu desejava, era fun-


damental que fosse validada por todos os alunos, já que uma única recusa
or

poderia comprometê-la. Dependendo da situação, eu teria que fazer um tra-


balho a parte para não prejudicar o aluno ou até mesmo abandonar a proposta
ara

se a quantidade de alunos contrários fosse expressiva. Por essa razão, uma


pergunta para os alunos era fundamental: quem não tinha um perfil no FB.
t

A pergunta, marcada por uma negação, foi proposital, visto que eu queria
i

orientar uma resposta afirmativa, ou seja, uma resposta que, do meu ponto
op

de vista, seria previsível por acreditar que todos os alunos tinham perfis no
d

FB. Porém, minha expectativa foi angustiosamente perturbada, uma vez que
três alunos responderam de forma negativa, alegando que simplesmente não
E

gostavam de se expor na internet. Era uma posição que eu tinha que res-
peitar. Como se tratava de três alunos extremamente sensíveis e abertos para
o diálogo, expliquei a eles que trabalharíamos em um grupo fechado e que
ver

eles podiam criar um perfil provisório, que apenas nós conheceríamos e que,
depois de concluído o trabalho, eles podiam deletá-lo. Com esse encami-
nhamento e graças à postura resiliente dos três alunos, foi possível, então,
instaurar e dar continuidade ao planejamento proposto.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 57

2 Os grupos de trabalho: dinamizadores do sistema

Para este trabalho, dei a liberdade para que os 38 alunos formassem


pequenos grupos com, no máximo, quatro participantes. Após a criação dos
grupos, realizei o sorteio dos temas com os quais iriam trabalhar nos semi-

od V
r
nários on-line e presenciais e nas aulas simuladas, bem como, a ordem das

uto
apresentações dos grupos, conforme mostrado na Tabela 1:

Tabela 1 - Temas e número de participantes dos grupos

R
oa
aC
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visã
Fonte: O autor.
a re
itor

Após a constituição dos grupos, todos foram orientados para focarem


os debates teóricos de seus respectivos temas na perspectiva linguística e
no âmbito das práticas de ensino e aprendizagem no contexto da Educação
par

Básica. Todos os dez seminários foram previamente planejados pelos grupos


e encaminhados para a minha análise. Para esse trabalho, eles tiveram duas
semanas para pesquisarem sobre o tema e liberdade para pensarem suas pro-
posições de seminários. Orientei que, obrigatoriamente, todos os seminários
Ed

deveriam ter um texto e um vídeo sobre os temas e o grupo responsável pelo


são

seminário deveria postar e mediar, ao longo da semana, no mínimo, três pro-


vocações para serem debatidas pelos demais grupos. Durante esse processo,
os grupos contavam com o meu acompanhamento off-line, ou seja, através
ver

da caixa de mensagem do próprio FB (inbox) eu conversava com os inte-


grantes do grupo e orientava sobre os mais diferentes aspectos que, do meu
ponto de vista, precisavam ser considerados para tornar o seminário ainda
mais instigante e proveitoso. Todos os outros grupos tinham que produzir
comentários sobre as questões propostas para o debate.
58

Conforme planejado, tínhamos a realização de dois seminários on-


-line distintos a cada duas semanas. Eles iniciavam sempre nas segundas-
-feiras, independentemente se havia ou não aula presencial, e encerravam
nos sábados. A cada seminário concluído eu postava uma avaliação geral
do seminário, agradecia ao grupo pela condução do trabalho, agradecia a

V
r
participação e contribuições dos demais grupos no debate e convocava o

uto
grupo para o seminário seguinte. Concluídos os dois seminários on-line, os
dois grupos se organizavam para os seus respectivos seminários presenciais.
O seminário presencial tinha que ser referenciado nas discussões pro-

R
duzidas no contexto on-line, a partir do tema debatido. Ao final do seminário

a
presencial, os integrantes dos grupos eram convocados para avaliarem suas
participações e contribuições para a produção dos seminários online e pre-

do
sencial. Na sequência, os dois seminários de cada grupo eram avaliados pelo
coletivo da sala e por mim.
aC

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são
3 Dos seminários às práticas simuladas: dinâmicas possíveis para a
sala de aula

Após a conclusão dos dez seminários (on-line e presenciais), teve início


i
o trabalho de elaboração e execução das aulas simuladas, com o objetivo de
rev

propiciar aos alunos, por meio de seus grupos, as condições para que eles pu-
or

dessem refletir e propor uma aula de práticas de língua(gem) orientada pelas


temáticas trabalhadas em seus respectivos seminários. Mesmo sabendo que
as práticas de simulação comportam uma natureza imprevisível, elas têm o
ara

propósito de predição, uma vez que, conforme observa Elgood (1988, p. 53),
a simulação procura modelar uma situação específica e com considerável
t

precisão, de forma a oferecer informações úteis sobre os possíveis resultados


i

obtidos no contexto real.


op

Em outros termos, as simulações no contexto da disciplina Linguagem e


d

Tecnologia, visavam a reproduzir da forma mais exata possível, as situações


e desafios reais no contexto da Educação Básica. As simulações permitiram
E

aos alunos um melhor entendimento sobre os mais diversos aspectos de um


processo de prática de ensino e aprendizagem sobre linguagem e tecnologia;
já que pode contribuir para a tomada de decisão com vistas ao aprimora-
ver

mento da aula planejada, prever os impactos das mudanças no processo da


aula antes de colocá-la em prática, fazer ajustes ao planejamento, testar as
condições tecnológicas disponíveis, entre outras questões relevantes para o
sucesso do trabalho proposto para o ambiente real da sala de aula.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 59

No final de cada aula simulada, o trabalho era avaliado pelo coletivo


da sala, ou seja, todos davam contribuições para melhorar a proposta de
trabalho do grupo. Depois de efetuados os ajustes sugeridos, os planos de
aula foram revistos e socializados com todos os alunos. No final das aulas
simuladas havia dez planos de aula sobre cada um dos temas trabalhos pelos

od V
r
grupos (gêneros discursivos digitais, internetês, redes sociais, vídeo, mapas,

uto
fanficton, jogos eletrônicos, memes, aplicativos de Língua Inglesa e apli-
cativos de Língua Portuguesa) para serem tomados como referência pelos
futuros professores em seus trabalhos nas escolas. A disciplina Linguagem e

R
Tecnologia encerrou com o envio, pelos grupos, do formulário de avaliação

oa
geral sobre o trabalho desenvolvido, tais como: pertinência da proposta
metodológica, conteúdo (temas) proposto, validade do FB para as práticas
de ensino e aprendizagem, trabalho com pequenos grupos, facilidades e di-
aC
ficuldades encontradas, papel dos colegas e do professor, importância da
disciplina para a formação profissional, pertinência na modalidade semipre-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

sencial e as condições estruturais e tecnológicas do Curso/UNEMAT.


As descrições sobre a estrutura organizacional da disciplina apresen-
visã
tadas acima são importantes, porque, do meu ponto de vista, permitem ve-
rificar as atividades propostas para o trabalho em grupo. Permitem ainda
constatar que a disciplina configurou-se em um espaço bastante complexo
e fecundo para a emergência de novas organizações e, consequentemente,
a re
itor

de resiliências adaptativas dos sujeitos em todos os níveis, à medida que os


sujeitos e os grupos interagiam. É essa dinâmica que pretendo tornar visível
na seção que segue.
par

4 Os grupos e seus efeitos para a dinâmica complexa do sistema

Com o propósito de dar visibilidade aos níveis de complexidade atin-


Ed

gidos pelos dez pequenos grupos e para o grupo Linguagem e Tecnologia,


elaborei a tabela abaixo.
são
ver
60

Tabela 2 - Dinâmica das atividades dos seminários

V
r
uto
R
a
do
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


Fonte: o autor.
são
Os dados expressos na Tabela 2 foram aferidos com base nos aconteci-
mentos em cada um dos pequenos grupos de seminário e como suas ações
afetaram a dinâmica do grande grupo Linguagem e Tecnologia. Para tanto,
i
sistematizei e organizei os dados da seguinte maneira:
rev
or

a) Atividade 1: para verificar essa atividade, considerei o número de


textos postados para leitura e fomento do debate em cada semi-
nário e a soma do total de páginas dos textos disponibilizados, por
ara

meio de links ou anexados para download.


b) Atividade 2: com relação aos vídeos, considerei o número e o
t

tempo total de duração.


i

c) Atividade 3: para essa atividade contabilizei todas as imagens


op
d

postadas pelos grupos em seus respectivos seminários, tais como,


charges, fotos, cartoons, prints, etc.
d) Atividade 4: refere-se, a exemplo das descrições das atividades
E

anteriores, ao número de links postados pelo grupo ao longo do


seminário. Diferentemente dos textos, vídeos e imagens, alguns
ver

grupos compartilharam links relacionados com o tema em seus co-


mentários. Por essa razão, tais links também foram considerados.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 61

e) Atividade 5: diz respeito ao número de mensagens postadas ao


longo do seminário. Para assegurar uma melhor organização do
trabalho e para evitar a “poluição visual” do perfil no FB, foi de-
finido que somente os grupos responsáveis pelos seminários e eu
podíamos fazer uso do Post (seção “Escreva algo...”).

od V
r
f) Atividade 6: relaciona-se ao número de comentários produzidos

uto
pelos participantes. Era na seção comentários que as discussões sus-
citadas pelas mensagens dos Posts se desenrolavam, ou seja, era o
espaço onde o debate e as mediações de fato acontenciam. Além

R
de poderem curtir o comentário, muitos alunos também respondiam

oa
aos comentários dos colegas, dinamizando ainda mais o debate.
g) Atividade 7 e 8: as curtidas e visualizações dos participantes foram sig-
nificativas para a dinâmica do grupo, pois elas apontavam quem havia
aC
visualizado e ou curtido as mensagens postadas e isso era um indicativo
de que os alunos tinham ciência dos acontecimentos do grupo.
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h) Atividade 9: para saber o volume da produção escrita em cada


seminário pelo coletivo dos participantes, expandi todas as men-
visã
sagens produzidas nas seções dos posts e comentários, para então
copiar e colar no processador de textos Word da Microsoft Office,
configurado com um parâmetro convencionado para a produção
de textos científicos: papel A4, fonte Times New Roman, espaço
a re
itor

entrelinhas de 1,5 e margens com 2,5 cm para o lado superior e


inferior e de 3 cm para os lados esquerdo e direito. Para esse tra-
balho considerei também os emoticons e outros símbolos produ-
zidos pelos participantes.
par

Como é possível de se verificar por meio da Tabela 2, cada grupo confi-


gurou-se em um dinamizador e complexificador do sistema como um todo. Por
Ed

esse motivo, não cabe aqui fazer nenhuma análise comparativa entre os grupos,
uma vez que cada um teve um papel decisivo e fundamental para a dinâmica
são

do sistema do grande grupo Linguagem e Tecnologia. Todo o conteúdo dos


seminários que se materializava no contexto do FB, através dos dispositivos
eletrônicos dos alunos era resultado direto e indireto das pesquisas realizadas
ver

pelos grupos e fruto de um intenso processo de interação social orientado por


processos como trocas de opiniões, dúvidas, problemas, atribuição de auto-
ridades, responsabilidades, negociação de sentidos, formas de interpretação,
resolução de problemas, trocas de experiências, informações, escolhas, cria-
tividade etc. Em síntese, os seminários eram uma emergência resultante da
postura “interdependente dos sujeitos e dos processos do todo dinâmicos do
62

grupo” (KURT, n/d [1948]) e em “torno de um proposito comum” (HANSEN,


WARNER e SMITH, 1976) e que conferia a cada grupo sua unidade e carac-
terísticas próprias de adaptação ao sistema.
Essa dinâmica interna dos grupos com vistas à organização e condução
dos seminários pode ser verificada nos excertos que seguem:

V
r
uto
Excerto #01
Por existir uma boa ligação entre nós, tivemos muita facilidade na
organização dos seminários. As nossas reuniões se davam na univer-
sidade, nas aulas vagas, intervalos e às vezes aos sábados. Por via tec-

R
a
nológica, decidíamos muitas coisas pelo grupo criado no Whatsapp,
denominado “Memes”. Esse grupo nos uniu ainda mais, pois cada ma-
terial interessante que encontrávamos na web era compartilhado nesse

do
espaço. Cada semana, uma de nós era responsável pela postagem dos
aC
comentários on-line em nome do grupo, mas antes de ser postado na

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página do Facebook, o comentário era mostrado no Whatsapp para o
são
consentimento de todas. Dessa forma também foi organizado o semi-
nário on-line e o presencial (Grupo Memes).

Excerto #02
i
Foi uma organização bem harmoniosa e tranquila, todos os integrantes
rev

do grupo tiveram um bom relacionamento, procurávamos debater cada


dúvida e a ouvir e respeitar a opinião de cada colega. A forma adotada
or

pelo grupo para as escolhas dos conteúdos foi através de celulares, e-


-mails e também pelas redes sociais (Grupo Fanfictions).
ara

Excerto #03
Para organização do nosso trabalho, elaboramos um plano de aula com
t

os assuntos a serem discutidos durante os seminários (presencial e


i

online) com os objetivos, conteúdos e metodologias. Também criamos


op

um grupo no “Whatsapp” e por meio dele, discutíamos o que cada


d

integrante do grupo iria fazer, como por exemplo, pensar nos textos,
nas questões aplicadas, nos vídeos, etc. Em relação às discussões rea-
lizadas nos seminários online, combinávamos que cada dia uma inte-
E

grante postaria em nome do grupo. Definimos que faríamos também


comentários individuais (Grupo Vídeos).
ver

Excerto #04
A organização e desenvolvimento do nosso seminário, bem como a
forma de participação nos demais seminários, foram feitas a partir de
um grupo criado no chat do próprio Facebook, de forma que todas as
integrantes pudessem acompanhar, ao mesmo tempo, tudo que uma
ou outra planejava em fazer, mediante um assunto proposto. Também
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 63

aproveitávamos alguns minutos vagos das aulas para discutir ou visu-


alizar algum material a ser postado. A participação nos outros semi-
nários aconteceu, na maioria das vezes, da mesma forma, ou seja, usá-
vamos o chat para chegarmos a um consenso ou entendimento daquilo
que daríamos como resposta (Grupo Jogos Eletrônicos).

od V
r
Como é possível verificar nos excertos, os alunos tiveram um intenso

uto
processo de interação no contexto de seus grupos em razão da necessidade
de discutirem e organizarem seus seminários e negociarem formas de partici-

R
pação de seus integrantes nos outros seminários. Foi possível verificar que o

oa
processo de colaboração foi um dos principais mecanismos para a dinamização
do sistema em seu todo. Essa atitude colaborativa dos alunos, como efeito dos
diferentes níveis de demandas impostas pelo próprio trabalho e de outras va-
riáveis que emergiram dentro de cada grupo, transformou o processo colabo-
aC
rativo em verdadeiros dinamizadores para a complexificação dos grupos. Essa
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propriedade colaborativa (SILVA, 2008, p. 229) era uma emergência derivada


das ricas conectividades criadas pelos alunos, “devido ao número de ligações
visã
entre as pessoas em um grupo (tecelagem de rede) e ao tipo de fluxo de dados
(textos, imagens, som)”, conforme nos diz Highsmith (2000).
Essa dinâmica em escala permite dizer que os grupos apresentavam uma
propriedade fractal. Na definição de Mandelbrot (1988), o termo “fractal”
a re

refere-se aos objetos cujas partes se relacionam de alguma forma com o todo
itor

e por isso são autorreferenciais ou autossimilares. Em outros termos, são


sistemas em que o todo é resultado da parte em escala que precede a anterior,
que se repetem de forma iterativa ao longo de toda estrutura sistêmica. Essa
perspectiva fractal mostra que nenhum grupo se encontrava isolado um do
par

outro, mas sim, interligados numa teia de relações que se complementavam


e apresentavam sempre um comportamento dinâmico.
No que diz respeito à organização para os trabalhos dos grupos, pude
Ed

constatar que eles tiveram poucos encontros presenciais, mas um intenso


são

processo de interação no contexto virtual, através de diferentes meios eletrô-


nicos, como as redes sociais (WhatsApp e FB) e também por e-mails, chats
e conversas por celulares. Essa forma de interação reforça a natureza ubíqua
e difusa possibilitada pelas tecnologias móveis para as práticas sociais con-
ver

temporâneas e que, como foi possível perceber, funcionaram de forma bas-


tante eficiente para o sucesso dos seminários. Nessa direção, é possível dizer
que a sala de aula física do Curso de Letras onde era oferecida a disciplina
Linguagem e Tecnologia se expandiu para o mundo virtual e moldou uma
realidade híbrida de espaços e tempos diferidos que não prejudicaram a qua-
lidade das práticas de trabalho propostas para a disciplina. Pelo contrário,
64

essas práticas se revelaram muito mais significativas para a formação dos


alunos. É uma perspectiva que, conforme apontam Silva e Silva (2015, p.
299), quando observam que a visão dicotômica entre virtual e real não se
sustenta mais no mundo contemporâneo, uma vez que “o mundo real e o
mundo virtual estão cada vez mais imbricados, conformando assim, uma

V
r
realidade mista (HANSEN, 2006), cada vez mais complexa e dinâmica”.

uto
Esse entendimento pode ser verificar nos excertos abaixo:

Excerto #05

R
A estratégia de utilizar o Facebook foi muito interessante, pois está-

a
vamos falando de tecnologia na tecnologia. Essa rede social é utilizada
por quase todo mundo para interagir e compartilhar vários assuntos e

do
agora vimos que também que é possível ter aulas através do Facebook
(Grupo Internetês).
aC

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Excerto #06
são
As redes sociais estão cada vez mais presentes em nossa vida e, com
o passar do tempo, surgem mais delas, com novas proposições e in-
teresses. Como sabemos, é extremamente incomum encontrar um es-
tudante de ensino fundamental ou médio que não tenha um perfil em
i
alguma rede social, portanto, podemos aproveitá-las para promover o
rev

ensino. Esse espaço é para o aluno um lugar de descontração, mas se


utilizado com objetivo educacional poder ser uma forma interessante
or

para aprimorar a relação professor-alunos (Grupo Memes).

Excerto #07
ara

O seminário virtual, realizado pelo grupo no Facebook, foi uma nova


experiência: tínhamos uma semana para efetuar postagens e interagir
t

com nossos colegas. [...] Virtualmente você tem a possibilidade de


i

fazer muitas coisas: postar links, vídeos, imagens e tudo muito rápido.
op

Discute-se um determinado assunto e, logo após, se houver dúvidas,


d

já se pode enviar um link de esclarecimento, por exemplo. Isso é algo


que não podemos fazer se não pela internet (Grupo Aplicativo de
E

Língua Portuguesa).

Outro aspecto interessante que verifiquei diz respeito ao fato de muitos


ver

alunos não conhecerem e tampouco terem relacionado os temas delimitados


para o trabalho como práticas de língua(gem). A percepção dos alunos sobre
a importância desses estudos para a formação docente contribuiu para de-
fenderem que a disciplina Linguagem e Tecnologia deveria ser ofertada
antes do Estágio Supervisionado e não apenas no último semestre do Curso.
Para eles, se isso tivesse acontecido teriam lidado com maior segurança e
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 65

criatividade para prepararem “aulas diferenciadas” para as escolas onde es-


tagiaram e, inclusive, produzido Trabalhos de Conclusão de Curso orien-
tados pelas práticas de língua(gem) mediadas por tecnologias. Sobre isso,
vejam o que escreveram os grupos abaixo.

od V
r
Excerto #08

uto
Sabemos que precisamos estar sempre atentos às novas praticas edu-
cacionais, já sabíamos que a internet é um grande aliado que facilita
e ajuda a pensar novas formas de conduzir nossas aulas, porém, essa

R
disciplina [Linguagem e Tecnologia] nos mostrou muitas ferramentas

oa
que não tínhamos conhecimento e, principalmente, como saber ex-
plorá-las em sala de aula (Grupo Jogos Eletrônicos).

Excerto #09
aC
Eu nunca imaginei que tivesse tanta coisa na internet que pudesse
ser trabalhada com os alunos nas aulas de Língua Portuguesa e até
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de Inglês. Eu nunca tinha ouvido falar em fanfiction (Integrante do


Grupo Internetês).
visã
Excerto #10
[...] não tinha me ocorrido que jogos eletrônicos e mapas pudessem ser
trabalhados em uma aula na área da Linguagem. Os mapas eram para
a re

nós, uma matéria da área da Geografia. Foi muito legal saber dessas
itor

coisas, através das aulas (Grupo Mapas).

Para encerrar as análises e discussões propostas para este artigo,


trago um trecho do Termo de Declaração elaborado e assinado por
par

22 alunos, em virtude dos questionamentos que surgiram no Curso de


Letras sobre a legitimidade da proposta adotada para o trabalho com a
disciplina Linguagem e Tecnologia.
Ed

Excerto #11
são

[...] Trouxemos essa resumida explanação do modo como são reali-


zadas nossas atividades para apresentar nossa posição. Logo que a
proposta foi feita pelo professor, todos se interessaram prontamente
em desenvolvê-la, pois era uma forma diferenciada e dinâmica de es-
ver

tudar e que nunca tínhamos entrado em contato. Além disso, a pro-


posta é totalmente coerente, uma vez que, há melhor maneira de en-
sinar e aprender a linguagem relacionada à tecnologia do que fazendo
uso da rede social mais utilizada no contexto virtual? Com essas aulas
escrevemos e debatemos muito e pelo que percebemos, ficamos mais
a vontade em expor nossas opiniões, fazer questionamentos e dis-
cussões, mediadas pelo Facebook e suas ferramentas. Aqueles que não
66

têm conhecimento do projeto precisam vê-lo na integra, para compre-


enderem como as aulas funcionam e continuam funcionando. Enfim,
não temos queixas em relação às aulas do professor, pelo contrário,
agradecemos pela organização, exigência e criatividade e, indubita-
velmente, é a disciplina que mais nos demanda tempo para desenvol-
vermos leituras e argumentações. (Termo de Declaração, 22/10/14)

V
r
uto
Ao aproximar o excerto acima com os outros excertos e analisá-los na
perspectiva dos Sistemas Adaptativos Complexos, tona-se possível verificar
o funcionamento contraditório no contexto do Curso de Letras. Essa contra-

R
dição ganha uma nuance interessante, pois, se por um lado tivemos alunos

a
adaptados a uma proposta de ensino e aprendizagem no contexto digital da
rede social FB e institucionalmente assegurada pela Portaria do MEC Nº.

do
4.059/2004 e no Projeto Político Pedagógico, por outro, temos as posições
aC
contrárias de vários professores que não aceitam essas proposições de tra-

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balho como práticas legítimas para a formação docente. Mesmo assim, en-
são
tendo como natural essa realidade contraditória e, por essa razão, não caberia
aqui emitir qualquer juízo de valor sobre esses professores, uma vez que
essas contradições, conforme observa Waldrop (1992), precisam ser com-
preendidas como algo constitutivo da realidade complexa. Para ele, os as-
i
rev

pectos contraditórios devem coexistir em proporções equilibradas, de modo


que não tornem o sistema perfeitamente ordenado, nem completamente de-
or

sordenado, a ponto de não existir uma estrutura delimitada.

Considerações finais
ara
t

Hass (2009) observa que é preciso termos em mente que os SAC se


configuram em um modelo teórico que nos ajuda a pensar sobre o mundo e
i
op

não para fazermos previsões futuras. Para a autora, os SAC estão ao nosso
d

redor, como, por exemplo, as colônias de formigas, os sistemas meteoro-


lógicos, os sistemas imunológicos, o funcionamento do cérebro, as bolsas
de valores, os sistemas comerciais e os grupos que trabalham em torno de
E

um propósito, como os dos partidos políticos, das comunidades etc. Logo,


os SAC estão também nos contextos das práticas de ensino e aprendizagem
ver

presenciais, virtuais ou semipresenciais.


Nessa direção, o presente trabalho possibilitou constatar que os grupos
constituídos para os seminários sobre Linguagem e Tecnologia se con-
figuraram em legítimos SAC. Apesar de cada grupo ter tido uma história
particular de organização e interação, foi possível verificar que os grupos
apresentaram uma propriedade fractal, ou seja, eles tinham aspectos que se
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 67

autorreferenciavam nas partes e no todo sistêmico. A postura de resiliência


adaptativa dos sujeitos/grupos com a proposta diferenciada de trabalho foi
algo que transcorreu sem grandes percalços pelo fato de estarem conectados
à internet por meio de seus próprios dispositivos tecnológicos e de estarem
familiarizados com a plataforma digital do Facebook. O estudo contribuiu

od V
r
para a importância de se considerar os processos de interação dos grupos,

uto
para além daquilo que eles apresentam como resultado final. Ou seja, inde-
pendentemente da atividade proposta pelo professor para ser desenvolvida
em grupo, torna-se pertinente que o professor conheça as dinâmicas ado-

R
tadas pelos integrantes do grupo; pois, o que ganha visibilidade no seminário

oa
online e presencial, por exemplo, é efeito resultante do que os alunos fizeram
antes em seus encontros de trabalho realizados anteriormente no interior do
grupo, tais como, pesquisas, leituras, trocas de opinião, escolhas, dúvidas,
aC
problemas, autoridades, responsabilidades, negociação de sentidos, interpre-
tações, resolução de problemas, trocas de experiências, informações, cria-
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tividade etc. Essa dinâmica empreendida pelos integrantes de cada um dos


grupos, a partir de algumas diretrizes estabelecidas no programa da disci-
visã
plina, aponta para uma perspectiva fundamental requerida para os processos
de ensino e aprendizagem contemporâneos: autonomia. Ao longo de todo
o trabalho foi possível verificar que cada aluno apresentou, em diferentes
níveis, uma postura autônoma muito significativa, não apenas para a sua
a re
itor

formação individual, mas também para o grupo que pertencia. Trata-se de


uma dinâmica que corrobora Paiva (2006, p. 88-89), quando diz, à luz da
complexidade, que a autonomia:
par

[...] é um sistema sócio-cognitivo complexo, que se manifesta em di-


ferentes graus de independência e controle sobre o próprio processo
de aprendizagem, envolvendo capacidades, habilidades, atitudes, de-
sejos, tomadas de decisão, escolhas, e avaliação [...]
Ed
são

Com relação à apropriação do Facebook como ambiente virtual de


aprendizagem, o trabalho permitiu verificar que a referida rede social,
mesmo não sendo um sistema concebido para as práticas de ensino e apren-
dizagem, pode ser tomada e significada como um espaço virtual bastante
ver

propício e fecundo para tais práticas, como, aliás, têm mostrado várias pes-
quisas (muitas destacadas aqui). Primeiro porque se trata de uma rede social
bastante familiar para muitas pessoas e acessível nos mais diferentes tipos
de dispositivos digitais e, segundo, porque congrega uma diversidade de fer-
ramentas voltadas para a interação social e que, por esse motivo, assegura o
desenvolvimento de práticas de construção formal de conhecimento. Nesse
68

sentido, a exemplo de qualquer contexto de práticas educacionais presen-


ciais (sala de aula) ou virtuais (Moodle), o FB, quando tomado para fins
educacionais, é dependente de um projeto de curso.
Por fim, o trabalho possibilitou constatar que as práticas de língua(gem)
produzidas nos contextos digitais devem se configurar em um componente

V
r
curricular fundamental para a formação de professores da área de Letras

uto
e Linguística. É preciso que reconheçamos que o conhecimento sobre
Linguagem e Tecnologia configura-se em um agenciamento que não pode
ser negligenciado pelas instituições e professores que têm como compro-

R
misso social a formação de professores alinhada com as demandas impostas

a
pela sociedade contemporânea para as práticas de ensino e aprendizagem.
Trata-se de um entendimento que precisa ser assegurado no âmbito das ins-

do
tituições formadoras para que seus desdobramentos possam, de fato, rever-
berar dentro das salas de aula das escolas da Educação Básica, através do
aC
trabalho dos futuros professores da área da Linguagem.

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são i
rev
or
ara
di t op
E

ver
CAPÍTULO 3

AFFORDANCES NO
DESENVOLVIMENTO DA PRODUÇÃO

od V
r
ORAL EM LÍNGUA INGLESA:

uto
considerações a partir da abordagem ecológica

R
oa
Kelly Cristina M. Gaignoux (UFPa/Bragança)
Michell Gadelha Moutinho (Escola de Aplicação/UFPa)

1 Introdução
aC
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Ao longo dos anos, muitas teorias buscaram compreender como se dá


a aprendizagem de uma língua estrangeira (LE) e qual o papel do ensino
visã
para torná-la mais eficaz. No final do século XX, chegou-se à conclusão
de que não haveria apenas um método ou abordagem que resolvesse todas
as questões, pois, em sua maioria, elas deixavam de lado um agente funda-
mental para o processo: o aluno (KUMARAVADIVELU, 2001).
Na tentativa de solucionar essa questão, durante algum tempo, a pre-
a re
itor

ocupação dos estudiosos era com a metodologia empregada e o papel do


professor para o sucesso da aprendizagem de língua. No entanto, nenhum
modelo contemplava todos os processos envolvidos na aquisição de uma
língua, muito menos o de uma LE (PAIVA, 2011a; 2011b). Ao pensar em
par

formas para facilitar a aprendizagem do aluno, acabava-se fragmentando a


aprendizagem e reforçando a ideia de que somente o professor seria o res-
ponsável por ela. Na tentativa de mudar esse paradigma, tem-se buscado
Ed

compreender o que de fato acontece ao longo da trajetória de aprendi-


são

zagem de uma LE.


A partir da concepção de aquisição de segunda língua como um sistema
complexo (cf. LARSEN-FREEMAN, 1997), foi possível repensar qual
o papel dos atores envolvidos no ensino e aprendizagem de línguas, bem
ver

como englobar nestes processos os mais diversos aspectos concernentes a


estes atores, como questões contextuais, individuais, sociais, políticas, his-
tóricas etc. Nesta direção, Borges e Paiva (2011) afirmam que, por meio
de uma abordagem complexa de ensino de línguas, poderíamos integrar as
mais diversas teorias e abordagens sob um mesmo leque, abandonando o
70

dogmatismo subjacente (característico de cada teoria e cada abordagem) ao


modo de pensar os fenômenos que ocorrem dentro de sala e durante a aqui-
sição de língua, seja ela materna ou estrangeira.
Entre as alternativas que estão em consonância com a abordagem com-
plexa, a abordagem ecológica surgiu para tentar preencher esta lacuna e

V
r
facilitar a compreensão deste processo. Kramsch (2008) aponta que foi a

uto
partir de uma visão mais integradora que a noção de ensinar uma LE mudou,
pois, ao considerar o ensino e aprendizagem de línguas como um sistema
complexo, entende-se que ambos não ocorrem de forma linear como pre-

R
vistos no currículo e livro didático. Ambos caracterizam-se por apresentar

a
propriedades emergentes imprevisíveis em razão das conexões feitas pelos
aprendentes a partir daquilo que já sabem e o que experimentam na interação

do
com e no contexto. Estes aspectos também estão entre os nove princípios da
abordagem complexa, proposta por Borges e Paiva (2011).
aC
No caso da produção oral, Kramsch (2008) destaca que forma como

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são
esta é tratada nos livros didáticos, em que se ensina um padrão de língua
a partir de um aspecto cultural e oportuniza espaços de prática iguais para
todos na conversação, acaba diminuindo a possibilidade de os alunos vi-
venciarem diferentes formas de uso da língua e experimentarem situações
i
menos previsíveis na troca conversacional.
rev

Paiva (2013a), referindo-se a Hatch (1978), complementa a ideia de


Kramsch (2008) e explica que a aprendizagem dos aspectos formais da
or

língua ocorre a partir da interação estabelecida entre os interlocutores no


discurso, levando em consideração aspectos contextuais de ambos, o que
ara

significa dizer, que qualquer alteração no contexto possibilitaria mudanças


na interação.
t

A partir dos argumentos mencionados anteriormente, podemos inferir


i

que as formas de aprendizagem vivenciadas pelos aprendentes em sala devem


op

priorizar uma visão menos racionalista de causa e efeito, possibilitando o


d

uso de múltiplas capacidades linguísticas que não se limitem à escolha da


função linguística e para quem esta deve se dirigir, por exemplo. Em razão
E

disso, autores como Van Lier (2004) e Kramsch (2008), baseados nas ideias
de Gibson (1986), entre outros, passaram a ter como foco de observação o
aprendente e como este interage com os diversos elementos com os quais
ver

tem contato tanto dentro da sala de aula como fora desta, ou seja, a maneira
como se percebe e age quanto às affordances disponíveis. A abordagem eco-
lógica permite que se possa entender a aprendizagem e seus fenômenos a
partir de um olhar mais amplo, como um sistema adaptativo complexo, no
qual as relações são não lineares, imprevisíveis, auto-organizáveis e abertas
a forças externas.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 71

Este capítulo pretende explorar, a partir de narrativas produzidas por


alunas do curso de Letras - Inglês da Universidade Federal do Pará (UFPa),
Campus Bragança, coletadas em dois momentos diferentes, quais as con-
dições que permitiram a percepção de affordances que influenciaram na tra-
jetória de aprendizagem do idioma. Para tanto, discorreremos sobre alguns

od V
r
pontos principais da abordagem ecológica no ensino e aprendizagem de

uto
línguas, detalhando dois conceitos fundamentais: affordances e emergência.
Em seguida, descreveremos a metodologia e exporemos os resultados da
análise das narrativas a fim de verificar quais fatores influenciaram no desen-

R
volvimento da produção oral e como esta influência ocorreu.

oa
2 Abordagem ecológica e aprendizagem de língua
aC
A abordagem ecológica busca integrar as noções de linguagem do ponto
de vista físico, cognitivo e social. Devido à multiplicidade de relações que se
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estabelecem nas situações de aprendizagem, estas passam a ser parte da inte-


visã
ração com os elementos envolvidos. Nessa perspectiva, a língua é vista como
um sistema complexo que se inter-relaciona no e com outros contextos.
A visão ecológica de aprendizagem tem fundamento na teoria sociocul-
tural que explica as formas de atividades humanas por meio da mediação.
Van Lier (2004), responsável por traduzir os estudos da abordagem eco-
a re
itor

lógica para a Linguística Aplicada, defende a ideia de que uma compreensão


da teoria semiótica possibilitaria uma visão ecológica de aprendizagem de
língua dentro de uma noção de espaço, tempo, ação, percepção e mente. De
acordo com o autor, Ecologia, neste caso, refere-se ao estudo do contexto
par

como um todo; é o estudo do movimento, processo e ação.


Ao considerar a abordagem ecológica-semiótica de aprendizagem de
língua, Van Lier (2004) destaca o papel da interação a partir da concepção da
Ed

teoria sociocultural que postula uma relação complexa entre aprendizagem


e desenvolvimento. Nesta direção, segundo aponta Silva (2011 p. 175),
são

“aprendizado e desenvolvimento se configuram em um processo extrema-


mente dinâmico, amalgamados, vão se influenciando mutuamente e comple-
xificando o sujeito ao longo de sua trajetória histórica e cultural”.
ver

Em outro momento, Van Lier (2010) aponta que a abordagem eco-


lógica tem como objetivo observar o processo de aprendizagem, as ações
e as atividades dos professores e dos aprendentes, a natureza multivariada
da interação e do uso da língua em toda sua complexidade e, como ocorre a
rede de interdependências entre todos os elementos no ambiente, não apenas
no nível social, mas também no físico e simbólico. Assim, não há apenas
um fator que determine o que, como e se um aluno aprende algo, como se
72

pensava a respeito da aprendizagem vista como resultado/produto do ensino,


em uma perspectiva linear, de causa e efeito, subsidiada pelo paradigma
mecanicista-cartesiano. A aprendizagem de línguas passa a ser considerada
como um fenômeno emergente, não linear, que engloba o indivíduo em seus
diversos aspectos no ambiente em que está inserido.

V
r
Uma vez que a visão de aprendizagem de língua mudou, Mercer (2013)

uto
destaca que o contexto também pode ser considerado como um sistema com-
plexo e que este passa a integrar outros sistemas, diferentemente de como
a ciência o compreendia, como algo que não fazia parte e, portanto, servia

R
como “pano de fundo” para a compreensão dos fenômenos.

a
Na sala de aula de línguas, por exemplo, os contextos são supostamente
desenvolvidos para propiciar oportunidades de aprendizagem e os aprendentes

do
podem ser mais ou menos bem sucedidos nessa interação. Mercer (2013)
aponta que abordagens deste tipo dão ênfase à necessidade de reconhecer a
aC
diversidade presente na situação, as interações entre os indivíduos e os fa-

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são
tores contextuais que levam a características emergentes únicas para cada in-
divíduo, englobando o grupo com um todo maior que a soma de suas partes e,
ao mesmo tempo, privilegiando o aprendente em sua individualidade.
Se o ambiente está repleto de oportunidades de prática e isso permite
i
ao aprendente tornar-se mais ativo em seu desenvolvimento, é a interação
rev

que permitirá que a aprendizagem ocorra, possibilitando que o aprendente


interaja dentro e fora da sala de aula (MARTINS, 2008). Concernente à in-
or

teração, Paiva (2013a) afirma que a aprendizagem também pode ocorrer em


outros ambientes fora da sala de aula desde que isso promova experiências
ara

linguísticas interpessoais e intrapessoais. A autora explica que por vivermos


em uma comunidade ecológica, a língua torna-se “um recurso poderoso para
t

aprendizes que precisam de input linguístico e de interação para adquirir a


i

língua (p. 7)”. Além disso, Paiva (2013a) ressalta que aprender a língua em
op

ambientes linguísticos pobres dificulta a aquisição da língua devido à falta


d

de input e interação.
No que diz respeito à produção oral, input e interação são essenciais
E

para o desenvolvimento dos aprendentes e, por isso, investigar essa habi-


lidade sem observar esses dois aspectos em ação, uma vez que o aprendente
está imerso em um ambiente repleto de significados (VAN LIER, 2000;
ver

McNEIL, 2014), não possibilitaria a compreensão do todo. De acordo com


estes autores, esses significados tornam-se gradualmente disponíveis na
medida em que os aprendentes agem e interagem com e nesse contexto.
Sobre essa questão, Martins (2011), referindo-se a Capra (1999), afirma que
na perspectiva ecológica” todos os membros de uma comunidade ecológica
estão interligados numa vasta e intricada rede de relações” (p. 151).
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 73

A linguagem é o elemento integrador e o objeto de estudo na rede de


relações que se estabelece dentro e fora da sala de aula. Segundo explica Van
Lier (2000), a linguagem emerge a partir de atividades semióticas propor-
cionadas pelo ambiente, no qual o aprendente interage. Nessa direção, Tudor
(2003) afirma que se faz necessário verificar o que as atividades realizadas

od V
r
em sala significam para os alunos, professores e outros que de alguma forma

uto
possam influenciar o que acontece nesse ambiente. Todas as oportunidades
de aprendizagem são valiosas, no entanto, professores e aprendentes pre-
cisam ter consciência de quando elas são ou não úteis (VAN LIER, 2004).

R
Logo, os processos de aprendizagem são processos semióticos, pois, ao

oa
agir em um contexto de aprendizagem, o aprendente tem recursos disponíveis
e prontos a serem usados para o seu desenvolvimento (VAN LIER, 2004). A
esses recursos chamamos de affordances, o qual será discutido a seguir.
aC
2.1 O que são Affordances
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O termo affordance, apresentado, primeiramente, por Gibson (1986),


visã
refere-se à interação entre o organismo, o ambiente ao qual pertence e o que
este tem a oferecer sob vários aspectos (alimento, abrigo etc.). Na concepção
do autor, affordances significam, de uma certa forma, algo objetivo, real e
físico, ao contrário de valores e significados, pois estes tendem a ser subje-
a re
itor

tivos, fenomenológicos e mentais. Apesar da noção apresentada por Gibson


(1986), o próprio autor complementa que

[...] uma affordance não é uma propriedade objetiva tampouco subjetiva;


par

ou é simplesmente ambas. Uma affordance vai além da dicotomia entre


subjetivo e objetivo, mas nos ajuda a entender sua inadequação. É igual-
mente um fato do ambiente e um fato do comportamento. É tanto físico
como psíquico ou nenhum. Uma affordance aponta para ambos os ca-
Ed

minhos, do ambiente e do observador (p. 129).1


são

O que Gibson esclarece é que a compreensão de affordance está ligada


ao caráter bidirecional da relação entre o indivíduo e o ambiente, na qual a
percepção do ambiente é, simultaneamente, a percepção do indivíduo sobre
ver

si mesmo em relação ao ambiente em que se encontra (GIBSON, 1986).


Gibson (1986) ainda afirma que as propriedades encontradas em um
certo ambiente só podem ser entendidas como affordance se levarmos em
consideração a relação do animal com aquilo que o meio proporciona, dei-
xando claro que toda interação entre o animal e o ambiente é única. Isto
1 Essa e outras traduções existentes neste artigo são de total responsabilidade dos autores.
74

significa dizer que a forma com que se percebe o que o ambiente tem para
nos oferecer é o que determina nosso comportamento em relação às affor-
dances, pois segundo Gibson (1986), há diferentes layouts que proporcionam
diferentes comportamentos para diferentes animais.
Chemero (2003) discute o conceito de affordance e esclarece o pen-

V
r
samento de Gibson a partir das interpretações feitas depois de seu trabalho

uto
seminal. Para Chemero, affordances são mais que uma propriedade do am-
biente que o animal percebe e mais que a percepção do animal de alguma
propriedade do ambiente; elas estariam na relação entre as habilidades que

R
o animal possui e algum aspecto do ambiente em uma determinada situação.

a
O autor exemplifica com a imagem de água que estava em um copo e foi
derramada: para um ser humano, para o qual a habilidade de beber e engolir

do
não pode ser utilizada nesta situação, a affordance não poderia existir.
Van Lier (2004) expandiu o significado de affordances em termos
aC
linguísticos. Para o autor, affordance apresenta três aspectos relevantes na

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são
aprendizagem de língua. Primeiro, affordance refere-se a uma relação entre
uma pessoa e uma expressão linguística, isto é, representa uma ação po-
tencial. Segundo, affordances linguísticos estão representadas nas expressões
linguísticas que estão disponíveis para serem percebidas ou não pelo inter-
i
locutor. Finalmente, quando as affordances são percebidas e interpretadas
rev

podem promover uma ação futura dependendo da habilidade do interlocutor.


Nesta perspectiva, para Van Lier (2004), o termo affordance é definido a
or

partir da relação dinâmica entre o indivíduo e suas percepções, interpretações


e ações com qualquer fator contextual. Sem algum destes três elementos, não
ara

se pode considerar que haja a emergência de novos comportamentos que


contribuam para a aprendizagem.
t

A relação entre os indivíduos e os fatores contextuais, tais como arte-


i

fatos, objetos, pessoas, estabelece-se por meio da percepção de sua utilidade


op

(MERCER, 2013). Ainda de acordo com a autora, ao tomar consciência da


d

inter-relação que ocorre entre todos estes elementos, os alunos estariam mais
aptos a perceber estas affordances e a se beneficiar de seu uso.
E

Entretanto, vale ressaltar que, assim como esta relação pode ser be-
néfica, ela pode trazer prejuízos, isto é, pode contribuir positiva ou nega-
tivamente. Gibson (1986) é contundente ao afirmar que uma affordance é
ver

aquilo que o ambiente oferece ao animal, seja para seu bem ou seu mal, e,
uma vez que a relação entre o indivíduo e o contexto é única, as affordances
positivas ou negativas são propriedades tomadas como referência para o ob-
servador e não como experiência vivida por ele. Chemero (2003) reforça
este entendimento, pois condiciona as affordances às situações em que os
indivíduos se encontram para percebê-las, o que significa que nem todos os
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 75

indivíduos as perceberão da mesma forma. Um exemplo do mundo natural


pode ser observado com carcaças de animais, pois, para algumas espécies
(abutres, urubus entre outras), uma carcaça significa alimento disponível e,
para outras (seres humanos), significa alimento que não pode ser consumido.
Ao transferir o conceito de affordance para o campo do ensino e apren-

od V
r
dizagem de línguas, é preciso ressaltar que nem tudo será utilizado para o

uto
benefício de todos os aprendentes, ou seja, o que pode beneficiar alguns
alunos, pode não ser de grande auxílio, ou até pode ser um empecilho para
os demais. Na próxima subseção, esta questão será explorada.

R
oa
2.2 A Emergência na abordagem ecológica

Dentre os aspectos que são fundamentais para a compreensão da apren-


aC
dizagem como sistema adaptativo complexo e para a abordagem ecológica,
encontramos na emergência um dos fenômenos importantes para suplantar
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o paradigma cartesiano-newtoniano, bastante presente na história das ci-


ências e, especificamente, do ensino e aprendizagem até a “virada da com-
visã
plexidade”, como chamou Sarah Mercer, em seu texto The self as a complex
dynamic system, de 2011.
Na natureza, dizemos que algo emerge quando várias partes se agrupam e
mudam de uma tal maneira que se (auto)organizam em um estágio que é maior
a re
itor

que a soma individual de suas partes. Um exemplo do mundo químico é a mo-


lécula de água, pois a união dos átomos de hidrogênio e oxigênio isoladamente
não são suficientes para determinar que, desta união, surgiria água. No mundo
animal, um exemplo clássico é a lagarta que dá origem à borboleta. Nos dois
par

casos, o todo formado pelas partes atinge um estágio qualitativamente superior


e não pode ser reduzido à soma das partes que o compõem.
Larsen-Freeman e Cameron (2008b), ao tratarem deste fenômeno,
Ed

consideram que a emergência é a mudança de fase no comportamento de


sistemas adaptativos complexos que surge quando o novo estágio apresenta
são

um grau de organização maior (no aspecto qualitativo) em relação ao estágio


anterior. Este tipo de mudança de fase, em tais sistemas, ocorre a partir da
interação entre agentes e elementos, e mesmo a menor das influências pode
ver

gerar esta auto-organização, fenômeno este denominado de “criticalidade


auto-organizada”. Um exemplo disto é uma avalanche: é possível saber que
ela vai acontecer, mas não determinar qual a quantidade de neve necessária
para deflagrá-la nem o momento exato para que ela aconteça.
76

Neste sentido, este estado crítico em que se encontra o sistema em um


dado momento de sua trajetória está próximo da beira do caos, estado em
que o sistema está sob diversas influências e muda adaptativamente para
manter a estabilidade dinâmica, o que demonstra um alto grau de responsi-
vidade e flexibilidade.

V
r
Ao considerarmos a aprendizagem como um sistema complexo, também

uto
podemos interpretá-la a partir da abordagem ecológica, traçando paralelos
com a mudança de fase gerada por meio da emergência de novos compor-
tamentos. Os “flocos de neve” que provocarão no aluno uma “avalanche”

R
podem ser tanto fatores contextuais como as affordances e estes elementos

a
podem causar mudanças no comportamento dos alunos, o que tem grande
relevância para os professores. Estes podem observar os processos envol-

do
vidos no ensino e aprendizagem de línguas a partir de uma perspectiva não
reducionista, o que possibilitaria a eles tornarem-se agentes neste processo.
aC
Para assumirem responsabilidades por suas aprendizagens, os alunos

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são
precisam reconhecer no contexto em que se inserem e nos elementos e
pessoas com quem interagem onde se encontram os principais recursos que
os ajudarão nas dificuldades durante esta trajetória. Van Lier (2004), ao
propor a mudança do termo input, entende que língua é um sistema emer-
i
gente e tal terminologia remeteria a uma noção de língua como um código
rev

fixo e a noção de aprendizagem baseada no acúmulo de conteúdos e fór-


mulas a serem reproduzidos pelos alunos. Ao substituir input por affordance,
or

o autor se posiciona em favor de uma pedagogia que privilegie o aluno, sua


trajetória e seu contexto na construção do conhecimento. Kramsch (2008)
ara

afirma que aquilo que o aluno aprende não vem de um programa linear, mas
emerge das conexões que o aluno faz com suas vivências (cf. LARSEN-
t

FREEMAN; CAMERON, 2008b).


i

É preciso, contudo, levar em consideração, como mencionamos anterior-


op

mente, que as mesmas affordances são diferentes para diferentes indivíduos


d

e a partir da percepção delas podem emergir comportamentos diferentes.


O contato com falantes nativos da língua estrangeira, por exemplo, pode
E

impulsionar a motivação para o estudo da língua para alguns alunos, mas


pode deixar alguns outros alunos mais introvertidos, desconfortáveis e apre-
ensivos neste tipo de interação. Assim, é preciso que o aluno consiga per-
ver

ceber, interpretar e agir para que as affordances que se apresentam possam


beneficiá-lo durante seu percurso como aprendente de línguas.
A partir destas considerações, buscaremos verificar nas narrativas das
alunas coletadas em um mesmo contexto quais as affordances percebidas,
interpretadas e sobre as quais os alunos agiram ou não para o desenvolvi-
mento da produção oral.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 77

3 Metodologia

As participantes neste estudo foram alunas-professoras matricu-


ladas no sexto semestre do curso de Letras-Língua Inglesa (extensivo) da
Universidade Federal do Pará, Campus de Bragança.

od V
r
Esta pesquisa é de caráter qualitativo e, para a coleta de dados, utili-

uto
zamos narrativas de aprendizagem como instrumentos, coletadas em dois
momentos distintos: antes do acesso ao ensino superior e depois como
alunas do curso de graduação. Para preservar a identidade das participantes,

R
atribuímos números às aprendentes, classificadas de 1 a 8, e às narrativas,

oa
consideramos 1 (antes do acesso à universidade) e 2 (como estudantes uni-
versitários), e, para cada excerto extraído de cada narrativa, atribuímos se-
quencialmente uma letra do alfabeto, estando, assim, codificados:
aC
Ex.: [8.1.a] - sendo 8 o número dado à aluna, 1 à narrativa antes da
universidade e “a” ao primeiro excerto da narrativa em questão.
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A presença exclusiva de alunas se deu devido à ausência de outros alunos


visã
em alguma das etapas de coleta das narrativas. Nas narrativas escritas, bus-
camos identificar as affordances encontradas pelos informantes para o desen-
volvimento da habilidade de produção oral. Na primeira narrativa, buscamos
identificar como a língua estrangeira era praticada e quais as affordances
percebidas pelas aprendentes antes da universidade. Na segunda narrativa,
a re
itor

buscamos identificar como estas aprendentes percebiam as affordances no de-


senvolvimento dessa produção. Tanto na primeira narrativa quanto na segunda,
observamos (se, de fato, ocorreu) como os processos (percepção, interpretação
e ação) se efetivaram na aprendizagem das aprendentes.
par

4 Análise e Discussão das narrativas


Ed

4.1 Tipos de affordances relacionadas ao interesse pela língua inglesa


são

Se as mais recentes questões levantadas sobre a aprendizagem de língua


giram em torno da percepção do observador sobre o que o ambiente pode pro-
porcionar, então, podemos dizer que a maneira como os aprendentes podem
ver

perceber as affordances necessárias para o seu desenvolvimento é bastante


relevante; pois segundo observa Paiva (2013a), as experiências dos apren-
dentes com as affordances devem contribuir para as interações intrapessoal
e interpessoal. Barsingerhorn et al. (2012), referindo-se a Warren (1988),
destacam dois aspectos importantes das affordances que se deve levar em
consideração. Primeiro, deve-se atentar para como os organismos percebem
o que o ambiente oferece em uma determinada situação e como as variáveis
78

da percepção regulam as ações durante a realização de uma tarefa específica.


A partir da observação de Warren (1988 apud BARSINGERHORN et al.,
2012), verificamos nos excertos a seguir – das narrativas coletadas –como as
aprendentes percebem diferentes affordances no contato com a língua antes
do acesso à universidade.

V
r
uto
[1.1.a]2 já havia muita carência de professor na área e isso fez com
que a minha experiência com o Inglês na escola não fosse um dos
melhores, nessa idade o que me fez almejar para o aprendizado da
língua foi – o que muitos podem achar patéticos- a paixão pelos livros

R
a
e filmes de Herry Potter, [...] a paixão pela língua através dos filmes
aumento com maior frequência a cada filme que lançava, e a ca-
rência de aprender a língua na escola também3,

do
aC
Nos excertos de [1.1.a], observamos um grande interesse pessoal em

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


obras artísticas (livros e filmes de Harry Potter). A aprendente percebe a
são
língua estrangeira em seus contextos como um “objeto” que causa “paixão”,
ou seja, por meio de seus interesses pessoais e do contexto em que está
inserida, este objeto torna-se a affordance (GIBSON, 1986). O mesmo pode
ser visto no excerto [4.1.a], onde, no lugar dos filmes, encontramos a música
i
rev

como atrativo para a aprendizagem:


or

[4.1.a] [...] Os anos foram passando e o meu passa tempo preferido


era ouvir músicas, especialmente em inglês, eu já estava gostando do
idioma e algumas vezes imaginei o quanto seria maravilhoso um dia
ara

poder estudar e dominar essa língua.


t

Assim como as aprendentes acima, [2.1.a] também nota a língua como


i

algo interessante, conforme excerto a seguir:


op
d

[2.1.a] [...] Entretanto não me atentei para a possibilidade de


aprender uma nova língua, mas achei interessantes e bonitas essas
E

novas palavras que até então eram desconhecidas para mim.

E a partir dessa percepção, decidem agir para compreender e interagir


ver

com a língua, como podemos observar no trecho de [1.1.b]. O interesse da


aprendente por livros e filmes em inglês a levou a tomar a decisão de fazer
vestibular para estudar a língua como profissão.

2 Mantivemos o texto original de todas as narrativas transcritas.


3 Para melhor identificar as informações analisadas e discutidas nesta análise, negritamos parte dos excertos que se apresentam.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 79

[1.1.b] [...] na adolescência pude perceber que meu interesse pela


língua era bem maior do que um simples filme, foi ai que percebi o
que eu realmente queria fazer quando prestasse o vestibular.

Em [3.1.a], a percepção da aluna é de que a língua é “estranha”, o que

od V
r
reforça a ideia de a affordance ser negativa, uma vez que seu estudo acontece

uto
de forma obrigatória, para cumprir uma exigência curricular, como podemos
observar no excerto a seguir:

R
[3.1.a] a princípio foi um grande susto por não entender absolu-

oa
tamente nada que meu teacher falava [...] Então estudei de 5ª a 8ª
seria nos períodos de (2005 a 2008), mas não sair do básico o mais
simples, apesar de um fundamental que deixou a desejar foi onde eu
encontrei com a tão “estranha” língua inglesa, mas foi com esse
aC
primeiro ponto de vista que passei a gostar mais [...]
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O comportamento mais recorrente diante de algo considerado “es-


visã
tranho” seria o afastamento daquilo que causa estranheza, aproximando-se
de coisas que estão mais próximas das zonas de conforto em que a pessoa
se encontra. Ainda assim, a aprendente, apesar do estranhamento e das difi-
culdades presentes na aprendizagem com a língua, decide seguir estudando,
pois, neste caso, as dificuldades seriam menores do que a motivação e a
a re
itor

vontade de aprender um novo idioma para tornar-se “professora de língua


inglesa”, como veremos em [3.1.b] a seguir:

[3.1.b] [...] em 2009 comecei o Ensino Médio, [...] foi nesse momento
par

que “o bicho começou a pegar”,eu tinha mesmo que estudar, mas


sempre vi como um obstáculo que teria capacidade de avançar e
sem esquecer-se da atenção inexplicável da minha professora assim
como o professor do fundamental, No ensino médio já tomei mais
Ed

um impulso e tive a certeza do que estudar para tentar o vestibular e


são

assim tentar entrar na faculdade e assim realizar um sonho de quando


criança. Ser professora não uma simples professora, mas uma pro-
fessora da língua Inglesa.
ver

No excerto de [4.1.b], a seguir, entretanto, a percepção da aprendente


está relacionada à utilidade da língua para si, fato que se deve à percepção da
atitude do professor, o que nos permite afirmar que, ao observar o ambiente,
ela percebeu que este poderia oferecer condições para ajudá-la a dominar o
idioma, mas não foi capaz de perceber quais affordances poderiam colaborar
80

para que a aprendizagem acontecesse. Neste caso, em particular, a apren-


dente parecia não estar engajada com as atividades de língua propostas pelo
professor em razão do próprio desinteresse deste no ensino da língua.

[4.1.b] Meu primeiro contato com língua inglesa foi a nove anos

V
r
atrás quando entrei na 5ª série do ensino fundamental. A princípio
não me vi muito motivada a estudar o idioma já que não via inte-

uto
resse nem mesmo por parte do professor na hora de ensinar. Na
época também não entendi exatamente o porquê que eu deveria estar
estudando um outro idioma e me perguntava sempre que o professor

R
entrava na sala, se estudar inglês realmente era necessário pra mim.

a
No entanto, para a aprendente, a música parece ter sido o elemento im-

do
pulsionador para a aprendizagem da língua apesar de não percebê-la como
aC
uma affordance, conforme mostra o excerto a seguir:

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
[4.1.c] Com o ensino que eu tinha em escola pública não era suficiente
para aprender muito, [...] Acrescentei muitas palavras ao meu voca-
bulário através das músicas que ouvia. Não havia chegado a pensar
na possibilidade de um dia me tornar uma professora de inglês, [...]
i
rev

Podemos afirmar ainda que em [4.1.b], apesar de o professor e as aulas


or

de língua serem restrições possibilitadoras, ou seja, dois elementos que limi-


tavam o desenvolvimento de sua aprendizagem, ainda assim, a aprendente
conseguiu interagir com a língua [4.1.c], porém em um contexto mais signifi-
ara

cativo para ela. Isso referenda, segundo aponta Kramsch (2008), que o aluno
aprende de forma não linear, proporcionando a emergência de conexões com
t

algo a partir de suas vivências. Em outras palavras, apesar das formas de


i

interação proporcionadas em sala de aula, muitas vezes, os alunos podem


op
d

não ter experiências de sucesso com estes tipos de atividades, alcançando-as,


contudo, fora da sala de aula.
Nos excertos [1.1.a], [2.1.a], [3.1.a] e [4.1.a], apresentados anterior-
E

mente, o contato inicial com a língua promove diferentes affordances (livros,


filmes e músicas em inglês, professores de inglês etc.) que contribuíram para
ver

o começo do percurso como aprendentes de línguas. Na metáfora da apren-


dizagem como um sistema adaptativo complexo, pode-se dizer que essas
affordances são potenciais condições iniciais para a análise da trajetória do
aluno e da emergência de vários outros aspectos relacionados à língua es-
trangeira, tendo como foco, dentre eles neste trabalho, a produção oral – que
analisaremos a seguir.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 81

4.2 Tipos de Affordances relacionadas à produção oral

Falar o idioma é sempre um desafio para os aprendentes de uma língua


estrangeira. Na sala de aula, eles têm de enfrentar situações comunicativas
que exigem certas competências. Quando a expectativa gerada para aprender

od V
r
a falar a língua não é atendida, esses aprendentes tendem a se retrair e não

uto
buscar formas de vencer as dificuldades. Nas narrativas analisadas, ob-
servamos que a percepção das aprendentes sobre o desenvolvimento da
produção oral após o ingresso a universidade sofreu mudanças, conforme

R
veremos nos excertos a seguir:

oa
[2.2.a] [...] porém eu não sabia de fato me comunicar em inglês,o
desespero aumentou quando certo dia um professor ministrou a aula
aC
toda em inglês, porém me senti atraída e desafiada a entender o que
ele falava. [...] As aulas de língua inglesa I, II, III, IV, V e VI me aju-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

daram muito, e as outras disciplinas que os professores ministravam


em inglês também ajudaram, pois pude ter um contato maior com a
visã
língua inglesa.

No excerto [2.2.a], observamos que a figura do professor representava o


estímulo que a aprendente precisava para desenvolver-se, levando-a a apro-
veitar mais das aulas de língua inglesa, o que, para ela, era uma ótima opor-
a re
itor

tunidade de prática, diferentemente de [4.2.a] como vemos a seguir:

[4.2.a] Ao entrar na universidade sabia bem pouco de inglês, o que


de fato havia aprendido nos anos anteriores eram apenas poucas pa-
par

lavras. E logo na primeira disciplina que tive na faculdade, percebi o


quanto precisava aprender essa língua o mais rápido possível. Então
busquei várias formas de tornar isso possível, a primeira foi me ma-
triculando em um curso de inglês[...] mas por conta de situação fi-
Ed

nanceira precisei deixar o cursinho após aproximadamente 3 meses


são

de estudo. [...] Então passei a estudar em casa, o que no início não


foi tão desesperador pois sempre obtia bons resultados estudando
sozinha, no entanto essa era a primeira vez que estava precisando
estudar um idioma sozinha.
ver

Ao contrário de [2.2.a], a narradora em [4.2.a], não percebia as aulas


de língua como uma possibilidade de desenvolver-se com relação ao idioma,
levando-a a procurar um curso de inglês fora da universidade. Podemos in-
ferir que apesar de perceber o curso de Letras (modalidade extensiva) como
algo desafiador, a aprendente não o via como uma forma de impulsionar sua
82

aprendizagem, ao contrário, enxergou no curso livre de inglês uma oportu-


nidade de aprimorar a língua. Isso se explica a partir do que Gibson (1986)
afirma quando percebemos as affordances. Para o autor, quando observamos
os objetos presentes no ambiente, nós os percebemos ou não como affor-
dances, pois quem observa o ambiente pode ou não perceber a affordance

V
r
dependendo de suas necessidades. Mas, de acordo com Gibson (1986), a

uto
affordance, por ser invariante, está em estado latente, dependendo da per-
cepção, interpretação e ação do observador.
Sobre isso, Chemero (2003) esclarece a questão acima ressaltando que

R
uma affordance não é somente uma propriedade do ambiente nem está di-

a
retamente relacionada com a percepção do animal, mas se constitui a partir
das relações entre os dois em um contexto. O autor explica que quando ob-

do
servamos os objetos presentes no ambiente não os discriminamos em termos
da qualidade, mas os percebemos ou não como affordances. Neste caso, po-
aC
demos afirmar que o ato de perceber ou não as affordances nesse ambiente

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são
depende de como a aprendente enxerga suas necessidades, porém não se
trata de afirmar que este ambiente não as ofereça.
Na concepção de Van Lier (2004), é preciso que haja a percepção, in-
terpretação para que, então, o indivíduo possa agir em relação à affordance,
i
o que fará um novo comportamento emergir. Em termos de aprendizagem
rev

de língua, o aprendente agirá de forma mais ativa assumindo um comporta-


mento mais autônomo. Isso pode ser melhor observado nos excertos desta-
or

cados a seguir:
ara

[5.2.a] No segundo ano de Faculdade, os problemas e as dificul-


dades começaram a aparecer, as quatro habilidades não estavam
t

sendo trabalhadas como deveria, eu não estudava muito nas aulas


de línguas e tinha o contato apenas nos períodos da disciplina, então
i
op

meu rendimento em sala de aula estava caindo, com isso me senti


d

frustrada e ao mesmo tempo constrangida com a minha aprendi-


zagem, a falta de ânimo nas disciplinas foram aumentando, e eu não
podia deixar isso acontecer, percebi que alguma atitude deveria ser
E

tomada enquanto ao meu desenvolvimento acadêmico, comecei a es-


tudar mais, me atentei a assistir vídeo aulas na internet, passei a
ouvir mais músicas em inglês, e me dedicar ao máximo no idioma,
ver

então houve uma grande melhora em sala de aula.

[8.2a] No início da graduação o aprendizado da língua inglesa


ainda era um tabu para mim. Com o passar o tempo fui descobrindo
que existem vários tipos de estratégias para desenvolver e acelerar
a aprendizagem de uma língua estrangeira e cada aluno tem um
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 83

determinado estilo de aprendizagem que se sobressai aos outros.


[...] Ultimamente sempre que preciso escrever algo na língua alvo
eu reviso lições anteriores do livro touchstone ou de qualquer outro
trabalho já realizado para que possa escrever com mais confiança,
utilizo ou busco palavras novas para não esquecer e sempre tento

od V
r
usa-las de várias maneiras diferentes.

uto
Nos trechos destacados dos excertos [5.2.a] e [8.2.a], observamos que
os três elementos (percepção, interpretação e ação) necessários e que definem

R
affordance na visão de Van Lier (2004) estão presentes. Em seus contextos,

oa
as aprendentes perceberam que as condições iniciais de aprendizagem (di-
ficuldade com a produção oral) poderiam mudar caso elas agissem em be-
nefício próprio, o que as levaram a desenvolver estratégias para facilitar a
aprendizagem da língua. O desenvolvimento de estratégias de aprendizagem
aC
pode ser uma das condições para o comportamento autônomo. Paiva (2010)
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explica que a relação que se tem com a língua define nosso comportamento
em relação a ela. No caso das aprendentes, por se tratar de uma língua estran-
visã
geira, elas se apoiaram na própria motivação e autonomia para se desenvol-
verem linguisticamente, procurando novas formas de aprendizagem (como o
uso de estratégias e recursos audiovisuais). Conforme Paiva (2010) sugere, a
motivação e a autonomia podem ser consideradas tipos de affordances.
a re

A agência dessas aprendentes, a partir da percepção de utilidade que


itor

as estratégias proporcionam em relação ao ambiente, faz com que elas se


tornem mais ativas, proporcionando mais possibilidades de prática e au-
xiliando aqueles que possivelmente tenham a mesma dificuldade que elas
(MERCER, 2013).
par

Outro tipo de affordance que observamos nas narrativas está presente


nas interações com a língua estrangeira em sala de aula. Para as aprendentes,
esse foi um elemento decisivo na emergência de novos comportamentos. Nos
Ed

excertos a seguir, verificamos que o uso da língua durante as práticas de pro-


são

dução oral levou as aprendentes a perceberem affordances tanto dentro da sala


de aula como fora desta. Em [1.2.b], [2.2.a] e [6.2.a], por exemplo, as apren-
dentes reconhecem que praticam muito mais a língua em sala de aula. No caso
de [1.2.b], ela acredita que de forma geral sua produção oral é boa em todos os
ver

níveis de língua. Em [2.2.a], a aprendente atribui a melhora na produção oral


não apenas às aulas de línguas, mas a todas as disciplinas do curso.
84

[1.2.b] a maioria das coisas que ouço em Inglês eu consigo compre-


ender sempre, na oralidade também me saio bem, em praticamente
todos os níveis de língua eu sou melhor na oralidade, porém como
não pratico muito fora da sala de aula, as vezes me sinto acanhada
quando pedem para eu falar em inglês.

V
r
[2.2.a] [...] eu não sabia de fato me comunicar em inglês, o desespero

uto
aumentou quando certo dia um professor ministrou a aula toda em
inglês, porém me senti atraída e desafiada a entender o que ele
falava. [...] As aulas de língua inglesa I, II , III, IV, V e VI me aju-

R
daram muito, e as outras disciplinas que os professores ministravam

a
em inglês também ajudaram, pois pude ter um contato maior com a
língua inglesa.

do
[6.2.a] A faculdade e meu curso extra foram fundamentais para
aC
meu aprendizado, já que ambas trabalham em cima das quatro habi-

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lidades linguísticas.
são
Em [5.2.b] e [7.2.a], a seguir, observamos que ambas as aprendentes
buscaram fora da universidade uma forma de melhorar a aprendizagem de
inglês, no entanto, ambas reconheceram que mesmo tendo feito o curso livre
i
rev

de inglês, isso não colaborou para o desenvolvimento da produção oral.


or

[5.2.b] o problema maior era praticar o speaking, pois no curso livre


de idiomas eu aprendi gramática, sentenças simples, vocabulários,
mais eu não usava-os frequentemente em diálogos em inglês, pois
ara

a conversação era pouco trabalhada em sala de aula, então o medo


de errar por falta de pratica, fez com que eu não progredisse muito
t

nessa parte, então minha maior preocupação sempre foi o listening e


i

speaking [...]
op
d

[7.2.a] [...] O impacto foi grande, aí veio a reflexão mais óbvia, tinha
que buscar um outro meio para tentar minimizar as dificuldades que
estava sentindo, um curso.
E

Ellis (2003) aponta que a sala de aula é um contexto de oportunidades


ver

disponíveis aos aprendentes, especialmente, no que se refere ao uso da


língua, pois é neste ambiente que os aprendentes são expostos a uma va-
riedade de elementos linguísticos e não linguísticos. O autor explica que
os aprendentes que, por alguma razão, encontram dificuldades na aquisição
de alguns elementos da língua e no uso desses recursos linguísticos na inte-
ração social, também encontraram algumas barreiras impostas pela própria
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 85

interação como, por exemplo, o tempo. No caso dos excertos de [5.2.b]


acima e [7.2.b] a seguir, por exemplo, as alunas relatam as dificuldades para
o desenvolvimento da fala, que estão na falta de prática e no medo de errar,
levando-as a ter uma participação menos ativa em sala.

od V
r
[7.2.b] [...] As primeiras aulas foram empolgantes, eu gostei, mas

uto
depois de quatro meses de curso comecei a perceber que ele não
estava acrescentando tanto para meu aprendizado e rendimento
dentro da sala de aula e me ajudando pouco no desenvolvimento da

R
fala que era meu maior objetivo.

oa
Este comportamento pode emergir pela influência de diversas variáveis
presentes no contexto em que as alunas estão inseridas e, a partir dos estudos
da complexidade, é preciso considerar as mais diversas variáveis que podem
aC
vir a influenciar na trajetória de aprendizagem delas.
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Além da questão das oportunidades disponíveis aos aprendentes em


sala, mencionando por Ellis (2003), percebemos que as aprendentes, por
visã
vários motivos (por exemplo, afetivos – medo de se expor), interpretam
essas práticas de produção oral como affordances que oferecem algum tipo
de desconforto e que podem ser considerados como uma ameaça para o
“eu” social, pois o medo de errar interfere na dinâmica de participação no
a re

grupo ao qual as aprendentes pertencem (cf. GAIGNOUX; MOUTINHO;


itor

MAGNO e SILVA, 2014). Sobre esta ameaça, Kramsch (2008) explica que
muitas vezes os aprendentes criam expectativas a respeito do que os outros
dirão sobre eles ou o que a situação exigirá deles, ou mesmo passam a se
identificar com os outros ou mostram-se conforme gostariam de ser vistos
par

pelos outros. Embora a ameaça ao “eu” social, conforme mencionamos an-


teriormente, possa fazer emergir um comportamento de aversão ao estudo e
contato com a língua, os excertos das narrativas [7.2.a] e [8.2.a] demonstram
Ed

a emergência de um comportamento contrário àquela aversão. As alunas


são

procuram agir de modo a superar as dificuldades para suprir as lacunas que


impedem o desenvolvimento da produção oral, seja por meio de estratégias
para aprendizagem de vocabulário [8.2.a] ou pelo suplemento fornecido por
um curso livre em uma outra instituição de ensino [7.2.a].
ver

[7.2.a] [...] O impacto foi grande, aí veio a reflexão mais óbvia, tinha
que buscar um outro meio para tentar minimizar as dificuldades que
estava sentindo, um curso.
86

[8.2.a] [...] Com o passar o tempo fui descobrindo que existem vários
tipos de estratégias para desenvolver e acelerar a aprendizagem de
uma língua estrangeira e cada aluno tem um determinado estilo de
aprendizagem que se sobressai aos outros. [...]

Em ambos os casos, a prática de uso da língua, emergente da interação

V
r
oral, funciona para as aprendentes como affordances. Por meio das ativi-

uto
dades realizadas em sala, essas affordances foram percebidas e interpretadas
como algo negativo em um primeiro momento, o que gerou uma ação que
não permitiria uma atitude ativa. Contudo, esta mesma affordance possibi-

R
a
litou uma ação para ajudar a alterar aquele comportamento de inibição.
A expectativa de aprender a falar a língua inglesa durante as aulas de

do
língua oferecidas pelo curso de graduação ou por um curso livre acaba con-
tribuindo para o aumento da ansiedade ao longo do processo de aprendi-
aC
zagem da língua. McNeil (2014), ao tratar da ansiedade na aprendizagem de

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língua estrangeira, afirma que esta ansiedade, considerada a partir da pers-
são
pectiva ecológica, pode não estar relacionada unicamente a questões como
as habilidades linguísticas e culturais do indivíduo, mas também às demais
relações presentes no contexto que não são percebidas como affordances.
i
O autor complementa seu pensamento explicando que esta ansiedade pode
rev

ser qualitativamente diferente em diversos contextos, dependendo da po-


tencialidade (isto é, possibilidade de percepção e interpretação) para a ação
or

presente em cada contexto. Nesse sentido, a ação através da percepção e


interpretação das affordances tem o objetivo, também, de diminuir esta an-
ara

siedade na aprendizagem.
Ao perceber a affordance como uma possibilidade de mudança, uma
t

nova trajetória surge no desenvolvimento da língua. No excerto a seguir,


observamos que a aprendente faz uma avaliação positiva com relação a sua
i
op

produção oral:
d

[5.2.b] o problema maior era praticar o speaking, pois no curso livre de


idiomas eu aprendi gramática, sentenças simples, vocabulários, mais
E

eu não usava-os frequentemente em diálogos em inglês, pois a conver-


sação era pouco trabalhada em sala de aula, então o medo de errar por
ver

falta de pratica, fez com que eu não progredisse muito nessa parte, então
minha maior preocupação sempre foi o listening e speaking,

No excerto acima, a avaliação feita pela aprendente sobre sua produção


oral demonstra que as variáveis da percepção permitiram a autorregulação
na interação com a affordance. Em [5.2.b], a aprendente sinaliza que sua
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 87

grande dificuldade era a habilidade de produção oral e que ao fazer o curso


livre fora da universidade havia melhorado quanto ao seu conhecimento gra-
matical e vocabular, entretanto, o medo de errar ao usar a língua a impedia de
progredir neste aspecto. No entanto, a aprendente percebeu que ao iniciar o
curso na faculdade sua produção oral melhorou levando-a a diminuir o medo

od V
r
de errar, conforme excerto [5.2.c] a seguir:

uto
[5.2.c] Na faculdade observei um grande desenvolvimento em minha
vida acadêmica, o meu nível de língua aumentou, aprendi a utilizar

R
as estratégias de conversação, as estruturas da língua, regras gra-

oa
maticais, o writing também ajuda bastante na hora da conversação,
minha participação em sala de aula aumentou, e eu não tenho mais
tanto medo de errar me expondo, [...]
aC
Nos trechos destacados em [5.2.d], observamos que ao ser exposta a
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uma situação que exigiria dela um comportamento mais ativo, a aprendente


passou a monitorar a própria aprendizagem e as affordances percebidas por
visã
ela como benefício ao seu desenvolvimento.

[5.2.d] No segundo ano de Faculdade, os problemas e as dificuldades


começaram a aparecer, as quatro habilidades não estavam sendo
trabalhadas como deveria, [...], com isso me senti frustrada e ao
a re
itor

mesmo tempo constrangida com a minha aprendizagem, [...], e eu


não podia deixar isso acontecer, [...] comecei a estudar mais, me
atentei a assistir vídeo aulas na internet, passei a ouvir mais músicas
em inglês, e me dedicar ao máximo no idioma, então houve uma
par

grande melhora em sala de aula.

De acordo com Zunbrun, Tardlock e Roberts (2011), a autorregulação é


um processo que auxilia os aprendentes no controle de seus comportamentos
Ed

e emoções com o objetivo de usufruir de suas experiências de aprendizagem


são

com sucesso. Ainda segundo os autores, a aprendizagem autorregulada é


controlada por um conjunto interconectado de fatores que determinam seu
desenvolvimento e sustentabilidade, em que a motivação é um desses fa-
tores. Como bem apontou Paiva (2013a), a motivação tende a ser uma das
ver

affordances utilizadas pelos aprendentes na manutenção da aprendizagem


da língua.

[5.2.e] Durante esse período do curso até agora, minha preocupação


maior sempre foi desenvolver essas duas habilidades, o listening
e o speaking, reconheço que eu deveria me dedicar ainda mais no
88

curso de Letras, não que eu esqueça de estudar e não estou nem aí


para desenvolver minhas habilidades, quero dizer, que eu dedico um
tempo maior entorno da disciplina que eu esteja cursando em um
determinado período, ou seja, pois são várias disciplinas em um se-
mestre, então o idioma não é praticado com tanta frequência como
nas aulas de línguas, porem recai um pouco essas habilidades por

V
r
falta de tempo em pratica-las.

uto
No excerto de [5.2.e] acima fica evidente que apesar da dedicação e es-
forço em superar as dificuldades com as habilidades de listening e speaking,

R
a aprendente encontra algumas barreiras ainda não superadas. Uma dessas

a
barreiras refere-se às demais disciplinas do curso que acabam tomando muito
mais seu tempo, o que a faz não praticar a língua oralmente como deveria, pois

do
ela reconhece que nas aulas de língua teria mais oportunidades de prática.
aC
Observamos aqui que o currículo do curso de Letras, composto tanto por

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disciplinas teóricas sobre a língua inglesa e de disciplinas que ensinam como
são
usá-la, cria um conflito de percepção dos alunos sobre o seu próprio desenvol-
vimento como falantes. Ou seja, no excerto [5.2.e] acima, a aluna reconhece
a necessidade de praticar a língua, mas isso acaba ficando em segundo plano,
pois precisa dedicar-se a outras disciplinas do curso, as quais não são vistas
i
rev

pela aprendente como forma de desenvolver-se em sua produção oral.


Em suma, o que verificamos no resultado da análise de todas as narra-
or

tivas apresentadas é que, ao considerarmos a aprendizagem de línguas como


um sistema adaptativo complexo, as mudanças neste sistema ocorreram em
razão das dificuldades encontradas pelas aprendentes com a produção oral.
ara

Elas queriam falar a língua, porém encontravam barreiras que as impediam


t

de avançar, mas, a vontade de aprender a falar foi o fator determinante para


elas para o desenvolvimento da habilidade. Por conta disso, ocorreu uma
i
op

mudança de fase que exigiu uma auto-organização do sistema a partir da


d

interação com as affordances. Estes encontravam-se disponíveis, no entanto,


cada uma das aprendentes percebeu e agiu de acordo com suas necessidades
levando o sistema a mudar sua trajetória.
E

ver
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 89

5 Considerações Finais

Na trajetória de aprendizagem de uma língua estrangeira, é possível


observar que o desempenho das alunas está também atrelado, entre outras
variáveis, às oportunidades que elas mesmas veem como significativas e à

od V
r
ação empreendida por eles em seu próprio benefício. Quaisquer influências

uto
externas que possam ajudar no desenvolvimento das competências serão tão
mais efetivas quanto o valor conferido a elas pelo aluno no contexto em que
está inserido.

R
As affordances, dessa forma, só gerarão saltos qualitativos se o aluno

oa
conseguir agir depois de considerar sua utilidade. Muitos alunos são capazes
de agir com mais autonomia e reconhecer em seus contextos as affordances
que os ajudarão dentro e fora de sala, mas também haverá aqueles que pre-
aC
cisarão de auxílio para que obtenham sucesso no processo de percebê-las.
É neste momento que o professor precisa intervir para tornar mais claras as
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possibilidades presentes no contexto para cada aluno.


visã
As narrativas coletadas e utilizadas neste estudo para a análise de affor-
dances mostram alunas com vários níveis de percepção das potencialidades
de aprendizagem de língua antes e depois da entrada no ensino superior. Em
suas trajetórias, é possível verificar o aspecto relacional presente na inte-
ração entre indivíduo e contexto, fazendo emergir affordances únicas para
a re
itor

cada aluno. Chemero (2003) afirma que as affordances estão na relação entre
as habilidades do animal e alguns aspectos presentes no contexto situacional
em que se encontram, podendo haver mudanças tanto em um quanto em
outro. Estas mudanças foram percebidas nos relatos das alunas, que inter-
par

pretaram e agiram a partir da mesma affordance de maneiras diferentes, o


que caracteriza a subjetividade de cada uma. Nesse entendimento, Ziglari
(2008) esclarece que a emergência de novos comportamentos surge como re-
Ed

sultado da interação dos aprendentes com o ambiente e que a aprendizagem


pode ser modificada conforme os aprendentes experimentam diferentes con-
são

textos e estão conscientes das diferentes affordances disponíveis. A partir


do exposto, podemos inferir que as interações entre as aprendentes e o am-
biente podem ser caracterizadas como beira do caos, onde os alunos tentam
ver

manter a estabilidade de seu sistema de aprendizagem e outros sistemas (ex.:


aninhando-se ao sistema identitário, como mencionado anteriormente), mu-
dando e adaptando-se. As affordances podem ser determinantes para que
haja uma mudança de fase a partir da ação promovida pela percepção e in-
terpretação do aluno, que pode auxiliá-lo no desenvolvimento da habilidade
de produção oral.
90

Para os aprendentes, de maneira geral, a clareza sobre as possibilidades


oferecidas pelo ambiente é importante para que ele possa ser mais ativo e
independente em sua aprendizagem. Para o professor, entender que as affor-
dances são únicas para cada aluno e que estas mudam conforme as mudanças
no contexto ou no aluno é imprescindível para uma prática pedagógica que se

V
r
proponha a desenvolver não apenas memorização de conteúdo, mas também

uto
comportamentos que os tornem aprendentes para toda a vida.

R
a
do
aC

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são i
rev
or
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di t op
E

ver
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

ver
Ed
são
itor
par aC
PARTE II
a re
visã R
od V
oa
uto
r
LIVROS DIDÁTICOS COM FOCO
NA TEORIA DA COMPLEXIDADE
E d
ver

i t or op
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rev
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do
a uto
r
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CAPÍTULO 4

POTENCIALIDADES DA ABORDAGEM
COMPLEXA NO USO DA COLEÇÃO

od V
r
“ALIVE! INGLÊS” – Ensino Fundamental1

uto
Leonardo dos Santos Pereira (CEBRAC)

R
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)

oa
1 Introdução

Desde o final da década de 1980, o contexto de ensino de línguas caminha


aC
para o que a área denomina de uma condição de pós-método (PRABHU,
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

1987, 1990; KUMARAVADIVELU, 1994, 2001). Nesse contexto, de acordo


com Kumaravadivelu (1990, p. 27), há uma reconfiguração da “relação entre
visã
teorizadores e professores pelo empoderamento dos professores com co-
nhecimento, habilidade e autonomia2”. Com isso, os professores estariam
aptos a “desenvolver por eles mesmos a sistematização de uma alternativa
coerente e relevante para o método, subsidiada por princípios pragmáticos”
a re

(KUMARAVADIVELU, 1990, p. 27) e relacionada à situação imediata de


itor

ensino. É o que Kumaravadivelu (2001) denomina pedagogia do pós-método


ou pedagogia da pragmática, Prabhu (1987) de pedagogia intuitiva ou senso
de plausibilidade e Borges (2010a) de metodologia (em oposição à abor-
par

dagem que seria a pedagogia dos teorizadores). Inserida nessa perspectiva,


a era do pós-método não compartilha da ideia mais tradicional do uso ex-
clusivo de um determinado método e/ou abordagem para um determinado
contexto de ensino de língua (PRABHU, 1990); aproximando o ensino e
Ed

a aprendizagem de línguas a uma ideia de complexidade em sala de aula


são

mediada pelo professor.


No entanto, conforme Borges (2010a), a pedagogia do pós-método su-
bentende uma ruptura com as concepções da natureza da linguagem e do
ensino/aprendizagem que subsidiam métodos e abordagens, ou seja, com a
ver

pedagogia dos teorizadores. Nesse sentido, ainda segundo Borges, a noção

1 Uma versão modificada e ampliada deste trabalho, com a inclusão da análise de outras atividades do livro do 6º/7º ano/
EF e 1º ano/EM, foi publicada no livro Current Issues in Second/Foreign Language Teaching and Teacher Development:
Research and Practice, da Cambridge Scholars Publishing, em 2015. Produção proveniente da apresentação e discussão
da abordagem complexa (BORGES; PAIVA, 2011), por um dos autores, no 17th AILA World Congress, de 10 a 15 de
agosto de 2014, em Brisbane/Austrália.
2 Essa e as demais traduções neste artigo são de nossa responsabilidade.
94

de senso de plausibilidade de Prabhu – que subentende que a noção de mé-


todos bons ou ruins é nela mesma enganosa – seria mais apropriada do que
a noção de pedagogia da pragmática de Kumaravadivelu para se pensar uma
condição de pós-método em sala de aula, tendo em vista que a primeira não
prevê, como a segunda, uma ruptura tão fortemente marcada com as abor-

V
r
dagens de ensino de língua e/ou pedagogia dos teorizadores.

uto
Apoiadas na visão da importância da teorização sobre o ensino e a
aprendizagem de línguas para mediar ações diversas e conscientes no con-
texto de sala de aula, Borges e Paiva (2011) desenvolveram a nomeada abor-

R
dagem complexa de ensino de línguas (doravante abordagem complexa),

a
alicerçada nos princípios da teoria da complexidade/caos. A abordagem
complexa visa uma pedagogia de ensino de língua que é articulada por di-

do
ferentes teorias sobre a natureza da linguagem e do ensino/aprendizagem
de diferentes áreas do conhecimento, objetivando, essencialmente, “acolher
aC
a pedagogia intuitiva do professor e/ou sua metodologia, servindo não so-

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
mente de orientação para as suas ações em sala de aula, mas principalmente
proporcionando sustentação a elas” (p. 351).
Nessa perspectiva contemporânea de ensino de língua, entende-se,
aqui, que a coleção de livros didáticos Alive traz para o contexto de ensino
i
de língua inglesa, no ensino fundamental e médio, princípios da era do pós-
rev

-método coadunadas com a concepção de linguagem e de aprendizagem3


como sistema adaptativo complexo (SAC). Dessa forma, este capítulo tem
or

por objetivo apontar as potencialidades da abordagem complexa no uso da


série, viabilizada por meio de uma análise de atividades propostas nos livros
ara

do professor do sexto e sétimo anos do ensino fundamental (MENEZES et


al. 2012a; 2012b). Para tanto, será apresentado o que segue: breve história
t

do contexto de produção, fundamentação e organização da série; resumo


i

da abordagem complexa e seus elementos constitutivos; análise da poten-


op

cialidade de alguns componentes da abordagem complexa em atividades


d

extraídas dos livros do sexto e sétimo anos.


E

2 A coleção de livros didáticos “Alive! inglês” – Ensino Fundamental

A série Alive traz uma proposta de ensino de inglês para o ensino funda-
ver

mental (EF) e médio (EM) menos restrito ao contexto de sala de aula e mais
ligado às práticas sociais. Os livros do EF foram lançados em 2012, pela
Editora Anzol Ltda., tendo como autores/as professores/as da Universidade
Federal de Minas Gerais e da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A

3 Neste capítulo não faremos distinção entre os termos aprendizagem e aquisição.


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 95

série foi aprovada pelo Ministério da Educação para ser distribuída nas es-
colas públicas brasileiras por meio do Programa Nacional do Livro Didático
de 2014, 2015 e 2016.
A coleção para o EF – de interesse deste estudo – é divida em quatro
livros (6º ao 9º ano) (Fig. 1). Cada livro, possui “oito unidades, organizadas

od V
r
em 4 blocos de 2 unidades, que constituem as 4 partes do livro” (MENEZES

uto
et al. 2012a, Manual do Professor, p. 11), mais duas unidades, ao final, deno-
minadas atividades extras. Ainda, cada um dos blocos possui uma abertura
(Learning plan) e um fechamento (Learning strategies e Let´s reflect on le-

R
arning!). Ao final, disponibiliza-se um Glossary (inglês-português) e uma

oa
seção denominada Language reference (aspectos linguísticos). Cada livro
possui também um CD de áudio, para ser utilizado na seção Let´s listen!
presente nas unidades.
aC
Fig. 1 - Imagem da Coleção Alive do Ensino Fundamental
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

visã
a re
itor

Fonte: Paiva (2013b, p. 8)

As quatro habilidades linguísticas (ouvir, falar, escrever e ler) – como en-


par

fatizado na coleção – são incentivadas para serem trabalhadas em conjunto de


duas ou mais (uma inovação da coleção em relação a outras), com as seguintes
combinações nas unidades: Let´s listen and read!, Let´s listen, read and talk!,
Ed

Let´s read and write! – entre outras sugestões. A análise linguística fica em
são

destaque na seção Let´s focus on language!, também em cada unidade, e é


sistematizada ao final de cada livro na seção Language reference.
Ao fazer a “Apresentação da obra”, Menezes et al. (2012a; 2012b) enfa-
tizam que o ensino na série pretende focar o uso social da linguagem, trazendo
ver

características do chamado sistema complexo para a sala de aula – orientado


pelos fundamentos da teoria da complexidade/caos (LARSEN-FREEMAN,
1997; PAIVA, 2005a; LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008). Dessa
forma, a coleção está alicerçada também na visão de aprendizagem mediada
pela compreensão desse processo por diferentes teorias, ou seja,
96

“(1) na capacidade inata para aprender uma língua; (2) na importância


de hábitos automáticos, como no caso do uso de algumas expressões
formulaicas e na aprendizagem de elementos sonoros; (3) na impor-
tância do insumo linguístico obtido por meio da exposição a práticas
sociais da linguagem autênticas, contextualizadas e socialmente signi-
ficativas; (4) na importância da interação da lingualização (output) e

V
r
da negociação de sentido; (5) no papel dos contextos neurais; (6) na

uto
relevância da construção da identidade; (7) na necessidade da mediação
social; (8) na aprendizagem situada em comunidades de prática; e tantas
outras propostas que tentam explicar como se aprende uma língua”

R
(MENEZES et al.. 2012a; 2012b, Manual do Professor, p. 3-4).

a
Em vista disso, a coleção fundamenta-se em uma concepção contempo-

do
rânea de linguagem como “um sistema semiótico complexo que compreende
aC
processos biocognitivos, sócio-históricos e políticos-culturais e que [...] per-
tence ao domínio individual e ao domínio social”; ainda sinaliza a língua

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
“como um sistema complexo”, ou seja, “não é algo estático, ou um conjunto
de estruturas linguísticas, mas um sistema vivo e dinâmico em constante
evolução e mudança” (MENEZES et al.. 2012a, Manual do Professor, p. 3).
Sabe-se que o lançamento de livros didáticos com uma visão de linguagem
i
não mais como forma gramatical e sim como interação social tem sido uma
rev

tendência na atualidade, mas a coleção em questão inova ao basear-se na


visão de linguagem como sistema dinâmico.
or

Alive significa “vivo(a)”, que é a ideia que o livro tem sobre a linguagem
como um sistema vivo, adaptativo, não linear, um sistema complexo; ou
ara

seja, como enfatizam os autores da série, “a obra busca oferecer aos profes-
sores e aos seus alunos um retrato da língua inglesa em uso, em ação, com
t

todas as características de um sistema complexo vivo que muda no tempo e


i

no espaço” (MENEZES et al. 2012a, Manual do Professor, p. 3). Assim, a


op

concepção de inglês vivo, no título da coleção, é subsidiada por uma visão de


d

sujeito e de construção de conhecimento como consta na passagem abaixo:


E

“- O ser humano é ser de múltiplas dimensões; - Todos aprendem


em tempos e ritmos diferentes; - O desenvolvimento humano é um
processo contínuo; - O conhecimento deve ser construído e recons-
ver

truído, processualmente e continuamente.” (Menezes MENEZES et


al. 2012a, Manual do Professor, p. 3)
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 97

Ainda, como explica uma das autoras do livro em outro trabalho,

“O título da obra se justifica pelo uso do inglês vivo, em uso, regis-


trado em textos orais e escritos. As diversas amostras do uso da língua
inglesa apresentam situações vividas por diferentes usuários e propor-

od V
r
cionam oportunidades para que alunos se engajem em práticas sociais
por meio de gêneros orais e escritos.” (PAIVA, 2013b, p. 8).

uto
A coleção ainda se diferencia de outros livros didáticos na atualidade

R
em vários pontos. Por exemplo, ela traz gêneros textuais “não encontrados

oa
em outras obras, como, por exemplo, listas de materiais escolares, regras de
uso de brinquedos em parques de diversão, dentre outros” (PAIVA 2013b,
p. 8). O uso desses gêneros aproxima o inglês à realidade dos alunos, já
que são “formas de vida, modos de ser [...] frames para a ação social”
aC
(BAZERMAN, 2006 apud MENEZES et al. 2012a, Manual do Professor,
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p.), proporcionando foco no uso da língua, e não apenas em sua forma.


visã
3 Abordagem complexa de ensino de língua

O artigo de Borges e Paiva (2011), Por uma abordagem complexa de


ensino de línguas, apresenta uma abordagem de ensino de língua contem-
a re

porânea, cujos pilares (ANTHONY, 1963) são a natureza da linguagem e


itor

do ensino/aprendizagem como um sistema adaptativo complexo (SAC).


Segundo as autoras, a linguagem como um SAC deve ser entendida como
um sistema que compreende processos cognitivos, sociais, históricos, po-
líticos e culturais e hábitos adquiridos. Por outro lado, a aprendizagem de
par

língua como um SAC abarca ampla categoria de hipóteses de aquisição


conceituadas como nativistas, comportamentalistas e interacionistas e não
apenas uma ou duas hipóteses, inseridas em apenas uma dessas categorias,
Ed

como acontece com as outras abordagens de ensino. Nesse contexto, a


são

abordagem complexa abriga vários elementos que se relacionam entre si,


tomando a língua como dinâmica, um sistema aberto, que evolui e muda
constantemente. Ainda, como outros sistemas complexos, a linguagem e
a aquisição de língua podem agregar novos conceitos, como os princípios
ver

de um sistema aberto e auto-organizável que nunca perde sua organização


interna, apesar de toda a transformação (PAIVA; NASCIMENTO; 2009).
Esses sistemas possuem propriedade única, de organização nuclear, que
permite o rearranjo a cada novo processo adquirido. Portanto, esse processo
é sempre inacabado e não linear, permitindo ao falante agir na sociedade e a
modificar, pois o coloca como um sujeito sócio-histórico-cultural. Borges e
98

Paiva (2011) pontuam, ainda, que a sala de aula também se constitui como
um SAC, pois esse ambiente vive – uma vez em ação com seus interagentes
– em constante evolução e mudança; sendo que cada aluno e o professor (e
outros agentes internos e externos à escola: coordenação pedagógica, di-
reção, corpo docente, comunidade, estado etc) também se constituem como

V
r
SAC, ampliando a capacidade de mudança e a adaptabilidade da sala de aula

uto
e, por consequência, sua complexidade.
De acordo com Demo (2008 apud BORGES; PAIVA, 2011), a comple-
xidade de um sistema baseia-se em sete características: dinamicidade, não line-

R
aridade, reconstrução, irreversibilidade, ocorrência em um processo dialético

a
evolutivo, intensidade e ambiguidade/ambivalência. Um sistema é dinâmico,
pois sempre se modifica. Essas modificações são, em suma, irreversíveis, pois

do
acontecem de maneira não linear. Com isso, o sistema sempre se reconstrói.
Como o sentido do todo está em cada parte do sistema, ele se caracteriza em
aC
um processo dialético evolutivo. As mudanças podem ter intensidades dife-

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são
rentes, podem ser pequenas ou grandes; e, como em toda mudança, podem
apresentar certa ambiguidade e/ou ambivalência. A complexidade permite que
esses fatores estejam intrinsecamente ligados uns aos outros.
Borges e Paiva (2011) explicam que um SAC é autônomo já que possui
i
a capacidade de se auto-organizar. Esse processo ocorre para que o sistema
rev

atinja um equilíbrio interno, sendo esse sempre moldado por atratores.


Um atrator é um comportamento que o sistema complexo “prefere”, como
or

discutido no capítulo introdutório deste livro. No contexto de sala de aula,


segundo as autoras, esses atratores dependem da concepção de linguagem
ara

e de ensino/aprendizagem que o professor carrega consigo, implícita ou ex-


plicitamente. Outro conceito importante, enfatizado pelas autoras, é o da
t

autopoiese ou autoproduzir-se em contato com o meio, porém de um modo


i

que é particular a cada sistema.


op

Para o desenvolvimento da abordagem complexa de ensino de línguas,


d

Borges e Paiva (2011) ampliaram os já quatro componentes (conectividade


mente-corpo-mundo na aprendizagem, dinamicidade da linguagem, coa-
E

daptação em sala de aula e centralização na aprendizagem) discutidos em


Larsen-Freeman e Cameron (2008), ou seja: providenciar o desenvolvi-
mento da competência ecológica (KRAMSCH, 2006) dos alunos; focar a
ver

organização na dinamicidade da linguagem na sala de aula; destacar os pro-


cessos de mudança e as negociações de sentidos e; focar-se no processo de
aprendizagem e desempenho dos alunos. A seguir os nove componentes da
abordagem complexa elaborados por Borges e Paiva (2011):
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 99

1. A linguagem e a aquisição de língua como SACs. A língua muda


e varia diacronicamente e ao ignorar estas mudanças ignora-se a
dinamicidade desse sistema;
2. A natureza do ensino/aprendizagem como multifacetada, vinculada
a diferentes concepções de construção do conhecimento;

od V
r
3. O professor como um dos elementos que torna o sistema de ensino/

uto
aprendizagem dinâmico. A metodologia do professor deve abrigar
mudanças, interagindo com os alunos (de maneira não linear), con-
cebendo a sala de aula e a escola como um SAC;

R
4. O desempenho é individual que, como um SAC, se auto-organiza

oa
durante o processo de aprendizagem. A sala de aula é heterogênea,
portanto, o desempenho individual de cada aluno deve ser levado
em consideração;
aC
5. A linguagem se materializa nas práticas sociais: língua falada e
escrita, gêneros discursivos, identidades etc., elementos essen-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

ciais no processo de aquisição de língua. Professores e alunos


devem ir além do básico e tradicional na aula e utilizar esses
visã
elementos contextualizados;
6. Acolher as múltiplas identidades. O professor deve entender as
identidades dos alunos como multifacetadas, fractalizadas (SADE,
2009) e, consequentemente, como SACs. Elas emergem e se (re)
a re
itor

constroem sócio-histórico e culturalmente.


7. As ações em sala de aula devem estar situadas na coconstrução
(professores-alunos) de um planejamento semiótico-ecológico
(BORGES, 2014a); ou seja, o planejamento é também um SAC,
par

tendo os eixos forma-significado-uso e autonomia-autenticidade-


-consciência como esteios;
8. Construção e restrição de affordances, que ocorre quando o pro-
Ed

fessor percebe os elementos da aprendizagem que contém valoração


para os alunos. Affordance traz a ideia da interdependência do aluno
são

com o seu ambiente e pode estimular ou restringir a aprendizagem.


9. Professores e alunos são seres vivos, portanto, possuem organização
autopoiética: produzem seu próprio ser, em contato com o meio e seu
ver

pares, porém se estruturando do modo que lhe for particular. A escola


(e seus agentes) é um elemento importante dessa autoconstrução.

O artigo de Borges e Paiva (2011) foi desenvolvido com o intuito de


propor uma abordagem complexa de ensino de línguas que subentende todo
o conjunto de elementos de uma sala de aula (professor, aluno, ensino/apren-
dizagem, material didático etc) como SAC. Fundamentado nessa abordagem,
100

o professor deve, ao invés de repetir métodos e técnicas, construir conscien-


temente a sua própria “metodologia” (BORGES, 2010a) levando em consi-
deração seu contexto imediato de ensino e as diversas teorias que o possam
ajudar no entendimento da dinâmica do ensino/aprendizagem. Por outro
lado, o aluno não deve apenas seguir instruções cegamente, mas mediar sua

V
r
própria aprendizagem, sendo um sujeito ativo e autônomo nesse processo.

uto
A aquisição, ao invés de linear e rígida, deve evoluir constantemente. Nesse
contexto, segundo as autoras, não seria mais adequado o uso do conceito de
“língua-alvo”, uma vez que para o ensino e para a aprendizagem não se trata

R
tanto de uma questão de objetivos e pontos de chegada, mas de desenvolvi-

a
mento, dinamicidade, não linearidade, auto-organização já que um sistema
complexo nunca se encontra em total repouso.

do
4 Potencialidades da abordagem de complexa no uso da coleção
aC
“Alive! inglês”

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são
Para verificar e demonstrar a potencialidade do uso da abordagem com-
plexa (BORGES; PAIVA, 2011) na prática da série Alive em sala de aula,
foram selecionadas atividades de dois dos livros do professor da coleção, mais
i
especificamente os destinados ao sexto (MENEZES et al. 2012a) e sétimo
rev

anos (MENEZES et al. 2012b) do Ensino Fundamental. Os parâmetros para


or

seleção, análise e discussão das atividades aqui demonstradas foram sete dos
nove componentes fundadores da abordagem complexa, a saber: 1) linguagem
e aquisição de língua como SACs; 2) natureza do ensino/aprendizagem como
ara

multifacetada; 3) professor como elemento que dá dinamicidade ao processo


de ensino/aprendizagem; 4) foco no desempenho individual do aluno; 5) lin-
t

guagem materializada em práticas sociais; 6) acolhimento das múltiplas iden-


i

tidades; 7) fornecimento e/ou restrição de affordances.


op

A seguir apresentar-se-á as atividades escolhidas e suas relações com os


d

sete componentes da abordagem complexa destacados acima. No entanto, esta


pesquisa não visa esgotar todas as atividades da série que potencialmente de-
E

monstram os componentes da abordagem complexa; o que se objetiva é mostrar


alguns exemplos apenas, de muitos que podem sem encontrados na série, cujas
escolhas são de nossa inteira responsabilidade. Muitas atividades contemplam
ver

mais de um componente, mas em cada tópico abaixo destacaremos apenas o


componente em evidência nas atividades utilizadas como modelo.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 101

4.1 Componente 1 – linguagem e aquisição de língua como SAC:

Os autores da série “Alive! inglês”, diferentemente de outras obras, en-


corajam4 o professor a explicar ao aluno a característica viva e complexa da
gramática da língua a ser aprendida como um componente constituinte da

od V
r
linguagem como prática social, mostrando ao aluno que ela varia no tempo

uto
e lugar; ou seja, “Grammar is not dead – it is alive. It changes and it varies
from place to place” (MENEZES et al. 2012b: 94, negrito nosso). Dessa
forma, a seção do livro Learning strategies (Fig. 2) traz o uso da gramática

R
como algo dinâmico, não linear e que produz sentido ao invés de apenas

oa
caracterizar-se como um amontoado de regras da língua. Reconhecer que a
gramática é viva e que se apresenta de formas diferentes em diferentes con-
textos de uso (variação linguística) subentende o reconhecimento da língua
aC
como um SAC. A atividade ilustrada na Fig. 2, por exemplo, busca fazer
com que professor e alunos reflitam criticamente a respeito do papel ativo da
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gramática da língua inglesa e da sua variação no uso em diferentes contextos


(Estados Unidos e Reino Unido), não havendo necessidade de separar a gra-
visã
mática em atividades dissociadas do desenvolvimento da língua.

Fig. 2 – Atividade extraída do Fig. 3 – Atividade extraída do


livro “Alive! inglês” livro “Alive! inglês”
a re
itor
par
Ed
são
ver

(MENEZES et al. 2012b, p. 94). (MENEZES et al. 2012b, p. 62).

4 Encorajamento visto nas explicações em letras azuis ao longo dos livros do professor.
102

Ainda, os significados das palavras dependem dos seus contextos de


uso: “Meaning depends on the context” (MENEZES et al. 2012b, p. 62)
(Fig. 3) – o que também mostra a concepção da natureza viva da linguagem
inserida na coleção. E sendo a gramática viva, é viva também a linguagem,
já que ambas estão aninhadas na constituição de um mesmo sistema com-

V
r
plexo. Com essa visão de linguagem, o livro apresenta diferentes signifi-

uto
cados do termo alive, deslocando a gramática de suas formas tradicionais de
apresentação como desarticulada do uso da linguagem.
Em outro exemplo (Fig. 4), na seção Let´s write and listen!, há uma

R
atividade que visa a compreensão do uso da expressão used to pelo aluno.

a
Para tanto, o livro utiliza exemplos de retextualização de gêneros discursivos
(DELL’ISOLA, 2007) ao longo da história, como carta e email, mostrando

do
a dinaminicidade da produção das formas de ação social materializada pelos
gêneros textuais no uso da linguagem.
aC

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Fig. 4 – Atividade extraída
são Fig. 5 – Atividade extraída
do livro “Alive! inglês” do livro “Alive! inglês”
i
rev
or
ara
di t op
E

ver

(MENEZES et al. 2012b, p. 47). (MENEZES et al. 2012a, p. 130).


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 103

A produção de “erros” (Fig. 5), principalmente na oralidade, pode ser


entendida como uma das características da linguagem como SAC. Dada a
não lineariade de sistemas complexos há a possibilidade de bifurcações em
sua rota testando novos caminhos e essas bifurcações, no caso da linguagem,
podem ser ocasionadas pela hesitação, por exemplo. Nesse contexto, a série

od V
r
compreende o “erro” como parte do processo dinâmico de produção e, con-

uto
sequentemente, aquisição da linguagem. Na atividade de speaking, na Fig. 5,
a dica é que o aluno não deve ter medo dos “erros”, como a hesitação, decor-
rentes das tentativas de produção da linguagem oral, pois essas manifestações

R
fazem parte do processo. Segundo o livro “Hesitation in not a mistake, but a

oa
characteristic of oral interaction” (MENEZES et al. 2012a, p. 130).

4.2 Componente 2 – natureza multifacetada do ensino/aprendizagem


aC
A natureza multifacetada do ensino/aprendizagem, conforme Borges
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

e Paiva (2011, p. 350-351, itálico das autoras), está “fundamentada pela


dimensão dinâmica reconstrutiva desse processo como postulado em dife-
visã
rentes reflexões sobre a construção de conhecimento”. Isso significa que,
considerando as necessidades do contexto imediato de aprendizagem, o pro-
fessor, como um dos elementos que dá dinamicidade à sala de aula, tem
liberdade para utilizar os princípios de diferentes tipos de abordagem de
a re
itor

ensino de língua durante uma mesma aula, tendo em vista também que a
abordagem complexa é multifacetada na sua concepção de ensino/aprendi-
zagem e de linguagem. Os livros da série Alive proporcionam ao professor
essa liberdade.
par
Ed
são
ver
104

Fig. 6 – Atividade extraída Fig. 7 – Atividade extraída


do livro “Alive! inglês” do livro “Alive! inglês”

V
r
uto
R
a
do
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são i
(MENEZES et al. 2012a, p. 94). (MENEZES et al. 2012a, p. 84).
rev

Na Fig. 6 pode-se ver um exemplo desse fato. Nas observações, em letra


or

azul, para o início das atividades 9 e 10 (pré-leitura), solicita-se a ativação


do conhecimento prévio dos alunos sobre o tema a ser discutido. A ativação
do conhecimento prévio é um princípio de fundamentação da abordagem
ara

instrumental – cuja visão de linguagem é como instrumento de comunicação


e a concepção de aprendizagem e/ou construção do conhecimento funda-
t

mentada no cognitivismo piagetiano (BORGES, 2010a). Ainda, o uso das


i
op

estratégias de leitura (pré-leitura, leitura e pós-leitura), indicadas pelo livro,


d

são reconhecidamente estratégias dessa abordagem com foco na leitura, como


proposta pelos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira do
Ensino Fundamental (BRASIL, 1998), por exemplo. No entanto, o livro
E

utiliza também estratégias de compreensão da língua nas outras habilidades,


mostrando facetas da abordagem instrumental que não se limitam ao foco
ver

da leitura. Logo após, na mesma página, há uma atividade mais clássica,


sobre linguagem formal e informal (atividade 11 no livro). Nessa atividade,
há um enfoque na forma da língua (uso da forma negativa do verbo do/does
e suas contrações) com exercícios típicos da abordagem gramatical, cuja
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 105

concepção de linguagem é como gramática e de aprendizagem como for-


mação de hábito e/ou fixação de estruturas gramaticais, postulada pela visão
empirista e/ou behaviorista de construção de conhecimento.
Já na atividade da Fig. 7, pode-se encontrar um exercício de com-
preensão oral que utiliza o gênero textual receita. Nessa atividade, o livro

od V
r
explica como esse gênero se estrutura no quadro “Did you know?” e na

uto
sequência sugere ao professor que faça uma atividade em que uma receita
de fácil preparação possa ser desenvolvida como atividade de sala de aula.
A refação de gêneros textuais no ensino de língua é um das características

R
da abordagem baseada em gêneros, defendida pelas Diretrizes Curriculares

oa
da Educação Básica – Língua Estrangeira Moderna (PARANÁ, 2008), por
exemplo, que se fundamenta na visão de linguagem como ato social e na
construção sociointeracional do conhecimento.
aC
4.3 Componente 3 – professor como elemento que dá dinamicidade à
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

sala de aula:
visã
Os livros da coleção Alive têm várias recomendações de atividades
extras. Quando Borges e Paiva (2011) pontuam que um professor – que visa
fazer emergir a abordagem complexa em sala de aula – deve ser o elemento
que dá dinamicidade ao sistema (ao invés de um mero repetidor de métodos
a re
itor

e técnicas), fica subentendido que esse professor seja proativo, capaz de


ampliar, adaptar e/ou modificar uma atividade para que ela se torne mais
adequada e/ou mais significativa para os alunos. Nesse contexto, o livro
Alive traz sugestões com potencialidades para gerar bons insumos (input,
par

KRASHEN, 1987) no contexto de aquisição da língua inglesa. Um bom


exemplo é a atividade da Fig. 8.
Ed
são
ver
106

Fig. 8 – Atividade extraída Fig. 9 – Atividade extraída


do livro “Alive! inglês” do livro “Alive! inglês”

V
r
uto
R
a
do
aC

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são i
(MENEZES et al. 2012a, p. 82). (MENEZES et al. 2012b, p. 23)
rev

Conforme pode-se observar na Fig. 8, o que o livro do professor chama


or

de “atividade interativa de vocabulário” (MENEZES et al. 2012a, p. 82) – em


azul no canto superior esquerdo na figura –, pode ser entendido como uma
oportunidade do professor sair da linearidade na condução das atividades da
ara

aula e tentar algo que emirja da própria iteração professor-alunos. Ao invés


de apenas solicitar aos alunos que marquem “gosto” (likes) ou “não gosto”
t

(dislikes) no quadro dos alimentos disponibilizado na atividade em questão


i

do livro, o professor pode iniciar uma votação no quadro, movimentando a


op

turma e proporcionado mais interação. Ainda, além das listas de alimentos


d

fornecidos na atividade recomenda-se ir além, sugerindo fazer a mesma dis-


cussão com outros temas como futebol, música, livro etc.
E

Também, na atividade da Fig. 9, na seção “Let´s act with words!”, o


papel do professor como um dos elementos que dá dinamicidade à sala de
aula é bastante evidente. A atividade é de produção do gênero cartum sobre
ver

o meio ambiente, que, segundo as sugestões no livro do professor, pode estar


diretamente relacionado às questões da escola sobre esse tema transversal,
cabendo ao professor expandir a atividade para o seu contexto. Para iniciar
a atividade, o livro sugere que o professor destaque as características desse
gênero (o humor associado a uma reflexão e/ou crítica, por exemplo), pois
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 107

isso ajudará na produção mais assertiva do gênero. O livro proporciona,


ainda, ao final da atividade, algumas ideias de produção de um cartum, e
modelos que podem ser acessados via internet. Essa atividade pode ser de-
senvolvida na sala de aula convencional, na sala de informática ou em outros
ambientes da escola, cabendo ao professor visualizar as potencialidades da

od V
r
atividade dentro do seu contexto imediato de ensino, imprimindo a ela a

uto
dinamicidade necessária para a sua execução.

4.4 Componente 4 – foco no desempenho individual do aluno:

R
oa
Na série Alive cada unidade temática tem seu encerramento com a seção
“Reflect on learning” (Fig. 10 e 11), que funciona como uma revisão do con-
teúdo visto. Porém, o que chama a atenção neste caso é a forma como essa
aC
revisão é organizada no livro. Conforme o próprio nome implica, a seção tem
como objetivo que o aluno reflita sobre suas ações e sua aprendizagem em sala de
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

aula. Com essa autoavaliação, o aluno pode focar em seu próprio desempenho.
Outro ponto interessante nessas seções são suas subseções “I am au-
visã
tonomous” (Fig. 10), “My opinion” (Fig. 11) e “Now I know” (Fig. 10 e
11) em que os alunos são estimulados a refletir sobre o que aprenderam.
A defesa da autonomia do aluno na coleção também pode ser vista como
parte do componente da abordagem complexa, visto que a autonomia está
a re
itor

diretamente ligada ao desempenho do aprendiz no processo de aquisição


de língua, sendo por meio dessa autonomia que o aprendiz administra sua
própria aprendizagem (PAIVA, 2010).
A última parte da seção do livro do sétimo ano (Fig. 10) chama-se “I
par

need to learn more”. Nessa subseção, ainda focando no seu desempenho, o


aluno pode detectar os pontos onde precisa haver uma melhora. Dessa forma,
a questão da autonomia, e consequente foco no desempenho do aprendiz, é
Ed

um dos pontos fortes da coleção, tendo em vista que os autores enfatizam


que na abordagem do livro “os alunos não se limitam a receber passiva-
são

mente conteúdos prontos apresentados pelo professor, mas são encorajados


a desenvolver uma postura autônoma, como responsáveis pelo processo de
ensino-aprendizagem” (MENEZES et al. 2012b, Manual do Professor, p. 4).
ver
108

Fig. 10 – Atividade extraída Fig. 11 – Atividade extraída


do livro “Alive! inglês” do livro “Alive! inglês”

V
r
uto
R
a
do
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
(MENEZES et al. 2012b, p. 37)
(MENEZES et al. 2012a, p. 131)
i
rev

A responsabilidade pela própria aprendizagem é um elemento muito im-


portante da teoria da complexidade no contexto educacional, visto que uma
or

das características do sistema adaptativo complexo é a sua auto-organização.


ara

4.5 Componente 5 – linguagem materializada nas práticas sociais:


t

A série Alive também valoriza as práticas sociais da linguagem. Um


bom exemplo (Fig. 12) é um exercício extraído do livro do 6º ano. Nessa ati-
i
op

vidade, o exercício proposto não serve apenas para ensinar formas positivas,
d

negativas ou imperativas no uso de verbo – já que a atividade está prevista na


seção de análise linguística “Let´s focus on language!”. O tão falado “mundo
lá fora” é apresentado aos alunos para que possam expressar opiniões e, mais
E

importante, para que deixem de ater-se à FORMA da língua e passem a olhar


mais para o SENTIDO produzido por ela. Isso mostra que a coleção procura
ver

trabalhar aspectos gramaticais de forma contextualizada com o universo de


uso real da linguagem, trazendo “exemplos de uso extraídos de textos autên-
ticos” (MENEZES et al. 2012a, Manual do Professor, p. 10).
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 109

Fig. 12 – Atividade extraída do livro “Alive! inglês”

od V
r
uto
R
oa
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

visã
(MENEZES et al. 2012a, p. 122).

O próprio livro refere-se ao uso de textos autênticos como uma parte


fundamental no processo de aquisição do inglês pelo aluno, já que, “[é]
importante que eles tenham a percepção de estar aprendendo a língua que
a re
itor

circula nas práticas sociais de linguagem”, com o uso de exemplos da língua


que “foram retirados de situações reais” (MENEZES et al. 2012a, p. 122).
Dessa forma, parece ser de suma importância para os autores da coleção que
as atividades de foco na linguagem possam despertar nos alunos uma com-
par

preensão de sentido da linguagem que vá além da sua forma. As atividades


na Fig. 12, por exemplo, visam essencialmente mostrar que o uso dos verbos
no imperativo é um recurso na produção e manifestação do gênero cartaz em
Ed

protestos; e protestos ocorrem em vários lugares do mundo, fazendo parte na


realidade do aluno.
são

Fig. 13 – Atividade extraída do livro “Alive! inglês”


ver

(MENEZES et al. 2012b, p. 121)


110

Ainda no contexto desse componente da abordagem complexa, Borges


e Paiva (2011) incluem o letramento digital como uma prática social im-
portante. Possivelmente também baseada nesse princípio, a coleção inclui
as redes sociais em suas atividades como ferramenta de interação e prática
de linguagem. Um exemplo é o exercício na Fig. 13 que sugere que o aluno

V
r
produza um microtexto sobre seus planos para o fim de semana, contendo

uto
140 caracteres, a fim de ser publicado no Twitter. Aliar o ensino formal à
modernidade das redes sociais é uma ideia interessante de prática social da
linguagem proposta pela coleção.

R
a
4.6 Componente 6 – acolhimento das múltiplas identidades:

do
De acordo com Borges e Paiva (2011), a identidade do sujeito complexo,
no contexto sócio-histórico-cultural, é multifacetada, ou seja, “são diversas,
aC
dinâmicas e mudam ao longo do tempo” (NORTON, 2000 apud BORGES;

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
PAIVA, 2011, p. 352). Ainda, as autoras entendem as identidades como frac-
talizadas (SADE, 2009), pois “bifurcam e estão intimamente associadas às
reações dos aprendizes em suas participações nas comunidades de prática da
segunda língua, emergindo e se reconstruindo via discurso/ gêneros discur-
i
sivos” (BORGES; PAIVA, 2011, p. 352). Nesse panorama, fazer emergir a
rev

abordagem complexa em sala de aula é também acolher as múltiplas iden-


tidades dos alunos no processo de ensino/aprendizagem. Nesse contexto, a
or

coleção Alive proporciona algumas atividades que potencialmente podem


contribuir para fazer emergir essas identidades dos alunos, englobando-as no
ara

avanço do desenvolvimento das atividades. Na Fig. 14, por exemplo, temos


a primeira página da Unidade 1 do livro do sexto ano que se denominada
t

“Who am I?”. Nessa atividade, o livro sugere ao professor que utilize a aula
i

para que os alunos possam se apresentar uns aos outros, comentando sobre
op

eles mesmos, sobre seus amigos e família. Ainda, são oferecidas algumas
d

fotos de desportistas famosos, entre eles brasileiros, focando em uma das


identidades desses profissionais do esporte.
E

Já na Fig. 15, o livro traz uma atividade em que os alunos podem criar
uma identidade digital, um avatar, que pode representar uma das facetas
da própria identidade do aluno ou uma identidade alternativa que talvez
ver

esteja no imaginário de cada um. A atividade é prevista para ser feita em


duplas, movendo-se para a formação de grupos maiores para a discussão das
criações feitas e finalizando em uma apresentação das identidades digitais
produzidas. Ainda, na atividade há links de sites em que os alunos podem
aprender mais sobre o tema avatar e imagens do próprio filme Avatar de
2009 que ilustra bem a fractalização das identidades.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 111

Fig. 14 – Atividade extraída Fig. 15 – Atividade extraída


do livro “Alive! inglês” do livro “Alive! inglês”

od V
r
uto
R
oa
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

visã
(MENEZES et al. 2012a, p. 10) (MENEZES et al. 2012a, p. 145)

Desenvolver atividades que oportunizam (1) a projeção do sujeito


a re
itor

(como ser único e multifacetado ao mesmo tempo) e (2) a autoconscien-


tização como sujeito que se fractaliza no ambiente sócio-histórico-cultural
que se está inserido é, ao mesmo tempo, enxergá-lo e conscientizá-lo como
um dos elementos do processo de ensino/aprendizagem da linguagem.
par

4.7 Componente 7 – fornecimento e/ou restrição de affordances:


Ed

Os affordances – ou propiciamentos (PAIVA, 2010) – são elementos


providos pelo ambiente e percebidos (ou não) pelos indivíduos que, no con-
são

texto formal de ensino, podem potencializar e/ou inviabilizar o aprendizado.


A coleção Alive, logo na primeira parte de cada livro para o ensino fun-
damental, oferece o desenvolvimento de um “projeto anual” (Year Project)
ver

cujo objetivo é a produção de uma atividade contínua ao longo do ano que


incentive “a percepção dos alunos sobre a língua inglesa” (MENEZES et al.
2012a, Manual do Professor, p. 11). No livro do sexto ano, utilizado aqui
como exemplo, a sugestão para o projeto anual é a produção de um scra-
pbook (Fig. 16). Nas indicações para a produção desse projeto, na página an-
terior (não ilustrada aqui), em letra azul, o livro traz as seguintes explicações
e recomendações para o professor:
112

“[...] scrapbook é um projeto a ser realizado ao longo do ano. O aluno


poderá realizá-lo de várias maneiras: utilizando um caderno, agenda
(nova ou velha), papel reciclado... Se o aluno tiver acesso è internet,
uma boa ferramenta é o Glogster (http://glogster.com)” (MENEZES
et al. 2012a, p. 8).

V
r
Fig. 16 – Atividade extraída Fig. 17 – Atividade extraída

uto
do livro “Alive! inglês” do livro “Alive! inglês”

R
a
do
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são i
rev
or
ara

(MENEZES et al. 2012a, p. 9) (MENEZES et al. 2012b, p. 122)


t

O fato de o livro sugerir o uso de qualquer material acessível ao aluno


i
op

para a produção do scrapbook é uma maneira de permitir que ele perceba


d

as ferramentas a sua volta que possam facilitar a aprendizagem do inglês.


Ainda, na Fig. 16, o livro traz o significado de scrapbook como “uma co-
leção de memórias” em que, para a sua produção, pode-se usar “fotos,
E

imagens, partes de textos de revistas e notas” (MENEZES et al. 2012a, p. 9).


Uma coleção de memórias pode proporcionar ao aluno um resgate de vários
ver

momentos de sua vida permeados ou não pelo uso da língua inglesa e possi-
bilitar a percepção do uso de recursos muitos próximos a si como materiais
potenciais para a aprendizagem da língua inglesa.
Na atividade da Fig. 17, temos um exemplo de uma atividade deno-
minada “Art corner” ou (em uma tradução literal) o “Cantinho da arte”, em
que os alunos podem construir artefatos sugeridos no livro com material
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 113

reciclado, trazendo-os de suas casas ou procurando-os na escola. As ins-


truções para a montagem são todas em inglês. Como na atividade anterior
(Fig. 16), esse tipo de atividade em sala de aula pode oportunizar aos alunos
o desenvolvimento de uma percepção da valoração dos objetos fornecidos
pelo ambiente para a aprendizagem de inglês.

od V
r
uto
Considerações finais

A coleção “Alive! inglês” do ensino fundamental foi lançada no ano de

R
2012 com uma proposta inovadora de ensino de língua inglesa baseada nos

oa
princípios da teoria da complexidade/caos. As concepções de linguagem e de
aquisição de segunda língua como sistemas adaptativos complexos (SACs)
da série estão fundamentadas em um paradigma contemporâneo de ensino
aC
de língua e a coleção é pioneira em lançar livros didáticos para o ensino
fundamental e médio baseados nessa visão.
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Por outro lado, a proposta de uma abordagem complexa de ensino


visã
de línguas (BORGES; PAIVA, 2011) ambiciona constituir-se como um
elemento-chave que emerge em contextos formais e reais (imprimindo-lhe
dinamicidade) de ensino/aprendizagem de língua em ação, porém seu uso
em situações reais de ensino ainda não fora investigado. Em vista disso, o
lançamento da coleção Alive se converte em uma oportunidade de investi-
a re
itor

gação inicial do potencial do uso da abordagem complexa.


Sendo a coleção Alive e a abordagem complexa subsidiadas pelos
mesmos fundamentos teóricos foi possível a análise e a discussão nos moldes
aqui desenvolvidos. A seguir, uma síntese do estudo será apresentada.
par

Elementos da abordagem complexa puderam ser identificados e


analisados nas atividades propostas dos livros do sexto e sétimo anos e também
nas sugestões de implementação dessas atividades no manual do professor
Ed

da coleção “Alive! inglês”. Primeiro, quando falamos em linguagem e em


aquisição de língua como SAC, pode-se notar a característica dinâmica que
são

subentende essas concepções em atividades que enfatizam que a língua é viva


e se modifica no tempo e lugar. Essas atividades focam na variação linguística
e na dependência dos significados aos contextos de uso da linguagem. Ainda,
ver

o foco nessa concepção de língua viva influenciou na escolha do nome da


série Alive. A natureza multifacetada do ensino/aprendizagem, por outro
lado, pode ser notada nas diversas formas que os exercícios dos livros são
propostos, variando na utilização de diversas abordagens de ensino de língua,
como a gramatical, a instrumental e a baseada em gêneros, por exemplo.
Nessa perspectiva, diferentes concepções de construção do conhecimento
como a visão behaviorista, cognitivista e sociointeracionista são igualmente
114

privilegiadas pela coleção; tendo em vista o reconhecimento da natureza


heterogênea na constituição dos sujeitos e, consequentemente, da sala de aula
pela coleção. A série também oferece atividades que visam à participação
efetiva e proativa do professor, o que o coloca como um elemento-chave que
dá dinamicidade à sala de aula. As atividades de feedback (retroalimentação)

V
r
dos alunos, previstas ao final de cada unidade dos livros, nas seções “Learning

uto
strategies” e “Let´s reflect on learning!”, são um indício de que a coleção está
preocupada em focar o desempenho individual de cada aluno e não apenas o
desenvolvimento da competência linguístico-comunicativa, como acontece

R
nos encaminhamentos do uso das abordagens de ensino de língua (outras que

a
não a abordagem complexa). Um grande número de atividades propostas na
coleção está focado nas práticas sociais da linguagem, aproximando a língua

do
inglesa da realidade do aluno e proporcionando uma reflexão na produção
de sentidos nessa língua em diferentes contextos reais de uso, inclusive com
aC
ênfase no letramento digital. Para tanto, o uso de textos autênticos é uma

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
preocupação constante nos livros didáticos da coleção. Outra aproximação
da língua inglesa ao contexto imediato do aluno é mediada pela série ao
propor atividades que possam acolher as múltiplas identidades dos alunos.
Por fim, ao sugerir atividades que possam sensibilizar o aprendiz para a
i
percepção dos objetos permeados de valoração a sua volta no aprendizado
rev

da língua, a coleção subentende a compreensão de que a interação professor-


aluno pode construir ou restringir affordances no ensino de língua.
or

Em vista do exposto acima, este trabalho elencou e comentou tipos de


atividades de ensino de língua que potencialmente ilustram elementos consti-
ara

tutivos da abordagem complexa (BORGES; PAIVA, 2011), fazendo-a emergir


em sala de aula. Um estudo profundo do potencial da abordagem complexa,
t

todavia, somente pode ser realizado em contexto real de sala de aula, com o
i

sistema em ação; porém, pudemos constatar com esta análise que as atividades
op

propostas na coleção “Alive! inglês” do ensino fundamental delineiam vários


d

componentes da abordagem complexa o que pode confirmar o potencial de seu


uso em situações reais de ensino em sala de aula.
E

ver
CAPÍTULO 5

TRANSDISCIPLINARIDADE
NO ENSINO DO ESPANHOL:

od V
r
uma análise do livro didático

uto
Enlaces – Ensino Médio

R
oa
Kelly Cristinna Frigo Nakayama (IFPR)
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)

Introdução
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

No mundo globalizado saber uma língua estrangeira (LE)1 é funda-


mental para a formação profissional, tendo em vista as inter-relações pessoais
visã
e laborais necessárias no cotidiano. A partir dessa necessidade, o espanhol
ganha visibilidade por dois fatores essenciais: Mercosul e leis que ampararam
a sua inclusão nos currículos escolares2. Com isso, houve um aumento na
produção e oferta de livros didáticos (LDs) para o ensino da língua espa-
nhola e inclusão dos mesmos, para distribuição gratuita às escolas, no Plano
a re
itor

Nacional do Livro Didático (PNLD) do Ministério da Educação. Nesse ce-


nário, Sedycias (2005, p. 35) destaca que “aprender espanhol deixou de ser
um luxo intelectual para se tornar praticamente uma emergência”.
Como já se sabe, o ensino/aprendizagem de línguas é permeado pela
par

influência dos LDs, tendo em vista que muitos professores e alunos têm
esse instrumento como único recurso na sala de aula. Em virtude disso, es-
pecialmente a partir dos anos oitenta, linguistas aplicados se debruçaram
Ed

sobre o tema, publicando análises do conteúdo de LDs e colaborando, por


são

conseguinte, para a formação de professores (CORACINI, 1999b). Nesse


contexto, Coracini (1999a, p. 107) cita três razões que justificam a análise
de exercícios dos materiais didáticos (MDs): por se destacarem nos MDs,
exigindo tempo e dedicação dos alunos; por se caracterizarem na interface
ver

dos objetivos dos autores dos MDs e da aprendizagem; e por permitirem ob-
servar as visões de linguagem e ensino/aprendizagem implícitas no material.
Sendo as duas últimas questões, principalmente, fatores que viabilizam a
compreensão e a coerência teórico-metodológica de um LD. Na década de
1 Nesse capítulo não fazemos distinção entre LE e segunda língua (L2).
2 A Lei 11.161/05 (BRASIL, 2005), por exemplo, traz a prerrogativa da inclusão facultativa do ensino do espanhol nos
currículos plenos do Ensino Fundamental e da oferta obrigatória no Ensino Médio.
116

80, no Brasil, por exemplo, com o advento da abordagem comunicativa


(AC), surgiram inúmeros LDs com uma roupagem dita comunicativa, porém
com uma abundância de exercícios de gramática, tradução, substituição e
repetição que não condiziam com os preceitos da abordagem.
Atualmente, com o desgaste da AC, novas propostas para o ensino de

V
r
LEs estão surgindo. Nesse panorama, emerge a coleção de livros Enlaces:

uto
español para jóvenes brasileños (OSMAN et al., 2013) para o Ensino
Médio (doravante Enlaces), fundamentada na transdisciplinaridade. Em
sua essência, a transdiciplinaridade é um princípio do pensamento com-

R
plexo (SANTOS; SOMMERMAN, 2009). No que concerne aos estudos

a
da complexidade na Linguística Aplicada, a concepção de linguagem e de
aquisição de segunda língua é entendida como sistema adaptativo complexo

do
(LARSEN-FREEMAN, 1997; LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b;
BECKNER et al., 2009; MENEZES, 2013) e a abordagem de ensino de
aC
línguas que surge desse contexto é a abordagem complexa (BORGES;

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
PAIVA, 2011; BORGES, 2015) – como se pode observar no capítulo de
análise do LD “Alive! : inglês” do Ensino Fundamental neste livro. Todavia,
a articulação do ensino de espanhol no Enlaces volta-se exclusivamente para
a transdiciplinaridade sem menção à complexidade.
i
Sendo a proposta teórico-metodológica do Enlaces a transdisciplina-
rev

ridade, é objetivo deste capítulo apresentar e discutir como o LD faz a ar-


ticulação entre os múltiplos saberes na apresentação e orientação didática
or

de suas unidades e atividades. O foco, porém, é na análise e discussão da


unidade 5 do LD do 1º ano (OSMAN et al., 2013). Para tanto, este capítulo
ara

foi dividido em três seções, a saber: 1) Transdiciplinaridade e complexidade


– que visa apresentar a temática em destaque no texto; 2) Organização geral,
t

princípios teóricos e apresentação dos conteúdos da coleção de LDs Enlaces


i

– que se pretende mostrar e discutir, de forma mais geral, a disposição do


op

LD em questão; 3) Análise da unidade 5, Livro didático 1 – Medioambiente:


d

¿Y a ti qué? (OSMAN et al., 2013) – que traz a análise propriamente dita de


uma das unidades do LD e que nos permitiu tecer as considerações finais.
E

1 Transdisciplinaridade e complexidade
ver

A transdisciplinaridade foi sistematizada pelo físico teórico romeno


Basarab Nicolescu, em 1999 – embora o termo tenha sido primeiramente
citado pelo biólogo e psicólogo Jean Piaget em 1970. Do mesmo modo
que a complexidade, ela surgiu em virtude dos desafios da globalidade no
século XXI, como o avanço do conhecimento (SANTOS, 2009). Os prin-
cípios que norteiam a transdisciplinaridade sugerem a não fragmentação do
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 117

conhecimento. Assim, com uma nova forma de pensar, articulada e contex-


tualizada, diferentemente do pensamento linear e fragmentado cartesiano, os
conceitos da transdisciplinaridade e da complexidade propõem a “religação
dos saberes compartimentados” (SANTOS, 2009, p. 15).
É relevante destacar que, de acordo com Santos e Sommerman (2009),

od V
r
tanto a transdisciplinaridade como a complexidade estão em processo de

uto
construção e ainda não podem ser consideradas como teorias pedagógicas.
Trata-se de uma problematização emergente, tendo em vista as mudanças
socioeconômicas e culturais na atualidade. No panorama contemporâneo,

R
Libâneo (2005) inclui a teoria da complexidade como uma modalidade

oa
das correntes holísticas ao lado da teoria naturalista do conhecimento, da
ecopedagogia e do conhecimento em rede. Os princípios da transdiscipli-
naridade e da complexidade se articulam, pois apresentam pressupostos
aC
similares, ou seja, se os saberes disciplinares se conectam, transcendendo
fronteiras, a aprendizagem ganha sentido, o que gera a compreensão sig-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

nificativa do conhecimento, contribuindo para a promoção de um ensino


menos técnico e mais humano.
visã
No entanto, o modelo didático que vigorou durante anos (e ainda
vigora), baseia-se nos princípios cartesianos de fragmentação, divisão, sim-
plificação e redução do conhecimento (SANTOS, 2009). Como exemplo,
temos as grades escolares divididas em áreas, cursos e disciplinas, resul-
a re
itor

tando em partes isoladas, muitas vezes descontextualizadas. Como afirma


Santos (2009), não podemos negar que o pensamento cartesiano, que sus-
tentou o princípio da fragmentação, gerou conhecimentos, tecnologias e pro-
gresso. Porém, a autora afirma que são necessários uma mudança conceitual
par

e princípios mais adequados para a ciência atual, tendo em vista as novas


relações com o conhecimento, sob a forma de rede. O princípio citado pela
autora, e sustentado por Morin (1991 apud SANTOS, 2009), é o hologra-
Ed

mático, que apresenta as conexões entre as partes e o todo. Para Morin, esse
princípio afirma que a parte está contida do todo, e que o todo está contido
são

nas partes. O autor destaca, ainda, que na era moderna há uma relação de
interdependência entre termos, antes vistos como antagônicos ou opostos,
como a unidade e a diversidade ou o local e o global. Compartimentalizar
ver

o conhecimento favorece a fragmentação, o que não é objetivo nem da


complexidade nem da transdisciplinaridade. Nesse sentido Morin, destaca,
ainda, que os alunos saem das escolas com muitos conhecimentos justa-
postos, o que indica que eles não estão interconectados; afirma, também, que
não há apenas uma forma de aprender, destacando que o processo cognitivo
118

é complexo, tendo em vista que observamos os objetos em suas relações com


outros objetos e acontecimentos, enredando informações como teias para
gerar conhecimento.
Dessa forma, a sala de aula torna-se espaço para o exercício da trans-
disciplinaridade, a fim de propiciar conhecimento significativo aos estu-

V
r
dantes, sendo o professor um dos principais agentes desta ação. Para tanto,

uto
é preciso entender o conceito de transdisciplinaridade, o qual muitas vezes
se confunde com o da interdisciplinaridade. Morin (2013, p. 53) compara a
interdisciplinaridade à Organização das Nações Unidas (ONU): a primeira

R
controla as disciplinas da mesma forma que a segunda controla as nações.

a
As duas se esforçam para que haja o reconhecimento da soberania territorial
entre nações e disciplinas e se empenham para mantê-las “em vez de des-

do
moroná-las, mesmo que algumas trocas incipientes se efetivem”. Há, assim,
uma tentativa para encontrar pontos em comum entre as diferentes nações e
aC
disciplinas, porém se constroem pontes entre elas para se atingir objetivos.

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são
Por outro lado, a transdisciplinaridade é entrelaçada desde o início: não tem
fronteiras internas nem externas, nem edificação de pontes para o alcance de
metas, e pressupõe a substituição de um sistema de causa e efeito (linear) por
um sistema espiralar e multirreferencial. Morin (2014) explica a transdisci-
i
plinaridade como esquemas cognitivos reorganizadores que atravessam as
rev

disciplinas. Ainda, para Peduzzi (2000, p.127):


or

[...] a transdisciplinaridade representa uma etapa superior que se


sucede à interdisciplinaridade, que situa as relações ou reciprocidades
ara

entre as diversas disciplinas no interior de um sistema total, tomando


por base uma axiomática geral compartilhada capaz de instaurar uma
t

coordenação, em vista de uma finalidade comum.


i
op

Nesse sentido, a transdisciplinaridade é uma alternativa para poten-


d

cializar o conhecimento científico fragmentado em disciplinas. Logo, uma


atitude transdisciplinar exige mudanças na prática docente, pois é preciso
aprender a reconhecer a diversidade dos conhecimentos e transitar por eles
E

tanto nas ciências humanas, exatas como naturais (SANTOS, 2009). Santos
alerta que o professor precisa considerar que todos os saberes são igual-
ver

mente importantes, ou seja, não é aconselhável construir hierarquias. Por


outro lado, a autora também ressalta que a base da interdisciplinaridade é
o conhecimento disciplinar, ou seja, há um objeto de estudo (no caso do
Enlaces, o espanhol) que orienta o trabalho docente.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 119

No contexto brasileiro, as Orientações Educacionais Complementares


aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) (BRASIL, 2002) já orientam
o trabalho com temas transversais, visando, no entanto, apenas articular co-
nhecimentos entre diversas disciplinas, mas que pode ser considerado como
uma tentativa do documento de aproximação com a transdisciplinaridade. O

od V
r
enfoque em temas transversais permite uma visão mais significativa do co-

uto
nhecimento e da vida (SANTOS, 2009), além de possibilitar relações entre
diferentes conhecimentos.

R
2 A coleção de livros didáticos Enlaces

oa
A coleção de LDs Enlaces: español para jóvenes brasileños (Fig.1),
elaborada para o ensino e a aprendizagem de espanhol para estudantes brasi-
aC
leiros do Ensino Médio regular, fundamenta-se nos Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio (BRASIL,2000); PCN + Ensino Médio;
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares


visã
Nacionais; Linguagens, Códigos e suas Tecnologias (2002); Orientações
Curriculares para o Ensino Médio (BRASIL, 2006); e na Matriz de Referência
para o ENEM (BRASIL, 2009). A coleção é dividida em três exemplares
(volumes 1, 2 e 3; para o aluno e para o professor), um para cada ano letivo
do Ensino Médio, todos acompanhados por um CD de áudio.
a re
itor

Figura 1 - Coleção de LDs Enlaces: español para


jóvenes brasileños – Ensino Médio
par
Ed
são
ver

Fonte: <http://www.macmillan.com.br/pnld>. Acesso em: 14/02/2016

O livro do aluno contém oito unidades que privilegiam competências e


habilidades, funções comunicativas, conteúdos linguísticos, gêneros discur-
sivos, temas transversais e interdisciplinaridade, de acordo com o observado
em seu índice. Além de atividades que privilegiam as quatro habilidades (ler,
120

escrever, ouvir e falar), há também aquelas de revisão e consolidação dos


conteúdos trabalhados, simulados do ENEM, sugestões de leituras, filmes,
músicas, vídeos e sites para consultas, com destaque aos usos socioculturais
do espanhol. Quanto ao aspecto mais formal da língua, o LD apresenta conju-
gações verbais, glossário e bibliografia. O manual do professor, por sua vez,

V
r
contém a resolução dos exercícios propostos. Há um guia didático no fim

uto
do manual que contempla a fundamentação teórica da coleção, orientações
e sugestões práticas para cada unidade, transcrições dos textos gravados e
sugestões de leitura ao professor, como as dispostas no item Más apoyo.

R
Além de interagir com documentos oficiais que norteiam a educação

a
no Brasil, a coleção propõe a articulação do ensino de espanhol como LE
com as outras disciplinas integrantes do Ensino Médio por meio de unidades

do
temáticas. Dessa forma, o estudante poderá desenvolver competências e ha-
bilidades para “conhecer e respeitar o pluralismo cultural e linguístico his-
aC
pânico” (OSMAN et al., 2013, p. 211) e “estabelecer relações e reconhecer

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
elementos constituintes de sua própria cultura a partir do contato com as cul-
turas hispânicas3” (p. 211). Por meio da língua espanhola (objeto de estudo)
e dos temas interdisciplinares e interculturais, que fazem parte do universo
do adolescente, o LD também prioriza estimular “o domínio de diferentes
i
linguagens, a construção de argumentos, a sistematização de princípios e
rev

visões, o enfrentamento de situações-problema, bem como aguçar a análise


das relações entre diferentes fenômenos e contextos” (p. 211).
or

Nota-se na coleção uma preocupação com o desenvolvimento da LE em


um sentido mais amplo, contemplando aspectos estratégicos, discursivos e
ara

socioculturais além dos gramaticais. Também se percebe o reconhecimento


e o respeito ao outro, já que estamos inseridos num contexto plurilíngue.
t

Nesse sentido, os temas promovem o respeito aos diferentes valores culturais


i

e sociais, bem como o senso crítico. Há desenvolvimento de competências


op

e habilidades linguísticas e de atitude, mostras de textos e usos autênticos


d

da língua, análise e produção de diversos gêneros discursivos e enfoque


intercultural. Além disso, sugere uma autoavaliação como atividade meta-
E

cognitiva. Observa-se, especialmente, que as atividades propostas em cada


unidade temática promovem a cooperação e a reflexão sobre a aprendizagem.
Com a primeira edição publicada em 2007, a coleção de LDs Enlaces
ver

sugere, logo no título, enredar os saberes e conhecimentos, já que “enlace”


significa união, conexão, em espanhol. Além das unidades distribuídas por
temas, o material apresenta modelos de provas do ENEM, tabela de verbos,
glossário, transcrições e referências de internet. As imagens apresentadas

3 Essa e outras traduções, neste artigo, são de nossa inteira responsabilidade.


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 121

pelo LD são, em parte, reais, como fotografias, imagens de revistas, mas


também estão presentes desenhos relativamente infantis para o universo do
adolescente do Ensino Médio. Há, ainda, variedade na apresentação de gê-
neros textuais como mapas, charges, tiras, propagandas, e-mail e chats, que
fundamentam inúmeras discussões sobre a linguagem como também pro-

od V
r
postas de produção escrita.

uto
Todavia, tendo uma proposta transdisciplinar, o que chama a atenção é
o fato dos autores explicitarem o item “interdisciplinaridade” como tópico na
apresentação das unidades de estudo, sendo que a transdisciplinaridade supera

R
este termo no sentido de não estabelecer fronteiras e limites entre os saberes.

oa
Na sua concepção de aprendizagem, a coleção propõe “[a] transdisciplina-
ridade como caminho para articular o ensino de espanhol com os mais dife-
rentes saberes” (OSMAN et al., 2013, p. 215). Apesar da incoerência inicial,
aC
a referência ao termo interdisciplinar é mais bem entendida a partir do es-
quema apresentado no guia didático, como exposto no item 2.2 do volume 1
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

do manual do professor (p. 215) (Fig. 2), por exemplo, em que as disciplinas se
perpassam e se transcendem, apesar de serem citadas explicitamente.
visã
Outro destaque é o tratamento aos gêneros discursivos e aos processos
de produção de texto. A coleção, então, concebe a linguagem como interação
social, construída nas interações, de forma dinâmica – evidenciando as prá-
ticas sociais da linguagem como fundamentais no processo de aquisição/
a re
itor

aprendizagem. Essas práticas incluem tanto a língua falada como a escrita,


os gêneros discursivos, identidades, bem como o letramento digital. Por
isso, o professor precisa promover essas práticas de forma contextualizada.
Na coleção, ainda, espera-se que o aprendiz, ao fazer uso da linguagem na
par

sala de aula, consiga desenvolver habilidades para que possa ser um usuário
competente da língua. Nesse sentido, a coleção atua como um recurso muito
útil que, dentre outros fatores, evidencia sua concepção pedagógica a partir
Ed

da linguagem utilizada, dos recursos interativos empregados e da forma


como são abordados os conteúdos linguísticos (gramaticais), discursivos,
são

socioculturais e estratégicos, necessários para o desenvolvimento da lin-


guagem. Observa-se, ainda, que a coleção prioriza o “funcionamento real
dos intercâmbios verbais” (OSMAN et al., 2013, p. 213), valoriza as va-
ver

riações linguísticas e a produção de sentidos. As atividades de escrita, leitura


e compreensão oral vinculam-se ao trabalho com os gêneros discursivos,
que focam a interação e o “reconhecimento dos contextos em que surgem
os enunciados” (p. 214). Dessa forma, nota-se a preocupação com o desen-
volvimento da linguagem como ato dialógico, pois não é concebida como
objeto estático, mas dinâmico e em constante transformação, o que pode ser
observado nas atividades propostas. Os exercícios são explicitados de forma
122

clara e direta, conectando-se com atividades anteriores de forma cíclica,


retomando discussões e assuntos tratados anteriormente. São apresentados
recursos estilísticos peculiares da língua espanhola, bem como gírias mo-
dernas e expressões idiomáticas. A linguagem também contempla as varie-
dades linguísticas como as regionais, de idade e grupos, sem percebermos a

V
r
presença de preconceitos ou estereótipos.

uto
Quanto à concepção de aprendizagem, a coleção baseia-se na pers-
pectiva socioconstrutivista de Vygotsky, que parte do princípio de que
“ensinar pressupõe descobrir e atuar nas relações reais do processo de de-

R
senvolvimento e a capacidade de aprendizagem dos alunos” (VYGOTSKY,

a
1998apud OSMAN et al., 2013, p. 214). Os autores sugerem que o professor
precisa partir do desenvolvimento real dos alunos, que se refere aos conhe-

do
cimentos prévios, para instigar a zona de desenvolvimento proximal (ZDP),
referentes às funções que estão em processo de amadurecimento. Assim, o
aC
professor precisa conhecer o que o aluno é capaz de fazer para desenvolver

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
suas capacidades por meio de tarefas que ainda não domina, mas que com
mediação é capaz de aprender. O papel do professor no contexto da aprendi-
zagem é o de mediador e facilitador.
No que se refere à proposta da coleção em adotar a “transdisciplina-
i
ridade como caminho para articular o ensino do espanhol com os mais dife-
rev

rentes saberes” (OSMAN et al., 2013, p. 215), os autores destacam no guia


didático que a elaboração da obra baseou-se na “perspectiva com princípios
or

de conhecimentos compartilhados, contextualizados, inter-relacionados e


interdependentes” (OSMAN et al., 2013, p. 215). Enfatiza-se o conceito de
ara

transdisciplinaridade como a “oposição ao processo de fragmentação com


a promoção do diálogo entre as ciências a favor de uma cosmovisão que
t

supere os saberes dissociados” (OSMAN et al., 2013, p. 215). Nesse sentido,


i

os autores citam Leffa (2006, p. 43), que entende que se trata de compre-
op

ender o objeto de estudo como algo complexo, como um sistema em inte-


d

ração constante com outros. Para ilustrar, os autores da coleção apresentam


o seguinte esquema exposto na Figura2.
E

ver
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 123

Figura 2 – Sistema de interação na coleção de LDs Enlaces

od V
r
uto
R
oa
Fonte: Osman et al. (2013, p.215)

Grinberg (2002, p.64) é citado também pelos autores do LD que destacam


o seguinte conjunto de princípios que fundamentam a transdisciplinaridade:
aC
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• “Não busca o domínio de muitas disciplinas, mas a abertura em direção


ao que perpassa e transcende;
visã
• Complementa o enfoque das disciplinas, tendo em vista que do encontro
entre as disciplinas surgem novos dados que as articulam entre si;
• Reconhece a existência de diferentes níveis de realidade, regidos por di-
ferentes lógicas;
• Considera os conceitos de história e tempo: Morin (2005, p.32) afirma
a re

que ´tudo é profundamente historiado´;


itor

• É transcultural e assume que o diálogo e a discussão são fatos importantes


para um saber compartilhado, fundado no respeito das alteridades unidas”.

Para Santos (2009), a transdisciplinaridade associa-se à complexidade,


par

pois ambas propõe “a religação dos saberes compartimentados” (p.15).


Apesar de ser possível perceber a complexidade no desenvolvimento do
MD, o termo não é citado na coleção. Em contrapartida, os autores destacam
Ed

a transdisciplinaridade, interculturalidade e temas transversais, com o


argumento de que toda atividade comunicativa transmite crenças, valores
são

culturais e ideologias.
Observa-se também no guia didático a preocupação com a
contextualização dos conhecimentos abordados, com o letramento e
ver

variações linguísticas. Santos (1999, p. 20) destaca que “a contextualização


é necessária para explicar e conferir sentido aos fenômenos isolados” e
que “as partes só podem ser compreendidas a partir de suas inter-relações
com a dinâmica do todo”. Dessa forma, a língua é concebida pelos autores
como um fenômeno intrinsecamente heterogêneo, o que será vislumbrado
na próxima seção.
124

3 Análise da unidade 5, Livro didático 1 – Medioambiente: ¿Y a ti qué?

Nesta seção, analisaremos e discutiremos algumas das atividades da


Unidade 5 do volume 1 da coleção Enlaces para o Ensino Médio intitulada
Medioambiente: ¿Y a ti qué? (OSMAN et al., 2013, p.79) – de agora em

V
r
diante referenciado apenas como LD ou Enlaces. Este título caracteriza-se

uto
como tema gerador para inúmeras discussões e atividades transdisciplinares
que o LD propõe. Os autores apresentam na primeira página dessa Unidade
os objetivos para o estudo, que são: “descrever ações habituais, falar sobre o

R
meio ambiente, expressar frequência, elaborar um folheto de campanha co-

a
munitária” (p. 79). A análise será feita considerando os objetivos elencados
e com a finalidade de identificar pressupostos da perspectiva transdisciplinar

do
inserida na concepção teórico-metodológica do LD. Os exercícios discutidos
aqui são os que seguem:
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
a) Questionário (Fig.3): o LD propõe um questionário para mensurar
a responsabilidade de cada aluno com relação ao meio ambiente;
b) Mapa (Fig.4): os estudantes ouvem uma conversação entre jovens
hispânicos e são convidados a identificar em um mapa os países,
i
capitais e nacionalidades desses jovens;
rev

c) Charges (Fig.5): o LD apresenta charges com diferentes temas


como poluição do ar, da água e efeito estufa, para que os estu-
or

dantes relacionem cada tema à imagem correspondente;


d) Gráfico (Fig. 6): apresentação de dados que explicitam os prin-
ara

cipais gases responsáveis pelo efeito estufa;


e) Artigo (Fig.7): apresentação de artigo de opinião sobre
t

consciência ecológica;
i

f) Texto científico (Fig.8): texto sobre a biodiversidade no Brasil;


op

g) Comunidade (Fig.9): produção de campanha publicitária na co-


d

munidade visando à economia de água;


h) Expressão artística (Fig.10): apresentação de diferentes obras
E

de arte produzidas a partir do lixo reciclável (Vik Muniz, Luis de


Dios, João Parrinha, Xandi Kreuzeder- Skeleton Sea.
ver

Os autores do Enlaces evidenciam em seu guia didático a necessidade


de um plano didático para o ensino de espanhol que esteja em constante
diálogo com todos os outros componentes do currículo escolar. A partir
da análise das potencialidades do LD, pode-se perceber que a Unidade
5 possibilita conexões entre diferentes saberes. No entanto, em nossa
compreensão, isso dependerá da concepção de ensino de cada professor
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 125

e de como ele norteará as atividades propostas; ou seja, entendemos que


um material potencialmente transdisciplinar pode tornar-se meramente
disciplinar dependendo do olhar destinado a ele. Por outro lado, um olhar
apenas inter/disciplinar para a prática das atividades do LD em análise pode
estar sendo reforçado pelo próprio guia didático do Enlaces – apesar da

od V
r
coleção considerar a transdisciplinaridade como caminho para articular o

uto
ensino de espanhol em sua concepção de aprendizagem, como já discutido
em outro momento neste capítulo. Isso pode ser constatado, por exemplo,
nas seguintes passagens: “Se for possível, antes da aula organize um trabalho

R
interdisciplinar com o professor de Ciências ou Biologia (OSMAN et al.,

oa
2013, p.244). “Se for possível organize com o professor de História trabalhos
e leituras sobre a Revolução Industrial (OSMAN et al., 2013, p.241). Nesse
panorama, pensamos ser de suma importância que os professores tenham
aC
uma compreensão clara de que, embora os saberes disciplinares ainda estejam
organizados separadamente nas escolas, esses saberes, em uma prática que
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

queira ser transdisciplinar, devem se conectar transcendendo as fronteiras


das disciplinas. Esse reconhecimento é necessário para que os professores
visã
não se atenham apenas ao trabalho interdisciplinar, entendendo-o, por outro
lado, apenas como uma das possibilidades encaminhadas pelo LD para
abordar uma prática transdisciplinar.
No índice do LD, como já enfatizado antes, também há referência
a re
itor

à palavra interdisciplinaridade (OSMAN et al., 2013, p.7), indicando


as disciplinas presentes em cada unidade. Todavia, apesar do emprego
constante da terminologia “interdisciplinar” pelos autores, nesses contextos,
é possível evidenciar que os saberes disciplinares se conectam e que a
par

transdisciplinaridade emerge nas unidades didáticas, momento em que


nomes de disciplinas isoladas não são citados. Isso, tendo em vista que a
prática transdisciplinar não necessita que citemos “nomes de disciplinas” aos
Ed

alunos, pois contribuiria para destacar a “separação em blocos” de saberes


e não para a compreensão do conhecimento sob a forma de rede, tendo em
são

vista os preceitos da transdisciplinaridade. No entanto, mais uma vez, o


pensamento cartesiano, da fragmentação dos saberes, ainda permeia muitas
práticas na atualidade, do mesmo modo que esteve presente na formação
ver

de vários professores e, somente aos poucos será possível formar um olhar


menos compartimentalizado e mais transdisciplinar.
Tendo essas questões em mente, ao analisarmos as atividades faremos
referência aos saberes envolvidos, citando, em alguns momentos, os nomes
das disciplinas para evidenciar as redes estabelecidas no interior da Unidade,
bem como para ilustrar como é possível transitar pelas ciências humanas,
exatas e naturais.
126

Na atividade número 1 (Fig.3) há perguntas como: 2- Cuando te duchas,


¿tardas más de cinco minutos?, 3- ¿Recoges las pilas domésticas para reci-
clarlas?, 6- ¿Duermes con la luz encendida?4. Em cada pergunta, o aluno
soma determinada pontuação dependendo de sua resposta. Ao final, pode-se
ler o perfil de cada um de acordo com os pontos acumulados. Exemplo:

V
r
Entre 9 y 45- ¡Muy bien! Ayudas a mejorar el planeta, aunque podrías hacer

uto
un poco más5. Esta atividade possibilita o trabalho transdisciplinar, tendo
em vista a abrangência de conexões possíveis. Ao tratar do tema da proteção
do meio ambiente e práticas cotidianas para que isso aconteça, há implícitas

R
relações com os saberes e conhecimentos da área de Ciências e Biologia. O

a
objetivo da atividade é que os alunos analisem criticamente as implicações
socioeconômicas e ambientais do uso dos recursos naturais, materiais ou

do
energéticos (OSMAN et al., 2013, p. 240). Tanto professor como aluno
podem sugerir intervenções para a redução e controle dos efeitos da poluição
aC
e, para fazê-lo, precisarão dispor de saberes prévios diversos e relacioná-los

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são
para elaborar textos orais ou escritos, ou seja, interconectar conhecimentos,
justificando a prática transdisciplinar.

Figura 3 – Questionário Figura 4 – Mapa


i
rev
or
ara
di t op
E

Fonte: Osman et al. (2013, p. 81)


ver

Fonte: Osman et al. (2013, p. 80)

4 2- Ao tomar banho, você demora mais de cinco minutos no chuveiro? 3- Você separa as pilhas para a reciclagem?, 6-
Você dorme com a luz acesa?
5 Muito bem! Você ajuda a melhorar o planeta, mas poderia fazer um pouco mais.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 127

A atividade 2, especificada na Figura 4, propõe a identificação de


países de origem de quatro jovens hispânicos, tendo como referência suas
capitais (Caracas, Buenos Aires, La Habana e Santiago de Chile). O LD
apresenta o mapa como suporte aos alunos. Em outro exercício, com ênfase
na compreensão auditiva, os jovens hispânicos conversam sobre ações

od V
r
para melhorar o planeta e a frequência com que as realizam. A partir dessa

uto
atividade, os alunos são instigados a refletir sobre suas próprias atitudes.
Como proposta de análise da linguagem, há marcas discursivas para serem
relacionadas às suas respectivas funções no contexto como ¿Cachai?

R
(expressão usada no Chile para chamar a atenção do entrevistado para o

oa
que afirma). O guia didático, apresentado no fim do manual do professor,
propõe que se destaque com os alunos a atividade de compreensão auditiva,
comentando que nenhuma variante é melhor que a outra, apenas diferente.
aC
Para a realização dessa atividade, são necessários conhecimentos
geográficos e socioculturais, além da leitura de imagens. Se esses
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conhecimentos não fazem parte do repertório dos alunos, tendo em vista


a dificuldade de alguns alunos com a leitura de mapas, a atividade pode
visã
ser um gatilho para o desenvolvimento desses novos saberes. Além da
simples identificação de uma localidade no mapa, é possível discutir com os
alunos sobre aspectos socioculturais locais, envolvendo questões de história,
cultura e sociedade. É possível, ainda, destacar valores regionais, expressões
a re
itor

idiomáticas, variantes linguísticas e hábitos dos jovens hispânicos a partir


dessa proposta, em contraste com os hábitos dos brasileiros. Entendemos ser
esse estudo transdisciplinar, pois permite as inúmeras relações entre saberes.
Na unidade 5 do Enlaces, os alunos também são convidados a relacionar
par

charges (ou vinhetas) (Fig. 5) com seus temas correspondentes (poluição do


ar, da água e efeito estufa). Nessa atividade, é possível evidenciar o foco no
gênero discursivo, bem como na leitura de imagens, privilegiando o aluno com
Ed

estilo de aprendizagem predominantemente visual. A transdisciplinaridade


pode ser percebida especialmente na leitura de imagens (nesse caso as
são

próprias charges), já que emergem inúmeras hipóteses e conhecimentos a


partir de sua compreensão, ora com base nos textos visuais, ora nos verbais.
Se o aluno ou professor não possuir um repertório de conhecimentos prévios
ver

sobre o tema proposto, provavelmente será difícil realizar sua interpretação,


sejam elas charges, tabelas, gráficos, comics... O mesmo ocorre com as
piadas, já que muitas vezes não conseguimos entendê-las devido à falta de
algum conhecimento contextual que pode envolver política, história, artes
etc. Além da interpretação de elementos visuais nas charges apresentadas no
Enlaces, evidencia-se também no LD elementos verbais como o destaque aos
aspectos gramaticais da língua em ¡Protege mi vida!, em que o possessivo
128

“mi” aparece marcado e substituído pelo artigo feminino “la”. Em ¡Protege


la vida!, há um convite para reflexão sobre a mudança na interpretação.
Quanto ao guia didático, há a sugestão para se trabalhar com a fonte e data
da publicação das charges (diário El País, 2009), para que se possa elencar
as mudanças ocorridas no período, ou seja, entre 2009 e o atual. Novamente,

V
r
o espanhol como objeto de estudo é permeado por diferentes conhecimentos

uto
e saberes, não vislumbrados de forma justaposta, mas interconectada.

Figura 5 – Charges Figura 6 – Gráfico

R
a
do
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são i
rev
or
ara
t

Fonte: Osman et al. (2013, p. 83)


i

Fonte: Osman et al. (2013, p. 82)


op
d

Na página 83 (Fig. 6), é apresentado um gráfico com os gases res-


ponsáveis pelo efeito estufa (dióxido de carbono, metano, óxido nitroso) e
E

suas principais fontes de emissão. O professor é orientado no guia didático


a instigar os alunos sobre os fatores que provocam a emissão de gases, o
que se associa a contextos históricos como a primeira e segunda revoluções
ver

industriais, tema para discussão coletiva. O guia didático também apresenta


como subsídio ao professor textos sobre os diferentes saberes abordados em
cada unidade, o que pode ser encontrado no item Más apoyo no manual do
professor (OSMAN et al., 2013, p. 241). Os autores sugerem que o professor
estimule os alunos a pensarem nas consequências sociais e ambientais nesse
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 129

período como a migração do campo para a cidade, surgimento do prole-


tariado, poluição devido ao uso de carvão como combustível, e sobre as
iniciativas do estado como rodízio de veículos, construção de ciclovias, co-
operativas de reciclagem (OSMAN et al., 2013, p. 242). São estimulados os
debates sobre políticas públicas com relação ao meio ambiente, o que pode

od V
r
estimular também a produção escrita na língua espanhola. Por outro lado, a

uto
leitura de gráficos se enlaça com conhecimentos da matemática, tendo em
vista a identificação do período de descontrole da emissão do gás metano,
e da química, no momento em que o aluno identifica as características das

R
principais fontes de emissão. No entanto, essas “disciplinas” não precisam

oa
ser mencionadas, sendo que o objeto de estudo é o espanhol.
Para aguçar os debates, que favorecem práticas orais em LE, há ex-
posição de artigos de opinião e científicos (Fig. 7 e 8) no LD. O artigo de
aC
opinião, página 84 do LD (Fig.7), discute a consciência ecológica, o pro-
tocolo de Kioto e a culpa individual de cada um diante de algumas ações
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

que colaboram para a emissão do dióxido de carbono. O termo Mea culpa,


usado frequentemente em ritos religiosos católicos para o reconhecimento
visã
público da culpa e do erro, é empregado no artigo de opinião para enfatizar
a responsabilidade que cada um tem diante dos problemas ambientais. As
atividades propostas objetivam evidenciar o conteúdo, como a posição do
autor do artigo sobre o tema, e a forma dos textos, como o veículo onde são
a re
itor

publicados (OSMAN et al., 2013, p. 242). A partir da compreensão e inter-


pretação, bem como da ênfase aos aspectos linguísticos e da reflexão sobre
o entorno da comunidade escolar ou local, pode-se privilegiar um trabalho
transdisciplinar, pontuando problemas e gerando iniciativas de solução.
par

Nesse contexto, os autores do LD disponibilizam no item Más apoyo no


guia didático do manual do professor, um texto sobre o Protocolo de Kioto
como suporte ao docente (OSMAN et al., 2013, p. 242), o que estende os
Ed

problemas locais para globais em forma de rede. Na página 86 do LD (Fig.


8), apresenta-se uma entrevista que foca o tema da biodiversidade no Brasil,
são

incluindo aí informações sobre o boto rosa. A partir do texto, é possível fazer


emergir a transdisciplinaridade, já que os alunos podem identificar e co-
mentar informações sobre a região do Brasil onde o boto é comum, processo
ver

de sua extinção, entre outros, o que se conecta com diferentes saberes das
ciências naturais. Por outro lado, trata-se de uma atividade em que os alunos
são orientados a identificar e sublinhar no texto verbos no presente do indi-
cativo e seus usos como a referência a situações habituais, futuro próximo,
propriedades ou características de algo ou alguém. Nota-se a preocupação
dos autores em destacar o presente do indicativo de uma forma menos estru-
tural. No entanto, na sequência didática dessa atividade, há uma tabela com
130

a conjugação de alguns verbos regulares e irregulares, com espaços vazios


para serem preenchidos. Esta atividade caracteriza-se como estrutural, com
foco na gramática e não no uso. Mesmo com exercícios contextualizados,
ou seja, vinculados ao tema do meio ambiente, há exercícios de completar
lacunas como ¿Les ___ (decir) a los otros miembros de tu familia que ___

V
r
(demostrar) conciencia ecológica evitando usar mucho plástico?6. Os exer-

uto
cícios propostos enfatizam o uso “adequado” das conjugações verbais, em
que o foco do aluno deve ser a forma e a justaposição de conteúdos, porém o
texto no formato de entrevista é apresentado com mais coerência em relação

R
aos princípios da transdisciplinaridade que os exercícios, pois evidenciam e

a
permitem mais relações com diferentes saberes.

do
Figura 7 – Artigo Figura 8 – Texto científico
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são i
rev
or
ara
t

Fonte: Osman et al. (2013, p. 86)


i

Fonte: Osman et al. (2013, p. 84)


op
d

Na Unidade 5 há também uma série de manchetes que devem ser relacio-


nadas às descrições de ações que focam a proteção do meio ambiente. Nesse
sentido, o exercício promove a averiguação de como podemos contribuir com
E

pequenos gestos como a separação do lixo orgânico e reciclável, economia de


água, luz e o uso consciente de sacolas plásticas. As ideias podem ser coletivas
ver

e discutidas em grupos. A partir desses textos, novamente se propõe aos alunos


a conjugação de verbos, conforme eles aparecem nos textos. Exemplo: ser
à son, es. (Reciclar es una forma inteligente [...]; Las luces LED son una
alternativa [...].Uma opção interessante para aplicação de formas gramaticais
proposta pelo LD é a construção de uma lista conjunta de ações que ajudam
6 Você sugere às pessoas de sua família que demonstrem consciência ecológica evitando usar muito plástico?
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 131

a preservar o meio ambiente. Assim, os alunos usam os verbos como veículo


de comunicação, de forma conectada, contextualizada e significativa, corrobo-
rando com os princípios da transdisciplinaridade. Ainda, o trabalho coletivo,
oral ou escrito, geralmente faz emergir ideais, conceitos e saberes de diferentes
áreas que fortalecem o foco transdisciplinar.

od V
r
Ainda na Unidade 5, o LD também propõe atividades de análise (ideia

uto
central, objetivo, forma de tratamento) do gênero panfleto de campanha co-
munitária (Fig. 9). Os alunos são convidados a elaborar um calendário se-
manal para uma campanha comunitária de incentivo e cuidado com o meio

R
ambiente em seu bairro, bem como a criação de um folheto.

oa
Figura 9 – Comunidade Figura 10 – Expressão artística
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

visã
a re
itor
par
Ed
são

Fonte: Osman et al. (2013, p. 91) Fonte: Osman et al. (2013, p. 93)

A atividade de campanha comunitária é exposta no tópico Análise de


Gênero, em que se explica a utilização do folheto como recurso para in-
ver

formar e promover certos comportamentos. Os autores focam as campanhas


de ação social. No calendário semanal é possível pontuar ações para os
problemas ambientais, bem como atitudes necessárias para reduzi-los. Os
resultados podem ser expostos na comunidade escolar e do bairro. Quanto
à transdisciplinaridade, é relevante destacar algumas sugestões do guia di-
dático. Os autores explicam a etimologia dos dias da semana, enfatizam
132

termos em latim e contrastam o português e o espanhol, destacando a tra-


dição romana que originou os dias da semana em espanhol (inspirados nos
corpos celestes) diferentemente do português, em que os nomes são oriundos
da Idade Média, quando os agricultores se reuniam ao redor de uma igreja
para vender seus produtos, sendo esta a primeira feira da semana e assim

V
r
sucessivamente (OSMAN et al., 2013, p. 243). Trata-se de curiosidades e

uto
conhecimentos interseccionando-se no interior da atividade proposta. Outro
aspecto relevante (e transdisciplinar) é que essa modalidade de atividade
acaba promovendo o contato com os problemas da comunidade, o que pode

R
gerar iniciativas de conscientização por parte de alunos e escola, integrando

a
esses ambientes, conectados em rede.
Como tentativa de abordagem transcultural e de expressão artística, o LD

do
apresenta, na página 93 (Fig. 10), algumas imagens de obras de arte produ-
zidas a partir do lixo reciclável e informações sobre seus respectivos artistas
aC
(Vik Muniz, Luis de Dios, João Parrinha, Xandi Kreuzeder- Skeleton Sea).

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são
Com base nas obras, os alunos podem realizar a leitura de imagens e responder
algumas questões sobre os materiais utilizados, semelhanças entre as pro-
duções, impacto e mudança de consciência derivados da leitura das obras. Em
particular, percebe-se um estreitamento com a área de artes plásticas, em que
i
é possível, inclusive, um trabalho prático de construção de maquetes, cartazes
rev

ou painéis com materiais recicláveis. A proposta justifica-se como transdisci-


plinar por suscitar discussões e práticas orais (ou escritas) em espanhol que
or

vislumbram informações diversas como o papel do artista plástico, comporta-


mento em museus, tipos de materiais recicláveis, reflexão sobre obras de arte
ara

bem como impacto e mudança de consciência ocasionada por elas. Percebe-se


que transitam conhecimentos pelas ciências humanas e naturais.
t

No término da unidade, há um espaço destinado à autoavaliação, em


i

que se preconiza a reflexão individual para aguçar o aspecto da autonomia.


op

A autonomia é um dos preceitos da complexidade, que prevê a auto-organi-


d

zação do indivíduo.
Com a análise, reflexão e discussão das atividades da Unidade 5 do
E

LD Enlaces 1 do Ensino Médio (OSMAN et al., 2013), dispostas acima,


percebemos que há o entrelaçamento de diferentes saberes e conhecimentos,
com o propósito de se discutir um tema gerador. Não são mencionadas disci-
ver

plinas, mas percebe-se o enredamento de conhecimentos diversos imbuídos


nas atividades propostas. Há a tentativa, aparentemente bem sucedida, de
superar o caráter fragmentado da organização do ensino. Assim, o LD visa
ensinar espanhol passando por todos os temas do conhecimento. Observa-se,
dessa maneira, que os conteúdos no Enlaces (OSMAN et. al. 2013) per-
passam diferentes disciplinas sem o intuito de nomeá-las, considerando que
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 133

não há fronteiras entre elas e o conhecimento. A partir de temáticas muito


interessantes, especialmente no mundo contemporâneo, e também dos temas
transversais propostos pelos PCNs, como questões de sustentabilidade e
meio ambiente, os conteúdos são apresentados por meio de atividades diver-
sificadas englobando conhecimentos e saberes das ciências naturais, exatas e

od V
r
humanas como geografia, história, química, matemática, artes, informática,

uto
ciências, biologia, entre outros. A aprendizagem do objeto de estudo, no caso
a língua espanhola, ocorre permeada de múltiplas e variadas informações
que se conectam, dependendo do viés do professor.

R
No entanto, a perspectiva de uma visão transdisciplinar, que parte do

oa
todo e transcende as barreiras disciplinares, não é tarefa fácil, tendo em vista
que professores formados pelo pensamento cartesiano, muitas vezes, não
se sentem confortáveis com as mudanças emergentes na atualidade. Esse
aC
desconforto, possivelmente, deve-se em parte pela formação fragmentada
e em parte pela insegurança em correr riscos. Nesse panorama, para fazer
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emergir a transdisciplinaridade o professor precisa entender-se “como um


dos elementos que dá dinamicidade ao sistema de ensino e de aprendizagem”
visã
(BORGES; PAIVA, 2011, p. 351) e não como alguém que, passivamente,
reproduz métodos e técnicas. Precisa, ainda, dinamizar as relações entre os
conteúdos e temas, considerando que a sala de aula lhe apresenta uma teia
de interações dinâmicas, não lineares, que envolvem diferentes elementos
a re
itor

como espaço escolar, professor, alunos, currículo, planejamento, abor-


dagem, metodologia, métodos e técnicas, material didático, visão da escola,
aspectos políticos etc. Por esse prisma, podemos destacar que o LD pode
ser um instrumento que potencializa o processo de aprendizagem por meio
par

de discussões, reflexões e participações, ou por meio do estudo autônomo.


Dessa forma, compreendemos também que apenas um enfoque teórico-me-
todológico subsidiado pela transdisciplinaridade, como podemos encontrar
Ed

na coleção de LDs Enlaces, não é suficiente para uma prática transdisci-


plinar, necessitando, por parte do professor, uma interpretação correta da
são

rede que transcende esse tipo de abordagem do conhecimento no contexto


de ensino e aprendizagem.
ver

Considerações Finais

Como resultado do estudo realizado, percebeu-se que o Enlaces, de


forma geral, cumpre o que se propôs a realizar, ou seja, enlaçar suas ati-
vidades, de forma contextualizada, compartilhada e interdependente. As
atividades da Unidade 5 do LD do 1º ano do Ensino Médio (OSMAN et.
al. 2013) – foco de análise e discussão deste capítulo – foram elaboradas a
134

partir de uma temática central que permeou todos os exercícios e discussões


propostas, contribuindo para que a transdisciplinaridade emergisse, como se
pôde observar no tópico acima. Além disso, no LD como um todo, há um
estreitamento entre os conteúdos, que são apresentados de forma cíclica e
retomados em diferentes unidades, como por exemplo, o tema da Unidade

V
r
6 ¿Qué hay detrás de la etiqueta? (OSMAN et. al. 2013, p.95), que retoma

uto
discussões sobre a industrialização e o consumismo, também responsáveis
por boa parte dos problemas ambientais destacados na Unidade 5. Essa es-
tratégia nos remete à tentativa de evitar a fragmentação e as fronteiras entre

R
os saberes, havendo, assim, a promoção do diálogo entre as ciências ao não

a
serem tratadas de forma dissociada.
Contudo, entendemos que o LD, em seu guia didático, acaba por en-

do
fatizar, em alguns momentos, mais a interdisciplinaridade do que a própria
transdisciplinaridade, o que pode facilitar uma prática apenas interdisciplinar
aC
pelo professor, sendo esse um aspecto menos favorável da coleção. Esse fato

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são
nos permite destacar, no uso da coleção, a sensibilidade do professor em re-
direcionar suas práticas quando se fizer necessário para mediar ou “enredar”
as discussões, visando à emergência da transdisciplinaridade, como sugerido
no guia didático.
i
Sendo o LD um recurso útil e escolhido, na maioria das vezes, pelo
rev

próprio professor, é pertinente atentar para a sua seleção a partir de concepções


de ensino e aprendizagem claras. Dessa forma, o professor pode atuar mais
or

diretamente sobre as evidências constatadas em sala de aula e direcionar seu


plano de ação com objetivos bem definidos. Ao encontro dessas preocupações,
ara

podemos tomar como referência os pressupostos da transdisciplinaridade que


vislumbram, entre outros aspectos, a dinamicidade da linguagem, a nego-
t

ciação de sentidos, a adaptação de acordo com as mudanças, além do foco no


i

processo de aprendizagem e no desempenho dos aprendizes.


op

Como observado na análise, o LD também permite a busca de expe-


d

riências fora da sala de aula, o que colabora para dinamizar o processo. Ao


relatar as iniciativas públicas para preservação do meio ambiente presentes
E

no seu entorno, o aluno precisa organizar informações e conectá-las com


as discussões propostas pelo LD. Também motiva a reflexão do professor,
a autonomia e a construção de identidades. Nesse caso, não se trata apenas
ver

da formação de hábitos automáticos de estruturas linguísticas ou acúmulo


de informações gramaticais. Percebe-se a inter-relação dos saberes e co-
nhecimentos, bem como a contextualização do que é apresentado ao aluno.
O grande desafio está na aplicação dessa abordagem no ensino formal de
LE, que tem a sala de aula como contexto principal. Além de “saber usar”
o LD de acordo com suas concepções, nesse caso a transdisciplinaridade,
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 135

concebendo uma nova visão de mundo, a prática docente não é tarefa fácil
para docentes que tiveram toda sua formação associada ao controle de tarefa,
à linearidade, à previsibilidade e ao imediatismo – princípios da concepção
cartesiana e mecanicista da construção do conhecimento.
Concluímos que a metodologia do LD analisado e a forma como aborda

od V
r
o ensino da língua é uma tentativa de fazer emergir a transdisciplinaridade e

uto
de superar o caráter fragmentado do ensino. Salientamos, porém, que o LD
poderia ter tido um enfoque maior na orientação do professor sobre como
“fazer” emergir a transdisciplinaridade a cada atividade, dando mais suporte

R
à prática e permitindo a ele enlaçar os conhecimentos, sem deixar-se con-

oa
fundir pela interdisciplinaridade. Entretanto, sem citar nomenclaturas, há
sugestões presentes no guia didático que explicam como é possível trabalhar
cada atividade para que ela se aproxime da concepção transdisciplinar, dando
aC
mecanismos para a diversidade no trabalho. Esse fato demonstra a preocu-
pação dos autores em atingir o objetivo da proposta teórico-metodológica do
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livro, tornando-o um apoio valioso para o ensino de espanhol.


visã
a re
itor
par
Ed
são
ver
E d
ver

i t or op
ara aC
rev
i são R V
do
a uto
r
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ver
Ed
são
itor
par aC
a re
PARTE III
visã R
od V
ACONSELHAMENTO
oa
ADAPTATIVO COMPLEXO
uto
LINGUAGEIRO COMO SISTEMA r
E d
ver

i t or op
ara aC
rev
i são R V
do
a uto
r
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CAPÍTULO 6

O EFEITO DO ACONSELHAMENTO
LINGUAGEIRO NA TRAJETÓRIA

od V
r
DE APRENDIZAGEM DE UMA

uto
ESTUDANTE DE INGLÊS1

R
oa
Eduardo Castro dos Santos Junior (UFPA)
Walkyria Magno e Silva (UFPA)

1 Introdução
aC
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Segundo Mercer (2015), a teoria da complexidade representa um im-


portante marco na linguística aplicada por considerar os atributos pessoais
visã
e contextuais do aprendente como partes de um mesmo sistema dinâmico
complexo (doravante SDC). Nessa direção, os estudos sobre aconselha-
mento em aprendizagem de línguas (AAL daqui em diante) beneficiam-se
dos postulados da teoria da complexidade dado ao seu foco em trajetórias
de aprendizagem individuais e complexas, levando em consideração os
a re
itor

aspectos internos e externos do aconselhado para impulsionar sua aprendi-


zagem. Deste modo, o conselheiro é mais um agente no sistema de apren-
dizagem do aconselhado, já que na interação que se estabelece entre eles, o
primeiro influencia, dinamiza e perturba a aprendizagem do segundo.
par

No contexto nacional, alguns estudos já vêm utilizando a teoria da com-


plexidade para explicar a sua relação com o AAL. Magno e Silva, Matos e
Rabelo (2015), por exemplo, identificaram atratores, pontos de bifurcação
Ed

e emergência de novos comportamentos a partir da interação dos aconse-


são

lhados com seus conselheiros e com os diversos outros contextos com os


quais mantém contato. Os resultados mostraram a forte interconexão entre os
elementos contextuais que dinamizam a aprendizagem desses indivíduos. Os
autores concluem chamando atenção para o olhar holístico sobre o sistema
ver

de aprendizagem dos alunos que a teoria da complexidade permite. É nesse


olhar holístico que se pode notar a interconexão entre os vários contextos (e
identidades) nos quais o aconselhado se situa.

1 Este trabalho é um recorte da pesquisa de Iniciação Científica conduzida em 2014-2015. Agradecemos o apoio da UFPA
no financiamento da bolsa de PIBIC. Este estudo recebeu o prêmio de destaque científico na área de Ciências Humanas
no XXVI Seminário de Iniciação Científica da UFPA.
140

Considerando o aconselhamento como mais um sistema no qual a apren-


dizagem de línguas acontece e sua interconexão com outros espaços, este ca-
pítulo pretende verificar como o aproveitamento do AAL reflete em uma rede
de contextos, como sala de aula, oficinas e projetos. Mais especificamente,
busca-se identificar os comportamentos que reflitam na aprendizagem de uma

V
r
participante; identificar como os agentes interagem nesse processo; e, por fim,

uto
verificar de que modo tais agentes influenciam sua trajetória. Os dados são
provenientes de narrativa, observação em espaços de aprendizagem, atas de
reuniões, relatórios de participação em oficinas e entrevistas.

R
Iniciaremos este capítulo expondo brevemente algumas características

a
dos SDC. Em seguida, discorremos brevemente sobre os atuais estudos de
motivação na aprendizagem de línguas. Depois, apresentamos a metodologia

do
de coleta e análise dos dados utilizados. A partir daí, mostramos, analisamos
e discutimos os dados coletados à luz da teoria da complexidade e dos as-
aC
pectos motivacionais. Finalmente, traçamos as considerações finais.

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
2 Características dos sistemas dinâmicos complexos

Segundo Larsen-Freeman e Cameron (2008b), os sistemas dinâmicos


i
complexos (SDC) podem ser definidos como aqueles que possuem elementos
rev

diferentes que interagem entre si de modo que podem – ou não – fazer emergir
novos comportamentos, sendo caracterizados como sendo dinâmicos, com-
or

plexos, não lineares, caóticos, imprevisíveis, sensíveis às condições iniciais,


abertos, auto organizáveis, sensíveis a feedback e adaptativos. Dentre essas
ara

características, enfocaremos neste trabalho o dinamismo e a abertura.


De Bot, Lowie e Verspoor (2007) e Larsen-Freeman (2015) consideram
t

a dinamicidade como uma das principais características dos SDC. Para


i

Larsen-Freeman e Cameron (2008b), tudo é dinâmico nos sistemas, pois a


op

maneira como os elementos agem (e interagem) muda ao longo do tempo.


d

Na aprendizagem de línguas, os elementos que dela fazem parte (autonomia,


motivação, interação, entre outros) são vistos como processos que mudam,
E

discreta ou continuamente, ao longo de todo o seu desenvolvimento.


Os SDC são abertos às influências externas, daí sua imprevisibilidade e
dependência do contexto. No entanto, o sistema pode alcançar, em determi-
ver

nados momentos, estágios de estabilidade. Isto não significa que ele esteja
estático, mas, na verdade, o que se tem é uma mudança contínua e pouco per-
ceptível, como bem argumentam Larsen-Freeman e Cameron (ibid.). Além
disso, não se separa o contexto do sistema porque os fatores contextuais
influenciam a sua trajetória da mesma forma que são influenciados por ele.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 141

As mudanças sistêmicas levam a diferentes estados ou fases. Larsen-


Freeman e Cameron (2008b) definem tais estados como o comportamento
atual do sistema. Para as autoras, quando um sistema muda de um estado
para o outro, o que muda, na verdade, são os padrões de comportamento.
Utilizando a metáfora da paisagem, as autoras defendem a possibilidade de

od V
r
todos os estados ou fases do sistema ocorrerem em uma área chamada de “pai-

uto
sagem de possibilidades”, onde há pontos altos e baixos. Nessa trajetória, há
determinados estados, modos ou padrões de comportamento recorrentes no
sistema, chamados de atratores ou estados atratores (LARSEN-FREEMAN;

R
CAMERON, 2008b). Nessa mesma linha de pensamento, Hiver (2015) res-

oa
salta que o termo atrator não exerce uma força de atração, como o nome pode
sugerir, mas representa os comportamentos que se movem em direção a novos
padrões na medida em que se afastam de outros padrões.
aC
Larsen-Freeman e Cameron (2008b) asseveram que os possíveis estados
ou comportamentos que um sistema pode assumir são regidos por alguns
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princípios ou regras, os quais são denominados parâmetros de controle. No


entanto, nem todos os parâmetros afetam sua trajetória. Na aprendizagem de
visã
línguas, as autoras acreditam que a motivação é um parâmetro de controle,
uma vez que ela mantém o sistema em movimento. A motivação pode ser
entendida como um SDC aninhado no sistema de aprendizagem de línguas
(LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b; PAIVA, 2005a), que, natural-
a re
itor

mente, apresenta diferentes graus de intensidade ao longo de toda a trajetória


de aprendizagem do indivíduo.
Entendendo a motivação e a complexidade de fatores internos, situ-
acionais e temporais que a regulam, Dörnyei e Ushioda (2011) chamam
par

atenção para três novas abordagens para o entendimento da motivação para


aprender LE: a) visão relacional da motivação, b) sistema identitário motiva-
cional e c) motivação a partir dos SDC, conforme veremos a seguir.
Ed

3 Visão relacional da motivação, identidade e contexto


são

De acordo com Sealey e Carter (2004)2, citados em Dörnyei e Ushioda


(2011), a abordagem linear volta-se para a identificação de variáveis e re-
ver

lações de causa e efeito, enquanto a abordagem relacional foca na evolução


sistêmica e dinâmica das características, fenômenos e processos relevantes
da motivação. Essa evolução é complexa, imprevisível, não linear e única, no
sentido de que cada aprendente e contexto apresentam uma relação singular.

2 SEALEY, A.; CARTER, B. Applied Linguistics as Social Sciences. London: Continuum, 2004.
142

Deste modo, a partir de uma abordagem relacional, Ushioda (2009) en-


tende a motivação como fenômeno que emerge a partir das relações entre o
indivíduo, sua identidade social e o contexto cultural em que ele está inserido.
Nessa perspectiva, a autora (2009; 2011a; 2011b) enfatiza as múltiplas iden-
tidades do indivíduo, isto é, ele, além de aprendente de língua, é também es-

V
r
tudante de graduação, membro de uma comunidade religiosa, filho, jogador

uto
de futebol, entre outras, que influenciam o seu processo motivacional.
Além de dinâmica e emergente, a motivação para apender uma LE en-
volve também uma reconfiguração na autoimagem do indivíduo (DÖRNYEI,

R
2005, 2009). Williams (1994)3, citada em Dörnyei (2005, p. 68), afirma que

a
aprender uma língua é muito mais do que adquirir um conjunto de voca-
bulário ou um instrumento de comunicação. Pelo contrário, envolve uma

do
“modificação na autoimagem, a adoção de novos comportamentos sociais e
culturais e modos de ser”. Diante disso, Dörnyei (2005) associa tal construto
aC
às visões que o aprendente projeta de si em um estado futuro. Essas visões

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
modelam seu comportamento na medida em que envolvem imagens e sen-
sações particulares de cada um, conforme veremos a seguir.

4 Sistema identitário motivacional


i
rev

Dörnyei (2005) afirma que a motivação integrativa, um dos aspectos pre-


sentes na teoria motivacional de Gardner e Lambert (1959), refere-se à dispo-
or

sição afetiva e interpessoal do aprendente em relação à comunidade falante da


língua alvo e ao desejo de se filiar a essa comunidade. O autor chama atenção
ara

para o fato de que essa identidade é virtual e metafórica porque que não há
uma comunidade geograficamente definida de falantes da língua inglesa, prin-
t

cipalmente, se levarmos em consideração a globalização dessa língua na con-


i

temporaneidade. Nesse sentido, o autor lança mão da teoria dos eus possíveis4
op

proveniente da psicologia com o intuito de expandir essa identificação.


d

De acordo com Markus e Nurius (1986), os eus possíveis representam


as visões em um estado futuro daquilo que os indivíduos podem se tornar,
E

gostariam de se tornar ou temem se tornar. Assim, esses estados representam


uma dimensão futura do indivíduo ao invés do seu estado atual. Os “eus
possíveis” atuam como uma força motivacional que move o indivíduo do seu
ver

estado presente para o futuro, integrando visão e ação. Dörnyei e Ushioda


(2011) ressaltam que essas possibilidades do “eu” são imagens, pensamentos
e sensações tangíveis e representam uma realidade para o indivíduo.

3 WILLIAMS, M. Motivation in foreign and second language learning: an interactive perspective. Educational and Child
Psychology, v. 11, n. 2, 1994.
4 Possible Selves Theory.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 143

Baseando-se nesses dois pilares – motivação integrativa e “eus” pos-


síveis –, Dörnyei (2005; 2009) propôs o sistema identitário motivacional que
é composto pelas seguintes dimensões: a) eu ideal em LE, que se refere àquilo
que a pessoa idealmente deseja se tornar. Essa dimensão atua como um fator
motivacional significativo porque ela é responsável por diminuir a diferença

od V
r
entre o “eu” atual e o “eu” futuro; b) eu que deve ser em LE, que se refere às

uto
características que uma pessoa acredita que a outra deva ter. Este aspecto en-
volve a pressão social (família, por exemplo), obrigações e responsabilidades;
por fim, c) experiências na aprendizagem em LE, que se refere ao ambiente de

R
aprendizagem imediato no qual o indivíduo está situado.

oa
Embora a dimensão futura das possibilidades do “eu” seja um fator mo-
tivador importante na trajetória de aprendizagem de LE, é no estado presente
que o aluno enfrenta as mais diversas influências que mantém seu desejo de
aC
aprender LE ativo. Essas interferências podem movê-lo para mais próximo
do seu “eu” ideal ou não. É com base na interferência de múltiplos fatores
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que direcionam a aprendizagem a caminhos não lineares, complexos e im-


previsíveis que Dörnyei e Ushioda (2011) apresentam a motivação a partir
visã
dos SDC, conforme veremos a seguir.

5 A relação entre motivação e sistemas dinâmicos complexos


a re
itor

A motivação para aprender LE integra múltiplos fatores relacionados


à identidade do aprendente e ao contexto em que ele está inserido e, por-
tanto, caracteriza-se como um sistema complexo. Dörnyei e Ushioda (2011)
afirmam que a motivação, como uma característica mental individual, deve
par

ser vista em relação às demais características do aprendente de língua de


forma holística de modo que a sua motivação, cognição e afetividade sejam
compreendidas interdependentemente. Alguns estudos descrevem a moti-
Ed

vação a partir da perspectiva dos SDC, entre eles Pawlak (2012) e Waninge,
de Bot e Dörnyei (2014).
são

Pawlak (2012) pesquisou a dinamicidade da motivação de 28 estudantes


de inglês durante o período de quatro semanas em uma escola de ensino
médio situada na Polônia. O autor utilizou questionários (para os alunos e
ver

professores), entrevistas, planos de aula e grade motivacional5. A análise


qualitativa e quantitativa evidenciou que a motivação não é estável e muda
não somente ao longo das aulas, mas também, em uma escala micro, durante
uma mesma atividade.

5 Trata-se de uma escala de 1 a 7 em que os alunos marcam seu nível de interesse em determinada aula e/ou atividade.
144

Estudos como o citado acima evidenciam a importância de se focar na


aprendizagem de LE de forma mais individualizada, já que cada trajetória
se desenvolve de maneira singular. Deste modo, entendendo a motivação a
partir de uma abordagem relacional, a qual envolve os múltiplos contextos,
identidades e influências presentes na trajetória de aprendizagem de LE, que

V
r
o aconselhamento linguageiro vem se estabelecendo como um suporte para

uto
os estudantes, sobretudo, no ensino superior.
Essa prática objetiva oferecer apoio individual para os aprendentes de
LE acerca de sua própria aprendizagem para que desenvolvam comporta-

R
mentos mais autônomos (CARSON; MYNARD, 2012). Nesse contexto,

a
a pessoa responsável em dar esse apoio é o conselheiro linguageiro. Na
relação que se estabelece entre eles, o aconselhado estabelece objetivos,

do
elabora planos de ação e verifica, por meio do diálogo e da reflexão, quais
as melhores formas de alcançar os objetivos propostos. No aconselhamento,
aC
ele é observado de forma holística já que na interação com o seu conselheiro,

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são
outros contextos e identidades são explorados com o intuito de potencializar
a sua aprendizagem. É dentro dessa visão relacional que o aconselhamento
se beneficia dos postulados da teoria da complexidade para melhor compre-
ender a trajetória de cada aluno.
i
rev

6 Metodologia
or

A inserção do aconselhado em múltiplos contextos implica, pois, na


relação complexa que se estabelece entre esses espaços de modo que um
ara

influencia o outro. Assim, faz-se necessário um estudo que verifique in


loco como se dá o aproveitamento do aconselhamento em outros espaços
t

de aprendizagem que não aqueles dos encontros com o conselheiro. Este


i

estudo de caso tem por objetivo verificar o aproveitamento do aconselha-


op

mento na aprendizagem de uma estudante de inglês. Para tal, nos colocamos


d

as seguintes perguntas de pesquisa: a) quais os efeitos das sessões de acon-


selhamento na aprendizagem de inglês da participante? b) quais os com-
E

portamentos que refletem a conscientização de aprender? c) como se dá a


trajetória motivacional da participante em questão?
Para Lüdke e André (2013, p. 20), o estudo de caso qualitativo é “o que se
ver

desenvolve numa situação natural, é rico em dados descritivos, tem um plano


aberto e flexível e focaliza a realidade de forma complexa e contextualizada”.
Este estudo de caso, realizado na Faculdade de Letras Estrangeiras Modernas
(FALEM) do Instituto de Letras e Comunicação (ILC), localizado no campus
de Belém da Universidade Federal do Pará (UFPA) no período de novembro
de 2014 a maio de 2015, lança mão da abordagem qualitativa interpretativa.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 145

Dentre os estudantes de graduação envolvidos como aconselhados no


projeto Aprendizagem de línguas estrangeiras como sistema adaptativo
complexo: autonomia, motivação e aconselhamento linguageiro6, foi se-
lecionada uma estudante. O critério de escolha utilizado foi por esta ter ini-
ciado a graduação sem proficiência na língua estudada. Para preservar sua

od V
r
identidade, conforme acordado em termo de consentimento livre e escla-

uto
recido, a participante é identificada como AC1CL67. Além da informante,
participaram também dois de seus professores e dois de seus colegas de sala.
Eles foram entrevistados com o intuito de verificar se os comportamentos

R
apresentados nas sessões de aconselhamento repercutiam naqueles demons-

oa
trados em sala de aula e nos demais contextos de aprendizagem, como ofi-
cinas, congressos, entre outros. O critério para seleção dos professores foi
que eles ministrassem a disciplina em inglês em uma das turmas frequen-
aC
tadas por AC1CL6. Por outro lado, o critério para seleção dos seus colegas
de sala foi a afinidade que ela possui com eles, percebida pelo primeiro autor.
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O estudo de caso faz uso de diversas fontes de informação (LÜDKE;


ANDRÉ, 2013). Assim, esta pesquisa lança mão dos seguintes instrumentos:
visã
narrativa de aprendizagem, atas de reuniões do grupo de pesquisa, obser-
vação não-participante, relatórios de AC1CL6 oriundos de sua participação
em oficinas e, por fim, entrevistas. Os dados são provenientes de várias
fontes, conforme ilustra a figura 1 abaixo.
a re
itor

Figura 1 – Fonte de dados


par
Ed
são
ver

Fonte: Elaborado pelos autores

6 Este projeto oferece aconselhamento linguageiro para estudantes de Letras com dificuldades em acompanhar suas
turmas nas habilidades linguageiras.
7 Código de identificação utilizado no projeto supracitado.
146

A narrativa possibilita a compreensão do processo de aprendizagem de


línguas, principalmente no que se refere à teoria da complexidade adotada na
análise (PAIVA, 2007). Pavlenko (2001, p. 213) assevera que as narrativas
são uma “fonte única de informações sobre motivações, experiências, lutas,
perdas e ganhos”. Além disso, a narrativa ilustra, retrospectivamente, a rota

V
r
percorrida pelo sistema em questão. Neste trabalho, buscou-se conhecer as

uto
primeiras experiências de aprendizagem de inglês da participante por meio
de sua narrativa.
Utilizamos as atas de reuniões do grupo de pesquisa e relatórios de

R
AC1CL6 provenientes de sua participação em oficinas. Lüdke e André

a
(2013, p. 45) argumentam que documentos como esses são de grande valia
para a abordagem qualitativa porque “não são apenas uma fonte de infor-

do
mação contextualizada, mas surgem num determinado contexto e fornecem
informações sobre esse mesmo contexto”. A observação foi realizada sem
aC
interferência direta com a aluna, embora reconheçamos que a presença do

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são
pesquisador possa ter alterado o contexto.
Por fim, foram realizadas entrevistas com a participante, seus profes-
sores e seus colegas de classe. As entrevistas foram semiestruturadas, com
um roteiro básico, que não é aplicado rigidamente, permitindo, assim, adap-
i
tações quando necessárias (ibid.). As perguntas enfocaram o comportamento
rev

da aprendente em sala de aula, sua experiência de aprender inglês, a projeção


do “eu” em estados futuros e atitudes diante da aprendizagem. Deste modo,
or

conforme podemos perceber na figura 1, trazemos aqui sete olhares sobre


o mesmo processo: o olhar da conselheira, dos professores, dos colegas, da
ara

própria aprendente e, por fim, do pesquisador.


Feita a seleção da aconselhada, fizemos o levantamento das atas de reu-
t

niões do grupo de pesquisa nas quais constam o relato da sua conselheira.


i

Foram coletados 12 relatos que abrangem o período de abril de 2014 a fe-


op

vereiro de 2015, representando a trajetória de participação de AC1CL6 nas


d

sessões de aconselhamento.
Para observar a aluna, encaminhamo-nos para os espaços de aprendi-
E

zagem frequentados por ela. A participante foi previamente informada do


dia, local e hora da observação. O procedimento ocorreu entre os meses
de novembro e dezembro de 2014. É sabido que a participante situa-se em
ver

diversos contextos de aprendizagem que vão além daquele universitário, no


entanto, neste trabalho, focamos em três espaços: sala de aula, oficinas e
aconselhamento linguageiro.
AC1CL6 foi observada em três aulas de língua inglesa e dois encontros
em uma oficina de produção escrita. Na sala de aula, tomamos notas dos com-
portamentos da participante levando em consideração suas interferências,
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 147

sua interação com os pares, manifestação de emoções e comentários feitos


por ela. Na oficina, levamos em consideração a atividade desenvolvida, a
interação com o seu ministrante e as sugestões feitas por ela.
Feita a observação, solicitamos que AC1CL6 nos enviasse sua narrativa
de aprendizagem atualizada uma vez que, nos primeiros encontros de AAL,

od V
r
a sua conselheira já havia pedido tal instrumento. No decorrer da coleta de

uto
dados, a informante participou de oficinas oferecidas pela universidade e,
ao concluí-las, os seus ministrantes solicitaram relatórios, que nos foram
disponibilizados por ela. Por fim, AC1CL6, dois professores e dois colegas

R
foram entrevistados. As entrevistas ocorreram entre abril e maio de 2015

oa
em horário previamente agendado em ambiente apropriado. Cada entrevista,
com duração aproximada de 20 minutos, foi gravada em áudio e posterior-
mente transcrita.
aC
Começamos a análise dos dados verificando as primeiras experiências
de AC1CL6 com a língua inglesa por meio de sua narrativa de aprendizagem,
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focando no seu conteúdo. Feito isto, depois de leituras sucessivas de todos


os dados, organizamo-los em quatro grupos motivados pelas perguntas que
visã
guiam esta pesquisa. O quadro 1 mostra quais foram os instrumentos utili-
zados em cada categoria:

Quadro 1 – Instrumentos utilizados em cada grupo


a re
itor

Grupos Instrumentos Origem


Primeiras experiências
Narrativa AC1CL6
com a língua inglesa
Colega A, Colega B,
par

Efeito do aconselhamento Observação, entrevistas Professor A, Professor


em outros ambientes e atas de reuniões B, Conselheira,
Pesquisador
Comportamentos que
Ed

refletem a conscientização Entrevista e relatórios AC1CL6


de aprender
são

Trajetória motivacional Entrevista e atas AC1CL6


Fonte: Elaborado pelos autores
ver

Com o intuito de manter a representação fiel dos dados, o seu conteúdo


foi mantido na sua forma original. É importante frisar que, por questões
éticas, todos os nomes mencionados foram substituídos por XXX ou em
caso de menção do nome da aconselhada, este, por sua vez foi substituído
por AC1CL6.
148

Feito os esclarecimentos teóricos e metodológicos, a seguir apresen-


tamos e discutimos os resultados da análise dos dados à luz da Teoria da
Complexidade e dos estudos sobre motivação.

7 Análise e discussão dos dados

V
r
uto
Iniciamos esta seção apresentando as condições iniciais do sistema de
aprendizagem de AC1CL6. Em seguida, discutimos os comportamentos
provavelmente catalisados pelas sessões de aconselhamento em outros am-

R
bientes de aprendizagem. Depois, mostramos aqueles comportamentos que

a
atestam a conscientização de aprender. Por fim, descrevemos a trajetória
motivacional da informante durante sua participação no projeto em questão.

do
7.1 Condições iniciais
aC

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são
As condições iniciais podem ser definidas como o estado que o sistema
está no momento em que ele começa a ser investigado (VERSPOOR, 2015).
Isto significa que devemos identificar o estado atrator que o sistema motiva-
cional ocupa no momento em que AC1CL6 começou a estudar inglês. Como
i
podemos perceber na sua narrativa, AC1CL6 criou grandes expectativas
rev

para estudar essa língua durante o seu primeiro ano no Ensino Médio quando
exclama “Que legal, vou aprender inglês!”. No entanto, diversas influências
or

atuaram para que essa experiência não fosse positiva, conforme mostra o
trecho abaixo.
ara

[1] infelizmente fui decepcionada, era preciso algo mais, algo que
t

desse sentido àquela aprendizagem, que se resumia a repetições. Para


piorar a situação, no segundo ano do ensino médio adoeci e já não era
i
op

tão participante das aulas. No terceiro ano passei mais de um semestre


d

sem professor de Inglês; enfim conclui o ensino médio com um insig-


nificante conhecimento da Língua (Narrativa, abril/2014).
E

No excerto [1] acima, AC1CL6 critica claramente o modo como o


inglês era ensinado em sua escola de Ensino Médio. Nas suas palavras, o
ver

ensino da língua “se resumia a repetições”. Tal relato evidencia que a meto-
dologia utilizada pelo professor era recorrente e afetou diretamente a postura
da aluna na sala de aula nos anos seguintes. Observamos, pois, um atrator
nesse sistema de aprendizagem: a prática pedagógica que era ineficiente para
a aluna, já que não oferecia sentido para ela (“era preciso algo mais, algo
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 149

que desse sentido àquela aprendizagem”). O excerto acima revela também


sua percepção do que é língua. Para ela, a língua é instrumento para comu-
nicação e, portanto, a aprendizagem deveria ser voltada para tal finalidade.
Verspoor (2015) chama atenção para a natureza iterativa do sistema,
afirmando que o próximo estado do seu desenvolvimento é resultado da in-

od V
r
teração que ocorre no seu estado anterior. Percebemos, no excerto [1], que a

uto
experiência na sala de aula durante o primeiro ano criou condições para que
o segundo e terceiro anos de estudos da língua resultassem em uma aluna
pouco participativa nas aulas. Ou seja, as práticas pedagógicas ineficientes,

R
somando agora um estado de saúde da aluna e a falta de professor à época,

oa
afetaram diretamente AC1CL6 de modo que ela concluiu o Ensino Médio
com conhecimento precário do idioma.
No excerto [2] abaixo, percebemos claramente a imprevisibilidade do
aC
sistema, uma vez que a aluna decidiu “ironicamente” continuar estudando inglês.
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[2] agora, no ensino superior, ironicamente, sou estudante de Língua


Inglesa e apesar de ter entrado na graduação com um conhecimento
visã
básico sobre o idioma sempre busquei várias formas de favorecer
minha aprendizagem (Narrativa, abril/2014).

Percebemos aquilo que Larsen-Freeman e Cameron (2008b) chamam de


a re

mudança de fase na trajetória do sistema, ou seja, o sistema passa por uma fase,
itor

muda radicalmente e adota comportamentos diferentes. Apesar de ter tido uma


experiência negativa no seu primeiro contato com a língua, AC1CL6 decide
continuar estudando o idioma, desta vez, no ensino superior. Com relação à
par

motivação que direcionou o sistema a este comportamento, AC1CL6 relata em


entrevista que começou a estudar inglês na graduação porque, como ela não
teve nenhuma oportunidade de estudar em um curso livre, gostaria de aprender
uma língua estrangeira, mas não manifestou, naquela ocasião, interesse em se
Ed

tornar professora, que é o objetivo do curso escolhido.


são

O impacto das condições iniciais no desenvolvimento futuro do sistema


dependerá do estado atrator em que o sistema se encontra (VERSPOOR,
2015). Se ele estiver em uma bacia atratora profunda, as condições iniciais
terão um efeito duradouro no desenvolvimento subsequente do sistema
ver

(CHAN; DÖRNYEI; HENRY, 2015). No caso de AC1CL6, a partir do


momento em que começa a estudar inglês na graduação, ela busca novas
formas de obter uma aprendizagem mais significativa ao procurar novas
150

oportunidades para utilizar a língua, como as oficinas dos English Teaching


Assistants (ETAs)8 e o AAL. Este engajamento tem um efeito determinante
na sua trajetória de aprendizagem, conforme mostra seu relato abaixo:

[3] pensando em como entrei aqui, com quase zero de conhecimento

V
r
no idioma reconheço que minha aprendizagem apresentou avanço, en-
tretanto ainda há muito trabalho e estou disposta a fazê-lo (Narrativa,

uto
abril/2014).

Percebemos, então, que mesmo diante da baixa proficiência na língua,

R
a
AC1CL6 mostra-se muito persistente nos estudos do idioma. Esses indícios
permitem caracterizar esta estudante como motivada intrinsicamente, uma

do
vez que ela se engaja em atividades que lhe causam certa satisfação e prazer
em aprender algo novo (RYAN; DECI, 2000). Assim, as condições iniciais
aC
deste sistema de aprendizagem configuram-se como um conjunto de eventos

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(positivos e negativos) que direcionaram AC1CL6 a ser uma estudante par-
são
ticipativa não somente na sala de aula, mas no contexto universitário como
um todo ainda que não demonstre o desejo de se tornar professora.
i
7.2 Efeito do aconselhamento em outros ambientes
rev

Antes de participar do AAL, AC1CL6 já aproveitava as oportunidades


or

que o contexto universitário oferecia. No seu primeiro encontro com a con-


selheira, ela relata que participava de todas as oficinas oferecidas pelos ETAs
ara

e, por conta da exposição à língua, não possuía tantas dificuldades de com-


preensão oral. Para ela, a produção oral era o seu ponto fraco, enquanto a
t

escrita representava um “desafio” ainda maior. Além dessas dificuldades,


AC1CL6 alegava também que o seu interesse em participar do aconselha-
i
op

mento era por precisar desenvolver melhores formas de gerenciar sua apren-
d

dizagem, demonstrando, assim, certo grau de conscientização.


Um de seus colegas, que é também aconselhado, quando questionado
sobre a percepção que ele tinha sobre a trajetória de aprendizagem de
E

AC1CL6 antes e depois de participar do aconselhamento, relata que antes


ela se sentia muito insegura para falar em diversos ambientes, entre eles a
ver

sala de aula, ao contrário do que ocorria agora. Essa mudança radical e a


adoção de novos comportamentos pode ser entendida como uma mudança
de fase, ilustrando os postulados de Larsen-Freeman e Cameron (2008b),
como mostra o excerto a seguir:

8 ETAs são os assistentes de ensino de inglês do programa Capes-Fulbright, atuando na UFPA.


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 151

[4] principalmente no começo, ela tinha muito... eu acho que ela era
pior do que eu assim na parte de falar, ela tinha muito medo de falar.
Lembro que eu não falava nada, mas não tinha tanto medo e ela tinha
muito muito medo assim. E ela ficava muito desmotivada no começo
e agora a AC1CL6 é a faladora lá da sala. Eu acho que, além disso,

od V
r
ela também corre atrás, ela se expõe muito principalmente na língua
inglesa mesmo tu vê assim ela falando devagar, mas ela tem essa co-

uto
ragem. E também de correr atrás dos objetivos dela, não só na parte
da graduação, mas na parte da língua inglesa e outras coisas... Tipo
oficinas, apresentar trabalhos, essas coisas... tudo que a universidade

R
oferece ela participa. Ela corre atrás dessas coisas... (Entrevista com

oa
colega A, abril/2015).

Essa vontade de fazer uso da língua estudada é estendida para outros


aC
espaços, como os cursos livres e as demais disciplinas da graduação. Nos
cursos livres, seu professor relata que ela se voluntariou para ser a primeira a
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fazer a prova oral e que seus textos escritos estão mais longos e com menos
erros. Na graduação, professores A e B relatam em entrevista que a tomada
visã
de decisão e a participação em sala de aula são características marcantes de
AC1CL6, conforme podemos perceber nos excertos [5] e [6] abaixo:

[5] O que sempre me chamou atenção da AC1CL6 é que ela sempre


a re
itor

toma iniciativas, ela nunca se limita ao mando do professor, [...] ela


sempre faz perguntas na sala de aula (Entrevista com professor A,
abril/2015).

[6] Eu percebi uma evolução importante do semestre passado para


par

este ano. Ela tem se mostrado mais segura na fala dela [...]. Ela é
muito questionadora. (Entrevista com professor B, maio/2015).
Ed

Os excertos [4], [5] e [6] mostram que a adoção desse novo comporta-
são

mento – ser participativa em LE – é manifestado em uma rede de espaços.


Esse padrão de comportamento em que o sistema se estabiliza é um exemplo
claro de atrator (HIVER, 2015).
O estado atrator discutido até aqui mostra um nível de estabilidade
ver

significativo no sistema, pois quando AC1CL6 não tem a oportunidade de


utilizar a língua em um contexto de aprendizagem específico, ela se sente
frustrada, como podemos perceber no excerto [7] abaixo:

[7] [AC1CL6] tomou a iniciativa de ajudar outra aluna que estava


com dificuldades para responder. O professor fez perguntas para
alguns alunos e não para ela. Ela falou para seu colega “ele nem me
152

chamou, fiquei triste”. O professor escutou, riu e deu a oportunidade


para ela responder. Ela o fez corretamente (Observação em sala de
aula, novembro/2014).

A disposição para falar em inglês dá-se não somente na sala de aula ou

V
r
na oficina de escrita acadêmica, mas se estende também para outros con-
textos. Seus colegas mencionam que ela está tentando empregar a LE com

uto
eles em todos os lugares, inclusive em redes sociais, tais como o Facebook.
Ambos mencionam na entrevista que a conversa entre eles com AC1CL6

R
ocorre em inglês quando ela inicia a interação em tal língua, como podemos

a
perceber na fala a seguir:

do
[8] inclusive a gente até de vez em quando conversa em inglês, fala
em inglês entre nós. Ela na verdade hoje em dia começa a falar em
aC
inglês normalmente na fila do RU e a gente vai praticando também e

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isso é bem interessante [...]. Ela é uma das pessoas que mais começam
são
a falar em inglês com a gente... começando uma conversa em inglês...
(Entrevista com colega B, abril/2015).

MacIntyre, Bruns e Jessome (2011, p. 93) argumentam que “as situ-


i
ações nas quais os aprendentes estão mais dispostos a se comunicar não são
rev

radicalmente diferentes daquelas em que eles estão menos dispostos”. No


or

caso da participante em questão, ela aproveita significativamente os propi-


ciamentos que o contexto disponibiliza. Se a motivação é aquela que dire-
ciona alguém a uma ação, AC1CL6 está altamente motivada no sentido de
ara

que ela age no AAL, na sala de aula, na oficina e no cotidiano.


Ela interage com o professor e os colegas. No entanto, é possível ob-
t

servar que ela mantém uma interação mais constante com um colega em
i

especial, que participa também como aconselhado no projeto em questão.


op
d

Esse colega foi um dos entrevistados neste trabalho. Ele relata que tanto a
falta de conhecimento da língua inglesa bem como a participação de ambos
no aconselhamento linguageiro contribuíram para o aumento de afinidade
E

entre eles.
ver

[9] Com certeza aumentou, tanto no aconselhamento quanto na sala


de aula vai aumentando. Mas assim, logo no começo que começou
as coisas básicas, a gente tinha muito dessa de motivação e tal, aí
tinha dia que a gente chegava “ah eu tô desmotivado, vou falar com
meu conselheiro, quero desistir” e a gente começava a falar sobre isso,
sobre aconselhamento... (Entrevista com colega A, abril/2015).
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 153

Nesse excerto, percebemos claramente a coadaptação entre eles, uma


vez que ambos buscam apoio entre si com o intuito de dinamizar os seus
sistemas de aprendizagem. Percebemos também que a relação que se esta-
belece entre eles e os seus respectivos conselheiros se estende para além das
sessões de aconselhamento, uma vez que, por meio do diálogo, eles trocam

od V
r
novas informações para conseguirem enfrentar a pressão que o contexto uni-

uto
versitário exerce, sobretudo naqueles que entram na faculdade com pouco
conhecimento do idioma. Deste modo, o aconselhamento influencia não so-
mente nos múltiplos espaços de aprendizagem de inserção da aconselhada,

R
mas também na relação que ocorre entre ela com seus pares.

oa
Conforme asseveram Larsen-Freeman e Cameron (2008b), o sistema
está em constante mudança, o que é chamado pelas autoras de estabilidade di-
nâmica, que é o que ocorre com o estado da aprendizagem da aluna em questão
aC
até o momento. Contudo, sua professora relata em entrevista que AC1CL6 já
não está tão participativa na sala de aula e vem também faltando algumas
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aulas. Ela nota uma “brutal diferença” no comportamento da aluna de um se-


mestre para o outro. No excerto abaixo podemos verificar tal comportamento.
visã
[10] eu estou como professora dela na disciplina de XXX que é em
língua inglesa. Então, diferente do comportamento dela do semestre
passado, esse semestre ela já tá com quatro faltas [...]. Além das faltas,
a re

ela não participou como ela vinha participando no semestre passado


itor

quando [a disciplina] era em português (Entrevista com professor A,


abril/2015).

O sistema de aprendizagem de AC1CL6 muda novamente de fase.


par

Desta vez, ele exibe um comportamento inesperado para uma aluna como
ela, como mostra o excerto [10]. Devido ao grande número de elementos
e agentes que compõem os SDC, vai além da capacidade dos instrumentos
Ed

adotados nesta pesquisa apontar o que levou tal sistema a seguir esse com-
são

portamento. Sabe-se, entretanto, que o período mencionado acima corres-


ponde àquele em que ela não mais estava participando do AAL devido à
licença maternidade de sua conselheira. Dentre a constelação de fatores que
podem ter motivado a emergência da baixa participação na sala de aula, a
ver

sua saída do aconselhamento é um dos elementos que mais perturbam a sua


trajetória.
154

7.3 Comportamentos que refletem a conscientização de aprender

Os dados discutidos até aqui mostram uma mudança significativa no


comportamento de AC1CL6 que se estendeu para outros espaços de apren-
dizagem a partir de sua participação no AAL. Seus professores e colegas são

V
r
unânimes ao afirmar que ela ficou mais confiante e participativa nesses am-

uto
bientes. Nas sessões de aconselhamento, as atitudes da aconselhada são for-
temente discutidas para que ela se torne mais consciente das suas ações. Por
meio dessa reflexão, a aluna pode pensar nos seus pontos fortes e nos pontos

R
a melhorar. AC1CL6 relata abaixo sua experiência com o aconselhamento.

a
[11] Antes do aconselhamento com inglês, eu tava meio que sendo

do
levada. Mas depois do aconselhamento eu tava levando, entendeu? Eu
já entendia como fazer as coisas certinho, então era basicamente isso.
aC
Antes eu ia sendo levada, não refletia, principalmente, com o que eu

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tava fazendo [...]. Toda a ação que eu fazia eu já imaginava aonde eu
são
poderia chegar, já tinha um plano já [...] (Entrevista com AC1CL6,
abril/2015).

É evidente no excerto [11] acima a mudança de atitude de AC1CL6


i
rev

diante da própria aprendizagem. Como podemos perceber, ela não tinha se


conscientizado acerca do seu processo de aprender antes do aconselhamento.
or

Tal só foi possível depois dessa sua participação. AC1CL6 relata que se
tornou mais responsável quando começou a conduzir seu próprio processo
com base nos seus pontos fortes e nos pontos a melhorar. Podemos notar
ara

também que o “eu futuro” é um fator que contribui para o desenvolvimento


da sua conscientização (“toda a ação que eu fazia eu já imaginava aonde eu
t

poderia chegar”).
i

É possível evidenciar a influência do aconselhamento no sistema afetivo


op
d

de AC1CL6. Ela menciona que se sentia com medo ao encarar um novo de-
safio, como ler algum texto em LE, e, por causa deste sentimento, ela não
avançava na sua aprendizagem. Com o aconselhamento, por outro lado, ela
E

relata que começou a persistir nesses desafios afim de superar o medo que
sentia. O excerto [12] abaixo explicita isso:
ver

[12] principalmente assim não ter medo de me relacionar com alguma


coisa em inglês. Por exemplo, quando eu tava no segundo semestre,
eu já tava no aconselhamento, mas não tinha sido totalmente desen-
volvido essa consciência, esse entusiasmo, essas coisas, eu ainda tava
no início, aí quando eu pegava um texto, por exemplo, de uma disci-
plina pra ler, ele era todo em inglês, aí eu ficava ‘meu deus, será que eu
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 155

vou conseguir?’ Aí eu não ia por causa que eu ficava com medo e aí eu


já achava que não ia conseguir. E agora não, quando eu pego um texto
em inglês, eu já vou, mesmo que eu pense que não vou conseguir, mas
eu vou aos poucos e consigo (Entrevista com AC1CL6, abril/2015).

od V
r
Quando ela estava no segundo semestre, as atividades solicitadas pelo

uto
seu professor iam além daquilo que ela poderia fazer com seu nível de língua.
Na época, sua conselheira relata que ela se desestabilizou emocionalmente
por não saber lidar com a pressão que o contexto exercia. AC1CL6 decidiu,

R
então, baixar o nível de expectativas com a disciplina ao tentar somente

oa
passar nela independente do resultado. Assim, conforme podemos perceber
no excerto [12], é por meio da reflexão sobre a aprendizagem durante o AAL
que AC1CL6 começa a superar as dificuldades. Além da estratégia de baixar
as expectativas, sua conselheira sugeriu também que ela planejasse as etapas
aC
que deveriam ser traçadas para alcançar seus objetivos, como podemos ver
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

no excerto a seguir.
visã
[13] principalmente no sentido de pensar que eu vou conseguir. Tipo
assim, às vezes a coisa parecia muito grande e, era sempre o que a
minha conselheira falava, a gente tinha que dividir em partes menores
e ver os caminhos para chegar até lá. Então, foi uma coisa que eu
aprendi muito com isso. E aí pensar em apresentar um trabalho em
a re
itor

um congresso internacional, como ocorreu, parecia uma coisa muito


grande. Mas aí colocando a cabeça no lugar e vendo todos os passos
pra chegar até lá com muita calma sempre, que é necessário calma até
com a gente mesmo quando o tá aprendendo uma língua porque às
par

vezes a gente quer dar um salto e não é assim, é por partes (Entrevista
com AC1CL6, abril/2015).

Podemos perceber nos excertos [12] e [13] que a conselheira atua como
Ed

um agente que, além de promover a conscientização sobre a aprendizagem,


são

auxilia a aconselhada a melhor lidar com o seu sistema afetivo, que é funda-
mental para o sucesso na aprendizagem. Esses excertos corroboram os resul-
tados empíricos de Yamashita (2015) sobre a importância da afetividade no
desenvolvimento da conscientização sobre a aprendizagem durante o AAL.
ver

7.4 Trajetória motivacional

Dörnyei e Ushioda (2011) asseveram que uma abordagem sistêmica da


motivação envolve a identificação do conglomerado motivacional que mais
se destaca. No caso do sistema de aprendizagem de AC1CL6, conforme já
156

discutido, evidenciamos que há um interesse intrínseco em participar das ati-


vidades da universidade (oficinas dos ETAs, por exemplo). Hidi e Renninger
(2006, p. 112) afirmam que o interesse é resultado da interação entre a pessoa
e o conteúdo particular. Para as autoras, “o potencial para o interesse está
na pessoa, mas o conteúdo e o ambiente definem a direção do interesse e

V
r
contribuem para o seu desenvolvimento”. Assim, as primeiras experiências

uto
bem-sucedidas de uso da língua no contexto universitário contribuíram para
o aumento do interesse de AC1CL6 em praticá-la mesmo quando ela se
sentia nervosa, como mostra o excerto [14]. Outras oportunidades que sur-

R
giram nesse mesmo contexto foram também bem aproveitadas por ela, como

a
a oficina de escrita acadêmica e o próprio aconselhamento.

do
[14] eu sempre me expus, XXX falou que é uma coisa que eu faço
muito, às vezes meu coração pode tá saindo pela boca, mas eu sei que
aC
é bom (Entrevista com AC1CL6, abril/2015).

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
Alguns fatores estavam impedindo a participação de AC1CL6 em al-
gumas atividades na universidade, que influenciaram negativamente seu
desempenho (tirou regular em uma disciplina). Sua conselheira relata que
i
“duas tardes e quatro noites” eram dedicadas para a igreja. Por conta disto,
rev

ela sugeriu que deveria haver um equilíbrio entre as atividades da igreja e da


universidade. Esta influência vai ao encontro daquilo que postula Ushioda
or

(2015) sobre a mudança da motivação de acordo com o contexto em que


a pessoa está inserida. AC1CL6 decidiu, então, sair do curso de música e
ara

reduzir o número de idas à igreja para que conseguir lidar com a rede de
espaços (e identidades) que frequenta.
t

AC1CL6 não demonstrava interesse em se tornar professora quando


começou tanto a graduação quanto o AAL. Naquele momento, a sua moti-
i
op

vação para estudar inglês residia somente na vontade de morar em um país


d

anglófono (Canadá). No entanto, ela recebeu uma proposta de dar aulas de


inglês para crianças na sua comunidade que atuou como uma força moti-
vadora, pois ela de fato quis “começar a dar aulas para crianças”. A vontade
E

de se tornar professora veio durante sua participação nessa atividade. Como


o sistema de aprendizagem é aberto às influências externas (LARSEN-
ver

FREEMAN; CAMERON, 2008b), a oportunidade de dar aulas atuou im-


previsivelmente e perturbou o seu sistema motivacional e identitário. Assim,
conforme aponta Dörnyei (2009), as experiências de aprendizagem e de
ensino positivas contribuem para a formulação do “eu futuro” de AC1CL6.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 157

AC1CL6 inscreveu-se para apresentar um trabalho em um congresso da


área, o que fez com sucesso. Depois da apresentação deste trabalho, ela criou
seu Currículo Lattes, começou a preenchê-lo e comprou uma pasta catálogo
para guardar todos seus certificados. Sua conselheira notou que “ela está
ansiosa por novas conquistas para enriquecer seu Lattes e está aproveitando

od V
r
ao máximo as oportunidades”. Ela decidiu, por exemplo, apresentar outro

uto
trabalho junto com o seu colega (colega A) em um congresso internacional,
conforme ela menciona no excerto [13]. As apresentações de trabalho e o
envolvimento com a prática docente refletem seu desejo de se tornar pro-

R
fessora, diminuindo a diferença entre o seu “eu atual” e o “eu futuro”.

oa
8 Conclusão
aC
Este estudo de caso teve por objetivo evidenciar o aproveitamento do
aconselhamento em outros espaços de aprendizagem, lançando mão de múl-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

tiplos olhares sobre o mesmo sistema. Em relação aos efeitos do aconselha-


visã
mento, os resultados mostraram que a participante aproveita as estratégias
sugeridas por sua conselheira nos outros ambientes e com seus pares, so-
bretudo no que diz respeito a sua participação. Ademais, a conselheira exerce
influência determinante na construção da confiança ao falar em LE, uma vez
que AC1CL6 se sentia com medo e desencorajada em correr riscos na língua
a re
itor

alvo. Com o aconselhamento, ela se tornou mais participativa e autorregu-


ladora da própria aprendizagem, não somente nas sessões, mas também nos
locais em foi observada. No entanto, quando ela não estava participando do
aconselhamento, ela voltou a demonstrar baixa participação na sala de aula.
par

Com relação aos comportamentos que refletem a conscientização de


aprender, os resultados evidenciaram que a participante tornou-se mais res-
ponsável pelo seu processo de aprendizagem. O AAL auxiliou a aprendente
Ed

a melhor lidar com o seu sistema afetivo e a utilizar estratégias para manter
a motivação ativa.
são

Quanto à trajetória motivacional, os dados revelaram que a motivação


é dinâmica e que o papel da conselheira é pertinente ao longo de todas as
fases da motivação. Além disso, o AAL colabora para a emergência de novas
ver

identidades, como a de ser professora, bem como ajuda no estabelecimento


e sustentação do “eu futuro”.
Esta pesquisa possui suas limitações. Acreditamos que um período
maior de tempo de observação, bem como um número maior de contextos
observados (como por exemplo, as oficinas dos ETAs e a comunidade em
que ela atuou como professora) ofereceriam esclarecimentos promissores
acerca do sistema de aprendizagem em questão. Apesar disso, o estudo
158

estimula a continuidade de pesquisas sobre aconselhamento, as quais podem


se beneficiar dos processos etnográficos e/ou longitudinais para verificar a
autorregulação da aprendizagem, assim como a dinamicidade do sistema
identitário motivacional.

V
r
uto
R
a
do
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são i
rev
or
ara
di t op
E

ver
CAPÍTULO 7

A EMERGÊNCIA DE
COMPORTAMENTOS AUTÔNOMOS NO

od V
r
ACONSELHAMENTO LINGUAGEIRO:

uto
um estudo segundo a teoria da complexidade

R
oa
Larissa Dantas Rodrigues Borges (UFPA)
Jhonatan Allan de Andrade Rabelo (UFPA)

Introdução
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Este trabalho visa investigar a contribuição do aconselhamento lingua-


geiro para o processo de autonomização sob a ótica da teoria da complexidade.
visã
O projeto de pesquisa intitulado “Aprendizagem de línguas estrangeiras como
um sistema adaptativo complexo: motivação, autonomia e aconselhamento
linguageiro” foi desenvolvido na Universidade Federal do Pará de 2013 a
2015. Dentre seus objetivos, estava a necessidade de estudar os construtos
relacionados à aprendizagem de línguas à luz da complexidade, uma vez que
a re
itor

os resultados de estudos anteriores já indicavam o caráter caótico e não linear


da autonomização dos participantes do aconselhamento linguageiro.
Partindo desse pressuposto, os membros do projeto de pesquisa debru-
çaram-se sobre os estudos mais relevantes a respeito desse novo paradigma
par

da Ciência e buscaram entender como esses preceitos poderiam contribuir


para as práticas do aconselhamento linguageiro. Neste capítulo, busca-
remos descrever a trajetória de uma das alunas aconselhadas no projeto.
Ed

Investigaremos como se deu seu processo de autonomização por meio da


são

análise dos comportamentos que emergiram após mudanças de fase identifi-


cadas em sua trajetória.
Inicialmente, iremos conduzir uma breve revisão teórica sobre a mu-
dança nos sistemas complexos, o aconselhamento linguageiro e a autonomia
ver

na aprendizagem de línguas estrangeiras. Em seguida, apresentaremos os pro-


cedimentos metodológicos que nortearam nossa pesquisa. Por fim, apresen-
taremos os dados coletados, analisando-os de acordo com os pressupostos da
complexidade e teceremos nossas conclusões, apontando a contribuição desta
investigação para os estudos sobre a aprendizagem de língua estrangeira (LE).
160

Mudança nos sistemas adaptativos complexos

Como mencionado no capítulo introdutório deste livro, os sistemas


adaptativos complexos são caracterizados por seu caráter dinâmico, ou seja,
sua constante mudança através do tempo. Martins e Braga (2007, p. 219)

V
r
explicam, de maneira sintética, como se dá esse processo:

uto
Um SAC [sistema adaptativo complexo] é composto de agentes que
interagem dinamicamente e adaptam-se uns aos outros e ao ambiente,

R
pois são sensíveis ao feedback e procuram acomodação mútua para

a
obter a otimização dos benefícios que garantirão a sua sobrevivência.
Essas interações e adaptações possibilitam que os agentes de um

do
sistema se auto-organizem, criando novos padrões e comportamentos.
aC
Os autores trazem à tona dois conceitos fundamentais por trás da

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


mudança nos sistemas: a auto-organização e a emergência de novos com-
são
portamentos. Segundo Larsen-Freeman e Cameron (2008b, p. 58), “auto-
-organização e emergência são maneiras alternativas de falar sobre a fonte
da mudança de fase no comportamento dos sistemas complexos”1. Elas de-
dicam um capítulo de seu livro a essa temática, e tentaremos resumir aqui
i
rev

alguns pontos relevantes.


As autoras explicam que existem dois tipos de mudança nos sistemas
or

complexos: internas e externas. Segundo elas, “mudanças internas e auto-or-


ganizadas alteram a estrutura do sistema, enquanto que respostas a energia
e matéria advinda do contexto levam a mudanças adaptativas que mantém a
ara

ordem ou a estabilidade”2 (p. 43-44). Em outras palavras, a mudança pode


t

resultar tanto de alterações dos elementos do próprio sistema (mudança in-


terna) como de influências contextuais (mudança externa). O resultado disso
i
op

é uma mudança de fase, ou seja, a mudança de um padrão de comporta-


d

mento, ou atrator, para outro, qualitativamente diferente e mais complexo


que o anterior.
Larsen-Freeman e Cameron (2008b) acrescentam que, após uma mu-
E

dança de fase, novos comportamentos podem emergir desse padrão inte-


rativo recém inaugurado. Esse fenômeno é conhecido como emergência, e é
ver

definido por elas como “o surgimento, em um sistema complexo, de um novo


estado em um nível de organização maior que o anterior. O comportamento

1 “Self-organization and emergence are alternative ways of talking about the source of phase shift in the behavior of
complex systems”.
2 “Internal self-organizing changes alter the structure of a system, while response to energy and matter coming from
outside, leads to adaptive change that maintains order or stability”.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 161

ou fenômeno emergente tem uma ‘completude’ reconhecível”3 (p. 59).


Holland (1998 apud SOUZA, 2011) corrobora essa visão afirmando que a
emergência de novos comportamentos é um processo perpétuo, uma vez que
os padrões interativos do sistema estão em constante fluxo mutacional. Ele
acrescenta que a observação dos sistemas nos permite identificar padrões

od V
r
recorrentes que, quando associados a eventos de interesse, são denominados

uto
propriedades emergentes.
Como exemplo, pensemos em um aprendente estudando um novo
idioma. A cada nova aula, o sistema de aprendizagem de língua deste aluno

R
recebe uma injeção de energia de seu contexto. Os conteúdos praticados são

oa
a energia contextual que é inserida no sistema e que pode levá-lo a uma mu-
dança de fase, saindo de um atrator para outro. Desse novo padrão interativo
podem emergir novos comportamentos, como a capacidade de se apresentar
aC
em inglês, de escrever um pequeno perfil para um site de relacionamento,
entre outros. Desta forma, a aprendizagem de línguas sob a ótica da com-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

plexidade deixa de ser um fenômeno cumulativo e passa a ser um fenômeno


emergente, como explica Kramsch (2012, p. 10):
visã
Um modelo complexo não sugere um estado inicial e final. Ao invés
disso, ele vê a aprendizagem como criadora de suas próprias con-
dições de desenvolvimento em interação aberta com o seu contexto,
a re

e sempre suscetível à mudança. Ao invés de um motor de desenvol-


itor

vimento situado fora do aprendente, de uma forma de input ou de


um dado ambiente social, um modelo complexo para a aquisição de
segunda língua sugere um sistema dinâmico, isto é, ao mesmo tempo
estruturante e estruturado pelo seu ambiente.4
par

No contexto desta pesquisa, investigamos como fatores contextuais,


dentre eles o aconselhamento linguageiro, podem atuar como um injetor
Ed

de energia no sistema de aprendizagem dos aconselhados, favorecendo a


são

emergência de comportamentos autônomos. Faz-se necessário, portanto, um


maior aprofundamento sobre estes dois pressupostos, que serão apresentados
nas seções seguintes.
ver

3 “the appearance in a complex system of a new state ate a level of organization higher than the previous one. The
emergent behavior or phenomenon has some recognizable ‘wholeness’”.
4 “a complex model does not posit an initial and an end state. Instead, it sees learning as creating its own conditions
of development in open interaction with its environment, and always susceptible to change. Rather than an engine of
development situated outside the learner, in the form of input or a given social environment”.
162

Aconselhamento linguageiro

Segundo Mynard e Carson (2012, p. 4), “o aconselhamento na apren-


dizagem de línguas envolve o processo e a prática de ajudar os alunos a di-
recionarem os seus caminhos para então se tornarem aprendentes de línguas

V
r
mais efetivos e mais autônomos”5. Os autores acrescentam que o ideal de

uto
aprendente autônomo, assim como o tipo de assistência provida, pode variar
de contexto para contexto.
O aconselhamento linguageiro já é praticado há alguns anos em centros

R
de autoacesso em diversas partes do mundo (MOZZON-McPHERSON,

a
2000, 2007; REINDERS, 2008), e muitos modelos que norteiam essa prática
já foram propostos. No contexto deste trabalho, a fundamentação de nossas

do
ações baseou-se em Mynard (2012), que propôs o modelo do diálogo, instru-
mentos e contexto, ilustrado na figura 1 a seguir:
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


Figura 1 – Modelo Diálogo, Instrumentos e Contexto para o
são
Aconselhamento em Aprendizagem de Línguas
i
rev
or
ara
di t op

Fonte: MYNARD (2012, p. 33).


E

A figura ilustra os participantes do aconselhamento linguageiro: o acon-


selhado, à esquerda, e o conselheiro, à direita. Em primeiro lugar, ressaltamos
ver

que o modelo leva em consideração os fatores contextuais (externos), que são


cruciais no desenvolvimento da aprendizagem. O aconselhado é convidado
a falar sobre sua família, amigos, trabalho, preferências e todos os contextos
que possam influir em sua trajetória. Ademais, o diálogo é outro elemento

5 “advising in language learning involvers the process and practice of helping students to direct their own paths so as to
become more effective and more autonomous language learners”.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 163

importante, por ser o meio pelo qual as interações são mediadas. O conteúdo
dos diálogos internos é compartilhado, representados pela atitude ativa do
aconselhado na imagem, falando e gesticulando, enquanto que o conselheiro
escuta atentamente. Isso reflete a importância de garantir ao aconselhado
maiores chances de se expressar e dizer o que pensa, para que o conselheiro

od V
r
possa entender suas reais necessidades e buscar em seu arcabouço as estra-

uto
tégias mais apropriadas. Finalmente, apresentamos as ferramentas previstas
no aconselhamento, que são divididas em três categorias: cognitivas, que
são itens que estimulam os processos cognitivos e metacognitivos, como

R
diários de aprendizagem, ficha de metas, ficha de autoavaliação, etc; teó-

oa
ricas, que são os conhecimentos teóricos que embasam as atitudes do con-
selheiro, como os estudos sobre motivação, autonomia e complexidade; e
práticas, que facilitam a organização do processo de aconselhamento, como
aC
gravações das sessões e cadernos de notas dos conselheiros.
Acreditamos que, dentre os modelos de aconselhamento linguageiro
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

existentes na literatura, o proposto por Mynard (2012) seja o mais com-


patível com os pressupostos da teoria da complexidade, uma vez que o
visã
contexto é levado em consideração, passando a fazer parte do sistema dos
aprendentes, influenciando e sendo influenciado pelo mesmo. Além disso,
as ferramentas teóricas dos conselheiros podem contemplar estudos sobre a
complexidade e seus reflexos no processo de aprendizagem. O conhecimento
a re
itor

sobre esses pressupostos garante aos conselheiros maior probabilidade de


estimular a mudança no sistema de aprendizagem de seus aconselhados e
de fomentar o processo de autonomização. Por meio de diálogo e constante
negociação, exemplos de ferramentas cognitivas, o conselheiro promove
par

reflexões que podem estimular o processo de auto-organização do sistema


após uma mudança de fase, da qual novos comportamentos podem emergir.
Por fim, as ferramentas práticas oferecem dados qualitativos e quantitativos
Ed

que auxiliam na descrição das trajetórias de aprendizagem e na identificação


de comportamentos autônomos emergentes. Sendo a autonomia o objetivo
são

central do aconselhamento linguageiro, a partir daqui, conduziremos uma


breve discussão teórica sobre esse pressuposto.
ver

Autonomia na aprendizagem de línguas

Os estudos sobre a autonomia surgiram a partir das pesquisas de


Holec (1981) desenvolvidas no CRAPEL (sigla em francês para Centro
de Pesquisas e Aplicações Pedagógicas em Línguas). O autor define esse
pressuposto como a capacidade de “assumir o comando de sua própria
164

aprendizagem”6 (p. 192). Em linhas gerais, o aprendente autônomo seria


capaz de, entre outras coisas, estabelecer objetivos de aprendizagem, definir
conteúdos a serem estudados, selecionar materiais, métodos e estratégias de
aprendizagem e avaliar os resultados.
A partir de Holec, as pesquisas sobre a autonomia se tornaram mais

V
r
frequentes, e “viraram moda” entre os estudos em Linguística Aplicada, to-

uto
mando as palavras de Little (1995). Muitos trabalhos sobre o tema foram de-
senvolvidos e retomaremos alguns deles neste capítulo. Littlewood (1996),
por exemplo, preocupa-se em estabelecer uma taxonomia, na qual autonomia

R
estaria relacionada à capacidade e a disposição do aprendente. Segundo ele,

a
a capacidade seria composta pelos conhecimentos das alternativas possíveis
e de sua habilidade em executá-las. A disposição, por sua vez, depende da

do
motivação e da confiança do aprendente em assumir responsabilidade sobre
as escolhas que devem ser feitas. Com base neste conceito, criamos a figura
aC
2 abaixo, na qual destacamos os elementos componentes da autonomia,

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
que ao interagirem dinamicamente, oportunizam a emergência de novos
comportamentos.

Figura 2 – Autonomia para Littlewood (1996)


i
rev
or
ara
di t op
E

Fonte: Elaborado pelos autores


ver

Benson (2001) também oferece uma definição de autonomia que


pode refletir o seu caráter complexo. Ele afirma que se trata de uma “capa-
cidade multidimensional que vai assumir diferentes formas para diferentes
indivíduos, e mesmo para o mesmo indivíduo em diferentes contextos ou

6 “to take charge of one’s own learning”.


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 165

períodos”7 (BENSON, 2001, p. 47). Essa definição captura a dinamicidade


e variabilidade deste pressuposto, destacando sua propensão à mudança
e também sua diversidade de manifestações, sugerindo que não há uma
fórmula única e exata que garanta o desenvolvimento da autonomia. O autor
acrescenta que a autonomia prevê a tomada de controle sobre a aprendi-

od V
r
zagem em três níveis: os processos cognitivos, o gerenciamento e os con-

uto
teúdos de aprendizagem (BENSON, 2001). No aconselhamento linguageiro,
uma das maneiras de possibilitar que o aconselhado assuma o controle sobre
esses aspectos é por meio da negociação, ou seja, acordos referentes ao esta-

R
belecimento de metas, seleção dos conteúdos, definição de critérios avalia-

oa
tivos, dentre outros. O valor da negociação no processo de autonomização é
destacado por Voller (1997) ao afirmar que sem a negociação, a autonomia
pode se tornar um fracasso.
aC
Com base no que apresentamos, podemos entrever o caráter imprevi-
sível e caótico do processo de autonomização e, de posse disso, entendemos
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

a autonomia como um sistema adaptativo complexo.


Ainda sobre a autonomização dos aprendentes, acreditamos que os es-
visã
tudos de Scharle e Szabó (2000) podem oferecer importantes contribuições
para o entendimento de suas trajetórias. As autoras estabelecem algumas
etapas para fomentar a autonomia entre os aprendentes: “conscientização, mu-
dança de atitude e transferência de responsabilidade” (SCHARLE; SZABÓ,
a re
itor

2000, p. 9). Magno e Silva et al. (2013, p. 58, grifos das autoras) apresentam
estas etapas, relacionando-as às práticas do aconselhamento linguageiro:

Em nosso trabalho de aconselhamento linguageiro, na primeira fase,


par

de conscientização, encoraja-se o aconselhado a compreender melhor


o processo de aprendizagem. Na segunda fase, de mudança de atitude,
levamos o aconselhado a considerar o processo de aprendizagem sob
uma nova perspectiva. Esse é um processo lento que requer muita
Ed

prática e perseverança por parte do CL e do aconselhado, pois implica


são

mudança de hábitos frequentemente fossilizados. Na terceira fase, de


transferência de responsabilidades, o aconselhado passa a ser mais
ativo, tomando a iniciativa e assumindo mais responsabilidades em
seu processo de aprendizagem.
ver

Essas etapas, porém, não acontecem sempre de forma linear no desen-


volvimento da autonomia dos aprendentes. Temos ciência que o processo
de autonomização possui caráter complexo e que o seu desenvolvimento se

7 “Multidimensional capacity that will take different forms for different individuals, and even for the same individual in
different contexts or at different times”.
166

dará de diferentes formas para cada pessoa. Em nossas experiências como


conselheiros, notamos que os efeitos desses estímulos são diferentes entre
os aconselhados. Para alguns, a mudança de atitude dá-se mais rapidamente,
enquanto que, para outros, esse processo ocorre de forma mais lenta, alguns
mostrando-se resistentes à autonomia. Além disso, muitas vezes percebemos

V
r
que a transferência de papéis pode variar em diferentes planos de ação, isto é,

uto
o aprendente pode atuar de maneira independente nas escolhas concernentes
ao trabalho com a produção escrita, mas mostrar-se fortemente dependente
do conselheiro no desenvolvimento da produção oral. Essas observações re-

R
fletem o caráter dinâmico, caótico, não linear e imprevisível do processo de

a
autonomização mediado pelo aconselhamento linguageiro.
Com base no apresentado nesta discussão teórica, procuramos evi-

do
denciar o caráter complexo do processo de autonomização. No âmbito dessa
perspectiva, os comportamentos autônomos emergem do processo de auto-
aC
-organização do sistema de aprendizagem dos aprendentes. Após uma mu-

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são
dança de fase, eles se estabilizam em um novo padrão de comportamento,
que pode dar origem a atitudes autônomas. Sendo assim, o conselheiro
linguageiro surge como um agente do contexto que atua como injetor de
energia, potencialmente estimulando mudanças de fase no sistema dos seus
i
aconselhados. De posse desses conceitos, na seção seguinte discutiremos os
rev

procedimentos metodológicos que utilizamos em nossa pesquisa.


or

Metodologia
ara

Este trabalho é um estudo de caso de cunho qualitativo. Segundo


Martins (2008), pesquisas qualitativas têm por objetivo principal a des-
t

crição, compreensão e interpretação de fatos e fenômenos. De acordo com


i

Teixeira (2010), esse tipo de pesquisa é caracterizada pela busca de uma pro-
op

funda compreensão do contexto de uma situação e pela ênfase no processo


d

dos acontecimentos, ou seja, na sequência dos fatos ao longo do tempo. Os


estudos de caso, por sua vez, são definidos por Yin (2010) como a busca
E

pelo entendimento de fenômenos sociais complexos. Ela acrescenta que este


tipo de estudo “permite que os investigadores retenham as características
holísticas e significativas dos eventos da vida real” (p. 24).
ver

Nesta pesquisa, analisamos o processo de autonomização de uma


aluna do curso de Letras – Habilitação em Língua Inglesa, participante do
projeto de aconselhamento linguageiro que é desenvolvido na Faculdade de
Letras Estrangeiras Modernas, na Universidade Federal do Pará, campus de
Belém. Este projeto visa fomentar a autonomia dos graduandos de Letras na
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 167

aprendizagem de línguas estrangeiras, por meio do acompanhamento perso-


nalizado de conselheiros linguageiros. A coleta de dados para esta pesquisa
teve a duração de 12 meses, de abril de 2014 a março de 2015.
A aconselhada ingressou no curso de Letras aos 19 anos e como seu
único contato prévio com o inglês havia sido no ensino médio, na escola

od V
r
pública, passou a sentir dificuldades na aprendizagem da língua alvo na uni-

uto
versidade, sobretudo porque muitos de seus colegas de classe já tinham certa
fluência no idioma. Diante dessas dificuldades, a aluna procurou voluntaria-
mente o projeto com o intuito de ser aconselhada quando estava no segundo

R
semestre do curso.

oa
Ambos os autores desse capítulo atuam como conselheiros linguageiros
no projeto mencionado. Porém, somente um deles foi conselheiro nessa in-
vestigação. A conselheira em questão é também professora da graduação
aC
de inglês no curso de Letras na Universidade Federal do Pará. Por esse
motivo, teve contato com a aconselhada tanto como professora na disciplina
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Aprender a Aprender Línguas Estrangeiras, no primeiro semestre do curso,


quanto como conselheira nos dois semestres subsequentes.
visã
Neste trabalho, utilizamos dois instrumentos de coleta e análise dos dados:
os relatórios escritos pela conselheira linguageira, doravante CL, e as atas das
reuniões do projeto de aconselhamento. Nossa pesquisa dedicou-se à análise
do processo de autonomização desta aconselhada ao longo do período citado,
a re
itor

caracterizando-se, portanto, como uma pesquisa longitudinal. Inicialmente,


identificamos no corpus desta pesquisa todos os comportamentos autônomos
que emergiram na trajetória da aconselhada, e os dispusemos em uma linha do
tempo. Em seguida, agrupamo-los em três categorias, de acordo com os sub-
par

sistemas afetados: aprendente de línguas, acadêmica de Letras e profissional


em formação. Tentamos também identificar possíveis agentes que podem ter
contribuído para a mudança de fase que levou à auto-organização do sistema
Ed

em novos padrões. Por fim, descrevemos estes novos padrões de comporta-


mento emergentes observados como evidências de autonomização na aconse-
são

lhada, conforme discutiremos a seguir.

Discussão
ver

Nesta seção, iremos descrever a trajetória da aconselhada no processo


de aconselhamento. Como mencionado anteriormente, a aconselhada apre-
sentou uma série de comportamentos autônomos resultantes de perturbações
advindas de agentes do seu próprio sistema, do contexto ou de ambos. A
figura 3, a seguir, é uma tentativa de ilustrar como possivelmente se deram
168

as mudanças no sistema, tendo por base os estudos de Larsen-Freeman e


Cameron (2008b), e considerando o recorte das variáveis (subsistemas),
entre as muitas existentes, para fins de análise neste estudo:

Figura 3 – Mudança no sistema

V
r
uto
R
a
do
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são i
rev
or

Fonte: Elaborado pelos autores

Na figura 3, tentamos evidenciar como se dão as mudanças de fase


ara

nos sistemas complexos. Primeiramente, é preciso destacar o caráter fractal


desses sistemas, ou seja, a semelhança de suas partes componentes em suas
t

diferentes escalas (PAIVA, 2005a). Entender a aprendizagem de línguas


i

como um sistema adaptativo complexo significa dizer que este é composto


op
d

por múltiplos subsistemas que interagem de maneira dinâmica e não linear.


Sendo assim, na figura, o sistema de aprendizagem da aconselhada é re-
presentado pelo quadrado, que é composto por múltiplos subsistemas, os
E

hexágonos. O processo de mudança de fase foi descrito em três momentos.


O primeiro mostra as condições iniciais do sistema, ou seja, uma descrição
ver

de seus padrões interacionais em um dado momento na escala temporal


(LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b). Nota-se que o mesmo en-
contra-se em um estado de estabilidade dinâmica, ou seja, em uma bacia
atratora. O momento II evidencia o surgimento de agentes perturbadores que
desestabilizam o sistema e o levam a uma mudança de fase, que se dá por
meio da auto-organização em novo padrão. No momento III, o sistema já
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 169

apresenta este novo padrão, do qual novos comportamentos podem emergir.


É importante ressaltar, que nem todos os subsistemas sofrem alteração após
uma mudança de fase. Alguns deles mantêm seus padrões interacionais
mesmo após essas perturbações. Em nossa figura, procuramos representar
este fato pelos hexágonos brancos menores.

od V
r
Em nossa pesquisa, notamos que três dos subsistemas da aconselhada

uto
sofreram mudanças que deram origem a novos comportamentos, foram eles:
os subsistemas aprendente de línguas, acadêmica de Letras e profissional
em formação. Consideramos alguns destes comportamentos evidências de

R
autonomia, uma vez que eles refletem o controle da aprendente sobre o seu

oa
processo de aprendizagem. Além disso, pensamos que o próprio aconselha-
mento linguageiro pode ter funcionado como um dos agentes perturbadores
que levaram o sistema a mudanças de fase. Nas seções que seguem, descre-
aC
veremos detalhadamente como se deram esses processos.
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Subsistema aprendente de línguas


visã
O subsistema aprendente de línguas, por influência de diferentes agentes
perturbadores, sofreu mudanças que deram origem a comportamentos autô-
nomos em diversos aspectos, tais como o controle sobre o planejamento dos
estudos e a tomada de iniciativas na prática das quatro habilidades da língua,
a re
itor

segundo descreveremos nas seções a seguir.

Controle sobre o planejamento dos estudos


par

No primeiro semestre de Letras, a aconselhada cursou a disciplina


Aprender a Aprender Línguas Estrangeiras, que discute os objetivos, as mo-
tivações, as crenças, os estilos e as estratégias na aprendizagem de LE, vi-
Ed

sando instrumentalizar os alunos com recursos para que possam exercer sua
autonomia ao aprender desde o início do curso. Observamos que a disciplina
são

em questão pode ter funcionado como um agente perturbador, levando-a a


assumir o controle pela própria aprendizagem (BENSON, 2001). Acreditamos
que a inserção de energia resultante dos estudos desenvolvidos na disciplina
ver

pode ter levado o sistema a uma mudança de fase. Retomando as palavras de


Larsen-Freeman e Cameron (2008b), após uma mudança de fase, o sistema
passa por um processo de auto-organização do qual novos comportamentos
podem emergir. O primeiro exemplo foi a tomada de iniciativa, por parte da
aprendente, de pedir para participar do projeto de aconselhamento linguageiro
como aconselhada. Acreditamos que a disciplina ajudou-a nas duas primeiras
fases do processo de autonomização descritos por Scharle e Szabó (2000): a
170

conscientização e a mudança de atitude. Na trajetória descrita acima, fica claro


que ela se conscientizou de seu papel na aprendizagem e também tomou a
atitude de buscar o acompanhamento de um conselheiro linguageiro.
Uma vez no projeto de aconselhamento, a primeira dificuldade apre-
sentada pela aconselhada foi o planejamento de seus estudos, já que ela tinha

V
r
uma rotina desorganizada e não dispunha de tempo suficiente para dedicar

uto
aos estudos do inglês. A CL pediu para que a aconselhada descrevesse sua
rotina em uma agenda, um dos instrumentos cognitivos do aconselhamento
(MYNARD, 2012). Essa proposta tinha como objetivo verificar quais os

R
momentos mais propícios para estudar a língua. Acreditamos que, dessa

a
perturbação estabelecida pelo aconselhamento, uma nova mudança de fase
ocorreu e novos comportamentos emergiram. Um dos exemplos foi o fato da

do
aluna ter se desvencilhado de algumas atividades em prol dos estudos, pas-
sando também a dedicar um pouco mais de seu tempo livre para este fim. Tal
aC
atitude ilustra o domínio sobre o gerenciamento da aprendizagem por parte

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
da aconselhada, um dos níveis de controle exercidos por alunos autônomos
(BENSON, 2001).
Como se aproximavam as férias, a CL lançou mão de outra das ferra-
mentas cognitivas utilizadas no aconselhamento (MYNARD, 2012), e pediu
i
que a aconselhada fizesse uma lista com as metas que ela gostaria de al-
rev

cançar, referentes ao estudo de inglês. Quando retornou no mês de agosto,


a aconselhada mostrou à CL os resultados de seus estudos: ela havia feito
or

uma revisão do conteúdo de língua dos níveis anteriores, a leitura de livros e


treino da compreensão oral por meio de vídeos em inglês na internet. A rotina
ara

de estudos da aconselhada durante as férias demonstra a capacidade e dispo-


sição da aconselhada para definir as melhores alternativas possíveis para sua
t

própria aprendizagem bem como para executá-las (LITTLEWOOD, 1996).


i

Outra decisão importante que tomou por iniciativa própria foi o trancamento
op

dos cursos livres de inglês, por perceber que os conteúdos eram muito seme-
d

lhantes aos que estudava no curso de Letras, devido o uso do mesmo livro
didático. A aconselhada avaliou que poderia utilizar o horário das aulas do
E

curso livre para estudar a língua por conta própria.


Tendo em vista o apresentado nesta subseção, na tabela 1, a seguir,
sistematizamos as evidências de comportamentos autônomos do subsistema
ver

estudante de língua, no que se refere aos diferentes níveis de controle que ela
assumiu sobre sua aprendizagem (BENSON, 2001).
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 171

Tabela 1 – Comportamentos autônomos sobre o controle da aprendizagem

Auto-organização
Aprendente - Controle sobre a aprendizagem
do subsistema

od V
r
• Iniciativa de participar do AL

uto
Comportamentos • Planejamento dos estudos com
emergentes o suporte da agenda.
(Evidências de autonomia) • Estabelecimento de metas para as férias.
• Trancamento dos cursos livres

R
oa
Fonte: Elaborado pelos autores

Durante o aconselhamento, a aconselhada também se mostrou inte-


ressada em superar suas dificuldades nas diferentes habilidades de compre-
aC
ensão e produção em inglês. Discutiremos abaixo como se deu o processo
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

de autonomização da aluna no trabalho com as quatro habilidades durante as


sessões de aconselhamento linguageiro.
visã
Compreensão e produção oral

No início do aconselhamento, mais precisamente no momento da


a re

análise das necessidades de aprendizagem da aconselhada, ela relatou não


itor

sentir dificuldade com a compreensão oral, pois sua participação prévia nas
oficinas dos ETAs8 havia ajudado a aconselhada a desenvolver essa habi-
lidade. Por esse motivo, a compreensão oral não foi selecionada como foco
par

de trabalho no aconselhamento. Não obstante, a aconselhada continuou a


prática dessa habilidade em sua rotina de estudos, mantendo sua participação
nas oficinas supracitadas, fazendo a transcrição fonética de palavras novas
e assistindo vídeos em inglês na internet. Tais atitudes também podem ser
Ed

consideradas evidências de comportamentos autônomos, uma vez que ela


são

exerceu o controle sobre os conteúdos e práticas para o desenvolvimento de


sua compreensão oral (BENSON, 2001).
A aconselhada preferiu priorizar a produção oral nas sessões de aconselha-
mento, visto que apresentava bastante dificuldade em participar das discussões
ver

nas aulas de inglês, o que ainda era agravado pelo fato de muitos de seus colegas
já serem fluentes na língua. Para sanar essa dificuldade, a CL sugeriu que a acon-
selhada estudasse os conteúdos das novas unidades do livro didático antes das

8 English Teaching Assistants: Falantes nativos de Inglês participantes de um Programa da Fulbright/CAPES que
trabalhavam no período da pesquisa na faculdade, como assistentes de ensino de Inglês, promovendo oficinas e outras
atividade de ensino e extensão para os graduandos de Letras com habilitação em Inglês.
172

aulas, para que já tivesse um conhecimento prévio do assunto. Essa estratégia


mostrou-se bastante eficaz, uma vez que ela alegou ter sido mais fácil acom-
panhar e participar nas aulas por já conhecer o assunto previamente.
Mais um comportamento autônomo da aconselhada foi o esforço em
usar a língua alvo nas sessões de aconselhamento. Além disso, fora de sala

V
r
de aula, ela relatou se esforçar em se comunicar em inglês com os próprios

uto
colegas do curso.
Outro fato que pode ter contribuído para os avanços na produção oral
da aconselhada foi sua participação assídua nas oficinas dos ETAs, como

R
mencionado acima, dentre as quais destacamos o clube de conversação9.

a
Além disso, sua participação em um dos projetos de extensão conduzidos
pelos ETAs, no qual ministravam aulas de inglês junto com alunos volun-

do
tários da graduação para crianças e adolescentes da comunidade no entorno
da universidade, também parece ter garantido grandes benefícios. Essa foi a
aC
primeira experiência da aconselhada ministrando aulas. Tal iniciativa parece

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
ter desencadeado a auto-organização do subsistema aluna como aprendente
de línguas, promovendo o desenvolvimento da sua produção oral, uma vez
que precisava praticar o que ia dizer em cada aula; bem como a auto-organi-
zação do subsistema profissional de Letras, como discutiremos mais adiante.
i
Na tabela 2, a seguir, os comportamentos autônomos são novamente
rev

destacados, sendo que, desta vez, as influências do aconselhamento contri-


buíram apenas para o trabalho com a produção oral, sendo as atitudes refe-
or

rentes à compreensão uma forte evidência de autonomia (HOLEC, 1981;


BENSON, 2001).
ara

Tabela 2 – Comportamentos autônomos sobre a compreensão e produção oral


t

Auto-organização
i

Estudante - Produção e compreensão oral


op

do subsistema
d

Prática da compreensão oral


1. Participação nas oficinas dos ETAs;
Comportamentos emergentes
2. Transcrições fonéticas das
(Evidências de autonomia)
E

palavras desconhecidas;
3. Prática por meio de vídeos em inglês. 
ver

9 Laboratório organizado pelos ETAs que visava desenvolver nos alunos as suas competências em produção e
compreensão oral. As atividades envolviam conversações livres sobre temas de interesse dos alunos.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 173
continuação
Auto-organização
Estudante - Produção e compreensão oral
do subsistema
Prática da produção oral
1. Estudo prévio do livro didático
para acompanhar com mais
facilidade as aulas de língua;

od V
r
Comportamentos emergentes
2. Uso da língua nas sessões de AL e
(Evidências de autonomia)

uto
fora de sala de aula com os colegas;
3. Participação nas oficinas dos ETAs;
4. Participação em um projeto de
extensão da universidade.

R
oa
Fonte: Elaborado pelos autores

No processo de aconselhamento também foi possível observar a emer-


gência de comportamento autônomos no trabalho com as habilidades de
aC
compreensão e produção escrita em inglês, conforme discutiremos a seguir.
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Compreensão e produção escrita


visã
Como mencionado a priori, uma das metas da aconselhada durante as
férias foi a leitura de um livro, pois sentia que precisava ampliar seu voca-
bulário de inglês para melhorar sua produção na língua alvo. No retorno das
férias, ela relatou ter lido a metade de um livro de seu interesse, Adventures of
a re
itor

Tom Sawyer. Além da leitura por prazer, observamos que a aluna realmente se
utilizou deste novo agente como fonte de oportunidades para aprender inglês,
pois ela mostrou para a CL as anotações feitas ao longo da leitura, que incluíam
uma lista de vocabulário novo cujos termos vinham agrupados em diferentes
par

categorias e também uma lista do passado dos verbos irregulares contidos no


texto e que ela desconhecia. Além disso, ao folhear o livro, a CL encontrou
várias anotações referentes à transcrição fonética das palavras que a aluna não
sabia pronunciar. Tais atitudes podem ser consideradas evidências de com-
Ed

portamentos autônomos emergentes no que diz respeito à leitura em inglês.


são

Acreditamos que o livro tenha sido um novo agente do contexto que surgiu
e com o qual ela passou a interagir dinamicamente, adaptando-se a nova lin-
guagem em busca de acomodação mútua que garantisse a sua sobrevivência,
ou seja, a aquisição do vocabulário novo (MARTINS; BRAGA, 2007).
ver

No que se refere à produção escrita em inglês, ao ouvir as dificuldades


da aconselhada, foi sugerido um trabalho por meio de gêneros textuais. A CL
trouxe uma lista com vários gêneros para que ela escolhesse um para trabalhar a
cada encontro de aconselhamento, exercitando assim sua habilidade de fazer as
escolhas referentes aos conteúdos da própria aprendizagem (BENSON, 2001).
Esse diálogo e negociação são constantes no aconselhamento linguageiro em
174

vista da autonomização dos aconselhados (VOLLER, 1997). A CL frequente-


mente buscava motivar a aluna mostrando que a prática de escrita como processo
era essencial para que ela obtivesse sucesso na escrita do Trabalho de Conclusão
de Curso (TCC), uma das metas da própria aconselhada. Mostrar a possibilidade
de sucesso em seu “eu futuro” (DÖRNYEI, 2005)10 ajudou, de alguma forma,

V
r
a perturbar o seu sistema, pois ela passou a trazer um texto baseado em dife-
rentes gêneros de sua escolha em cada sessão de aconselhamento, sem que a

uto
CL precisasse cobrar isso dela. Dentre suas produções, ela escreveu uma carta
a uma amiga, uma oração e uma narrativa de final de semestre. Nos encontros,
ao fazer a revisão colaborativa dos textos, a aconselhada geralmente marcava os

R
a
pontos que precisava melhorar para que não voltasse a cometer os mesmos erros
em produções futuras. A aconselhada refletia sobre o que precisava melhorar,

do
pois dificilmente os mesmos erros voltaram a ocorrer em outras redações. Isso
demonstrou que a aconselhada tinha consciência da importância dessas tarefas
aC
para a sua aprendizagem. Em geral, ao final da revisão dos textos, ela gravava a

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


sua leitura de seus próprios textos em voz alta para que pudesse praticar a pro-
são
núncia e perceber o progresso feito em suas próprias produções.
Na tabela 3, a seguir, sistematizamos mais uma vez os comportamentos
autônomos emergentes que resultaram das mudanças no sistema. Nele, fica
evidente o controle que a aconselhada passa a assumir sobre o gerenciamento
i
rev

de suas atividades, especialmente no trabalho que conduziu nas férias, sobre


a seleção dos conteúdos e no trabalho com a produção escrita com base nos
or

gêneros (BENSON, 2001). Destacamos ainda o papel da negociação nesse


processo, que pode ter influído significativamente para a mudança de atitude
por parte da aconselhada.
ara

Tabela 3 – Comportamentos autônomos sobre a compreensão e produção escrita


i t

Auto-organização
op

Estudante - Produção e compreensão escrita


do subsistema
d

Leitura de livros visando à aprendizagem da língua.


Comportamentos • Listas de vocabulário novo;
emergentes • Transcrições fonéticas das
E

(Evidências de autonomia) palavras desconhecidas;


• Listas com o passado dos verbos.
Escrita baseada na teoria dos gêneros.
ver

Comportamentos • Escolha do gênero;


emergentes • Correções colaborativas;
(Evidências de autonomia) • Reflexão sobre os erros;
Escrita como processo.
Fonte: Elaborado pelos autores

10 Os estudos de Dörnyei (2005) discutem o valor do estabelecimento de um “eu-futuro” para a proteção e manutenção da
motivação dos aprendentes.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 175

Nesta seção, descrevemos algumas das influências que oportunizaram


mudanças no subsistema aprendente de línguas. Todavia, como mencio-
namos anteriormente, outros subsistemas também se auto-organizaram
durante a trajetória da aconselhada. Na seção seguinte, explicaremos quais
foram as contribuições do aconselhamento para possíveis emergências de

od V
r
novos comportamentos na acadêmica do curso de Letras.

uto
Subsistema acadêmica de Letras

R
A participação no projeto de aconselhamento linguageiro, na disci-

oa
plina Aprender a Aprender LE e nas demais disciplinas cursadas no período
também podem ter atuado como agentes perturbadores que influenciaram o
subsistema acadêmico da aluna. Ela passou a apresentar novas evidências de
aC
autonomia ao buscar investir em seu currículo. Isso pode ter sido resultado
de uma das tarefas da disciplina Aprender a Aprender LE que consistia na
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

produção de um plano de carreira para os cinco anos subsequentes, no qual


os alunos deveriam descrever as metas a serem alcançadas. Essa atividade
visã
tinha em vista guiar os alunos em suas trajetórias e fomentar o processo de
autonomização (SCHARLE; SZABÓ, 2000). A primeira iniciativa foi a sub-
missão e aprovação de um trabalho a ser apresentado no XXXV Encontro
Nacional dos Estudantes de Letras (ENEL) em Belo Horizonte. Apesar da
a re
itor

apresentação ter sido em português, a aconselhada sentiu-se estimulada a


buscar novos desafios. Ela procurou participar como ouvinte da conferência
local do Braz Tesol e relatou que ficou atenta às comunicações para que pu-
desse apresentar em inglês em um próximo evento. Para nós, esse foi mais
par

um exemplo de comportamento autônomo da aluna ao pensar em mais uma


possibilidade de sucesso em seu “eu futuro” (DÖRNYEI, 2005). A aconse-
lhada mostrou-se atenta para as diversas oportunidades de participação em
Ed

eventos da área. Sua próxima conquista foi a aprovação para a apresentação


de um pôster em um congresso internacional que ocorreu na nossa univer-
são

sidade, o IX Congresso da ABRALIN11.


Ademais, por ter se destacado na participação do Students’ Council12,
outra iniciativa dos ETAs, a aconselhada foi escolhida para o cargo de
ver

vice-presidente, passando a coordenar eventos realizados pelos alunos na


faculdade. Esse foi mais um exemplo de emergência de comportamento au-
tônomo da aconselhada. A esta altura do processo, é possível notar o maior
nível de autonomia da aconselhada, que já passa a tomar decisões sem o

11 Associação Brasileira de Linguística.


12 O Students’ Council foi mais uma das atividades propostas pelos ETAs na universidade que visava organizar um pequeno
grupo de alunos do curso de Letras para promover eventos e atividades de cunho acadêmico na faculdade.
176

intermédio da CL. Acreditamos que isso tenha sido resultado do aumento de


sua confiança, após as boas experiências que vinha tendo no aconselhamento
(LITTLEWOOD, 1996). Sendo assim, o aconselhamento linguageiro passa
a ter um papel cada vez menos ativo, uma vez que a aconselhada já toma ati-
tudes por conta própria, transferindo a responsabilidade pela aprendizagem

V
r
para si mesma (SCHARLE; SZABÓ, 2000).

uto
Os fatores que levam o sistema a continuar mudando têm suas raízes
em suas experiências prévias, mais especificamente, nos compromissos que
assumiu na disciplina que cursou, o que nos leva a crer que o trabalho desen-

R
volvido em Aprender a Aprender LE, e possivelmente em outras disciplinas

a
do curso, pode ter levado o seu sistema a mudar internamente, garantindo a
auto-organização do sistema em um novo padrão, mais complexo que o an-

do
terior (LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b), como tentamos mostrar
na tabela a seguir:
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


Tabela 4 – Comportamentos autônomos emergentes
são
no subsistema acadêmica de Letras

Auto-organização
Acadêmica – Participação em congressos
do subsistema
i
rev

• Criação e investimento no Currículo Lattes.


• Apresentação de trabalho no ENEL.
or

Comportamentos
• Participação como ouvinte no BRAZ TESOL.
emergentes
• Aprovação para apresentação
(Evidências de autonomia)
de um pôster no ABRALIN.
ara

• Vice presidente do Students’ Council.


t

Fonte: Elaborado pelos autores


i
op

Por fim, descrevemos as evidências de autonomia na aconselhada no


d

subsistema profissional de línguas em formação.

Subsistema profissional em formação


E

Como mencionamos anteriormente, a primeira experiência, como pro-


ver

fessora voluntária de inglês no projeto para crianças e adolescentes carentes


no entorno da universidade, pode ter estimulado a auto-organização do
sistema aluna como profissional de Letras. As atividades de ensino parecem
ter reforçado o interesse da aluna em se tornar professora de inglês e a im-
pulsionado a assumir um novo desafio.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 177

A aconselhada reside em um bairro periférico de Belém, onde funciona


um projeto social para a comunidade. Por ser aluna de Letras, ela foi con-
vidada a dar aulas de inglês para crianças nesse projeto e tinha interesse
que se tornasse um projeto de extensão registrado na faculdade, tendo a CL
apoiado essa iniciativa. Assim, a CL enviou à aconselhada alguns modelos e

od V
r
ela própria escreveu o projeto que foi aprovado como atividade de extensão,

uto
sempre com o suporte da CL.
A CL também sugeriu a aconselhada que escrevesse um diário sobre sua
experiência de ensino na comunidade após cada aula ministrada, visando um

R
artigo a ser escrito no futuro. O desafio de escrever um artigo a entusiasmou

oa
bastante, pois ela tinha grande interesse em enriquecer seu currículo com
uma publicação desse tipo. A aconselhada conduziu o planejamento e as ati-
vidades de ensino na comunidade de forma bastante autônoma, solicitando a
aC
ajuda da CL poucas vezes nas sessões de aconselhamento. A emergência de
comportamentos autônomos na aconselhada como profissional de Letras foi
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

observada na forma como ela planejou, ministrou e registrou as atividades


de ensino de inglês na comunidade, como se pode ver na tabela 5 abaixo.
visã
Tabela 5 – Comportamentos autônomos emergentes
no subsistema profissional em formação
a re

Auto-organização
itor

Profissional – Práticas de ensino


do subsistema
Participação no projeto de Extensão no PROPAZ69.
Comportamentos Criação do projeto de extensão para ministrar
emergentes aulas de inglês em sua comunidade.
par

(Evidências de autonomia) Planejamento, condução e registro das


atividades de ensino no projeto de extensão.

Neste ponto, retomamos as palavras de Holland (1998 apud SOUZA,


Ed

2011) nas quais o autor afirma que os sistemas complexos estão em um fluxo
são

mutacional constante, e que a análise dessa dinâmica nos permite identificar


comportamentos emergentes. Desde o momento em que começou a parti-
cipar do aconselhamento linguageiro, o sistema de aprendizagem passou por
uma série de mudanças de fase, das quais novos comportamentos emergiram,
ver

muitos dos quais, consideramos evidências de autonomia. Acreditamos que


as mediações propostas pela CL serviram como uma constante inserção de
energia no sistema, que, ocasionalmente, levaram a mudanças de fase. Ao

13 O PROPAZ é um programa que nasceu no governo do Pará no intuito de dar assistência à crianças, adolescentes e
jovens em situação de vulnerabilidade social. A Falem desenvolve um projeto de extensão no qual os graduandos em
Letras ensinam inglês para os alunos inscritos nesse programa.
178

notar o controle que ela exercia sobre sua aprendizagem em seus diversos
níveis, especialmente após perceber a grande quantidade de atitudes autô-
nomas, a aconselhada foi liberada do projeto.
Na seção seguinte, tecemos algumas conclusões a que chegamos sobre
a trajetória aqui descrita.

V
r
uto
Conclusão

Na trajetória delineada acima, descrevemos o processo de autono-

R
mização da aconselhada destacando os comportamentos emergentes nos

a
diferentes subsistemas: aprendente de línguas, acadêmica de Letras e pro-
fissional em formação. Ao analisar as condições iniciais do sistema aprendi-

do
zagem, notamos a grande disposição da aconselhada, mas pouca capacidade
aC
de gerenciar o processo de aprendizagem (LITTLEWOOD, 1996). O acon-
selhamento linguageiro e as práticas metacognitivas propostas podem ter

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
funcionado como a injeção de energia que levou o sistema a mudanças, da
qual emergiram comportamentos propícios para esse gerenciamento.
Os dados apresentados evidenciam que o aconselhamento linguageiro
teve papel fundamental no processo de autonomização da aconselhada em suas
i
três fases: a conscientização, mudança de atitude e transferência de respon-
rev

sabilidades (SCHARLE; SZABÓ, 2000). Acreditamos ainda que o constante


diálogo e negociação nas sessões possibilitaram que a aconselhada exercesse
or

a habilidade de fazer suas próprias escolhas, levando-a paulatinamente a as-


sumir a responsabilidade por sua própria aprendizagem (BENSON, 2001).
ara

Não podemos definir categoricamente todos os agentes perturbadores


que influenciaram nas mudanças de fase pelas quais passou a aconselhada,
t

das quais novos comportamentos emergiram. No entanto, apontamos ao


i

longo do texto uma série de agentes que injetaram energia no sistema e in-
op

fluenciaram positivamente sua trajetória, dentre eles: a disciplina Aprender


d

a aprender LE e outras disciplinas do curso de Letras, o aconselhamento


linguageiro, as oficinas dos ETAs e os projetos de extensão.
E

Outro favor que estimulou a aconselhada a assumir novos desafios foi


a constante reflexão acerca do seu “eu futuro” (DÖRNYEI, 2005). Além
das experiências relatadas no texto, observamos que o desejo de se tornar
ver

uma professora de línguas de sucesso a impulsionou a desenvolver suas ha-


bilidades de língua e de ensino de forma exponencial. Quando concluiu o
quarto semestre do curso, foi aprovada no processo seletivo para dar aulas de
inglês nos Cursos Livres da faculdade, onde trabalha atualmente. Todos os
exemplos apresentados neste trabalho retificam o valor do aconselhamento
linguageiro como agente perturbador em sistemas de aprendizagem.
CAPÍTULO 8

ESTADOS ATRATORES EM
TRAJETÓRIAS DE ACONSELHAMENTO

od V
r
LINGUAGEIRO NA APRENDIZAGEM

uto
DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS

R
oa
Maria Clara Vianna Sá e Matos (UFPA)
Sádie Saady Morhy (UFPA)

1 Introdução
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Desde o ano de 2011, a Faculdade de Letras Estrangeiras Modernas


(FALEM) da Universidade Federal do Pará (UFPA) tem desenvolvido pes-
visã
quisas1 voltadas à tríade autonomia, motivação e aconselhamento lingua-
geiro com o principal objetivo de ajudar o aluno de línguas com dificuldades
na aprendizagem do idioma de sua licenciatura. Mais recentemente, este
estudo vem ampliando suas bases teóricas ao buscar apoio na ciência da
complexidade, em especial, na teoria dos sistemas adaptativos complexos
a re
itor

(LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b).


Nosso papel como participantes dessas pesquisas envolve duas ações.
Em primeiro lugar, como pesquisadoras, nos aprofundamos nos estudos te-
óricos que envolvem essa tríade e a complexidade. Em segundo lugar, como
par

conselheiras linguageiras atuantes na FALEM, exercemos nosso papel de


apoio aos alunos. Com isso, coletamos dados nas sessões de aconselhamento
que nos permitem relacionar nossa prática às teorias observadas.
Ed

Esse caminho vem se consolidando na medida em que são explo-


são

rados os três fenômenos de maneira entrelaçada nas pesquisas em que par-


ticipamos. Esta escolha, desenvolvida a partir do pensamento de Ushioda
(1996) que já via ligação entre autonomia e motivação, contribui para que
esses fenômenos sejam assumidos enquanto processos complexos interde-
ver

pendentes na aprendizagem de línguas. Dessa maneira, quando lidamos com


autonomia, estamos lidando com motivação no aconselhamento linguageiro

1 No biênio 2011-2013, Aconselhamento linguageiro visando à motivação e à autonomia na aprendizagem de línguas


Estrangeiras. No biênio 2013-2015, Aprendizagem de língua estrangeira como um sistema adaptativo complexo:
autonomia, motivação e aconselhamento linguageiro. No biênio 2015-2017, Processos de aconselhamento na
aprendizagem de línguas, autonomia e motivação na perspectiva da complexidade.
180

e pressupomos que um aconselhado que não está motivado, provavelmente


não estará suficientemente envolvido com o estudo que faz e, nessa con-
dição, talvez encontre mais dificuldades em alcançar suas metas.
O aconselhamento que oferecemos na UFPA é individual e face-a-face
e acontece em locais variados da instituição, como em sala de aula, centro

V
r
de auto acesso ou área externa do instituto em que a FALEM se encontra.

uto
Uma sessão inicial dura de 20 a 30 minutos. Quando necessário, conselheiro
e aconselhado podem ter uma sessão via telefone ou por redes sociais. Não
há um prazo estabelecido para que um aluno mantenha seu aconselhamento.

R
Sua necessidade geralmente determina o tempo em que será aconselhado.

a
Conforme o grupo de pesquisa foi avançando no estudo sobre como
abordar a complexidade dos fenômenos que estudamos, passamos a considerar

do
esses processos também interligados às múltiplas identidades e aos múltiplos
contextos na trajetória de aprendizagem dos alunos aconselhados que acom-
aC
panhamos. Para tanto, nos tornamos atentas à emergência das particularidades

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
dessa rede, que inclui a dinâmica das relações entre seus componentes, a va-
riação de seu comportamento e os seus momentos de estabilidade dinâmica, os
quais propiciam a formação de estados atratores, tema deste capítulo.
Como conselheiras linguageiras e pesquisadoras, temos observado, no
i
contexto do projeto, que tais estados são comuns nas trajetórias dos alunos
rev

que são aconselhados. Desse modo, pensamos que não faz sentido ignorá-
-los, pois eles influenciam o desenvolvimento da aprendizagem pretendida.
or

Porém, notamos que para aqueles que assumem o papel de conselheiro,


nem sempre é possível vislumbrar como isso pode ser alcançado. Assim,
ara

justificamos a realização deste estudo, já que ele pretende tecer reflexões a


esse respeito, ao discutir casos reais de formação de estados atratores nas
t

trajetórias de aconselhamento linguageiro (AL) que acompanhamos, apre-


i

sentando dados acerca da sua formação e funcionamento e expondo as estra-


op

tégias que lançamos mão para lidar com esse fenômeno.


d

Para alcançar tais propósitos, iniciamos nosso estudo tecendo esclare-


cimentos acerca da atividade de AL (tópico 2). Em seguida, discorremos
E

sobre estados atratores (tópico 3). Posteriormente, relatamos dois casos de


aconselhamento (tópico 4) – nesse momento nossos textos se tornam in-
dividuais; com a descrição de cada caso particular de pesquisa, analisado
ver

separadamente por cada pesquisador (subtópicos 4.1 e 4.2). É quando cada


pesquisadora ressalta as características mais salientes de seu aconselhado;
ilustra ocorrências de bacias atratoras; aponta a repercussão das estra-
tégias adotadas para desacomodá-los das bacias, e dialoga com as teorias já
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 181

apresentadas (tópicos 2 e 3). Por fim, nas considerações finais, retomamos


nosso discurso como conselheiras pesquisadoras, analisando juntas o con-
junto destas investigações.

2 Aconselhamento linguageiro

od V
r
uto
Nesse tópico definimos AL, seu propósito e funcionamento alinhados
ao estudo que realizamos.
Embora utilizado em outras áreas que envolvem as relações humanas, o

R
termo aconselhamento ainda requer mais definições no campo da Linguística

oa
Aplicada. Isso porque, segundo Magno e Silva (2012), esse ramo é relativa-
mente novo na área de ensino e aprendizagem de línguas e, portanto, carece
de investigações e estudos. O que se tem observado é a influência do aconse-
aC
lhamento linguageiro no aluno de línguas, que o tem utilizado como aliado
de sua aprendizagem.
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Ainda que diversos autores se sobreponham em suas definições opera-


visã
cionais de aconselhamento, ao verificarmos as características principais de
cada uma, identificamos três categorias. A primeira delas descreve o acon-
selhamento como um diálogo entre os sujeitos. Nessa concepção, alguns
autores o definem como um diálogo ou uma relação entre duas pessoas, o
conselheiro e o aluno (KELLY, 1996; GREMMO, 2007; REINDERS, 2008;
a re
itor

KARLSSON, 2012). A segunda categoria coloca o AL como provedor de


ajuda e apoio ao aluno (STICKLER, 2001; MOZZON-MCPHERSON, 2001;
CARSON; MYNARD, 2012; REINDERS; 2012). Já a terceira categoria
enfatiza que o aconselhamento procura levar os alunos a serem mais autô-
par

nomos, uma vez que os estimula a refletir sobre sua aprendizagem e a buscar
meios que facilitem esse processo (KELLY, 1996; CARSON; MYNARD,
2012; CANDLIN, 2012).
Ed

Candlin (2012), não consegue definir aconselhamento sem falar de auto-


nomia. Para o autor, ambos são processos dinâmicos, que abrangem a interação
são

entre pessoas com histórias, ao longo do tempo e espaço. Ele acredita que há
fortes componentes motivacionais relevantes, entrelaçados no processo, como
a forma que os construtos são interpretados, a avaliação das relações entre os
ver

participantes e os valores que ambos trazem consigo. O mesmo autor ainda de-
fende que aconselhamento e autonomia são comprometidos um com o outro.
Ou seja, se a autonomia é um objetivo, o aconselhamento é um meio para
que se chegue até ela. Da mesma forma, se o aconselhamento é um processo
pedagógico desejado, deve ser direcionado e focado.
182

Algumas habilidades são necessárias a um conselheiro linguageiro,


como a capacidade de dominar técnicas2 que podem auxiliar o aconselha-
mento e permitir que o aluno fale de suas necessidades mais profundamente
e tome iniciativa para estabelecer objetivos. É necessário seguir procedi-
mentos que permitem orientar, exemplificar, apoiar, dar retorno, avaliar, re-

V
r
lacionar e concluir as atividades com os alunos, conforme o preconizado por

uto
Kelly (1996).
Um conselheiro experiente sabe que algumas atitudes são fundamentais
durante o aconselhamento, como: buscar harmonia e empatia no relaciona-

R
mento com o aconselhado; pensar positivamente e abster-se de julgamentos;

a
mostrar disponibilidade para ajudar; saber controlar uma conversa; saber
formular perguntas; saber ouvir; ter habilidade de observação e de interpre-

do
tação; saber sugerir alternativas; e saber explicar algumas das causas dos
problemas de aprendizagem (AOKI, 2012).
aC
Se o AL for compreendido como um sistema adaptativo complexo, as

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
habilidades de um conselheiro tendem a se expandir. Essa possibilidade se
concretiza na medida em que se valoriza a interação entre os diversos ele-
mentos que compõem o sistema, assumindo um olhar holístico e enredado
para compreendê-lo. A partir disso, um agente, como o conselheiro lingua-
i
geiro, pode tentar compreender momentos de estabilidade dinâmica, bacias
rev

atratoras, englobando esta realidade. Esse olhar, percebendo comportamentos


desmotivados dos aconselhados, pode contribuir para o favorecimento de
or

gatilhos ou perturbações que propiciem abreviar esses estados.


ara

3 Atratores
t

Neste tópico retomamos as explicações sobre estados atratores pre-


i

sentes na introdução deste livro e procuramos explicitar aspectos referentes


op

à sua formação e funcionamento.


d

Os atratores caóticos ou estranhos são fenômenos presentes nas tra-


jetórias de sistemas complexos e representam zonas provisórias de estabi-
E

lidade dinâmica. Eles são extremamente sensíveis às condições iniciais e


resultam de momentos de auto-organização, constituindo um possível estado
padrão de comportamento.
ver

O entendimento de atratores como momento de estabilidade dinâmica


tem relação com o fato de que, seja temporariamente ou por um período
mais longo, podem levar o sistema ao equilíbrio; mas essa estabilidade não
significa que ficam estáticos, uma vez que sistemas complexos são sempre

2 Para uma compreensão mais detalhada ver Stickler (2001).


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 183

dinâmicos. Segundo Paiva (2011), mesmo estando em uma bacia atratora o


sistema continua em movimento, ou em estabilidade dinâmica, uma vez que
sua parada completa representaria a sua morte.
Para melhor entender a sua formação, remetemos às explicações de sis-
temas dinâmicos.

od V
r
uto
Sistemas dinâmicos se encaixam no sentido de que cada sistema é
sempre parte de outro sistema [...] Como eles se desenvolvem com
o tempo, subsistemas dinâmicos parecem se acomodar em estados

R
específicos, chamados de ESTADOS ATRATORES, que são pre-

oa
feridos, mas não necessariamente previsíveis3 (DE BOT; LOWIE;
VERSPOOR, 2007, p. 8).

Quanto à imprevisibilidade na formação de atratores, Hiver (2015)


aC
ressalta que devido à abertura do sistema, a configuração dos mesmos é de-
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pendente de um conglomerado de interações entre componentes e eventos.


Sendo assim, esses estados resultam de forças internas e externas que atuam
visã
de modo interdependente para acomodá-los ou desfazê-los a qualquer mo-
mento e em qualquer espaço de fase, sem que haja um propósito específico
para tal. Como exemplo de forças com esse potencial, o autor menciona o
feedback positivo e negativo e as perturbações grandes e pequenas dentro
a re

e fora da sala de aula, todos eles de natureza contextual, não linear e com
itor

efeitos igualmente imprevisíveis. Com tais qualidades, estado atratores “não


são necessariamente percebidos como agradáveis ou desejáveis4”, apenas
representam o que um sistema está fazendo ou como ele está se compor-
tando em dadas circunstâncias, bem como o resultado ou padrão constituído
par

a partir de um processo de auto-organização (HIVER, 2015, p. 21).


Ainda sobre atratores, esses possuem algumas características distintas.
Sua estrutura complexa é geralmente formada por várias camadas internas
Ed

que se sobrepõem umas às outras. Isso porque, internamente, ele se asse-


são

melha a um fractal – figura geométrica formada por elementos em diferentes


escalas, mas com a mesma semelhança física, como a couve-flor. Eles as-
sumem muitas formas interessantes e complexas no espaço de fase de um
sistema; e não há como prever a sua evolução à longo prazo com alguma
ver

confiabilidade (WILLIAMS, 1997).

3 Dynamic systems are nested in the sense that every system is always part of another system, going from submolecular
particles to the universe, with the same dynamic principles operating at all levels. As they develop over time, dynamic
sub-systems appear to settle in specific states, so-called ATTRACTOR STATES, which are preferred but not necessarily
predictable. Esta e as demais traduções são de responsabilidade dos autores.
4 [...] are not necessarily perceived as pleasant or desirable states [...]
184

Os atratores identificados pelos conselheiros do grupo de pesquisa cos-


tumam se assemelhar àqueles mencionados por Larsen-Freeman e Cameron
(2008), variando entre os modos: não profundo – que permite que o sistema
aluno se mova de um estado para outro sem maior dificuldade ao longo de
sua trajetória, demostrando, assim, um equilíbrio momentâneo do sistema;

V
r
bem profundo – aquele em que o sistema se coloca no modo fixo, com

uto
comportamento em equilíbrio, e precisa de uma forte injeção de energia
para poder se deslocar, e; de estado crítico – que necessita de um pequeno
estímulo para fazer o sistema mover-se na trajetória, configurando um com-

R
portamento muito instável.

a
A figura 1 demonstra o modo como o sistema aluno pode se organizar
em estados atratores, em seus espaços de fases, em trajetórias. Em a) o

do
sistema está em estado não profundo, ou aleatório; em b) encontra-se em
estado bem profundo, ou em “uma bacia atratora profunda”, como nós con-
aC
selheiros costumamos dizer, e em c) está em estado crítico.

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são
Figura 1 – Estados atratores em seus espaços de fases em trajetórias:
i
rev
or
ara
di t op
E

ver

Fonte: Larsen-Freeman; Cameron, (2008b, p. 51).

Em se tratando de aprendizagem de línguas no aconselhamento lin-


guageiro, como pesquisadoras, observamos que estados atratores são com-
portamentos “preferidos” no sistema alunos; estados em que se encontram
consciente ou inconscientemente quando não se arriscam, por exemplo, a
buscar pelo conhecimento da língua fora da sala de aula; ou ainda quando
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 185

estudam sempre de uma determinada maneira, seja porque é mais cômodo,


seja porque não conhecem outra forma de estudo ou estratégia de apren-
dizagem. Em todos os casos, ainda que aparentemente estático, o sistema
aluno fica suscetível à ocorrência da aprendizagem, uma vez que, depen-
dendo de sua auto-organização e do contato com suas múltiplas variáveis, a

od V
r
aprendizagem pode ou não ocorrer. Nesse sentido, o aconselhamento lingua-

uto
geiro pode representar uma oportunidade para identificar possíveis estados
atratores dos alunos e, quando diagnosticados, tentar movê-los das zonas em
que se encontram, instigando a aprendizagem do idioma.

R
Compreendemos que o conjunto de noções discutidas acerca de atratores

oa
é relevante para que um conselheiro linguageiro possa desenvolver também,
além das funções já enfatizadas sobre o seu papel, uma sensibilidade para
perceber atratores em trajetórias de aprendizagem de seus aconselhados; e
aC
viabilizando, assim, reflexões sobre maneiras para lidar com eles.
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4 Estudos de caso
visã
Apresentamos a seguir dois estudos de caso que exemplificam como
diagnosticamos estados atratores emergindo em trajetórias de aconselha-
mento linguageiro. Mostramos, também, as estratégias que adotamos para
mitigá-los, buscando favorecer metas de aconselhamento. Os dados aqui
a re
itor

apresentados foram coletados entre 2011 e 2015, sendo que o caso #1 refere-
-se à trajetória do aconselhado AC1CL3 e o caso #2 àquela de AC2CL1.
Como cada conselheira irá descrever o seu estudo de caso, os mesmos serão
narrados em primeira pessoa.
par

4.1 Caso #1: múltiplas agendas em conflito


Ed

Este estudo de caso é sobre AC1CL35. No momento em que o aconse-


lhamento foi iniciado, o aconselhado se encontrava na graduação em língua
são

inglesa, no quarto semestre de sua licenciatura e queria alcançar a seguinte


meta: incrementar a aprendizagem do inglês acadêmico. Para ele, cumprir
essa meta significava preparação para o seu trabalho de conclusão de curso
ver

(TCC), que deveria ser iniciado por volta do sétimo semestre. Até então,
AC1CL3 só estudava, vinha de ônibus para a faculdade e tinha uma vida
simples em casa. Em relação à sua identidade de estudante, ele era reco-
nhecido como um bom aluno, já proficiente no inglês do dia-a-dia. Por meio
de seus relatos, também me informei a respeito das suas outras identidades,

5 Código do aluno no projeto de pesquisa.


186

aninhadas a de aluno de Letras. Soube que ele é filho único de pais já idosos;
que tinha que ajudar em casa; que era muito querido entre colegas, amigos,
familiares e namorado e que gostava de dar atenção a todos ao seu redor.
Como estratégias para ajudá-lo a alcançar sua meta, eu procurei co-
nhecer como AC1CL3 se imaginava no futuro enquanto licenciado em

V
r
língua inglesa6. Para isso, como sua conselheira, quis saber sua opinião

uto
sobre como um TCC bem sucedido poderia contribuir para isso; sondar a
respeito de quais habilidades seriam esperadas para desenvolver um bom
TCC e quais atitudes deveriam ser assumidas para alcançar tais objetivos.

R
Nas suas respostas, ficou claro o desejo de ser um profissional bem sucedido,

a
pós-graduado, com um emprego em uma universidade pública, com aparta-
mento próprio na cidade e com possibilidades de realizar viagens nacionais e

do
internacionais nas férias. Ele acreditava que uma excelente monografia seria
importante para abrir portas para a sua pós-graduação e que sem continuar
aC
os estudos, dificilmente ele teria o emprego dos sonhos. E ainda, ele entendia

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são
que um TCC com a qualidade almejada viria com prática de escrita aca-
dêmica. Com isso em mente, nós dois iniciamos o planejamento de tarefas
para o alcance das metas de aconselhamento, com prazos viáveis para a sua
execução. Essas informações foram documentadas na forma de um plano
i
de ação. A principal atividade desse plano foi a leitura de textos acadêmicos
rev

em inglês (relacionados ao seu tema de estudo) para a percepção das carac-


terísticas desse gênero textual no que diz respeito à construção de sentido.
or

A partir disso, o aconselhado deveria listar termos específicos, bem como


modelos para introduzir seções, conduzir argumentos, desenvolver diálogos
ara

entre diferentes autores e dar desfecho a ideias. Além disso, AC1CL3 propôs
destacar as partes do texto em que o autor expressa a sua voz e, também,
t

sugeriu parafrasear trechos que considerava relevantes ao seu estudo, tor-


i

nando-os citações indiretas, conforme a normalização.


op

Em pouco mais de um mês de tentativas de implementação desse plano,


d

os encontros de aconselhamento estavam ocorrendo nas datas combinadas,


mas houve reajustes das tarefas e dos prazos para cumprir as atividades ne-
E

gociadas. Por exemplo, a tarefa de parafrasear trechos importantes de um


texto foi reduzida mais de uma vez. Passou de trechos de um texto inteiro,
para apenas uma ou duas páginas de um texto como tarefa de cada semana,
ver

que logo depois se transformou em tarefa para cada quinze dias. E, mesmo
que tenham sido negociadas pelo próprio aconselhado, essas atividades
custaram a ser finalizadas. Baseando-me nos estudos de Larsen-Freeman e

6 Aqui foi explorada a teoria do Sistema Motivacional Autoidentitário para a Aprendizagem de Língua Estrangeira
(DÖRNYEI; USHIODA, 2011).
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 187

Cameron (2008b) e de Hiver (2015), concluí que esse estado configurava


em um atrator e que seria preciso entender mais sobre o conglomerado de
forças que nele atuam para que fosse possível pensar em estratégias para
perturbá-lo. Para tanto, sondei sobre o desempenho do aconselhado como
aluno, conversando com o grupo de discussão da pesquisa que trata do acon-

od V
r
selhamento linguageiro, uma vez que outros professores que dele fazem

uto
parte eram também professores de AC1CL3. Consultei, também, alguns de
seus colegas de sala da graduação, os quais já foram meus alunos e que eu
sabia que se importavam com ele. De modo geral, todos me informaram que

R
AC1CL3 chegava atrasando em sala e faltava repetidamente, sendo esses

oa
alguns dos motivos prováveis de seus compromissos não estarem em dia.
Nos encontros de aconselhamento que se seguiram, também quis
saber a respeito do cotidiano da vida pessoal de AC1CL3. Assim, sugiram
aC
as seguintes variáveis: sua avó, uma pessoa muito querida sua, esteve mal
de saúde e acabou falecendo próximo do aniversário dele; uma colega de
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sala estava com câncer; ele próprio desconfiava que estivesse com alguma
doença grave, e seu namorado com convites constantes para sair. Como con-
visã
sequência, ele estava dedicando bastante do seu tempo para essas pessoas.
Havia ainda o envolvimento com o centro acadêmico e com alguns pro-
jetos da faculdade. Além do trânsito pesado no seu percurso diário às aulas.
Registradas essas informações, tentei vê-las integradas à atividade do AL e
a re
itor

passei a suspeitar que conflitos entre a agenda acadêmica e a agenda social


do aconselhado fomentavam a permanência do atrator.
Na tentativa de perturbar o atrator em que se encontrava AC1CL3,
adotei as seguintes estratégias: desenhei um buraco bem profundo, disse ao
par

aconselhado que ele estava lá dentro, bem no fundo, e então passamos a


discutir sobre os motivos percebidos que o mantinham lá, impedindo a pro-
gressão das metas. A figura 2, abaixo, é fruto da aplicação dessas estratégias.
Ed

Nela, há a representação do que denomina-se bacia atratora e o seu conteúdo


diz respeito ao conglomerado de forças, que interligadas, estariam influen-
são

ciando o comportamento atual (atrator) de AC1CL3.


ver
188

Figura 2 – Bacia atratora profunda de AC1CL3

V
r
uto
R
a
do
aC

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são i
Fonte: Nossa autoria.
rev

Com a conversa que tivemos sobre a configuração do desenho, suspeitei


or

que o estado em que AC1CL3 se encontrava não atingia apenas as metas


de aconselhamento, mas também seu reconhecimento como bom aluno. A
princípio, o aconselhado pareceu impressionado com esse entendimento da
ara

sua situação, permaneceu calado por algum tempo, mas depois falou: “Eu
quero sair do buraco”. Com esse desejo, sugeriu que apresentássemos um
t

trabalho juntos em um fórum de língua estrangeira com o tema de seu TCC.


i

Eu aceitei e ele se esforçou para elaborar os slides e explicá-los em inglês


op
d

acadêmico, demonstrando que estava investindo em novas atividades para


alcançar suas metas de aconselhamento.
A apresentação foi bem sucedida e eu o elogiei várias vezes publica-
E

mente na FALEM. Porém, dias depois, comecei a notar que o feedback po-
sitivo não estava resultando em mudança significativa de comportamento
ver

e que o replanejamento de ações e atitudes conflitantes com as metas con-


tinuavam presentes, embora por meio de outras configurações. Neste caso,
posso mencionar Hiver (2015) ao colocar o feedback positivo como uma das
forças que influenciam tanto na acomodação de um estado atrator, quanto
na configuração de outro estado. Essa questão me levou a perceber a for-
mação de várias bacias menos profundas que se repetem em espaços de fases
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 189

próximos. No conglomerado de cada uma delas, tentei notar as forças mais


influentes na sua formação, que poderiam estar impedindo novos progressos.
Para a compreensão da formação de uma e outra bacia pelo aconselhado, eu
voltei a usar a estratégia do desenho do “buraco”. Neste contexto, entendo
que AC1CL3 reagia prontamente, desenvolvendo algumas das atividades

od V
r
previstas, mas logo se acomodava em outra bacia. Partindo dessas obser-

uto
vações, tentei adotar estratégias diferentes para fomentar mudança de rumo
na sua trajetória de aconselhamento. Por exemplo: ao conhecer melhor a
rotina de AC1CL3, negociamos uma agenda de trabalho que contemplasse

R
uma perspectiva holística, ou seja, que envolvesse a rotina em família, com-

oa
promissos com outras disciplinas e os momentos de lazer. Isso porque, por
meio da percepção da constituição de estados anteriores, ficou evidente
que seria preciso organizar melhor o tempo para que as atividades das suas
aC
agendas acadêmica e social pudessem coexistir.
Essas ações visavam ajudá-lo a perceber que deveria aprender a de-
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senvolver várias tarefas ao mesmo tempo e que ao se organizar melhor,


não precisaria abrir mão daquilo que considerava importante tanto na vida
visã
acadêmica quanto na pessoal. As ações também nos ajudaram a pensar em
como lidar com o imprevisível, como nas questões que envolvem doenças
e trânsito. Juntos, resolvemos que, o desafio seria transformá-las em novas
oportunidades de ação no lugar de deixá-las causar paralisia.
a re
itor

Concomitantemente a essas estratégias, tomei outras iniciativas. Uma


delas foi levar o aconselhado a refletir de que modo as suas atitudes afetavam
o seu presente e futuro. Para isso, explorei como ele percebia a relação entre
a sua identidade social, o seu comportamento nas disciplinas em curso e os
par

seus planos de fazer pós-graduação e de trabalhar na universidade em que


hoje estava estudando. Lembrei que as pessoas em seu convívio poderiam
estar nas bancas dos vários exames para as seleções que ainda estavam por
Ed

vir. Desse ponto de vista, ele estaria em uma vitrine e as atitudes tomadas
naquele momento poderiam ser lembradas posteriormente, talvez influen-
são

ciando na sua escolha para preencher uma vaga de trabalho.


Outra estratégia adotada para o mesmo propósito foi deixar claro, com
exemplos reais, que seu comportamento atual tem consequências até mais
ver

imediatas. Por exemplo, AC1CL3 relatou no aconselhamento que poderia


participar da seleção de estagiários nos cursos livres de língua estrangeira,
oferecidos pela faculdade. Como sua conselheira, ressaltei que as normas
para aproveitar essa oportunidade de trabalho remunerado envolviam ter
uma boa conduta como estagiário e como aluno da graduação também.
190

Depois de implementadas as estratégias (acima destacadas) que interli-


garam (1) identidade social em construção, (2) estado presente e (3) possível
futuro do aconselhado, o fluxo da trajetória do aconselhado permaneceu mais
próximo do desejado por mais tempo. Vale ainda mencionar que essa fase de
aconselhamento pode também ter sido energizada pela matrícula do aconse-

V
r
lhado na disciplina obrigatória de metodologia de pesquisa como apoio para

uto
desenvolver o projeto de TCC. Foi a partir desse fato que AC1CL3 resolveu
ser mais produtivo em relação às primeiras atividades propostas no aconse-
lhamento para melhorar a sua escrita acadêmica.

R
Considerando-se os estados atratores aqui apresentados, cheguei às se-

a
guintes considerações:
A estratégia adotada para provocar mudança de comportamento na

do
bacia atratora da figura 2 teve efeito de curta duração, permitindo que ela se
transformasse em outras, menos profundas, por motivos aleatórios, algumas
aC
vezes lembrando aqueles da figura em questão, mas com configurações dife-

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são
rentes. Já as estratégias para lidar com os estados desta nova disposição de
atratores, repercutiram de forma mais próxima ao desejado. Até o desfecho
do caso para este relato, as estratégias têm contribuído para manter, por mais
tempo, a trajetória longe de momentos de estabilidade dinâmica.
i
Sob a égide da complexidade, as estratégias adotadas para perturbar
rev

estados atratores incluem um olhar holístico que valoriza os múltiplos con-


textos e identidades do aconselhado. Essa abordagem incentiva que se co-
or

necte os diversos agentes envolvidos à situação de aconselhamento. Dessa


forma, o diálogo no aconselhamento pode ir muito além do conselheiro e do
ara

aconselhado, como ocorreu ao se buscar ouvir os professores e colegas de


AC1CL3, além dos membros da pesquisa, e ao procurar saber do cotidiano
t

pessoal de AC1CL3, além do acadêmico. Por meio desse relato, é possível


i

apreender o quanto o AL pode ser influenciado pela rede de relações que o


op

envolvem. O mesmo pode acontecer quando o presente e o futuro do aconse-


d

lhado são percebidos de modo interligado. Com isso, é integrada a noção de


que a construção da identidade social do aconselhado merece cuidados para
E

que não desfavoreça o alcance de seus objetivos.

4.2 Caso # 2: metas idênticas


ver

Este estudo de caso é sobre AC2CL17, cujos dados foram coletados


entre 2012 e 2014. A aluna entrou na instituição com pouca ou nenhuma pro-
ficiência do idioma que iria estudar e do qual pretendia se tornar professora.

7 Código do aluno no projeto de pesquisa.


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 191

Ela trouxe consigo algumas crenças que podem ter influenciado sua traje-
tória de aprendizagem. Por exemplo, a aluna acreditava que não conseguiria
aprender inglês na universidade; e que seus colegas de classe, que já sabiam
o idioma, teriam melhor desempenho. As primeiras aulas ministradas no
idioma estrangeiro foram muito difíceis; e ela possuía pouca ou nenhuma

od V
r
ideia de como tornar-se autônoma em seus estudos. Além disso, precisou

uto
aprender a conviver com pessoas mais jovens, com comportamentos que
não a agradavam. Por ser tímida, isso exigiu dela um esforço maior para se
adaptar à nova realidade. Ainda foi possível notar que a aluna carecia de uma

R
certa dose de motivação.

oa
AC2CL1 possuía várias identidades aninhadas àquela de estudante uni-
versitária. De família de classe média; não trabalhava; utilizava transporte
coletivo; mãe de uma filha de 11 anos; católica; fazia parte do Grupo de
aC
Oração dos Estudantes Católicos Universitários; era aluna de inglês em um
curso de idiomas particular em Belém; morava com os pais; era solteira e
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

tinha 32 anos.
As primeiras metas que AC2CL1 traçou para as férias de julho de 2012,
visã
logo no começo de seu aconselhamento, foram bem gerais, como ler um
livro e escutar músicas; mas essa atitude é comum nesta etapa inicial. O
estabelecimento de metas é uma fase importante do aconselhamento lingua-
geiro porque é a partir dessa identificação que o aluno traça planos e tenta
a re
itor

executá-los. Por ser uma fase relevante no processo, costumamos registrar


essa etapa por escrito.
Inicialmente, a aluna fez vários planos, mas seu texto demonstrava
expectativas vagas em relação à aprendizagem. Diante disso, resolvi ques-
par

tioná-la sobre como pretendia executar suas metas; e solicitei que fosse mais
específica, como mostram na figura 3.
Ed
são
ver
192

Figura 3 – Metas de AC2CL1

V
r
uto
R
a
do
aC

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são i
rev

Fonte: MORHY, (2015, p.73).


or

No entanto, ao retornar das férias, nenhuma das atividades propostas


nas metas foi apresentada e a aluna tentou evitar o assunto quando cobrada.
Quando insisti que apresentasse as atividades que escolheu fazer, ela expôs
ara

o seguinte:
t

[...] o que não consegui fazer corretamente foi ler o livro como lhe
i

falei não gostei da história e parei de ler; mas acredito conseguir falar
op

sobre o que se trata, eu li dois livros. A música também consegui en-


d

tender e cantar mas não consegui gravar toda a letra escutei e aprendi
duas músicas. Só falta lhe apresentar o que fiz (Trecho de e-mail en-
E

viado em 11/out/2012; MORHY, 2015, p. 73).


A resposta da aconselhada mostrou que AC2CL1 trouxe posteriormente


ver

as músicas que interpretou. Ela escolhera duas canções de sua preferência e


fizera um glossário com as palavras que não conhecia. A aluna não chegou
a me mostrar os livros que leu, só comentou brevemente sobre eles. Quanto
aos parágrafos que pretendia escrever, não fez nenhum, e se justificou argu-
mentando que isso acontecera porque não soubera como fazê-lo diante do
pouco vocabulário que tinha. Quanto às leituras, mesmo afirmando no e-mail
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 193

que sabia falar do que se tratava, isso, de fato, não aconteceu quando eu a
questionei; ela não soube me contar a história que leu – nem em inglês, nem
em português. Conversamos sobre suas justificativas e tentei mostrar-lhe que
é necessário um esforço de sua parte para conseguir alcançar os objetivos.
Procurei, também, incentivá-la para prosseguir com as metas futuras.

od V
r
Nas férias seguintes, em janeiro de 2013, AC2CL1 traçou metas idênticas

uto
as das férias do ano anterior; e apresentou resultados igualmente similares. A
aluna trouxe as atividades, no mês de março de 2013, quando as aulas do ano
letivo iniciaram. Ela se esforçou para me contar, em inglês, a história do livro

R
que leu, mas não se saiu muito bem. Mostrou-me a letra da música que havia

oa
escutado e estudado, com uma lista de sinônimos das palavras que não sabia.
Quanto aos parágrafos que se comprometeu a escrever a cada domingo, não
escreveu nenhum. Questionei se por acaso essa atitude não foi consequência
aC
de alguma dificuldade que sentira; mas, segundo a aluna, foi por esquecimento
mesmo. Senti que houve pouco esforço de sua parte na realização das tarefas,
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e que o resultado apresentado poderia ter sido melhor. Faltou organização; seu
trabalho foi entregue em pedaços de papel, rabiscados e soltos. Apesar disso,
visã
elogiei o produto final e pedi que ela se autoavaliasse.
Nas duas ocasiões, ainda que tenha realizado algumas das metas que se
comprometera fazer, é possível perceber certa acomodação ou falta de em-
penho na realização das tarefas. Como conselheiros, não deveríamos julgar
a re
itor

o comportamento do aluno, e sim tentar entende-lo. Uma das suposições


para a atitude da aluna, a princípio, pode levar o conselheiro a pensar que
ela imaginou: “eu escuto uma musiquinha aqui e outra ali; leio um livrinho
superficialmente; e me safo dizendo que realmente fiz alguma coisa nas
par

férias, que estudei; dessa forma, fico bem no aconselhamento e com minha
conselheira...”. Esse tipo de comportamento, que me pareceu implícito em
seus procedimentos, foi, igualmente e de forma inversa, assumido por mim
Ed

ao acatar os resultados sem me manifestar, ou procurar entendê-los, e tendo


eu inclusive elogiado a aluna. Levei um tempo para perceber que eu me en-
são

contrava em uma bacia atratora. Da mesma forma, não percebi de imediato


que as metas de minha aconselhada para as férias de julho (2012) e janeiro
(2013) eram as mesmas e os frutos idênticos; e que AC2CL1 demonstra estar
ver

em uma bacia atratora ao passa a ter comportamento semelhante em relação


às metas para o semestre seguinte, conforme é explicitado na figura 4.
194

Figura 4 – Bacia atratora de AC2CL1 em 2012 e 2013

V
r
uto
Fonte: MORHY, (2015, p. 75).

R
a
A figura 4 demonstra um possível estado atrator aleatório em que a
aluna se encontrava em 2012 e 2013, tendo em vista a projeção das metas

do
estabelecidas. Partimos da compreensão que seu comportamento provavel-
mente se moveu de uma meta para outra, o que poderia explicar a falta de um
aC
progresso concreto em cada uma delas. Ao comprometer-se em realizar algo

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e fazê-lo parcialmente ou não fazê-lo, a aluna provavelmente ficava presa
são
entre o querer e o fazer, sem finalizar o que se propunha. Fleischer (2011,
p. 75) ao citar Lorenz (1993, p. 41) e Stewart (2002, p. 99) explica que sis-
temas que mantém comportamentos repetitivos e frequentes – de forma que
seus estados ocorrem de forma cada vez mais próxima – representam um
i
rev

conjunto de atratores. No AL esses estados parecem impedir que o aconse-


lhado se mova, progredindo em sua aprendizagem do idioma.
or

Por outro lado, eu, como sua conselheira, também demonstrei acomo-
dação diante do comportamento de AC2CL1 e não apresentei reação de modo
que a fizesse perceber o que estava acontecendo; não tomei nenhuma atitude
ara

para movê-la da bacia atratora cíclica em que se encontra e me coadaptei ao


t

sistema. Poderia ter colocado em discussão, naquele momento, o porquê de


ela ter esquecido de fazer a redação; discutir o dia-a-dia da aluna e porque
i
op

não teve “tempo” para fazer tarefas simples. Porém, prossegui sem esses
d

questionamentos. Nossos sistemas se coadaptaram. Em sistemas complexos a


adaptação e a coadaptação acontecem naturalmente e geralmente incorporam
fenômenos do contexto do qual o sistema faz parte (LARSEN-FREEMAN;
E

CAMERON, 2008b). Da mesma forma, AC2CL1 adaptou-se ao meu sistema


e se instalou em uma zona de conforto, como se pode ver abaixo:
ver

Está tudo bem, mas não estou conseguindo aplicar as mesmas metas
nos novos tempos verbais que já aprendi... com excelência, preciso
de sua ajuda para montar as atividades no passado, no futuro, mas
estou tentando depois lhe mostro (Trecho de e-mail, em 27/jan/2013;
MORHY, 2015, p. 76).
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 195

O e-mail de janeiro de 2013 já refletia a dependência da aluna do acon-


selhamento e sua dificuldade em tornar-se autônoma. Ela tentava realizar
as tarefas, mas não conseguia resultados. Durante o semestre isso não foi
diferente. AC2CL1 esteve presa em sua bacia atratora e precisou de meu
auxílio constante para ajudá-la nos exercícios. Mostrou-se, cada vez mais,

od V
r
condicionada ao meu sistema e incapacitada para realizar atividades sozinha,

uto
como mostra seu e-mail abaixo.

Segue minhas metas e planejamentos do mês de abril, vou imprimir

R
dessa vez pra colar na parede e visualizar todo dia o que tenho que

oa
fazer, pra não esquecer e me organizar melhor: 1) Listening: Escolher
uma música, entender o que a música expressa: procurar o significado
das frases, palavras, verbos, etc. ou ver um trecho de um filme e veri-
ficar estruturas e expressões; 2) Reading: escolher 1 livrinho para ler
aC
no mês de Abril. Fazer um pequeno parágrafo e tentar ler no encontro
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

de aconselhamento; 3) Speaking: escolher um trecho de um filme e


tentar contar em inglês; 4) Writing: verificar as estruturas gramaticais,
visã
tentando escrever uma pequena redação tema livre. Ex.: Uma carta a
uma amiga, descrição de sua melhor amiga (E-mail enviado em24/
mar/2013); MORHY, 2015, p. 76).

A aluna permaneceu nessa bacia atratora aleatória, optando por fazer


a re
itor

as mesmas coisas; escolhendo as tarefas de sempre, que pareciam não estar


contribuindo para a aprendizagem do idioma. Logo, eu precisei tomar uma
atitude para retirá-la dessa condição, uma vez que suas notas em língua in-
glesa estavam caindo. Eu procurei ler alguns textos para melhor embasar meu
par

conhecimento teórico sobre motivação e ajudá-la a encarar novos desafios.


Com isso, fiz AC2CL1 perceber que a aprendizagem de língua passa por
altos e baixos e que esses picos não são tão negativos quanto parecem. Eles
Ed

fazem parte de toda aprendizagem, como numa montanha russa em que há


momentos em que sentimos estar subindo e outros em que a queda é bem per-
são

ceptível (ZINN, 2006). Dörnyei e Ushioda (2011) mencionam essa flutuação


da aprendizagem em seus estudos relacionando-a a motivação do aluno. Eu
igualmente me encontrava na mesma situação como conselheira – na mesma
ver

bacia atratora; e não podia continuar assim. Meu sistema também deveria ser
retirado desse estado. Nesse caso ambas careciam de energia para se mover.
Eu encontrei ajuda no grupo de pesquisa, que percebeu minha coadaptação e
me auxiliou a sair de minha bacia. Com isso, retomei o papel que deveria ter
tido anteriormente, que era o de investigar a fundo o porquê da aluna não re-
alizar as tarefas ou realizá-las parcialmente. Iniciei por solicitar que AC2CL1
196

escrevesse um parágrafo em inglês – já que nunca havia apresentado nenhum;


e o resultado foi surpreendente porque ao que ela chamou de redação eu vi
apenas frases, uma abaixo da outra, dispostas como uma lista.
Conversamos sobre essa tarefa e mostrei à aluna as características do
gênero redação. Seria necessário construir parágrafos, com frases com co-

V
r
nectores e pontuação adequados, de modo que transmitissem uma ideia.

uto
As redações em inglês deveriam seguir o mesmo formato daquelas em sua
língua materna, o português. Seria conveniente, inclusive, que sua redação
tivesse um título. Na ocasião percebi que ela não escrevia por não ter ideia de

R
como fazê-lo. Tentamos organizar o que AC2CL1 escreveu, mas ela preferiu

a
abandonar o que havia feito e escolher um novo tema. A partir desse mo-
mento, mostrei-lhe um exemplo de redação em língua inglesa e solicitei que

do
ela fizesse uma parecida, substituindo alguns dados por informações que lhe
diziam respeito. Esse exercício passou por três reescritas até que ela mesma
aC
julgasse que estava bom. Deste ponto em diante AC2CL1 passou a escrever

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
alguns parágrafos e a trazê-los para que eu pudesse ler e avaliá-los.
Traçamos metas gerais para o semestre, porém dividimos essas metas
em outras mais curtas e rapidamente alcançáveis para seu estudo de inglês.
Por exemplo, se sua meta era ler um livro X, marcaríamos as páginas que
i
deveriam ser lidas e interpretadas e estabelecíamos um prazo mais curto para
rev

essa tarefa. Além disso, reduzimos prazos – de metas mensais para metas
semanais. AC2CL1 escolheu fazer atividades diferentes das que costumava
or

fazer. Eu a monitorava e a lembrava, por e-mail ou celular, do que precisava


trazer para mim na semana seguinte. Como consequência desse procedi-
ara

mento, suas redações foram melhorando e a aluna sentiu-se mais confiante e


motivada para escrever e falar.
t

Na teoria da complexidade os sistemas abertos trocam energia, man-


i

tendo assim sua estabilidade dinâmica. No entanto, esse estado pode ser
op

alterado caso nova energia seja introduzida no sistema, gerando mudança


d

de comportamento (LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b). No acon-


selhamento, o conselheiro busca, sempre que possível, estimular novas
E

condições iniciais no sistema do aconselhado; esperando, com isso, criar


oportunidades que o levem a avançar em sua aprendizagem.
ver

Considerações finais

Este estudo discutiu estados atratores no aconselhamento linguageiro,


descreveu dois estudos de caso que envolvem esse fenômeno e apresentou
algumas das estratégias implementadas para perturbá-los, procurando mi-
tigar a permanência desses sistemas em estabilidade dinâmica.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 197

Entendemos o aconselhamento linguageiro como uma modalidade de


apoio ao aluno com dificuldades de aprendizagem de línguas estrangeiras,
compreendida por nós como um sistema adaptativo complexo. Nesta pers-
pectiva, consideramos que o aluno, enquanto sistema, é energizado por inú-
meros subsistemas interligados ao seu, como a família, a universidade, os

od V
r
amigos e o próprio conselheiro, compondo uma rede que colabora direta-

uto
mente para a formação e funcionamento de bacias atratoras. Essas bacias
surgem em algum momento e podem desestimular o curso necessário para
que a aprendizagem possa se desenvolver.

R
Por meio das estratégias que adotamos e dos efeitos que observamos,

oa
vemos que o aconselhamento linguageiro, como um sistema complexo
capaz de interferir no sistema aluno, tem viabilizado um apoio significativo
ao processo de aprendizagem do discente de Letras. Porém, pela própria
aC
complexidade dos sistemas dinâmicos, não há como garantir ou prever a
permanência de um fluxo contínuo nas trajetórias de aprendizagem das quais
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

participamos, nem mesmo precisar os estados atratores e sua evolução no


espaço de fases do sistema.
visã
a re
itor
par
Ed
são
ver
E d
ver

i t or op
ara aC
rev
i são R V
do
a uto
r
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
CAPÍTULO 9

CONSELHEIROS LINGUAGEIROS
COMO POTENCIAIS PERTURBADORES

od V
r
DE SUAS PRÓPRIAS TRAJETÓRIAS

uto
NO SISTEMA DE APRENDIZAGEM

R
oa
Walkyria Magno e Silva (UFPA)

1 Introdução
aC
Os sistemas de aprendizagem vistos como sistemas adaptativos com-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

plexos – SACs – (LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008b; MARTINS;


BRAGA, 2007; PAIVA, 2005a) são compostos por diversos elementos, tais
visã
como professores, alunos, diretores de escola ou instituições de ensino, seus
secretários e outros funcionários. Dentre os espaços em que esse sistema
transita no âmbito escolar e universitário, pode-se citar as salas de aula, a
biblioteca (quando houver), os laboratórios, dentre outros. Tudo isso está
a re

dentro de sistemas maiores que os aninham, tais como o próprio sistema


itor

educacional municipal, estadual, federal ou grupos de escolas associadas (de


línguas, particulares etc.).
O sistema de aprendizagem de línguas a que nos referimos neste ca-
pítulo conta com um agente adicional: o conselheiro em aprendizagem de
par

línguas. Esse conselheiro apoia o aprendente linguageira, psicológica e


pedagogicamente. Ele próprio pode ser tanto um recurso de aprendizagem
como um mediador para que o aprendente identifique outros recursos.
Ed

Este texto é um recorte de um estudo maior cujo objetivo foi entender as


são

relações que se estabelecem entre conselheiros e aconselhados no processo


de aprendizagem de línguas adicionais (LA)1. Em uma aproximação maior,
busquei entender como o papel do conselheiro como agente de mudança (ou
não) na trajetória de aprendizagem de alunos reflete-se no seu próprio percurso.
ver

Um grupo de pesquisadores na Universidade Federal do Pará tem inter-


ferido na trajetória de licenciandos em Letras por meio de projetos de pes-
quisa enfocados nesse tema desde 2011. Estudos com primeiros resultados
podem ser conferidos em Magno e Silva et al. (2013) e Magno e Silva et al.

1 Pós-doutoramento realizado na Universidade Federal de Minas Gerais entre junho de 2013 e abril de 2014, com
financiamento parcial da CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
200

(2016) e em alguns capítulos deste livro. Essas práticas de aconselhamento


linguageiro têm auxiliado alguns alunos com dificuldades na aprendizagem
de LA a redirecionarem seus esforços para um caminho que nos parece mais
favorável à administração desse processo.
No entanto, há uma lacuna no entendimento de como o processo de

V
r
aconselhamento influencia a trajetória dos próprios conselheiros. Os obje-

uto
tivos, portanto, deste capítulo voltam-se para esse foco. Procuro discernir
padrões de comportamento na trajetória de três conselheiros atuantes, os
quais podem ser representativos de percursos de outros de seus pares. Esta

R
discussão pode contribuir tanto para a compreensão desse sistema aninhado

a
que vem a alterar e ser alterado pelos aconselhados quanto para o direciona-
mento na preparação de novos conselheiros.

do
Este capítulo está organizado em uma breve exposição teórica que se
segue. Depois disso, explico a metodologia empregada neste estudo e, na
aC
sequência, os resultados que encontrei. Finalizo, interligando os subsistemas

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
abordados e proponho o surgimento de um professor da complexidade2, o
que espero ter justificado ao final da leitura do texto.

2 Sistemas aninhados e agentes perturbadores


i
rev

A trajetória de aprendentes de línguas adicionais é constituída pela coe-


xistência de inúmeras variáveis que proporcionam rotas possíveis do sistema.
or

A esse respeito, Larsen-Freeman e Cameron (2008, p.175) descrevem os


espaços de fase em uma conversa como
ara

uma paisagem multidimensional com colinas e vales entre os quais


t

o sistema se move, criando uma trajetória. A paisagem representa as


probabilidades de vários modos ou fases do comportamento do dis-
i
op

curso, e a trajetória é esculpida a medida em que uma conversa espe-


d

cífica se move de um modo a outro. A trajetória é o tracejar da con-


versa, mostrando as escolhas feitas e as direções tomadas.3
E

É evidente que ao se analisar a inter-relação estabelecida entre conse-


lheiro e aconselhado, essa trajetória ocupa espaços de fase únicos em cada
ver

caso, mas que se configuram em alguns padrões de comportamentos prefe-


ríveis como veremos mais adiante.

2 Agradeço aqui este insight provocado pela Profa. Elaine Borges, co-editora deste volume, por ocasião do IX Congresso
da ABRALIN em fevereiro de 2015 em Belém.
3 Esta e todas as traduções de citações neste capítulo são de minha responsabilidade.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 201

Trato nesta seção dos sistemas acoplados de aconselhamento, motivação


e autonomia. Vejo esses três sistemas como vivos, mutantes e adaptáveis uns
aos outros engendrando processos dependentes tanto das condições iniciais
de espaços de fases como sujeitos às perturbações que podem ocorrer na
paisagem na qual os agentes transitam.

od V
r
uto
2.1 Sistema de aconselhamento

Dentro do sistema de aprendizagem de LA compreendido como um

R
SAC, a figura do conselheiro linguageiro é entendida como um agente de

oa
mudança na trajetória dos aprendentes. Ele pode atuar em um ponto de bifur-
cação e auxiliar o estudante a desviar de uma trajetória para outra.
Segundo Mozzon-McPherson e Visman (2001), o campo do aconselha-
aC
mento linguageiro está se desenvolvendo como importante apoio ao aluno,
às vezes até substituindo o professor, na aprendizagem de línguas em nível
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

superior. Um conselheiro linguageiro (CL) precisa ter três habilidades bá-


sicas: ser um guia (especialmente de estratégias), conhecer o ambiente do
visã
aprendente e o que ele oferece para que ocorra o propiciamento4 em inte-
rações enriquecedoras, e ter boas habilidades de aconselhamento.
Já há quase duas décadas, Riley (1997) mostrou o aconselhamento lingua-
geiro intimamente ligado à autonomia, uma vez que o conselheiro instiga prá-
a re
itor

ticas que se estendem muito além das sessões, buscando sempre uma atmosfera
que maximize a ação do aprendente e que minimize intervenções professorais.
Segundo Stickler (2001), algumas das técnicas empregadas pelo CL
são: espelhamento, paráfrase e sumário. O espelhamento é a repetição inten-
par

cional de palavras-chave para provar que o conselheiro estava focado no que


o aconselhado quis dizer. A paráfrase serve como uma checagem para saber
se o que o aconselhado disse foi o que o conselheiro entendeu. Se for fiel, dá
Ed

segurança ao aconselhado de que ele foi compreendido. Se não for, dá-lhe


a chance de esclarecer seu ponto de vista. O sumário, técnica geralmente
são

empregada no final das sessões, resume os aspectos principais que foram


compreendidos pelo conselheiro, ressalta o que foi tratado e serve de base
para o trabalho na sessão subsequente.
ver

Se a aprendizagem é um SAC, uma das maneiras de agir nela é cuidar


das necessidades individuais do aconselhado, trabalhando com estratégias
motivacionais direcionadas para cada aluno. Nesse aspecto o conselheiro
tem um papel privilegiado, desenvolvendo suas funções durante o processo

4 Affordance.
202

de aprendizagem, oferecendo apoio no momento em que ele é necessário e


retirando-se de cena, passando a ser um mero interlocutor, quando o apren-
dente assume o protagonismo de seu processo de aprendizagem.
O modelo de aconselhamento linguageiro proposto por Mynard (2012)
prevê o trabalho do conselheiro e aconselhado articulado em três esferas:

V
r
contexto, diálogo e ferramentas. Este modelo é adequado aos SACs, uma

uto
vez que o contexto e a ação que nele se desenrola são inseparáveis. Mynard
prevê que o diálogo ocorre tanto internamente em ambos quanto entre os in-
teractantes. Eles desenvolvem um diálogo interior, o aconselhado pensando

R
nas dificuldades que tem e nas estratégias que precisa passar a empregar e o

a
conselheiro pensando no que pode fazer para auxiliar o aprendente. O apren-
dente precisa agir e o conselheiro não deve assumir tons diretivos em suas

do
orientações, mas propor um cardápio de alternativas para que o aconselhado
escolha seu próprio caminho.
aC
Os três tipos de instrumentos são descritos pela autora como cogni-

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
tivos, teóricos e práticos. São exemplos de instrumentos cognitivos diários
e contratos de aprendizagem, fichas de autoavaliação e quaisquer outros
documentos que auxiliem o desenvolvimento das habilidades cognitivas e
metacognitivas. Os instrumentos teóricos são representados pelo conheci-
i
mento acumulado na área de aprendizagem de línguas que será utilizado
rev

pelo conselheiro para informar sua orientação e também é o conhecimento


que é compartilhado com o aconselhado para que ele entenda melhor como
or

se dá a sua aprendizagem. Já os instrumentos práticos traduzem-se em tudo


o que se usa institucional ou pessoalmente para organizar as sessões de
ara

aconselhamento, tais como reserva de horários e acerto de locais para os


encontros. Esses últimos instrumentos permitem que ambos se concentrem
t

no aconselhamento em si e não em como operacionalizá-lo.


i

A preparação dos conselheiros linguageiros pode se dar de forma es-


op

pontânea, quando professores mais atentos às necessidades individuais de


d

seus alunos começam a estudar maneiras de melhor orientá-los, ou pode


ser por meio de cursos preparatórios como os oferecidos em algumas uni-
E

versidades por conselheiros já atuantes. Geralmente essa preparação com-


preende um componente teórico e um componente prático. A parte teórica
é centrada no conhecimento de estratégias de aprendizagem, em propostas
ver

de autoavaliação e autorregulação, em um aporte sobre psicologia da apren-


dizagem, sobretudo em temas como motivação, autonomia e outros afins.
O componente prático da preparação de conselheiros usualmente envolve a
audição de sessões gravadas, a assistência a sessões de aconselhamento com
conselheiros mais experientes e o treino entre os pares.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 203

O que também não deve ser relegado a segundo plano é a própria perso-
nalidade do candidato a conselheiro. Além de conhecer a língua e ter conhe-
cimentos teóricos sobre a aprendizagem de línguas, é preciso ser tolerante,
amigável, calmo e, principalmente, saber ouvir.
Grande parte da literatura sobre aconselhamento linguageiro procura

od V
r
fazer a distinção do papel deste agente daquele do professor (KELLY, 1996;

uto
MOZZON-MCPHERSON, 2000; AOKI, 2012 entre outros). Entendo que
esta é uma preocupação pertinente enquanto desejosa de estabelecer um
campo de atuação para este profissional. Neste capítulo, embora respeite

R
esse posicionamento, coloco-me em uma posição conciliadora, argumen-

oa
tando que o professor cada vez mais volta-se para a necessidade de ser mais
conselheiro, oferecendo possibilidades de ação, e tendo um discurso menos
impositivo. Vejamos quais são essas maiores diferenças.
aC
Já na última década do século passado, Kelly estabelece uma diferen-
ciação entre macro e micro habilidades de um conselheiro linguageiro. As
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

macro habilidades incluem as estratégias que podem facilitar o autogeren-


ciamento, tais como iniciar um projeto, estabelecer objetivos, sugerir ações,
visã
apoiar o aprendente. Essas ações macro seguem uma sequência necessária
para se desenvolver um projeto qualquer do início ao fim. Já as micro ha-
bilidades de um conselheiro envolvem comportamentos que podem ser
necessários em qualquer fase da aprendizagem e dizem respeito a ações
a re
itor

contínuas de apoio ao aprendente. Como exemplos dessa segunda cate-


goria, pode-se citar o ato de criar empatia e de dar atenção ao aprendente.
De um modo geral, as macro habilidades seriam aquelas que o conselheiro
compartilha com o professor e as micro aquelas mais especializadas do pri-
par

meiro. A autora conclui que as habilidades de um conselheiro “precisam ser


aprendidas conscientemente” e que aprendemos a linguagem do conselheiro
“como uma maneira de ser mais genuínos, compreensivos e respeitosos com
Ed

nossos alunos” (p. 112), o que é, no meu entender, desejável de se esperar


também de professores.
são

Mozzon-McPherson, em 1997, em um texto premonitório intitulado O


conselheiro linguageiro: um novo tipo de professor? Uma análise de um
papel emergente, indica no parágrafo final do seu texto que o conselheiro “é
ver

um negociador de significados, um facilitador de aprendizagem e um desen-


volvedor de mudanças” (p. 108). Essa descrição desse agente sugere uma
concatenação com os princípios da complexidade segundo os quais a mu-
dança é sua maior característica. Então, se o conselheiro é um promotor de
mudança nos papeis dos aprendentes, ele é um agente primordial da apren-
dizagem vista como um SAC. Alguns anos depois, a mesma autora (2000)
argumenta pela profissionalização do conselheiro linguageiro estabelecendo
204

o diálogo reflexivo com o aprendente como a marca preponderante de sua


atuação. Esse texto sugere um programa de treinamento de conselheiros com
aulas e discussão de casos por teleconferência, além de seminários e oficinas
presenciais. É certo que o conselheiro atende individualmente cada apren-
dente e essa relação é impossível de se replicar em sala de aula, mas, como

V
r
irei argumentar ao longo deste capítulo, muitas das atitudes do conselheiro

uto
são transferíveis para o professor se uma visão for a de alguém que deve
fomentar a autonomia do aluno e levá-lo a aprender a aprender.
Aoki (2012) estabelece uma lista de checagem para o conselheiro a qual

R
é dividida nas seguintes categorias: habilidade para estabelecer uma ligação

a
com o aprendente, imaginação e empatia, habilidade de pensar positivamente,
habilidade de não julgar, vontade de ajudar, habilidade para manter um nível

do
de controle adequado, habilidade de fazer perguntas, habilidade de ouvir, ha-
bilidade de observar e interpretar, habilidade de prover alternativas, habilidade
aC
para explicar a causa de problemas de aprendizagem, habilidade de falar de

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são
uma maneira que o aprendente entenda, habilidade de prover os aprendentes
com o insumo linguageiro de que eles precisam e, finalmente, habilidade para
refletir. Ora, ao deixar de ver o professor como dono do conhecimento que
“passa” para os alunos, mas vê-lo como um agente nesse sistema em mu-
i
dança que é o SAC da aprendizagem de LA, percebe-se claramente que as
rev

habilidades necessárias a um conselheiro podem ajudar o desempenho desse


professor da complexidade. Até mesmo a habilidade de não julgar (negritada
or

acima), que pode trazer estranheza para a discussão, uma vez que o professor
precisa avaliar seus alunos, mostra coerência quando vemos quais são as ações
ara

derivadas dessa categoria propostas por Aoki (p. 158):


t

Sou consciente de que o que é bom para mim não necessariamente é bom
para todos. Sou consciente de que as generalizações não podem ser apli-
i
op

cadas para todos. Não avalio unilateralmente a habilidade comunicativa


d

do aprendente. Não avalio unilateralmente o método de aprendizagem do


aprendente. Sou consciente de que o resultado das atividades de aprendi-
zagem só pode ser conhecido depois que forem testadas. Sempre checo se
E

tenho informação suficiente para formar um julgamento.


ver

Um professor complexo, como estou sugerindo nesta discussão, tende


a abraçar essas ações. A avaliação na perspectiva de um professor da com-
plexidade passa por mudanças e se desloca na direção de uma avaliação
formativa, derivada de instrumentos como portfolios e não meras medições
por meio de provas e outros recursos pontuais, aproximando-se da descrição
dos comportamentos feita por Aoki que acabei de citar.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 205

Como se pode antecipar, o professor consciente dos aspectos emergentes


da complexidade não pode deixar de exercer não algumas, mas várias, das
ações típicas de um conselheiro. Essas ações, dentro dos espaços de fase da
sala de aula, podem se configurar como catalisadoras de movimento expo-
nencial nesses sistemas.

od V
r
uto
2.2 Motivação

Trato nesta subseção da concepção de motivação com enfoque no con-

R
selheiro linguageiro. Especulo sobre os aspectos motivacionais que fazem

oa
com que professores queiram agir como conselheiros.
Deci e Ryan (1985 apud DÖRNYEI; USHIODA, 2011) estabelecem
três necessidades que são inerentes ao comportamento motivado: autonomia,
aC
representada pela sensação de ser responsável pelas próprias ações; conexão,
ou seja, o fato de estar ligado a outras pessoas; e competência, revelada por
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sentimentos de eficácia resultantes de um retorno positivo sobre suas ações.


Esses três aspectos estão presentes no trabalho do conselheiro uma vez que
visã
ele tem plena liberdade de escolher as ações que proporá para negociação
com seu aconselhado; ele está intimamente ligado ao aconselhado, sendo
que a relação que se estabelece entre ambos está entre as condições de su-
cesso do processo; e, finalmente, o conselheiro percebe de imediato se suas
a re
itor

ações estão sendo levadas em conta causando perturbação ou não na traje-


tória dos aconselhados.
Ao se pensar como Ushioda (1996) que um aluno motivado é por defi-
nição um aluno autônomo, vê-se logo a integração desses dois construtos no
par

sistema de aprendizagem de LE. Minha definição preferencial de motivação é

um estado alerta cumulativo e dinamicamente mutante em alguém que


inicia, direciona, coordena, amplia, conclui e avalia os processos cog-
Ed

nitivos e motores por meio dos quais os desejos e vontades iniciais


são

são selecionados, priorizados, operacionalizados e executados (com


ou sem sucesso) (DÖRNYEI, 2011, p. 209).

Esta conceituação, por apresentar também a ideia de insucesso, traz em


ver

seu bojo os conceitos de um sistema dinâmico sensível ao contexto de forma


a abrigar todos os tipos de comportamentos possíveis em uma determinada
trajetória. O que não transparece, no entanto, na definição acima é a grande
influência do meio, pois nem sempre a opção está nas mãos do aprendente
ou do conselheiro. Tampouco transparece na definição mencionada os outros
agentes em subsistemas aninhados ao sistema de aprendizagem do aluno,
206

tais como o do professor. Dörnyei e Ushioda (2011, p. 158) concordam que


“se um professor está motivado para ensinar, há uma boa chance de que seus
alunos estarão motivados para aprender”. O mesmo parece ocorrer na díade
conselheiro – aconselhado, a motivação do conselheiro em ajudar pode acar-
retar uma vontade de ser ajudado por parte do aconselhado. Ainda, o início

V
r
de uma trajetória de aprendizagem ascendente pode alimentar o senso de

uto
autoeficácia do conselheiro, o que resulta em mais motivação para trabalhar
com o aconselhado, gerando sinergia entre esses agentes.
Ao discorrerem sobre a motivação do professor, Dörnyei e Ushioda

R
(2011, p. 188) afirmam que “o impacto positivo de bons professores é, em

a
larga medida, devido à força de seu compromisso em relação ao conteúdo
ensinado o qual se torna ‘infeccioso’, isto é, ele instila nos alunos um desejo

do
de buscar o conhecimento”. O mesmo pode-se dizer que ocorre com os con-
selheiros. Uma vez que estes são, por definição, estudiosos da área de ensino
aC
e aprendizagem de línguas e apaixonados pelo que fazem, podem funcionar

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são
como catalisadores de forças motivacionais que podem “infectar” seus acon-
selhados com mais motivação para aprender.
Já a desmotivação é definida como forças externas específicas que re-
duzem ou diminuem a base motivacional de uma intenção comportamental
i
ou de uma ação em desenvolvimento (DÖRNYEI, 2001). Tal fenômeno é
rev

discernido pelo autor da “amotivação”, que é o que ocorre quando nunca


houve motivação. Quanto à desmotivação, a literatura anterior à visão da
or

complexidade relata inúmeras causas, tais como humilhação pública, resul-


tados de testes péssimos, conflitos com colegas, entre outras (DÖRNYEI,
ara

2001). Hoje se compreende que um fator desmotivador para um aluno pode


ser motivador para outro e que as trajetórias são originais em cada caso.
t

Ao chegar ao ambiente universitário, os alunos são já egressos de uma


i

história de aprendizagem prévia que pode ter favorecido a passividade e a


op

desmotivação. As condições iniciais da experiência de aprendizagem têm


d

efeitos em suas rotas futuras. Este não é um privilégio de nosso país, pois
Patrick, Hisley e Kempler (2000 apud DÖRNYEI; USHIODA, 2011, p. 190)
E

dizem que

o fenômeno da energia adormecida pode ser particularmente preva-


ver

lente em estudantes universitários, muitos dos quais são veteranos de


um sistema educacional construído em torno de incentivos extrín-
secos e prêmios, que pode tê-los feito esquecer ou perder a fé em sua
própria motivação intrínseca para aprender. O entusiasmo pode agir
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 207

de alguma forma como uma faísca que reacende a chama da curio-


sidade e do interesse para os alunos, dando-lhes um impulso para a
motivação intrínseca.

Creio que muitos dos aconselhados que assumem caminhos diversos

od V
r
a partir de seus encontros com seus conselheiros apresentam essa energia

uto
adormecida, mencionada pelos autores, e não sabem – ou esqueceram – do
prazer de aprender por aprender e da boa sensação que é sentir-se capaz.
Não pretendo afirmar ser o conselheiro o santo graal do processo de apren-

R
dizagem, mas apenas reconhecer que ele é mais um elemento dinamizador

oa
do sistema. Arrisco-me a propor que ele seja até mesmo um elemento pri-
vilegiado que, por gerar empatia e por oferecer apoio individualizado, pode
fazer com que o aconselhado se coadapte de forma que favoreça o processo
aC
de aprendizagem.
Ushioda (2009) argumenta que o ímpeto motivacional sustentado é
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ligado a questões de identidade, aos futuros “eus que os aprendentes pro-


jetam para si”. Esse fato leva a uma nova teorização da motivação em relação
visã
ao self, à identidade. Por exemplo, os alunos de Letras – Inglês, que, em suas
narrativas recorrentemente mencionam maus professores dessa língua que
tiveram em sua vida escolar (aqueles que não saiam do verbo to be), temem
tornarem-se iguais a seus antigos mestres. Esta imagem do eu futuro não
a re

desejável, provocada na conversa com o aconselhado, pode ser uma força


itor

motivadora importante. Ao se imaginar competente e diferente daquele eu


temido que ele imaginou, o aprendente pode fazer emergir forças internas
que o levem para fora de uma bacia atratora na sua trajetória. No processo
par

de aconselhamento, por ser uma atividade individualizada, essa emergência


das particularidades de cada um – conselheiro e aconselhado – é privilegiada
e pode servir ao propósito de alavancar a aprendizagem.
A autora argumenta ainda que se o professor focar nas identidades
Ed

transportáveis que os alunos trazem para dentro da situação de aprendi-


são

zagem, eles passam a valorizar essas identidades que representam mais do


que um simples aprendente da língua: uma pessoa falante de si na língua
que aprende. Nesse processo a emergência de novas dimensões pode acon-
tecer, uma vez que os aprendentes passam a usar a língua para falar sobre os
ver

diversos vieses de sua pessoa e sentem que a língua adicional serve para que
eles vivam essas identidades multifacetadas5.

5 Resende (2009) diria identidades fractalizadas.


208

Dörnyei (2009) compreende as diferenças individuais dos aprendentes


como um sistema dinâmico. Ele argumenta que diversas correntes do pensa-
mento, tais como a Teoria dos Sistemas Complexos e o Emergentismo, levam
a um melhor entendimento das trajetórias dos aprendentes. Os sistemas dinâ-
micos têm uma flutuação contínua e uma estabilidade em certos momentos.

V
r
Essas estabilidades, bacias atratoras, são resistentes à mudança. Constelações

uto
de sistemas envolvendo a cognição, a emoção e a motivação são interdepen-
dentes e levam ou não ao sucesso da aprendizagem. Se o aprendente precisa
estar motivado, o conselheiro também. Ele deve aprender a se automotivar

R
acreditando sempre que o aconselhado tem condições de aprender e de de-

a
senvolver suas competências na língua, o que leva novamente a uma das cate-
gorias mencionadas por Aoki (2012), a de pensar positivamente.

do
Os conselheiros também sofrem com a flutuação da sua própria moti-
vação, em uma trajetória que assume um equilíbrio dinâmico no continuum
aC
entre motivação e desmotivação. Esse aspecto sinergético da motivação foi

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são
bem explorado por Kubanyiova (apud DÖRNYEI; USHIODA, 2011, p.
183) ao descrever a trajetória de oito professores eslovacos que frequen-
taram um treinamento em abordagens sensíveis à motivação e fomentadoras
de autonomia. Sua análise
i
rev

revela complexidades individuais em como a motivação do professor


pode ser afetada pelas condições e exigências contextuais. Parece que
or

na essência, os fatores contextuais dependem muito da configuração


específica dos possíveis eus dos professores que constituem seu auto-
ara

conceito como trabalhadores.


t

O caráter recíproco e recursivo da motivação mostrada e exercida por


conselheiro, professor e estudante pode ser mais bem descrito ao se assumir
i
op

uma abordagem complexa e dinâmica do fenômeno. Como dizem Dörnyei


d

e Ushioda (2011, p. 191), “nessa perspectiva, não se pode falar em ante-


cedentes e consequências dentro de relações de causa-efeito distintas, mas
sobre resultados emergentes de interações entre sistemas constituintes sub-
E

jacentes às disposições motivacionais de alunos e professores”. Acrescento,


ainda, que essas disposições se influenciam mutuamente e podem gerar
ver

efeitos muito maiores do que os esperados.


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 209

2.3 Autonomia

A autonomia do aprendente pode ser compreendida como um sistema


aninhado na sua trajetória de aprendizagem. Propositalmente, opto por tratar
do processo de autonomização enquanto um sistema aninhado em último

od V
r
lugar porque é ele o processo que se deseja instaurar ou fomentar tanto em

uto
salas de aula quanto no trabalho do aconselhamento.
Dentre as definições de autonomia na aprendizagem de LA mais co-
nhecidas, prefiro a de Benson (2001, p. 47) que diz que “autonomia é uma

R
capacidade multidimensional que se manifesta de diferentes formas em

oa
indivíduos diferentes, e até mesmo em um único indivíduo em diferentes
contextos ou em épocas diferentes”. Minha preferência por esta definição
deve-se ao fato de ela englobar a variabilidade dessa autonomia, por vezes
aC
exercida pelo indivíduo e em outras vezes até mesmo mascarada por ele, de-
pendendo do contexto. Isso se deve, dentro do pensamento dos SACs, a sua
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dependência das condições iniciais, a sua sensibilidade ao retorno recebido


e, certamente, a sua grande capacidade de se coadaptar.
visã
Uma questão que se coloca é a da dimensão crítica em um sistema adap-
tativo complexo. Teria o sujeito agentividade para excercer sua autonomia,
por exemplo? Ou tudo seria decidido pelos dados do acaso no comporta-
mento do sistema? Como o sistema se desenvolve – não é preterminado ou
a re
itor

previsto – seus elementos seguem trajetórias divergentes em alguns pontos


de bifurcação. Larsen-Freeman e Cameron (2008b, p. 76) referendam isso,
ao citarem Juarrero (1999), argumentando que “a complexidade oferece
novas maneiras de entender as causas e explicações que sustentem operacio-
par

nalmente uma teoria dinâmica da ação” fazendo com que uma nova compre-
ensão dos fenômenos seja alcançada.
Argumentos são abundantes mostrando a conexão entre as decisões do
Ed

indivíduo e redes de comportamentos sociais. Talvez o indivíduo detenha


realmente muito pouco do poder decisório sobre suas ações. No entanto,
são

dando uma orientação ao debate, as autoras especulam a possibilidade de


a Teoria da Complexidade ajudar a desvelar algumas dessas complicações
quando apoia o entendimento de como um sentido do “eu” emerge da
ver

inter-relação entre cérebro, corpo e mundo. As autoras acrescentam que a


responsabilidade pelas ações de alguém é exacerbada pela consciência da
complexidade porque ao imaginar que um ato pode ter consequências em
multicontextos, a opção por cada caminho será mais cuidadosa.
Esta é uma discussão atual e pertinente, havendo defensores de ambas
as posições sem que um consenso seja alcançado. Al Hoorie (2015) explora
os dois lados e termina tendendo para aquele que elege a agentividade como
210

mais forte. Essa posição é reforçada pela argumentação de que o próprio não
posicionamento ou a não ação é, em si, uma ação. O autor chama isso de
“ação repelidora” de distratores, estudada principalmente no âmbito da re-
siliência. Em estudos de autonomia, podemos traçar um paralelo dessa ação
“repelidora” com o conceito explicitado como “resistência à autonomia”

V
r
(BROWN; SMITH; USHIODA, 2007), que pode também ser uma ação es-

uto
colhida pelo aprendente.
Há os indivíduos que são intuitivamente autônomos e há estudiosos
que afirmam que pouco se pode fazer para aqueles que não têm o ímpeto de

R
dirigir sua própria aprendizagem. Alinho-me, no entanto, com pesquisadores

a
como Benson (2001), Raya, Lamb e Vieira (2007) os quais afirmam que se
pode fomentar a autonomia e pavimentar o caminho para que o aprendente

do
se torne mais autônomo. Explorei este aspecto em Magno e Silva (2008),
texto no qual argumento que o professor pode agir para que a autonomia do
aC
aluno floresça, precisando para isso abdicar de parte de seu poder diretivo e

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são
aprender a negociar quase tudo na sala de aula.
Assim, ao se compreender a relação entre professor e aluno, e, no caso
deste texto, entre conselheiro e aconselhado, como uma cooperação de um
lado e outro, pode-se resgatar a ideia de adaptabilidade e auto-organização
i
do sistema de aprendizagem de LA e seus avanços e recuos em direção à
rev

autonomização. Um estudante autônomo em uma disciplina que tem a frente


um professor que fomenta a autonomização de seus alunos, promovendo dis-
or

cussões e negociações de toda a ordem, pode não se comportar assim frente


a um professor controlador e simpático à hierarquia existente no sistema
ara

escolar. É possível que um aluno que pareça autônomo em sala de aula de


fato não o seja, apresentando apenas o comportamento já esperado pelo pro-
t

fessor. Assim, é possível que a autonomização em vias de ser construída pelo


i

aluno coadapta-se de acordo com os outros sistemas e agentes com os quais


op

está interagindo no momento. No âmbito do aconselhamento, bacias atra-


d

toras podem se formar até mesmo na dinâmica entre o par de interactantes


cujos sistemas se coadaptam.
E

De maneira geral, pode-se ainda acrescentar a forte bacia atratora que é


o sistema educacional brasileiro tradicional que pouco incentivo dá à tomada
de decisões por parte do aluno.
ver

Finalizando esta breve exposição teórica, já não separo aconselhamento


linguageiro, motivação e autonomia, mas vejo-os como sistemas aninhados
na relação existente entre os conselheiros e seus aconselhados, sempre fo-
cando nos primeiros para propósito deste texto.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 211

3 Considerações metodológicas

A metodologia apropriada para os estudos em complexidade ainda está em


desenvolvimento. Dörnyei (2011b) afirma que os estudos a respeito de SACs
devem ser “retrodizíveis” (retrodictive) em oposição à “predizíveis” (predictive)

od V
r
porque só podem tratar dessas trajetórias uma vez que elas já tenham ocorrido.

uto
Nessa metodologia a predição é inexistente, uma vez que cada sistema opta por
uma de várias trajetórias a cada ponto de bifurcação encontrado.
Ao se analisar o sistema de aprendizagem como um SAC, compartilha-

R
-se da ideia da inseparabilidade do contexto do objeto analisado. Como diz

oa
Vasconcellos, “por meio da operação lógica de distinção, que é necessária
para conceber os objetos ou fenômenos, o cientista distinguirá o objeto de
seu contexto, sem, entretanto, isolá-lo ou dissociá-lo desse contexto” (2002,
aC
p. 113). Ao enfocar o papel do conselheiro linguageiro e suas relações com
o aconselhado, não se deixa de lado todos os sistemas aninhados que fazem
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parte de ambos.
visã
Passo a relatar brevemente o contexto de trabalho desses conselheiros;
em seguida, explico como se dá a preparação desse conselheiro em nosso
ambiente. Depois, exponho os instrumentos que utilizei para coletar os
dados para este estudo e como os analisei.
O corpus da investigação consistiu em dados coletados no projeto de
a re
itor

pesquisa intitulado Aprendizagem de Línguas Estrangeiras como um


Sistema Adaptativo Complexo: autonomia, motivação e aconselha-
mento linguageiro (2013 – 2015), desenvolvido na Faculdade de Letras
Estrangeiras Modernas (FALEM) da Universidade Federal do Pará (UFPA).
par

O grupo de pesquisa, composto por alunos de doutorado, de mestrado


e da graduação, coordenado por mim, reúne-se quinzenalmente em uma sala
da FALEM. Nessas reuniões, com pauta distribuída antecipadamente e ata
Ed

enviada após cada encontro, são compartilhadas informações sobre eventos e


assuntos diversos, discutidos textos teóricos e expostos breves relatos sobre
são

a trajetória da inter-relação entre cada conselheiro e aconselhado. Muitas


vezes, é nesse relato compartilhado com os demais membros do grupo que
são identificados atratores e comportamentos emergentes. Nem sempre o
ver

próprio conselheiro consegue perceber esses fenômenos sozinho, mas no


modelo adotado pelo grupo para partilhar suas experiências, essa supervisão
o auxilia a desempenhar melhor o seu papel6.

6 A inspiração para esse modelo provém dos grupos Balint (1975) nos quais um grande número de médicos e assistentes
sociais puderam ser preparados para ouvir pessoas em crise. O trabalho nesses grupos “era levado a efeito discutindo
os relatos dos clínicos gerais sobre seus pacientes no grupo, composto de seus colegas” (p. 250). O assistente social
relatava livremente sua experiência com o sujeito. Esse relato era usado para inferir os fatores dinâmicos que davam
212

A preparação do conselheiro linguageiro na UFPA começa pela inte-


gração do candidato ao grupo de pesquisas que estuda o assunto. Ele passa
a ler os textos fundamentais para começar a aconselhar e ouve os relatos
de conselheiros mais experientes. Depois, se quiser, participa, como obser-
vador, em sessões de aconselhamento. No grupo de pesquisas enfocado neste

V
r
trabalho, além da preparação mencionada, há a discussão de casos em reu-

uto
niões quinzenais. Nessas reuniões, cada conselheiro relata o estado da arte
do sistema de seus aconselhados e requer opinião dos demais conselheiros.
Além de mim, os demais membros do grupo também intervém quando ne-

R
cessário para auxiliar nas possibilidades de ação desses conselheiros. Os

a
pontos que merecem maior atenção são foco de estudos teóricos futuros.
Para este estudo foram levantados os dados de três conselheiros, aqui

do
identificados por CL1, CL4 e CL10. À época da coleta, os dois primeiros eram
mestrandos em Linguística Aplicada e professores substitutos na FALEM.
aC
CL10 é ainda aluno da graduação. CL1 é casada e tem filhos; já CL4 e CL10

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são
são solteiros. Todos têm experiência como conselheiros (três anos para os
dois primeiros e dois anos para CL10). Os relatórios individuais desses conse-
lheiros, os seus relatos e consequentes reações a eles registrados nas atas das
reuniões do grupo de pesquisa foram atentamente lidos para que se percebesse
i
os aspectos emergentes nessas trajetórias descritos na próxima seção.
rev

4 Atratores e emergência
or

No decorrer da análise dos dados pude ver o desenrolar dos subsistemas


ara

da autonomia e da motivação desses conselheiros enredados em suas práticas


de aconselhamento. A autonomia é total para cada conselheiro atuar com seu
t

aconselhado da maneira que julgar conveniente. No entanto, essa autonomia


i

é, de certa forma, controlada pelas reuniões quinzenais quando suas ações


op

são convalidadas ou confrontadas pelos membros do grupo de pesquisa.


d

Nesse sentido, concordo com Hiver quando ele afirma que


E

o retorno positivo gera padrões que são algumas vezes identificados


como um ciclo vicioso – ou a sua contrapartida mais feliz, um ciclo
virtuoso. Um retorno positivo repetitivo pode aprisionar os alunos em
ver

um estado de letargia aprendida na qual eles podem simplesmente de-


sistir da aprendizagem (2015, p. 23).

origem aos comportamentos. Tanto as reflexões do relator quanto as críticas e comentários dos outros membros do grupo
ajudavam a reconstruir a trajetória e identificar pontos de interferência. Esse procedimento, que ficou conhecido como
“10 minutos para o paciente” foi implementado na Clínica Tavistok, em Londres, e visava a sensibilização do clínico para
prestar atenção ao paciente como um todo, vendo-o como um sujeito integral e não só como o portador dos resultados
de exames em folhas de papel.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 213

O mesmo que ocorre com aprendentes que são elogiados costumeira-


mente mesmo quando não mereceram esse elogio, e o mesmo pode ocorrer
com o conselheiro que não é confrontado em suas ações. Daí a necessidade
dessa espécie de supervisão coletiva que pode, em vista do conhecimento
compartilhado sobre SACs, identificar a ocorrência de certos fenômenos

od V
r
como os descritos aqui.

uto
Alguns aspectos emergiram na análise dos dados das trajetórias desses
três conselheiros enfocados neste estudo. Optei por separá-los em dois
grandes grupos: o primeiro expõe a instalação de bacias atratoras e o se-

R
gundo elenca a emergência de novos comportamentos, em uma das vezes

oa
decorrente da saída dessas bacias. Essas observações foram interpretadas à
luz da complexidade.
aC
4.1 Bacias atratoras
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As bacias atratoras são uma região de relativa estabilidade em um


sistema dinâmico. Entretanto, como esses sistemas são abertos, elas podem
visã
receber forças perturbadoras que podem mover o sistema de um atrator para
outro ou ainda para uma outra direção, desejavelmente mais favorável à
aprendizagem.
Nos dados analisados, encontrei duas bacias atratoras em relação ao
a re
itor

comportamento dos conselheiros: a primeira é a coadaptação dos sistemas


dos conselheiros e dos aconselhados e; a segunda é a volta a uma bacia
atratora representada pela linguagem diretiva típica do professor tradicional,
por vezes ainda utilizada pelo conselheiro.
par

4.1.1 Coadaptação
Ed

A coadaptação é um estado atrator que pode ser desfavorável para a


aprendizagem. Como prova da bidirecionalidade do movimento do sistema,
são

encontrei, em diversas situações uma coadaptação do conselheiro em re-


lação ao aconselhado, ficando ambos em uma bacia atratora de inatividade.
Lembrando Hiver (2015), citado anteriormente neste capítulo, um ciclo vi-
ver

cioso era instaurado.


O conselheiro encontrava-se com o aconselhado e nada do que havia
sido acordado entre eles era, efetivamente, levado a cabo. Alternativamente,
sessões marcadas eram adiadas e remarcadas sem que viessem de fato a
ocorrer. Esta bacia atratora era tacitamente aceita por ambos e assim
214

permaneciam em estabilidade dinâmica, na qual a trajetória de aprendi-


zagem dos estudantes ficava em suspenso, sem progresso evidente. Seguem
alguns exemplos:

(1) AC3CL10 diz o que deve e quer fazer, mas não faz (CL10, ata

V
r
26/3/14).

uto
(2) CL10 encontrou-se com AC3 na segunda-feira passada e mudou
as metas dela diminuindo-as; a aluna só apresentou os tópicos, mas
não fez os exercícios (CL10, ata 9/4/14).

R
(3) AC3CL10 teve dificuldades na compreensão escrita no Toefl. Não

a
deu a mini aula previamente acordada. Disse que não lembrava do
que tinha estudado. Disse que está muito envolvida em um projeto
para a disciplina de língua. Ela estava se organizando, mas com o

do
feriado parou tudo. Ainda, a aluna tem dificuldades com estratégias
aC
de gerenciamento (CL10, ata 7/5/14).

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são
Vemos nos excertos de 1 a 3 acima o mesmo conselheiro preso a um
comportamento coadaptado ao do aconselhado: não o confrontava e em seus
relatos registrados nas atas das reuniões essa imobilidade ficou óbvia. Nada
saia do lugar; embora a dinamicidade estivesse lá, o sistema não se movia.
i
Durante três meses, de março a maio, as atas registraram o mesmo compor-
rev

tamento dessa díade.


or

No excerto abaixo vemos outra ocorrência de coadaptação entre conse-


lheira e aconselhada.
ara

(4) Em dois anos de convívio com AC1CL1 como aconselhada, foi


neste semestre que descobri nela algumas características até então
t

desapercebidas por mim. Ela mostrou-se um tanto acomodada,


i

talvez por achar que sabe mais inglês do que realmente sabe e consi-
op

derar que não seria necessário dispor de maiores esforços. Ainda pre-
d

cisamos trabalhar esse lado da aconselhada (relatório CL1 julho/14).

Fica claro nos excertos de (1) a (4) acima que este tipo de coadaptação
E

é prejudicial ao sistema de aprendizagem, levando-o à inércia causando en-


tropia7 que pode resultar em morte do sistema. Nesses casos, se mesmo
ver

depois do alerta do grupo, nada for feito, há geralmente a desistência do


aconselhado do processo de aconselhamento.

7 Levo o leitor ao capítulo 8 que mostra com mais detalhes alguns episódios dessa coadaptação.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 215

As técnicas sugeridas por Stickler (2001) poderiam, como o foram


depois do alerta do grupo, ter sido implementadas e trazidas à consciência
das aconselhadas em foco. Elas poderiam ser instigadas a refletir porque
estariam conselheiros e aconselhadas repetindo sempre o mesmo sumário da
sessão. Ambos trariam à tona essa sensação de não sair do lugar. A partir da

od V
r
leitura das atas nas quais o mesmo comportamento era relatado, reunião após

uto
reunião, foi inevitável constatar a bacia atratora em que se encontram tanto
as aconselhadas quanto os conselheiros. O diálogo interior (MYNARD,
2012) dos conselheiros precisou ser acionado mais energicamente para que

R
eles percebessem a longa estabilidade do sistema.

oa
4.1.2 Linguagem diretiva
aC
Outra bacia atratora encontrada nos relatos dos conselheiros é a influência
do tom diretivo no discurso em suas orientações aos aconselhados. No lugar
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de oferecer alternativas ou fazer com que o aconselhado descubra novos


percursos, eles passam a oferecer soluções prontas. A linguagem diretiva é
visã
contraproducente para gerar autonomia; ao contrário, ela gera dependência e
neutraliza o processo de autonomização. Nos registros:

(5) CL4 reparou que está sendo muito prescritivo nas sessões de
a re
itor

aconselhamento. Como gravou suas sessões pode perceber esse pro-


blema (ata 23/4/14).
(6) CL10 ouviu a sessão que havia gravado e percebeu que está fa-
zendo o aconselhamento de forma muito diretiva (ata 28/5/14). 
par

Os excertos (5) e (6) acima são descrições dos comentários dos


membros do grupo registrados em ata. Neles, pode-se perceber uma incon-
sistência entre o discurso dos conselheiros, as bases teóricas em que seu
Ed

trabalho se assenta e a ação desses no processo. Gremmo (2009) diz que não
são

é papel do conselheiro atribuir notas ao aluno ou exercer algum julgamento


sobre suas ações, reservando-se o papel de ouvi-lo e propor alternativas ou,
melhor, fazê-lo refletir sobre como melhorar seu desempenho. No entanto, o
que se vê é que nos relatos de alguns dos conselheiros é que há diversos epi-
ver

sódios em que eles relatam tristeza com o desempenho de seus aconselhados


ao mesmo tempo em que se coadaptam a eles, sem tomar alguma atitude
mais perturbadora para o sistema.
Vejamos o progresso de CL4 nos excertos abaixo, os quais são registros
do segundo semestre do ano de 2014, depois que o conselheiro já havia saído
da sua bacia atratora representada pela linguagem diretiva:
216

(5a) AC3CL4 constatou um problema que é “passar o que compre-


endeu de um texto para um texto próprio escrito”. CL4 trouxe isso à
tona no aconselhamento, mas deixou ao critério dela escolher o que
fazer (ata 16/9/14).
(5b) O objetivo de AC3CL4 na língua seria desenvolver a leitura e a

V
r
escrita de textos. CL4 gostaria de ter sugerido um trabalho com

uto
oralidade, mas deixou de ser diretivo e aceitou a vontade da aluna
(ata 18/11/14).

R
Os excertos (5a) e (5b), especialmente quando comparados a (5)

a
mostram o quanto o conselheiro apresenta uma trajetória que já transita co-
modamente pelos comportamentos esperados de um conselheiro. Em (5a)

do
ele ouve a aconselhada, mas deixou a responsabilidade pelas ações para ela,
aC
atuando como uma caixa de ressonância para suas preocupações, mostrando

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empatia e provocando um comportamento autodirecionado. Em (5b) pode-
são
-se ver que, embora o conselheiro tenha um posicionamento sobre o que a
aluna deveria fazer, ele restringe esse comportamento e deixa que ela tome
as decisões pertinentes. Talvez, nesse caso, a ação realizada pela aconselhada
não surta os efeitos desejados, mas faz parte do processo que ela mesma
i
identifique isso.
rev
or

4.2 Emergência

Ao contrário das bacias atratoras, ou por vezes até provenientes de


ara

energia nelas injetada, os sistemas podem fazer emergir comportamentos


novos em uma outra fase, apresentando um salto qualitativo na produti-
t

vidade do sistema. Entre esses comportamentos emergentes, pude identificar


i

três deles nos dados sobre os quais me debrucei. São eles: a perturbação no
op
d

sistema dos aconselhados levando-os a bifurcar em uma direção mais fa-


vorável da sua aprendizagem, a autovalorização dos conselheiros enquanto
profissionais e o realinhamento do papel do professor em direção àquele do
E

conselheiro, o que não deixa de ser também uma coadaptação.


Cada um desses aspectos será detalhado a seguir, com excertos exem-
ver

plificadores retirados do material analisado.


COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 217

4.2.1 Perturbação no sistema dos aconselhados

Como perturbador da trajetória dos aconselhados, o conselheiro pode


intervir nos pontos de bifurcação do sistema deles, atuando como uma força
que pode tirá-los da bacia atratora em que se encontram. Pode também atuar

od V
r
de forma constante e contínua fazendo com que a trajetória desse aconse-

uto
lhado avance. O excerto abaixo ilustra como isso pode ocorrer.

(7) CL1 preparou uma espécie de aula para AC2CL1 com o objetivo

R
de tirá-la do ciclo “lamurioso” em que se encontrava, reclamando

oa
sempre da mesma professora, uma situação em que ambas têm pouco
espaço de ação. [...] CL1 pediu que AC2CL1 trouxesse várias re-
dações de diversos períodos, tarefas do curso livre que frequenta, do
Curso de Letras, de vários professores. CL1 foi fazendo perguntas e
aC
AC2CL1 foi se avaliando. Na análise comparativa ela foi vendo o
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quanto já tinha aprendido. AC2CL1 adorou a atividade. CL1 fez


isso instintivamente porque não adianta ficar batendo na mesma tecla
visã
(ata 7/5/14).

Atente-se que esta conselheira é a mesma que estava em situação de


coadaptação descrita retrospectivamente no seu relatório semestral (excerto
4). Ao perceber a bacia atratora em que se encontrava no seu relacionamento
a re
itor

com a aconselhada, o que foi descoberto na supervisão pelo grupo, ela tomou
as ações descritas em (7), o que fez o sistema se mover. Em primeiro lugar,
a aula dada, embora não seja atribuição do conselheiro, foi uma ação que re-
tirou o sistema de sua passividade injetando nele nova energia. Em segundo
par

lugar, nessa mesma época, a conselheira usou uma técnica de reflexão e au-
toanálise com sua aconselhada que a fez verificar, por meio de suas próprias
produções em inglês de diferentes épocas, o quanto já havia progredido. Este
Ed

senso de autoeficácia (DÖRNYEI; USHIODA, 2011) fez com que o sistema


se movesse em direção a uma trajetória mais favorável.
são

Para experimentar este resultado, o conselheiro precisa incluir em seu


diálogo interior (MYNARD, 2012) suas percepções do que é importante para
o aprendente. lembro a pertinência, seguindo Mozzon McPherson (2000) e
ver

Aoki (2012), da inclusão de um forte componente teórico sobre aprendi-


zagem de línguas na bagagem técnica do conselheiro. Sem isso, o conse-
lheiro fica impossibilitado de agir. A emergência de novos comportamentos
relatada reflete a autonomização dos aprendentes aconselhados.
218

4.2.2 Autovalorização da imagem do conselheiro

Identifiquei nos dados o quanto a atividade como conselheiro pode levar


a uma autoimagem valorizada de si próprio e de suas capacidades tanto cogni-
tivas e metacognitivas quanto afetivas. A partir de trajetórias de alguns acon-

V
r
selhados pode ocorrer uma valorização da autoimagem do conselheiro, o que

uto
pode ser comprovado pelos excertos abaixo. Esses episódios são altamente
motivadores para o conselheiro e fazem com que o sistema se reenergize.

R
(8) AC1CL10 tirou a nota máxima na prova de inglês e está muito or-

a
gulhoso com esse resultado. Eu também estou muito feliz, pois tenho
acompanhado os altos e baixos da trajetória de aprendizagem dele. Ele,

do
no nosso último encontro, agradeceu minha presença na sua aprendi-
zagem e relatou que se não fosse pelo aconselhamento linguageiro ele
aC
teria desistido do curso. Saber deste efeito positivo na trajetória dele

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é muito gratificante, pois reflete todo o trabalho que estamos desen-
são
volvendo na universidade (CL10 relatório dezembro/14).

No excerto acima, percebe-se que este conselheiro provavelmente


poderá atuar positivamente na motivação do aconselhado, pois, replica-se o
i
que Dörnyei e Ushioda (2011) alegam a respeito do professor ao dizer que
rev

quando um professor motivado ensina, seus alunos serão também motivados


or

a aprender. Pode-se notar ainda o caráter “infeccioso” da motivação, men-


cionado pelos mesmos autores nos excertos abaixo:
ara

(9) Os conceitos básicos da Teoria da Complexidade foram estudados


novamente, mas com uma nova finalidade: apresentá-los e discuti-los
t

com os novos integrantes do grupo de pesquisa. Algumas reuniões


i

foram coordenadas por CL1 e por mim, e esse foi outro ganho
op

muito relevante. Meu interesse e minha motivação pela pesquisa


d

aumentaram exponencialmente após essa experiência. (CL4 rela-


tório julho/14).
(10) Percebo que fica mais fácil ler textos teóricos mais densos, e
E

interpretá-los com mais segurança. Tenho tido um grande desenvol-


vimento intelectual e acadêmico (CL1 relatório dezembro/14).
ver

Essa imagem dos membros do grupo reflete-se em mais desejo de es-


tudar e de aconselhar com ainda mais propriedade.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 219

4.2.3 Mudança no papel do conselheiro enquanto professor

Em outra coadaptação observada nos dados, percebi que o papel de


conselheiro exerceu influência na sua identidade de professor. A partir do
domínio dessa nova tarefa, os conselheiros inserem algumas das técnicas e

od V
r
práticas do aconselhamento em suas aulas. Esse movimento de emergência

uto
de um novo professor já havia sido notado em Gantuss (2015) que entre-
vistou e observou três professores que também são conselheiros, em suas
práticas docentes.

R
Nos conselheiros estudados neste texto, todos, sem exceção, relataram

oa
que ouvem mais seus alunos dentro de sala de aula e na medida em que isso
é possível passaram a dar a eles atenção mais individualizada.
aC
(11) Tanto a Teoria da Complexidade quanto o Aconselhamento con-
tribuem significativamente para minha formação. Em primeiro lugar,
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a teoria da complexidade permite entender os fenômenos de forma


mais abrangente e que nem sempre estão relacionados à aprendizagem
visã
de língua estrangeira. Além disso, a prática de aconselhamento lin-
guageiro melhora não somente a mim enquanto conselheiro, mas
também enquanto professor e aprendente de língua estrangeira
(CL4 relatório julho/14).
a re
itor

O trabalho como conselheiros transfere a sensação de autonomia para o


professor dentro de sua sala de aula e ele se apropria da maneira como quer
desenvolver o processo de aprendizagem. Percebe-se aqui a não linearidade
do sistema com a prática do aconselhamento causando um efeito inesperado
par

na qualidade das aulas do professor, que passa a se preocupar com a indivi-


dualização do ensino ainda que em turmas não muito pequenas.
Ed

Considerações finais
são

Embora as publicações tenham feito questão de diferençar os papéis do


professor daqueles do conselheiro, o que este texto traz é uma aproximação
entre os dois. Esta virada do professor em direção às práticas do aconse-
ver

lhamento parece ser o que se enquadra em um professor na complexidade:


atento às diferenças individuais, mediador de práticas de aprendizagem.
220

Acrescento ainda que esse professor “complexo” sempre existiu; ele


apenas não se enquadrava em um só método. Cada um de nós tem gratas
lembranças de professores inspiradores que faziam a diferença em turmas
que sempre foram heterogêneas, buscando o que tocaria cada aluno, o que
catalisaria o maior efeito, às vezes com grande esforço.

V
r
Estar informado e consciente das diferentes bases teóricas da comple-

uto
xidade pode, de fato, trazer uma enorme contribuição para uma trajetória
ascendente e diria até transcendente para o professor da complexidade.
Assim como a maioria dos fenômenos vistos sob o paradigma da

R
Complexidade, o professor conselheiro sempre esteve no sistema. Ele foi

a
recortado, simplificado, desconectado de seu contexto em sucessivas levas
metodológicas. Hoje, com a reconciliação das teorias de aquisição de se-

do
gunda língua (MENEZES, 2013) e com a emergência da abordagem com-
plexa de ensino de línguas (BORGES; PAIVA, 2011, BORGES, 2015), que
aC
potencialmente iluminam as ações multifacetadas do professor no processo

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são
de ensino/aprendizagem de línguas adicionais, há espaço para que os eus
fractalizados revelados no papel do conselheiro se integrem dando margem
à emergência desse novo professor.
O professor da complexidade não reduz, não homogeneiza e não sim-
i
plifica a sala de aula. Ele a assume integralmente, com todas as identidades
rev

e subsistemas ali instalados e usa o que aprendeu no aconselhamento para


fazer o sistema se mover, inclusive o seu próprio.
or
ara
di t op
E

ver
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

ver
Ed
são
itor
par aC
a re
PARTE IV
R
COMPLEXAS
visã
od V
CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS
oa
uto
r
E d
ver

i t or op
ara aC
rev
i são R V
do
a uto
r
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CAPÍTULO 10

COMPLEXIDADE BIOLÓGICA
NO ENSINO/APRENDIZAGEM

od V
r
DE LÍNGUAS ADICIONAIS

uto
Rodrigo Camargo Aragão (UESC)1

R
oa
Introdução

A compreensão acerca de fenômenos associados a aprendizagem, co-


aC
municação e conhecimento tem sido um desafio. A relação da aprendizagem
com a linguagem e com o que distinguimos como cognição e aprendizagem
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

tem atraído o esforço de um amplo espectro de pensadores, de filósofos


gregos clássicos a neurobiólogos e engenheiros eletrônicos (GARDNER,
visã
1995). Em meados do século passado, esse tema, tradicionalmente reservado
a filósofos, ganhou o concurso acadêmico da Cibernética. Esse termo foi
adotado à época para uma empreitada intelectual transdisciplinar que se
debruçou sobre a problemática do conhecimento tendo como meta geral a
a re
itor

edificação de uma ciência geral da mente (DUPUY, 1996, p. 9).


Entre 1946 e 1953, foram realizadas em Nova York dez conferências
financiadas pela fundação filantrópica Josiah Macy Jr., que ficaram conhe-
cidas como as Conferências Macy. Dessas conferências participaram desta-
par

cados neurocientistas como Warren McCulloch; o físico Heinz von Forster;


renomados matemáticos como John von Neumann, Norbert Wiener e Walter
Pitts; filósofos como Filmer Northrop; antropólogos como Gregory Bateson
e Margareth Mead; o linguista Roman Jakobson; dentre inúmeros outros en-
Ed

genheiros, psicólogos, economistas, sociólogos, psicanalistas, fisiologistas.


são

Atualmente, o codinome, inicialmente adotado pelo grupo como Cibernética,


não é mais usado, e a expressão para ser referir a esse movimento tem sido
distinguida como ciências cognitivas ou ciências da cognição2 (GARDNER,
1985; DUPUY, 1996) que têm como ambição a edificação de uma ciência
ver

comum da mente.

1 Este trabalho foi desenvolvido durante estágio pós-doutoral na UFMG, sob a supervisão de Vera Menezes de Oliveira e Paiva.
A pesquisa contou com bolsa do CNPq, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – Brasil (Processo:
168419/2014-9). Agradeço a Vera Menezes, ao POSLIN/UFMG e ao CNPq o apoio para o desenvolvimento da pesquisa.
2 Ao longo do século XX e até a contemporaneidade, as ciências cognitivas têm fornecido modelos e estratégias
acadêmicas para se compreender os processos relacionados à cognição, impactando diversas áreas, bem como campos
que tratam do ensino/aprendizagem de línguas adicionais.
224

No âmbito das discussões da Cibernética, podemos distinguir dois


movimentos principais. A Cibernética em sua primeira fase, que se deno-
minou como Cibernética de Primeira Ordem, envidou seus esforços no
desenvolvimento de modelos e estruturas físicas com foco na comuni-
cação e no controle destes sistemas. Os pesquisadores da Cibernética de

V
r
Primeira Ordem estavam movidos pelo interesse de se modelar e desenhar

uto
máquinas de estrutura igual que poderiam comunicar-se entre si através
de sistemas lógico-matemáticos. Dessa fase da Cibernética, temos desdo-
bramentos tecnológicos importantes desenvolvidos no pós-guerra, como

R
equipamentos de engenharia eletrônica, materiais da indústria bélica e de

a
telecomunicações, próteses mecânicas para seres humanos, bem como os
primórdios da Inteligência Artificial e as ciências cognitivas em sua pri-

do
meira e mais difundida versão, o cognitivismo. A Cibernética de Primeira
Ordem toma como princípios os modelos computacionais para o entendi-
aC
mento da comunicação e o controle entre máquinas e os humanos.

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
O modelo de cognição concebido aqui se desdobra no cognitivismo
com o entendimento do conhecimento como representação de uma realidade
externa que é manipulada mentalmente em termos lógico-matemáticos. É
desta modelagem a noção de informação como algo transferido de um lugar
i
para outro e que define o que ocorre (informa) entre aquele que envia o
rev

pacote informacional e aquele que recebe. Nessa perspectiva, a forma di-


fundida de se compreender o conhecimento é a partir do isolamento da
or

razão, distinção fundamental do humano na tradição metafísica ocidental,


de quaisquer outros fenômenos3. Fruto dos debates das conferências Macy,
ara

se desdobra um outro movimento denominado de Cibernética de Segunda


Ordem, ou Cibernética da Cibernética, como autorreferenciada por um ob-
t

servador que ao observar seu sistema faz parte deste mesmo sistema. Advém
i

daqui o início da relação entre organismo e meio enquanto dinamicamente


op

em fluxo, e o observador e contexto enquanto sistemas inter-relacionados.


d

Grande parte da movimentação para a Cibernética de Segundo Ordem se


dá pelo entusiasmo do físico Heinz von Foerster e aí temos o desenvolvi-
E

mento das teorias do caos/complexidade, e da autopoiese (DUPUY, 1996).


Esse último termo o nome da hipótese explicativa cunhada por Humberto
Maturana para compreensão da organização dos seres vivos.
ver

3 A essa linha de pensamento sobre comunicação e conhecimento Reddy (1979) deu o nome de metáfora do tubo; Van Lier
(2004) e Kramsch (2002) chamaram de metáfora do contêiner, da transmissão de informações, ou do quebrador de input.
A ideia que prevalece aqui é em relação à linguagem e conhecimento e não à incorporação de elementos socioculturais,
históricos e afetivo-emocionais.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 225

A Cibernética de Segunda Ordem transfere seu foco para o entendimento


de sistemas dinâmicos complexos em fluxo contínuo de mudanças, regidos
por mecanismos de auto-organização em ambiências de fenômenos inter-
dependentes em sua constituição e desenvolvimento. Além disso, este novo
movimento passa a argumentar que o observador faz parte do sistema que

od V
r
observa. Notamos aqui o surgimento de noções sobre autorreferência, pois

uto
aquele que descreve suas observações está inserido na observação, bem como
problematizações sobre o entendimento da cognição como algo da “realidade”
que surge independentemente daquele que a conhece. Esses questionamentos

R
se deram particularmente à luz da dinâmica de seres vivos e sistemas dinâ-

oa
micos de aprendizagem em ecologias complexas, como por exemplo, expli-
citado na Teoria Geral dos Sistemas de Bertalanffy. Nesta esteira observamos
o desenvolvimento de modelos regidos pelas primeiras discussões sobre auto-
aC
-organização através de processos de retroalimentação iterativos que permitem
a estabilidade e mudança, com emissão de padrões dinâmicos.
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Assim como estou indicando, a teoria da autopoiese está diretamente


associada à Cibernética de Segunda Ordem. Durante as discussões da
visã
Cibernética nas Conferências Macy, muito se debateu acerca de processos
de retroalimentação em máquinas computacionais, o que desembocou na
ideia de circularidade causal que fundamenta conceitos como de autopoiese
em conjunto com a noção de determinismo estrutural, como veremos adiante
a re
itor

(DUPUY, 1996, p. 16-20). Neste modelo de conhecimento, interações dinâ-


micas de sistemas biológicos com seu entorno passam a ser entendidas como
perturbações, ao contrário da noção de informação (input-output) que define
e instrui o que deve ocorrer em máquinas computacionais. Os sistemas vivos
par

são determinados estruturalmente, e dependem desta estrutura dinâmica,


no operar em seus nichos ecológicos. Como nos apontam Davis e Sumara
(2006, p. 12): “em sistemas dinâmicos complexos o que é aprendido é mais
Ed

apropriadamente atribuído ao agente do que ao contexto do agente4”. Esse


é um importante ponto de distinção entre modelos oriundos da Cibernética
são

de Primeira Ordem e àqueles de Segunda Ordem. Como argumentam Davis


e Sumara (2006, p. 12): “as marcas impressas nestas páginas podem unica-
mente detonar vários aspectos da história corporal de modificações estru-
ver

turais do sistema vivo”, e as perturbações detonam dinâmicas nos sistemas


vivos que dependem de sua própria estrutura para estabelecer coerências de
ações com seu meio de interações. Esta estrutura é situada em um espaço de
relações e ações históricas.

4 Todas traduções foram feitas pelo autor.


226

Dessa maneira, tomo como foco deste capítulo a complexidade do


ensino/aprendizagem de língua adicional à luz do quadro teórico da Biologia
do Conhecer (MATURANA, 1997, 1998, 2001) bem como de sua concepção
epistemológica fundante, a teoria da autopoiese (MATURANA; VARELA,
1973; 2001). Para tanto, situo a Biologia do Conhecer no âmbito da ciber-

V
r
nética, movimento intelectual transdisciplinar de meados do século XX que

uto
fundamentou o desenvolvimento de teorias do caos/complexidade em sua
segunda fase. A Segunda Cibernética traz implicações para a compreensão
dos sistemas complexos distinta daquela concebida pela Cibernética de

R
Primeira Ordem. Ao descrever conceitos centrais da Biologia do Conhecer

a
para compreensão dos sistemas vivos em seu meio, estarei guiado pelas se-
guintes questões: Como se constitui conhecimento de uma língua adicional?

do
Como posso distinguir processos de aprendizagem de uma língua adicional?
Quais são as limitações e implicações da instrução formal no ensino e apren-
aC
dizagem de uma língua adicional? A partir destas questões, busco elaborar

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são
um panorama do que distingo aqui como complexidade biológica e sua re-
lação com o ensino/aprendizagem de línguas adicionais.

Bases Biológicas do Observador e da Complexidade


i
rev

Humberto Maturana participou das discussões desencadeadas a partir


da Cibernética nas Conferências Macy no nascedouro do que posteriormente
or

foi chamado de ciências cognitivas, como apontei anteriormente. Maturana


trabalhou diretamente com Warren McCullock a partir de meados de 1950 até
ara

o início de 1960, no laboratório de epistemologia experimental, dirigido pelo


próprio neurofisiologista no Massachussets Institute of Technology (MIT).
t

Este laboratório encontrava-se próximo do gabinete de pesquisadores li-


i

gados ao cognitivismo, como Noam Chomsky e Marvin Minsky. McCullock


op

organizou as Conferências Macy e era um irrequieto cientista que sempre


d

problematizou princípios axiomáticos. Porém, enquanto McCullock e sua


equipe problematizavam se o sistema nervoso humano poderia ser adequa-
E

damente descrito e explicado em termos lógico-computacionais, os cog-


nitivistas tomavam o modelo computacional e a lógica representacionista
como um princípio, um postulado crucial e fundador das ciências cognitivas
ver

(MAGRO, 1999, 2002). Nesta época, os pesquisadores do Laboratório de


Epistemologia Experimental trabalhavam na replicação de um experimento
de rotação do olho de anfíbios, que se regeneram facilmente, como a rã e a
salamandra. No experimento, o olho do animal é removido de sua órbita,
seccionam-se os nervos ópticos e gira-se o globo ocular em 1800, que é
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 227

depois recolocado no lugar. Logo após o olho se cicatriza e todos os nervos


ópticos se regeneram, mas a salamandra passa a lançar a língua para “cap-
turar” seu inseto com um desvio de exatamente 1800.
McCullock e seus colaboradores, incluindo Maturana, escreveram um
artigo intitulado “O que o olho da rã diz para o cérebro da rã”, no qual des-

od V
r
creviam um tipo de “sistema detector de insetos”, que funcionava de acordo

uto
com os padrões de excitação da retina e de uma rede neuronal conectada a
ela, independentemente da quantidade de iluminação. Este grupo de pesqui-
sadores procura, no artigo, descrever o trajeto dos impulsos nervosos que

R
“informam” o cérebro daquilo que a retina está “vendo”, enfatizando a ati-

oa
vidade da retina e do sistema nervoso em detrimento da intensidade de luz
que incide sobre a retina, essa uma novidade na época (Cf. MAGRO, 1999;
MAGRO, 2001; MATURANA, 1997a; MATURANA; VARELA, 2001).
aC
Refletindo sobre a resposta dada por sua equipe ao problema, Maturana
conclui, em meados de 1960 ao preparar uma palestra para Sociedade
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Americana de Antropologia, que a solução proposta isolava o animal de seu


contexto e de sua história de interações prévias. Ao fazê-lo assim, os cien-
visã
tistas atribuíam ao animal uma propriedade intrínseca, ou mesmo definida
de fora do sistema, e dessa maneira dissociada de sua história e contexto,
que passava a ser responsabilizada por algo que ocorria nas interações do
animal em seu ambiente (MATURANA, 1997a; MAGRO, 2001). Outra im-
a re
itor

portante constatação foi de que o ato de lançar a língua na direção oposta


era uma observação relacional sobre a conduta da rã, ou seja, o animal con-
tinuava a fazer o que sempre fez, sem alcançar, contudo o resultado efetivo,
pois a presa estava do lado oposto ao da sua língua, sem conseguir dar-se
par

conta disso. O anfíbio não era capaz de corrigir seu comportamento e não
era capaz de aprender. Maturana propôs então que tudo que realizamos num
meio depende de nossa biologia. Neste caso, ao alterar a estrutura do an-
Ed

fíbio, este continuava a fazer o que sempre fez em sua história de interações
prévias e correlações neuroefetoras, mas somente para os pesquisadores que
são

observavam o comportamento do anfíbio com o olho girado, a presa estava


em direção oposta à da língua lançada.
Assim, dada nossa constituição biológica, não é possível fazer refe-
ver

rência a nada que tenha uma argumentada existência independente de nós


mesmos. O observador surge ao aceitar sua biologia, que não é reduzida
unicamente a dinâmicas fisiológicas ou celulares. Chamo atenção para este
aspecto. O que distingo aqui como biologia faz referência à dinâmica de
um ser vivo em sua experiência sistêmica no viver. Não há ser vivo sem
circunstância ecológica. Somos o que somos em um meio. No caso de seres
228

humanos, o linguajar e o conhecer5 enquanto atividades constitutivas são


nossos fenômenos biológicos mais íntimos. A partir dessa reflexão Maturana
cunhou seu aforismo: “Tudo é dito por um observador a outro observador
que pode ser ele mesmo”.
Portanto, se de acordo com o experimento de rotação do olho da rã, e

V
r
da hipótese da organização autopoiética dos seres vivos, que implica num

uto
fechamento operacional dos seres vivos em contínuo acoplamento em seu
meio, não podemos fazer referência a objetos externos e independentes do
ser que os distingue e nomeia, em que consiste então uma explicação cien-

R
tífica? Maturana (2001, p. 29) afirma que as explicações científicas são re-

a
formulações da experiência com elementos da própria experiência que são
aceitas por um observador. A validade de um explicar depende de um outro

do
observador, que pode ser eu ou você, ou de uma comunidade de observa-
dores. Se a explicação proposta não é aceita, não pode ser uma explicação.
aC
Se aceitam o que estou explicando, seguimos em frente. A validade da expli-

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são
cação depende do outro. Há muitas formas de explicar o mundo enquanto há
mecanismos explicativos com coerências lógicas e observadores que podem
aceitar tais mecanismos.
Maturana (2001, p. 31) distingue, no âmbito das explicações científicas,
i
o domínio das ontologias transcendentes, ou da objetividade sem parênteses,
rev

e o domínio das ontologias constitutivas, ou da objetividade entre parên-


teses. No primeiro, a pergunta pelo observador não existe. Já que aí a exis-
or

tência precede a distinção, tudo existe independentemente do observador, e


o pesquisador desvenda uma realidade, um universo. Neste sentido é comum
ara

o aforismo “os dados revelam que...”. A realidade transcende a existência


do vivente. Tudo que existe, existe independente de mim mesmo. Ser vivo e
t

meio não são interligados aqui, um independe do outro.


i

Por outro lado, no domínio da objetividade entre parênteses, a pergunta


op

pelo observador é legítima, já que a realidade de um observador depende de


d

seu viver, suas experiências e distinções feitas na linguagem. A existência se


constitui na distinção na linguagem a partir do reconhecimento da nossa fe-
E

nomenologia biológica. Portanto, todas as distinções e explicações feitas por


um observador são sujeito-dependentes. O que o observador faz? Realiza,
inicialmente, operações de distinção. Aqui, nos perguntamos, como faço o
ver

que faço? Ao aceitar esta pergunta me adentro em um mecanismo explicativo,


pois procuro aqui explicar como faço para distinguir coisas de outras coisas
de suas relações e de quem as observa. No caminho explicativo da ontologia

5 Em sua estrutura epistemológica Maturana usa termos verbais ao invés de conceitos nominais. Essa opção tem relação
com sua concepção destes fenômenos enquanto ações dinâmicas contínuas.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 229

constitutiva, meu caminho é explicar como faço o que faço para gerar tal fe-
nômeno. A existência depende do observador, depende do que ele faz, de suas
operações e de seu agir na linguagem (MATURANA, 2001, p. 34). Isso é
indicado ao colocarmos a objetividade entre parênteses. Dentro deste domínio
distinguimos muitas realidades, cada uma dentro de suas lógicas e coerências

od V
r
operacionais explicativas que podem ser aceitas por um observador.

uto
A Autopoiese e a Dinâmica dos Seres Vivos

R
Humberto Maturana e Francisco Varela (2001), colaborador de

oa
Maturana no aprofundamento, expansão e divulgação de sua obra, nos con-
vidam a um olhar diferente do tradicional para os fenômenos constitutivos
dos seres vivos imersos na cognição e na linguagem que somos. Essa com-
aC
preensão da dinâmica biológica é feita com base na constituição da hipótese
explicativa sobre a biologia celular, feita anteriormente por Maturana, em
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que se propõem uma caracterização dos seres vivos como sistemas dinâ-
visã
micos complexos, diferentemente das máquinas lógico-computacionais, o
que era padrão no pensamento da Cibernética de Primeira Ordem. Passamos
então para a compreensão dos sistemas autopoiéticos.
Elaborada por Humberto no início da década de 1970, o conceito de
autopoiese é proposta como uma forma encontrada pelo pesquisador para
a re
itor

compreender o viver. Esta hipótese explicativa foi expandida e forma-


lizada posteriormente em um livro intitulado: “De maquinas y seres Vivos”
(MATURANA; VARELA, 1973). Esse livro procura distinguir os seres
vivos das máquinas, a partir de uma dinâmica particular de organização
par

celular que denominaram de organização autopoiética. Essa organização é


definida como uma rede operacionalmente fechada de relações moleculares
circulares em que as proteínas (DNA) produziam o RNA que por sua vez
Ed

produziam proteínas (DNA), numa atividade circular fechada. Tais relações


produzem mais e mais relações do mesmo tipo, de forma que em cadeia
são

sistêmica vão produzindo a si mesmas.


Na constituição desta hipótese explicativa, seres vivos são distinguidos
de máquinas, pois se autoproduzem (autopoiético), enquanto as máquinas
ver

são produzidas por outros (alopoiético), já que há sempre alguém que as pro-
grama, que as informa para executar uma determinada tarefa com funções
pré-estabelecidas. Maturana e Varela (1973) argumentam que os seres vivos
não têm uma finalidade específica, um propósito de ações programadas e
programáveis como as máquinas, e assim, não são igualmente passíveis de
230

instrução por outros e pelo meio. Sobre este conceito, Magro (2002, p. 32)
nos indica como esta distinção entre máquinas e seres vivos ser torna crucial
no conjunto da Biologia do Conhecer:

(De Maquinas y Seres Vivos) onde estabeleceram uma diferenciação

V
r
sistemática entre o que chamaram de máquinas alopoiéticas, feitas
pelo homem com objetivos específicos para a execução de tarefas, e

uto
máquinas autopoiéticas, como designaram então os seres vivos, cujo
mecanismo de funcionamento é caracteristicamente distinto das pri-
meiras: uma rede de relações moleculares que, ao se produzir, produz

R
os componentes e as próprias relações que o constituem. A ousadia

a
dessas ideias no início de 1970 é enorme: os autores questionaram aí
as relações causais típicas do raciocínio tradicional ocidental, a tele-

do
onomia, a dependência plantada no interior dos indivíduos por meio
aC
de mecanismos animísticos diversos (as representações inatas, os me-
canismos computacionais, os controles centrais) e ressaltaram a auto-

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nomia e a individualidade como características para as quais seria ne-
são
cessário atentarmos na explicação do fenômeno da vida. Ressaltaram
ainda a estrutura dinâmica e contingente desses seres, determinante,
a cada instante, daquilo que eles podem fazer, dizer, conhecer, des-
crevendo assim a fenomenologia do vivente em termos recursivos,
i
rev

dinâmicos e processuais.
or

Aspectos Centrais da Biologia do Conhecer

Com base na constituição de hipóteses sobre o viver e o fazer do pes-


ara

quisador enquanto um observador, Maturana continua na década seguinte


t

(1980) a gerar um mecanismo explicativo para o fenômeno do conhecer,


para o próprio fazer científico, os fenômenos sociais, para a linguagem, para
i
op

as dinâmicas mentais, culminando na autoconsciência e impactos para as


d

relações humanas e domínio da ética. Esse conjunto de ideias, publicadas


em artigos distintos, foram reunidos na obra Árvore do Conhecimento, de
Maturana e Varela (2001), que nos oferece um aparato epistemológico para
E

explicar nossa experiência e o conhecer como reformulação dessa experi-


ência na linguagem. A Biologia do Conhecer está baseada em uma biologia
ver

que considera o ser vivo como um sistema de relações autopoiéticas, com


um sistema corporal determinado estruturalmente, com sistema nervoso
operacionalmente fechado a informações (input/output) que possam instruir
o sistema, abertos à energia e em contínuo acoplamento estrutural no meio,
o que conserva o funcionamento de relações autopoéticas, que por sua vez
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 231

gera o viver6. Esta dinâmica é fruto de uma prolongada história filogenética


– a história da espécie - que é reconstruída através de cada história ontoge-
nética – a história de desenvolvimento do ser vivo no meio -, num modo de
vida particular que resulta no ser vivo que observamos7.
A partir da noção de determinismo estrutural, observa-se que mu-

od V
r
danças ocorridas nos sistemas vivos são determinadas a cada instante por

uto
sua própria estrutura e dinâmica de estados em conservação do acoplamento
estrutural. Na Biologia do Conhecer a coadaptação estrutura viva-meio (o
acoplamento estrutural) é uma invariável e condição de continuidade cir-

R
cular do organismo vivo. Sem acoplamento estrutural, o sistema vivo deixa

oa
de existir, e cessam os processos autopoéticos. Nossa história ontogenética
é um fluir dinâmico de interações recorrentes em permanente adaptação e
congruência num meio de ações específico, o acoplamento estrutural. Ainda
aC
aqui, a ontogenia contínua dos sistemas vivos é a marca mais contundente
da complexidade inerente a esses sistemas. Como Davis e Sumara (2006,
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13) argumentam em consonância com essas ideias: “a aprendizagem é uma


questão de transformações contínuas no aprendiz e simultaneamente em seu
visã
meio físico e comportamental, o que em termos biológicos quer dizer mu-
danças estruturais dos sistemas”.
Como venho indicando, nosso ponto de partida é a dinâmica celular que
fundamenta e se expande em uma dinâmica corporal que se encontra e um
a re
itor

permanente fluir de mudanças estruturais em sintonia com transformações


em um meio de relações. Torna-se ausente aqui a dependência na noção de
representação mental, ou de qualquer outro intermediário epistemológico
que faça uma mediação entre o mundo e o ser que conhece. Recoloca-se
par

a questão do conhecer enquanto agir ao argumentar que nossas interações


num meio particular geram perturbações que podem desencadear mudanças
estruturais na dinâmica de relações neuro-efetoras do corpo, congruentes
Ed

com transformações nos domínios de comportamento. Dessa maneira,


nossa fisiologia e nosso domínio de ações relacionais em um meio fluem
são

juntas, de maneira estruturalmente acoplada, embora estes sejam domínios


ver

6 Fechamento operacional não é um conceito físico (sistema se mantém aberto ao fluxo de energia e matéria – se não as
células morrem) – mas caracterizam um funcionamento autrreferecial das dinâmicas internas do sistema nervoso. Estados
de atividades do sistema nervoso sempre levam a outros estados de atividade e são disparados por estados de atividade – e
toda essa dinâmica de mudanças nos estados de atividade permanecem como rede de elementos neuronais.
7 A expressão de uma argumentação circular tem relação com a fenomenologia circular dos sistemas cibernéticos de
segunda ordem. Ainda, conforme Magro (2012, p. 16) argumenta, a Biologia do Conhecer (BC) não escapa da crítica de
Dupuy (1996) sobre o insulamento proposital dos cibernéticos e suas estruturas conceituais. Maturana trabalha sempre
com os mesmos conceitos em uma estrutura recursiva e que recusa o uso de vocabulário de modelos causais-lineares
associados à primeira fase da cibernética. Em uma primeira leitura costumamos ter um estranhamento com a construção
discursiva da BC.
232

operacionalmente distintos (Cf. Figuras 1, 2 e 3 mais adiante). Cognição é


ação efetiva e congruência operacional em domínios de ações distintos, num
fluir de mudanças estruturais dinâmicas.
Assim, a Biologia do Conhecer rompe com um entendimento que postula
que o meio ou os outros realizam transmissão de informações, que geram em

V
r
nós as representações necessárias para lidarmos cognitivamente com nossos

uto
contextos. Além disso, a relação de transformação mútua e contínua entre
fisiologia e meio, supera as dicotomias tão caras ao pensamento da meta-
física ocidental (corpo/mente, emoção/razão; essência/aparência...), em que a

R
Cibernética de Primeira Ordem e o cognitivismo são articulados. A Biologia

a
do Conhecer toma fenômenos não quantificáveis como a emoção, a história,
a experiência, como fundamentais para compreensão das mudanças contínuas

do
que ocorrem em sistemas vivos. As emoções, definidas como disposições cor-
porais que modulam nossas ações estão relacionadas às dinâmicas cognitivas
aC
e linguísticas e são fundamentais nos processos de aprendizagem.

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são
Maturana e Varela (2001, p. 89) propõem, através da noção de fecha-
mento operacional do sistema nervoso, que seu operar não pode ser nem
representacional – como cópia da realidade, nem solipsista – interno, sub-
jetivo. O sistema nervoso opera através de uma rede de correlações circu-
i
lares, e é a dinâmica histórica deste sistema que especifica que perturbações
rev

podem desencadear mudanças em sua dinâmica de correlações internas. O


sistema nervoso opera através do desencadear de mudanças estruturais nas
or

relações de estados da rede de conexões neuronais a partir de perturbações


geradas em sua dinâmica de estados em interações no meio. Deste modo,
ara

definir o sistema nervoso como sistema que processa informações como as


máquinas, com entradas (input) e saídas (output), as armazena e as acessa,
t

como um computador, não seria possível do ponto de vista biológico. Não


i

há, neste sentido, interações instrutivas com o meio, mas uma congruência
op

operacional, uma coordenação comportamental adequada (aos olhos de um


d

observador), num domínio de acoplamento estrutural no meio em que se


vive. Nessa dinâmica, um observador especifica e estabelece as relações que
E

compõem um determinado sistema em jogo interdependente no momento


em que se especifica.
Assim, Maturana (2001) aponta, de maneira lúdica, que a única in-
ver

teração instrutiva que conhecemos no ocidente é o toque do rei Midas, já


que tudo o que ele toca vira ouro, independente da estrutura tocada. Dito
em outras palavras, o rei Midas é o único capaz de informar (dar forma) a
estrutura de um ser vivo. Para Maturana este tipo de interação não se aplica
à constituição e organização dos seres vivos autopoiéticos. Um organismo
desenvolve sua ontogenia, sua história de interações num meio com outros,
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 233

com a condição de conservação de sua congruência com o meio (acopla-


mento estrutural) e consequente conservação da dinâmica autopoiética.
Assim como indiquei anteriormente, o conhecer como um fenômeno bio-
lógico é uma constante dos seres humanos que se entrelaça a atividades de
linguagem e emoções. Daí vem o aforismo: viver é conhecer e conhecer é

od V
r
viver. Desse modo, Maturana postula que, como seres vivos, vivemos simul-

uto
taneamente em dois domínios distintos: o domínio da fisiologia e o domínio
do comportamento ou das interações, como mostram as figs. 1 e 2 abaixo,
reproduzidas de Maturana (1997b, p. 215- 218):

R
oa
aC Figura 1 – Domínios explicativos
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visã
Fonte: MATURANA (1997b, p. 215- 218)

Figura 2 – Ser vivo e meio


a re
itor
par
Ed

Fonte: MATURANA (1997b, p. 215- 218)


são

Esses domínios são distintos operacional e processualmente, mas estão


inter-relacionados de uma maneira imbricada. Notem nas figuras que o
sistema vivo está circularmente fechado a suas correlações igualmente cir-
ver

culares e o meio se dá em um contorno estruturalmente acoplado com a


estrutura do ser vivo. Assim, não devemos estabelecer uma visão reducio-
nista e isomórfica reduzindo um domínio ao outro, nem postulando a trans-
ferência causal-linear (input/output) de elementos de um para outro, já que
suas dinâmicas são distintas e estruturalmente determinadas. Logo, tudo o
que fazemos em nossas interações num meio em que estamos modifica o
234

fluir dinâmico do organismo, podendo definir o modo como funcionam as di-


ferentes partes do nosso corpo, incluindo nosso sistema nervoso, proporcio-
nando a realização das atividades. Muda-se a estrutura do corpo, muda-se a
dinâmica de relações possíveis no meio8. O determinismo estrutural implica
que estados que um organismo experiencia não podem ser determinados por

V
r
uma instrução de seu meio (input), mas somente pela dinâmica dos compo-

uto
nentes e relações entre tais componentes de sua estrutura, momento a mo-
mento com mudanças contínuas graduais e emergentes abruptas.
Em outras palavras, a história de vida de um ser vivo é um fluir inin-

R
terrupto de mudanças estruturais num meio, em uma constante deriva on-

a
togênica e permanente coadaptação. A fig. 3 ilustra nosso fluir ontogênico
dinâmico de mudanças estruturais acopladas num meio (MATURANA,

do
1997b, p. 217):
aC
Figura 3 – A deriva ontogênica

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são i
rev
or
ara

Fonte: MATURANA (1997b, p. 217)


t

Tal mecanismo explicativo para o conhecer sugere que o ensino e a


i
op

aprendizagem são ações que se dão através de mudanças estruturais desen-


d

cadeadas a partir de perturbações que são geradas pelos que ensinam e pelos
que aprendem em reciprocidade mútua (aquele que aprende também ensina)
E

e que estes sistemas em interação determinam em último caso como estas


perturbações e condições emergentes afetarão seus próprios sistemas. Como
não somos máquinas que podem ser informadas por instruções do meio, as
ver

transformações dependem do que emerge nestes domínios operacionais,


o que Davis e Sumara (2006) se referem, por exemplo, como pedagogia
8 Há uma diversidade de casos na literatura que registram como mudanças em nossa corporeidade, seja desde condições
iniciais, bem como acidentes que modificam o corpo e seu sistema nervoso, causam a emergência de novas realidades
dependentes nestas estruturas. Obras interessantes que posso citar, por exemplo, são: O Erro de Descartes de Antonio
Damasio e os diversos livros de Oliver Sacks como Um Antropólogo em Marte; O Homem que Confundiu sua Mulher com
um Chapéu e Tempo de Despertar.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 235

da transformação. Estes autores conclamam noções que possam auxiliar a


compreender estes processos de transformações como dança estrutural de
sistemas9, coemergência, codependência, estabelecimento de domínios con-
sensuais e especificação mútua.

od V
r
Implicações da Deriva Ontogênica e o Linguajar

uto
Ao interagir com uma língua adicional, entra-se em um certo domínio
de ações e vai-se transformando nesse meio, constituindo o que a Biologia

R
do Conhecer distingue como deriva ontogênica ou transformação na convi-

oa
vência. Para a Biologia do Conhecer, é cara a noção que nos transformamos
com outros através de convivência prolongada realizando ações coordenadas
e conjuntas proximamente. Aprendemos a ser alunos num determinado do-
aC
mínio de interações no qual entramos. Transformamos-nos com nossos pro-
fessores, colegas e artefatos tecnológicos quaisquer que geram interação e
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operações consensuais – de convivência interativa prolongada. Nas próprias


visã
palavras de Maturana “a aprendizagem é um comentário que um observador
faz das transformações estruturais ao olhar um processo histórico do começo
ao momento em que se olha” (MATURANA, 2001, p. 26). A aprendizagem
toma forma de uma expressão de distinção feita por um observador, que
significa um fluir dinâmico e histórico, congruente com o domínio das inte-
a re
itor

rações nas quais efetivamente participamos.


Neste âmbito a linguagem tem papel fundamental. Enquanto seres
humanos, vivemos imersos no linguajar enquanto atividade linguística. A
explicação se dá na linguagem. O que se distingue como si mesmo se dá na
par

linguagem. Reitero que experiências são descritas na linguagem e o obser-


vador surge ao aceitar minha biologia. O modo de vida humano tem origem
nas interações recorrentes e consensuais (de convivência frequente) entre
Ed

grupos de hominídeos caçadores e coletores de grãos, nozes e sementes que


compartilhavam sua comida e se ocupavam uns com os outros, o que de-
são

mandava uma série de ações mutuamente coordenadas. Nesse sentido, a lin-


guagem como coordenações de coordenações consensuais de conduta, num
entrelaçamento de emoção e razão, tem sua origem na origem do modo de
ver

viver humano. O linguajar se dá como um operar em um espaço de ações


mútuas coordenadas. Maturana (2001, p. 24) sugere que o linguajar, assim
como outras atividades que executamos no domínio do comportamento,
modula nossa fisiologia e ao mesmo tempo é por ela especificada. Dessa

9 Esta imagem foi projetada em uma obra de Claire Kramsch sobre aquisição de línguas (KRAMSCH, 2002) em que
apresenta perspectiva ecológicas para aprendizagem de línguas.
236

maneira, a dinâmica conversacional constitui-se como um fluir operacional


de ações consensuais, de maneira não linear, contingente e mutuamente
orientadora. Essas dinâmicas incluem gestos, posturas, olhares, entonação,
e inflexão de voz que podem ser tomadas como significativas no curso de
coordenações de ações.

V
r
Maturana e Varela (2001) definem a distinção como o mecanismo ope-

uto
racional cognitivo básico de um observador. Vivemos em uma interobjeti-
vidade, ou seja, num espaço relacional e comportamental de distinções entre
objetos e pessoas. No ato de distinguir, destacamos uma certa unidade do

R
fundo em que ela está. Ao fazê-lo, especificamos figura e fundo ao mesmo

a
tempo, e acabamos por dar ênfase àquilo que escolhemos para constituir
nossa figura, negligenciando o fundo, que distinguimos também. Assim, os

do
objetos surgem nos espaços consensuais de distinções de distinções e de
coordenações de coordenações de ações como elementos que distinguem
aC
um elemento de outro e coordenam uma ação com outra. Dessa maneira,

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são
através de operações de distinção, vamos estabelecendo a diferença da di-
ferença, a distinção da distinção. A partir destas primeiras operações de dis-
tinções, concatenamos com outros uma coordenação de uma ação anterior
com elementos que distinguimos na linguagem, a uma posterior e assim
i
coordenando ações de ações consensuais, dando origem a textos e a teias
rev

discursivas, entrelaçando o conversar e o emocionar no linguajar.


Desta maneira, ao nomear objetos, ações e relações, e ao descrevê-
or

-los das mais diversas maneiras, vamos ao mesmo tempo fazendo coisas
com esses objetos e ações, construindo domínios de ações consensuais
ara

mútuas com outros na linguagem, definindo relações e coordenando ações


específicas num determinado domínio de ações. Através destes processos de
t

distinção e configuração de coordenação de coordenação de ações, vamos


i

construindo atividades em determinados domínios de realidade que, a longo


op

prazo, e através de contínua recorrência e momentos de recursão, certas es-


d

tabilidades de coordenação de coordenação de ações vão se configurando


numa rede de relações comportamentais discursivas e de textos prévios.
E

Biologia do Conhecer e Ensino/Aprendizagem de Línguas Adicionais


ver

A partir da Biologia do Conhecer, o conhecer uma língua adicional é


constituir um comportamento adequado, num meio interacional específico,
distinguido por um observador ou por um grupo de observadores (usuários da
língua, professores..). O conhecimento de uma língua adicional se constitui na
dependência do domínio da fisiologia, através de mudanças contínuas nas di-
nâmicas de correlações do sistema de corporal, embora não se reduza a ele nem
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 237

se localize nele. No domínio da conduta, o conhecimento de uma língua adi-


cional é configurado como ação efetiva e adequada daquele que aprende e usa
essa língua em interação com outros num meio operacional específico distinto
da primeira língua (mas se apoiando nela), através de distinções de distinções
e coordenação de coordenação de ações recorrentes, prolongadas e recursivas,

od V
r
estabelecendo aí um domínio pragmático de operações que um observador

uto
pode distinguir, posteriormente ao uso, como comunicação simbólica.
O comportamento adequado é a expressão de um fluir dinâmico estru-
tural histórico de um organismo em congruência com o meio interacional em

R
que se vive, fala e conhece. Logo, o comportamento adequado é um comen-

oa
tário de um observador (que pode ser um professor ou você mesmo) sobre o
fluir dinâmico de um organismo, em domínios de ações particulares. Assim,
a aferição do conhecimento depende do domínio de ações especificado pelo
aC
observador ao fazer sua pergunta, e do que ele e sua comunidade de obser-
vadores consideram como um comportamento adequado naquele domínio de
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ações e operações por eles especificados como adequado.


Os processos de aprendizagem de uma língua adicional dão-se como
visã
fruto da plasticidade estrutural dos organismos autopoiéticos. Assim, tais
processos ocorrem como um fluir dinâmico estrutural de um organismo em
congruência com outros organismos num meio particular de interações que
emergem perturbações que podem detonar operações num domínio de co-
a re
itor

ordenações consensuais de ações – o fazer linguagem. O desenvolvimento


de uma língua adicional é um processo que se dá no domínio das ações
e das relações consigo mesmo e com outros, e como tal se desenvolve na
dinâmica de atividade comportamental e consensual de seus participantes,
par

embora dependa de sua dinâmica estrutural corporal para ocorrer (seu de-
terminismo estrutural). Portanto, para que ocorra o que um observador pode
distinguir como o funcionamento de uma língua adicional, é necessário que
Ed

encontros recorrentes num campo operacional aconteçam por um período su-


ficientemente prolongado. Retomo que consenso, aqui, não significa acordo
são

explícito, mas a participação efetiva num domínio de ações num modo par-
ticular de convivência.
O processo de desenvolvimento linguístico é pessoal e contingente. Os
ver

organismos vão se transformando juntos, mas de maneiras diferentes, a partir


de suas interações contingenciais, havendo variações. A efetividade deve ser
atribuída a processos históricos de desenvolvimento de um aprendiz, eficaz
ou não em seus procedimentos e operações linguajeiras, num determinado
meio de interações em que se insere, tendo em mente o determinismo estru-
tural, a plasticidade orgânica daqueles que aprendem, as ontogenias (prévias
e em curso) dos aprendizes da língua e seu professor ou artefato tecnológico,
238

o determinismo estrutural e também o momento estrutural do aprendiz num


meio. Como o que pode detonar transformações em um aprendiz pode não
ser para o outro, e como na sala de aula o resultado do aprendizado vai
depender das dinâmicas propostas e das interações efetivas e variáveis dos
aprendizes com as mesmas, tanto a diversidade quanto a similaridade dos

V
r
processos de ensino e aprendizagem de uma língua adicional são esperadas.

uto
A consensualidade de atividades deve ir de encontro ao domínio de distinções
de distinções, de coordenações de coordenações de ações e de domínios re-
cursivos, pragmáticos e interativos. Elementos do sistema distinguidos pelo

R
professor como aqueles que tendem a expandir ou restringir a transformação

a
dos sistemas com vistas à emergência de novas formas de organização em
níveis de complexidade mais elevada devem ser observadas.

do
A instrução formal em sala de aula concebida como transmissão de
informações, é radicalmente questionada na perspectiva biológica da com-
aC
plexidade de sistemas. Como venho argumentando, a transmissão, nem

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são
internalização de informações e uma mente abstrata ou corporificada no
sistema nervoso dos aprendizes é possível. Tampouco temos aqui o desdo-
bramento de uma gramática nuclear inata que passa a receber parâmetros
diferenciadores periféricos do input de uma língua adicional. A instrução
i
formal destina-se a criar um espaço de convivência particular, estabelecendo
rev

um domínio de interações específico, no qual convivemos com outros, que


favoreça interações pragmáticas e dinâmicas no âmbito das distinções de dis-
or

tinções e coordenações de coordenações de ações consensuais, recorrentes e


recursivas. O papel do professor é crucial no estabelecimento de um domínio
ara

de interações e de convivência, no qual as dinâmicas corporais, como as


emoções e o momento estrutural dos indivíduos sejam favoráveis e promo-
t

tores de encontros entre alunos que coordenam distinções e ações consen-


i

suais no linguajar, assim, sendo possível promover transformações em suas


op

dinâmicas de ações e dinâmicas corporais internas. A aprendizagem não é a


d

captação ou a apreensão de algo externo que é representado no sistema, mas


sim o transformar-se num meio particular de interações e ações recorrentes,
E

recursivas e consensuais na linguagem. Conhecer é agir.


Sistemas dinâmicos biológicos não podem ser informados por input, que
especifica o que vai acontecer com o organismo aprendente. Dessa maneira, o
ver

que se experimenta na aprendizagem de uma língua adicional é uma modulação


da fisiologia do organismo, no âmbito das interações operacionais no domínio
do ensino e aprendizagem de uma língua adicional, que podem desencadear
mudanças estruturais no meio e no ser vivo em dinâmica e danças estruturais
nos sistemas que os movimentem para frente, para níveis de maior comple-
xidade estrutural e operacional. Portanto, não há garantias, nem especificações
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 239

anteriores às atividades realizadas pelos aprendizes, num domínio particular


de ações por eles mesmos especificados (é o agente que especifica seu meio –
sujeito-dependente). Nesse sentido pode-se fazer valer o aforismo: nem tudo
que se ensina é aprendido, nem tudo que se aprende é ensinado.
Assim, as interações recorrentes e particularmente as recursivas – que

od V
r
geram padrões novos - podem modular dinâmicas entre organismos e seu

uto
nicho ecológico. Essa possibilidade depende da própria estrutura do orga-
nismo da qual participam as emoções, a linguagem, a identidade, a cognição,
de maneira interdependente e em reciprocidade mútua. Num espaço de in-

R
terações particulares, o emocionar tende a modular o curso de ações de um

oa
agente, assim como as consequências em termos de aprendizagem para os
aprendizes ali envolvidos (ARAGÃO, 2011).
O que um observador pode distinguir como a gramática e o léxico
aC
emerge nas prolongadas interações recorrentes, no âmbito das distinções de
distinções de objetos e sentidos e das coordenações de coordenações de ações
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consensuais. Todo o operar relacional de ir e vir produz uma gramática. Essa


gramática, configurada como a concatenação processual de ações, emerge
visã
do processo e esforço de uma determinada coordenação de coordenação de
ações com outros num determinado domínio de ações, de maneira depen-
dente de um certo padrão de correlações de atividades da rede neuronal, fe-
chada em si mesma. Assim, é necessário que ocorra um determinado fluxo de
a re
itor

coordenações de coordenações de ações para surgir uma maneira específica


de coordenação regular de ação que vai atender a um determinado fluxo de
coordenação de coordenação de ações. O sentido semântico das interações
assim como a gramática envolvida nessas interações são distinções secun-
par

dárias de um observador, que são configuradas conjuntamente nos fluxos


recorrentes de coordenações de coordenações de ações. O sentido não está
nas palavras e nem nas funções gramaticais, mas nos fluxos de coordenações
Ed

de coordenações de ações pragmáticas entre os interlocutores envolvidos, e


é especificado a posteriori de acordo com as consequências do seu fluir in-
são

teracional e a partir a emergência de sentido pelos observadores envolvidos.


Como vimos, a Biologia do Conhecer se constitui como um mecanismo
explicativo sobre conhecer dos seres humanos, oriundos da operação dos
ver

mesmos como seres vivos autopoiéticos, envolvendo reflexões voltadas para


a natureza do conhecer, para as explicações científicas e para complexidade
dos sistemas vivos. As consequências desta maneira de compreender os fe-
nômenos da linguagem, da cognição, da emoção e do social são engenhosas
para o ensino/aprendizagem de línguas adicionais na perspectiva da comple-
xidade de sistemas e foram introduzidas aqui neste capítulo.
E d
ver

i t or op
ara aC
rev
i são R V
do
a uto
r
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CAPÍTULO 11

INTERFACES ENTRE A ABORDAGEM


COMPLEXA E O BILINGUISMO

od V
r
MULTIDIMENSIONAL NA

uto
EDUCAÇÃO DE SURDOS

R
oa
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)
Eliziane Manosso Streiechen (UNICENTRO)

Introdução
aC
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Desde o reconhecimento da língua de sinais (LS) como língua natural


das pessoas surdas na década de 1960, com os estudos do linguista norte-
visã
-americano Willian Stokoe, cresce o interesse de pesquisas na LS em contato
com áreas de estudo da linguagem já consolidadas como a sociolinguística,
a psicolinguística e a linguística aplicada, por exemplo. Principalmente, há
um despertar pela forma como a LS opera, como sua gramática se organiza,
como o processo de ensino e de aquisição/aprendizagem de língua materna
a re
itor

(L1) e segunda língua (L2) se realizam.


Contudo, para que a LS fosse legitimada, foram necessárias intensas
lutas e movimentos da comunidade surda. O Congresso de Milão, realizado
em 1880, foi um marco negativo nesse contexto, tendo reunido professores
par

de vinte e sete países para o debate sobre a reabilitação do surdo em di-


reção à “normalidade” (GOLDFELD, 2002). Compactuando com a visão
aristotélica de linguagem como condição para a humanização do indivíduo
Ed

(relacionando audição com capacidade de adquirir conhecimento), a prin-


são

cipal finalidade do evento foi a de abafar o movimento gestualista crescente


na França, condenando o uso da LS na educação de surdos em favoreci-
mento da abordagem oralista (já amplamente desenvolvida na Alemanha).
Objetivava-se desenvolver a fala dos surdos, pois se entendia que o do-
ver

mínio da língua oral era condição determinante para que esse sujeito fosse
aceito dentro da sociedade majoritária (STREIECHEN, 2013). O Congresso
de Milão revelou que, para uma parcela significativa da sociedade, era o
surdo que deveria se adaptar à língua oral predominante, contudo sem pro-
curar compreender as dificuldades implicadas nesse processo de oralização.
242

Acreditava-se, à época, que “[...] o desempenho escolar do surdo só se com-


preendia e podia ser mensurado a partir de suas habilidades de oralização ou
mesmo de realização de leitura orofacial” (SILVA, 2008 apud NOGUEIRA;
SILVA, 2014, p. 136).
Todavia, com o insucesso do oralismo, surge nos Estados Unidos, em

V
r
1970, o que se convencionou chamar filosofia da comunicação total. Nessa

uto
abordagem, previa-se o uso livre de quaisquer estratégias e/ou recursos que
resultassem em comunicação ou o seu desbloqueio; o que fez emergir uma
prática bimodal simplificada, ou seja, o uso de uma língua oral sinalizada

R
e sem gramática própria. Com as críticas a essa modalidade que, como o

a
oralismo, não enxergava a LS como uma língua natural, a abordagem bi-
língue emerge como a mais adequada na educação de surdos já ao final da

do
mesma década, na Europa. O bilinguismo fortalece o enfoque da aquisição
da LS como L1 e de uma língua escrita como L2. Dessa forma, a educação
aC
bilíngue do surdo passa a significar “que a linguagem gestual natural da

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são
criança é modelada e esperada que seja o primeiro idioma e principal meio
de comunicação1” dessa criança, sendo a LS também “a linguagem em sala
de aula e a que fornece uma ponte para a alfabetização na comunidade de
ouvinte da língua falada” (SWANWICH, 2015, p. 2). Tendo em vista o fra-
i
casso das metodologias antecedentes, o bilinguismo na educação do surdo
rev

volta-se para as pesquisas no campo de aquisição de L1/L2 e dos métodos e


abordagens de ensino língua estrangeira (LE)/L2. Por outro lado, do ponto
or

de vista filosófico, segundo Swanwich (2015), a educação bilíngue “se es-


força em direção aos objetivos humanitários e democráticos de inclusão e
ara

diversidade social” (p. 2).


A história da educação de surdos, como sistematizada acima, revela sua
t

fundamentação em dois momentos ou paradigmas distintos: (1) visão carte-


i

siana do sujeito representado no cogito ergo sum2, o sujeito uno, homogêneo,


op

centrado, indivisível, individual, em que o reconhecimento da diferença não


d

implica na sua aceitação (SIGNORINI, 1998), com uma concepção linear,


mecanicista, de causa e efeito, do processo de construção do conhecimento;
E

(2) visão pós-moderna do sujeito, representado pelo que se entende ser o


sujeito bakhtiniano, dialógico, emergente, em constante (trans)formação,
multifacetado, social, complexo (SIGNORINI, 1998), cuja identidade é
ver

fractalizada (SADE, 1999), com uma concepção sistêmica, não linear, auto-
-organizável do processo de construção do conhecimento. No primeiro mo-
mento, o surdo é o sujeito patológico, diagnosticado com uma deficiência

1 Esta e outras traduções neste capítulo são de nossa responsabilidade.


2 Penso, logo existo.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 243

auditiva, que precisa de reabilitação para se integrar à sociedade ouvinte


majoritária, constituindo-se, assim, como um cidadão – visão subjacente à
educação oralista, sobretudo, e à filosofia da comunicação total. No segundo
arcabouço, o surdo é reconhecido como pertencente a um grupo minoritário,
com cultura e língua próprias, um sujeito que se constrói sócio-historica-

od V
r
mente, o sujeito surdo – emergente na educação bilíngue.

uto
No contexto brasileiro, a Língua Brasileira de Sinais (Libras) foi oficia-
lizada somente em 2002, por meio da Lei Nº 10.436 (BRASIL, 2002), sendo
que o principal interesse pelo seu reconhecimento estava atrelado aos cons-

R
tantes fracassos e evasão escolar dos alunos surdos por não conseguirem

oa
adquirir conhecimentos por meio da oralidade. Nesse cenário, a educação
bilíngue já se fazia presente, de forma incipiente, todavia, desde o final da
década de 1980, consolidando-se nas décadas seguintes. Com isso, surgem
aC
estudos (SALLES et. al., 2004; CAMPOS, 2009; ALBRES; OLIVEIRA,
2013; SOUSA, 2014) que discutem a similaridade e/ou afiliação da meto-
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dologia bilíngue com teorias e/ou hipóteses interacionistas de ASL, como a


Hipótese da Interação de Michel Long e a Teoria Sociocultural de Vygotsky;
visã
ainda, vinculam o bilinguismo ao ensino comunicativo de línguas.
Neste capítulo, visamos promover uma discussão que mostre que a abor-
dagem bilíngue na educação de surdos, em sua concepção multidimensional
do fenômeno (nomeada, aqui, bilinguismo multidimensional), vai além da
a re
itor

interface com teorias interacionistas de aquisição de segunda língua (ASL)


e com a abordagem comunicativa, envolvendo outras hipóteses e modelos
(nativistas e comportamentalistas), bem como princípios de outras abor-
dagens de ensino de línguas – alinhando o bilinguismo multidimensional
par

à abordagem complexa. Para isso, apresentaremos os princípios e funda-


mentos das abordagens mais significativas que permeiam a educação dos
surdos (oralismo, comunicação total e bilinguismo); bem como exporemos
Ed

os pressupostos das principais abordagens de ensino de L2/LE (gramatical,


instrumental, comunicativa, comunicacional, dialógica e complexa) e suas
são

relações com teorias/hipóteses de ASL.

1 Abordagens na Educação de Surdos


ver

Por longos anos na história da humanidade, as pessoas surdas, assim


como outras que nasciam com algum tipo de necessidade especial, foram
cruelmente desprezadas e descartadas da sociedade. Como salienta Sassaki
(2006, p. 30), “[a]lgumas culturas simplesmente eliminavam as pessoas com
deficiência, outras adotaram práticas de interná-las em grandes instituições
de caridade, junto com doentes e idosos”. Pelo fato de os surdos não falarem,
244

eram julgados como seres impensantes, incapazes, os quais poderiam ‘con-


taminar’ a sociedade, tornando-se um peso para as famílias e comunidades.
Com base na filosofia aristotélica, acreditava-se que o pensamento seria con-
cebido somente por meio das palavras e a principal referência era a própria
Bíblia “No princípio era o verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era

V
r
Deus” (BÍBLIA, João 1, 1).

uto
Nessa atmosfera, os surdos foram privados de receber qualquer tipo de
educação, uma vez que não se acreditava na possibilidade de seu desenvol-
vimento intelectual e moral. Com o passar do tempo e com a evolução da

R
medicina e das pesquisas, a visão sobre o sujeito surdo também vai se trans-

a
formando. Assim, a partir do século XVI, principalmente na Europa, surgem
os primeiros educadores, tais como Pedro Ponce de Leon (1520-1584), Ivan

do
Martim Pablo Bonet (1620), entre outros, os quais se utilizam de diferentes
técnicas de ensino (alfabeto manual, códigos visuais, linguagem oral e a
aC
própria LS). No século XVIII, o alemão Sammuel Heinicke, principal de-

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são
fensor do oralismo, afirma que “sem palavra não há humanidade”, difun-
dindo suas ideias por todo o mundo, culminando no Congresso de Milão
em 1880. Em contrapartida, desafiando as dificuldades, o francês Charles
Michel de L’Épée (1712-1789) defendeu a LS como a língua natural e ma-
i
terna dos surdos, postulando que, por ser uma língua gestual-visual, torna-
rev

-se um verdadeiro meio de comunicação e desenvolvimento do pensamento


para as pessoas surdas (STREIECHEN, 2013). Entretanto, com a dissemi-
or

nação das decisões do Congresso de Milão, a maioria dos países optou por
implantar a abordagem oralista na educação dos surdos, ocasionando um
ara

intenso sofrimento e uma resistente barreira na comunicação e na aquisição


de conhecimentos por esses sujeitos. Proibidos de usar a sua língua natural
t

(LS), milhares se surdos passaram a enfrentar várias dificuldades, carac-


i

terizando-se, em seus diferentes aspectos, como uma agressão que atinge,


op

magoa e deixa profundos vestígios de forma física, social, ética, psíquica e


d

moral nessa comunidade minoritária (STREIECHEN; ZYCH, 2015).


Como consequência das técnicas oralistas, os surdos não aprenderam a
E

falar, exceto algumas palavras que eram repetidas de forma mecânica sem
saber o que elas realmente significavam; não receberam uma educação efetiva,
resultando em milhões de surdos analfabetos. Os surdos, que passaram por
ver

essa abordagem, trazem marcas negativas em suas vidas até os dias atuais.
Com o fracasso do oralismo, os surdos permaneceram durante um século
sem comunicação e à mercê das pesquisas que tinham como alvo apenas a
“orelha” do surdo e não o sujeito como um todo (STREIECHEN; KRAUSE-
LEMKE, 2014). Há de se enfatizar que esse século em que os surdos foram
submetidos ao oralismo, foi o período do auge econômico para as fábricas
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 245

de Aparelho Amplificador Sonoro (AAS) (conhecido também como prótese


auditiva), bem como para os consultórios fonoaudiólogos – responsáveis
pela terapia da fala. Assim, após os exames (audiometria/impedanciometria/
bera e outros) os quais serviam para diagnosticar a surdez e o grau da perda
auditiva, os professores precisavam orientar as famílias a submeter a criança

od V
r
ao uso constante do AAS e encaminhá-la às sessões de terapia de fala, reali-

uto
zadas em consultórios particulares de fonoaudiologia, em centros de surdez
ou ainda nas próprias escolas especiais. Apesar de se constatar, a partir dos
próprios depoimentos dos surdos, que a abordagem oralista não é a mais

R
apropriada para a educação de surdos, ainda hoje existem escolas brasileiras

oa
que insistem em trabalhar com esse método. Segundo Streiechen e Krause-
Lemke (2014, p. 959), “[e]ssas escolas priorizam o desenvolvimento da ora-
lidade e da audição, como se isso fosse um pré-requisito para a alfabetização
aC
do sujeito surdo e sua inserção na sociedade”.
Para que se possa entender os motivos pelos quais se torna extrema-
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mente difícil uma pessoa surda conseguir falar é necessário que se com-
preenda o desenvolvimento da fala em ouvintes e surdos. Streiechen e
visã
Krause-Lemke (2014, p. 962) explicam que uma pessoa ouvinte aprende,
fundamentalmente, pelo canal auditivo, relacionando as palavras aos fo-
nemas apresentados a ela. Portanto, todo vocabulário que um ouvinte ad-
quire é processado, prioritariamente, pelo canal auditivo. Contudo, ao longo
a re
itor

de todo esse processo, ocorrem, também, pistas visuais por meio das quais
ele tem a oportunidade de observar os usos e as funções em determinados
objetos, além de ouvir seus nomes, com frequência. Ou seja, desde bebê, a
criança ouve seus pais, parentes, vizinhos, o rádio, a televisão entre outros. À
par

medida que vai crescendo, consegue distinguir os significados das palavras e


incorporar sinônimos, enriquecendo, assim, seu vocabulário no decorrer de
toda sua vida. Ao escrever, o ouvinte, portanto, busca estas palavras e tenta
Ed

ordená-las no papel. Já em relação à pessoa surda, as autoras destacam que


ela aprende por meio do canal visual e, portanto, precisa se apoiar na imagem
são

da palavra, seu sinal e seu significado e não nos fonemas. Resumidamente,


pode-se entender que: para uma pessoa ouvinte ocorre mentalmente a “vi-
sualização” da palavra escrita e sua associação com o som que as sílabas
ver

isoladas e agora reunidas representam. Ao reler a palavra, imagina-se o som


e seu significado. Se a pessoa entrar em contato com a palavra em outra
ocasião, lendo-a novamente, ela fará a decodificação pela rápida e sequencial
montagem silábica, mentalizará o som em seu inconsciente e associará a pa-
lavra ao que o “som mental” quer dizer. Com o surdo não há essa associação,
pois ele tenta ligar o sinal a uma imagem. Essa transcodificação associativa
palavra-som-significado não existe na mente da pessoa surda. Como não
246

há comunicação por meio da oralidade com esses sujeitos, mas por meio
de sinais visuais, ao sinalizar uma palavra que ele não está acostumado a
usar e pedir para que a escreva, ele terá muita dificuldade (como erros de
grafia) ou poderá não saber escrevê-la. Uma palavra escrita para o surdo
nada mais é do que um simples desenho e ele não consegue associá-la a

V
r
nenhum tipo de som pelo simples fato de nunca ter ouvido. Por isso, a ideia

uto
pré-concebida de que bastaria sinalizar uma palavra, letra por letra, por meio
do alfabeto manual (datilológico) para que um surdo a compreenda é uma
ilusão (STREIECHEN; KRAUSE-LEMKE, 2014, p. 963). Uma vez que o

R
sujeito surdo não assimila nada ou praticamente nada pelo canal auditivo,

a
a única forma que ele tem para aprender as palavras é pelos olhos, mas os
olhos não distinguem os sons. Como ele não conhece os sons das palavras,

do
não sabe como pronunciá-las. As palavras que existem em sua mente são
aquelas poucas que ele visualizou em sua forma escrita (se já alfabetizado)3.
aC
Diante disso, é possível concluir que para a pessoa surda expressar-se por

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são
meio de uma língua, que não a LS, é extremamente difícil.
Constatado que os surdos nunca conseguiriam se comunicar como os
ouvintes, de maneira satisfatória, via oralismo, e que, mesmo com a impo-
sição das práticas oralistas, as pessoas surdas insistiam em se comunicar por
i
meio da LS, decidiu-se permitir aos surdos a utilização de toda e qualquer
rev

forma de comunicação. Essa abordagem ficou conhecida como: comunicação


total (CT). A principal meta era o uso de quaisquer estratégias que permi-
or

tissem o resgate da comunicação das pessoas surdas, combinando, inclusive,


a língua de sinais, gestos, mímicas, leitura labial, entre outros recursos que
ara

colaborassem com o desenvolvimento da língua oral (GOLDFELD, 2002).


No entanto, ao falar e sinalizar ao mesmo tempo, as pessoas, principalmente
t

os professores que na época trabalhavam com surdos, acabavam recorrendo


i

ao bimodalismo (duas modalidades de línguas) e, como a LS apresenta es-


op

trutura sintática bem diferente da língua portuguesa (LP), ficava impossível


d

falar e sinalizar ao mesmo tempo. O contexto de uma frase dita em por-


tuguês, por exemplo, não segue a mesma tradução simultânea em Libras, pa-
E

lavra por palavra; ou seja, não existe um sinal correspondente em Libras para
cada palavra pronunciada em LP: muitas coisas são entendidas pelos surdos
apenas por meio de expressão facial, outras por sinais, outras por meio de
ver

datilologia (alfabeto manual – letra por letra). Ainda, ao se utilizar dessa mo-
dalidade (misturar Libras e LP), produz-se uma terceira modalidade, o ‘por-
tuguês sinalizado’ podendo, inclusive, dificultar ainda mais a compreensão

3 Para compreender melhor essa questão, ler: Análise da produção escrita de surdos alfabetizados com proposta bilíngue:
implicações para a prática pedagógica (STREIECHEN; KRAUSE-LEMKE, 2014).
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 247

do aluno surdo (PERLIN; STROBEL, 2008). Em Libras, para se ter uma


ideia, conectivos (artigos, conjunções, preposições e certos tipos de verbos)
não são sinalizados. Uma pessoa surda ao perguntar: “quantos anos você
tem?” sinalizará apenas: “IDADE VOCÊ” ou simplesmente “IDADE” mais
a expressão facial interrogativa (STREIECHEN, 2013). Na frase “Eu gosto

od V
r
de sol”, por exemplo, sinalizada em Libras na figura 1 abaixo, observa-se

uto
que a estrutura da sentença não obedece à ordem de sujeito, verbo e objeto
como na LP: o objeto (SOL) é sinalizado primeiro e não o pronome (EU).
Eu traria a figura 1 para cá.

R
oa
aC Figura 1: “Eu gosto de sol” em Libras
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visã
Fonte: STREIECHEN (2013, p. 105)
a re
itor

Lacerda (1998) ressalta que a mistura entre línguas na CT dificulta a


aquisição dos conhecimentos pelos surdos, pois cada língua tem caracte-
rísticas próprias e independentes, tornando-se impossível expressar-se, ao
par

mesmo tempo, por uma língua sinalizada e outra oralizada. Complementando,


Nogueira e Silva (2014, p. 137) enfatiza que “no oralismo havia o completo
apagamento dos gestos e das línguas de sinais e na CT, um ´vale-tudo´ desde
que fosse alcançado o objetivo esperado, a fala”. Com isso, entendeu-se que
Ed

essas abordagens não eram coerentes para a educação de surdos; o que po-
são

tencializou o avanço do bilinguismo, viabilizando uma educação por meio


de duas línguas (LS/L1 e língua escrita/L2).
De acordo com Capovilla e Raphael (2008, p. 1540), a perspectiva do
bilinguismo possibilita que a criança seja imersa no universo da LS, fazendo
ver

com que ocorra seu desenvolvimento linguístico e cognitivo. Tal imersão


favorecerá, mais tarde, o desenvolvimento das habilidades de leitura e de
escrita em LP.
248

Para Guarinello et al. (2007, p. 45-46):

A proposta bilíngue surgiu baseada nas reivindicações dos próprios


surdos pelo direito à sua língua e pelas pesquisas linguísticas sobre a
língua de sinais. Ela é considerada uma abordagem educacional que se

V
propõe a tornar acessível à criança surda duas línguas no contexto escolar.

r
De fato, estudos têm apontado que essa proposta é a mais adequada para o

uto
ensino de crianças surdas, tendo em vista que considera a língua de sinais
como natural e se baseia no conhecimento dela para o ensino da língua
majoritária, preferencialmente na modalidade escrita. [...] Na adoção do

R
bilinguismo deve-se optar pela apresentação simultaneamente das duas

a
línguas (língua de sinais e língua da comunidade majoritária).

do
No Brasil, a educação bilíngue surge entre as décadas de 80 e 90. No
aC
entanto, somente no início de 2000, ao se considerar as dificuldades do

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surdo em desenvolver a fala, o Decreto Federal Nº 5.626/2005 regulamenta
são
a Lei Nº 10.436/2002 que, por sua vez, dispõe sobre a Libras e estabelece
que os alunos surdos devem ter uma educação bilíngue, na qual a Libras
é a L1 e a LP, na modalidade escrita, a L2. O Decreto, em seu Capítulo
IV, Art. 14, determina também a necessidade de: “VI - adotar mecanismos
i
de avaliação coerentes com o aprendizado de L2, na correção das provas
rev

escritas, valorizando o aspecto semântico e reconhecendo a singularidade


or

linguística manifestada no aspecto formal da LP; VII - desenvolver e adotar


mecanismos alternativos para a avaliação de conhecimentos expressos em
Libras” (BRASIL, 2005).
ara

Em 2014, foi publicado, pelo MEC/SECADI, um Relatório contendo


subsídios para a política linguística de educação bilíngue, em que o principal
t

objetivo é propagar e assegurar que a escolarização dos surdos no Brasil seja


i

realizada em escolas bilíngues:


op
d

A Educação Bilíngue de surdos envolve a criação de ambientes lin-


guísticos para a aquisição da Libras como primeira língua (L1) por
E

crianças surdas, no tempo de desenvolvimento linguístico esperado e


similar ao das crianças ouvintes, e a aquisição do português como se-
gunda língua (L2). A Educação Bilíngue é regular, em Libras, integra
ver

as línguas envolvidas em seu currículo e não faz parte do atendimento


educacional especializado. O objetivo é garantir a aquisição e a apren-
dizagem das línguas envolvidas como condição necessária à educação
do surdo, construindo sua identidade linguística e cultural em Libras e
concluir a educação básica em situação de igualdade com as crianças
ouvintes e falantes do português (BRASIL, 2014, p.6).
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 249

Diante disso, muitas cidades brasileiras têm lutado para implantar es-
colas bilíngues visando atender a demanda. Os municípios menores, que não
possuem surdos em número suficiente, estão tentando criar polos centrali-
zados para atender também os alunos das cidades vizinhas. Nesse sentido,
podemos considerar que a abordagem bilíngue é um modelo de educação

od V
r
que valoriza o sujeito surdo como um ser em toda a sua plenitude, acredi-

uto
tando, inclusive, que ele pode se tornar um ser livre, autônomo, indepen-
dente, emancipado, crítico e capaz de viver dignamente. Para isso, basta lhe
a oportunidade de poder se comunicar e adquirir conhecimentos por meio

R
de sua língua natural, a língua de sinais. Essa abordagem segue o princípio

oa
de que “as diferenças existentes no processo de desenvolvimento da escrita
pelos surdos não podem ser associadas à surdez, mas às línguas envolvidas
nesta dinâmica [...]” (STREIECHEN; KRAUSE-LEMKE, 2014, p. 967).
aC
2 Abordagens de Ensino de Línguas
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visã
Historicamente, a subárea de ensino de línguas na LA é dividida em três
eras: dos métodos, das abordagens e do pós-método. Métodos e abordagens
de ensino de línguas sempre estiveram relacionados a uma “sistematização de
procedimentos que pudessem concretizar uma determinada visão de como se
ensina e como se aprende uma língua” (BORGES, 2010a, p. 398). No âmago
a re
itor

dessa perspectiva, consolidando o início da era das abordagens, emerge a


discussão de Anthony (1963) sobre a natureza da linguagem e a natureza
da aprendizagem como os dois pilares de sustentação de uma abordagem.
Antes, na era dos métodos, últimos cem anos (RICHARDS; RODGERS,
par

2001), as reflexões eram de cunho mais empírico do que teórico, sem se


fazer distinção entre abordagem, método e técnica – terminologia hierar-
quizada, depois, por Anthony (1963), momento em que a abordagem ficou
Ed

no topo (teoria), seguida pelo método e técnica (prática) que deveriam ser
coerentes com os pressupostos teóricos da abordagem.
são

No cerne de uma abordagem de ensino de língua, como mote, além


dos dois esteios (linguagem e aprendizagem) de sua constituição, e subsi-
diado por eles, sempre esteve a preocupação do desenvolvimento de uma
ver

competência da linguagem (linguística, comunicativa, pragmática etc.) para


a aquisição de uma LE/L2, abalizada por uma ou mais hipótese(s)/teoria(s)
de ASL. Dessa forma, o que difere entre uma abordagem e outra, de acordo
Borges (2009), além das concepções de linguagem, aprendizagem e ASL, é
o foco no desenvolvimento de uma competência, a priori, para se chegar às
outras, a posteriori, no processo de ensino/aprendizagem. No que concerne
às hipóteses de ASL, Larsen-Freeman e Long (1991) pontuam haver entre
250

quarenta e sessenta delas, incluindo modelos, metáforas, perspectivas e pres-


supostos sobre ASL, agrupadas em três grandes conjuntos: nativistas, am-
bientalistas e interacionistas. Nesse contexto, Paiva (2014) enfatiza que as
principais teorias de ASL que permeiam o ensino de línguas são: nativistas:
Modelo da Gramática Universal, Modelo Monitor, Hipótese do Input ou da

V
r
Compreensão; ambientalistas: Teoria Behaviorista-Estrutural, Modelo da

uto
Aculturação, Modelo Conexionista; interacionistas: Hipótese da Interação,
Hipótese do Output ou da Lingualização, Teoria Sociocultural, e; Aquisição
de Segunda Língua na Perspectiva da Complexidade – esse último modelo

R
já inserido na era do pós-método (tratado à frente). Paiva ainda discute, re-

a
sumidamente, outras quinze teorias das quais incluiremos, aqui, apenas o
Modelo da Competência Variável e o Modelo Dialógico – ambos intera-

do
cionistas. Por outro lado, de acordo com Borges (2009; 2010b; 2015) as
principais abordagens de ensino de línguas são: gramatical; instrumental4;
aC
comunicativa; comunicacional; dialógica, e; complexa – a primeira inserida

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são
no que se entende, na área, por movimento/ paradigma gramatical, a última
no movimento/ paradigma da complexidade e as demais no movimento/ pa-
radigma comunicativo.
Métodos de ensino de língua com foco em tópicos gramaticais como
i
unidade de ensino (grammar-based), ênfase em apenas uma habilidade da
rev

língua (geralmente leitura ou oralidade) e com o uso de exercícios mecânicos,


de tradução e repetitivos, como o da Gramática e Tradução e o Audiolingual (e
or

outros inseridos na era dos métodos), por exemplo, correntemente compõem o


que se entende por abordagem gramatical/tradicional de ensino de línguas que
ara

ainda é de uso bem comum no contexto brasileiro. Essa abordagem, alinhada


a hipóteses de ASL ambientalistas, tem como objetivo o desenvolvimento
t

da competência linguística, a priori, que pode ser associado como sendo


i

resultado do “processamento e a repetição de experiências que levam ao


op

fortalecimento das conexões neurais” (modelo conexionista) (PAIVA, 2012,


d

p. 20). Assim, a competência em questão seria alcançada ao se criar hábitos


linguísticos via automatização da língua (teoria behaviorista-estrutural).
E

Ainda, no que concerne o audiolingualismo – que privilegiava a oralidade


elevando a necessidade do aprendiz atingir a fluência do falante nativo –
podemos associar o modelo da aculturação, principalmente pelo aspecto desse
ver

modelo em ter a cultura do falante nativo como referência para a aquisição da

4 Também conhecida como ensino de língua para fins específicos (acadêmicos, negócios etc.) (skill-based), com foco em
uma ou mais habilidade da língua (ouvir, falar, escrever ou ler), dependendo das necessidades dos alunos previamente
analisadas. As demais abordagens, em contraposição, são reconhecidas como para fins gerais e geralmente tendem a
focar, conjuntamente, todas as habilidades da língua, salvo pressupostos teóricos específicos de cada uma em relação à
primazia de uma habilidade sobre a outra.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 251

L2. Segundo Richards e Rogers (2001, p. 66), o audiolingualismo era também


conhecido como o “método do informante”, sendo o “informante”, o falante
nativo, a fonte segura no fornecimento de frases e itens lexicais de sentenças
que o aprendiz deveria imitar.
A abordagem instrumental de ensino de línguas, muitas vezes en-

od V
r
tendida como compondo a abordagem comunicativa (BORGES, 2011),

uto
emerge da necessidade de aprendizagem rápida (skill-based) de uma LE/L2
à época da Segunda Guerra Mundial. Décadas mais tarde, ela teve grande
repercussão no Brasil com o desenvolvimento do projeto de ensino de inglês

R
para fins acadêmicos, com foco na leitura, da PUC-SP5, nas universidades

oa
brasileiras na década de 1980 (CELANI et. al., 1988) – servindo de base
teórico-didática, depois, aos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua
Estrangeira (PCN-LE) do Ensino Fundamental (BRASIL, 1998). A compe-
aC
tência que essa abordagem visa desenvolver é essencialmente a pragmática6
por meio da negociação de significado (hipótese da interação) e da exposição
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

do aprendiz a insumos compreensíveis (modelo do monitor, input ou da


compreensão) provenientes da comunidade discursiva em LE/L2 específica
visã
com a qual necessita interagir.
A abordagem comunicativa de ensino de línguas, também muito uti-
lizada no Brasil a partir de 1980, principalmente por escolas de idiomas,
surge no contexto mundial na década de 1960, visando substituir a abordagem
a re
itor

gramatical no contexto do ensino de língua para fins gerais. No entanto, seu


desgaste tornou-se aparente já no final da década de 1990 devido a várias
razões. Entre elas estaria o foco na competência comunicativa, a priori (“pri-
mazia da língua falada” HOWATT, 1988, p. 25), com ênfase do processo de
par

comunicação interpessoal (via negociação do significado; hipótese da inte-


ração) para assimilação de funções e noções da linguagem (content-based)
como condição para a produção de LE/L2 (hipótese do output/produção
Ed

compreensível). Outra razão seria o espaço exíguo deixado tanto para o uso
da L1 (princípio monolíngue) quanto para a explicitação gramatical (ensino
são

indutivo, modelo da competência variável). Duras críticas a ela foram feitas


por Howatt (1988) que considerou que essa abordagem apenas “adicionou
uma dimensão extra à metodologia progressiva tradicional” (p. 25) redu-
ver

zindo excessos do audilingualismo.


Com isso, há a emergência da abordagem dialógica de ensino de línguas
– nomeada, às vezes, como abordagem discursiva ou baseada em gêneros
(genre-based) – cujo foco é na competência metagenérica (KOCH, 2002), a

5 Pontifícia Universidade Católica – São Paulo (PUC-SP).


6 Alcance de uma eficiência comunicativa em situações específicas (CHOMSKY, 1980).
252

priori, com ênfase na compreensão e produção de gêneros discursivos orais


e escritos em LE/L2 como fator para o desencadeamento da aquisição de LE/
L2 (teoria sociocultural e modelo dialógico). Para a prática dessa abordagem
em contexto de ensino, geralmente usa-se o recurso de sequências didáticas
(DOLZ et. al., 2004) na evolução do processo de compreensão/ produção/

V
r
refação dos gêneros textuais. As Diretrizes Curriculares da Educação Básica

uto
de Letras Estrangeiras Modernas – DCE-LEM (PARANÁ, 2008), por
exemplo, seguiu essa tendência, tecendo críticas à abordagem comunicativa.
A abordagem comunicacional de ensino de línguas, mais conhecida

R
como ensino baseado em tarefas (task-based), não é muito usada no Brasil,

a
já que conta muito com o professor proficiente na LE/L2 na preparação,
execução e condução de tarefas em L2/LE que levem os aprendizes a racio-

do
cinarem na língua a fim de adquiri-la. Sua prática é via tarefas (pré-tarefa,
tarefa e pós-tarefa) que promovam interações satisfatórias (teoria sociocul-
aC
tural) para o desenvolvimento da competência linguística, a priori, similar

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
ao da língua materna (modelo da gramática universal). No entanto, essa
prática é mais bem sucedida em contexto de ensino de L27. Na abordagem
comunicativa também há o uso de tarefas, chamadas “tarefas comunica-
tivas”, mas são essencialmente focadas no desenvolvimento da competência
i
comunicativa, a priori, (via comunicação interpessoal) e não no desenvolvi-
rev

mento da competência linguística, a priori, (via raciocínio na LE/L2) como


previsto na abordagem comunicacional. Essa é uma das diferenças entre as
or

duas abordagens, tendo Prabhu (1987), precursor da abordagem, preferindo


nomeá-la de comunicacional para diferenciá-la da pedagogia subjacente à
ara

abordagem comunicativa (BORGES, 2009; 2012).


A era do pós-método, por sua vez, compactuada com a visão da pós-
t

-modernidade, traz para a área de ensino de línguas uma reflexão de que não
i

há o melhor método, já que “a noção de métodos bons ou ruins é nela mesma


op

enganosa” (PRABHU, 1990, p. 161), devendo-se enfatizar mais a meto-


d

dologia do professor (BORGES, 2010a) e uma pedagogia da pragmática


(KUMARAVADIVELU, 1994) ou senso de plausibilidade (PRABHU,
E

1987) do que a pedagogia dos teorizadores (dos métodos). Nesse panorama,


emerge a abordagem complexa de ensino de línguas (BORGES; PAIVA,
2011; BORGES, 2014b; 2015) cujo cerne não é mais o foco em uma com-
ver

petência, a priori (como nas outras abordagens), mas no desempenho do


aprendiz para o desenvolvimento de competências na LE/L2. O desempenho,

7 Se entendermos L2 (segunda língua oficial de um país, caso do inglês na Índia) como diferente de LE (país apenas com
a L1 como língua oficial), em que os alunos estão mais expostos à língua que aprendem. Atualmente, no entanto, muitos
autores não diferenciam mais L2 de LE, usando, ainda, nesse caso, a terminologia língua adicional ou LE/L2 – como é o
caso das autoras deste capítulo.
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 253

por sua vez, é auto-organizável e sensível às condições iniciais – um sistema


adaptativo complexo (SAC) –, sendo o professor, em situação de ensino, o
elemento desse sistema que potencialmente poderá desencadear essa auto-
-organização, viabilizada por meio de (inter)ações de várias ordens em um
contexto também dinâmico. Aqui, tem-se a hipótese da ASL na perspectiva

od V
r
da complexidade (PAIVA, 2014) que “deve, necessariamente, conceber

uto
tanto a lingua(gem) como o ensino/aprendizagem como fenômenos igual-
mente complexos” (BORGES; PAIVA, 2011, p. 344). Ainda, um modelo
de ASL no âmbito dos SACs deve ser entendido como “um conjunto de

R
conexões em um sistema dinâmico, complexo, não linear e imprevisível,

oa
que se move em direção ao ´limite do caos´, considerado como uma zona
de criatividade com um potencial máximo para aprendizagem” (PAIVA,
2009, p. 34-5). Modelo que, segundo Borges e Paiva (2011), “admite com-
aC
petências inatas [...] criação de hábitos automáticos [...] a importância da
afiliação à cultura da outra língua e a construção de identidades [...] o papel
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fundamental do input, da interação e do output, das conexões neurais e das


mediações sociais”; ou seja, entende que todas as teorias de ASL (nativistas,
visã
ambientalistas e interacionistas) – e não apenas uma ou duas, como acontece
na constituição das outras abordagens – são componentes constitutivos do
processo de desenvolvimento de uma LE/L2.
a re
itor

3 Bilinguismo multidimensional e abordagem complexa

Como já enfatizado neste capítulo, o bilinguismo na educação do surdo


irrompe para suprir métodos híbridos ou bimodais (que combinam oralidade
par

e sinais) da abordagem da comunicação total que, por sua vez, surge como
uma proposta diferente que pretendia superar os insucessos do modelo mo-
nolíngue do oralismo. Com isso, a educação do surdo volta-se para as pes-
Ed

quisas e estudos já desenvolvidos na área de ensino de LE/L2 e comparações


entre as abordagens na educação do surdo e as abordagens de ensino de LE/
são

L2 já consolidadas tornam-se comuns.


Nessa linha de reflexão, no Brasil, temos, por exemplo, os trabalhos
de Salles et al. (2004), Campos (2009), Albres e Oliveira (2013) e Sousa
ver

(2014). Campos (2009) pontua que a abordagem oralista na educação de


surdos sempre teve como foco o aspecto gramatical, inserida na percepção
de que conhecer o funcionamento metalinguístico da língua é dominar essa
língua, devendo-se partir de estruturas mais simples (palavras) para as mais
complexas (frases, textos) e da fala para a escrita. Salles et. al. (2004) dis-
cutem três abordagens de ensino de língua associados a correntes linguísticas:
audiolingual (estruturalismo), comunicativa e interacionista (funcionalismo)
254

– sinalizando que, no contexto bilíngue da educação do surdo, a abordagem


interacionista (uma espécie de ramificação da abordagem comunicativa, se-
gundo as autoras) é mais vantajosa para o ensino da modalidade escrita da
LP como L2, tendo, essa abordagem, a hipótese da interação e a teoria so-
ciocultural como fundamentação. De acordo com as autoras, a compreensão

V
r
e a produção de textos escritos, como processos essencialmente interativos,

uto
devem ir além da transmissão de informações estruturais e lexicais, visando
aspectos pragmáticos, sociolinguísticos e culturais e a abordagem interacio-
nista estaria mais em acordo com essa proposta do que a abordagem comu-

R
nicativa. Em discussão sobre política linguística na Libras, Albres e Oliveira

a
(2013) assinalam as três concepções clássicas de linguagem no âmbito do
ensino de línguas (“espelho” do pensamento, código e interação), asso-

do
ciando as duas primeiras a um ato monológico da comunicação subsidiada
pela educação oralista do surdo, e; vinculando a última, a uma ação dialógica
aC
da enunciação compartilhada pelo bilinguismo. Sousa (2014), por sua vez,

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
compara abordagens de ensino de LE/L2 (gramatical – método da gramática
e tradução e audiolingual – e comunicativa) às abordagens na educação de
surdos (oralismo, comunicação total e bilinguismo). Para a autora, os pro-
cedimentos metodológicos do audiolingualismo, como repetição, memori-
i
zação e formação de hábitos, assemelham-se aos do oralismo; já o recurso
rev

do uso da L1 para se aprender LE/L2 do método da gramática e tradução


aproxima-se da metodologia da comunicação total. Por fim, a autora salienta
or

que a prática da análise contrastiva L1-LE/L2 e outras da abordagem comu-


nicativa, como o foco na necessidade dos aprendizes, estariam em acordo
ara

com a perspectiva bilíngue.


Por outro lado, com o advento da abordagem complexa de ensino de
t

línguas (BORGES; PAIVA, 2011; 2014; BORGES, 2015) se faz necessário


i

avançar na discussão. Sabe-se que o bilinguismo é contemporaneamente a


op

abordagem mais recomendada para a educação do surdo. Porém, há que se


d

considerar uma diferença importante entre o que enfatizamos, aqui, de bi-


linguismo unidimensional e multidimensional – este último em acordo com
E

a proposta multifacetada das várias dimensões do processo de ensino e de


aprendizagem de línguas da abordagem complexa.
Fundamentamos nossa reflexão no trabalho de Harmers e Blanc (2000)
ver

que discutem definições de bilinguismo de vários autores, pontuando que


todas possuem um ponto fraco que é a unidimensionalidade; já que, essencial-
mente, definem bilíngue em relação ao domínio da competência linguístico-
-comunicativa em duas línguas, ignorando outras dimensões importantes desse
fenômeno subsidiadas em várias disciplinas (psicologia, psicolinguística, so-
ciolinguística, sociologia e linguística). Para os autores, o bilinguismo “deve
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 255

ser abordado como um fenômeno complexo em que, simultaneamente, im-


plica um estado de bilingualidade de indivíduos e um estado de línguas em
contato no nível coletivo” e, como tal, “deve ser estudado em vários níveis de
análise: individual, interpessoal, intergrupo e social” (p. 32). Na perspectiva
multidimensional do bilinguismo, Harmers e Blanc elencam seis dimensões

od V
r
como relevantes na constituição da bilingualidade: (1) competência relativa:

uto
competência linguística em L1 e L2 (bilinguismo balanceado) ou mais em uma
língua do que em outra (bilinguismo dominante)8; (2) organização cognitiva:
única representação cognitiva para duas traduções equivalentes (bilinguismo

R
composto) ou representações distintas paras duas traduções equivalentes (bilin-

oa
guismo coordenado); (3) idade de aquisição: bilinguismo infantil (simultâneo
ou consecutivo na aquisição da L1 e L2), adolescente e adulto; (4) exoge-
neidade: presença (bilinguismo endógeno) ou não (bilinguismo exógeno) de
aC
falantes da L1 e L2 no ambiente social da criança; (5) status sociocultural:
L1 e L2 são valorizadas (bilinguismo aditivo) ou L1 é desvalorizada (bilin-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

guismo subtrativo), e; (6) identidade cultural: bilinguismo bicultural (assimi-


lação da cultura das duas línguas), monocultural (identificação com apenas
visã
uma cultura), acultural (rejeição da cultura da L1) e descultural (afastamento
da cultura das duas línguas).
Considerando as questões de bilingualidade em Harmers e Blanc (2000),
alinhadas à concepção do sujeito surdo como um sujeito complexo, enten-
a re
itor

demos que uma educação bilíngue multidimensional deve, fundamentalmente,


articular-se com a pedagogia das LE/L2 em cinco vertentes primordiais – ele-
mentos constitutivos da abordagem complexa – dispostas a seguir.
par

1. concepção de linguagem como SAC (BECKNER et al., 2009) que


aninha, em um mesmo sistema, como elementos de um todo, pres-
supostos das visões clássicas de linguagem (“espelho” do pensa-
Ed

mento, código e interação), como “comportamento adquirido,


conjunto de estruturas, sistema de signos, faculdade inata, função
são

cerebral, sistema social de comunicação, discurso, e instrumento de


pensamento e de ação” (BORGES; PAIVA, 2012, p. 343);
2. pressuposto da ASL como SAC (LARSEN-FREEMAN, 1997),
ver

sendo a ASL caracterizada por processos dinâmicos, integrando,


igualmente, a criação de hábitos linguísticos, afiliações pessoais
e culturais com a L2, input, output, interação, conexões neurais e
socioculturais (MENEZES, 2013) ao conciliar teorias/hipóteses de

8 Usaremos, aqui, o apoio do artigo de Megale (2005) que discute cada uma dessas dimensões.
256

ASL ambientalistas, nativistas e interacionistas, e; consequente-


mente, harmonizando em um mesmo sistema complexo todas as
abordagens de ensino de línguas;
3. visão da natureza do ensino/aprendizagem como multifacetada,
norteada “pela dimensão dinâmica reconstrutiva desse processo

V
r
como postulado em diferentes reflexões sobre a construção de co-

uto
nhecimento” (BORGES; PAIVA, 2011, p. 350-351), como o beha-
viorismo, o cognitivismo e o interacionismo (BORGES, 2015);
4. enfoque no desempenho do aprendiz para a emergência das com-

R
petências na língua, fazendo o caminho inverso das outras abor-

a
dagens de ensino que focam uma competência, a priori, para se
chegar a outras;

do
5. perspectiva do professor como dinamizador do processo de ensino/
aprendizagem, entendendo a sala de aula, alunos, escola e sua co-
aC
munidade (diretor, professores, familiares), material didático, plane-

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são
jamento, currículo (e outros elementos) como sistemas adaptativos
complexos (SAC), sendo o professor o SAC que movimenta todos os
outros interligados a ele em função do desempenho dos alunos.
i
Na sequência dessa breve apresentação das vertentes, focaremos a dis-
rev

cussão na segunda (tópico 3.1), enfatizando as teorias/hipóteses de ASL que


compõem as diferentes abordagens de ensino de LE/L2 (conforme Fig. 2) e
or

que nos permite apresentar e discutir mais enfaticamente as interfaces entre


a abordagem complexa e o bilinguismo multidimensional. Adicionalmente,
ara

elencaremos (tópico 3.2) pontos importantes na educação do surdo, funda-


mentados na quinta vertente, como ponto de partida para a reflexão sobre o
t

professor como dinamizador do processo de ensino/aprendizagem.


i
op

3.1 Interfaces entre a abordagem complexa e o bilinguismo multidimensional


d

No contexto das teorias nativistas de ASL, o modelo da gramática uni-


E

versal postula que qualquer criança normal é capaz de adquirir gramática de


grande complexidade devido à capacidade linguística inata do ser humano.
No contexto do bilinguismo multidimensional a criança surda se encaixa per-
ver

feitamente nessa perspectiva em seu processo de aquisição da sua L1 (a LS);


já que a bilingualidade infantil, quando no aspecto consecutivo – em uma
das suas dimensões (idade de aquisição) –, postula que primeiro se aprende
a L1 e depois a L2. Todavia, esse processo pode gerar (ou não) dificuldades
na compreensão da gramática da L2, tendo sido, essa dificuldade, consi-
derada uma anormalidade na criança surda pelo oralismo. Por outro lado,
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 257

no processo de desenvolvimento da compreensão e produção da língua es-


crita como L2 pelo surdo, faz-se necessário haver input de qualidade (textos
autênticos de diferentes gêneros discursivos e com imagens) e em grande
quantidade o que reforça o modelo do input ou da compreensão de Krashen.
Ainda, a hipótese do filtro afetivo (bloqueio mental que impede os apren-

od V
r
dizes de utilizar plenamente o input compreensível) é um fator importante a

uto
se considerar em relação à aquisição da L2 pelo surdo, dado a sua exposição
histórica à imposição da oralidade sobre a LS. O que se tem praticado em
abordagens unidimensionais na educação do surdo é ensinar a L2 sem que

R
o surdo se aproprie primeiramente da sua L1 (a LS) o que contribui muito

oa
para que o filtro afetivo em relação à L2 se mantenha alto dificultando a sua
aquisição/aprendizagem.
aC
Figura 2 – Interfaces entre a abordagem complexa e
a abordagem bilíngue multidimensional
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Abordagem Complexa
visã
Sistema Adaptativo Complexo
Abordagem Comunicativa
Content-based
INTERACIONISTAS
Abordagem Gramatical
Grammar-based
AMBIENTALISTAS Hipótese da Modelo da Abordagem Instrumental
Interação Competência Skill-based
Teoria Variável NATIVISTA
Modelo Behaviorista- INTERACIONISTA
Conexionista /
Estrutural competência Modelo do/a
Hipótese do/a
a re

exogeneidade relativa Monitor/ Input/


Output / Produção
itor

Compreensão Hipótese da
organização Compreensível Interação
cognitiva Modelo
Aculturação
Abordagem Comunicacional
Task-based Abordagem Dialógica exogeneidade
status NATIVISTA Genre-based
sociocultural INTERACIONISTA INTERACIONISTAS
Modelo da
Gramática Teoria Modelo
Teoria
Universal
par

Sociocultural Sociocultural Dialógico


idade de
aquisição identidade identidade
cultural
cultural
Abordagem Bilíngue
Bilingualidade Multidimensional
Ed

Fonte: Produzida pelas autoras


são

No que se refere a hipóteses ambientalistas de ASL, o modelo acul-


turação respalda o surdo na necessidade de estar em contato com falantes
de LS para desenvolver a linguagem e como essa aproximação (ou não)
ver

pode inibir ou promover a aquisição da sua L1. A falta desse contato, por
exemplo, desde a tenra idade da criança surda, tem resultado na aquisição
tardia da L1 o que gera atraso em todo o seu desenvolvimento e prejudica o
processo de aquisição da L2. Nesse caso, a bilingualidade entra na dimensão
de status sociocultural das línguas envolvidas em que a L1 (bilinguismo sub-
trativo) não possui valor. Pode-se entender que esse era o caso na perspectiva
258

unidimensional da comunicação total (pseudobilinguismo), tendo em vista


que a LS, como no oralismo, também não era efetivamente reconhecida
como a L1 do surdo. No caso do bilinguismo multidimensional agrega-se
também a dimensão de valor (bilinguismo aditivo) às duas línguas (L1 e
L2) envolvidas. A teoria behaviorista-estrutural, no que concerne à visão

V
r
de Skinner, prevê o comportamento verbal emergindo a partir do estímulo,

uto
resposta e reforço mediado pelo outro e, se não for usada isoladamente
(como invariavelmente acontecia nas abordagens oralista e da comunicação
total), pode contribuir para a aquisição da L2, como em atividades com

R
objetivos específicos que visam reforçar a compreensão do funcionamento

a
da gramática da L2, via análise contrastiva entre L1 e L2, por exemplo. O
modelo conexionista, por sua vez, estaria mais em acordo com a dimensão

do
da organização cognitiva da bilingualidade, cujo tipo composto (uma única
representação para as duas línguas) e coordenado (uma representação para
aC
cada língua) pode estar ligado a questões de idade e contexto de aquisição.

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são
Da mesma forma, o conexionismo enfatiza que é pela interação sinergética
entre elementos biológicos e empíricos que ocorrem as percepções da mente,
viabilizando conexões neurais e suas modificações.
No âmbito dos modelos interacionistas de ASL, a hipótese do output
i
ou da produção compreensível enfatiza que uma regra da língua é adquirida
rev

se ela é experimentada e confirmada na comunicação. No caso da educação


bilíngue do surdo na aquisição da L2, esse processo deve ocorrer via uso
or

de gêneros discursivos escritos diversificados como unidade de ensino –


prática respaldada pelo modelo dialógico e teoria sociocultural. Essa última,
ara

ao enfatizar que a interação com outras pessoas e com artefatos culturais


influenciam e geram mudanças na forma como as crianças agem e se
t

comportam, pode vincular-se à dimensão da identidade cultural na bilin-


i

gualidade. No que concerne ao modelo da competência variável, podemos


op

associá-lo à dimensão da competência relativa da bilingualidade em que a


d

competência linguística do surdo bilíngue pode ser nas duas línguas (bilin-
guismo balanceado) ou apenas na L1 (bilinguismo dominante). Por outro
E

lado, a hipótese da interação, que postula que para a aprendizagem da L2


ser bem sucedida, os aprendizes precisam ser participantes ativos quando
recebem input, estaria relacionada às dimensões endógena e exógena do
ver

bilinguismo. Essas dimensões vinculam-se à presença ou ausência da co-


munidade de fala das línguas no ambiente social da criança surda, tendo
proximidade com o que se denomina contemporaneamente de pedagogia
surda, dentro da dimensão endógena. Essa pedagogia defende que a criança
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 259

surda deve ter aulas ministradas em LS (L1) por professores surdos desde
a educação infantil. Na dimensão exógena, entende-se que o professor deva
ser proficiente em ambas as línguas (L1/ L2).

3.2 O professor na educação bilíngue multidimensional

od V
r
uto
O professor como o elemento que dá dinamicidade ao processo da
educação bilíngue – no âmbito do bilinguismo/bilingualidade de natureza
multidimensional – ainda precisa ser muito discutido pelos profissionais

R
envolvidos na área, considerando todas as questões tratadas e outras não

oa
incluídas neste capítulo. Contudo, aspectos de suma importância a serem ob-
servados, principalmente em ambientes escolares onde há surdos incluídos,
foram sintetizados por Streiechen (2013) e os apresentamos aqui como um
aC
ponto de partida para essa discussão: a criança surda só iniciará seu apren-
dizado da língua escrita após dominar a L1; o aluno surdo não estará neces-
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sariamente alfabetizado se apenas copiar do quadro ou dos colegas e não


associar o que escreve com o seu significado, pois a cópia e reprodução de
visã
palavras ou textos não garantem o conhecimento; as aulas devem ser enri-
quecidas com recursos visuais, utilizando-se de estratégias que permitam o
uso de diferentes linguagens como desenhos, dramatizações, teatros, vídeos
e outros; os alunos surdos devem sentar-se em lugares que facilitem a ampla
a re
itor

visualização da classe, favorecendo sua interação com o professor e colegas;


a poluição visual é prejudicial à concentração do aluno surdo; a avaliação
dos textos escritos pelos surdos deve considerar a inferência de aspectos
estruturais da LS; a avaliação didática deve ocorrer de forma diferenciada
par

e por meio de ambas as línguas (L1/L2); a presença do tradutor intérprete


de LS (TILS) em sala de aula é fundamental para que o aluno surdo tenha
acesso efetivo a todos os conteúdos desde que ele domine a LS; o surdo é
Ed

aluno do professor da disciplina e não do TILS; nunca falar dirigindo o olhar


ao TILS, mas sempre ao surdo; nunca referir-se ao surdo como ‘surdo-mudo’
são

– ele só não fala porque não ouve; o surdo se expressa com o corpo todo,
então será comum afastar a carteira ou se levantar para se expressar; em toda
situação duvidosa, paciência e bom senso é o que sempre devem prevalecer.
ver
260

Conclusão

Neste capítulo, preocupamo-nos em promover uma discussão sobre


a educação do surdo no âmbito das interfaces entre a abordagem bilíngue
multidimensional e a abordagem complexa de ensino de línguas. A re-

V
r
lação entre as duas abordagens foi desenvolvida por meio das principais

uto
dimensões do bilinguismo multidimensional tratado em Harmers e Blanc
(2000) e as mais importantes hipóteses/ teorias de ASL (PAIVA, 2014) que
permeiam as abordagens de ensino de língua e que, por sua vez, são ele-

R
mentos constitutivos da abordagem complexa (BORGES; PAIVA, 2011;

a
BORGES, 2015). Para tanto, tivemos a preocupação em descrever resu-
midamente a história da educação do surdo, bem como em apresentar, de

do
forma mais detalhada, as principais abordagens historicamente utilizadas
na educação do surdo e no ensino de línguas adicionais (LE/L2). Com
aC
a análise, foi possível observar que todas as dimensões do bilinguismo

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são
multidimensional se aninham nas perspectivas de fundamentação da abor-
dagem complexa, o que a coloca em evidência para subsidiar o trabalho do
professor no contexto da educação do surdo.
i
rev
or
ara
di t op
E

ver
À GUISA DE CONCLUSÃO

AO FINAL DE UMA ROTA,


BIFURCANDO PARA NOVAS

od V
r
CONDIÇÕES INICIAIS

uto
Walkyria Magno e Silva (UFPA)

R
Elaine Ferreira do Vale Borges (UEPG)

oa
Os objetivos da obra foram alcançados e agora resta-nos saber da re-
cepção que o volume terá no nosso meio. A busca por lançá-lo em um evento
aC
de formação de professores reflete a preocupação das editoras a respeito
do universo educacional multifacetado no qual esses profissionais atuam. A
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complexidade, que sempre existiu nessa área, mas que foi sucessivamente
apagada por levas de estudos reducionistas que ainda perduram, revela-se
visã
nos textos que acabamos de apresentar.
As partes do livro articulam-se para ilustrar o emprego das teorias que
integram a complexidade em diferentes estudos, empíricos em sua grande
maioria e teóricos no caso de dois deles. Este é o caminho sugerido pelos
a re
itor

precursores na Linguística Aplicada quando incitam à exploração de novos


vieses de se enxergar e interpretar antigos fenômenos. Assim, cada capítulo
é a peça de um grande mosaico fractal em plena construção. Eles com-
pletam-se e se espelham em múltiplas possibilidades no campo de estudos
par

da Linguística Aplicada que já se entende transdisciplinar; mas revelam


também, como exposto no próximo parágrafo, o início de uma longa jornada,
com muitas bifurcações, no desvelamento e compreensão dos fenômenos da
linguagem como sistemas adaptativos complexos.
Ed

Os estudos constantes na primeira parte abordaram competências lingua-


são

geiras diversas interpretadas sob o ponto de vista da complexidade. Cremos


que mais estudos são necessários, principalmente no que tange ao inter-rela-
cionamento entre as diferentes competências. Precisamos de mais pesquisas
ver

sobre o desenvolvimento das habilidades orais e escritas, vistas como partes


interconectadas de um todo que é a apropriação de línguas adicionais. A se-
gunda parte, que trata da análise de dois livros didáticos construídos com a
visão complexa, demandam estudos futuros que mostrem a utilização desses
materiais em contextos reais e igualmente complexos. Temos certeza de que
trabalhos com este foco estão em andamento e ansiamos por saber quais resul-
tados eles trarão. O conselheiro linguageiro, elemento constitutivo do sistema
262

de aprendizagem, pode ou não perturbar a trajetória de outros agentes, como


pudemos ver nos capítulos da terceira parte. Já as expansões teóricas alcan-
çadas na quarta parte do livro provavelmente provocarão uma leva de estudos
que abranjam a Biologia do Conhecer e a educação para surdos, esta última
carecendo de um olhar complexo para dar conta dessas situações. Enfim, os

V
r
capítulos anunciam um eterno recomeçar em infinitas bifurcações dadas por

uto
diferentes condições iniciais uma vez que nada é estático e tudo está em cons-
tante adaptação. Eles mostram ainda o quanto o processo de ensino e aprendi-
zagem é orgânico e integrado, não separando e não reduzindo o que ocorre nos

R
múltiplos contextos aninhados aos próprios processos.

a
Cabe ressaltar ainda que os capítulos da primeira parte abordam o
quanto as tarefas em sala de aula podem ser enriquecidas quando o professor,

do
enquanto dinamizador do sistema, está atento tanto às questões macro, pro-
venientes do conhecimento do que se passa no mundo ao largo, como no
aC
caso do capítulo de Rafael Vetromille-Castro, quanto às questões do mi-

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são
crocosmo da sala de aula – no caso relatado por Kelly Gaignoux e Michell
Moutinho – quando o professor está atento às emoções emergentes em sala
de aula. Neste, não é difícil encontrar a relação com a Biologia do Conhecer,
explorada por Rodrigo Aragão no primeiro capítulo da parte quatro. Ainda,
i
o capítulo de Valdir Silva mostra o quanto as fronteiras da sala podem ser
rev

expandidas na inseparabilidade dos multiversa virtual e real. Estão aí os


“portais” entre mundos nos quais podem transitar professores e alunos.
or

Essas discussões enfatizam o que a literatura da área da complexidade já nos


mostra: que os indivíduos se apresentam fractalizados em múltiplas iden-
ara

tidades e demandam professores, por sua vez, também multi-identitários,


que tenham habilidades que se aproximam daquelas do conselheiro (parte
t

três). É evidente que este professor – que se entende ser igualmente com-
i

plexo – precisa ser permeável ao que acontece no mundo, na sala de aula e


op

em cada subsistema no qual ele próprio transita assim como os subsistemas


d

aninhados em cada indivíduo com os quais tem contato. Essas habilidades


podem potencializar a proatividade dos sistemas dos alunos. Eduardo Santos
E

Junior e Walkyria Magno descrevem os diversos contextos em que as ações


catalisadas pelo aconselhamento tiveram efeito; Larissa Borges e Jhonatan
Rabelo indicam a emergência de novos comportamentos em uma aprendente
ver

de inglês que passa a enxergar seus subsistemas como integrados e não


conflitantes; Maria Clara Matos e Sadie Mohry descrevem os estados atra-
tores que podem explicar a resistência à autonomia e o quanto conselheiros
e aconselhados precisam estar atentos para não deixarem o sistema parar
(morrer). Ainda, abordando a questão do aconselhamento, Walkyria Magno
e Silva percebe que as trajetórias dos próprios conselheiros também sofrem
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 263

os impactos no contato com os demais agentes do sistema. Os capítulos da


parte dois mostram que os agentes inanimados do sistema como livros e
materiais didáticos estão gradativamente acolhendo essa nova visão e sendo
construídos com a perspectiva da complexidade. Ambas faixas escolares,
embora para línguas adicionais diferentes, estão aí representadas: o material

od V
r
para inglês, relatado por Leonardo Pereira e Elaine Borges, voltado para

uto
o Ensino Fundamental, e o material para espanhol, apresentado por Kelly
Nakayama e Elaine Borges para o Ensino Médio. Finalmente, em um mundo
que reconhece a inclusão como parte dele, o capítulo de Elaine Borges e

R
Eliziane Streiechen traz o quanto a visão da complexidade pode contribuir

oa
para a compreensão da educação de surdos. O mundo é o que é e qualquer
reducionismo ou compartimentalização não atende às suas necessidades.
A diversão e o entretenimento de preparar este livro proporcionou co-
aC
adaptação de funções entre todos que dele fizeram parte. Houve grandes
perturbações nos sistemas dos autores com sucessivas revisões dos textos e
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demandas das editoras. Algumas peças do quebra-cabeças encaixavam logo


de primeira vez, outras demandaram grandes esforços e reflexões. Tudo isso
visã
para que o resultado final fosse orgânico, sistêmico, vivo, entrelaçado, um
mosaico fractal. Isso resultará em novas condições iniciais que serão o palco
para novas perturbações e novos rumos.
a re
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par
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do
a uto
r
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
SOBRE OS AUTORES

Eduardo Castro dos Santos Junior

od V
r
É graduando em Letras com habilitação em língua inglesa pela

uto
Universidade Federal do Pará. Foi assistente de ensino (teaching assistant)
nos projetos Ícone Duke-UFPA em duas edições do programa. Atualmente
exerce a mesma função no projeto FáLá English Project. É aluno voluntário

R
de iniciação científica e professor estagiário de inglês nos Cursos Livres de

oa
Línguas Estrangeiras (CLLE) da instituição em que estuda. Sua pesquisa
sobre a relação entre aconselhamento, motivação e complexidade foi agra-
ciada com o prêmio Destaque da Iniciação Científica na área de Ciências
aC
Humanas e Sociais, Letras e Artes em 2015 na UFPA. Seus interesses de
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

pesquisa incluem sistemas adaptativos complexos, motivação, autonomia,


crenças e aconselhamento em aprendizagem de línguas. E-mail: eduardo_
visã
castro_jr@hotmail.com

Elaine Ferreira do Vale Borges


a re
itor

É bacharel e licenciada em Letras (Português/Inglês) pela FCLAR/


UNESP, mestre em Linguística Aplicada pelo IEL/UNICAMP e doutora
em Educação pela FE/USP. Fez estágio doutoral na Universidade de Murcia
(Espanha) e residência pós-doutoral na UFMG. Atualmente, é professora
par

adjunta do Departamento de Estudos da Linguagem (DEEL) e do Programa


de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Estadual de Ponta
Grossa (UEPG). Na mesma instituição, coordenou o Programa Inglês Sem
Ed

Fronteiras (SESu/MEC), o Projeto Paraná Fala Inglês (SETI/PR) e o


Subprojeto PIBID/Inglês (CAPES). Seus interesses de pesquisa situam-se
são

nas áreas de ensino e aprendizagem de línguas adicionais (incluindo Libras


e Português como L2), abordagens de ensino de línguas e formação de pro-
fessores na perspectiva da teoria da complexidade/caos. É líder do grupo de
ver

pesquisa LINC – Linguagem e Complexidade do CNPq (http://grupolinc.


blogspot.com.br). E-mail: elainefvb@uol.com.br e elainefvb@uepg.br
292

Eliziane Manosso Streiechen

É graduada em Letras Português/Inglês; bacharel em Letras/Libras pela


Universidade Federal de Santa Catarina; Especialista em Psicopedagogia
Institucional e Clínica; mestre em Educação pela Universidade do Centro-

V
r
Oeste de Guarapuava/PR (UNICENTRO); doutoranda do Programa de

uto
Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa/
PR. Foi professora e tradutora/intérprete de surdos durante vinte anos. Foi
uma das fundadoras da APAE de Ivaí/PR. Atualmente, é professora efetiva

R
da UNICENTRO, Campus de Irati/PR, onde exerce ou exerceu as seguintes

a
funções: coordenadora do Programa de Inclusão e Acessibilidade; coorde-
nadora substituta do PIBID/Espanhol; coordenadora do Curso de Libras no

do
Centro de Línguas. Possui pesquisas relacionadas à aquisição da linguagem
escrita pelo aluno surdo; CODA (Children of deaf adult); inclusão; surdez,
aC
entre outras temáticas. Publicou dois livros: “Língua Brasileira de Sinais

Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão


são
- Libras”, pela Editora UNICENTRO de Guarapuava/PR, 2012 e “Libras:
aprender está em suas mãos”, pela Editora CRV de Curitiba/PR, 2013.
E-mail: lizi.unicentro@yahoo.com.br.
i
rev

Jhonatan Allan de Andrade Rabelo


or

É mestre em Estudos Linguísticos com ênfase em Ensino e Aprendizagem


de Línguas e Culturas pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Também
ara

possui graduação em Licenciatura em Letras - Habilitação em Inglês nessa


mesma instituição. Trabalha como professor substituto desde 2015 na mesma
t

instituição. Seus principais interesses de pesquisa são motivação, autonomia,


i

aconselhamento linguageiro, teoria da complexidade e abordagem ecológica


op

para a aprendizagem de línguas. E-mail: jhonatan_rabelo@hotmail.com


E d

Kelly Cristina Marques Gaignoux

É doutoranda em Estudos Linguísticos do Programa de Pós-Graduação


ver

em Letras da Universidade Federal do Pará (2016) e mestre em Letras


pelo mesmo programa. Graduada em Letras (Habilitação Língua Inglesa)
pela Universidade Federal do Pará (2001) e graduada em Psicologia pela
Universidade da Amazônia (1991). Atualmente, é professora assistente
do curso de Língua Inglesa da Universidade Federal do Pará, Campus
Bragança. Tem experiência na área de Linguística, com ênfase no ensino e
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 293

aprendizagem de línguas. Atua principalmente nos seguintes temas: Ensino e


Aprendizagem de Língua Inglesa sob a ótica da Complexidade, Metodologia
e Técnicas de Ensino, Formação de professores e Identidade. E-mail:
kgaignoux@gmail.com

od V
r
uto
Kelly Cristinna Frigo Nakayama

É licenciada em Letras Português/Espanhol pela Universidade Federal

R
do Paraná (2001), bacharel em Letras na área de Espanhol pela Universidade

oa
Federal do Paraná (2002) e mestre em Letras (área de concentração em Estudos
Linguísticos: Aquisição de L2) pela Universidade Federal do Paraná (2006).
Atuou como Coordenadora do Núcleo Pedagógico de Licenciaturas (Letras e
aC
Pedagogia) na Faculdade de Telêmaco Borba-PR (FATEB). Atualmente é pro-
fessora de Língua Espanhola e Portuguesa no IFPR- Instituto Federal do Paraná,
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

Campus Telêmaco Borba e membro do COPE-Comitê de Pesquisa e Extensão


do IFPR, Campus Telêmaco Borba. E-mail: kellycrisf@yahoo.com.br.
visã
Larissa Dantas Rodrigues Borges
a re
itor

É doutoranda em Estudos Linguísticos no Programa de Pós-Graduação


em Letras na UFPA. É mestre em Linguística e especialista em Linguística
Aplicada ao Ensino da Língua Inglesa como Língua Estrangeira. Possui gra-
duação em Licenciatura em Letras - Habilitação em Português e Inglês nessa
par

mesma instituição. É professora efetiva, desde 2009, no curso de Letras


com habilitação em Inglês na Faculdade de Letras Estrangeiras Modernas
(FALEM) da UFPA. É membro do grupo de pesquisa “Aprendizagem de
Ed

línguas estrangeiras como um sistema adaptativo complexo: autonomia,


motivação e aconselhamento linguageiro”. Seus principais interesses de
são

pesquisa são autonomia e motivação na aprendizagem de línguas, aconse-


lhamento linguageiro, sistemas adaptativos complexos, escrita acadêmica e
gêneros textuais no ensino de LE. E-mail: dantaslarissa@yahoo.com.br
ver
294

Leonardo dos Santos Pereira

Possui graduação em Letras (Português/Inglês) pela Universidade


Estadual de Ponta Grossa (2014). Tem experiências na área de ensino de
idiomas desde 2011. Participou do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação

V
r
à Docência (PIBID) em 2013. Atualmente, ministra aulas de língua inglesa no

uto
Centro Brasileiro de Cursos (CEBRAC). E-mail: leopereirapg@gmail.com.

R
Maria Clara Vianna Sá e Matos

a
Possui graduação em Letras com habilitação em língua inglesa e sua

do
literatura pela Universidade Federal do Pará (1995); é especialista em
Linguística Aplicada ao Ensino e Aprendizagem de Língua Estrangeira
aC
pela Universidade da Amazônia (2004) e mestre em Linguística (2011) pela

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são
Universidade Federal do Pará (UFPA). Atua desde 1998 como professora
na Faculdade de Letras Estrangeiras Modernas (UFPA), ministrando disci-
plinas na área de linguística e de literatura em língua inglesa. Desde 2011
participa de grupos de pesquisa sobre motivação e autonomia do aluno de
i
língua estrangeira. Mais recentemente tem relacionado esses temas aos es-
rev

tudos de aconselhamento linguageiro e de sistemas adaptativos complexos.


Atualmente cursa Doutorado em Estudos Linguísticos no Programa de
or

Pós-Graduação em Letras na UFPA, continuando suas investigações acerca


desses fenômenos. E-mail: matos_mariaclara@yahoo.com.br
ara
t

Michell Gadelha Moutinho


i
op

É mestre em Letras pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da


d

Universidade Federal do Pará (2016). Graduado em Letras (Habilitação


em Língua Alemã e Língua Portuguesa) pela Universidade Federal do Pará
E

(2009). Atualmente é professor da Escola de Aplicação da Universidade


Federal do Pará. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Línguas
Estrangeiras Modernas, Alemão. Atua também no projeto de Aconselhamento
ver

na aprendizagem de línguas, autonomia e motivação na perspectiva da com-


plexidade, coordenado pela Professora Dra. Walkyria Magno e Silva. E-mail:
michell_gm@hotmail.com
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 295

Rafael Vetromille-Castro

É graduado em Letras pela Universidade Federal de Pelotas, mestre


em Linguística Aplicada pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da
Universidade Católica de Pelotas e doutor em Informática na Educação

od V
r
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Possui pós-doutorado em

uto
Linguística Aplicada pela University of California, Berkeley. É professor
do Programa de Pós-Graduação em Letras stricto sensu e da área de língua
inglesa do Centro de Letras e Comunicação da Universidade Federal de

R
Pelotas. Atua na área de Linguística Aplicada, com especial interesse de pes-

oa
quisa na interface linguagem e tecnologias, formação de professores, ensino/
aprendizagem de línguas, usabilidade pedagógica, interação e complexidade.
É membro do grupo de trabalho Linguagem e Tecnologia da Associação
aC
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Letras e Linguística (ANPOLL).
De 2014 a 2015, integrou o Núcleo Gestor do Programa Idiomas sem
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Fronteiras (IsF/MEC) como vice-presidente na área de uso de tecnologias


para educação e ensino de idiomas. E-mail: vetromillecastro@gmail.com.
visã
Rodrigo Camargo Aragão
a re
itor

É doutor em Linguística pela UFMG. Professor no Programa de Pós-


Graduação em Letras e na Licenciatura em Letras da Universidade Estadual
de Santa Cruz onde lidera o grupo de Pesquisa FORTE (CNPq/UESC).
Atua na Linguística Aplicada nas linhas: ensino/aprendizagem de línguas;
par

linguagem e tecnologias. Desenvolve pesquisas com foco na formação de


professores mediada por tecnologias digitais e no papel das emoções em
experiências de ensino/aprendizagem. Os focos de pesquisa são subsidiados
Ed

por abordagens da complexidade de sistemas, em particular pela Biologia do


Conhecer. Foi Diretor de Educação a Distância e Tecnologias Educacionais
são

do Instituto Anísio Teixeira (2011-2013) da Secretaria da Educação do


Estado da Bahia. Atualmente, coordena o GT de Linguagens e Tecnologias
da ANPOLL para o biênio 2014-2016 e realiza estágio pós-doutoral em
ver

Linguística Aplicada na UFMG. E-mail: aragaorc@gmail.com.


296

Sádie Saady Morhy

É bacharel em Turismo pela Universidade Federal do Pará, UFPA


(1983), e possui Licenciatura em Letras Português, Inglês e suas litera-
turas, pela Universidade da Amazônia (2010). É especialista no Ensino e

V
r
Aprendizagem do Inglês como Língua Estrangeira, e Mestre em Estudos

uto
Linguísticos pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da UFPA (2015).
Ministra aulas para a graduação em Licenciatura em Letras, Inglês desde
2012, para disciplinas de Língua Inglesa, Literatura Anglófona, Linguística

R
e Estágio Supervisionado, no programa PARFOR. Atualmente é professora

a
na Faculdade de Letras Estrangeiras Modernas da UFPA. Entre os anos de
2012 e 2015, dedicou parte de seu tempo a projetos que investigam questões

do
que envolvem complexidade e autonomia para aprender uma língua estran-
geira, com ênfase em centros de autoacesso e aconselhamento linguageiro.
aC
Em 2016 ingressou no Doutorado em Estudos Linguísticos e no grupo de

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diemorhy@yahoo.com
são
pesquisa DISSE - Discurso, Sujeito e Ensino, ambos da UFPA. E-mail: sa-
i
Valdir Silva
rev

É graduado em Letras (Português/Inglês) pela Universidade do Estado


or

de Mato Grosso (1990), mestre em Linguística Aplicada pelo Instituto de


Estudos da Linguagem (IEL/UNICAMP, 2003) e doutor em Linguística
ara

Aplicada pela Faculdade de Letras (FALE/UFMG, 2008). É professor


efetivo do Curso de Letras, campus de Cáceres e do Programa de Pós-
t

Graduação em Linguística da UNEMAT. Integra o Núcleo de Pesquisa em


i

Linguagem e Tecnologia do Centro de Estudos e Pesquisas em Linguagem


op

(CEPEL/UNEMAT) e o GT Linguagem e Tecnologia da ANPOLL. Lidera


d

o Grupo de Pesquisa/CNPq Linguagem, Tecnologia e Contemporaneidade


em Linguística Aplicada (LINTECLA). Tem como foco de estudo os efeitos
E

das tecnologias digitais nas práticas de língua(gem) e na formação de pro-


fessores da área da Linguagem, na perspectiva dos Sistemas Adaptativos
Complexos. E-mail: ollule4@yahoo.com.
ver
COMPLEXIDADE EM AMBIENTES DE ENSINO
E DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ADICIONAIS 297

Walkyria Magno e Silva

É graduada em Letras Português e Alemão pela Universidade Federal


do Paraná e em Inglês pela Universidade Federal do Pará, mestre em
Linguística pela Universidade Estadual de Campinas, doutora em Ciências

od V
r
da Linguagem pela Universidade de Toulouse II (Le Mirail, França) e pós

uto
doutora pela Universidade Federal de Minas Gerais. Atualmente é pro-
fessora associado 4 da Universidade Federal do Pará, onde leciona no curso
de Letras com habilitação em inglês e no Programa de Pós Graduação em

R
Letras. Seus interesses de pesquisa centram-se nos seguintes temas: auto-

oa
nomia, estratégias de aprendizagem, estilos de aprendizagem, motivação,
aconselhamento linguageiro e ensino e aprendizagem de línguas estran-
geiras no paradigma da complexidade. De março de 2008 a março de 2010
aC
ocupou o cargo de Diretora da Faculdade de Letras Estrangeiras Modernas
da Universidade Federal do Pará. E-mail: walkyriamagno@gmail.com e
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão

wmagno@ufpa.br
visã
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itor
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Ed
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R
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do
aC

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ver

SOBRE O LIVRO
Tiragem: 1000
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12 X 19 cm
Tipologia: Times New Roman 11,5/12/16/18
Arial 7,5/8/9
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal Supremo 250 g (capa)

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