Política monetária no Brasil em tempos de pandemia. Brasil: J. Polit. Econ. 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0101-31572022-3353. Acesso em 07 jun 2023.
A política monetária adotada no Brasil desde 1999, baseada no regime de
metas de inflação, tem como objetivo principal alcançar a estabilidade de preços, utilizando a taxa básica de juros (SELIC) como único instrumento de controle. No entanto, após 22 anos de sua implementação, constata-se que em apenas 7 desses anos a inflação ficou dentro da meta estabelecida, revelando a baixa eficácia dessa política. O artigo traz uma análise crítica dessa abordagem, explorando suas limitações e os mecanismos de transmissão da política monetária no contexto brasileiro. Uma constatação importante é a falha desses mecanismos, com a taxa de câmbio se mostrando o mais eficaz, o que introduz um viés na administração da política monetária, levando à tolerância com movimentos de apreciação da taxa real de câmbio devido ao seu efeito positivo no controle da inflação. Essa dinâmica, também observada em outras economias em desenvolvimento, contribui para a desindustrialização do Brasil, reduzindo seu potencial de crescimento e aumentando a vulnerabilidade a choques de oferta. Uma crítica fundamental é direcionada à escolha da taxa de juros como instrumento para controlar a inflação. Sob a perspectiva da não neutralidade da moeda no longo prazo, a literatura pós-keynesiana e a teoria da inflação inercial argumentam que a taxa de juros não é o melhor instrumento, uma vez que é necessário distinguir as causas que mantêm a inflação daquelas que a aceleram. A inércia inflacionária e a indexação dos preços são apontadas como fatores que mantêm a taxa de inflação, enquanto as pressões de custo e, em menor medida, o excesso de demanda em relação à oferta agregada são fatores que a aceleram. Portanto, a política monetária baseada na taxa de juros pode levar a uma convenção de nível de taxa de juros "normal" excessivamente elevada, prejudicando o investimento produtivo e reduzindo o potencial de crescimento a longo prazo. Outro ponto relevante abordado é a busca de credibilidade da política monetária por meio de regras rígidas, o que pode resultar na captura do banco central pelos interesses do setor financeiro, aumentando a concentração de renda e riqueza. Esse aspecto é particularmente evidente em economias financeiramente integradas, como o caso do Brasil, que adotam a estratégia de crescer com poupança externa. Nesse contexto, a política monetária baseada na taxa de juros pode restringir o espaço de política para estratégias de desenvolvimento econômico e geração de emprego. No geral, o artigo oferece uma análise crítica da política monetária adotada no Brasil, destacando sua baixa eficácia, os mecanismos de transmissão falhos e as limitações do uso da taxa de juros como instrumento de controle da inflação. Além disso, ressalta a importância de considerar outras variáveis e causas da inflação, bem como os impactos macroeconômicos de longo prazo resultantes das decisões de política monetária. O texto enfatiza a necessidade de uma abordagem mais abrangente e cautelosa na definição da política monetária, levando em conta as peculiaridades da economia brasileira e buscando promover o desenvolvimento sustentável e a geração de emprego. Além disso, é essencial considerar o impacto da pandemia na análise da política monetária. A crise desencadeada pela pandemia de COVID-19 teve efeitos significativos na economia brasileira. Durante esse período, houve incertezas consideráveis sobre a evolução da pandemia, o que torna questionável o uso das expectativas de inflação como guia confiável para justificar aumentos na taxa de juros. Os testes empíricos realizados revelaram que a inflação de preços administrados não responde à taxa de juros. Em relação à inflação de preços livres, os testes empíricos confirmaram a relevância dos choques de custo, como o índice do preço das commodities e a taxa de câmbio, na sua evolução. Portanto, uma análise completa da política monetária no Brasil requer levar em consideração não apenas a eficácia e as limitações do uso da taxa de juros como instrumento de controle da inflação, mas também os impactos de longo prazo resultantes das decisões de política monetária. Além disso, é fundamental considerar o contexto da pandemia e suas incertezas, a fim de adotar abordagens mais abrangentes e cautelosas na definição da política monetária, visando promover o desenvolvimento sustentável e a geração de empregos.