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Segunda prova de Economia Monetária

Daniel Campos Nigro

RA: 243777

Da política fiscal e monetária em tempos de inflação: teoria e crítica à visão


ortodoxa

Em tempos recentes, poucos assuntos são mais caros ao noticiário econômico do


que a inflação e o combate a este fenômeno. Como exemplo, vem logo à mente o caso
brasileiro de manutenção da taxa básica de juros em níveis elevados (13,75% ao ano)
para conter a “marcha inflacionária”. Entretanto, conforme se discutiu ao longo do
semestre, o uso da taxa básica de juros como única ferramenta para o combate à
inflação, o qual está alicerçado na teoria econômica pelas contribuições do Novo
Consenso Macroeconômico (que deriva dos Novos Keynesianos e até mesmo dos
Novos Clássicos), tem críticas pertinentes ao seu funcionamento e à sua funcionalidade
de forma geral. Para debater esta questão, convém expor os alicerces que sustentam essa
forma de lidar com a inflação, bem como as críticas que surgem neste âmbito.

A ideia da inflação como fenômeno exclusivamente monetário ressurge com os


monetaristas, dos quais o mais famoso expoente é Friedman. Em uma apropriação da
Teoria Quantitativa da Moeda, concluiu-se que a quantidade de moeda em circulação é
o fator que acarreta a inflação, ao impulsionar a economia para além da Taxa Natural de
Desemprego – taxa de desemprego à qual não há processo inflacionário; gerando um
aumento de preços pelo lado da demanda. Com isso, geram-se expectativas equivocadas
nos agentes, a chamada Ilusão Monetária, fazendo com que haja um aumento no nível
de preços, ou seja, inflação. Após, a economia passa a atuar com a mesma taxa de
desemprego – ideia de mercados perfeitamente autorreguláveis, porém com inflação. Ou
seja, altera-se a curva de Phillips, tornando-a aceleracionista.

Modificando o conceito de expectativas, passando de adaptativas para racionais


(em outras palavras os agentes passam a olhar não somente para o passado para
constituir as suas expectativas), a partir de Lucas (escola Novo-Clássica), ainda há a
importância da taxa natural de desemprego, taxa a qual sempre retorna a economia.
Assim, qualquer política econômica estará somente gerando prejuízos, ao passo que não
altera o emprego e o crescimento do produto no longo prazo, gerando apenas um rastro
inflacionário. Vem dessa escola a gestação de políticas como a de independência dos
Bancos Centrais, para não gerar expectativas equivocadas nos agentes.

Atualmente, com a política de metas para a inflação, vigoram as contribuições


teóricas do Novo Consenso Macroeconômico. Existe, a partir das contribuições dos
Novos-Keynesianos, a percepção que o Market Clearing não é integral. Há uma regra
para o controle da inflação que deve mantê-la dentro da meta: a Regra de Taylor, a qual
determina a taxa de juros em vigor para controlar a inflação. Percebe-se uma crítica a
políticas discricionárias na tradição ortodoxa no trato à inflação, as quais podem gerar
expectativas equivocadas nos agentes, piorando o cenário macroeconômico ao invés de
melhorá-lo. Com as metas para a inflação, em teoria a comunicação do governo melhora
– não gera expectativas equivocadas nos agentes – e controla-se o governo.

Começando a explicitar as críticas à tradição ortodoxa de política


macroeconômica, vê-se que a inflação de custos é descartada, na teoria e na forma de
lidar com o fenômeno inflacionário. Em contraponto a concepção unilateral da inflação
(como demanda), nota-se que a inflação decorre também de choques de custo, os quais
são repassados aos consumidores, e um conflito distributivo – como bem expõem os
Pós-Keynesianos -, no qual o poder de barganha dos trabalhadores é maior, gerando um
choque pelo aumento do salário real. Percebe-se que de forma alguma a política
aumento de juros coíbe este aumento da inflação.

Em adição, como Modenesi explica, os mecanismos de transmissão da política


monetária no contexto brasileiro são bastante falhos. O autor coloca que um aumento da
taxa básica de juros (a nossa Selic) pode inclusive provocar uma alta inflacionária, visto
que os títulos são pós-fixados, além da sensibilidade ser baixa para o aumento dos juros,
precisando de altíssimas taxas de juros para manter a inflação contida. Há ainda os
choques de câmbio-custo, nos quais o aumento da taxa de câmbio leva ao aumento do
custo de produção (por meio de insumos importados).

A ideia da inflação como um fenômeno exclusivamente monetário, como


advogava Friedman em sua retomada da TQM1, assim, cai por terra. Ainda mais quando
se utiliza como exemplo o uso de políticas como o quantitative easing em tempos

1
Teoria Quantitativa da Moeda.
recentes, no quais mesmo com a emissão monetária, via venda de títulos, não houve
uma alta inflacionária.

Tratando agora das propostas alternativas à ortodoxia, na MMT (Teoria


Monetária Moderna) vemos uma política, já adotada pelo Japão, por exemplo, de
controle da curva de juros de longo prazo. Ou seja, ao invés de somente estabelecer a
taxa básica de juros, deixando o mercado determinar as demais para o futuro,
estabelece-se taxas específicas para cada período temporal. A Teoria Monetária
Moderna ainda afirma que a política fiscal é essencial para o controle da inflação,
estando de acordo com o texto presente na proposta, sendo até mais importante que a
política monetária, embora as duas devam ser combinadas. Isto é, não adianta ter uma
política monetária seguindo em uma direção completamente oposta à da política fiscal,
é fundamental pensar em uma política macroeconômica de forma integral, como um
todo.

O câmbio também tem papel impactante, conforme vimos, em uma alta


inflacionária. Assim, segundo a Hierarquia Internacional Monetária (HIM), a qual
coloca as moedas nacionais em diferentes posições de acordo com sua
“funcionalidade”2, existem limites para a política monetária em países de moedas menos
líquidas (países periféricos). O foco seria, então, em políticas cambiais, além de limitar
o fluxo de capitais, visando uma taxa de câmbio competitiva. Apesar disso, nota-se uma
falta de tratamento para com a política fiscal, sendo relegada a um segundo plano dentro
da HIM, uma crítica feita pela MMT à HIM.

Após esta breve exposição das críticas à política de tratamento à inflação nos
moldes ortodoxos, conclui-se que a taxa de juros e a política monetária sozinhas não
dão conta de todo o fenômeno inflacionário, sendo necessária a combinação com
políticas fiscais, que assumem um papel dominante, bem como políticas cambiais e
controle dos fluxos de capitais. Assim, pelo controle dos custos pela política fiscal, a
situação dos grandes manuais de economia e contradita pela realidade e de forma
teórica pelas contribuições dos heterodoxos à política macroeconômica: uma política
fiscal expansionista pode ser de muito mais auxílio no combate a inflação, ao observar
as causas do fenômeno inflacionário, do que a elevação da taxa de juros e ainda mais do
que uma política fiscal contracionista.

2
Embora seja ainda possível explicar a hierarquia de moedas de uma forma estruturalista ao invés de
funcionalista.

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