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População de Salvador encolheu

quase 10% nos últimos 12 anos


Cidade perdeu 257 mil habitantes e a posição de 3ª mais populosa do país

Gil Santos
gilvan.santos@redebahia.com.br

Publicado em 29/06/2023 às 05:01:10

Movimento na Estação da Lapa até engana, mas a verdade é que cidade está com menos moradores. Crédito: Marina Silva
Imagine o trânsito no horário de pico, as avenidas, o metrô lotado e os ônibus cheios. Pode parecer
estranho, mas a população de Salvador encolheu -9,6% nos últimos 12 anos. Dados do Censo
Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), divulgados nesta quarta-feira
(28), revelam que a cidade perdeu 257 mil moradores, entre 2010 e 2022, sendo esta a maior
queda dentre as capitais e a segunda maior em todo o Brasil.

O único município que teve redução populacional absoluta maior que Salvador foi São Gonçalo
(RJ), com -10,3%. Até 2010, a capital baiana era a 3ª cidade mais populosa do Brasil, atrás apenas
de São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ). Agora, foi ultrapassada por Brasília (DF) e Fortaleza (CE).
São 2,4 milhões de soteropolitanos. O superintendente do IBGE, André Urpia, conta que é preciso
observar o contexto para entender os números.

“Enquanto Salvador teve redução populacional, cidades vizinhas como Lauro de Freitas e Camaçari
registraram crescimento no número de moradores e de domicílios. Nesses últimos 12 anos, foram
construídos muitos empreendimentos nessas cidades. Além disso, a pandemia possibilitou o home
office, que pessoas pudessem trabalhar de qualquer lugar mesmo atuando em Salvador”, disse.

Ele acredita que esse processo migratório foi responsável também pelo aumento populacional em
seis dos dez municípios da Região Metropolitana que fazem parte da Grande Salvador. Os
números mais expressivos foram em Lauro de Freitas (24,4%), Camaçari (23,3%) e São Francisco
do Conde (13,7%), mas também houve crescimento em Dias D’Ávila, Madre de Deus e Mata de
São João.

Estudante de Medicina Veterinária, Maria Eduarda Gomes, 23, foi uma das pessoas que deixaram
a capital para buscar novos rumos na RMS, mais especificamente em Abrantes, distrito do
município de Camaçari. A escolha pelo novo local de morada se deu em consenso com a família,
que à época havia decidido se mudar do apartamento que a estudante morava desde que nasceu. 

"O custo de moradia em Salvador está muito alto, então, na Região Metropolitana, consigo morar
melhor pagando muito menos. Quando digo morar melhor, quero dizer com mais segurança, em
bairros mais tranquilos e casas maiores", esclarece a jovem.

Na contramão do aumento populacional entre as cidades da RMS, ficaram Salvador, São Sebastião
do Passé, Simões Filho e Candeias, onde ocorreram reduções. Os recenseadores identificaram 3,3
milhões de pessoas vivendo nos dez municípios citados, o que representou queda de 4,7% na
comparação com 2010. 

Mesmo com a capital reduzindo o número de moradores, a população da Bahia aumentou.


Segundo o Censo do IBGE, o crescimento foi de 10 mil novos habitantes por ano (119 mil, no total).
Em geral, os baianos estão fugindo dos grandes centros urbanos e buscando cada vez mais o
interior.

O doutor em Ciências Sociais e professor titular do Programa de Pós-graduação em


Desenvolvimento Regional e Urbano (PPDRU) da Unifacs, Laumar Neves, explica que fatores
relacionados a mortalidade e fecundidade também estão relacionados a essa mudança de
comportamento.

“Historicamente, Salvador foi uma cidade que atraiu a população do interior que se deslocava para
a capital em busca de novas oportunidades de trabalho e melhores condições de vida. Nos últimos
anos, as cidades da Região Metropolitana deixaram de ser atrativas, a taxa de desemprego é alta e
as condições de vida não são fáceis”, disse.

O professor lembrou que os grandes centros enfrentam problemas sociais, como maior
insegurança e dificuldade de acesso a serviços, e que o custo de vida e do solo são mais caros. No
caso de Salvador, melhorias no transporte público facilitaram a integração com regiões como Lauro
de Freitas e Camaçari, onde o preço de casas e apartamentos são mais baixo. Além disso, a
mortalidade é maior nas metrópoles, seja pela violência, seja por questões de saúde.

“Salvador e outros centros urbanos registraram muitas mortes na pandemia, e muita gente mudou
para o interior. O crescimento das cidades de pequeno e médio porte traz um desafio para o poder
público que será como ordenar o solo e melhorar a prestação de serviços nesses locais, porque no
Brasil o crescimento populacional se faz acompanhar pela desigualdade social e aumento da
pobreza”, afirmou.

A oferta de políticas públicas, como construção de universidades em municípios do interior e


incentivos ficais para o agronegócio, atraem investimentos privados e mais pessoas para essas
cidades. Um exemplo é Luís Eduardo Magalhães, no Oeste do estado. Em 2010, a cidade tinha
60,1 mil habitantes. Em 2022, contabilizou 107,9 mil moradores, um aumento proporcional de
79,5% da população.

O crescimento é visto positivamente pelo prefeito de Luís Eduardo Magalhães, Junior Maraba
(DEM. Ele atribui a alta populacional não só à força do agronegócio, mas também ao planejamento
municipal. "Atrás dessa máquina do agro, existe toda uma operação de um município. [...] Hoje,
além da melhoria na prestação dos serviços públicos e do grande programa de urbanização que
estamos realizando, nós focamos na qualificação da mão de obra da população para que ela
receba esse impacto, transformando isso em oportunidades de negócios e na qualidade do serviço
ofertado. Uma coisa é fato: aonde existe emprego, existe crescimento. Ninguém se muda para uma
cidade que não tem trabalho", frisa.

Já Vitória da Conquista, no Sudoeste do estado, foi o município que mais cresceu em termos
absolutos. Segundo o IBGE, em 2010, a cidade tinha 306 mil habitantes. Em 2022, são 370 mil,
aumento de 64 mil pessoas ou 20,9% a mais da população. Em seguida, aparecem Feira de
Santana, com 59 mil moradores a mais, e Camaçari, com 56 mil.

Para a prefeitura do município, o crescimento é puxado pelas oportunidades de investimento. “A


nossa cidade é polo e atrai um quantitativo importante de pessoas de toda a região, inclusive do
norte de Minas, que buscam serviços aqui”, afirma a gestão municipal. Apesar do crescimento ser
visto com bons olhos, a prefeitura admite que ela sobrecarrega a malha viária, o sistema de saúde
pública e de transporte público.

“Com o novo levantamento, esperamos que os repasses do Fundo de Participação dos Municípios
(FPM) e das outras rubricas tenham a mesma proporção de crescimento. De nossa parte, vamos
continuar o trabalho para organizar e planejar a urbanização, o saneamento, os serviços de
educação, saúde e desenvolvimento social, além de criar um ambiente permeável para as
atividades econômicas”, destaca.

Também no Sudoeste do Estado foi registrado outro destaque no levantamento feito pelo Censo
2022. O município de Caatiba, que antes era um povoado denominado Riachão, apresentou a
menor redução proporcional de sua população, encolhendo -45,7%. A reportagem tentou entrar em
contato com a prefeitura através dos canais oficiais disponibilizados no site do munícipio, mas não
obteve sucesso.

Moradia

O número de moradores por domicílio também reduziu em todo o país, incluindo a Bahia e
Salvador. A pedagoga Michele Santos, 29 anos, sempre viveu em uma casa com muita gente, mas,
em 2017, resolveu deixar a residência dos familiares, em Santa Luzia do Lobato, no Subúrbio
Ferroviário de Salvador, onde vivia com mais cinco pessoas. Primeiro, ela dividiu apartamento com
uma amiga, e depois, passou a morar sozinha.

“A mudança foi por questões pessoais e de necessidade. Sempre tive a meta de que quando
conseguisse um emprego legal e a grana permitisse morar sozinha, ainda que de aluguel, faria
isso. Tirando alguns perrengues, a gente aprende a administrar nossa própria vida, cresce diante
das dificuldades, traça planos para buscar sempre oportunidades melhores e vive em paz”, conta.
Na capital baiana, a média é de 2,5 moradores por imóvel, no estado o percentual é de 2,8
habitantes. Os especialistas afirmam que esse cenário é resultado de várias escolhas. Em geral, as
famílias têm optado por ter menos filhos. Segundo o Banco Central, a taxa de fecundidade, que
mede a quantidade de nascimentos de crianças por mulher, está em 1,65 no Brasil, menor que a de
países como México (1,90) e Argentina (1,91).

A redução de filhos é percebida em todas as camadas sociais, está decrescendo desde a década
de 1960 e diretamente ligada aos métodos contraceptivos e a mudança do papel da mulher na
sociedade. A participação feminina no mercado de trabalho, movimentos de conscientização e
novos objetivos profissionais e acadêmicos têm levado às famílias a postergar a chegada e a
quantidade de bebês.

Em termos de moradias, o estado registrou crescimento nos três modelos pesquisados. Dos
6.873.605 domicílios visitados pelos recenseadores na Bahia, o número de ocupados aumentou
23,9%, o de vagos cresceu 78,1% e o de uso ocasional pouco mais que dobrou, aumentando
102,3%. Os modelos vagos, ou seja, sem moradores, e os de uso ocasional, como casas de praia e
veraneio, foram os que mais aumentaram.

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