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Angelo Arruda
Angelo Arruda
FOLHA APROVAÇÃO
3
AGRADECIMENTOS
RESUMO
ABSTRACT
This study intends to show that the non-execution of social rights by the State,
assured by the Federal Constitution, is the result of unfair economic and policy
structures, based on the lack of efficient public policies for the social inclusion. The
challenge identified regards changing these structures, as well as reassessing
Federalism, which has shown to be harmful in many aspects. To do so, the deductive
approach method was used, and as a procedure technique, the monograph, focusing
consultation on doctrinal elements. Concerning authors to be used as theoretical
reference, J.J. Gomes Canotilho and Ricardo Lobo Torres on the constitutional
principles and their realization were used. Secondly, when analyzing the matters
involving local power and extrafiscality, the choice made was Ricardo Hermany and
Hugo Thamir Rodrigues. This paper is divided into three chapters: the first one is
about the State and its role in implementing social rights; the second one focuses on
Federalism and the importance of local power; finally, the third one involves public
administration and extrafiscality, thus, revealing its connection with the research line -
social rights and public policies. This paper concludes that there is the need of
reviewing essential matters involving Brazilian Federalism, fiscal solidarity and the
character of extrafiscality in the taxation. There are also conclusions on the possibility
of effective actions in the municipal scope, attached to the function of extrafiscality in
the taxation, in order to retrieve and assure the guarantees of the Constitution and
under it.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 07
INTRODUÇÃO
No Brasil a carga tributária1 atingiu nos últimos anos níveis expressivos, sendo
que as conseqüências disto são de todos conhecidas, em especial o fato de a
sociedade não ver transformados em serviços os tributos pagos, bem como uma
falta cada vez maior de investimentos.
Ocorre que nos últimos anos o Brasil obteve arrecadações fantásticas, com
recordes seguidos de superávit primário2, sem que os direitos sociais recebessem
melhorias por conta de tais fatores3, circunstância que evidencia que não é e não
será com maior receita fiscal que tais direitos serão prestigiados.
Neste sentido, o aumento da carga tributária definitivamente não pode mais ser
cogitado, até porque a luta para manter a atual tributação, como, por exemplo, nos
casos da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira de Valores e de
1
No primeiro semestre de 2006, a carga tributária em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) atingiu 39,41%,
contra 39,16% no primeiro semestre de 2005. Nesse período, os tributos federais totalizaram R$ 269,5 bilhões
(69%), os estaduais R$ 102,9 bilhões (26%) e os municipais R$ 20,3 bilhões (5%). O índice per capita dos seis
primeiros meses do ano teve um incremento de 8,97%, o que significa que cada brasileiro pagou R$ 175,53 a
mais de tributos. Em uma projeção para esse ano da carga tributária per capita, o IBPT estima um aumento de
9,84% nominal e 5,68% real. Com isso, cada pessoa deverá pagar R$ 4.380,00 em tributos, contra R$ 3.987,46
do ano passado. A carga tributária brasileira deu um salto nos últimos 50 anos, passando de 14,5% para quase
37,37% do PIB. (Fundação Escola Superior de Direito Tributário).
2
O setor público brasileiro consolidado fechou o ano passado com superávit primário de R$ 90,144 bilhões. Em
termos de comparação com o Produto Interno Bruto (PIB), o saldo correspondeu a 4,32%.(Fonte: Valor on line).
3
Para ‘honrar’ compromissos assumidos com a remuneração do capital financeiro especulativo, base de
sustentação e tônica da política econômica dos governos FHC e Lula, o setor público vem realizando
considerável ‘esforço fiscal’ para ‘fazer caixa’ para o superávit primário. Em outras palavras, vem deixando de
investir em áreas sociais prioritárias como saúde, educação, saneamento e habitação.
8
Entretanto, até que tudo isto se viabilize, passando do plano teórico para o
prático, necessária se mostra a busca de medidas capazes de permitir o
atendimento das demandas sociais pelo Estado. E é aqui que se inclui a
extrafiscalidade, como no decorrer deste trabalho procurar-se-á demonstrar.
Nos últimos anos por inúmeras razões o Estado tem sido repensado. Como
adiante será tratado, de uma postura neutra no chamado período liberal, o Estado
passou a ter destaque sobretudo a contar da segunda metade do século XX, em
face da formulação de políticas intervencionistas. Foi a fase conhecida como de
“bem-estar social”, que permitiu, em alguns casos, significativos avanços sociais e
econômicos.
4
A Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza
Financeira – CPMF foi instituída no ordenamento jurídico-positivo para vigorar inicialmente pelo prazo máximo de
dois anos, pela Emenda Constitucional nº 12/96, que incluiu o art. 74 ao Ato das Disposições Constitucionais
Tributárias.
9
Esta crise, por se manter estática, como não poderia deixar de ser, acaba por
gerar discussões generalizadas no campo da Política, da Economia e do Direito. É
isto que ocorre atualmente no Brasil, permitindo renovadas propostas reformistas
estimuladas pela dinâmica imposta pelo mundo globalizado, com destaque para a
redução do tamanho do Estado e para a implementação de políticas para
desenvolvimento do mercado enquanto instituição, como forma de possibilitar o
alcance de padrões econômicos capazes de gerar benefícios à sociedade.
Por fim, o artigo 203, procurando dar efetividade aos direitos e aos valores
mencionados acima, determina que seja prestada assistência social a quem dela
necessitar, independentemente de pagamento de contribuição à seguridade social,
explicitando seus objetivos nos incisos I a V, entre os quais, a proteção à família, à
maternidade, à infância, à adolescência e à velhice, o amparo às crianças e aos
adolescentes carentes, a promoção da integração ao mercado de trabalho, a
habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de
sua integração à vida comunitária. E, para atingir tais objetivos, o artigo 204, de
forma clara, prevê a atuação paralela das entidades beneficentes de assistência
social.
5
A expressão “Estado Moderno” é utilizada para caracterizar estruturas em que o governo, de modo direto ou
indireto, obedece a regras escritas ou consuetudinárias, que determinam seu funcionamento e resguardam as
pessoas de direito privado da interferência indevida do Poder Público. Referir Estado Moderno é modo de definir
o Estado de Direito, em que a escolha dos governantes é feita pelo povo, através do voto direto ou indireto,
sendo os candidatos apresentados por partidos políticos.
12
Para que seja possível realizar uma incursão pela evolução do Estado,
necessário de início conceituá-lo. Antes vale o alerta de Dalmo de Abreu Dallari
(2001, p. 41), no sentido de que são muitos os conceitos, formulados com grande
diversidade por todos que o têm em profundidade estudado, razão pela qual se
mostra necessária precisa fixação, de modo a evitar possíveis divergências
resultantes de concepções diversas.
Hans Kelsen (1998, p. 309) registra que Estado “[...] é uma sociedade
politicamente organizada, porque é uma comunidade constituída por uma ordem
coercitiva e esta ordem é o direito”.
Agustín Gordillo (1977, p. 89), afirma que o termo Estado para designar:
Manuel Gonçalves Ferreira Filho (1995, p. 45) compreende ser o Estado “[...]
uma ordem jurídica relativamente centralizada, limitada no seu domínio espacial e
temporal de vigência, soberana e globalmente eficaz”.
Por fim, indispensável o conceito objetivo dado por Dallari (2001, p. 49), ao
afirmar que o Estado é a “[...] ordem jurídica soberana, que tem por fim o bem
comum de um povo situado em determinado território”.
6
“Bem observa Agustín Gordillo que falar em Estado de Direito não quer dizer que todo o Estado deve ser
‘Estado de Direito’, o que vale dizer é que deve atuar com sujeição aos princípios jurídicos fundamentais,
respeitar os direitos individuais e, “em especial, a liberdade, ou seja, ‘saber se as normas jurídicas impetrantes
num determinado país submetem ou não o Estado’.” (MACEDO; FERRARI, 2005, p. 17).
15
Regina Maria Macedo e Nery Ferrari (2005, p. 16) afirmam que no século XX,
os Estados sofreram conseqüências de crises políticas, econômicas e ideológicas,
sendo que na evolução das instituições políticas é fundamental uma percepção de
Estado de Direito para que se possa compreender o status angariado pelo Estado:
7
“A concepção liberal do Estado de Direito servira de apoio aos direitos do homem, convertendo os súditos em
cidadãos livres, consoante nota Verdú, a qual, contudo, se tornara insuficiente, pelo eu a expressão Estado de
Direito evoluíra, enriquecendo-se com o conteúdo novo.
Houve, porém, concepções deformadoras do conceito de Estado de Direito, pois é perceptível que seu
significado depende da própria idéia de que se tem do Direito. Por isso, cabe razão a Carl Schmitt quando
assinala que a expressão ‘Estado de Direito’ pode ter tantos significados distintos como a própria palavra
“Direito” e designar tantas organizações quanto as que se aplica à palavra ‘Estado’. Assim, acrescente ele, há
um Estado de Direito feudal, outro estamental, outro burguês, outro nacional, outro social, além de outros
conformes com o Direito natural, com o Direito racional e com o Direito histórico. Disso deriva a ambigüidade da
expressão Estado de Direito, sem mais qualificativo que lhe indique conteúdo material. Em tal caso a tendência é
adotar-se a concepção formal do Estado de Direito à maneira de Forsthoff, ou de um Estado de Justiça, tomada
a justiça como um conceito absoluto, abstrato idealista, espiritualista, que, no fundo, encontra sua matriz no
conceito hegeliano do Estado ético, que fundamentou a concepção do Estado fascista: ‘totalitário e ditatorial em
que os direitos e liberdades humanas ficam praticamente anulados e totalmente submetidos ao arbítrio de um
poder político onipotente e incontrolado, no qual toda a participação popular é sistematicamente negada em
benefício da minoria [na verdade, elite] que controla o poder político e econômico’. Diga-se logo, que o Estado de
Justiça, na formulação indicada, nada tem a ver com Estado submetido ao Poder Judiciário, que é um elemento
importante do Estado de Direito. Estado submetido ao juiz é Estado cujos atos legislativos, executivos,
administrativos e também judiciais ficam sujeitos ao controle jurisdicional no que tange à legitimidade
constitucional e legal. É também uma abstração confundir Estado de Direito com uma visão jusnaturalista do
Estado.
Por outro lado, se se concebe o Direito apenas como um conjunto de normas estabelecidas pelo Legislativo, o
Estado de Direito passa a ser Estado de Legalidade, ou Estado legislativo, o que constitui uma redução
deformante. Se o princípio da legalidade é um elemento importante do conceito de Estado de Direito, nele não se
realiza completamente”. (SILVA, 1999, p. 117-118).
16
8
A Revolução de 1789 foi uma revolta social da burguesia, inserida no Terceiro Estado francês, que se elevou
do patamar de classe dominada e discriminada para dominante e discriminadora, destruindo os alicerces que
sustentavam o absolutismo (antigo regime), pondo fim ao Estado Monárquico autoritário.
9
No tocante à Teoria da Separação dos Poderes de Montesquieu, adotada pelo Estado Liberal, José de
Albuquerque Rocha observa que o objetivo de Montesquieu ao idealizar os poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário, era preservar os privilégios da sua própria classe, a nobreza, ameaçada tanto pelo rei, que almejava
recuperar sua influência nacional, quanto pela burguesia, que dominando o poder econômico, intentava o poder
político. Elaborou, então, sua teoria que repartia o poder entre a burguesia, nobreza e realeza, afastando, deste
modo, a possibilidade da burguesia em crescimento ser a sua única detentora. (ROCHA, 1995, p. 128).
17
Neste contexto, o Estado Liberal surge como uma reação ao Estado Nacional.
Tal reação teve o seu início na Inglaterra, onde o processo de unificação do Estado
desenrolou-se com maior antecedência, e esteve caracterizado pelo esforço em
limitar o poder político e responsabilizar:
10
“O liberalismo político de Locke, no âmbito filosófico, e o Estado Liberal que, no plano histórico, se consolida a
partir da independência dos Estados Unidos da América e da Revolução Francesa, assinalam uma expressiva
ruptura com o formalismo jurídico do padrão absolutista. Apesar da preferência de muitos autores por destacar
os seus desvios e os seus deméritos, e a verdade é que ambos, sob a lua da doutrina dos direitos naturais,
realizaram uma façanha de não ouço magnitude, a estruturação de um modelo de Estado Material de Direito que
se antecipou em mais de um século à forma constitucional da generalidade das democracias ocidentais do
mundo contemporâneo (Alemanha, Espanha, Portugal, Itália, Brasil etc.), com os seus catálogos de direitos
fundamentais geralmente conectados a uma cláusula de intangibilidade normativa. Só uma miopia severa,
adquirida ao preconceito antiburguês, poderia impedir alguém de enxergar aí a exemplar sintaxe da filosofia de
Locke e dos movimentos revolucionários do século XVIII na América e na Europa”. (Martins Neto, 2003, p. 105).
11
“O liberalismo fez surgir [...] o chamado Estado Democrático de Direito. A fonte de legitimação do poder não é
mais o direito divino (império e monarquia), mas a escolha do governante pelo voto popular. Esse é o seu
aspecto democrático. A síntese principal do ‘Estado de Direito’, por outro lado, é a delimitação do poder político
através de sua qualificação jurídica. O emissor fundamental da ordem normativa já não é mais a figura do rei ou
imperador, cuja fonte de poder é supostamente divina e imutável, mas sim uma figura criada por uma
Constituição, ou Carta Fundamental de criação de direitos e deveres numa nação. [...] Tal tipo de Estado fez
surgir o capitalismo laissez faire, denominação que veio de uma expressão (laissez faire, laissez passeur)
utilizada pelos franceses do século XVIII, defensores do livre mercado. [...] O governo não controlava os rumos
18
Destaca ainda que as constituições que regeram o Estado Liberal Clássico não
apresentam referência direta à ordem econômica e social, de sorte que buscam
passar a imagem de que são constituições políticas preocupadas com a organização
da estrutura política do Estado. Tal não impede, segundo o referido autor, que se
reconheçam tais constituições como econômicas, ou seja, caracterizadas pela busca
da organização econômica fundamental, vez que os textos constitucionais liberais
clássicos incluem entre as liberdades públicas os direitos individuais de propriedade,
de comércio, de indústria, de profissão. Pode-se afirmar, assim, que correto é dizer
que o Estado Liberal subordinou a atividade política à econômica ou, melhor ainda, à
estrutura do Poder, às classes emergentes na sociedade burguesa. (2002, p. 31).
A ideologia liberal está caracterizada pela idéia de que o ser humano é um ser
individual, de forma que na relação indivíduo-sociedade, o primeiro prevalece. Os
direitos do indivíduo apresentam-se como absolutos, apenas encontrando limite
frente a direito igual de outro indivíduo.
da economia, mas punia condutas que violassem direitos e liberdades individuais, agindo mais por provocação,
de forma a calibrar a ordem social”. (Carvalho, 2005, 291-294).
12
“Não se deve, porém, exagerar demasiadamente, no plano doutrinário, o não intervencionismo estatal, pelo
menos na contribuição legada por Adam Smith. Julgava ele que o Estado tem apenas três deveres a cumprir:
primeiro, o de defender a sociedade da violência e da invasão por outras sociedades independentes; segundo, o
de proporcionar uma adequada administração da justiça, para os inevitáveis conflitos de interesses entre os
indivíduos; e terceiro – aqui o relativo intervencionismo de Smith -, o de propiciar aquelas obras públicas (public
Works) ‘de tal natureza, que o lucro jamais reembolsa as despesas de um indivíduo ou de um pequeno número
deles e, por esse motivo, não há razão para esperar que algum indivíduo ou pequeno grupo (small number of
individuais) as erija ou mantenha’.” (SOUZA JÚNIOR, 2002, p. 29).
19
De acordo com João dos Passos Martins Neto (2003, p. 107), a estrutura desse
modelo de Estado é de um “[...] Estado Material de Direito, cujo antagonismo com o
absolutismo compreende ainda a adesão ao princípio da soberania indivisível, ou da
separação de poderes (divisibilidade funcional) [...]”. Para ele, o nome do Estado
Liberal foi atribuído não em virtude de uma neutral submissão a restrições materiais,
mas sim levando em conta o conteúdo ideológico dos limites impostos a partir das
matérias consideradas indisponíveis ao legislativo sob a forma de direitos
fundamentais. Isto no seu entender nada mais foi do que “[...] imunizar as liberdades
individuais contra o arbítrio do poder [...]”.
O autor citado continua a sua explanação ressaltando que o Estado Liberal não
se resumiu na defesa única exclusiva dos direitos de liberdade:
Particularmente na França, porque a revolução almejava a destruição do
ancien regime fundado em privilégios aristocráticos e estamentais, o acento
maior foi colocado na igualdade, ou na proclamação do direito de todos os
indivíduos, pela sua só condição humana, a uma igual proteção das leis,
sem distinções por motivo de nascimento ou título de nobreza. Nos Estados
Unidos, devido à recepção da cultura jurídica inglesa, fortemente marcada
por institutos de natureza processual, ganharam proeminência a garantia do
devido processo legal e outras que lhe são correlatas (defesa, contraditório,
júri etc.). Paralelamente, completando o núcleo dos bens jurídicos mais
caros ao ideal dos movimentos revolucionários da modernidade, os direitos
à vida e à prosperidade obtiveram geral reconhecimento no seio liberal.
Começava, então, sob a armadura ideológica do liberalismo, uma nova
história do homem, que Bobbio viria a nomear de a era dos direitos.
Acresce considerar que os direitos políticos, sobretudo o direito de sufrágio,
embora num primeiro momento só consentidos aos proprietários, podem ser
considerados como uma conseqüência do Estado Liberal. (2003, p. 107-
108).
Em que pese os ideais liberais alcançarem outros direitos que não apenas a
liberdade, pode-se concluir, que, de modo geral, o Estado, na visão liberal, deveria
20
Souza Junior (2002, p. 36-37) afirma que, no momento em que o Estado deve
ficar o mais ausente possível do domínio das atividades econômicas e sociais,
pouco espaço resta para as funções denominadas “de governo”. Funções tais que
se refletem na vida econômica e social desenvolvidas por meio de políticas
públicas13 pelos órgãos específicos de governo, objetivando responder às demandas
dos diversos grupos integrantes da comunidade, bem assim deixar a competição
que se dá entre eles por recursos escassos.
Eros Roberto Grau (2001, p. 14-15) alerta, contudo, que o Estado sempre
esteve presente na atuação do campo econômico. Em suas palavras: “[...] ao tempo
do liberalismo era o Estado, seguidas vezes, no interesse do capital, chamado a
intervir na economia”. Angelita Maria Maders (2004) compartilha deste entendimento
ao afirmar que os Estados tiveram que assumir um papel ativo na industrialização
capitalista e no desenvolvimento social, resultando no que se convencionou
denominar de liberalismo tardio caracterizado por um Estado marcadamente
intervencionista14. Como afirma Caio Tácito (1998, p. 02):
13
Tal conceito será abordado, especificadamente, no Capítulo Terceiro.
14
Importante realizar a distinção entre intervencionismo, dirigismo e planificação: intervencionismo – são as
medidas eventuais por parte do Estado, caracteriza o início da derrocada do ideal liberal; dirigismo – caracteriza-
se pela intervenção mais acentuada e auxílio à iniciativa privada; planificação – a intervenção é ainda maior com
a elaboração de projetos e análises da economia global. (Streck; Morais, 2002).
22
Com tais mudanças ocorridas, uma nova forma de Estado vai surgindo,
trazendo consigo valores de cunho social. Surge, então, o Estado Social de Direito.
O que se verificou com o passar dos anos foi a existência de uma igualdade
somente formal, a qual, somada ao absenteísmo do Estado Liberal relativamente às
questões sociais, serviu para impulsionar o capitalismo, com conseqüente
agravamento das condições da classe trabalhadora, que passava a viver sob
condições miseráveis.
Este descompromisso com o aspecto social, que foi agravado pela Revolução
Industrial, culminou com a Revolução Russa de 1917, conduzindo os trabalhadores
a se organizarem, como única alternativa de garantir direitos. Como efeito disto e
para neutralizar os ideais revolucionários do leste europeu, surgiu o Estado Social,
caracterizado pela intervenção do Estado na economia, pela aplicação do princípio
da igualdade material e pela realização da justiça social.
23
15
“Por oportuno, há três apontamentos sobre questões de terminologia. O Estado Social, assim concebido,
naturalmente não se confunde com os sistemas políticos de inspiração marxista. Com efeito, como adverte
Bonavides, há lago, no ocidente, que o distingue, desde as bases, do Estado proletário ou comunista que o
socialismo radical intenta implantar: ‘é que lê conserva sua adesão á ordem capitalista, princípios cardeal ao qual
não renuncia’. Daí, a propósito, a explicação para opinião em geral difundida quanto a constituir o Estado Social
“um meio termo entre a proposta socialista revolucionária e o liberalismo em crise’. Nesse caso, uma vez que o
emprego do mesmo nome para designar objetos distintos é inaceitável, sob pena de frustração da função
primordial da linguagem, aos sistemas políticos marxistas se deve reservar uma nomenclatura própria e
exclusiva, como Estado Socialista, Estado Marxista ou Estado Comunista, a bem de espancar confusões
semânticas.
O Estado Social tem sido ainda, muitas vezes, assimilado aos chamados Estado-providência e Estado de Bem-
Estar. Alguns autores utilizam as expressões como sinônimas. Contudo, o caráter providencial ou beneficente diz
respeito, somente, à obrigatoriedade de o poder público fornecer um conjunto mínimo de bens e serviços
considerados essenciais à dignidade da existência humana, como em matéria de saúde, educação, assistência e
previdência, para o fim de liberar as classes pobres de uma alternativa inóspita; ou a constatação a título
oneroso no mercado privado ou a dependência de instituições caridosas de eficácia incerta. O aspecto da
providência liga-se, pois, essencialmente, à atividade estatal no campo da educação e da seguridade, que é
apenas uma das dimensões da política intervencionista que se generaliza a partir da segunda década do século
XX nos países ocidentais capitalistas. Por isso, Estado-Providência é uma categoria de abrangência limitada,
que está para a categoria Estado Social como um círculo menor desenhado dentro de outro mais vasto.
Na literatura política, o Estado Social já apareceu sob a denominação de Estado Contemporâneo. De fato, é
assim, entre nós, Pasold entendeu de nomear o novo modelo estatal que, ao menos no plano do discurso
constitucional, surge na segunda década do século passado, em 1917, com a Constituição Mexicana, e, em
1919, com a Constituição Alemã (ou de Weimar). Todavia, a divergência, aqui, é apenas aparente simbólica. O
Estado Contemporâneo de Pasold é justamente aquele que tem, como desígnio inerente à sua própria
existência, uma função social a cumprir, qual seja, a realização prioritária dos valores fundamentais da pessoa
humana (saúde, educação, trabalho, liberdade e igualdade), num ambiente jurídico-político em que se façam
imperar os mecanismos típicos do regime democrático (eleições, plebiscitos e referendos). Não é, pois, nem o
Estado liberal clássico, nem o Estado Socialista ortodoxo, mas o Estado Social da tradição ocidental, que exorta
a fraternidade entre os homens sem lhes aniquilar a autonomia.
Cabe averbar que, no mérito, a distância guardada do Estado Socialista tem conseqüências relevantes para a
compreensão do Estado Social. Posicionado numa linha intermediária entre individualismo e coletivismo, o
24
Estado Social parte de uma idéia de dignidade da pessoa humana que se assenta primeiramente no
reconhecimento de um direito humano de autodeterminação, cuja contrapartida é o dever de auto-
responsabilidade. Assim, se o Estado Social não tolera o abandono de cada qual à própria sorte, também não
admite que o homem renuncie às responsabilidades que tem para consigo mesmo. A propósito do direito
constitucional alemão, Benda cuidou de acentuar esse aspecto, observando que o Estado Social não implica a
administração de um sistema de serviços de provisão absoluta, que libere o indivíduo de todas as preocupações
e cuidados pessoais com a construção de sue próprio futuro existencial. (MARTINS NETO, 2005, p. 114-116).
16
“Esse binômio que integra a noção de Estado Social vem consagrado expressamente em duas constituições
contemporâneas. A Lei Fundamental de Bonn, de 1949, em seu artigo 28, declara ser a Alemanha Ocidental “um
Estado republicano, democrático e social de direito”. Por sua vez, a Constituição espanhola, em seu artigo 1.º
proclama: “A Espanha constitui-se num Estado social e democrático de direito”. (SOUZA JÚNIOR, 2002, p. 75).
17
Registre-se que o laissez faire como sistema social foi paulatinamente sendo desacreditado, gerando como
decorrência crescimento do Estado. O princípio do Welfare State é o da redistributividade, ainda que uma
estatização parcial seja freqüente em alguns casos, o que realmente importa é a redistribuição da riqueza
produzida pela iniciativa privada. (CARVALHO, 2005).
18
Para Antonio Carlos Wolkmer (1990, p. 26): “Todas essas são rotulações que justificam e legitimam momentos
do Estado Contemporâneo, os quais indistintamente do modelo político econômico de que servem, quer seja o
Capitalismo, quer seja o Socialismo estatizante (concentração das decisões por parte de um Superestado que se
diz representante dos trabalhadores em geral), apresentam características ora comuns, ora específicas”. Em
sentido diverso entende Morais (2002, p. 37): “O modelo constitucional do Welfare State, principiou as ser
construído com as Constituições mexicana de 1917 e de Weimar de 1919, contudo, não tem uma aparência
uniforme. O conteúdo e os instrumentos próprios desta forma estatal se alteram, se reconstroem e se adaptam a
25
Silva (1999, p. 120-121) afirma que a expressão Estado Social de Direito não
está aplicada com total propriedade pois:
situações diversas. Assim é que não se poderia falar em ‘o’ Estado do Bem-Estar dado que sua apresentação,
por ex., americana – do Norte, é claro – se diferencia daquela do État-Providence francês ou do protótipo anglo-
saxão ou, mesmo dos países nórdicos, se quisermos constituir alguns núcleos básicos”.
26
19
Afirma Nuria Belloso Martín (2005, p. 76) que o ideal do Estado de Bem-Estar Social está assentado em: “[...]
políticas públicas de bem-estar social [que] se baseiam na idéia de que assegurar um mínimo de bem-estar
social não é apenas necessário, mas que exige interferência no livre funcionamento do mercado livre,
redistribuindo riqueza sob a forma de serviços públicos. Os serviços de bem-estar social constituem, portanto,m
um elemento constitutivo indispensável de cidadania social, pois pretendem evitar a hostilidade entre os
contribuintes e que se identifique os beneficiários, como indivíduos inferiores. Ao contrário, asseguram a
existência de níveis de vida mínimos para todos os membros da comunidade social: são universais, evitam a
súplica e não se está exposto com isto a discricionariedade oficial. Desta forma, o direito ao bem-estar social se
tornou em uma parte essencial da cidadania em si, o mesmo que os direitos de propriedade e de voto”.
27
Martins Neto (2003, p. 113-114) afirma que o Estado Social está diretamente
ligado ao reconhecimento dos direitos sociais22, o que lhe confere uma amplitude
maior na proteção de direitos:
20
“O bem comum [...] tende, numa primeira instância, a conservação da ordem e da paz interna, numa segunda
instância, para a proteção dos cidadãos contra os ataques externos e contra o cometimento de atos delituosos, e
numa terceira instância, para o fomento dos propósitos particulares das pessoas na medida em que seja
necessário ou útil para a paz e ordem da comunidade. A meta do Estado é prover ao bem comum na ordem
temporal.
Na concepção tomista, o homem não desaparece no Estado: seu fim último não é a comunidade terrena, mas
um outro fim mais elevado, um fim transcendente, sobrenatural. A pessoa humana ultrapassa o Estado em tudo
aquilo que se relaciona com os direitos protegidos pela lei natural. O bem comum não é o bem de uma
coletividade, nem a soma dos bens individuais: o bem comum possui natureza distinta. Esses bens são, por sua
vez, o pressuposto pra que os homens possam desenvolver seus fins particulares. Por isso, a finalidade ad
comunidade não é senão contribuir com os problemas para a obtenção desses bens. A lei não qualquer
mandamento arbitrário dos detentores do poder, mas somente o mandamento inspirado num fim justo, e o bem
comum é o fundamento jusnaturalista geral e o limite das atribuições da autoridade, pelo que somente nesse
âmbito se pode expedir um direito positivo obrigatório. Por isso, a finalidade da lei positiva é adequar o direito
natural às distintas situações e épocas. Nesta oportunidade, é apropriado recordar o célebre provérbio ‘Serás rei
se agires retamente, se assim não agires, não o serás’.
Em resumo, existe uma perimira obrigação do contribuinte de respeito à ordem jurídica em geral e das
obrigações tributárias em particular, sendo um dever inexorável o cumprimento dos deveres fiscais. Entretanto,
para que tal fim seja cumprido, o Estado, observando adequadamente a ordem normativa, deverá empenhar-se
em criar as bases necessárias para obter um razoável clima de paz ou segurança jurídica que permita o normal
cumprimento das obrigações dos contribuintes, esclarecendo dúvidas e afastando incertezas. Desta forma, os
sujeitos sabem ao que se ater e em que situações de conflito suas demandas será adequadamente ouvidas em
tribunais imparciais para se protegerem de eventuais comportamentos arbitrários.” (Altamirano, 2005, p. 133-
134).
21
Cristiano Carvalho (2005, p. 298) afirma que o Estado de Bem-Estar Social ou Welfare State foi marcado por
uma crise caracterizada pela incapacidade de satisfazer as expectativas sociais pelo bem-estar: “O resultado é
uma crise profunda do Welfare State, cujos sistemas jurídicos não entendem mais às expectativas sociais,
tendendo, então, a fazer crescer mais seu intervencionismo, apenas para fracassar novamente. Isso leva
invariavelmente à conclusão de que apenas numa ordem política liberal é que se pode sustentar o Estado
Democrático de Direito que a ordem política liberal, por sua vez, necessita desse Estado de Direito, numa
interdependência recíproca. O Welfare State, através do feedback positivo, acaba por levar a ordem social ao
caminho da servidão”.
22
Os direitos sociais serão abordados de forma mais aprofundado na seqüência.
28
Martín (2005, p. 72-73) defende que, frente à crise manifestada pelo Estado de
Bem-Estar Social, devem residir preocupações também, em torno da questão da
cidadania social, uma vez que ela “[...] sofre cada vez mais ataques e críticas que,
por sua vez, se correspondem com as dirigidas também contra a política social, os
direitos sociais e os serviços sociais [...]”. Lembra ainda, que a cidadania atual
encontra seu apoio no que chama de “Estado de Bem-estar parcial”, caracterizado
por excluir grandes grupos dos direitos sociais. E conclui:
23
As reivindicações sociais conduziram o chamado Estado mínimo a se transformar em um Estado interventor e
social, com o propósito de neutralizar a exploração e os abusos praticados pelas classes economicamente mais
fortes, tutelando os interesses sociais de uma forma ampla e plural. Em relação ao Brasil, muito embora inegável
a influência deste processo na elaboração da Carta Política 1988, sobretudo ao elevar a dignidade da pessoa
humana a fundamento da República, na busca de uma sociedade livre, justa e solidária, entendemos que
inexistiu uma fase capaz de ser chamada de welfare state.
29
Neste contexto, assinala Flávio de Azambuja Berti (2004, p. 43) que, a contar
da metade dos anos setenta, problemas sintomáticos começaram a ser notados “[...]
particularmente à vista de sucessivas crises econômicas como a do petróleo, a
inflação galopante, o endividamento crescente de países periféricos, a saturação de
sistemas e de formas de agir, [...]”, razão pela qual teve início um processo de
releitura e revisão do posicionamento do Estado Social.
24
“Cabe perguntar-se em que situação se encontra atualmente o Estado social. Não se pode esquecer que o
Estado social surge com a finalidade de corrigir as deficiências de segurança e de bem-estar, que expôs o
Estado Liberal, com o objetivo de corrigir o predomínio do individualismo clássico e do absenteísmo estatal. Sua
legitimidade se apóia precisamente em que é um Estado inspirado em princípios de solidariedade e justiça
social.
Mas o Estado social tem-se encontrado tanto com críticas procedentes de ideologias de esquerdas como de
correntes mais conservadoras [...]. Os primeiros destacavam suas contradições, quer dizer consideravam que o
Estado social não é mais que uma forma que adotou o capitalismo para encobrir as relações de dominação
existentes na sociedade e para encobrir as relações de dominações existentes na sociedade e para obter novas
formas para a aquisição de mais capital [...].
Por sua vez, a corrente neoliberal defende uma diminuição de impostos – estes são considerados como uma
violação do direito de propriedade, uma vez que se projeta que a redução de impostos proporciona um aumento
do investimento provado proporcionalmente, coisa que não tem ocorrido – uma privatização do setor público –
com o objetivo da redução da carga tributária e porque e, principalmente, porque o Estado não tem que se
ocupar da realização de políticas sócias, pelas quais se deve desmantelar as estruturas administrativas que
funcionam neste âmbito. Entre a posição social e neoliberal, entre as vantagens que apontam os primeiros e as
críticas e inconvenientes que destacam os segundos, entendemos, como Offe, que o Estado de bem-estar se
transformou em uma estrutura irreversível, quer dizer, não cabe uma volta atrás nem seu desmantelamento.”
(Martín, 2005, p. 81).
30
25
Para Bobbio (2000, p. 388) democracia significa “poder em público” no sentido de que deve haver um poder
visível aos súditos para que compreendam as decisões que são tomadas pelos detentores do poder. Explica o
autor que “para os antigos a imagem da democracia era completamente diferente: falando de democracia eles
pensavam em uma praça ou então em uma assembléia na qual os cidadãos eram chamados a tomar eles
mesmos as decisões que lhes diziam respeito. ‘Democracia’ significava o que a palavra designa literalmente:
poder do démos, e não, como hoje dos representantes do démos. Se depois o termo démos entendido
genericamente como a ‘comunidade dos cidadãos’, fosse definido dos mais diferentes modos, ora como os mais,
os muitos, a massa, os pobres em oposição aos ricos, e, portanto, se democracia fosse definida ora como poder
dos mais ou dos muitos, ora como poder do povo ou da massa ou dos pobres, não modifica em nada o fato de
que o poder do povo, dos mais, dos muitos, da massa, ou dos pobres, não era aquele de eleger quem deveria
decidir por eles, mas de decidir eles mesmos [...]”. (p. 372).
Segundo Regina Maria Macedo e Nery Ferrarri (2005, p. 19): “A democracia nada mais é do que o governo do
próprio povo, pelo povo e para o povo, segundo conceito que deve a Lincon. É um conceito histórico, que
representa o instrumento de realização dos valores essenciais da convivência humana, traduzidos nos direitos
fundamentais do homem. Messe sentido, a democracia não é conceito estático abstrato, mas um processo de
afirmação do povo e de suas garantias fundamentais, que vai conquistar no correr da história. [...] A democracia,
por sua vez, repousa sobre dois princípios fundamentais: o da soberania popular, segundo o qual o povo é a
única fonte de poder, e o da participação, direta ou indireta, do povo no poder, para que este seja a expressão da
vontade popular. Nos casos de participação indireta surge um princípio que se poderia dizer secundário ou
subsecundário, que é o da representação”.
Silva (1999, p. 112) afirma que: “a democracia é um processo de convivência social em que o poder emana do
povo, há de ser exercido, direta ou indiretamente, pelo povo e em proveito do povo. Diz-se que é um processo de
convivência, primeiramente para denotar historicidade, depois para realçar que, além de ser uma relação de
poder político, é também um modo de vida, em que, no relacionamento interpessoal, há de verifica-se o respeito
e a tolerância entre os conviventes”, ou seja, com as opiniões dissidentes”. Ainda que: “a democracia, como
realização de valores (igualdade, liberdade e dignidade da pessoa) de convivência humana, é conceito mais
abrangente do que o Estado de Direito, que surgiu como expressão jurídica da democracia liberal. A superação
do liberalismo colocou em debate a questão da sintonia entre o Estado de Direito e a sociedade democrática. A
evolução desvelou sua insuficiência e produziu o conceito de Estado Social de Direito que a Constituição acolhe
np art. 1.º como um conceito-chave do regime adotado, tanto quanto o são o conceito de Estado de Direito
Democrático da Constituição da República Portuguesa (art. 2.º) e o Estado Social e Democrático de Direito da
Constituição Espanhola (art. 10). (p. 116).
31
26
“[...] é importante lembrar que o artigo 1.º da CF/88 deixa claro que o Brasil é um Estado Democrático de
Direito; vale dizer, a reunião de elementos próprios do Estado de Direito (protetivo de propriedade, liberdade etc.)
e do Estado Social (modificador da realidade em função da isonomia, solidariedade etc.).
A CF/88 assume feição nítida de uma solução de compromisso entre concepções distintas de Estado;
compromisso que implica não haver prevalências genéricas de nenhum dos dois conjuntos de elementos (nem
do Estado de Direito nem do Social), mas reconhece a necessidade de proceder a constantes ponderações de
valores que podem levar episodicamente e diante de determinados casos concretos à prevalência de uns ou de
outros.” (GRECO, 2005, p. 172).
32
27
No uso da expressão “Estado Democrático de Direito” estão presentes componentes que tendem a fazer da
liberdade ao mesmo tempo liberdade-autonomia e liberdade-participação. De um lado, isto vem marcado pelo
modo como se estendem os direitos políticos à sua máxima universalidade, aliados à plena extensão dos direitos
sociais, econômicos e culturais. De outro, pelo empenho em se evitar que, no modo como se adquirem, numa
sociedade, aliados à plena extensão dos direitos sociais, econômicos e culturais. De outro modo, pelo empenho
e, se evitar que, no modo como se adquirirem, numa sociedade pluralista, tais direitos, venha o seu exercício
cingir-se e esgotar-se no mero jogo de classes dominantes. Seus efeitos, assim, não devem se produzir apenas
frente ao Estado, mas em relação aos particulares; na relevância da sociedade civil deve-se ver o
reconhecimento de que os controle da legitimidade constitucional não é só a expressão de uma fiscalização
formalmente orgânica, mas também uma tarefa comum, que deve fazer a Constituição uma prática e não
somente um texto ao cuidado dos juristas; a participação, não apenas do Legislativo, do Executivo, do Judiciário,
mas também do cidadão em geral, na concretização e na efetivação dos direitos, uma peça primordial do seu
contexto democrático-social legítimo. (FERRAZ JÚNIOR, 2005, p. 221).
28
Clóvis Gorczevski (2005, p. 1283) afirma que “[...] de uma maneira geral, define-se cidadania com qualidade
ou direito de cidadão. Cidadão como sendo o indivíduo no gozo de seus direitos civis e políticos em um Estado”.
Afirma o autor, ainda, a importância da constituição de uma sociedade bem instruída para o exercício da
cidadania: “[...] neste início de novo milênio, urge uma nova educação, mais abrangente, mais humana, mais
crítica, onde seja possível uma efetiva preparação para a cidadania. Uma educação ministrada com dedicação,
amor e respeito. Esta deve ser a prioridade em todas as instâncias públicas ou privadas, pois bem lembra
Resende que os problemas fundamentais do nosso país se acumulam e não serão resolvidos sem a efetiva
participação da sociedade através de uma mobilização consciente, inteligente e objetiva.” (p. 1297-1298).
33
29
Paulo Bonavides (1980, p. 17) ensina que democracia é "[...] aquela forma de exercício da função governativa
em que a vontade soberana do povo decide, direta ou indiretamente, todas as questões de governo, de tal sorte
que o povo seja sempre o titular e o objeto – a saber, o sujeito ativo e o sujeito passivo de todo o poder legítimo."
35
do ser, que evidenciava uma postura omissiva, de não intervir, limitando a atuação
política estatal na esfera do indivíduo, visando assegurar ampla liberdade.
30
No art. 6º da CF/88 que estão indicados como direitos sociais, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, assistência aos desamparados,
na forma desta Constituição.
31
Segundo Sandra Regina Martini Vial (2005, p. 91-92), a sociedade hodierna é marcada pela insegurança,
incerta e contradição, “[...] além disso, é uma sociedade que opera sempre a partir do paradoxo
inclusão/exclusão.”
32
Artigo 1º da Constituição Federal de 1988: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito [...]”.
33
No artigo 5º da CF/88 trata dos direitos fundamentais, individuais e coletivos, estabelecendo que todos são
iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
36
determinou o aumento da carga tributária, o que, por sua vez, fez surgir problemas
ainda maiores.
João dos Passos Martins Neto (2003, p. 166) afirma que os direitos sociais35
são, geralmente, apresentados como uma subclasse dos direitos fundamentais ou,
ainda:
34
O termo é utilizado para designar a crescente e acelerada transnacionalização das relações econômicas,
financeiras, comerciais, tecnológicas, culturais e sociais, fenômeno ocorrente nas duas últimas décadas.
35
Importante registrar que o presente trabalho deter-se-á ao conceito de direitos sociais presente na Constituição
Federal de 1988, para que, a partir dele, seja possível verificar em que ponto será necessária a adoção de
medidas a fim de obter a sua efetiva implementação, propiciando a inclusão social.
37
Ao realizar uma análise mais detida acerca da vinculação dos direitos sociais a
prestações positivas, destaca Martins Neto (2003, p. 157) que se está diante de uma
determinação inexata, pois, dentre os direitos sociais estariam, também, direitos que
demandariam uma postura negativa por parte do Estado e, mesmo, direitos cuja
prestação não estaria atribuída ao Poder Público. Continua Martins Neto (2003, p.
178):
36
Os direitos sociais são, por conseguinte, sobretudo, endereçados ao Estado, para quem surgem, na maioria
das vezes, certos deveres de prestações positivas, visando à melhoria das condições de vida e à promoção da
igualdade material. (Bontempo, 2005, p. 70).
38
Martins Neto (2003, p.173-174), ainda acerca desta questão, depois de referir
que não pode ser admitida a possibilidade de abolição dos direitos sociais por meio
de emenda constitucional, eis que isto representaria reconhecer ao poder
constituinte derivado a possibilidade de rever “[...] a ordem constitucional em sua
mais íntima essência, por falência de vínculos substantivos que garantam algo mais
do que uma democracia feita de liberdades meramente formais [...]”, conclui que os
37
“Buscando promover a igualdade material a Constituição de 1988, traz um Capítulo próprio (Capítulo II),
dedicado aos direitos sociais, encartado no Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, trazendo, ainda
um título especial sobre a Ordem Social.” (BONTEMPO, 2005, p. 71).
38
“Partindo-se do pressuposto, portanto de que os direitos sociais são direitos fundamentais, submetem-se eles
à principiologia e lógica próprias dessa categoria de direitos. Vale dizer: devem ser interpretados de modo a
garantir a dignidade da pessoas humana; seus efeitos devem ser maximizados u otimizados, nos termos do
princípio da aplicabilidade imediata e são intangíveis por meio de reforma constitucional.
E essa preocupação com a eficácia das normas constitucionais é redimensionada em se tratando dos direitos
sociais, na medida em que a grande maioria desses direitos previstos na Constituição de 1988 são enunciados
sob a roupagem de normas programáticas que são, em um primeiro momento, endereçadas aos Poderes
Públicos: o legislador, já que necessitam de concretização legislativa; ao administrador, para a implementação
39
das políticas públicas que buscam efetivá-los; e aos juízes, quando apreciam as demandas judiciais que visam
garantir a sua concretização.” (BONTEMPO, 2005, p. 192-193).
39
Bontempo (2005, p. 202-205) entende que o Poder Executivo deve comprometer-se com planejamento de
metas para a viabilização dos direitos sociais: “Para garantir a efetivação dos direitos sociais, especialmente
levando em consideração a necessidade de que estes sejam “progressivamente realizados”, entende-se que
deverá haver um sério comprometimento do Poder Executivo com o planejamento das metas e diretrizes a
serem perseguidas; a elaboração das leis orçamentárias, de modo a priorizar os recursos necessários à
efetivação dos direitos sociais; e, por fim, a implementação de políticas públicas que garantam a plena realização
desses direitos. O planejamento, nunca é demais ressaltar, deve ser concebido, nos termos do art. 174 da
Constituição de 1988 – sob a égide do princípio da legalidade. Nesse passo, deve traçar as metas a serem
perseguidas pelo Estado e dispor sobre os recursos públicos para a implementação de políticas públicas
necessárias ao exercício dos direitos sociais, em função das prioridades estabelecidas pela Constituição. [...]
40
Diante desta perspectiva de que, para que sejam efetivados os direitos sociais,
é necessário haver um planejamento, e da evidente incapacidade do Estado em
promovê-los, propõe o presente trabalho um resgate do Poder Local como meio a
dinamizar tal processo, justamente em razão do fato de que se acredita que a
viabilização dos direitos sociais pode ser alcançada se os meios para tanto foram
efetivamente eficientes, sendo para tanto importante ações no meio municipal.
Para atender à exigência da “progressiva implementação” dos direitos sociais, “na medida do máximo dos
recursos disponíveis”, não se vislumbra outro caminho que o sério comprometimento com o planejamento da
utilização dos recursos públicos, bem com como a delimitação das prioridades a serem realizadas, figurando,
dentre elas, inegavelmente, por força da nossa Constituição dirigente e por força dos fundamentos de nosso
Estado, a implementação dos direitos econômicos, sociais e culturais.”
40
Na década de 70, quando da formulação da nova Constituição Federal portuguesa, José Joaquim Gomes
Canotilho propõe uma nova fórmula a ser aplicada à esta Carta Política: a constituição dirigente. Entendia o
autor, que a CF deveria ter estampado os programas políticos do país, sendo estes vinculantes. Não havia
espaço ao administrador público cumprir de forma diversa os programas sociais estampados no limiar da referida
carta. Isso é percebido muito nitidamente no art. 18 da Constituição Federal portuguesa, ao afirmar que as
normas constitucionais são vinculantes. A crítica feita à constituição dirigente se mostra no tocante ao fato de
que esta não apresenta soluções de acordo com a evolução do tempo. O administrador fica engessado diante
das disposições da CF. A discricionariedade marca indelével da política, quase não há. Ou seja, a constituição
dirigente não acompanha a evolução dos tempos. Também, a crítica se assenta no fato de a Constituição
misturar o político com o jurídico, de forma a transformar o administrador público em mero executor de tarefas do
legislador constituinte (originário e derivado).
41
Assim, sugere-se voltar uma maior atenção ao Poder Local, como forma de
alcançar um pouco da tão desejada efetivação dos direitos sociais, oportunizando
uma maior eficiência nas políticas públicas de inclusão social. Tal alternativa,
evidentemente, deve ser vista de forma vinculada à questão da existência de
recursos públicos. No ponto importante alerta faz Martín (2005) quanto à intenção de
incutir no meio social a impressão de que apenas os direitos sociais possuem um
custo elevado para sua implementação. Em razão deste custo elevado, não restaria
outra alternativa que não a sua inexecução, diante da deficiência de recursos
apresentados pelo Estado. O que, contudo, não é revelado, de acordo com a citada
autora, é que todos os direitos detêm um custo para a sua realização, sejam eles
sociais ou não, de sorte a ausência de recursos não pode ser a justificativa para falta
de sua implementação.
Há que se ressaltar, nesse contexto, que não poderá ser admitida qualquer
possibilidade de retrocesso em relação à consecução e proteção dos direitos
conquistados. Estes já estão garantidos, necessitando, agora, serem
implementados, estando amparados pela cláusula do retrocesso social:
41
Registra neste sentido Faria (2002, p. 113-114): “Concebidos para se concretizar basicamente por meio de
políticas governamentais de caráter compensatório e distributivo, os direitos sociais também têm sido
mortalmente atingidos pelos processos de desformalização, deslegalização e descontitucionalização, pela
desregulação do mercado de trabalho, pela abdicação de determinadas funções públicas do Estado via
privatização de serviços essenciais, pela negação da idéia de justiça distributiva via ação fiscal e pelo crescente
condicionamento de todas as esferas da vida pelos valores e regras do mercado, corroendo os fundamentos
igualitários da própria democracia. Os princípios básicos e os padrões morais inerentes aos direitos humanos e
aos direitos sociais – como a dignidade, a igualdade, a solidariedade e a inclusão econômica, por exemplo –
estão levando a pior na colisão frontal com os imperativos categóricos da economia globalizada, como a
produtividade, a competitividade e a cumulação levadas ao extremo. Na medida em que as obrigações são
progressivamente reduzidas ao conceito geral de mercadorias e convertidas em negócios privados, em que o
papel de consumidor cada vez mais se sobrepõe ao de trabalhador, em que os titulares de um direito civil se
transformam em meros consumidores de bens e serviços produzidos e/ou prestados pela iniciativa privada em
por fim, em que os titulares dos direitos sociais e dos direitos humanos de última geração são reduzidos ao
simples papel de “clientes”, ao acesso a serviços essenciais – como educação, saúde, previdência, energia
elétrica, água, telefonia etc. – passa a depender de contratos provados de compara e venda. [...] Com, isso
aqueles que não têm condições de comprar esses serviços básicos e aqueles que não têm como pagar por
serviços já consumidos, ou seja, os “excluídos” e os inadimplentes no plano econômico, convertem-se também
nos “sem-direitos” no plano jurídico, não mais parecendo com portadores de direitos subjetivos públicos.”
43
42
Bontempo (2005, p. 306) sustenta que os Poderes Executivo e Legislativo têm ”[...] o compromisso e a
responsabilidade de priorizar a realização dos direitos sociais, sob pena de sua conduta ser questionada perante
o Poder Judiciário. Neste prisma, para garantir a efetivação dos direitos sociais, especialmente levando em
consideração a necessidade de que estes sejam “progressivamente realizados”, há de existir um sério
comprometimento do Poder Executivo com o planejamento das metas e diretrizes a serem perseguidas; a
elaboração de leis orçamentárias que priorizem os recursos necessários à efetivação dos direitos sociais; e, por
fim, a implementação de políticas públicas que garantam a plena realização desses direitos.” Já em relação ao
Judiciário, afirma que tem ele a “[...] a responsabilidade de aplicar o Direito e, para tanto, há de pautar-se pela
lógica do Estado social de Direito delineado pela Carta de 1988, buscado garantir que sejamos atingidos, dentre
outros objetivos enunciados no seu art. 3.º, “uma sociedade livre justa e solidária” e “erradicar a pobreza e a
marginalização. Para alcançar tais objetivos é necessário que o Poder Judiciário deixe de se conduzir pela lógica
própria do Estado liberal de Direito – que exige uma postura de “não-atuação” de “abstenção” – transitando para
a lógica do Estado social de Direito, marcada pela responsabilidade do Estado na implementação das políticas
públicas necessárias à implementação dos direitos sociais.”
44
43
artigo 60, parágrafo 4º inciso I: Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a
forma federativa de Estado [...].
46
O Estado Unitário44 pode ser definido como aquele que apresenta um único
centro de poder, o qual é a cúpula e núcleo do poder. Pode, outrossim, tal modelo
de Estado apresentar uma forma descentralizada na esfera administrativa, legislativa
ou política, cujo alcance passa a depender do poder central que pode sempre
suprimi-lo (Porfírio Júnior, 2004, p. 3). Já o Estado Federal45 caracteriza-se pela
descentralização administrativa, legislativa e política, com a atribuição de
44
Raul Machado Horta (2002, p. 305) afirma que o Estado Unitário apresenta uma evolução a caminho da
descentralização: “[...] o Estado Unitário acha-se submetido a um processo de renovação estrutural, que decorre
da ampliação do grau de descentralização, para alcançar as formas mais avançadas do regionalismo. O estado
Unitário com descentralização regional, como ele se encontra organizado na Constituição da república Italiana de
1947, e na Constituição da Espanha de 1978, representa o ensaio de nova forma estatal – o Estado Regional –,
tipo intermediário, que se localiza nas fronteiras do estado Unitário e Estado Federal”.
45
José Afonso da Silva (1996, p. 56) afirma que: “[...] o Estado Federal é o todo, dotado de personalidade
jurídica de direito público internacional. A União é a entidade federada formada pela reunião das partes
componentes, constituindo pessoa jurídica de direito público interno, autônoma em relação aos Estados e a
quem cabe exercer as prerrogativas da soberania do Estado. [...] Os Estados Membros são entidades federativas
componentes, dotadas de autonomia e também de personalidade jurídica de direito público interno”. Paulo
Bonavides (1983, p. 205) afirma que Estado Federal é o “[...] Estado soberano, formado por uma pluralidade de
estados, no qual o poder do Estado emana dos Estados-membros, ligados numa unidade estatal”.
47
De acordo com Regina Maria Macedo e Nery Ferrari (2005, p. 189), Estado
Federal:
É uma forma de Estado Composto, onde se encontra a união de
comunidades públicas dotadas de autonomia constitucional e política, ou
seja, é um tipo de Estado descentralizado politicamente, cuja competência
dos entes jurídicos parciais decorre de previsão constitucional.
A constituição, ao criar o Estado Federal, o faz de modo que o poder não
fique concentrado em uma única pessoa de direito público, mas se reparta
entre esta e os entes coletivos que o compõem.
Seguindo esta linha de colocações, para que seja possível falar em Estado
Federal, é necessária a presença de requisitos específicos, quais sejam: a repartição
46
“Não entram em acordo os autores no apontar os traços característicos do Estado Federal. Assim, v.g., Duguit
nele vislumbra a existência de dois governos no mesmo território e a impossibilidade de aleirarem as
competências de cada um deles, sem a anuência de ambos. Já Hauriou sustenta que, no federalismo, há
diversidade de leis e várias soberanias secundárias, sob uma soberania comum. Jelinek, sempre rigoroso,
aponta como da essência do Estado Federal a autonomia, salvaguardada pela Constituição, das unidades
federadas. Lê Fur, de sua parte, considera existente uma Federação quando as unidades federativas entram na
formação da vontade do Estado. Kelsen, com sua visão formalista do Direito, distingue o Estado Federal dos
demais pela existência, nele, de três ordens jurídicas: duas parciais (a União e a as unidades federadas) e uma
48
Neste sentido, destaca também Paulo de Barros Carvalho (1991, p. 363) que
os:
Por isso Konrad Hesse (1988, p. 180-181) define federalismo como: “[...] a livre
unificação de totalidades políticas diferenciadas, fundamentalmente, com os
mesmos direitos, em regra, regionais que, deste modo, devem ser unidas para
51
Michel Bothe (1995, p. 259) afirma que os fins da forma federativa de Estado
são os seguintes:
a) meio de se preservarem a diversidade e particularidades históricas;
b) proteção das minorias políticas (se estiveram separadas em espaços
geográficos definidos);
c) em atenção à subsidiariedade (princípio segundo o qual se atribui
competência à comunidade menor, que poderia solucionar mais
adequadamente o problema, por estar mais próxima);
d) meio de se assegurar a liberdade – divisão vertical do poder – com
fortalecimento da liberdade individual; e,
e) meio de se promover a democracia, uma vez que por meio do
Federalismo se abre um plano adicional de participação.
48
No Federalismo Dualista: “[...] o Governo federal dispunha de poderes enumerados, limitados pelas
disposições constitucionais, dotando-se os estados dos poderes residuais, ou seja, todos aqueles não
outorgados expressamente para o Governo central.” (LOBO, 2006, p. 13).
49
“A promulgação da Constituição de 1988 trouxe consigo a restauração do federalismo cooperativo brasileiro,
mas não como o fizera a Constituição de 1934, pois a concentração de competências ainda é demasiadamente
acentuada na esfera da União. Embora entendamos justas as críticas, o certo é que os parâmetros do
federalismo cooperativo estão presentes na Constituição de 1988. Podemos observar o sentido de cooperação
nas competências comuns disciplinadas no art. 23 e em especial no seu parágrafo único ao dizer: ‘Lei
53
complementar fixará normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,
tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional’”. (SIQUETTO, 2004, p. 275).
50
O princípio da subsidiariedade será abordado, de forma mais aprofundada em capítulo próprio.
54
[...] quer um Estado que não seja proprietário de todos os bens (de cuja
exploração resultariam recursos suficientes para seu funcionamento) e,
mais, se ela pretende que esse Estado faça algo (p.ex., proveja à
seguridade social), o dinheiro de que necessita deverá vir de alguma origem
que não seja a mera exploração de seu patrimônio. Vale dizer, virá da
tributação. Daí falar-se em “Estado Fiscal” como aquele que, para subsistir,
necessita de tributos.
51
Tavares (2003, p. 797), por exemplo, elenca outras modalidades de Federalismo: Federalismo Orgânico,
Federalismo de Integração e Federalismo de Equilíbrio.
52
“O Estado – como instrumento que é da sociedade – deve agir em sintonia com os objetivos e prioridades por
esta escolhidos, ao mesmo tempo em que este papel implica estar investido de responsabilidades inafastáveis.
Neste contexto, o Estado não é pura estrutura investida de “poderes” cuja legitimidade emanaria de fontes
externas à própria sociedade. Ao Revés, ao Estado cabe cumprir “deveres” perante a sociedade (por ser seu
instrumento) e os poderes que lhe são atribuídos limitam-se ao suficiente para viabilizá-los e em dimensão que
não ultrapasse o necessário para tanto.
Este perfil que a CF/88 atribui ao Estado repercute em diversos campos, inclusive ilumina os princípios que o
caput, do artigo 37 impõe à Administração Pública. Dentre estes, merecem menção o da moralidade (como
postura responsável perante o indivíduo interlocutor do Poder Público) e o da eficiência que – num Estado
instrumento da sociedade – deve ser visto não apenas da perspectiva da presteza, celeridade, continuidade etc.,
mas principalmente da ótica da busca dos fins constitucionalmente qualificados. Ou seja, parâmetros da
eficiência são os valores e fins constitucionais e não o mero produto mediato da atividade realizada.” (GRECO,
2005, p. 173-174).
55
53
“A ideologia, que reinou até o início do último século, segundo a qual o Estado atuaria como mero vigilante de
uma economia que se auto-regulava, viu-se superada com o modelo a partir do qual o Estado passava a
desempenhar um papel ativo e permanente nas realizações inseridas no campo econômico, assumindo
responsabilidades para a condução e funcionamento das próprias forças econômicas. Esse fenômeno encontra,
no plano constitucional, uma primeira manifestação no México, em 1917 e, logo, em seguida, ma Alemanha, com
o texto de Weimar. Viu-se paulatinamente estendido a outros textos constitucionais, alcançando o Brasil, em
1934 e a partir daí deitando raízes mais profundas nos textos constitucionais subseqüentes.
É neste sentido que se afirma que o Estado contemplado pela Carta de 1988 não é neutro. Seguindo a tendência
acima, o constituinte revelou-se inconformado com a ordem econômica e social que encontrara, enumerando
uma série de valores sobres os quais se deveria firmar o Estado, o qual, ao mesmo tempo, se dotaria de
ferramentas hábeis, a concretizar a ordem desejada. No lugar de se ter um ordenamento dado, que deve ser
apenas mantido ou adaptado, o legislador constituinte preconizou uma realidade social nova, ainda inexistente,
cuja realização e concretização, por meio de medidas legais, passa a ser interesse público. Esta nova realidade
se traduz no desenvolvimento econômico, prestigiada pelo Constituição de 1988, que inclui, no artigo 3.°, entre
“os objetivos fundamentais da República” o da garantia do desenvolvimento nacional”, o que, entretanto, não se
compreende isoladamente de outros objetivos, como o da construção de uma “sociedade livrem justa e
solidária”, onde se erradicarão “a pobreza e a marginalização” e se reduzirão “ as desigualdades sociais e
regionais”, promovendo, enfim, “o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação”. Daí, ao se ressaltar a importância do desenvolvimento econômico, ser possível
qualificá-lo como “justo para que se trone legítimo”, não sendo um fim em si mesmo, devendo afinar-se como
desenvolvimento humano”. (SCHOUERI, 2005, p. 01-02).
56
efetivos que possam acompanhar e aferir a utilização final dos recursos. (Siqueto,
2004, p. 286).
Alternativas para lidar com a mencionada crise são apontadas por Goldberg
(2004, p. 28-29), destacando três pontos específicos: o primeiro, com a eliminação
dos focos de rigidez do sistema, ou seja, a Constituição deve assegurar a autonomia
orçamentária aos entes federativos sem predeterminar gastos ou destinações dos
orçamentos municipais ou estaduais; o segundo, com a reestruturação das
competências tributárias, transferindo “bases de incidência”, em troca de
transferências fiscais amparadas em critérios que mereçam o esforço fiscal de cada
ente; e o terceiro, com a criação de mecanismos de coordenação entre União,
Estados e Municípios, bem como de desincentivos a estratégias não-cooperativas
por parte dos entes federativos.
Portanto, preciso Siquetto (2004, p. 290) quando afirma que se faz necessário
organizar um novo pacto federativo em que as relações intergovernamentais tenham
como propósito a redistribuição do bolo tributário, com critérios objetivos e
57
Fernando José Dutra Martuscelli (2001, p. 99-100) afirma ser possível verificar
uma forte centralização de poder, impossibilitando a participação efetiva de Estados
e Municípios na administração do Estado Federativo Brasileiro. No seu entender, é
possível concluir pela “[...] não-existência de federalismo efetivo no Brasil e de
isonomia entre as pessoas constitucionais, da prevalência da União Federal sobre
os demais entes federados [...]”, como também dos inegáveis interesses patrimoniais
58
Destaca Porfírio Júnior (2004, p. 10-11) que o que deve ser almejado é a busca
de tratamento diferenciado entre os Estados, de modo a fazer prevalecer a tônica de
que distinção perante diferentes e de igualdade perante iguais. Neste sentido,
defende a adoção de um federalismo: “[...] que permita manter a autonomia dos
entes locais, ao mesmo tempo em que apresente flexibilidade suficiente para permitir
59
O respeito à integridade das índoles locais dá-se por meio da outorga aos
entes contemplados nos limites territoriais do Estado (as “personas” acima
aludidas), de poderes cujo exercício permita um relativo – mas inconcusso –
funcionamento autônomo nos assuntos de seu interesse. Conseqüências da
manutenção da multiplicidade regional vão se espraiar tanto no
fortalecimento da democracia e da liberdade individual quanto no sentido de
solidariedade e no compromisso de cooperação que, em última análise,
representam a argamassa capaz de manter sem coação aqueles entes
locais. (LOBO, 2006, p. 29).
Neste contexto, José Maurício Conti (2001, p. 24-25) assinala que o estudo do
Federalismo Fiscal se processa a partir da análise:
Assim, depreende-se que devem ser promovidos esforços para que, em âmbito
local, seja possível uma maior atuação possibilitada pelo auferimento de renda
necessária ao Município.
Neste sentido, Lobo (2006, p. 136) destaca que com a Constituição Federal de
1988, buscou-se a formulação de um ideário de descentralização do poder, com
vistas a permitir uma maior participação dos municípios e estados, inclusive, em
matéria tributária, sinalizando o fortalecimento da autonomia financeira das unidades
federadas. Desta forma, evidenciou-se na nova ordem constitucional, no mínimo
54
De acordo com Lobo (2006, p. 47-48), o Federalismo foi consagrado pela Constituição Federal de 1988 que
traz em seu texto “[...] a utilização do termo ‘Federativa’ no próprio nome do país (‘República Federativa do
Brasil’), passando pela dicção de inúmeros dispositivos que versam os Princípios Fundamentais e a
Organização do Estado (v.g.: arts. 1.º, 3.º, 4.º, 12, 18, etc) até a expressa afirmação dos cânones básicos da
autonomia (art. 18, ‘caput’) e da isonomia (art. 19, III) dos entes federativos. Diferentemente das demais
Federações contemporâneas, entretanto, aquela erigida pelo constituinte brasileiro de 1988 contempla
peculiaridade única, que lhe confere, segundo a doutrina, desenho heterodoxo que não encontra similar dentre
os outros Estados Federais: em vez das tradicionais duas esferas autônomas (União e Estados-Membros), a
Federação brasileira é descentralizada em três ordens de competência legislativa, política e administrativa, com
a expressa inclusão também dos Municípios na classe maior dos entes federativos.”
55
Bonavides (1993, p. 273) destaca a importância de se analisar o artigo 18 da Constituição Federal de 1988,
tendo em vista que: “Esse artigo inseriu o município na organização político administrativa da República
Federativa do Brasil, fazendo com aquele, ao lado do Distrito Federal, viesse a formar aquela terceira esfera de
autonomia, cuja presença, nos termos em que se situou, altera radicalmente a tradição dual do Federalismo
brasileiro, agora de nova dimensão básica.”
61
Nesta linha, registro importante é feito por Morbidelli (1999, p.188-199), quando
afirma que a Constituição de 1988 buscou reestruturar o Estado Federal segundo as
concepções do Estado moderno, sinalizando para um modelo ser cooperativo, com o
estabelecimento da co-participação entre os entes federativos, isto é, da relação de
igualdade e responsabilidade entre a União e as unidades federadas.
56
“O Município, enquanto ente estatal federado, possui uma função social, qual seja a de buscar a concretização
do Bem Comum dos munícipes, sendo dinâmico o seu conteúdo, devendo, cada Município, com base nos
direitos fundamentais (os quais corporificam o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana),
perceber, em seu tempo e no seu espaço, quais suas peculiariedades e, assim, priorizar políticas públicas
adequadas a cada realidade. (RODRIGUES, 2004, p. 1039-1040).
62
Na realidade, não pode ser de forma diversa, visto que estaria afastada de
qualquer lógica a concessão de autonomia58 aos Municípios, sem o aferimento aos
mesmos de renda adequada para execução de seus serviços.
57
Macedo e Ferrari (2005, p.92) registram: “Reza o art. 30, III, que compete ao Município “instituir e arrecadar os
tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas
o publicar balancetes nos prazos fixados em lei”. Portanto, a autonomia financeira consiste na capacidade de ter
receita própria para realizar a despesa necessária. [...] Assim, a autonomia financeira fica, no atual sistema
constitucional, garantida pela instituição e arrecadação de tributos, nos termos dos arts. 145, 156 e 158) da
Constituição Federal, bem como pelo recebimento de repasses das verbas concernentes a tributos arrecadados
por outras esferas administrativas, União e Estados Membros.”
58
Silva (1999, p.621) conceitua autonomia como “capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de
um círculo prefixado por entidade superior”.
63
artigo 30, II, da CF, confere aos Municípios competência para suplementar a
legislação federal e a estadual no que couber. (CARRAZZA, 2005, p. 163-165).
59
“A autonomia, que a Constituição de 1988 outorga ao Município, contém uma qualificação especial que se dá
um conteúdo político de extrema importância para a definição de seu status na organização do Estado brasileiro,
inteiramente desconhecido no regime anterior. Antes, o reconhecimento da autonomia municipal tinha um
sentido remissivo. Quer dizer, a Constituição remetia aos Estados o poder de criar e organizar seus Municípios.
O dito sentido remissivo consistia em determinar aos Estados que, ao organizarem os seus Municípios, lhes
assegurassem a autonomia, mas apenas quanto às capacidades de auto-administração, autolegislação e
autogoverno. A o fazê-lo, os Estados haviam de respeitar a autonomia assegurada na Constituição Federal em
termos genéricos relativos ao peculiar interesse local.
Veja-se que a diferença fundamental da outorga da autonomia municipal: as normas constitucionais anteriores
sobre ela se dirigiam aos Estados-membros, porque estes é que deveriam organizá-los, assegurando-a, mas, aí,
se reservavam a eles poderes sobre os Municípios, que agora já não têm: o poder de organizá-los, de definir
suas competências, a estrutura e competência do governo local e os respectivos limites. Agora não, as normas
constitucionais instituidoras da autonomia dirigem-se diretamente aos Municípios, a partir da constituição
Federal, que lhes dá o poder de auto-organização e o conteúdo básico de suas leis orgânicas e de suas
competências exclusivas, comuns e suplementares (arts. 23, 29, 30 e 182).
Isso significa que a ingerência dos Estados nos assuntos municipais ficou limitada aos aspectos estritamente
indicados na Constituição Federal, como, por exemplo, os referentes à criação, incorporação, fusão e ao
desmembramento de Municípios (art. 18, § 4.º) e à intervenção (arts. 35 e 36).” (SILVA, 1999, p. 622-623).
64
De outro lado, alertam, também, que o interesse local a ser alcançado com a
autonomia conferida ao Município, pode perfeitamente não se apresentar apenas
como interesse local, mas como interesse que diga respeito também à União e aos
Estados membros. Destacam que não há interesse local que de alguma forma
também não seja “[...] reflexamente da União e dos Estados Membros, como não há
interesse nacional ou regional que não se reflita nos Municípios, como parte
integrante de uma realidade maior que é a Federação brasileira [...]”. (MACEDO;
FERRARI, 2005, p. 114-115).
60
Observa Tavares (2003, p. 824) que os “[...] municípios representam uma excelente fórmula de
descentralização administrativa do Estado. Quanto mais descentralizado o exercício do poder do Estado,
maiores as chances de participação política do cidadão e, por conseqüência, mais elevado o nível democrático
que se pode alcançar”.
65
61
Acerca do Princípio da Subsidiariedade afirma Torres (2000, p. 304-305): “O princípio da subsidiariedade, que
se afirma no pensamento social da Igreja desenvolvida a partir do final do séc. XIX vincula totalmente o Estado
dos nossos dias, que se torna um Estado Subsidiário. Corresponde à ideologia do liberalismo social e representa
uma nova forma de equilíbrio entre Estado e sociedade. Recorde-se que, no início do liberalismo, na fase do
Estado Guarda-Noturno, havia a preponderância dos interesses individuais sobre os do Estado; durante boa
parte do século XX, com a emergência dos socialismos democráticos e da social-democracia, fortaleceu-se o
Estado de Bem-Estar Social ou Exatidão Providência, com a prioridade do Estado sobre a sociedade; hoje, com
o liberalismo social e o Estado subsidiário, assiste-se a nova equação no relacionamento entre Estado,
sociedade e indivíduo, com a prevalência da sociedade, por seus corpos intermediários e pela afirmação dos
direitos difusos sobre o Estado, e a do indivíduo frente à sociedade.” Janice H.F. Morbidelli (1999, p. 60-61)
registra que: “O princípio da subsidiariedade, inspirado na Constituição alemã, completa a doutrina federativa
contemporânea. Ele prevê que funções que possam ser realizadas pelas comunidades locais jamais sejam
assumidas pelas comunidades maiores. Essas teorias e aplicações práticas do Federalismo intergovernamental
vêm promovendo uma modernização dos poderes, que não envolve somente a questão de devolução de
poderes para as unidades constituintes da federação, mas também a possibilidade de transferência de
autoridade sobre assuntos julgados mais propícios a cada esfera de governo, onde podem ser mais efetivos
respondendo certos desafios.”
67
De outro lado, ao mesmo tempo permite que as esferas mais distantes dele
sejam também contatadas, caso o Município não possa resolver sozinho o
problema63.
62
Deve ser viabilizada a participação ativa da sociedade da resolução de problemas que nascem no seu meio,
justamente, para que seja evitada a sua dependência ao Estado: “Nas relações orçamentárias entre o Estado e a
sociedade a satisfação das necessidades deve se fazer prioritariamente pelos órgãos societais. O Estado só
concederá prestações financeiras, auxílios ou subvenções quando houver impossibilidade de solução dos
problemas por parte da própria sociedade. Os incentivos fiscais e os privilégios, adverte Tipke, prejudicam o
princípio da subsidiariedade e criam desnecessária dependência da sociedade. As próprias relações no âmbito
da seguridade devem ser governadas pela subsidiariedade de tal forma que o Estado só conceda subvenções e
ajudas após esgotadas as potencialidades societais. (TORRES, 2000, p. 305-306).
63
“[...] a abertura do espaço público estatal, permitindo a ampliação da articulação dos atores sociais, a partir de
uma ótica subsidiária, não traz como conseqüência a superação das instituições, mas, sim, a conciliação dessas
com o controle social. Nesse sentido, o destaque para a atividade interpretativa da sociedade em relação aos
princípios constitucionais mostra-se novamente adequado, a partir do conceito de interpretação mutativa das
normas constitucionais que não se restringe ao Poder Judiciário, mas, por outro lado, não significa a superação
dos paradigmas estatais.” (HERMANY, 2005, p. 1408).
69
64
Ricardo Hermany (2005, p. 1403) analisa o princípio da subsidiariedade mediante o estudo do sistema
constitucional português afirmando ser possível a sua aplicação ao sistema brasileiro: “É essencial que o poder
local se estruture no sentido de consagrar a idéia de subsidiariedade, seja em relação à atribuição de
competências à esfera local, seja na modificação estrutural do próprio poder local a ponto de estabelecer uma
nova dinâmica na relação entre espaço público estatal de nível local com a sociedade, amparada numa lógica de
integração. Dessa forma, a concepção de subsidiariedade, inserida em nível constitucional no Estado Português
e perfeitamente compatível com a ordem constitucional Brasileira, permite que se constitua uma nova estrutura
na formação das decisões públicas, deixando de repetir em nível local as estratégias tradicionais, caracterizadas
pela subordinação. Em relação à atribuição de competências, a adoção do princípio mostra-se fundamental, haja
vista que a definição das atribuições municipais no Brasil vincula-se ao indeterminado conceito de interesse
local. Em vista disso, a idéia de subsidiariedade deve servir de critério definidor da atuação do Município no
federalismo brasileiro, permitindo que um maior número de atribuições seja gerido a partir da esfera local,
sempre que exista um interesse, ainda que não exclusivo, por parte dos cidadãos do Município.”
70
65
Observa Hermany (2005, p. 1412) que estes são os requisitos para que se fale também num direito social
condensado: “São justamente esses os pressupostos necessários para a consolidação de um direito
condensado, razão pela qual a proposta de um novo federalismo, amparada numa estrutura municipalista que
71
agregue o viés participativo, é indispensável para a atuação comunicativa dos atores sociais. Diante disso, o
Município, no federalismo brasileiro, deve ter o seu espectro ampliado para além de um simples estudo de
enumeração de competências, passando para uma verificação dos instrumentos e estruturas capazes de permitir
a atuação da sociedade civil como sujeito ativo do processo decisório, sem olvidar, contudo, a necessária
vinculação aos princípios constitucionais referenciais.”
72
66
“[...] o Princípio da Eficiência, também chamado de Princípio da Conveniência por alguns autores, reclama
que nos atos de formulação da descriminação de renas tributárias seja verificado, pelos constituintes, o nível de
eficiência dos entes destinatários na gerência operacional dos tributos, ou seja, nos procedimentos de
lançamento, fiscalização, arrecadação e utilização dos valores coletados. Nesse processo há que se perquirir
não apenas a adequação das bases de incidência em compasso com a eficiência na prestação dos serviços
custeados, mas, muito além, como se viu, devem ser analisados também os requisitos da “proximidade” e da
“eficácia” na alocação dos gravames, da mesma forma que tais requisitos terão sido levados em conta na
outorga das funções administrativas e dos serviços públicos a serem prestados pelos integrantes do Estado. A
verificação desses requisitos resultará, enfim, na aplicação do cânone da subsidiariedade integrado à diretriz da
eficiência, priorizando-se a alocação das fontes tributárias nas menores esferas de governo sempre que estas se
mostrem mais eficientes que os demais entes federativos”. (LOBO, 2006, p. 132).
73
67
“[...] é a democracia local que favorece o desenvolvimento de uma cultura participativa de caráter permanente,
construindo-se num novo espaço político. Tal perspectiva desloca a discussão acerca da estrutura de
desenvolvimento econômico para o espaço local, valorizando o debate realizado com os cidadãos e estimulando,
com isso, a participação popular. A esfera local potencializa a idéia de pertencimento, de responsabilidade social,
estimulando, dada a proximidade do processo decisório, a ativa participação da sociedade, o que acarreta
inúmeros benefícios. Portanto, o fator que se constata em todas as estratégias bem-sucedidas de poder local
reside no maior grau de abertura dos processos decisórios para a população.” (HERMANY, 2005, p. 1410).
68
Ensina Torres (2000, p. 147-148): “A idéia de cidadania surge na Antigüidade clássica. Entre os gregos e os
romanos a cidadania criava o elo entre o homem livre e a cidade, reconhecendo-lhe direitos e impondo-lhe
obrigações, orientando-lhe a conduta cívica e despertando-lhe a consciência das virtudes. No patrimonialismo a
concepção de cidadania fica ligada ao complexo de privilégios e de regalias usufruído pelos que pertencem a
determinado estamento e que, em conseqüência, adquirem o status correspondente. Mas é com a revolução
francesa que a concepção de cidadania se expande para abranger os direitos fundamentais do homem,
entendidos como direitos da liberdade suscetíveis de concretização na cidade e no Estado, e os direitos
vinculados à idéia de igualdade e justiça: liberte, egalité et fraternité, de um lado, e Droits de l1Homme et du
Citoyen, de outro. A cidadania em sua expressão moderna tem entre os seus desdobramentos, a de ser
cidadania fiscal. O dever/direito de pagar impostos se coloca no vértice da multiplicidade de enfoques que a
coextensivos desde o início do liberalismo.”
74
contexto que fica bem evidente que o exercício da cidadania local se mostra por
demais relevante para a afirmação dos direitos sociais e econômicos.
69
Já defendia Rudolf Von Jhering (2002) que a vida em sociedade é um viver para o outro. A conduta de um irá
influenciar, diretamente, a conduta de outro cidadão. Nesse sentido, necessária a compreensão de que se deve
assumir um papel de cidadão ativo para que o meio social no qual se está inserido possa perceber os reflexos de
condutas que buscam pela efetivação dos direitos sociais.
75
Silva (1996, p. 94) sustenta que os princípios são verdadeiras ordenações que
se irradiam e imantam os sistemas de normas, ou, são "[...] núcleos de
condensações nos quais confluem valores e bens constitucionais". Com efeito, os
70
Registre-se que cuidaremos aqui da cidadania fiscal em seu sentido amplo, que abrange, além da
problemática da receita, os aspectos mais largos da cidadania financeira, que, compreendendo a vertente da
despesa pública, envolve as prestações positivas de proteção aos direitos fundamentais e aos direitos sociais e
as escolhas orçamentárias, questões que apresentam o maior déficit de reflexão teórica no campo da cidadania.
71
Autores diversos discorrem a respeito deste assunto, sendo adotado no presente estudo a posição de
Canotilho (2000, p.1123), que considera a Constituição Federal como um sistema aberto de regras e princípios.
72
Canotilho (2000, p. 1123) concebe a idéia de que o sistema jurídico deve ser visto como um sistema normativo
aberto de regras e princípios: [...] (1) – é um sistema jurídico porque é um sistema dinâmico de normas; (2) – é
um sistema aberto porque tem uma estrutura dialógica {Caliess} traduzida na disponibilidade e ‘capacidade de
aprendizagem’ das normas constitucionais para captarem a mudança da realidade e estarem abertas às
concepções cambiantes da ‘verdade’ e da ‘justiça’; (3) – é um sistema normativo, porque a estruturação das
expectativas referentes a valores, programas, funções e pessoas, é feita através de normas; (4) – é um sistema
de regras e de princípios, pois as normas do sistema tanto podem revelar-se sob a forma de princípios como sob
a sua forma de regras.”
76
Tal aceitação se justifica sob uma ótica pragmática, pela possibilidade da regra
ser usada como base de fundamentação de pretensões ou exercício de poderes.
[...] son normas que sólo pueden ser cumplidas o no. Si una regla es válida,
entonces de hacerse exactamente lo que ella exige, ni más ni menos. Por
lo tanto, las reglas contienen determinaciones en el ámbito de lo fáctica y
jurídicamente posible. (1997, p.87).
77
Desta forma e a partir das observações feitas, é possível identificar nas normas
constitucionais tanto princípios, como regras74, cabendo alertar para a possibilidade
de existência de conflitos entre as espécies de normas referidas que para serem
resolvidos necessitam da projeção dos valores envolvidos no caso concreto, com
consideração, portanto, de uma perspectiva axiológica. Isto também pode ocorrer
entre princípios, na medida em que, em um mesmo sistema jurídico constitucional,
dois princípios, em um caso específico, podem entrar em conflito, em colisão.
73
A teoria dos princípios de Robert Alexy, juntamente com a teoria das posições jurídicas básicas, formam a
base da teoria estrutural dos direitos fundamentais que foi apresentada por ele à comunidade jurídica alemã em
meados da década de 80, tornando-se, posteriormente, referência obrigatória no estudo dos direitos
fundamentais.
74
Em relação às diferenças entre regras e princípios, Canotilho (1999, p. 1088-1089) ensina ainda que: "Em
primeiro lugar, os princípios são normas jurídicas impositivas de uma optimização, compatíveis com vários graus
de concretização, consoante os condicionalismos fácticos e jurídicos;as regras são normas que prescrevem
imperativamente uma exigência(impõe, permitem ou proíbem)que é ou não é cumprida(nos termos de
Dworkin:applicable in all-or-nothing fashion);a convivência dos princípios é conflitual (Zagrebelsky), a convivência
de regras é antinômica; os princípios coexistem, as regras antinômicas excluem-se. Conseqüentemente, os
princípios, ao constituírem exigências de optimização, permitem o balanceamento de valores e interesses(não
obedecem, como as regras, à < lógica do tudo ou nada> ), consoante o seu peso e a ponderação de outros
princípios eventualmente conflitantes;as regras não deixam espaço para qualquer outra solução, pois se uma
regra vale(tem validade) deve cumprir-se na exata medida das suas prescrições, nem mais nem menos.(...)em
caso de conflito entre princípios, estes podem ser objeto de ponderação, de harmonização,pois eles contêm
apenas <exigências> ou <standards> que, em < primeira linha>(prima facie)devem ser realizados;as regras
contém <fixações normativas>definitivas, sendo insuscetível a validade simult6anea de regras contraditórias.
Realça-se também que os princípios suscitam problemas de validade e peso(importância, ponderação, valia);as
regras colocam apenas questões de validade(se elas não são correctas devem ser alteradas)." GRAU (1998,
p.89-90), afirma que as regras devem ser aplicadas por completo ou não, não comportando exceções. Para ele o
mesmo não ocorreu com os princípios, que não se excluem, comportando exceções no âmbito de sua aplicação:
"(...)as regras jurídicas não comportam exceções. Isso é afirmado no seguinte sentido; se há circunstâncias que
excepcionem uma regra jurídica, a enunciação dela,sem que todas essas exceções sejam também enunciadas,
será inexata e incompleta. No nível teórico, ao menos, não há nenhuma razão que impeça a enunciação da
totalidade dessas exceções e quanto mais extensa seja essa mesma enunciação(de exceções), mais completo
será o enunciado da regra."
78
A solução não passará pelo plano da validade, mas sim pela esfera dos valores
envolvidos, o que significa não obrigatoriamente a necessidade de se afastar um ou
outro princípio, mas apenas reconhecer que, na hipótese posta em apreciação, um
deles deve ser mais considerado que o outro. Por óbvio, isto não significa que em
outra situação específica, possa o entendimento ser diverso, sendo privilegiado
outro princípio, que na situação anterior tenha sido rejeitado.
75
“Os valores jurídicos não possuem nenhuma especificidade, isto é, não se colocam na esfera axiológica com
entidades autônomas, ao lado de outros valores (artísticos, religiosos, científicos, econômicos, etc.). O valor
jurídico, como disse Miguel Reale, é um valor franciscano, competindo-lhe ser suporte de todos os outros
valores.
Nem mesmo na esfera do dever ser o valor jurídico é total, pois divide com os valores morais a missão
axiológica. A justiça e a liberdade, por exemplo, são valores jurídicos e morais.” (Torres, 2000, p. 118).
76
Luís Cabral de Moncada (1995) afirma que o conceito de Positivismo poderia ser tomada em duas acepções,
uma restrita e lata a outra. Na primeira, ter-se-ia o sistema de idéias filosóficas fundado pelo francês Augusto
Comte (1798-1857). Na segunda, serviria para designar um movimento mais vasto, dentro do qual caberiam
numerosas escolas e tendências do século XIX, dentro e fora da França, em matéria de filosofia, de métodos
científicos, de psicologia, de sociologia, de história, de direito e de política.
81
ter ele escrito “[...] que a justiça é um valor franciscano cuja função é bem servir a
todos e a cada um”.
77
“Ao questionar a respeito da finalidade do Direito Tributário alguns confundem este com o tributo. Dizem, então
que a finalidade do Direito Tributário é viabilizar a arrecadação dos recursos financeiros dos quais necessita o
Estado para alcançar seus objetivos. Isto é um equívoco que precisas ser afastado. O tributo este, sim – tem
essa finalidade, que não se confunde com a finalidade do Direito Tributário.
O direito Tributário existe para delimitar o poder de tributar, transformando a relação tributária, que antigamente
foi uma relação simplesmente de poder, em relação jurídica. A finalidade essencial do Direito Tributário, portanto,
não é a arrecadação do tributo, até porque esta sempre aconteceu, e acontece, independentemente da
existência daquele. O Direito Tributário surgiu para delimitar o poder de tributar e evitar os abusos no exercício
deste.” (Machado, 2003, p. 53).
78
“A positivação da liberdade se dá em dois planos sucessivos e interdependentes: no dos princípios
fundamentais do ordenamento (art. 1.º da CF) e no dos direitos humanos, fundamentais ou da liberdade (art. 5.º
da CF), com a sua projeção fiscal nos arts. 150, 151 e 152. A idéia de liberdade vai se positivar, em um primeiro
momento de grande abstração, amalgamada às idéias de justiça e segurança e com a intermediação dos
princípios formais de legitimação (igualdade, razoabilidade,m ponderação, etc.), nos princípios fundamentais do
art. 1.º da CF: soberania, cidadania, liberdade de iniciativa e trabalho, democracia.” (Torres, 2005a, p. 109).
82
De outro lado, o tributo também pode ser visto como o preço pela proteção do
Estado representada pela disponibilização de bens e serviços públicos, de modo a
que indivíduo algum seja privado de parcela de sua liberdade sem que haja uma
contrapartida. (TORRES, 2005b, p. 04).
79
“O fundamento do direito ao mínimo existencial, por conseguinte, está nas condições para o exercício da
liberdade, que alguns autores incluem na liberdade real, na liberdade opositiva ou na liberdade para, ao fito de
diferençá-la da liberdade que é mera ausência de constrição.” (TORRES, 2005a, p. 96-97).
83
Pode-se afirmar, então, que o tributo que nasce com os ideais liberais aos
poucos vai ganhando concepção diferente, variando de acordo com o ideal de
Estado que é apresentado:
80
No art. 150, VI, "c" da CF/88, está prevista a imunidade:
"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI - instituir impostos sobre:
(...)
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos
trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos
da lei;
(...)
§ 4º As vedações expressas no inciso VI, alíneas b e c, compreendem somente o patrimônio, a renda e os
serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas".
No art. 14 do CTN, tem-se os requisitos para a fruição dessa imunidade:
"Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos
pelas entidades nele referidas:
I não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; (NR)
II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de
assegurar sua exatidão.
§ 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do artigo 9º, a autoridade competente pode
suspender a aplicação do benefício.
§ 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do artigo 9º são exclusivamente, os diretamente
relacionados com os objetivos institucionais das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos
estatutos ou atos constitutivos".
Por sua vez, o art. 12 da Lei n. 9.532/97, também, tratou do assunto:
"Art. 12. Para efeito do disposto no art. 150, inciso VI, alínea "c", da Constituição, considera-se imune a
instituição de educação ou de assistência social que preste os serviços para os quais houver sido instituída e os
coloque à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins
lucrativos.
§ 1º Não estão abrangidos pela imunidade os rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações
financeiras de renda fixa ou de renda variável.
§ 2º Para o gozo da imunidade, as instituições a que se refere este artigo, estão obrigadas a atender aos
seguintes requisitos:
a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados;
b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos seus objetivos sociais;
c) manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que
assegurem a respectiva exatidão;
d) conservar em boa ordem, pelo prazo de cinco anos, contado da data da emissão, os documentos que
comprovem a origem de suas receitas e a efetivação de suas despesas, bem assim a realização de quaisquer
outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial;
e) apresentar, anualmente, Declaração de Rendimentos, em conformidade com o disposto em ato da Secretaria
da Receita Federal;
f) recolher os tributos retidos sobre os rendimentos por elas pagos ou creditados e a contribuição para a
seguridade social relativa aos empregados, bem assim cumprir as obrigações acessórias daí decorrentes;
g) assegurar a destinação de seu patrimônio a outra instituição que atenda às condições para gozo da
imunidade, no caso de incorporação, fusão, cisão ou de encerramento de suas atividades, ou a órgão público;
h) outros requisitos, estabelecidos em lei específica, relacionados com o funcionamento das entidades a que se
refere este artigo.
§3º Considera-se entidade sem fins lucrativos a que não apresente superávit em suas contas ou, caso o
apresente em determinado exercício, destine referido resultado, integralmente, à manutenção e ao
desenvolvimento dos seus objetivos sociais".
85
atividade de tributação, pelo que a sua concessão deve ser considerada como
mecanismo viabilizador dos valores fundamentais da sociedade.
81
A imunidade é instituto constitucional. Traduz-se, para uns, em limitação ao poder de tributar e, para outros,
em uma regra constitucional de incompetência, no sentido de ser um instrumento que auxilia no desenho da
regra de competência tributária. Para Paulo de Barros Carvalho a Imunidade Tributária é "[...] a classe...de
normas jurídicas, contidas no texto da Constituição Federal, e que estabelecem, de modo expresso, a
incompetência das pessoas políticas de direito constitucional interno para expedir regras instituidoras de tributos
que alcancem situações específicas e suficientemente caracterizadas". ( 2003, p. 181). Para Yves Gandra da
Silva Martins, trata-se de uma "[...] vedação absoluta ao poder de tributar nos limites traçados pela Constituição".
(1998, p. 31). Nestas condições, imunidade não pode ser confundida com isenção. Aquela, a imunidade, se
encontra no plano constitucional e está relacionada com a norma de competência; já a isenção é criada e
regulada por norma de natureza infra-constitucional.
86
82
O princípio da igualdade tem previsão no caput do artigo 5º da Constituição Federal: “Todos são iguais perante
a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, [...]. “
87
desequilíbrio social. Por isso a devida compreensão deste princípio importa em não
avaliá-lo de forma limitada, apenas ao sentido formal. Impõe-se a sua interpretação
de forma harmônica com outras normas constitucionais, orientada nas atuais
exigências de justiça e solidariedade social.
Necessário destacar ainda, que não se pode conceber apenas uma positivação
que busca a igualdade formal, eis que necessária a luta pela igualdade material, de
sorte que se a tributação estiver amparada pela busca formal de um conceito de
igualdade, pode incorrer em falta de legitimação social.
83
“Há um problema inicial que consiste em saber se realmente a igualdade é um valor, isto é, se tem, no seu
espectro normativo, o status de idéia supraconstitucional.
A aceitação da igualdade como valor é essencial ao Estado Democrático de Direito, eis que, mesmo destituído
de conteúdo prévio, imanta todos pois outros valores. O valor formal não deixa de ser valor, tendo em vista que
procura sempre permear os valores que apresentam conteúdo possível.” (TORRES, 2005a, p. 143).
84
A igualdade apresenta-se como valor que vai interferir em todos os demais valores buscando a sua
compatibilização: “A igualdade é o tema fundamental da filosofia jurídica e política e penetra, como medida,
proporção ou razoabilidade, em todos os valores, dando-lhes a unidade. Participa, portanto, das idéias de justiça,
segurança e liberdade. [...] A igualdade tributária também é vazia, repudiando as discriminações arbitrárias,
afastadas da fundamentação ética dos valores. Serve de medida e harmoniza simultaneamente a justiça (e os
seus princípios da capacidade contributiva, da redistribuição de rendas, do desenvolvimento econômico), a
segurança (e os seus princípios da legalidade, da irretroatividade, da vinculação do lançamento, etc.) e a própria
liberdade absoluta (e as suas imunidades explícitas ou implícitas), mediante o sopesamento desses valores. Não
basta que a lei crie a tributação justa, afinada com a capacidade econômica do cidadão, mas que a imponha
igualmente a todos; nem se esgota a segurança no direito de ir à presença do juiz expor a sua pretensão contra
o Fisco, mas de estar em pé de igualdade com a outra parte; nem a imunidade significa apenas intributabilidade
dos direitos da liberdade, senão que aponta para a igual vedação de incidência para todos os homens. Demais
disso, a igualdade tributária não está presa a um único fundamento, eis que pode se justificar por motivos fiscais
ou extrafiscais, financeiros ou políticos, conjunturais ou permanentes.” (TORRES, 2005a, p. 153).
88
85
Art. 3º. Constituem-se objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - Construir uma sociedade
livre, justa e solidária; II - Garantir o desenvolvimento nacional; III -Erradicar a pobreza, a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
89
Em que pese ser esta a sua primordial função, alerta o autor referido, que a
redistribuição de rendas pode encontrar empecilhos para a sua verificação, diante da
falta de possibilidade de concretização, pelo que [...]. é preciso, por conseguinte,
surpreendê-la nos seus princípios maiores, como sejam a capacidade contributiva, o
custo-benefício, a distribuição de rendas e a solidariedade do grupo [...]. (Torres,
2005a, p. 113).
86
“A justiça tributária compreende o processo sobre o justo na cobrança dos imposto, taxas, contribuições e
empréstimos compulsórios [...].” (TORRES, 2005a, p. 122).
87
“Justiça social, inicialmente, quer significar superação das injustiças na repartição, a nível pessoal, do produto
econômico. Com o passar do tempo, contudo, passa a conotar cuidados, referidos à repartição do produto
econômico, não apenas inspirados em razões micro, porém macroeconômicas: as correções na injustiça da
repartição deixam de ser apenas uma imposição ética, passando a consubstanciar exigência de qualquer política
econômica capitalista.” (GRAU, 2001, p. 259).
90
88
De uns trinta anos para cá reacendeu-se o interesse pela idéia de justiça fiscal. A crise do petróleo deflagrada
em 1973 fez com que s passasse a meditar sobre a escassez dos recursos públicos e por muito mais que mera
coincidência, foi publicado o livro fundamental de John Rawls sobre a Teoria da Justiça, tantas vezes citado.
91
Por óbvio, a aplicação rigorosa deste princípio está vinculada à idéia do que
seja tratamento justo, na medida em que impõe ao legislador considerar as
Deu-se a “virada kantiana”, isto é, a retomada de alguns pontos de reflexão do filósofo de Königsberg, como o
relacionamento entre direito e moral e a concepção de contrato social.” (TORRES, 2005, p. 123).
89
A primeira sinalização no direito pátrio ao princípio da capacidade contributiva constou da Carta Magna de
1824, que no seu artigo 179, §15, estabelecia que “Ninguém será isento de contribuir para as despesas do
Estado em proporção a seus haveres”. Entretanto, somente na Constituição de 1946 é que o apontado princípio
teve expressa referência no artigo 202. Posteriormente, na Constituição de 1967 foi suprimido do respectivo texto
constitucional. Mais recentemente, quando da elaboração do texto da atual Constituição, a chamada comissão
Afonso Arinos fez constar o princípio da capacidade contributiva no artigo 149 do anteprojeto, que deveria ser
observado em relação a todos os tributos: “Os tributos terão caráter pessoal, sempre que isso for possível, e
serão graduados pela capacidade econômica do contribuinte segundo os critérios fixados em lei complementar”.
No entanto, o texto constitucional ao final promulgado acabou por restringir aplicação do princípio, determinando
a sua observância apenas com relação aos impostos, pelo que restou afastado das demais espécies tributárias.
90
A utilização da expressão "capacidade econômica" para Silva Martins (1989, p.34), representou equívoco do
legislador: “À luz de tal distinção, percebe-se que o constituinte pretendeu, ao mencionar a capacidade do
contribuinte, referir-se à sua capacidade contributiva e não à sua capacidade econômica, nada obstante o núcleo
comum de ambas, que implica densidade econômica capaz de suportar a imposição.” A capacidade contributiva
pressupõe uma relação jurídica entre o contribuinte e a Fazenda Pública, em que esta impõe àquele o dever de
arrecadar aos cofres públicos, nas medidas de suas possibilidades, isto é, no limite de sua capacidade
contributiva. De outro lado, a capacidade econômica é a exteriorização da potencialidade econômica de uma
pessoa em razão de seus rendimentos, independente de sua vinculação ao referido poder. É a aptidão dos
indivíduos em obter riquezas, sendo que estas se expressarão através de sua renda, do consumo ou do seu
patrimônio. Portanto, tem capacidade econômica todo aquele indivíduo que disponha de alguma riqueza ou de
aptidão para obtê-la, de uma forma geral. (p.35). Desta forma, em tese é possível que uma pessoa tenha
capacidade econômica e ao mesmo tempo não tenha condições de contribuir com o Fisco. Não obstante tais
observações, a CF-88 não reconhece tal distinção, tendo utilizado a expressão capacidade econômica como
sinônimo de capacidade contributiva.
92
91
“De feito, a solidariedade era valor fundante do Estado de Direito e já aparecia na trilogia da Revolução
Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade. Solidariedade é fraternidade. Sucede que o pensamento jurídico
posterior a Kant exacerbou a idéia de liberdade, diluindo-a na de legalidade, com o que ficaram esquecidas as de
justiça e solidariedade. A própria igualdade, que poderia se abrir às considerações de justiça ficou presa a
ideologias conflitantes: de um lado o liberalismo igualitário, revolucionário ou radical, com a figura exponencial de
Rousseau, que absolutizava o conceito de liberdade e atribuía à igualdade certo conteúdo político e econômico;
de outra parte, o liberalismo de tipo inglês, moderado ou doutrinário, que defendia, com Toqueville, Benjamim
Constat e outros, o conceito negativo de liberdade política e civil, restringindo a igualdade aos aspectos formais e
econômicos da ausência de constrição estatal.” (TORRES, 2005a, p. 180-181).
92
Há que se registrar que a solidariedade deve ser buscada mesmo nos pequenos grupos que compõem a
sociedade, como observa Torres (2005a, p. 585): “Muito para notar que a solidariedade, como assinala a
doutrina germânica, cria o sinalagma não apenas entre o Estado e o indivíduo que paga a contribuição, mas
entre o Estado e o grupo social a que o contribuinte pertence, considerando este às vezes em função do trabalho
e da profissão e outras vezes em razão de situações existenciais (velhice, doença, gravidez, morte, etc.). Porém,
a solidariedade não se esgota em ser uma atitude frente ao Estado, senão que também opera dentro do próprio
grupo: os princípios da igualdade e da proporcionalidade devem ser respeitados; os subgrupos, como os dos
patrões e dos empregados, seguem diferentes subprincípios derivados do princípio maior da solidariedade, como
sejam os do equilíbrio de risos e do dever de assistência; a solidariedade é uma decorrência da responsabilidade
social do empregador (sozialen Verantwortung Von Arbeitgebern)”.
93
“[...] como princípio orçamentário que é, a solidariedade se sintetiza na visão conjunta da receita a de despesa
e se comunica intimamente co o princípio da redistribuição de rendas. Solidários são os contribuintes e os
beneficiários da seguridade social, em conjunto. Diz Isensee que a solidariedade do beneficiário
(Leistungsempf¨nger) corresponde aos deveres solidários do contribuinte (Solidarische Pflichten): o trabalhador
alimenta o estudante.” (TORRES, 2000, p. 223).
95
Tais são os pressupostos da solidariedade fiscal que, como mais adiante será
visto, está de forma profunda relacionada com a extrafiscalidade. Isto porque quase
sempre será possível identificar a solidariedade como fator determinante da
94
A idéia de solidariedade será desenvolvida de modo mais aprofundado na seqüência do trabalho.
95
“A solidariedade se aproxima da justiça por criar o vínculo de apoio mútuo entre os que participam dos grupos
beneficiários da redistribuição dos bens sociais. A justiça social e a justiça distributiva passam pelo
fortalecimento da solidariedade. Os direitos sociais, ou direitos de segunda geração como preferem outros,
dependem dos vínculos da fraternidade. Solidários são os contribuintes e os beneficiários das prestações
estatais, em conjunto. Diz Isensse que “às pretensões solidárias correspondem deveres solidários”. A
solidariedade entre os cidadãos deve fazer com que a carga tributária recaia sobre os mais ricos, aliviando-se a
incidência sobre os mais pobres e dela dispensando os que estão abaixo do nível mínimo de sobrevivência. É
um valor moral judicizável que fundamenta a capacidade contributiva e que sinaliza para a necessidade da
correlação entre direitos e deveres fiscais.” (TORRES, 2005a, p. 584).
96
Para Torres (2005, p. 168), segurança jurídica “[...] é certeza e garantia dos
direitos é paz. Como todos os valores jurídicos, é aberta, variável, bipolar e
indefinível [...].” Conclui que a segurança jurídica significa a segurança dos direitos
fundamentais.
96
“[A segurança] é um autêntico direito fundamental, no sentido de que as leis tributárias do Estado e a própria
Fazenda Pública constituem res publica, ou direitos republicanos, ou direitos de 3.ª geração como preferem
outros, garantidos pelo ordenamento jurídico e acionáveis pelo Ministério Público ou por qualquer um do povo.
Nessa perspectiva é que Alberto Nogueira pode falar em Direitos Humanos da Tributação. Flávio Bauer Novelli
dissertou proficientemente sobre o tema: “A segurança é o direito fundamental, enquanto situação subjetiva
protegida explicitamente pela Constituição... é evidente que a segurança que a Constituição protege não é só a
segurança individual... É também, ou é até mesmo em primeiro lugar, a segurança do direito enquanto
pressuposto e fundamento daquela outra. Este entendimento me parece digno de consideração, particularmente
no que se refere ao Direito Tributário, uma vez que o exato respeito dessa disposição, em todos os seus
desenvolvimentos e implicações, poderá ter conseqüências significativas, quer no momento da edição da lei
tributária, quer no momento de sua interpretação”. Isensee diz que “direito fundamental” à segurança”
(Grundrecht auf Sicherheit) exibe o status negativos, configurando na legislação que protege o cidadão contra o
Estado, e o status positivus libertatis, consubstanciado na garantia do processo judicial e do administrativo.”
(TORRES, 2005, p. 170-171).
97
O preceito que garante tal condição está previsto no artigo 5.º, caput, da
Constituição Federal de 1988: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade [...]”97.
97
“A Constituição da Espanha contém dispositivo semelhante (art. 9.º, 3). A Constituição da Alemanha não
contém declaração explícita sobre a segurança, que é lida nas entrelinhas da cláusula do Estado Social” (Torres,
2005a, p. 169).
98
Observa Torres ( 2005a, p. 180): “Uma outra característica marcante da sociedade de risco é que nela as
instituições políticas e as instituições sócias entram em novo relacionamento. O Ministério Público e o Judiciário
passam e exercer papel mais ativo na defesa dos direitos difusos, em cooperação com as instituições sociais,
afastando-se da missão neutra que desempenhava na sociedade industrial. A sociedade de riscos, com a
98
pluralidade de interesses em jogo, é necessariamente uma sociedade litigiosa. Surge um novo esquema de
separação de poderes, no qual destacam a flexibilização da legalidade tributária, a tipificação administrativa e a
judicialização da política.”
99
“Derivado do adjetivo de pólis (politikós), significa tudo aquilo que se refere à cidade, e, portanto, ao cidadão,
civil, público e também sociável e social, o termo ‘política’ foi transmitido por influência de grande obra de
Aristóteles, intitulada Política, que deve ser considerada o primeiro tratado sobre a natureza, as funções, as
divisões do Estado, e sobre as várias formas de governo, predominantemente no significado de arte ou ciência
do governo, isto é, de reflexão, não importa se com intenções meramente descritivas ou também prescritivas
(mas os dois aspectos são de difícil distinção), sobre as coisas da cidade”. (BOBBIO, 2000, p. 159).
99
Por oportuno há que se referir também, que a visão de política pública está
ligada à concepção de Estado que se adota, ou seja, o ideário do modelo de Estado
é que irá determinar a política pública a ser adotada. Segundo Bucci (2002, p. 244-
245):
Feitas estas observações, cabe referir que Bucci (2002, p. 241) define políticas
públicas101 como:
100
Jürgen Habermas (1999) defende que o conceito de ideologia surgiu com a nova organização social,
constituída pela ascensão da burguesia como classe dominante e do modo de produção capitalista que passou
a legitimar formas de poder estatal, fundamentadas na livre iniciativa do mercado e na não intervenção estatal.
Já para Marilena Chauí (2001, p. 55) a distorção trazida pela ideologia não decorre de ela apresentar-se como
uma aparência, mas de ela estar voltada para “neutralizar a história, abolir as diferenças, ocultar as contradições
e desarmar toda tentativa de interrogação. [...] A ideologia, forma específica do imaginário social moderno, é
uma maneira necessária pela qual os agentes sociais representam para si mesmos o aparecer social,
econômico e político, de tal sorte que essa aparência (que não devemos simplesmente tomar como sinônimos
de ilusão ou falsidade), por ser o modo imediato e abstrato de manifestação do processo histórico, é o
ocultamento ou a dissimulação do real. [...] Universalizando o particular pelo apagamento das diferenças e
contradições, a ideologia ganha coerência e força porque é um discurso lacunar que não pode ser preenchido”.
101
“[...] As políticas públicas devem ter como objetivo a justiça social de fato, entendendo-se a justiça não em um
sentido utilitarista, pois se assim for incorre-se em um sério problema. [...] Partindo-se do pressuposto da
existência de uma justiça social de fato, tem-se uma sociedade que inclui a todos somente porque é possível, ao
mesmo tempo, excluí-los. Este problema deve ser afrontado também pelos economistas, tendo em mente a
perspectiva da justiça não no sentido utilitarista. Não se pode esquecer que o utilitarismo tem, ainda, uma grande
influência nos definidores de políticas públicas, tanto nacionais quanto internacionais. Aliás, quando se trata de
economia internacional, o utilitarismo, seguindo as idéias de James Meade, no clássico livro Trade and Welfare,
fez-se presente, afirmando literalmente que, adotando-se a antigo critério utilitarista se decidirá cada ação
política do ponto de vista dos seus efeitos sobre uma soma complexiva. Dessa forma, parece que a idéia da
tutela dos direitos fundamentais passa distante das reflexões fundamentadas na perspectiva utilitarista”. (VIAL,
2005, p. 94-95).
101
102
“A temática das políticas públicas, como processo de formação do interesse público, está ligada à questão da
discricionariedade do administrador, na medida em que “o momento essencial da discricionariedade é aquele em
que se individualizam e se confrontam os vários interesses concorrentes”. E um interesse é reconhecível como
interesse público quando é assim qualificado pela lei ou pelo direito, que é exatamente o que se faz no processo
de formação da política pública como dado de direito, ou seja, sancionar determinados fins e objetivos, definindo-
os legitimamente como a finalidade da atividade administrativa”. (BUCCI, 2002, p. 265).
102
103
Observa Bucci (2002, p. 269-270): “Parece relativamente tranqüila a idéia de que as grandes linhas das
políticas públicas, as diretrizes, os objetivos, são opções políticas que cabem aos representantes do povo e,
portanto, ao Poder Legislativo que as organiza sob forma de leis, para a execução pela Poder Executivo,
segundo a clássica tripartição das funções estatais em legislativa, executiva e judiciária. Entretanto, a realização
concerta das políticas públicas demonstra que o próprio caráter diretivo do plano ou do programa implica a
permanência de uma parcela da atividade “formadora” do direito nas mãos do governo (Poder Executivo),
perdendo-se a nitidez da separação entre os dois centros de atribuições”.
104
104
“É preciso provocar o Poder Judiciário, submetendo-lhe, com ousadia, demandas relativas aos direitos
sociais, evitando a permanência no ordenamento jurídica de leis e políticas públicas contrárias a esses direitos e,
por conseqüência, à ‘Vontade da Constituição’.” (BONTEMPO, 2005, p. 300).
105
3.4 A extrafiscalidade
Feito este registro histórico, cumpre dizer que é também antiga a discussão
sobre os institutos da fiscalidade, parafiscalidade e extrafiscalidade, levando em
conta o critério finalístico da tributação, razão pela qual cabem no ponto alguns
registros diferenciadores. Assim, um tributo terá natureza fiscal quando a sua
cobrança objetivar apenas a arrecadação de recursos para os cofres públicos, com o
propósito de sustentar os encargos que são próprios da administração pública. Por
esta razão, afirma-se que o tributo será fiscal quando seu objetivo principal for a
arrecadação de recursos financeiros para o Estado.
105
Anota Berti (2003, p. 37) que “observou-se que na Europa do pós-guerra houve diversas formas de incentivo
para a reconstrução dos paises mediante o uso extrafiscal de impostos variados. Isto se deu particularmente
naqueles lugares em que os efeitos maléficos do conflito bélico foram sentidos de modo mais intenso até
meados do ano de 1945.”
107
[...] fiscal um tributo quando sua finalidade básica for geração de ingressos
para o Erário. Toda e qualquer finalidade não-arrecadatória, que prepondere
sobre os interesse meramente arrecadatório, dará ao tributo uma conotação
extrafiscal. As finalidades fiscais e extrafiscais convivem em todos os
tributos, entretanto, o que haverá e será relevante para a distinção entre
uma ou outra modalidade dessa classificação dos tributos em análise, será
não a exclusividade de um fim, mas a preponderância de um fim sobre o
outro.
106
O artigo 3.º do Código Tributário dispõe que: “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória em moeda ou
cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante
atividade administrativa plenamente vinculada”.
108
Além das vantagens acima citadas, possibilitadas pelo uso extrafiscal, pode-se
destacar outra grandiosa característica, mencionada por Rothmann (1970, p. 108),
correspondente à “[...] aplicação das leis tributárias, visando precipuamente a
modificar o comportamento dos cidadãos, sem considerar o seu rendimento fiscal”.
Na mesma linha segue o pensamento de Meirelles (1984, p. 380-381) ao defender a
“[...] utilização do tributo como meio de fomento ou de desestímulo a atividades
reputadas convenientes ou inconvenientes à comunidade.”
público que sempre deve preponderar sobre o interesse privado. Tal escopo
é o fim do Estado e também o meio para o desenvolvimento efetivo de um
Estado de Direito que realize a justiça fiscal. Evidentemente, há parâmetros
para a realização destes fins, todos muito bem definidos na Constituição,
geralmente sob a forma de enunciados conhecidos como “Princípios
Constitucionais Tributários” ou “Limitações Constitucionais ao Poder de
Tributar”.
Desta forma, é possível afirmar que a extrafiscalidade foi objetivada pelo
legislador constituinte, tanto que o mesmo previu regras específicas para
estimular seu uso, contudo sempre guardados o respeito e a adequação ao
Sistema Tributário como um todo. (BERTI, 2004, p. 36-37).
107
A indicação de Estado Contemporâneo é feita por Berti (2004, p. 39) ao definir quatro fases distintas do
processo de evolução do Estado enquanto forma de organização do poder político até sua atual configuração:
Estado Antigo na Grécia e em Roma; o Estado Medieval; o Estado Moderno; e o Estado Pós-moderno ou
Contemporâneo. Foi no Estado Contemporâneo, em especial após a Segunda Grande Guerra, que de seu a
mudança na postura do Estado em decorrência do surgimento de novas necessidades da sociedade. É neste
cenário que surge o chamado Estado Social, amparado na doutrina norte-americana do Welfare State. (Berti, p.
42).
108
O uso extrafiscal dos tributos deve submeter-se à tutela constitucional, como alerta Martuscelli (2001, p. 60-
61): “A relevância das finalidades extrafiscais de alguns entes tributários não lhes subtraem a tutela
constitucional. Ainda que extrafiscais, essas entidades remanescem como tributos e, posto isso, submissas ao
regime constitucional tributário. As exceções à regra de submissão ao regime constitucional tributário dos tributos
ditos fiscais são dadas pela própria Constituição Federal. Dessa forma, embora certas finalidades extrafiscais
justifiquem um tratamento constitucional diferenciado para os tributos ditos, desta feita, extrafiscais, tal
diferenciação não implica uma abolição irrestrita dos direitos e garantias integrantes do estatuto do Contribuinte.”
110
109
“A flexibilização do orçamento é um temo que merece ser abordado quando se discute o papel social do
Estado e o bem-estar social. O Brasil é uma federação com elevado índice de federalismo fiscal e com mais de
5.500 entes da federação. Há um evidente grau de disparidade regional em uma federação com as dimensões
da brasileira, ainda mais num país em que há profunda desigualdade de renda e de distribuição de riquezas.”
(Cavalcanti, 2002, p. 307-308).
113
Significa, como visto que, por previsão constitucional, os estímulos fiscais são
de expressiva relevância como instrumento de viabilização de políticas de
desenvolvimento. Mas como conciliar os princípios da estrita administração da coisa
pública, em rígida conformação orçamentária, com a necessidade de promover o
desenvolvimento através de estímulos? Não há, segundo Silva Martins (2002, p.
277), maior dificuldade. É que todo
[...] incentivo fiscal que não se vincule a qualquer receita programada, para
o qual não haja qualquer projeção de gastos, ou seja, em que o custo
municipal para sua concessão é zero, refoge a rigidez orçamentária à falta
de elemento capaz de perturbar o equilíbrio entre receitas e despesas
públicas. Em termos diversos, todo o estímulo fiscal cuja concessão possa
provocar um impacto negativo no orçamento, com possível redução de
receitas, deve ser submetido a todos os severos controles que a
Constituição e a lei orçamentária impõem. Não aqueles cujo impacto é
nenhum, visto que sua concessão não reduz receitas – no futuro aumentá-
las-á -, não tem reflexos, não afeta o orçamento, não gera qualquer
despesa não programada.
Inclusive, é neste sentido o espírito do art. 14 da LRF. Assim, a possibilidade
de criação de estímulos fiscais sem impacto sobre orçamento110 corresponde à
ferramenta importante para a administração pública, na medida em que atrai
investimentos, possibilitando a criação de empregos e permitindo futura geração de
receita tributária como resultado das atividades econômicas desenvolvidas.
110
Ainda, no tocante aos meios para a obtenção de uma maior flexibilização em relação às medida previstas
pela LRF, destaca Rodrigues (2005, p. 60) ser possível, embora existam amarras, implementar também políticas
públicas pautadas pela extrafiscalidade: [...] Constata-se, da análise da Lei de Responsabilidade Fiscal, em
primeiro lugar, que os entes federados devem instituir todos os respectivos tributos, previstos
constitucionalmente, principalmente os impostos, cuja não implantação implica perder o direito a transferências
voluntárias; em segundo, que os atos de renúncia fiscal ficam totalmente atrelados a formalismos ou ações que
impeçam prejuízos orçamentários ou de arrecadação; em terceiro, que, tendo-se em vista o teor do caput e do
inciso I, do art. 14, a renúncia, mesmo sem previsão de fonte alternativa de recursos, é possível; e, por último,
que a lei em questão não criou nenhum empecilho para, via renúncia fiscal, evitar a migração interna de
empresas.”
115
111
Estados e municípios amparados em seu direito para instituir e isentar tributos, tem gerado um verdadeiro
conflito federativo, chamado de “guerra fiscal”, que nada mais é do que a exacerbação de práticas supostamente
competitivas. Nos últimos anos a “guerra fiscal” tem se intensificado, em face dos benefícios fiscais e financeiros
que vêm sendo concedidos de forma indiscriminada, em especial às grandes empresas, como forma de estímulo
para que estas se instalem em seus respectivos territórios. Entretanto, a realidade tem mostrado que apesar das
vantagens decorrentes do aumento dos níveis de emprego, os apontados benefícios têm gerado uma
concorrência nefasta entre entes federados, circunstância que a médio e longo prazo vem acarretando o
agravamento da crise financeira em que já se encontram Estados e Municípios.
112
A CF/88 dispõe no parágrafo 6º, do art.150: “Qualquer subsídio ou isenção, redução da base de cálculo,
concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser
concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima
enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art.155, par.2, XII, g.”
116
Cabe ainda outro alerta, no sentido de que incentivo fiscal não pode ser
confundido com incentivo financeiro. Aquele atua nas obrigações tributárias antes de
seu termo, enquanto este corresponde a benefício ocorrente em momento posterior
à extinção da apontada obrigação. Destaca-se que o art. 155, § 2º, XII, “g”, da
Constituição Federal, cuida exclusivamente de incentivos fiscais, não tratando dos
incentivos financeiros.
Portanto, este financiamento tem natureza financeira e não fiscal, podendo ser
realizado com amparo na autonomia outorgada aos entes federados, pelo que não
há que falar em eventual infringência de acordos entre Estados, na medida em que a
113
O direito tributário e o direito financeiro são considerados atualmente ramos autônomos do direito, integrando
o campo das finanças públicas. Isto porque a CF/88 optou por separá-los: os arts. 145 a 156 cuidam do sistema
tributário (relações entre o poder impositivo e o contribuinte); os arts. 157 a 169, cuidem das finanças públicas e
dos orçamentos, abrangendo a partilha das receitas tributárias entre os entes federativos (arts. 157 a 162), as
regras das finanças públicas e administração da moeda e do crédito (arts. 163 e 164) e dos orçamentos (arts.
165 a 169).
114
Conforme Nabais (1998), a lei que estipular os benefícios fiscais para determinados setores da atividade
econômica terá sua aferição constitucional verificada de maneira limitada à constatação se as mesmas se
revelam arbitrárias ou se apresentam excessivas ou desproporcionais aos fins para que foram criadas. Em razão
da tributação negativa, adotada com a finalidade de privilegiar os contribuintes que adotam comportamentos
previstos pela legislação estipuladora dos benefícios fiscais, não poderá se dizer que se está ofendendo o
princípio da igualdade, uma vez que, justamente por terem o caráter de normas de cunho econômico-social e
fiscal, é que sua verificação constitucional deve ser limitada ao comportamento estipulado para se obterem, o
qual não poderá ser desproporcional e conter excessos em relação ao fim colimado. Assim, é por ter
essencialmente caráter extrafiscal que os benefícios fiscais têm de ser analisados não sob a ótica estritamente
tributária, mas de acordo com os fins a serem buscados e a sua natureza econômico-social.
117
Nesta linha, resta claro que se trata de dois tipos absolutamente distintos de
estímulos e que não podem ser confundidos. O primeiro, de natureza tributária,
previsto na letra “g”, do inciso XII do art. 155 da Carta Política; e o segundo, de
natureza financeira, subordinado às disposições constantes dos arts. 165 a 169 da
CF.
Com tais colocações, resta evidente a possibilidade de amplo manejo por parte
dos entes federados para a implementação de políticas extrafiscais. A questão
principal, todavia, é a escolha adequada de tais políticas, cujos critérios norteadores
devem ter por influência os possíveis efeitos positivos decorrentes de sua adoção,
no que diz respeito às vantagens geradas em favor da sociedade. Em outras
115
O CONFAZ – Conselho Nacional de Política Fazendária foi criado para evitar a guerra fiscal entre os Estados-
membros. No entanto, no decorrer dos anos diversos Estados de forma isolada passaram a conceder incentivos
de forma direta, sem a anuência do Conselho, de forma que cada vez mais o seu poder ficou relegado a plano
secundário.
118
No entanto, é isso que se tem visto, ou seja, empresas com precisa projeção
de seus custos produtivos e de instalação, estabelecem a partir disso um processo
de competição entre governos estaduais e municipais, para ver “quem dá mais”.
Exemplos claros disso são recentes no Estado do Rio Grande do Sul, com
transferência de fábricas de calcados para os estados do nordeste, bem como de
fumageiras para o de Santa Catarina. Desta forma, as políticas extrafiscais somente
poderão ser tidas como instrumento de efetiva de inclusão social, quando planejadas
devidamente, para que não tenham vida útil curta, para que seus efeitos positivos
possam permanecer por longo tempo.
O que fazer então? Quais os critérios e cuidados que devem ser tomados pela
administração no processo de concessão de benefícios? Quais as medidas
extrafiscais possíves? É o que procuraremos apontar no capítulo seguinte.
O exercício tributante extrafiscal deve, assim, ser visto sob uma perspectiva de
solidariedade, no sentido de possibilitar o acertamento de inúmeras situações
geradoras de desigualdades.
120
116
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios:I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; [...]
121
117
Art. 153 da CF.
118
Art. 154 da CF.
119
Art. 155 da CF.
120
Impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte
interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior,
que são de competência dos Estados e do Distrito Federal.
121
Art. 155, § 2º, V.
122
122
Art. 157 da CF.
123
Art. 158 da CF.
123
Embora isso reste evidente no plano teórico, na prática, o que se tem visto é
algo diverso, especialmente nos últimos anos, em que a União tem dirigido esforços
e medidas com o propósito de gerar um maior superavit primário, cujo resultado em
sua parte significativa tem sido dirigido ao pagamento de encargos da dívida pública.
Significa em outras palavras, que os compromissos com os credores internos e
externos da União têm sido privilegiados em relação aos credores de políticas
públicas de inclusão social.
Esta realidade não tem sido aceita pacificamente. Prova disto é o recente
movimento promovido por governadores e prefeitos, com a finalidade de
implementar reforma que possibilite uma divisão das receitas oriundas da
Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira - CPMF. A reivindicação
constituiria mecanismo de negociação para que houvesse apoio para aprovação da
prorrogação da própria CPMF, como também da Desvinculação das Receitas da
União - DRU, que permite ao governo gastar livremente 20% do orçamento,
incluindo, portanto, aquelas receitas vinculadas a fins específicos como a CIDE e a
CPMF, por exemplo.
No caso antes referido, se a receita da CPMF se destina à saúde, por que não
deixar uma fatia da arrecadação diretamente nos Municípios e Estados? Por que
impor a centralização da arrecadação, com a distribuição posterior dos recursos
correspondentes pela União?
124
O jornal ZERO HORA de 31 de janeiro 2007, p. 8, noticiou que para a Ministra Dilma Rousseff, “[...] a União
não pode ceder a Estados e Municípios o equivalente a R$ 9,6 bilhões, com os 30% reivindicados da CPMF.
124
125
Vários são os instrumentos de participação da sociedade, previstos na CF e legislação infraconstitucional, que
podem ser utilizados pela administração pública: a) consulta pública (abertura de prazo para manifestação por
escrito de terceiros, antes de decisão, em matéria de interesse geral); b) audiência pública (sessão de discussão,
aberta ao público, sobre tema ainda passível de decisão); c) colegiados públicos (reconhecimento a cidadãos, ou
a entidades representativas, do direito de integrar órgão de consulta ou de deliberação colegial no Poder
Público); d) assessoria externa (convocação da colaboração de especialistas para formulação de projetos,
relatórios ou diagnósticos sobre questões a serem decididas); e) denúncia pública (instrumento de formalização
de denúncias quanto ao mau funcionamento ou responsabilidade especial de agente público; ex. representação
administrativa); f) reclamação relativa ao funcionamento dos serviços públicos (difere da representação
administrativa, pois fundamenta-se em relação jurídica entre o Estado ou concessionário do Estado e o
particular-usuário); g) colaboração executiva (organizações que desenvolvam, sem intuito lucrativo, com alcance
amplo ou comunitário, atividades de colaboração em áreas de atendimento social direto); h) ombudsman
(ouvidor); i) participação ou "controle social" mediante ações judiciais (ação popular, ação civil pública, mandado
de segurança coletivo, ação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, entre outras); j) fiscalização
orgânica (obrigatoriedade, por exemplo, de participação de entidades representativas em bancas de concursos
o
públicos, v.g, OAB). Tais instrumentos procedimentais têm previsão na CF (arts. Art. 5 , XXXIII, XXXXIV, "a",
o o o
LXIX, LXX, LXXI, LXXII, LXXIII, LXXVII; 10; 37, 3 .; 58, II; 74, §2 ; 132; 216, §1 .), como também em normas
infraconstitucionais (Lei de Normas Gerais de Processo Administrativo (Lei 9784/99, arts. 31 a 34).
126
Cumpre fazer a distinção entre audiência pública e consulta pública. Embora ambas constituam formas de
participação popular na gestão e controle da Administração Pública, não se confundem. A audiência pública
propicia o "debate público e pessoal por pessoas físicas ou representantes da sociedade civil", considerado "o
interesse público de ver debatido tema cuja relevância ultrapassa as raias do processo administrativo e alcança a
própria coletividade". Cuida-se, no fundo, de modalidade de consulta pública, com a particularidade de se
materializar através de "debates orais em sessão previamente designada para esse fim". A oralidade, portanto, é
seu traço marcante. De outro lado, a consulta pública tem a ver com o interesse da Administração Pública em
"compulsar a opinião pública através da manifestação firmada através de peças formais, devidamente escritas, a
serem juntadas no processo administrativo". (CARVALHO FILHO, 2001, p. 186).
126
Se tal circunstância for identificada, a decisão deverá ser pela não concessão
da vantagem, eis que, no futuro, esgotado o prazo de sua vigência, certamente a
atividade empresarial restará inviabilizada, o que sinaliza para a sua extinção ou
migração para outro ente federado, que assegure vantagem fiscal semelhante.
127
Em complemento o mesmo artigo 14 dispõe que devem ser atendidas igualmente as disposições da Lei de
Diretrizes Orçamentárias, além de, no mínimo, a uma das condições expressas em seus incisos I e II, assim
redigidos: “I – demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei
orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio
da lei de diretrizes orçamentárias; II – estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado
do caput, por meio de aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo,
majoração ou criação de tributo ou contribuição.”
128
128
O princípio da publicidade está inserido entre os fixados pelo artigo 37 da CF. Segundo a referida norma
devem orientar os atos da administração direta e indireta os princípios da legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência.
129
Este processo todo, envolvendo as três fases acima tratadas, ganha especial
relevância aqui se considerado que o Município, por ter competência tributária
restrita, praticamente tem apenas para implantar a política de inventivos a
possibilidade de utilização de dois tributos em especial – o Imposto Sobre Serviços
(ISS), e o Imposto Sobre Propriedade Territorial Urbana (IPTU). Assim, a
extrafiscalidade em nível municipal, sofre limites bem claros.
[...] pode-se ter que a utilização extrafiscal de tais espécies tributárias pode
ocorrer tanto em razão do grau de pobreza de determinadas pessoas como
enquanto instrumento que vise, por exemplo, à geração de empregos para
habitantes de determinado Município, o que se daria pela não-cobrança de
taxas, por período determinado, ou pela não-cobrança de contribuições de
melhoria decorrentes de obras de terraplenagem em terreno de empresa a
se instalar ou de obras que facilitem o acesso à mesma [...].
Tudo sinaliza, pois, para, em nível municipal, ser o IPTU a espécie tributária
que maiores possibilidades apresenta para fins de utilização extrafiscal.
131
Com efeito, a partir desta noção, de que o direito ao meio ambiente sadio está
vinculado a interesses públicos e privados, possível afirmar também que está
fundado na idéia desta solidariedade, visto que somente se conseguirá efetividade
com a participação de todos, nos termos indicados pela norma constitucional antes
apontada, que impõe ao Poder Público e a toda coletividade o dever de protegê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
129
De forma diversa dos chamados direitos da primeira geração - direitos individuais, considerados como
garantias do indivíduo diante do poder do Estado, e dos direitos de segunda geração - direitos sociais,
caracterizados por prestações que o Estado deve ao indivíduo, o direito ao meio ambiente na condição de direito
fundamental da terceira geração - direitos difusos, representa um direito-dever, no sentido de que o cidadão ao
mesmo tempo em que dele é titular, também precisa atuar na sua preservação.
132
CONCLUSÃO
direitos sociais, com a saúde, educação, segurança, habitação, etc, até porque
existem normas constitucionais expressando tal compromisso. Depois, em segundo
plano, devem ficar obrigações do Estado de natureza contratual, sobretudo as
resultantes das dívidas públicas com grupos econômicos e financeiros.
no sentido de não poder no futuro eliminar o benefício, sob pena de acarretar efeitos
sociais negativos. É que a possibilidade de perda pelo município de determinada
atividade econômica, como resultado da extinção das vantagens fiscais, certamente
poderá ser fator de exclusão social, ocasionada com a migração da atividade
empresarial para outro ente federado.
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