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DIREITOS HUMANOS E POLÍTICAS SOCIAIS

SUMÁRIO
1. Introdução ........................................................................................................................................3
1.1 Breve Contextualização da História entre Direitos Humanos e Políticas Sociais ....................6
2. O Capitalismo Dependente Latino-Americano e Tensões da Formação Social no Brasil ................15
2.1 As Políticas Sociais como Instrumentos de Promoção da Igualdade ...........................................19
3. Ditadura, Modernização Conservadora e Expansão da Política Social ..........................................24
3.1 Direitos e Particularidades da Cidadania no Brasil ......................................................................32
3.1.1 Idas e Voltas, Avanços e Retrocessos ...................................................................................33
4. Direitos e Políticas Sociais na Constituição Federal de 1988 ............................................................37
4.1 O princípio da gestão democrática e os Conselhos na Seguridade Socia.....................................40
5. O Direito a Participação na Gestão da Saúde .....................................................................................41
5.1 Papel do Conselho Nacional de Saúde .........................................................................................43
5.2 O direito à participação na gestão da previdência social ..........................................................44
5.3 O Direito à Participação na Gestão da Assistência Social .......................................................48
5.4 O Conselho Nacional de Assistência Social.............................................................................49
6. Participação Social nas Políticas Públicas: Avanços e Desafio .........................................................51
7. Referências Bibliográficas .............................................................................................................57
1. INTRODUÇÃO

Na segunda metade da década de 1980 a luta pela redemocratização do país


culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988, conhecida como
Constituição Cidadã, o que permitiu aos movimentos populares, aos sindicatos e
partidos políticos de esquerda, alterar o status de luta contra a opressão tornando a
busca por avanços na garantia e ampliação dos direitos de cidadania seu principal
instrumento de ação.
No marco de uma sociedade democrática, vivida no país apenas por breves
intervalos entre uma ditadura e outra, o Direito na forma de leis, tornou-se nesse
período um instrumento de defesa da melhoria das condições de vida da classe
trabalhadora e de redução das desigualdades sociais que marcam historicamente a
sociedade brasileira.
Porém, a reflexão sobre os limites dessa estratégia, numa perspectiva crítica,
é pouco realizada no âmbito dos movimentos populares, ou nos espaços de trabalho
dos profissionais das várias áreas que atuam na esfera da garantia desses direitos,
tais como operadores do direito, assistentes sociais, pedagogos, psicólogos,
administradores públicos, entre outros. Neste sentido é que se coloca uma
aproximação ao debate sobre os limites e possibilidades de aplicação do Direito na
sociedade capitalista a partir da efetivação dos Direitos Humanos em geral e das
políticas sociais como instrumentos de promoção de igualdade.
A discussão proposta aqui está circunscrita ao espaço da práxis em seu sentido
amplo, isto é, o da busca dos sujeitos pela constante modificação das circunstâncias
que determinam a formação das ideias e que, por sua vez, alteram as próprias
circunstâncias, num movimento contínuo pela busca de uma sociedade sem
exploração.

O conhecimento das políticas sociais merece ser entendido como garantia da


implementação dos direitos humanos e sua indisfarçável vinculação ao Estado,
gerada diante de seu caráter público, impondo, necessariamente, o aprofundamento
da discussão sobre os dois institutos, as políticas sociais e os direitos humanos.

Cabe registrar que a importante implementação dos direitos fundamentais faz


parte de um longo processo histórico que exige o constante incremento da
participação popular, com vistas ao seu reconhecimento legal e, consectariamente, a
busca por sua universalização mediante a construção das políticas públicas.
Inicialmente, cumpre destacar, que os direitos elevados a esta categoria se
fundamentam a partir de três dimensões, que são ligadas conceitualmente ao tema
da revolução francesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

A primeira dimensão buscou restringir a ação do Estado frente aos particulares,


a segunda agregou os direitos que envolvem as prestações positivas mediante o
oferecimento de serviços públicos, e a terceira incluiu os direitos difusos e coletivos,
aqueles que não podem ser titularizados diante de sua ampla legitimidade, como o
direito ao meio ambiente equilibrado. Assim, a apropriação das políticas sociais está
mais intimamente relacionada ao alcance dos direitos fundamentais de segunda
dimensão, diante da maior vinculação impõe do poder público com as prestações
positivas de que passaram a ser credores seus cidadãos.

Se valendo dos conceitos acima descritos a Constituição Federal de 1988 visou


a reconstrução do modelo estatal nacional e a substituição do modelo autoritário pelo
democrático, admitindo e incentivando a participação política dos estratos sociais
articulados. Dessa maneira, se tornaram conhecidas as demandas que cada um deles
pretendia ver atendidas pelo corpo social. A ampliação das políticas sociais percorria
caminhos paralelos a tais interesses, ora mais, ora menos próximos, mas é correto
afirmar que havia crescente expansão.

Em determinado momento da história recente do país, ocorreu considerável


alteração nesse panorama diante da assumida ressignificação do Estado através das
práticas neoliberais. Estas impuseram um viés mais restritivo à proclamada amplitude
do reconhecimento dos direitos sociais outorgados na carta política. A implementação
das políticas sociais passou a ser restrita a adoção de ações com vistas a garantia de
direitos mínimos a determinados grupos de cidadãos considerados os mais expostos,
tais como crianças, idosos e trabalhadores de baixa renda.

Considerando o compromisso assumido pela nação através da Constituição


Federal de 1988, onde o Estado brasileiro se comprometeu a prestar políticas de bem
estar social, acrescentando que a partir daí se construiria uma sociedade livre, justa e
solidaria, erradicando assim a pobreza e a marginalização, dentre outros
compromissos igualmente nobres, não faltam críticas ao modelo de aplicação e
seleção adotado.

A matriz política que vem sendo operada se traduz na redução das


desigualdades de maneira focalizada, critica aplicada, principalmente, aos governos
de ideologia de esquerda, que, ao menos conceitualmente, reconhecem que a
pobreza e as desigualdades sociais estão fundamentadas em realidades que
extrapolam as questões focalistas.
1.1 Breve Contextualização da História entre Direitos Humanos e Políticas
Sociais

T. H. Marshall (1893-1981) foi professor de Sociologia na London School of Economics, diretor do


Departamento de Ciências Sociais da Unesco e presidente da International Sociological Association.

A afirmação dos Direitos Humanos como uma conquista da humanidade ao


longo dos séculos é a perspectiva que predomina em nossa sociedade na atualidade.
Essa conquista teria início, ainda que de maneira indireta, no reconhecimento dos
direitos naturais, ou seja, de que existem direitos que não necessitam ser atribuídos
aos homens pois são a manifestação da sua essência, o caráter absoluto do ser
humano.

Os defensores da ideia da existência de direitos naturais afirmam que ela


nasce da razão humana na busca por encontrar elementos que identifiquem os
homens como iguais e estabeleçam condições de convivência entre esses iguais.
Constituem-se, pois, na busca da pessoa pelos valores universais que, num primeiro
momento foram relacionados à religião e num momento posterior do desenvolvimento
das ideias, ao contrato social que dá origem ao Estado.
A ideia de que todos os homens nascem iguais tem no desenvolvimento da
igualdade perante a lei sua forma mais acabada. Seria, então, a partir da positivação
dos direitos do homem que ocorreu com as grandes revoluções do século XVIII, as
revoluções norte americana e francesa, que todos os homens passam a ser
reconhecidos como sujeitos de direitos, os Direitos Humanos ganham status de
valores universais e, a partir daí, tem início seu processo de ampliação e consolidação.

As liberdades civis conquistadas naquele momento histórico (direito à


propriedade, à liberdade de ir e vir, direito de compra e venda) foram responsáveis
por garantir uma igualdade básica aos homens, e esta igualdade jurídica lhes permitiu
ampliar ainda mais seus direitos. Este é o centro do modelo evolutivo, proposto pelo
sociólogo britânico Thomas H. Marshall, e que melhor expressa tal proposição.

Garantidos os direitos civis, os homens passaram a reivindicar a liberdade de


expressão, o direito de pensamento, de organização e de participação nas decisões
políticas. Dessa maneira, os direitos civis se constituiriam em uma condição para a
ampliação dos direitos políticos e mesmo para a garantia do processo democrático.

Os direitos civis e políticos, além do processo democrático são, por sua vez, a
base sobre a qual se tornam possíveis as conquistas sociais. São as lutas dos
trabalhadores, possíveis apenas em função de que os mesmos são cidadãos com
direitos civis e políticos, isto é, sujeitos de direitos, que caminharam no sentido de
construção de uma igualdade mais substantiva, palpável, permitindo-lhes melhor
usufruir das riquezas produzidas pela civilização. Mauro Iasi faz o seguinte comentário
crítico acerca desta concepção de Marshall:

“...o autor acaba prisioneiro de uma visão segundo a qual a evolução desses
patamares de direito são o resultado de uma espécie de autoaperfeiçoamento
do próprio Estado, isto é, na medida em que o Estado torna possível um
código civil, um conjunto de instituições de acesso à justiça, como tribunais,
juízes, advogados, garante as condições de exercício dos direitos civil;
quando desenvolve instituições políticas e jurídicas como partidos, eleições
tribunais eleitorais, parlamentos, cria os quadros institucionais que permitem
os direitos políticos, da mesma forma, espera ele, que o desenvolvimento de
legislações sociais e instituições de acesso a bens e serviços às camadas
mais pobres, o desenvolvimento de políticas públicas e legislações protetivas
em relação ao trabalho, acompanhado de instituições como tribunais e o
direito do trabalho, seriam suficientes para fornecer o quadro institucional que
permitirá o florescer dos direitos sociais.” (IASI, 2012, 184).

Para Marshall, os Direitos Humanos encontram-se sempre num crescendo,


num processo de reconhecimento que amplia, universaliza, diversifica e especifica
esses direitos. Na base desse processo está um contrato mais moderno, um pacto
social assentado novamente em uma dinâmica de direitos e deveres que garante a
manutenção da sociedade existente.

Outro autor que partilha da concepção evolucionista dos Direitos Humanos é o


filósofo italiano Norberto Bobbio. Segundo Perry Anderson (1996), Bobbio faz parte
do grupo de pensadores que sofreu os horrores da Segunda Guerra Mundial e pensou
alternativas para que a humanidade evitasse repetir aqueles acontecimentos. Muito
influente em seu país e também na América Latina, seu pensamento é menos
conhecido no restante da Europa e Estados Unidos da América.

A contribuição de Bobbio para a perspectiva dos Direitos Humanos está


relacionada ao caráter histórico e relativo da construção desses direitos, o que, por si,
não altera a lógica de pensamento de Marshall, muito pelo contrário, a reforça. Sendo
responsável por arrolar e sistematizar as principais características dos Direitos
Humanos na atualidade, Bobbio (1992) defende a ideia de que os direitos do homem
variam de acordo com a história da humanidade, com as necessidades e interesses
de cada sociedade em seus diversos momentos. Descarta a ideia de que existe um
direito natural do homem uma vez que o Direito é considerado por ele historicamente
determinado.

Na base da sua argumentação está o questionamento de um fundamento


absoluto dos Direitos Humanos, ele busca um fundamento sim, mas não um que seja
inquestionável como a existência de direitos cuja origem seja anterior ao próprio
homem, isto é, divina. Para ele um fundamento absoluto, assim como um poder
absoluto, não pode ser questionado, o que é ruim, classificando a ideia de direitos
naturais, que durante séculos foi defendida pelos jusnaturalistas, como uma ilusão.
Assim, a existência de uma “natureza humana” é um argumento frágil como afirma:

Não é o caso de repetir as infinitas críticas dirigidas à doutrina dos


direitos naturais, nem demonstrar mais uma vez o caráter capcioso dos
argumentos empregados para provar o seu valor absoluto. Bastará recordar
que muitos direitos, até mesmo os mais diversos entre si, até mesmo os
menos fundamentais – fundamentais somente na opinião de quem os
defendia -, foram subordinados à generosa e complacente natureza do
homem. (BOBBIO:1992, 16)

Quer dizer, a “natureza humana” foi justificativa para coisas distintas em cada
tempo, em cada sociedade, conforme os interesses dos homens: o que pode parecer
essencial em uma época histórica não é em outra época, em outra sociedade, com
outra cultura. Ele reconhece assim, que os direitos do homem são historicamente
relativos, e esse relativismo é considerado como uma expressão do pluralismo, da
existência das várias formas de pensamento, da convivência entre concepções tão
antagônicas como a defesa da liberdade de religião e da liberdade científica, por
exemplo. Sobre isto o autor afirma:

O elenco dos direitos do homem se modificou, e continua a se


modificar, com a mudança das condições históricas, ou seja, dos
carecimentos e dos interesses, das classes no poder, dos meios disponíveis
para a realização dos mesmos, das transformações técnicas, etc. Direitos que
foram declarados absolutos no final do século XVIII, como a propriedade
sacre et inviolable, foram submetidos a radicais limitações nas declarações
contemporâneas. (BOBBIO, 1992, 18).

E sua reflexão avança no sentido da aplicabilidade dos Direitos Humanos, que


para ele é menos uma questão filosófica e mais o resultado do desenvolvimento
histórico da sociedade, sendo assim uma questão econômica e sobretudo política,
uma vez que para a efetivação desses direitos é necessário que existam as condições
objetivas em sociedade para a sua aplicação, dentre essas condições estão a
vontade, o empenho, o convencimento de que a realização desses direitos é
desejável.

Como homem de seu tempo, que viveu as perseguições da Segunda Guerra


Mundial e o período imediatamente posterior com a criação da ONU, Bobbio atribuiu
a esse processo histórico um caráter progressivo, de um avanço permanente no
sentido da ampliação dos Direitos Humanos. Assim, para ele, a Declaração Universal
dos Direitos Humanos, de 1948, é uma espécie de síntese histórica de um processo
que tem início na ideia de direitos naturais. Estes possuem um caráter universal, pois
valem para todos os homens, porém são abstratos, não materializados. A abstrata
ideia de direitos naturais se transforma ao longo da história em direitos positivos,
concretos, materializados em leis, mas ainda particulares e individuais.

Por fim, com a Declaração e o movimento em torno a ela, estes passam à


categoria de universais: são direitos positivos, concretos e universais. Também
apontando para o caráter progressivo dos Direitos Humanos, afirmar, porém, que o
problema dos direitos do homem atualmente não é justificá-los, mas protegê-los.
Assim, o autor reconhece a dificuldade de colocar em prática o discurso dos Direitos
Humanos construídos historicamente.
“Com efeito, o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e,
num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos,
qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou
relativos, mas sim qual é o modo mais seguro de garanti-los, para impedir que, apesar das
solenes declarações, eles sejam continuamente violados.” (BOBBIO, 1992, 25)

Resgatando o esquema de Marshall ele apresenta o desenvolvimento dos


direitos do homem em três fases, na primeira estão os direitos de liberdade que são
aqueles que buscam limitar o poder do Estado e garantir uma esfera de liberdade para
os indivíduos ou para os grupos particulares. É a liberdade em relação ao Estado.

Em uma segunda fase, ocorrida em outro momento histórico, encontram-se os


direitos políticos, em que a liberdade é mais do que um não impedimento, mas é
também uma possibilidade de participação cada vez mais ampla dos membros da
comunidade no poder. É a liberdade no Estado. Por último, numa terceira fase,
encontram-se os direitos sociais, que englobam novos valores constituídos
historicamente como o de bem estar e da igualdade, que exigem uma ação ativa do
Estado, de maneira que se trata de uma liberdade por meio do Estado. Concluindo, o
caráter progressivo, isto é a certeza de que o caminho para a efetivação dos Direitos
Humanos estava aberto pode ser resumido na seguinte afirmação:

...do ponto de vista da filosofia da história, o atual debate sobre os


direitos do homem – cada vez mais amplo, cada vez mais intenso, tão amplo
que foi posto na ordem do dia pelas mais autorizadas assembleias
internacionais, pode ser interpretado como um “sinal premonitório” (signum
prognosticum) do progresso moral da humanidade. (1992, 52).

A criação de mecanismos jurídicos cada vez mais consistentes, substantivos e


com maior legitimidade, assentados em uma democratização de amplo alcance da
vida social, e realizada a partir de uma democracia representativa sólida, é a meta do
autor. Ele se ampara na certeza de que os Direitos Humanos desejáveis, são fins que
merecem ser perseguidos, sendo que o problema a ser resolvido é o de que, apesar
de serem desejáveis, eles não são ainda reconhecidos em sua totalidade. Ao
historicizar a construção dos Direitos Humanos, reconhecer a necessidade de sua
ampliação no sentido do reconhecimento de uma igualdade econômica e social, e
indicar o caminho da luta histórica para alcançar esses objetivos, sua reflexão se
apresenta no limiar entre liberalismo e socialismo. Porém, para Perry Anderson o
caminho percorrido pelo eminente filósofo italiano não o coloca nesse limite:

➢ Entre liberalismo e socialismo, ele, na prática, opta pelo primeiro. As


vezes justifica sua preferência com a alegação de que ela {a sua opção} é, na
realidade, a mais radical. Num certo sentido, escreve, a democracia é ‘uma ideia muito
mais subversiva que o próprio socialismo’. Esta alegação hoje em dia já não se confina
em Bobbio.

Sua maneira de cumpri-la também se disseminou – redefinir o socialismo como


uma especificação setorial da democracia, ou exemplificação local de um conceito de
ordem superior. Assim ele declara sua inclinação a uma concepção de socialismo que
‘enfatiza o controle do poder econômico por uma extensão das regras do jogo
democrático à fábrica, ou à firma em geral, e não da transição de um modo de
produção para outro’ que envolveria uma ‘coletivização geral dos meios de produção’.

O significado desta mudança – que se tornou virtualmente um topo da


discussão recente – está na substituição que ele opera. A reconceituação do
socialismo como essencialmente democracia econômica responde a um duplo
propósito. Ela serve ao mesmo tempo para apropriar a legitimação central à
implementação de tal mudança social e para evitar o obstáculo ideológico central à
implementação de tal mudança; a saber, a instituição da propriedade privada. Sua
lógica é a de um logro – a palavra omitida é expropriação. (ANDERSON: 1996, 56)

Embora a teoria dos Direitos Humanos tenha se sofisticado ao ponto de gerar


uma percepção de aproximação entre socialismo e liberalismo, como na proposição
de Bobbio, a crítica marxista, bem menos popular, trata do tema dos Direitos Humanos
de uma maneira bastante distinta. A concepção de homem, a visão de mundo, o
conceito de Estado e até a própria concepção acerca do caráter histórico dos Direitos
Humanos é totalmente diferente daquelas nas quais se sustentam a teoria dos Direitos
Humanos.

Do ponto de vista filosófico o materialismo histórico e dialético não concebe o


homem de uma forma abstrata, nem portador de uma essência invariável. Também
não aceita a possibilidade de existência de uma razão universal, um senso individual
do que é justo dado a priori. Em ambos os casos essas são consideradas concepções
centradas no indivíduo como portador de uma essência ou uma razão a-histórica.

O homem é considerado na sua existência real, em uma sociedade


determinada, em dada época histórica, em uma dada classe social. A razão é a
capacidade humana de raciocinar, de apreender a realidade e de interagir com ela.
Nesta medida, a própria capacidade de raciocínio e percepção da realidade está
condicionada por fatores econômicos, culturais, morais e ideológicos. Como afirma
Trindade:

A única coisa permanente é o movimento, o homem é histórico, é o homem de


uma época, assim como a sociedade é a sociedade de uma época. A realidade está
em permanente transformação, ela não foi criada num determinado momento, seja
por contrato ou outro mecanismo, ela é a forma de existência do homem, este nasce
em sociedade, vive e se desenvolve em sociedade.

Esta é a forma própria de existência do homem desde que ele evoluiu de outras
espécies na natureza. Dentre as formas de organização da sociedade ao longo da
história, no desenvolvimento das relações que o homem estabeleceu com a natureza
para garantir o seu sustento e preservação, estão as sociedades que se dividiram em
classes sociais, cujos interesses são antagônicos, contrários. Nesta perspectiva, o
Estado não é nem neutro, nem mecanismo de conciliação de interesses de classes,
constitui-se em instrumento para administrar a luta de classes em favor da classe
economicamente dominante.

Assim, os Direitos Humanos que surgem no século XVIII (direitos civis e


políticos) são correspondentes às necessidades do modo de produção capitalista que
se organizava, e da burguesia como classe que se firmava na condução desse
processo. A igualdade entre os homens estabelecida pelas revoluções burguesas
constituía-se em uma necessidade da própria ordem capitalista que se consolidava,
como afirma Celso Kashiura Junior em sua crítica da igualdade jurídica:

“Com efeito, a igualdade jurídica não é apenas mais um dentre os


vários elementos da forma jurídica, apenas mais um dentre os vários
“princípios gerais” do direito. A igualdade das partes no contrato, a igualdade
jurídica dos indivíduos na sociedade civil, a igualdade dos homens perante a
lei, enfim, a equivalência abstrata dos homens face ao direito é indispensável
à forma jurídica e ao seu contexto, o capitalismo.” Celso Kashiura Junior
(2009, 27)
Ao desvelar o caráter de classe dos Direitos Humanos, o marxismo mostrou
que boa parte desses direitos, mesmo os civis e políticos se construíram mais como
uma resposta às lutas dos trabalhadores do que como resultado de um contrato ou
pacto. Mostra também que o capitalismo não é capaz de propiciar a emancipação
humana, nem mesmo de garantir uma igualdade entre os homens que vá para além
da igualdade formal da lei.

Como reforça Kashiura Junior “A igualdade jurídica não é simples ilusão que
encobre a desigualdade real dos homens – há, na própria ‘ilusão’ da igualdade, algo
de essencial à ‘realidade’ da desigualdade.” (2009, 29). As lutas pelo sufrágio
universal, contra as ditaduras e governos totalitários, pelo direito de expressão e
organização dos trabalhadores, contra a discriminação racial, pelos direitos das
mulheres, foram sempre lutas sangrentas protagonizadas pelas massas de
trabalhadores ao longo dos tempos, mesmo sendo estas reivindicações clássicas da
própria burguesia. E vêm, desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão
de 1789, refletindo a correlação de forças entre as classes sociais. Para Mauro Iasi:

… os direitos civis não são apenas “desejáveis”, mas são essenciais


ao desenvolvimento e à reprodução das relações capitalistas de produção
{…}; os direitos políticos, por sua vez, não são essenciais às relações
capitalistas de produção {…} mas não são antagônicos à acumulação
capitalista (como, por sua vez, comprova o exuberante desempenho da
acumulação capitalista sob o Estado de Direito vigente). Entretanto os direitos
sociais acabam por se chocar com a desigualdade fundante e necessária à
acumulação capitalista, a desigualdade entre o capitalista e o trabalhador
assalariado e, mais que isso, se localiza na distribuição da riqueza entre o
fundo de acumulação privada e a riqueza pública destinada a financiar as
políticas sociais e as estruturas garantidoras de direitos sociais. (2012, 185)

Diante do fato de que, mesmo as classes de Direitos Humanos que são uteis
ao capitalismo, somente se efetivam plenamente pelas lutas dos trabalhadores, o que
não dizer das lutas pelos direitos trabalhistas, por salário, por melhores condições de
vida, de trabalho, de saúde, assim como as lutas por educação, habitação e
saneamento, tipicamente direitos socias. Sobre os direitos sociais Trindade afirma:

➢ Malgrado desuniformes de país para país, a existência desses direitos,


particularmente dos direitos econômicos-sociais, indica o patamar a que se chegou à
correlação de forças na luta de classes em um país e em uma época. Indica que a
burguesia, nessa dada época e país, não dispõe mais de força suficiente para explorar
de qualquer modo os trabalhadores, extrair deles todo o sangue. Indica também que,
além dos trabalhadores, outros protagonistas sociais passaram a não tolerar mais a
discriminação e a opressão seculares das quais vinham sendo vítimas. (2011, 299)

A conclusão a que o autor chega é de que as lutas dos explorados e oprimidos


ao longo da história foi forçando uma alteração na concepção de Direitos Humanos
inicial, a do século XVIII.

O conjunto de normativas internacionais que reconheceram os direitos civis,


políticos e econômico-sociais no período que se seguiu à Segunda Guerra Mundial
e se expressou na Declaração de 1948, também refletiu a correlação de forças de
um momento histórico conseguindo elevar os direitos econômicos e sociais à esfera
de Direitos Humanos, mas manteve a propriedade privada como um dos Direitos
Humanos, e sem restrições de nenhum tipo. Mesmo sendo encurralada pelas
condições objetivas daquele contexto, e se vendo obrigada a reconhecer tais direitos
sociais pela luta dos trabalhadores, a burguesia vem, desde então, operando um
verdadeiro boicote à sua efetivação sempre que isso é possível.

Além de recortar também os demais direitos (civis e políticos) aonde o


desenvolvimento capitalista deles não necessite. Essa condição dos Direitos
Humanos é ainda mais palpável quando a crise capitalista impõe cortes de gastos
para viabilizar os lucros cada vez maiores do capitalismo em sua fase atual, de maior
desenvolvimento e, consequentemente, de aprofundamento da exploração,
afastando-se da concepção evolucionista dos Direitos Humanos.

Desde o final do século XX é possível observar um processo de estagnação e


mesmo de regressão dos Direitos Humanos, principalmente, mas não exclusivamente,
dos direitos sociais, num caminho que avança a passos visíveis para a barbarização
da vida social que atinge grandes contingentes da população do planeta.

Apesar da consagração da mais radical igualdade jurídico-formal em um


sistema político e da garantia jurídico constitucional dos direitos públicos subjetivos
de liberdade, a existência de forte heterogeneidade social – milhões de homens
supérfluos privados dos mais essenciais direitos de igualdade material – degenera a
democracia político-formal em plutocracia. A igualdade jurídico-formal é um direito oco
para o homem supérfluo, interessando somente ao homem proprietário para eleger
governante alguém compromissado com a defesa e preservação da propriedade
privada, com a garantia do cumprimento dos contratos e com a preservação da
segurança jurídica dos homens proprietários. Mantém-se inatingível o direito de
ilimitada acumulação de capital pelo homem proprietário. E o homem supérfluo
mantém nesta plutocracia a sua condição jurídico-material sui generis de morto civil
em vida. (Martinelli2 apud TRINDADE, 2011, 309)

O contexto mundial de crise da ordem capitalista tem provocado um combinado


de formas mínimas de direitos econômicos sociais com a redução de direitos políticos
e civis, o que coloca em pauta a necessidade de desmascarar outro aspecto desse
conjunto de “ilusões” que a igualdade jurídica promove.

2. O CAPITALISMO DEPENDENTE LATINO-AMERICANO E TENSÕES DA


FORMAÇÃO SOCIAL NO BRASIL

A colonização europeia redefiniu radicalmente os modos de produção e


reprodução dos povos originários americanos. Civilizações e territórios foram
destruídos em nome das formas antediluvianas do capital, sob a bênção do Estado e
da Igreja católica. Na Europa Ocidental Setentrional, foi um período de transição do
feudalismo para o capitalismo. Aqui, nas Américas, a transição foi outra, embora
intimamente relacionada ao que acontecia no continente europeu. Essa época ficou
conhecida como a acumulação primitiva do capital.

O comunismo primitivo foi dizimado por uma política estatal de conquista do


território e genocídio indígena que instaurou um sistema de dominação das
populações locais e dos povos africanos. O objetivo foi implementar o escravismo
como um sistema econômico de exploração do trabalho humano e dos recursos
naturais nativos para exportação de mercadorias que atendessem aos interesses dos
mercados externos. A violência como potência econômica e seus métodos brutais de
expropriação - colonização, tributação regressiva, dívida pública e protecionismo -
desembarcaram nas Américas para cumprir seus desígnios de impulsionar a
acumulação capitalista na Europa.

O ingresso da América Latina no mercado mundial deu-se sob a égide da


colonização, fundada no tripé da monocultura de exportação, do latifúndio e da força
de trabalho escravizada indígena e negra. Em meados do século XIX, com a divisão
internacional do trabalho comandada pelo Império Britânico, há uma mudança
qualitativa da inserção latino-americana nos circuitos mundiais da acumulação de
capitais, passando da colonização para o capitalismo dependente. Esse é um período
de transição de modos de produção na América Latina.

Até então, a região era fornecedora de matérias-primas e alimentos para os


países industriais centrais e a sua condição política era de colônia dos impérios
europeus. Junto aos processos nacionais de independência no início dos anos 1800,
temos a transição dos modos de produção pré-capitalistas para o capitalismo
dependente, tendo o trabalho livre como relação social de produção hegemônica, mas
combinada com diversas outras formas tidas como arcaicas. Como diz Décio Freitas
(1982, p. 131):

“Medrou em toda parte uma pluralidade de modos de produção,


nenhum dos quais em sua forma pura. As relações de produção parecem por
muito tempo entremisturadas numa tal confusão que não se pode determinar
qual a que exercia a dominância. No estado atual da investigação histórica,
manda a prudência que se fale apenas em formação social de transição.”
Décio Freitas (1982, p. 131)

‘O Brasil participou dessa transição histórica de uma forma sui generis. E aqui
é mais do que necessária a prudência indicada por Décio Freitas, tendo em vista que
existe uma enorme controvérsia (ainda em aberto) sobre o caráter do modo de
produção existente na América Latina antes da emergência do capitalismo
dependente e quando teria começado e terminado essa transição histórica. ’

Enquanto em diversos países da América Latina espanhola a independência


foi realizada sob intensos combates militares entre frações das classes dominantes e
com ativa participação popular, no nosso país a independência foi um acordo pelo alto
entre os donos do poder, excluindo-se o protagonismo popular a partir do uso intensivo
da coerção estatal. Além disso, o Brasil manteve intacta a sua estrutura econômica
de latifúndios monocultores de exportação e de exploração da força de trabalho
escrava, sendo o último país a banir a escravidão nas Américas. Isso deixou marcas
profundas na nossa formação econômico-social, não somente do ponto de vista do
racismo estrutural, mas também das desigualdades de classes e raças e da violência
estatal contra os de baixo.

O fim da escravidão não pode ser reduzido ao ato formal de assinatura da Lei
Áurea em 1888. Visto como uma concessão da monarquia, perde-se a dimensão das
lutas geopolíticas entre o Império Britânico e o Brasil independente e das rebeliões
quilombolas e populares. Na verdade, a extinção do escravismo no nosso país deve
ser estudada como um longo processo de determinações externas e internas.

“Preocupadas com a formação de mercados consumidores para seus


produtos manufaturados, as classes dominantes inglesas adotaram, sob o
véu de uma súbita solidariedade humanista ungida de uma ética protestante,
a política de combater o tráfico negreiro e a escravidão na América Latina. O
Brasil, por se tratar do maior mercado importador de escravos africanos no
mundo, é um dos alvos prioritários, com assinatura de tratados entre os dois
países e de incursões militares dos ingleses no nosso país a partir do Bill
Aberdeen” (1845).

Em 1831, criou-se, sob pressão da diplomacia inglesa, uma lei que proibiu o
tráfico negreiro. Essa lei, contudo, pertenceu ao rol das leis “para inglês ver”. Os
latifundiários brasileiros e traficantes portugueses de escravos pressionaram o Estado
brasileiro a não adotar medidas efetivas para colocar em prática a lei promulgada.
Somente em 1850, já com o Bill Aberdeen plenamente ativo, é que o Brasil começou
a combater o tráfico negreiro e promulgou-se a lei Eusébio de Queirós.

Depois disso, temos outras legislações - Ventre Livre em 1871 e Sexagenários


em 1885 - para colocar uma pá de cal na escravidão. Em termos numéricos, o longo
processo do fim da escravidão pode ser descrito da seguinte forma:

➢ em 1850, a população escrava correspondia a 31% da população total;

➢ apenas dois anos depois, em 1852, esse percentual caiu para 15%; em
1887, às vésperas da Abolição, o percentual era de somente 5% (Moura, [1959] 1988,
p. 67).

Nesse mesmo processo de extinção da escravidão, concorreu um fator


essencial que muitas vezes passa despercebido por parte substantiva da bibliografia
crítica sobre o tema: as lutas de resistências de escravos e escravas contra a
exploração e a opressão. Clóvis Moura ([1959] 1988) destaca tanto as lutas
populares e quilombolas - um fenômeno nacional de organização econômica, militar
e cultural contra o escravismo, e não somente de fuga das senzalas - quanto a
radicalização do movimento abolicionista, com a participação direta de mulheres e
homens libertos da escravidão, com uma pauta de reivindicações que incluía a
reforma agrária e o atendimento de necessidades sociais, como trabalho, educação,
moradia etc. Em resumo, a pressão dos de baixo também criou abalos estruturais na
ordem vigente; sem elas, o sistema já apodrecido poderia persistir por mais algum
tempo.

Enquanto as velhas formas de produção não morreram e as novas não


nasceram, vivenciamos o aparecimento de combinações de exploração de classes
baseadas em métodos de coerção econômica e extraeconômica. O trabalho escravo
coexistiu com o trabalho livre em diversas regiões do país e setores econômicos. A
coexistência entre modos de produção na formação econômico-social brasileira ia
muito além do campo: estava presente no artesanato e nas manufaturas nascentes
dos centros urbanos.

Escravos e operários conviveram e vivenciaram - juntos, mas de maneira


desigual - a opressão, a alienação e a exploração nos mesmos postos de trabalho e
locais de moradia. Há um amálgama entre a escravidão e o trabalho livre (que anos
depois se transformaria em assalariado) na formação do proletariado brasileiro, que
tem suas raízes sociais nos indígenas, negros e imigrantes europeus (Vinhas, 1970,
p. 128). E mais: escravos e trabalhadores livres lutaram juntos, no fazer-se da classe
trabalhadora brasileira, contra o então decadente escravismo e o nascente capitalismo
dependente. Conforme aponta Clóvis Moura (1988, p. 247):

Do ponto de vista em que nos colocamos em relação ao escravismo


tardio o exemplo é significativo, pois demonstra como já existiam escravos
trabalhando como operários e se associando a entidades de trabalhadores
livres e, em contrapartida, a iniciativa de uma dessas entidades [Imperial
Associação Tipográfica Fluminense] no sentido de modificar o status do seu
associado, concedendo-lhe o título de cidadão. Clóvis Moura (1988, p. 247):

Dessa configuração compósita de modos de produção e de formas de


organização das classes subalternas, resulta que, apesar das diferenças existentes
entre escravos e trabalhadores livres, a luta de classes no Brasil é intimamente
imbricada com a questão racial. Essa particularidade histórica não pode ser
negligenciada, sob pena de reproduzirmos uma perspectiva eurocêntrica sobre a
“questão social”. Florestan Fernandes ([1988] 2017, p. 85) explicita a essência
teórica e as consequências políticas da particularidade histórica da “questão social”
no Brasil ao escrever:

“Se a classe tem de ser forçosamente o componente hegemônico,


nem por isso a raça atua como um dinamismo coletivo secundário. A lógica
política que resulta de tal solo histórico é complexa. […] Classe e raça se
fortalecem reciprocamente e combinam forças centrífugas à ordem existente,
que só podem se recompor em uma unidade mais complexa, uma sociedade
nova, por exemplo. Aí está o busílis da questão no plano político
revolucionário.” Florestan Fernandes ([1988] 2017, p. 85).

Apesar de a transição histórica entre modos de produção na América Latina no


século XIX possuir traços gerais, é importante ressaltar as particularidades de cada
formação econômico-social, seja em uma análise em nível nacional e/ou regional.
Desta forma, ressaltamos as especificidades do estado do Rio de Janeiro frente ao
desenvolvimento desigual e combinado do modo de produção capitalista num país
dependente como o Brasil. Os processos ocorridos no Rio ajudam a entender tais
especificidades, pois foi no estado fluminense, junto com outras regiões e cidades
(Porto Alegre, Recife, Salvador e São Paulo), que se gestaram os embriões do modo
de produção capitalista e da classe trabalhadora no Brasil.

2.1 As Políticas Sociais como Instrumentos de Promoção da Igualdade

http://www.usp.br/aun/antigo/exibir.php?id=6237

Desde as primeiras ações promovidas por Otto Von Bismark na Alemanha no


final do século XIX, os Estados capitalistas centrais vêm adotando medidas de
intervenção no sentido de garantir a sobrevivência de parcela dos trabalhadores. Na
década de 1930 incipientes sistemas de previdência social, serviços de assistência
social públicos, assim como de saúde e educação, já existiam em boa parte desses
países com o objetivo de, juntamente com a legislação trabalhista, regular a vida dos
grandes contingentes de trabalhadores que viviam aglutinados nas cidades, nos
grandes centros industriais. É, porém, apenas após o final da Segunda Guerra
Mundial, com o pacto social que se estruturou a partir das proposições de intervenção
do Estado na economia formuladas por John M. Keynes, e a ascensão da
socialdemocracia ao poder, que se organiza uma forma de governo baseado na
ampliação das políticas sociais enquanto direitos dos trabalhadores. O Estado de Bem
Estar Social (Welfare State) constituiu-se assim em um sistema de governo baseado
nos seguintes princípios:

1) Responsabilidade estatal na manutenção das condições de vida


dos cidadãos, por meio de um conjunto de ações de três direções:regulação
da economia de mercado a fim de manter elevado nível de emprego;
prestação pública de serviços sociais universais, como educação, segurança
social, assistência médica e habitação; e um conjunto de serviços sociais
pessoais; 2) universalidade dos serviços sociais e; 3) implantação de uma
“rede de segurança” de serviços de assistência social.” (BEHRING E
BOSCHETTI: 2006; 94)

Alçando as políticas sociais à condição de instrumentos estratégicos da ação


governamental, o Estado de Bem Estar Social, também denominado Estado
Providência, buscou articulá-las em sistemas de Seguridade Social apontando para a
concepção de proteção social. A lógica da Seguridade Social tem como pressuposto
o reconhecimento e a incorporação dos direitos sociais como parte dos Direitos
Humanos. Assim, Maria Lucia Werneck Vianna resgata uma frase de T.H. Marshall
para apresentar um conceito para esse termo:

“...o uso da expressão Seguridade Social aponta para uma


concepção de proteção social. Baseada no suposto de que a cidadania
implica, além dos direitos civis e políticos, o “elemento social que se
refere a tudo o que vai desde o direito a um mínimo de bem-estar
econômico e segurança, ao direito de participar, por completo, na
herança social e levar a vida de um ser civilizado de acordo com
padrões que prevalecem na sociedade”. (VIANNA, 1994, 14)

A autora acrescenta que a ideia de Seguridade Social está em direta oposição


à de Seguro Social que predominou durante as primeiras décadas do século XX e que
estava ligada a serviços sociais cuja prestação exige uma contribuição na forma de
contrapartida por parte do trabalhador (como na Previdência Social brasileira). Na
perspectiva da Seguridade Social os serviços sociais estão direcionados à luta contra
a pobreza e são de caráter universal, isto é, concebidos como direitos de todos os
cidadãos, indiscriminadamente, voltados à ampliação da igualdade entre os homens.

O seu financiamento é garantido por impostos gerais e não apenas pela


contribuição direta de cada trabalhador para determinado serviço. A responsabilidade
pela gestão desses serviços é do Estado, portanto são serviços públicos, orientados
por políticas estabelecidas pelo Estado. Foram, assim, erigidas estruturas de
prestação de serviços de saúde e educação públicos e universais, sistemas robustos
de previdência associados à garantia de renda mínima e programas assistenciais
voltados às necessidades específicas de parcelas da população, baseadas na ideia
de proteção social, isto é, na busca da garantia de que nenhum cidadão se visse sem
meios para sua subsistência, e que está se desse em níveis socialmente aceitáveis,
baseadas na ideia de dignidade da pessoa humana.

Certamente as políticas sociais aglutinadas ou não em sistemas de Seguridade


Social são instrumentos poderosos no sentido de atribuir aos Estados capitalistas um
caráter de neutralidade, melhor ainda, uma ilusão acerca da capacidade desses
Estados serem instrumentos de promoção da igualdade entre os homens na sua forma
mais acabada, aquela que leva em consideração não apenas as liberdades
individuais, mas também que garante condições materiais igualitárias para o exercício
dessas liberdades.

Alguns autores consideram que seu surgimento das políticas sociais remonta
às primeiras leis que regulavam o transito de trabalhadores e definiam os preços da
mão de obra decretadas na Inglaterra e na França no século XIV, passando pela Lei
dos Pobres Inglesa, de 1601, que diferenciava os pobres válidos (capazes para o
trabalho) dos inválidos, até a radical e violenta reforma das Leis dos Pobres, de 1834,
que limitada a ajuda aos pobres a ser menor que o menor salário pago e determinava
a internação nas workhouses, com trabalhos forçados a todos que solicitassem
assistência e fossem capazes de trabalhar.

Essas leis, como instrumentos de intervenção do Estado para conter ou regular


a vida dos trabalhadores, seriam as formas iniciais de política social, e foram evoluindo
com a organização dos trabalhadores que, pressionando o Estado, possibilitaram o
surgimento de instrumentos mais adequados para o favorecimento de seus
interesses, ou melhor, políticas sociais cujos objetivos estivessem em sintonia com os
interesses dos trabalhadores. Nesta perspectiva Pereira afirma ter a política social um
caráter contraditório:

...apreende essa política como produto da relação dialeticamente


contraditória entre estrutura e história e, portanto, de relações –
simultaneamente antagônicas e recíprocas – entre capital x trabalho, estado
x sociedade e princípios da liberdade e da igualdade que regem os direitos
de cidadania. Sendo assim, a política social se apresenta como um conceito
complexo que não condiz com a ideia pragmática de mera provisão ou
alocação de decisões tomadas pelo Estado e aplicadas verticalmente na
sociedade (como entendem as teorias funcionalistas). Por isso, tal política
jamais poderá ser compreendida como um processo linear, de conotação
exclusivamente positiva ou negativa, ou a serviço exclusivo desta ou daquela
classe. Na realidade, ela tem se mostrado simultaneamente positiva e
negativa e beneficiado interesses contraditórios de acordo com a correlação

De forças prevalecentes. É isso que torna a política social


dialeticamente contraditória. E é essa contradição que permite à classe
trabalhadora e aos pobres em geral também utilizá-la a seu favor. (2008, 166)
destaques da autora

A percepção de que o Estado não se constitui apenas em um comitê executivo


da burguesia, mas guarda a possibilidade de, sob pressão, responder aos interesses
dos trabalhadores está subjacente à compreensão das políticas sociais como
processos contraditórios, reforçando a ilusão de que o Estado capitalista é capaz de
promover a igualdade através das políticas sociais.

A crítica a esta posição passa pela necessidade de desvelar o caráter das


políticas sociais como instrumentos de garantia da reprodução da força de trabalho
no capitalismo, em sua fase mais avançada: a era dos monopólios. José Paulo Netto
ao analisar as funções das políticas sociais chama a atenção para o seu surgimento,
no final do século XIX, como parte da solução monopolista que tem como objetivo a
maximização dos lucros através do controle dos mercados (2005, 24), o que exige a
refuncionalização do Estado. Esta passa a assumir novas funções no auxílio aos
grandes monopólios.

Dentre essas funções encontra-se a manutenção e reprodução da força de


trabalho sistematicamente ameaçada pelas profundas e, cada vez mais frequentes,
crises capitalistas geradas pela alta concentração de capitais da era monopolista.
Afirma o autor:

“...quer pelas contradições de fundo do ordenamento capitalista da


economia, quer pelas contradições intermonopolistas e entre os monopólios
e o conjunto da sociedade, o Estado – como instância da política econômica
do monopólio – é obrigado não só a assegurar continuamente a reprodução
e a manutenção da força de trabalho, ocupada e excedente, mas é compelido
(e o faz mediante os sistemas de previdência e segurança social,
principalmente) a regular a sua pertinência a níveis determinados de
consumo e a sua disponibilidade para a ocupação sazonal, bem como a
instrumentalizar mecanismos gerais que garantam a sua mobilização e
alocação em função das necessidades e projetos do monopólio “(NETTO:
2005, 27).

A compreensão de que as políticas sociais, e os serviços sociais delas


derivados, são mecanismos economicamente necessários à ordem capitalista, quer
seja como instrumentos de regulação da força de trabalho, quer seja como
mecanismos de estímulo ao consumo, não desconsidera a força que possuem como
mecanismos de natureza política.

A articulação entre funções políticas e econômicas do Estado na fase do


capitalismo avançado é conhecida através das várias tentativas de uso das políticas
sociais como instrumentos de obtenção de consenso social. Nesse sentido o autor
apresenta um paralelo entre a entrada do capitalismo em sua fase de monopólios e o
avanço das lutas dos trabalhadores discutindo o papel da incorporação pelo Estado
das demandas postas pelos trabalhadores:

“... a transição ao capitalismo dos monopólios realizou-se


paralelamente a um salto organizativo nas lutas do proletariado e do conjunto
dos trabalhadores – é, inclusive, em quase todas as latitudes, simétrico ao
aparecimento de partidos operários de massas; o coroamento da conquista
da cidadania sobre a qual doutrinou linearmente Marshall (1967),
acompanha, nos seus lances decisivos, o surgimento da idade do monopólio:
as demandas econômico-sociais e políticas imediatas postos por todo este
processo reivindicativo e organizativo macroscópico não vulnerabilizam a
modelagem da ordem econômica do monopólio, ainda que a tenham
condicionado em medida considerável. Antes, ao absorvê-las, o poder político
que o expressa adquiriu cariz de coesionador da sociedade que, não
casualmente, desempenhou funções diversionistas e ilusionistas sobre
inúmeros protagonistas políticos desvinculados dos interesses
monopolistas.” (NETTO: 2005, 27) destaques do autor.

Mesmo que muitas vezes a conformação das políticas sociais atinjam


patamares de ampliação de direitos como ocorreu nos países centrais após a
Segunda Guerra Mundial, com o Estado de Bem Estar Social, conquistas da classe
trabalhadora no sentido de ampliação de direitos sociais são, em geral, capturadas e
transformadas pelas políticas sociais do Estado burguês em mecanismos de
segregação e controle das massas.

Behing e Boschetti alertam para a inexistência de relação direta entre política


social e direitos sociais: ... não há uma necessária identidade prática entre política
social e direito social, ou seja, um altíssimo grau de seletividade no âmbito da
elegibilidade institucional, por exemplo, pode ser contraditório com a perspectiva
universal do direito social; {...} o conceito de direito social de cidadania pode conter ou
não um elemento de crítica e de proposição da política social na perspectiva da sua
ampliação. Há que qualificar, portanto, a relação entre cidadania e direito social nas
pautas de luta dos movimentos sociais. (2006, 102).
Segundo Trindade, o espaço da política social não é um espaço de contradição
em que é possível contemplar interesses contraditórios, interesses da classe
trabalhadora. Trata-se de um espaço de luta, uma luta cujo objetivo é sem dúvida o
da melhoria das condições materiais de vida dos trabalhadores sem, no entanto,
ignorar que no capitalismo os direitos econômicos e sociais somente podem se
desenvolver até um determinado patamar, aquele que não colida com os direitos de
propriedade (TRINDADE, 2011), cerne da própria concepção de Direitos Humanos.

3. DITADURA, MODERNIZAÇÃO CONSERVADORA E EXPANSÃO DA


POLÍTICA SOCIAL

https://www.algosobre.com.br/images/stories/historia/golpe-de-1964-fora-ditadura.jpg

O termo modernização conservador foi cunhado primeiramente por Moore


Junior (1975) para analisar as revoluções burguesas que aconteceram na Alemanha
e no Japão na passagem das economias pré-industriais para as economias
capitalistas e industriais. Neste sentido, o eixo central do processo desencadeado pela
modernização conservadora é entender como o pacto político tecido entre as elites
dominantes condicionou o desenvolvimento capitalista nestes países, conduzindo-os
para regimes políticos autocráticos e totalitários. Assim, as revoluções burguesas na
Alemanha e no Japão não seguiram a versão clássica, como no caso da Inglaterra,
da França e dos Estados Unidos, pois foram revoluções burguesas parciais, visto que
não destruíram efetivamente as estruturas sociais, políticas e econômicas do antigo
regime.

Portanto, o pacto político orquestrado no interior do Estado nacional alemão e


japonês aprofundou os laços políticos entre os terratenentes e a burguesia, excluindo
os proletariados e os camponeses do direito pleno à democracia e à cidadania. Neste
sentido, Bendix (1996, p. 37) afirmou que as

“[...] sociedades ocidentais progrediram firmemente para uma condição na qual


os direitos de cidadania são universais. Onde os direitos ainda são negados, o conflito
é evidente e muitas vezes violento.”

Para Bendix (1996), os principais direitos à cidadania são:

• direitos civis,
• como liberdade pessoal,
• de palavra,
• de associação,
• de reunião,
• de pensamento,
• de fé,
• de propriedade,
• de acesso à justiça,
• de realizar contratos etc., como também direitos políticos, como de votar
e ser votado, direito ao voto secreto e direito ao acesso a cargo público. Por fim, os
direitos sociais, que vão ao direito de bem-estar econômico, como, por exemplo,
educação, direito a segurança, direito de participar na herança social e de viver a vida
de um ser civilizado de acordo com os padrões da sociedade civilizada.

Por sua vez, Moore Junior (1975, p. 13) salientou que existiram “[...] três
caminhos históricos principais, desde o mundo pré-industrial ao contemporâneo.”

O primeiro caminho levou à construção de sociedades capitalistas e


democráticas na Inglaterra, França e Estados Unidos. Já “O segundo caminho
também era capitalista, mas na ausência de um forte surto revolucionário, passou
através de formas políticas reacionárias até culminar com o fascismo.” (MOORE
JUNIOR, 1975, p. 14). E, por fim, o terceiro caminho foi o comunismo, que se
desenvolveu na Rússia e na China. No caso das sociedades capitalistas e
democráticas houve o desenvolvimento de um “[...] grupo na sociedade com uma base
econômica independente, o qual ataca os obstáculos a uma versão democrática do
capitalismo herdado do passado.” (MOORE JUNIOR, 1975, p. 14).

Neste sentido, as revoluções burguesas que aconteceram nestes países se


manifestaram como alterações violentas que determinaram uma ruptura com a
estrutura política e econômica do antigo regime, retirando, assim, os proprietários
rurais do centro do poder político, dado que esses eram os principais responsáveis
pelas decisões políticas no período da sociedade pré-industrial. No caso dos países
que se lançaram no segundo caminho de construção de uma sociedade capitalista,
como foi o caso da Alemanha e do Japão, o estímulo revolucionário não foi o mesmo
da revolução burguesa Inglesa, Francesa e Americana, visto que “[...] o impulso
burguês era muito mais fraco. Se chegou a tomar forma revolucionária, a revolução
foi derrotada.” (MOORE JUNIOR, 1975, p. 14).

Entretanto, estas revoluções foram a “[...] alternativa mais importante da


modernização conservadora, através de uma revolução vinda de cima.” (MOORE
JUNIOR, 1975, p. 503), dado que as elites pré-industriais não foram varridas
plenamente do centro de decisão política do Estado nacional. O que aconteceu na
Alemanha e no Japão foi uma nova rearticulação dos terratenentes com a burguesia
para instituir um novo contrato político e econômico, em que

[...] algumas secções de uma classe comercial e industrial


relativamente fraca apoiaram-se em elementos dissidentes das classes
antigas e dominantes, principalmente recrutados do campo, para levarem a
cabo as alterações políticas e econômicas necessárias para a sociedade
industrial moderna [...]. (MOORE JUNIOR, 1975, p. 14).

Poulantzas (1986), ao analisar o caso da Alemanha durante sua passagem de


uma economia feudal para uma economia industrial, corroborou essas ideias
desenvolvidas por Moore Junior (1975) sobre as revoluções vindas de cima.
(POULANTZAS, 1986). Para Poulantzas (1986, p. 176), o caso alemão foi [...] uma
importante viragem no processo de transformação das relações de produção, e não
mudaram em nada a superestrutura do Estado e os detentores do poder político. A
nobreza fundiária continua ainda a deter o poder político e o Estado prussiano [...] É
de fato esse Estado, sob Bismarck, que levará a burguesia a alcançar a dominação
política, o que Marx e Engels caracterizaram precisamente como a revolução ‘a partir
de cima’.

Logo, os proprietários da terra não perderam sua fonte de poder e continuaram


conduzindo de forma compartilhada com a burguesia nascente os destinos do Estado
Nacional graças à “ausência de capacidade política, pela sua constituição de classe,
da burguesia conduzir o bom termo, numa ação aberta, a sua própria revolução.”
(POLANTZAS, 1986, p. 178).

Por tudo isto, as revoluções vindas de cima determinaram padrões de


desenvolvimento capitalista diferenciados, posto que o processo de modernização da
Alemanha e do Japão não teve forças suficientes para destruir os elementos
tradicionais provenientes da antiga sociedade pré-industrial. Neste sentido, Bendix
(1996) afirma que, conforme Joseph Schumpeter, todo desenvolvimento é parcial,
uma vez que:

“As estruturas sociais, os tipos e as atitudes são moedas que


não fundem prontamente. Uma vez formados, eles persistem,
possivelmente durante séculos, e uma vez que estruturas e tipos
diferentes oferecem diferentes graus de habilidade para sobreviver,
nós quase sempre achamos que o grupo atual e o comportamento
nacional mais ou menos se desviam daquilo que devemos esperar que
sejam se tentamos inferi-los das formas dominantes do processo
produtivo.”(BENDIX, 1996, p. 43).

Entretanto, Bendix (1996, p. 39) define o desenvolvimento social e político ou a


modernização como “[...] mudanças sociais e políticas que acompanharam a
industrialização em muitos países da civilização ocidental.” Desta feita, o eixo dessa
modernização é a industrialização, definida como “[...] as mudanças econômicas
produzidas por uma tecnologia baseada em fontes de autoridade inanimadas, bem
como o desenvolvimento contínuo da pesquisa científica aplicada.” (BENDIX, 1996, p.
39).

“Assim, o desenvolvimento decorre de mudanças que acontecem na


esfera econômica, política e social, nas quais os grupos dirigentes tiveram
um papel predominante: Uma vez que a iniciativa política é importante nos
países que são ‘retardatários industriais’, é apropriado dar especial
atenção aos grupos sociais que eram politicamente proeminentes na
estrutura social tradicional. Quer esses grupos tenham ou não tido um papel
condutor na modernização do país, é claro que sua influência social é
penetrante. Se quiserem compreender tipos de ‘desenvolvimento parcial’,
deve se dar atenção especial à ‘linha base’ de tradição em relação à qual
essas mudanças devem ser aferidas. Para isto, um conhecimento dos grupos
dirigentes tradicionais é indispensável [...]. “(BENDIX, 1996, p. 215).

Nesta perspectiva de desenvolvimento parcial, as mudanças sociais


determinadas pela industrialização foram condicionadas pela forma em que foram
tecidas as relações políticas no seio do Estado nacional, visto que os interesses entre
o moderno e o tradicional permaneceram arraigados, com maior ou menor
intensidade, no centro de decisão política do Estado.

Por sua vez, Moore Junior (1975, p. 495) destacou alguns indicadores para
compreender a estrutura social, econômica e política daquelas sociedades que
seguiram o caminho do capitalismo democrático.

1. Desenvolvimento de um equilíbrio para evitar uma coroa demasiado forte


e uma aristocracia proprietária demasiado independente;
2. O movimento no sentido de uma forma adequada de agricultura
comercial;
3. O enfraquecimento da aristocracia proprietária;
4. O impedimento da coligação aristocrático-burguesa contra os
camponeses e os operários;
5. Uma ruptura revolucionária com o passado.

Dentre esses cinco determinantes para a construção de uma sociedade


democrática e capitalista, observa se que, em termos de classes sociais, os
terratenentes deveriam apresentar reduzida força na passagem da sociedade pré-
industrial para a sociedade industrial e moderna, haja vista que, quanto maior seu
poder político e econômico, menor era a força da burguesia para construir uma
sociedade democrática e capitalista.

Portanto, a Modernização Conservadora, e as Revoluções Vindas de Cima,


tiveram como característica o fato de a burguesia nascida da revolução capitalista não
ter forças suficientes para romper com a classe dos proprietários rurais, resultando
em um pacto político entre a classe dos terratenentes e a burguesia. Tal pacto se deu
com o objetivo de manter um projeto conjunto de construção de uma sociedade
capitalista, contudo arraigada em uma estrutura de dominação, em cujo centro de
decisão política do Estado, os interesses da classe dos proprietários rurais se
mantivessem enraizados. Em linhas gerais, Moore Junior (1975); em seus trabalhos
uma característica comum para a interpretação das revoluções vindas de cima.

Para esses autores, as revoluções burguesas que aconteceram no Japão e na


Alemanha varreram da estrutura do poder político as classes dos camponeses e dos
trabalhadores para institucionalizarem o pacto político entre os terratenentes e a
burguesia industrial. O processo de modernização conservadora conduziu, então,
estes países para a formação de uma sociedade industrial moderna, mas com uma
estrutura política conservadora, fato que as conduziu ao nazifascismo.

Em relação à força dos proprietários rurais, esta manteve forte, criando, assim,
um processo de modernização impulsionando o avanço destas economias no
capitalismo industrial, entretanto aferradas em uma sociedade política marcada
profundamente pelos interesses dos grandes proprietários rurais, os quais criaram
obstáculos ao acesso democrático das demais classes sociais ao mercado de terras.

No caso específico da transformação capitalista da agropecuária, os trabalhos


de Lênin (1982) apontaram como o pacto político tecido no interior do Estado nacional
na passagem de uma economia pré-industrial para uma economia industrial
determinou, predominantemente, duas vias de desenvolvimento capitalista na
agricultura condicionadas pela configuração da estrutura fundiária desses países.

Neste sentido, Lênin (2002) destacou, ao analisar o Programa Agrário da Social


Democracia da Primeira Revolução Russa de 1905 – 1907, que o desenvolvimento
do capitalismo na Rússia poderia seguir duas vias que “[...] chamaríamos de caminho
tipicamente prussiano e caminho do tipo norte-americano.” (LÊNIN, 2002, p. 29). No
caso do desenvolvimento capitalista na agricultura, o autor destaca que, na primeira
via, a “[...] exploração feudal do latifúndio transformasse lentamente numa exploração
burguesa-junker [...]. No segundo caso, ou não existem domínios latifundiários ou são
liquidados pela revolução, que confisca e fragmenta as propriedades feudais.” (LÊNIN,
2002, p. 29).

Em seu estudo sobre o desenvolvimento capitalista na Rússia, Lênin (1982)


deixou mais claro estas vias de desenvolvimento capitalista da agricultura quando
mostrou que, na via prussiana, “[...] conservam-se a massa principal da grande
propriedade fundiária e os pilares da antiga ‘superestrutura’, nessa hipótese, o papel
dirigente caberá à burguesia e ao latifundiário liberal-monárquicos [...].” (LÊNIN, 1982,
p. 10).

Já no caso do caminho norte-americano,

[...] a grande propriedade fundiária e todos os pilares da antiga


‘superestrutura’ que lhe correspondem são destruídos; o papel dirigente é
desempenhado pelo proletariado e pela massa camponesa [...] assegurando
o desenvolvimento mais rápido e livre das forças produtivas sobre uma base
capitalista [...]. (GUIMARÃES, 1977, p. 11).

Contudo, Rangel (2000) destaca que a via prussiana foi marcada pela
transformação capitalista da grande propriedade rural sem que haja uma
fragmentação da estrutura fundiária. Deste modo, o camponês que não conseguiu
adotar um padrão tipicamente capitalista com o uso de tecnologias e de técnicas
modernas, foi desapropriado e lançado, pela concorrência intercapital, para fora de
sua unidade de exploração agrícola, não mais como proprietário dos meios de
produção, mas como proprietário da força de trabalho, constituindo, assim, relações
de trabalho tipicamente capitalistas.

Já no caso da via norte-americana, a transformação capitalista determinou


uma fragmentação da estrutura fundiária, em que as propriedades rurais nascidas
deste padrão tipicamente capitalista estavam arraigadas em pequenas unidades de
exploração agrícola que mantiveram relações de trabalho predominantemente
familiares. Neste sentido, o avanço do capitalismo no campo aconteceu sobre uma
agricultura capitalista familiar.

Por sua vez, entender como o termo modernização conservador foi adotado
pelos pensadores econômicos e sociais nacionais. Não obstante, é importante
destacar que este termo foi cunhado para refletir as bases objetivas históricas, sociais
e estruturais específicas das economias da Alemanha e do Japão que, desde a II
Guerra Mundial, são considerados países desenvolvidos. Desta maneira, há de se
fazerem as mediações históricas e teóricas necessárias para compreender as
especificidades dos países subdesenvolvidos como é o caso do Brasil, uma vez que
a formação econômica e social nacional é diferente daquela encontrada nos países
da Europa Ocidental, Japão e Alemanha. Isto se deu porque o progresso técnico
penetrou a estrutura econômica brasileira de forma diferenciada, constituindo, assim,
uma sociedade crivada pela existência, no mesmo espaço e tempo, de uma economia
moderna e uma economia arcaica.

Deste modo, Furtado (1965, p. 184) destacou que “[...] o subdesenvolvimento


não constitui uma etapa necessária do processo de formação das economias
capitalistas modernas. É em si, um processo particular, resultante da penetração de
empresas capitalistas modernas em estruturas arcaicas.” Destarte, as estruturas
econômicas e sociais dos países desenvolvidos apresentam menor grau de
heterogeneidade, quando comparadas às dos países subdesenvolvidos, dado que as
elites dominantes dos países centrais construíram um projeto de nação que
incorporou ao sistema econômico capitalista os estratos inferiores da estrutura social.
No caso do Brasil, a elite dominante criou empecilhos ao acesso à cidadania e à
democracia, visto que as classes inferiores foram e continuam sendo alijadas das
vantagens proporcionadas pela modernização.

Portanto, a argumentação de Alberto Passos Guimarães é construída levando-


se em consideração apenas o elemento econômico do processo de modernização
conservadora, uma vez que o autor caracteriza o processo como a penetração do
progresso técnico na unidade de exploração agrícola sem que houvesse qualquer
fragmentação na estrutura fundiária nacional.

Para, Guimarães (1977), ao transpor para a realidade nacional o termo


cunhado por Barrington Moore Junior, não teve o cuidado de realizar as devidas
mediações históricas e teóricas necessárias à compreensão das especificidades do
caso brasileiro, diferente daquele encontrado no modelo de desenvolvimento
capitalista da Alemanha e do Japão. Assim, seu foco central de análise reduziu-se à
vertente econômica, dado que analisou somente como o progresso técnico penetrou
nas grandes unidades de exploração agrícola.

Por tudo isto, Graziano da Silva (2000 apud RANGEL, 2000); não refletiu sobre
o pacto político conservador urdido entre a burguesia nacional e os terratenentes no
interior do Estado que determinou o rumo e o ritmo do desenvolvimento capitalista da
sociedade nacional. Neste sentido, este teórico não conseguiu perceber que o pacto
tecido pela elite dominante criou fortes obstáculos para o acesso democrático das
demais classes sociais aos mercados de terras, de capital, de trabalho, democracia e
à cidadania.
3.1 Direitos e Particularidades da Cidadania no Brasil

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Por que os brasileiros vivem descontentes com a política? Por que


nossa democracia tem tanta dificuldade para se estabelecer na prática? Por que,
apesar de avanços recentes, parecemos tão longe de resolver nossos principais
problemas como sociedade? Responder essas perguntas não é tarefa simples e
requer análises por vários ângulos diferentes. O historiador e cientista político José
Murilo de Carvalho, no já clássico livro “Cidadania no Brasil: o longo caminho” faz uma
tentativa ao estudar o desenvolvimento da cidadania e dos direitos em nosso país.

José Murilo de Carvalho adota em sua obra a teoria criada pelo sociólogo
britânico Thomas Humphrey Marshall. Segundo este, a cidadania é uma condição na
qual o indivíduo tem a posse de três tipos de direitos.

Direitos civis. São aqueles que garantem a vida, a segurança, a propriedade, a


possibilidade de ir e vir, a igualdade perante à lei, o acesso à justiça, a escolha do
trabalho, a inviolabilidade do lar. Eles estão relacionados à liberdade individual.

Direitos políticos. Se referem ao direito de participar da política e da


administração pública. Sua forma mais óbvia é o voto, mas eles incluem também a
organização de partidos políticos, a existência de instituições representativas e
legítimas, entre outros.
Direitos sociais. Garantem ao cidadão usufruir de educação, saúde,
aposentadoria, salário justo e serviços públicos de qualidade em geral. Eles são
baseados na ideia de justiça social e de participação de todas as pessoas nas riquezas
produzidas pela sociedade.

Segundo Marshall, existe uma ordem lógica na conquista desses três tipos de
direitos. Os civis são os mais básicos, que possibilitam mais à frente a conquista dos
políticos e, por meio da participação política, os sociais. Essa sequência aconteceu
na Inglaterra, de forma gradual, com a implantação dos direitos civis no século XVIII,
dos políticos no século XIX e dos sociais no XX. No Brasil, a história foi bem mais
complicada.

3.1.1 Idas e Voltas, Avanços e Retrocessos

https://gulbenkian.pt/cidadaos-ativos/2019/08/28/a-importancia-de-ensinar-cidadania-para-a-vida-em-
comunidade/

José Murilo de Carvalho investiga a história brasileira para entender como os


direitos foram implantados por aqui. Relembrar brevemente os principais
acontecimentos para entender seu argumento.

Da Independência à Primeira República

O primeiro período analisado vai de 1822, na Independência, até o fim


da Primeira República, em 1930. Nele, a cidadania foi muito incipiente. Os maiores
obstáculos eram a escravidão e o domínio dos grandes proprietários rurais. A
escravidão colocava como subumanos grande parte da população e os donos de
terras tinham poder maior do que a lei e o Estado em seus domínios. Portanto, a
cidadania era totalmente suprimida.

Existiam eleições para cargos legislativos durante o período imperial, mas o


direito ao voto começou limitado à elite. Ao longo das décadas e durante a República,
ele foi estendido a mais pessoas, mas passava longe das mulheres e escravizados.

Movimentos políticos eram quase sempre compostos por revoltas pontuais


contra alguma medida do governo, e não por reivindicações de direitos.

O período Vargas

O golpe que levou Getúlio Vargas ao poder em 1930 mudou bastante esse
cenário. Os direitos civis e políticos tiveram alguns avanços entre 1934 e 1937,
principalmente com a expansão do voto às mulheres no começo da década. Depois
disso, a ditadura do Estado Novo imprimiu muitos retrocessos, com repressão política
e restrições de liberdades.

Por outro lado, os direitos sociais tiveram grande destaque. O governo passou
a focar nos benefícios aos trabalhadores urbanos, concedendo a eles a possibilidade
de se organizar em sindicatos, reivindicar melhores condições, usufruir de
aposentadorias e pensões. O Ministério do Trabalho foi criado em 1930 e a Justiça do
Trabalho, em 1939.

Contudo, o Estado tinha grande influência nas relações trabalhistas e


os sindicatos só poderiam existir com a sua permissão. Dessa forma, o gozo dos
direitos sociais tinha um forte traço paternalista e autoritário. Não à toa, na
propaganda oficial, Getúlio era retratado como “o pai dos pobres”.

Primeiros passos da democracia

Com a derrubada de Vargas, o Brasil viveu um período democrático,


com avanços importantes nos direitos políticos. A cada eleição, o voto era concedido
a mais e mais pessoas. Em 1962, havia 14,7 milhões de eleitores no país.

Os partidos políticos começaram a se consolidar e ganhar a preferência da


população, especialmente o PTB, o PSD e a UDN. A efervescência política ofuscou o
desenvolvimento dos direitos sociais e ajudou a criar o ambiente de polarização e
antagonismo que culminou do golpe militar de 1964.

Regime Militar

Na nova ditadura, houve eleições regulares para diversos cargos e novos


eleitores foram incorporados a elas. Entretanto, a participação política acontecia de
forma muito limitada, uma vez que não era possível eleger o presidente, políticos
oposicionistas foram cassados e o sistema de dois partidos (ARENA e MDB)
tornava praticamente impossível diminuir o poder dos militares.

O maior retrocesso do período aconteceu nos direitos civis, com o Ato


Institucional Nº 5, o famoso AI-5, durante o governo de Costa e Silva. O decreto fechou
o Congresso, instituiu a censura prévia à imprensa, suspendeu o habeas corpus,
possibilitou a perseguição e cassação de opositores, entre outras medidas
repressivas.

Nova República

Por fim, o último período analisado por José Murilo de Carvalho começa em
1985 e termina em 2013, data da última atualização do livro.

A Constituição de 1988, chamada de Constituição Cidadã, consolidou


conquistas anteriores e oficializou os direitos civis, com a promessa de dar um fim aos
abusos do Estados e às ameaças às liberdades individuais.

Houve avanços nos direitos sociais, principalmente com a estabilização da


economia e os programas sociais que ela possibilitou. O acesso à educação cresceu
e o analfabetismo minguou. Por meio do SUS, o Estado passou a prover, pelo menos
em teoria, saúde universal.

Em relação à participação política, as eleições diretas e regulares voltaram a


fazer parte da vida dos brasileiros. O multipartidarismo voltou com tudo e houve uma
multiplicação no número de legendas. Porém, os protestos de junho de 2013
mostraram que os inegáveis passos para a frente não resolveram problemas
estruturais. A desigualdade, a pobreza e a corrupção seguem como parte integrante
do país. A sensação de distanciamento entre sociedade civil e classe política ainda é
onipresente.
Já os direitos civis ainda têm aplicação desigual e limitada. O acesso à justiça
é precário para a maior parte da população. O número de homicídios disparou e fez
da segurança pública uma das maiores preocupações nacionais. A violência policial
faz vítimas nas periferias, principalmente a população negra. Segundo pesquisas
citadas no livro, boa parte das pessoas desconhece a maioria dos seus direitos e os
limites do Estado.

Uma história diferente

Marshall afirmou que o desenvolvimento lógico da cidadania acontece na


sequência vista na história inglesa: primeiro vêm os direitos civis, depois os políticos
e, em seguida, os sociais.

No Brasil, aconteceu o contrário. O primeiro tipo de direitos a ser praticado


verdadeiramente foram os sociais, principalmente na Era Vargas. Enquanto isso, os
civis e os políticos eram atacados.

Não existe apenas um caminho certo na implantação da cidadania, como o


próprio Marshall reconhece, mas o modo como isso acontece dá origem a diferentes
tipos de cultura cidadã. Em nosso país, essa mistura de um Estado provedor e
autoritário criou uma relação paternalista, em que direitos não são universais, mas
dados como favores.

“O Estado é sempre visto como todo-poderoso, na pior hipótese como


repressor e cobrador de impostos; na melhor, como um distribuidor paternalista de
empregos e favores. […] Essa cultura orientada mais para o Estado do que para a
representação é o que chamamos de ‘estadania’, em contraste com a cidadania.”

Como a provisão vem do poder Executivo, este também passou a ter mais
destaque e visibilidade que o Legislativo e o Judiciário. A figura do presidente é
extremamente poderosa no imaginário popular, o que aumenta a busca por um
salvador que resolva todos os problemas rapidamente.

Durante outro período autoritário, a ditadura militar, houve o paradoxo da


participação política:

➢ o direito ao voto foi ampliado enquanto instituições,


➢ como o Congresso e o judiciário,
➢ e a oposição eram esvaziadas.

Tudo isso gerou, segundo José Murilo de Carvalho, uma cultura política de
pouca organização civil e de busca por privilégios, ou seja, a demanda por benefícios
apenas para determinados grupos. É um cenário que atrapalha a consolidação
universal dos direitos e causa essa enorme frustração entre a população.

Por isso, o autor argumenta que é necessária a participação ativa do povo para
conquistar a cidadania plena e resolver a “incapacidade do sistema representativo de
produzir resultados que impliquem a redução da desigualdade e o fim da divisão dos
brasileiros em castas separadas pela educação, pela renda, pela cor.”

4. DIREITOS E POLÍTICAS SOCIAIS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

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No Brasil. De acordo com Carvalho (1998), a atitude apática e “bestializada” 2


do povo brasileiro frente às arbitrariedades do Estado não corresponde à realidade.
Essa visão é, segundo a autora, uma construção discursiva que desqualifica o
comportamento e a atitude do povo brasileiro, que incorpora as culturas negras e
indígenas na forma de manifestar suas insatisfações. Com efeito, a história política do
país é repleta de exemplos de manifestações populares que demonstram a
capacidade do povo brasileiro se organizar e lutar por seus direitos.

A reivindicação por maior participação popular foi encaminhada para a


Assembleia Constituinte por meio da proposta de garantia de iniciativa popular no
Regimento Interno Constituinte. Esse manifesto foi apresentado e aceito pela
Assembleia Constituinte contendo mais de quatrocentas mil assinaturas. O processo
de emendas populares adotado pelo Regimento Interno da Assembleia Constituinte
foi uma experiência pioneira no campo da institucionalização da participação da
sociedade no âmbito da política nacional.

Por meio das emendas populares a sociedade pôde participar ativamente do


processo de elaboração da atual Carta Magna, apresentando propostas ao texto
constitucional. O constituinte Ulysses Guimarães – Presidente da Assembleia
Nacional Constituinte –, em seu discurso na sessão solene de promulgação da
Constituição de 1988, ressaltou que a participação popular na elaboração da atual
Carta Magna não se deu somente por meio das emendas, mas também:

“... pela presença, pois diariamente cerca de dez mil postulantes


franquearam, livremente, as onze entradas do enorme complexo
arquitetônico do Parlamento, na procura dos gabinetes, Comissões, galerias
e salões. Há, portanto, representativo e oxigenado sopro de gente, de rua, de
praça de favela, de fábrica, de trabalhadores, de cozinheiras, de menores
carentes, de índios, de posseiros, de empresários, de estudantes, de
aposentados, de servidores civis e militares, atestando a contemporaneidade
e autenticidade social do texto que ora passa a vigorar.” (trecho extraído de
Discurso de Ulisses Guimarães em 05 de outubro de 1988).

Mais adiante, no mesmo discurso, o constituinte Ulisses Guimarães destacou


que a Constituição de 1988 alargou o exercício da democracia brasileira em
participativa, além de representativa, assinalando que:

“É o clarim da soberania popular e direta, tocando no umbral da


Constituição, para ordenar o avanço no campo das necessidades sociais. O
povo passou a ter a iniciativa de leis. Mais do que isso, o povo é o super
legislador, habilitado a rejeitar pelo referendo projetos aprovados pelo
parlamento. A vida pública brasileira será também fiscalizada pelos Cidadãos.
Do presidente da República ao Prefeito, do Senador ao Vereador. A moral é
o cerne da pátria” (Ulisses Guimarães, 1988 – op.cit.).

Assim, a Constituição brasileira, promulgada em 1988, acabou absorvendo


grande parte das reivindicações do movimento de “Participação Popular na
Constituinte”, institucionalizando várias formas de participação da sociedade na vida
do Estado, sendo que a nova Carta Magna ficou conhecida como a “Constituição
Cidadã” pelo fato de, entre outros avanços, ter incluído em seu âmbito mecanismos
de participação no processo decisório federal e local.

Com referência à participação direta, a Constituição destaca o referendo, o


plebiscito e a iniciativa popular. Já no tocante à democracia participativa, estabelece
os Conselhos Gestores de Políticas Públicas, nos níveis municipal, estadual e federal,
com representação do Estado e da sociedade civil, indicando que as gestões das
políticas da Seguridade Social, da educação e da criança e do adolescente deveriam
ter caráter democrático e descentralizado. Importante ressaltar que o dispositivo de
emendas populares foi também utilizado nos processos de elaboração das
constituições estaduais e das leis orgânicas dos municípios brasileiros, resultando na
criação de conselhos municipais de gestão e controle de políticas públicas, com a
participação de atores governamentais e não governamentais.

A inscrição de espaços de participação da sociedade no arranjo constitucional


das políticas sociais brasileiras apostou no potencial das novas institucionalidades em
mudar a cultura política do país, introduzindo novos valores democráticos e maior
transparência e controle social na atuação do Estado no tocante às políticas sociais.
A Constituição brasileira estabeleceu sistemas de gestão democrática em vários
campos de atuação da Administração Pública, tais como:

❖ o planejamento participativo, mediante a cooperação das associações


representativas no planejamento municipal, como preceito a ser observado pelos
municípios (Art. 29, XII);
❖ a gestão democrática do ensino público na área da educação (Art. 206,
VI);
❖ a gestão administrativa da Seguridade Social, com a participação
quadripartite de governos, trabalhadores, empresários e aposentados (art.114, VI), e
a proteção dos direitos da criança e do adolescente.

A seguir destacam-se alguns avanços da participação social nas políticas


sociais, que resultaram de preceitos constitucionais:

1. A luta pela Reforma Sanitária em articulação com os profissionais de


saúde resulta na aprovação do Sistema Único de Saúde (SUS), que institui um
sistema de co-gestão e de controle social tripartite – governo, profissionais e usuários
– das políticas de saúde.
2. A luta pela Reforma Urbana resulta na função social da propriedade e
da cidade reconhecida pela atual Constituição, em capítulo que prevê o
a. planejamento e a gestão participativa das políticas urbanas.
3. A elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente, como
desdobramento do reconhecimento constitucional da criança como um sujeito de
direito em situação peculiar de desenvolvimento e da adoção da doutrina da proteção
integral.
4. Promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social, como resultado do
reconhecimento constitucional de que a assistência social é um direito, figurando ao
lado dos direitos à saúde e à previdência social.

Hoje, após duas décadas dos avanços inseridos na Constituição, quase a


totalidade das políticas sociais brasileiras – saúde, educação, assistência social,
criança e adolescente, trabalho e renda, turismo, meio ambiente, pesca, etc. - contam
com espaços institucionalizados de participação social, denominados conselhos, que
se configuram como órgãos administrativos colegiados com representantes da
sociedade civil e do poder público. Muitos deles passaram a desenvolver também
conferências nacionais, que são consideradas espaços mais amplos de participação,
onde representantes do poder público e da sociedade discutem e apresentam
propostas para o fortalecimento e a adequação de políticas públicas específicas.
Algumas conferências são regulamentadas por lei (conferências nacionais, estaduais
e municipais da Saúde e da Assistência Social); outras são regulamentadas por
decreto do Poder Executivo, e há ainda aquelas que não possuem nenhum
instrumento de institucionalização que obriga a sua realização.

4.1 O princípio da gestão democrática e os Conselhos na Seguridade Socia

A Constituição Federal de 1988 declara que o Brasil é um Estado Democrático


de Direito que tem dentre seus fundamentos a cidadania (art.1°, II). No restante do
texto constitucional, um conjunto de mecanismos necessários ao exercício dessa
cidadania é instituído, destacando-se, em relação à gestão pública, o chamado direito
à participação, a ser regulamentado através de lei (art.37, §3°. “A lei disciplinará as
formas de participação do usuário na Administração Pública direta e indireta”).
O artigo 193 trata dos princípios gerais da Seguridade Social, define de forma
mais explícita a participação, com menção direta aos “trabalhadores, empresários e
aposentados”.

O artigo 198 trata das ações e dos serviços públicos de saúde; a diretriz geral
é “participação da comunidade”.

O artigo 204, das ações governamentais na área da assistência social,


estabelece a “participação da população por meio de organizações representativas na
formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis”. A
regulamentação desse princípio, por normas infraconstitucionais, privilegiou a criação
de várias estruturas, ao estilo de conselhos de Estado. Cada uma das áreas, em razão
das dinâmicas próprias, estruturou seus conselhos de forma particular, assim os
conselhos de Seguridade, previdência, saúde e assistência tiveram nas duas últimas
décadas diferentes destinos e sucesso variado como instrumentos de participação.
Da mesma forma, apesar de partilharem desafios comuns, cada um desses espaços
guarda singularidades que só podem ser analisadas em seu próprio contexto de
histórico de atuação.

5. O DIREITO A PARTICIPAÇÃO NA GESTÃO DA SAÚDE

A área da saúde foi a primeira a criar e a institucionalizar os mecanismos de


participação popular por meio de conselhos e conferências. O caráter pioneiro da área
da saúde deveu-se ao papel desempenhado pelo Movimento pela Reforma Sanitária,
cujo marco mais significativo foi a XIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em
1986, que impulsionou o processo de descentralização das políticas de saúde, com a
criação do Sistema Único de Saúde (SUS). Historiadores, militantes e estudiosos da
área são unânimes ao creditar ao Movimento Sanitarista à vitória pelo fato de a
Constituição Federal de 1988 ter incluído a garantia da saúde como direito de todos
os brasileiros e dever do Estado:

“O sistema de saúde do Brasil é uma conquista da população brasileira, que


ocorreu meio que ao contrário da história dos países latino-americanos. Em toda a
América Latina e também no Caribe, o que foi feito foi uma privatização da atenção à
saúde”.
(trecho de entrevista concedida por Maria Luíza Jaeger em 2005 para a
Radiobrás)

“A Constituição anterior falava em direito à assistência médica e a de 1988 fala


em direito à saúde e diz que a saúde tem a ver com educação, lazer, trabalho e com
atenção à saúde. O conceito de integralidade da atenção também aparece no texto
constitucional. É bom lembrar que, ao mesmo tempo, saúde se torna, na Constituição
Federal, a única questão de relevância pública.” 12.(idem).

A Constituição Federal garante para todos os cidadãos o direito à saúde, por


força de vários dispositivos constitucionais que reiteram que é dever do Estado
garantir o direito à saúde. Assim, no Brasil, as políticas públicas de saúde orientam-
se desde 1988 pelos princípios de universalidade e equidade no acesso às ações e
aos serviços e pelas diretrizes de descentralização da gestão, de integralidade do
atendimento e de participação da comunidade, na organização de um Sistema Único
de Saúde no território nacional.

A concepção da saúde inscrita na Constituição trouxe mudanças significativas


nas relações de poder político e na distribuição de responsabilidades entre o Estado
e a sociedade, e entre os distintos níveis de governo. Coerente com essa concepção,
ampliaram se os canais de participação dos gestores da área e dos usuários do
sistema, instituindo-se conferências de saúde e conselhos de saúde em cada esfera
de governo, como instâncias colegiadas para a participação social na gestão do
Sistema Único de Saúde – SUS -; a Comissão Intergestores Tripartite na direção
nacional do Sistema Único de Saúde e as Comissões Intergestores Bipartites na
direção estadual; e fortaleceram-se os órgãos colegiados nacionais de representação
política dos gestores das ações e serviços nos Estados e municípios – o CONASS
(Conselho Nacional de Secretários de Estado de Saúde) e o CONASEMS (Conselho
Nacional de Secretários Municipais de Saúde).
5.1 Papel do Conselho Nacional de Saúde

https://www.cfn.org.br/index.php/noticias/cns-divulga-manual-para-realizacao-de-conferencias-de-
saude/

O Conselho Nacional de Saúde - CNS - é um órgão colegiado com


representação de diversos setores da sociedade e também de entidades nacionais de
trabalhadores que possuem papel relevante para a sociedade brasileira. Tem o
caráter deliberativo na formulação de estratégias e no controle da execução das
políticas de saúde.

A Lei Federal 8.142/90, em seu § 2°, define que “O Conselho de Saúde, em


caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do
governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na
formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância
correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões
serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do
governo”.

No tocante às conferências nacionais, em dezembro de 2007 foi realizada a 13ª


Conferência Nacional de Saúde, que desenvolveu seus trabalhos tendo como tema
central a questão da “Saúde e Qualidade de Vida: Políticas de Estado e
Desenvolvimento”. Resultado de muita luta e de mobilização da sociedade, o Sistema
Único de Saúde já sofreu várias tentativas de modificações voltadas para sua redução
(focalização), sucateamento e privatizando a saúde pública do Brasil.

É lugar comum a mídia mostrar as filas de espera nos postos de saúde,


hospitais sujos e lotados, falta de medicamentos e de profissionais da área da saúde,
dentre outras mazelas. Entretanto, o SUS tem vários aspectos positivos que são muito
pouco divulgados e conhecidos na sua totalidade pela população brasileira. Em
relação ao atendimento oferecido pelo SUS, destacam-se, a título de ilustração, a sua
magnitude:

I. assistência integral e totalmente gratuita para a população de portadores do


HIV e doentes de AIDS, renais crônicos e pacientes com câncer, e
II. realização média anual de mais de 1,0 bilhão de procedimentos de atenção
básica; 251 milhões de exames laboratoriais; 8,1 milhões de ultra-sonografias
e 132,5 milhões de atendimentos de alta complexidade (85% do total realizado
no país), entre tomografias, sessões de hemodiálise, quimioterapia, etc.

5.2 O direito à participação na gestão da previdência social

O princípio da participação na gestão previdenciária tem como fonte originária


na Constituição de 1988 o artigo 194, que no seu item VI assinala o caráter
democrático e descentralizado da gestão administrativa com a participação da
comunidade, em especial dos trabalhadores, dos empresários e dos aposentados,
ainda que antes e depois da criação do Conselho Nacional da Previdência Social
tenham ocorridas muitas manifestações populares visando à correta aplicação dos
direitos da Seguridade Social.
De acordo com os dados do Ministério da Previdência Social, o seguro social
atingiu, em junho de 2008, uma quantidade média de 25,4 milhões de benefícios do
sistema previdenciário. Desses, 14,7 milhões foram destinados aos beneficiários da
área urbana, 7,5 milhões aos beneficiários da área rural e 3,2 milhões aos benefícios
assistenciais.

De acordo com Delgado et al (2002), um sistema de seguro social de ampla


cobertura como o brasileiro, com tal massa de participantes, requer, de fato, um
controle público de sua gestão, bem como um permanente intercâmbio com a
sociedade sobre os rumos e os limites da política que se realiza na relação da
burocracia com a população beneficiária, visando a alcançar os objetivos que a
sociedade elege para a proteção social dos grupos vulneráveis no âmbito da
previdência social.

A regulamentação do princípio da participação na gestão previdenciária deu


se por meio da Lei 8.213/1991, que criou várias estruturas específicas de participação
social na gestão pública do sistema previdenciário, destacando-se o Conselho
Nacional de Previdência Social e o Conselho Nacional de Seguridade Social, que
existiram a partir de 1991 e foram extintos em 1999, no Governo de Fernando
Henrique Cardoso.

Ao Conselho Nacional da Previdência Social cabe deliberar sobre a política de


previdência social e sobre a gestão do sistema previdenciário. Suas competências são
amplas e incluem desde o estabelecimento de diretrizes gerais para a definição da
política previdenciária até a aprovação das propostas orçamentárias da previdência
social, antes de serem consolidadas no Orçamento da Seguridade Social. É presidido
pelo Ministro de Estado da Previdência Social e composto por representantes do
Governo Federal, dos trabalhadores aposentados, dos pensionistas, de trabalhadores
ativos e de empregadores.

O processo de criação e de construção da participação social na política


previdenciária não é, de acordo com Delgado et al (2002), aparentemente precedido
por algum movimento social ou ação concertada de atores sociais, razoavelmente
organizados, que favorecesse a construção dos Conselhos. Segundo os autores, essa
talvez seja a grande diferença em relação, por exemplo, ao Conselho Nacional de
Saúde, o qual fora precedido pela ação do Movimento Sanitarista e por toda uma
articulação nacional e regional dos atores públicos envolvidos na política de saúde.
Além disso, é importante ressaltar, brevemente, que nos 20 anos que se seguiram à
promulgação da Constituição, a previdência social esteve constantemente no centro
do debate econômico e político, sendo considerada por muitos atores como uma das
principais causas dos problemas econômicos existentes no período. Logo após a
promulgação da Constituição Federal, o país viveu uma crise política e atravessou um
sofrido processo hiperinflacionário.

Nesse período, os críticos colocavam os avanços previdenciários advindos da


atual Carta Magna - como, por exemplo, a equiparação entre benefícios rurais e
urbanos - entre as principais causas do déficit público e, consequentemente, da
inflação. No início da década de 90, a crise econômica continuou e, portanto, as
críticas persistiram e, até mesmo, intensificaram-se as vozes que defendiam a
necessidade de reforma constitucional no campo da previdência. Mesmo assim, não
se conseguiu fazer qualquer modificação no período da revisão constitucional (1993).

Fatores como o advento do Plano Real, que estabilizou os preços, o baixo


crescimento econômico da década de 90, o aumento das despesas previdenciárias
pós Constituição Federal de 1988 e as modificações no padrão demográfico da
sociedade brasileira transformaram o então superávit das contas da previdência em
déficit já no início da década. Assim, entre os anos de 1995 a 2002, as críticas ao texto
constitucional da previdência social continuaram com muita força, sendo que a política
econômica daquele período apresentava como uma de suas principais bandeiras a
reforma constitucional da previdência.

Tal esforço resultou na famosa Emenda Constitucional nº. 20, bem como em
outras medidas que visaram a restringir a cobertura previdenciária, destacando-se a
criação do chamado fator previdenciário. Em 2003, o país continuou apresentando
baixo crescimento econômico, sendo que a proposta governamental no período
defendia a reforma constitucional no regime previdenciário do setor público, que
resultou em alterações que restringiram o seu alcance.

No presente, observa-se uma reversão de expectativas, uma vez que o atual


crescimento econômico tem permitido reduzir o déficit previdenciário, mesmo
considerando os reajustes reais no valor do salário mínimo. Assim, aparentemente, o
debate em torno da questão previdenciária tem sido atualmente mais otimista e
progressivo, a exemplo da realização do recente Fórum Nacional da Previdência
Social.

Todas as questões conjunturais apresentadas no breve relato acima


contribuíram para que o arranjo de participação social na gestão da previdência social
perdesse um pouco em efetividade. Em trabalho que avalia a atuação do Conselho
Nacional da Previdência Social – CNPS no período de 1992 a 2000, Delgado et al
(2002) concluiu que o processo de institucionalização da participação social por meio
do CNPS apresentou inúmeras dificuldades, destacando-se:

➢ Ausência de condições históricas mais propícias para a implementação


da gestão quadripartite com descentralização federativa, conforme observado no
processo participativo na área da saúde.
➢ Advento do período de política econômica conservadora nos anos 90,
resultando em embates fortes, conflitos e refluxos dos movimentos sociais que
lutavam pela ampliação e manutenção de direitos sociais conquistados na
Constituição de 1988.
➢ Baixa assimilação dos princípios constitucionais por parte do CNPS,
resultando em menor capacidade de articular, defender e ampliar os direitos sociais
universais na previdência e na Seguridade Social.

No entanto, apesar das dificuldades elencadas, pode-se afirmar que, ao longo


de sua existência, o Conselho Nacional de Previdência Social desempenhou
importante papel na defesa das conquistas sociais no campo previdenciário da
Constituição Federal de 1988 e no fortalecimento da previdência social do país, a qual,
nas duas últimas décadas, sofreu vários golpes no sentido de diminuí-la e de
descaracterizá-la de seus princípios universais.
5.3 O Direito à Participação na Gestão da Assistência Social

https://www.direito2.com.br/loas-direito/

Com a Constituição de 1988, a assistência social adquiriu o caráter


constitucional de política pública no âmbito da Seguridade Social. Passou a ser um
direito para todos aqueles que dela necessitam, e não uma benemerência do Estado
ou da sociedade. Além disso, foi criado o Benefício de Prestação Continuada (BPC),
que substituiu, em 1995, a renda vitalícia (criada em 1974), ambos sem necessidade
de vínculos contributivos, e aprofundaram-se os debates no sentido da
descentralização na gestão e da implementação dos arranjos que institucionalizam a
maior participação da sociedade na gestão da política de assistência social. A
aprovação da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) só ocorreu em 1993, cinco
anos depois da promulgação da Constituição.

A LOAS definiu explicitamente os arranjos da descentralização e da


participação social. De acordo com essa lei, os conselhos municipais constituem-se
numa das instâncias deliberativas do sistema descentralizado e participativo de
assistência social. A LOAS definiu ainda a estrutura geral a ser reproduzida nos níveis
nacional, estadual e municipal, qual seja, a “Conferência” como instância deliberativa
máxima, cuja função é avaliar a situação da política de assistência social, propor
diretrizes, apreciar e aprovar proposta orçamentária encaminhada pelo Ministério da
Previdência e Assistência Social, e determinou a criação do Fundo de Assistência
Social.
Além disso, determinou que a efetiva instituição de um Conselho de Assistência
Social, de composição paritária entre governo e sociedade civil, de um Fundo de
Assistência Social, com orientação e controle dos respectivos conselhos, e a
elaboração de um Plano de Assistência Social seriam pré-requisitos para os repasses
da União aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios. Entretanto, apenas em
1997 instituíram-se a sistemática de repasse de recursos e a Norma Operacional
Básica (NOB), criando condições políticas e institucionais para o início efetivo dos
processos de descentralização. Como instâncias componentes do sistema
descentralizado, têm-se ainda as comissões intergestoras tripartite e bipartite, que
constituem espaços de negociação e pactuação entre os entes federados a respeito
dos aspectos operacionais e da gestão da política, incluindo divisão de recursos entre
eles. São instâncias que propiciam a participação dos gestores de todos os níveis de
governo no processo decisório da política.

5.4 O Conselho Nacional de Assistência Social

CNAS foi instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS - como
órgão superior de deliberação colegiada, vinculado à estrutura do órgão da
Administração Pública Federal responsável pela coordenação da Política Nacional de
Assistência Social, que atualmente é o Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome.

É composto por dezoito membros e respectivos suplentes, sendo nove


representantes governamentais e nove representantes da sociedade civil, dentre
representantes dos usuários ou de organizações de usuários, das entidades e
organizações de assistência social e dos trabalhadores do setor, escolhidos em foro
próprio sob fiscalização do Ministério Público Federal.

Dentre as principais competências do CNAS encontram-se:

➢ aprovar a Política Nacional de Assistência Social;


➢ normatizar as ações e regular a prestação de serviços de natureza
pública e privada no campo da assistência social;
➢ fixar normas e conceder registro e Certificado de Entidade Beneficente
de Assistência Social;
➢ zelar pela efetivação do sistema descentralizado e participativo de
assistência social;
➢ convocar ordinariamente a Conferência Nacional de Assistência Social;
➢ apreciar e aprovar a proposta orçamentária da Assistência Social a ser
encaminhada pelo órgão da Administração Pública Federal responsável pela
coordenação da Política Nacional de Assistência Social;
➢ divulgar, no Diário Oficial da União, todas as suas decisões, bem como
as contas do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) e os respectivos pareceres
emitidos.

O CNAS constitui-se, de fato, em um espaço de negociações reconhecido e


legítimo dos setores governamentais e da sociedade. É uma instância importante para
o debate e proposições na política mais geral de assistência social, bem como na
definição de critérios para o repasse de recursos para entidades de assistência social.
Em anos recentes, esse Conselho tem contribuído efetivamente para a implantação
do Sistema Único de Assistência Social – SUAS -, por meio de suas resoluções.

Em 2004, o CNAS aprovou a Política Nacional de Assistência Social – PNAS -


que estabeleceu princípios e diretrizes para a implementação do SUAS, que foi
resultado de amplos debates realizados em todos os Estados e no Distrito Federal
durante o ano de 2004, a partir de uma proposta preliminar apresentada pela
Secretaria Nacional de Assistência Social em cumprimento às deliberações da IV
Conferência Nacional de Assistência Social realizada em 2003. Já em 2006, o CNAS
aprovou também a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos, que foi uma
das deliberações da 5ª Conferência Nacional de Assistência Social que aconteceu em
dezembro de 2005. No tocante às Conferências Nacionais de Assistência Social -
instâncias colegiadas de caráter deliberativo com intensa participação social dos
usuários ou organizações de usuários, de entidades e de organizações de assistência
social e de trabalhadores do setor -, já foram realizados várias plenárias nacionais
desde 1995 e um sem número de plenárias estaduais e municipais que trataram de
questões fundamentais para a política nacional de assistência social, conforme
elucidado abaixo:
I Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período de 20 a 23 de
novembro de 1995, com o tema geral: “A Assistência Social como um direito do cidadão
e dever do Estado”.
II Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período 9 a 12 de
dezembro de 1997, com o tema geral: “O Sistema Descentralizado e Participativo da
Assistência Social - Construindo a Inclusão - Universalizando Direitos”.
III Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período de 4 a 7 de
dezembro de 2001, com o tema geral: "Política de Assistência Social: Uma trajetória de
Avanços e Desafios".
IV Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período de 7 a 10 de
dezembro de 2003, como o tema geral: "Assistência Social como Política de Inclusão:
uma Nova Agenda para a Cidadania - LOAS 10 anos”.
V Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período de 5 a 8 de
dezembro de 2005, com o tema geral “SUAS – PLANO 10: Estratégias e Metas para
Implementação da Política Nacional de Assistência Social”.
VI Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período de 14 a 17 de
dezembro de 2007, com o tema geral: “Compromissos e Responsabilidades para
Assegurar Proteção Social pelo Sistema Único da Assistência Social -SUAS”.
VII Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período nos dias 30 de
novembro a 3 de dezembro de 2009, com o tema geral: “Participação e Controle Social
no SUAS”.
VIII Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período nos dias 07 a
10 de dezembro de 2011, com o tema geral: “Avançando na consolidação do Sistema
Único da Assistência Social – SUAS com a valorização dos trabalhadores e a qualificação
da gestão, dos serviços, programas, projetos e benefícios.”
IX Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no período nos dias 16 a 19
de dezembro de 2013, com o tema geral: “A Gestão e o Financiamento na efetivação do
SUAS”.

6. PARTICIPAÇÃO SOCIAL NAS POLÍTICAS PÚBLICAS: AVANÇOS E DESAFIO

Os avanços constitucionais no desenho das políticas sociais criaram espaços


concretos de participação da sociedade no planejamento e na execução de políticas
por meio de conselhos municipais, estaduais e federais. Entretanto, ao lado desses
avanços, ao longo da década de 90 e no início dos anos 2000, a relação do Estado
com a sociedade sofreu uma inflexão. Isto é, os movimentos sociais que na década
de 80 caracterizavam-se por seu caráter reivindicatório, pela ampliação de direitos
sociais universais e pela construção de um Estado do bem-estar social, na década de
90, grande parte das organizações passam a assumir responsabilidades conferidas
ao Estado pela Constituição Federal.

Essa guinada no papel da sociedade civil reflete a política governamental do


Estado mínimo, significando a tentativa de repassar à sociedade civil
responsabilidades conferidas à instância pública governamental, conforme
outorgadas pela Constituição Federal de 1988 e por todas as leis orgânicas
decorrentes. Segundo Dagnino (2004)17, na década de 90 há uma outra noção de
participação em disputa na conjuntura política e social da época.

Para a autora, a ideia de participação passou por um processo de


resignificação, passando a ser vista como “participação solidária”. Essa noção de
participação relaciona-se com a prática do trabalho voluntário e com a ideia de
responsabilidade social de indivíduos e empresas. Nesse sentido, há uma
despolitização do significado da participação social, pois se enfatiza uma noção de
participação individualista, ligada a valores morais, desconectada do coletivo.

Essa perspectiva traz impactos negativos tanto para o desenvolvimento e a


efetivação dos espaços públicos participativos como para a implementação de
políticas públicas de combate à pobreza e à desigualdade social. Com a assunção ao
poder de uma das forças políticas originárias do sindicalismo e dos movimentos
sociais criados nas décadas de 70 e 80 tem-se observado a maior presença da
sociedade nos espaços de participação social existentes na esfera pública federal.

Informações referentes ao período de 2003 a 2006 indicam que o Governo


Federal colocou em prática uma estratégia de manter e ampliar a interlocução com
movimentos sociais e com organizações da sociedade. Tal estratégia foi concretizada
a partir da maior utilização dos espaços de participação social existentes no âmbito
da Administração Pública Federal e da criação de novos mecanismos que propiciam
a canalização das demandas e manifestações da sociedade para dentro do Estado.

Com isso, de acordo com o ministro-chefe da Secretaria-Geral-PR, Luis Dulci,


quis o Presidente da República ampliar o conceito de governabilidade, incorporando
os atores não legalmente instituídos, como os movimentos sociais e as entidades
representativas da sociedade civil, no diálogo permanente com o Estado, realizado
pelos gestores públicos, sobretudo nos momentos que antecedem as decisões
governamentais que afetam diretamente a vida da população brasileira: “Este é um
governo de mudança, que só alcançará seu objetivo ampliando o espaço democrático
da participação social. A governabilidade parlamentar é fundamental, mas, para
realmente mudar o Brasil, é preciso ampliar o próprio conceito de governabilidade.
Nunca a sociedade se mostrou tão disposta a participar na construção de um novo
país. Estamos incorporando essa energia.

Além disso, a História nos dá exemplos de governos liderados pela esquerda,


em outros países, que fracassaram por não terem conseguido ampliar e aprofundar
sua base social. Só neste primeiro ano, a equipe da Secretaria-Geral manteve mais
de 700 reuniões com organizações da sociedade. Esse método inovador de governar
reflete-se na agenda do próprio Lula. Ele foi o primeiro presidente a visitar a
Assembleia da CNBB em Itaici, o Congresso da CUT em São Paulo, a marcha do
Fórum Nacional da Reforma Agrária em Brasília. Também foi o primeiro a receber a
Associação Brasileira de ONGs. Recebeu a direção da UNE, que havia dez anos não
era convidada ao Planalto.

Outros governos chegaram a criminalizar movimentos como o MST. O nosso,


ao contrário, mantém com eles uma interlocução franca e respeitosa.” (trecho extraído
de entrevista concedida pelo Ministro Luís Dulci para Ricardo Azevedo, publicada na
Revista Teoria e Debate da Fundação Abramo - ano 17 - nº56 - dez 2003/janeiro
2004).

Dentre outras iniciativas colocadas em prática para dinamizar o diálogo com a


sociedade na Administração Pública no período 2003-2006, o Governo Federal
colocou em prática uma estratégia de apoio à realização de conferências nacionais e
de criação de novos conselhos nacionais de direitos e de políticas públicas. Em torno
da participação social nas conferências nacionais, assistiu-se, nesse período, a uma
situação inédita, pois nunca os segmentos organizados da sociedade haviam
demonstrado tanto dinamismo nas mais diferentes áreas de políticas públicas.

Entre 2003 e 2006 foram realizadas 43 conferências – 38 nacionais e cinco


internacionais -, que mobilizaram mais de dois milhões de pessoas da sociedade civil
e do poder público, nas esferas municipal, estadual e nacional. É importante notar
que, do conjunto de conferências realizadas no período 2003-2006, 15 conferências
foram realizadas pela primeira vez, conforme aponta o Quadro 1. No tocante aos
conselhos nacionais, no período em análise foi colocado em prática pelo Governo
Federal um franco processo de abertura de novos espaços dessa natureza. Quadro 1
aponta que, durante a primeira gestão do Governo do Presidente Lula, onze novos
conselhos vinculados às políticas públicas e à defesa de direitos foram criados.

Informações do Governo Federal revelam ainda que, em janeiro de 2007, a


Administração Pública Federal contabilizava cerca de 40 conselhos nacionais que
contemplavam na sua composição representantes de organizações da sociedade civil.
A mesma fonte de informações destaca também a enorme heterogeneidade de
representantes civis que participam desses conselhos.

No início de 2007 participavam dos conselhos nacionais um total de cerca de


440 entidades representativas de segmentos da sociedade civil (organizações
sindicais, patronais, movimentos urbanos, rurais, ambientalistas, de defesa de
direitos, entre outros), sendo que algumas delas estavam presentes em mais de um
conselho nacional, ultrapassando o número de 600 participações

1. 1ª Conferência Nacional das Cidades


2. 1ª Conferência Nacional Infanto-Juvenil do Meio Ambiente
3. 1ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de
Deficiência
4. 1ª Conferência Nacional de Políticas Públicas para a Juventude
5. 1ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa
6. 1ª Conferência Nacional de Políticas pra as Mulheres
7. 1ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial
8. 1ª Conferência Nacional de Aquicultura e Pesca
9. 1ª Conferência Nacional do Esporte
10. 1ª Conferência Nacional do Meio Ambiente
11. 1ª Conferência Brasileira sobre APL - Arranjos Produtivos Locais
12. 1ª Conferência Nacional de Educação Profissional e Tecnológica
13. 1ª Conferência Nacional dos Povos Indígenas
14. 1ª Conferência Nacional de Economia Solidária
15. 1ª Conferência Nacional da Cultura Fonte: Secretaria-Geral –
PR/Secretaria Nacional de Articulação Social (jan. de 2007) P.

Além dos conselhos e das conferências, a realização de consultas públicas foi


amplamente utilizada nesse período, destacando-se, principalmente, aquelas
vinculadas às temáticas de meio ambiente, presentes no Plano de Construção das BR
163 e BR 364, no Plano Amazônia Sustentável (PAS), no Plano Nacional de Recursos
Hídricos, e outros.

O ano de 2003 foi também o primeiro em que um Governo Federal realizou um


processo de consulta à sociedade para a elaboração do Plano Plurianual no país. Para
a definição das prioridades do Plano Plurianual 2004–2007 foram organizados fóruns
de discussão nos 26 Estados brasileiros e no Distrito Federal, os quais contaram com
a participação de 2.170 organizações variadas, a saber:

• sindicatos,
• associações e federações empresariais,
• organizações não-governamentais,
• movimentos populares e instituições religiosas e científicas.

Pelo exposto, pode-se afirmar que, do ponto de vista quantitativo, houve, no


período analisado, uma expansão da participação social na esfera pública social
brasileira.

No entanto, o principal desafio reside em investir na capacidade de o Estado


em responder à quantidade expressiva de novas (e antigas) demandas que adentram
a burocracia estatal, transformando as resoluções dos conselhos, as deliberações das
conferências, as sugestões, as críticas, e as moções oriundas dos fóruns e das
consultas realizados em medidas e políticas públicas concretas que melhoram a
qualidade de vida da população.

Assim, as dificuldades enfrentadas pelo Governo brasileiro em dar


consequência prática à participação social, mesmo contando com espaços legalmente
instituídos para essa finalidade, desde a Constituição de 1988, geram várias
indagações sobre a natureza das dificuldades que obstaculizam o aprofundamento da
democracia pela via de mecanismos participativos. Entretanto, apesar dos
indiscutíveis avanços quantitativos observados nos últimos anos, a consolidação da
participação social no Brasil ainda enfrenta inúmeros desafios, sobretudo no tocante
à melhoria da qualidade e da efetividade dos espaços de participação social. Na
verdade, muitos passos devem ser dados até que, de fato, as deliberações da
sociedade civil sejam encaminhadas aos escaninhos apropriados da Administração
Pública Federal e se concretizem em medidas e políticas públicas adequadas à
população.
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