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EQUIPAMENTOS DE MANOBRA E PROTECÇÃO DE MOTORES DE BAIXA

TENSÃO
Manuel Bolotinha, MSc, Engenheiro Electrotécnico i

1. INTRODUÇÃO
Os motores eléctricos de corrente alternada em baixa tensão, que transformam
energia eléctrica em energia mecânica, desempenham um papel fundamental na
indústria produtiva e na indústria da construção, tendo também uma larga aplicação
doméstica.
Neste artigo serão abordados os equipamentos habitualmente utilizados na sua
manobra e protecção.

2. CONTACTORES
Os equipamentos normalmente utilizados para o arranque e paragem de motores
eléctricos de baixa tensão (BT)1 são os contactores, que devem obedecer à Norma
IEC2 60947, que são equipamentos de corte e manobra, com capacidade para o
estabelecimento e a interrupção das correntes de arranque e de serviço, permitindo
um número elevado de manobras de fecho e de abertura dos circuitos de
alimentação de cargas, sujeitas a ciclos frequentes de “ligar-desligar”.
Nos motores BT os contactores também integram os sistemas de mudança de
sentido de rotação e de velocidade, quando tal é requerido.
As características dos contactores são os seguintes:
• Tensão estipulada3 (ca ou cc4).
• Intensidade estipulada.
• Número de manobras.
Devem ainda ser considerados na definição dos contactores:
• Tensão de comando (ca ou cc).
• Número de contactos auxiliares NA e NF5.
Em aplicações particulares os contactores podem dispor de encravamentos
mecânicos e/ou eléctricos, a fim de evitar falsas manobras (por exemplo, no caso

1 BT: U ≤ 1 kV.
2 IEC: International Electrotechnical Commission.
3 Valor estipulado (para equipamentos): Valor de uma grandeza fixado, em regra, pelo fabricante para um dado
funcionamento especificado de um componente, de um dispositivo ou de um equipamento; este valor corresponde
ao anteriormente designado por “valor nominal”, designação que atualmente é apenas utilizada para redes.
4 ca: corrente alternada; cc: corrente contínua.
5 NA: contacto normalmente aberto; NF: contacto normalmente fechado.

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dos contactores BT, ordens de comando simultâneo para dois sentidos de marcha
diferentes de um motor).
Os contactores dispõem de uma bobina de fecho, actuada electricamente, por
corrente alternada ou corrente contínua, funcionando por emissão de corrente. O
corte de corrente provoca a abertura do contactor.
O comando dos contactores pode ser feito local ou remotamente, de forma
automática (sensores, PLC – Progamable Logic Controllers, etc.) ou de forma
manual (interruptores ou botoneiras de impulso).
Por questões de segurança, junto ao motor, deve existir uma botoneira de paragem
de emergência, como se representa na Figura 1.

Figura 1 – Exemplo de uma botoneira de paragem de emergência de um motor


Os contactores BT são utilizados ainda na manobra de baterias de condensadores e
circuitos de iluminação, designadamente de iluminação pública e exterior.
Nos contactores BT o corte é feito no ar, fazendo-se a extinção do arco numa
câmara própria para o efeito. Estes equipamentos são classificados, de acordo
com as condições de utilização, nas seguintes categorias:
Corrente alternada
• AC1: Cargas pouco ou não indutivas.
• AC2: Arranque, paragem e mudança do sentido de rotação de motores de
corrente alternada de rotor bobinado.
• AC3: Arranque, paragem e mudança do sentido de rotação de motores de
corrente alternada de rotor em curto-circuito.
• AC4: Arranque, paragem, mudança do sentido de rotação e arranques
sucessivos de curta duração de motores de corrente alternada.

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Corrente contínua
• DC1: Cargas pouco ou não indutivas.
• DC2: Arranque e paragem de motores de corrente contínua de excitação
shunt6.
• DC3: Arranque, paragem e mudança do sentido de rotação de motores de
corrente contínua de excitação shunt.
• DC4: Arranque e paragem de motores de corrente contínua de excitação
série7.
• DC5: Arranque, paragem e mudança do sentido de rotação de motores de
corrente contínua de excitação série.
As tensões estipuladas habituais dos contactores BT são: 240 V; 400 V; 440V; 500 V;
600/690 V.
Já as correntes estipuladas dependem do tipo de utilização, uma vez que para o
mesmo contactor as correntes estipuladas são, por exemplo:
• Em categoria AC1: 45 A.
• Em categoria AC3: 25 A.
• Em categoria AC4: 12 A.

Figura 2 – Contactor BT

6 Motores de excitação shunt: Nestes motores o circuito do enrolamento de campo que produz a excitação está
em paralelo ou em derivação com o circuito de armadura, sendo apenas necessária uma fonte de corrente contínua
para alimentar o circuito da armadura e do campo, pois ambos os circuitos estão em paralelo. Como o enrolamento
de campo está em paralelo ou em derivação com o circuito da armadura, é possível utilizar o mesmo tipo de
condutor do caso de excitação independente.
7 Motores de excitação série: Nestes motores o circuito do enrolamento do campo que produz a excitação está em
série com o circuito da armadura, sendo assim necessário apenas uma fonte para alimentar o circuito do campo e
da armadura. Como neste caso a corrente que circula no enrolamento do campo que produz a excitação é a mesma
corrente que circula no enrolamento da armadura, é necessário um enrolamento próprio para o circuito de excitação,
capaz de suportar correntes relativamente altas da armadura.

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3. PROTECÇÃO CONTRA SOBRECARGAS
A protecção dos motores eléctricos BT contra sobrecargas, para potências que
usualmente não excedam os 80/100 kW, e dependendo da importância do motor no
processo produtivo (ou outro) em que se encontra inserido, é habitualmente garantida
por relés térmicos reguláveis, que devem obedecer à Norma IEC 60947, de que se
mostra um exemplo na Figura 3, habitualmente associados a contactores.

Figura 3 – Relé térmico


Em caso de actuação do relé térmico, um contacto auxiliar deste equipamento
interrompe o circuito de alimentação da bobina do contactor, provocando a
abertura deste, o que é representado na Figura 4, onde K1 representa o contactor e a
respectiva bobina de comando e F o relé térmico e o respectivo contacto auxilia.

Figura 4 – Circuito de potência (esquerda) e de comando (direita) de um contactor


para um motor BT

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Cabe aqui referir que há situações em que não se utiliza a protecção contra
sobrecargas, preferindo-se que o motor continue em funcionamento até à sua
paragem por avaria ou destruição, como é o caso dos motores das bombas de
água de combate a incêndios.
Os relés térmicos são principalmente do tipo bimetálico. Estes relés são constituídos
por dois metais diferentes, com coeficiente de dilatação diferente; quando ocorre
uma sobrecarga a dilatação dos metais provoca um “encurvamento” da placa
bimetálica, que origina a abertura do órgão de manobra que lhe está associado – o
contactor – como se representa na Figura 4.
Os relés térmicos podem ser também do tipo electrónico, que contudo é utilizado
preferencialmente em motores de baixa tensão de elevada potência.
A selecção dos relés é feita de acordo com a potência do motor, sendo reguláveis,
normalmente entre 85% e 115% da sua corrente nominal. A fim de evitar disparos
intempestivos os relés térmicos devem ser seleccionados de acordo com a
temperatura ambiente; a temperatura ambiente considerada habitualmente pelos
fabricantes é de 40 °C.
Os modelos actuais no mercado apresentam já compensação de temperatura e
actuação em caso de falta de uma fase.
A falta de uma fase pode ser provocada pela fusão do fusível dessa fase, em caso de
curto-circuito à terra, por exemplo.

4. PROTECÇÃO CONTRA CURTO-CIRCUITOS


A protecção dos motores eléctricos BT contra curto-circuitos é realizada por meio de
fusíveis.
Os fusíveis, que são um tipo de resistência de baixo valor óhmico, podem ser
definidos como um “elemento de sacrifício”, que se funde quando percorrido por
correntes elevadas, para protecção dos circuitos e equipamentos contra
sobrecargas e curto-circuitos, devendo obedecer ao estipulado nas Normas IEC
60269, 60282 e TR8 61912.
Os fusíveis não são habitualmente utilizados contra a protecção dos motores eléctricos
BT contra sobrecargas, porque se fossem dimensionados para tal, poderiam actuar
no momento de arranque dos motores9, dando origem a disparos intempestivos.
O principal componente de um fusível é um fio ou fita metálica (habitualmente zinco,
cobre, alumínio, prata ou ligas metálicas), de secção bastante inferior à secção dos
condutores do circuito, que funde quando o valor da corrente que o percorre é
muito elevado e interrompe o circuito, evitando que o defeito provoque outros
danos na instalação, como sejam o sobreaquecimento ou o incêndio.
Este componente, que é calibrado para garantir as suas características e a não
interrupção do circuito com a corrente de serviço, é instalado num invólucro não

8TR: Technical Report.


9 A título de exemplo refira-se que a corrente de arranque de um motor é aproximadamente 5 a 7 vezes a sua
corrente nominal.

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combustível – material cerâmico, vidro, material plástico, fibra de vidro ou mica
moldada, dependendo do fabricante, da aplicação e da tensão de serviço.
Os fusíveis são montados em bases, expressamente concebidas para o tipo de
fusível. A Figura 5 mostra o exemplo de um fusível de facas do tipo NH e respectiva
base.

Base

Fusível

Figura 5 – Fusível BT e base


As principais características dos fusíveis são:
• Tensão estipulada.
• Corrente estipulada (In) – valor máximo da corrente que o fusível pode conduzir
continuamente sem interromper o circuito.
• Poder de corte estipulado (I1) – corrente máxima que o fusível pode interromper
com segurança, variando habitualmente entre 23 kA e 63 kA, embora em
alguns tipos possa atingir os 100 kA.
• Corrente convencional de funcionamento ou corrente convencional de fusão (If)
– corrente mínima que provoca a fusão do fusível.
• Corrente convencional de não funcionamento (Inf) – valor da corrente que o
fusível é capaz de conduzir sem fusão, durante um tempo definido
(designado por tempo convencional), exprimido como um múltiplo de In
(exemplo: Inf = 1,25xIn).
• Fusão convencional (I2xt): medida da energia necessária para provocar a fusão
do fusível (esta característica baseia-se na lei de Joule).
• Curva tempo-corrente (ver Figura 6) – indica o tempo de actuação do fusível
em função da corrente (característica habitualmente fornecida pelo fabricante e
que está definida nas normas aplicáveis).

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Curva tempo-
corrente tipo

Tempo máximo
de funcionamento
Tempo (s)

Tempo mínimo
de
funcionamento

Corrente (A)

Figura 6 – Exemplo da curva tempo-corrente de um fusível


A temperatura tem uma importante influência no funcionamento do fusível, uma vez
que os seus valores característicos são definidos para uma determinada
temperatura de serviço. Se a temperatura de serviço for diferente da especificada
pelo fabricante, é necessário aplicar um factor de correção, que é também indicado
pelo fabricante, segundo as normas aplicáveis.
Os factores a considerar para a selecção de fusíveis são:
• Tensão nominal da instalação.
• Corrente de serviço.
• Temperatura ambiente.
• Corrente de sobrecarga e tempo de atuação desejado para o fusível.
• Valor máximo da corrente de curto-circuito.
• Correntes de arranque (quando aplicável) e picos transitórios de corrente
expectáveis.
• Eventuais limitações dimensionais.
• Tipo de montagem.
• Aplicação.
• Normas e regulamentos aplicáveis.

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Classificação dos fusíveis BT
De acordo com a Norma Francesa NF EN 60269 (harmonizada com as Normas
europeias EN), e que é usada vulgarmente numa larga maioria de países, os fusíveis
BT, tendo em consideração as funções, aplicação e a curva tempo-corrente,
classificam-se da seguinte forma:
gL/gG
Destinam-se sobretudo à protecção de circuitos e equipamentos, sendo os de
utilização mais habitual.
aM
Utilizados na protecção de motores, habitualmente designadas por “fusíveis de
acompanhamento motor”, destinam-se apenas à protecção contra curto-circuitos,
devendo ser conjugados com outros tipos de equipamentos para a protecção de
sobrecargas.
gR
São fusíveis ultra-rápidos, com forte capacidade de limitação da corrente de curto-
circuito, valor baixo de I2xt, utilizados essencialmente na protecção de equipamentos
com semi-condutores, tais como UPS, variadores de velocidade, conversores de
frequência, etc.
A selectividade entre fusíveis é habitualmente garantida se a relação entre as
correntes estipuladas da regulação de dois fusíveis consecutivos for igual ou
superior a 1,6.
Já a selectividade entre um fusível e o disjuntor, com um dos aparelhos instalado
imediatamente a montante do outro, é garantida se a relação entre as correntes
estipuladas do fusível e do disjuntor for igual ou superior a 2.
Na protecção de motores BT contra curto-circuitos devem ser utilizados fusíveis dos
tipos aM ou gC, cujas intensidades estipuladas devem ser seleccionadas de acordo
com a regulação do relé térmico, utilizando-se para o efeito tabelas fornecidas pelos
fabricantes, de que se apresenta um exemplo na Tabela 1, para motores trifásicos.
Tabela 1 – Intensidade estipulada de fusíveis de protecção de motores

Potência do Intensidade estipulada do


Corrente de regulação
motor – valores fusível (A)
do relé térmico
aproximados
(A) aM gC
(kW)
0,03-0,07 0,1-0,16 0,25 2
0,08-0,6 0,16-1,25 0,25 2
0,12-0,2 0,25-0,4 1 2
0,2-0,3 0,40-0,63 1 2
0,3-1 0,63-1 2 4
1-1,2 1-1,16 2 4
0,9-1,1 1,25-2 4 6
1,2-2 1,6-2,5 4 6
1,2-2 2,5-4 6 10
2-3 4-6 8 16

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3,4-4 6,5-8 12 20
3,6-5 7-10 12 20
4,6-7 9-13 16 25
6-9 12-18 20 35
8,8-13 17-25 25 50
12-18 23-32 40 63
15,5-20 28-36 40 80
16,6-22 30-40 40 100
20-42 37-50 63 100
40-55 48-65 63 100
46-60 55-70 80 125
53-68 63-80 80 125
68-79 80-93 100 160

5. DISJUNTORES MOTOR
Na protecção dos motores BT contra sobrecargas e curto-circuitos o conjunto relé
térmico-fusível é frequentemente substituído por disjuntores com disparadores
magneto-térmicos com uma curva de disparo adequada à protecção dos motores;
o disparador térmico (protecção contra sobrecargas) é insensível à corrente de
arranque dos motores e regulável, para ajuste à potência do motor. Os disjuntores
devem obedecer às Normas IEC 60898 (aplicações domésticas ou similares) e
60947 (aplicações industriais).
Estes disjuntores são vulgarmente designados por disjuntores motor e dispõem de
contactos auxiliares destinados a interromper o circuito de alimentação do contactor
em caso de actuação da protecção.
Na Figura 7 apresenta-se um exemplo de um disjuntor motor.

Regulação do
disparador térmico

Figura 7 – Disjuntor motor

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O Autor não segue o Novo Acordo Ortográfico.

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