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SERMÃO DA
SEXAGÉSIMA
A ACTUALIDADE DO PE. ANTÓNIO VIEIRA
Jorge Damasceno
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ÍNDICE
Mais do que um homem de Letras, o Pe. António Vieira, padre jesuíta, pregador,
missionário, diplomata, político e utopista é a figura mais representativa do pensamento
seiscentista português. Nascido em Lisboa partiu aos sete anos de idade com a família
para Baía, capital do Brasil nessa altura, e também a capital da produção de açúcar. O
pai, Cristóvão Vieira Ravasco, que tinha sido escrivão em Portugal, passou a ser
secretário da governação da colónia.
Vieira iniciou os estudos ao frequentar o colégio dos padres jesuítas. Em 1623,
com 15 anos, foge aos pais para ingressar na Companhia de Jesus, iniciando o
noviciado. Segundo o Prof. Hernâni Cidade, a veracidade desde episódio não está, no
entanto, documentada:
"Verídico episódio, o dessa evasão de noctâmbulo? É possível que sim; mas possível, também,
que seja invenção romanesca, consoante a maneira de considerar tais coisas que no tempo em que
escrevia o seu primeiro biógrafo se supunha a mais própria para edificar as almas, por se encarar o
caso como indício claro da vocação irresistível do rapazinho, da predestinação divina que o
encaminhava."1
Seja qual for a nossa aceitação do grau de veracidade histórica deste episódio,
sabe-se que aos 17 anos fez voto de "gastar toda a vida na conversão dos gentios e
doutrinar novamente aos convertidos"; mas há um pormenor que nos convida a rejeitar
a ideia de que se trata de uma invenção romanesca: trata-se do noviciado, não era uma
decisão banal a impressionante determinação com que nesta altura se enfrentava a
dificílima fase do noviciado numa ordem religiosa como era a Companhia de Jesus:
"Os dois anos de noviciado são de pura provocação para os alunos; tudo durante esse tempo
tende a abolir as relações existentes com o mundo exterior. O neófito pertence em corpo e alma à
Companhia; nenhum acto que não esteja de antemão regulado pelos superiores, nenhum pensamento
que não seja por eles sugerido ou perscrutado ... Do romper do sol à hora de adormecer, todos os
momentos têm a sua ocupação prevista; nenhum para a recordação dos pais, dos amigos, dos interesses
que até aí prendiam à vida comum o iniciado." 2
1
Hernâni Cidade, Padre António Vieira, Obras Escolhidas, Vol. I,, Prefácio, p. XII.
2
Id., p. XVI.
4
vem documentada na sua obra monumental, duzentos sermões, meio milhar de cartas,
numerosos relatórios, etc.
3. VIEIRA E A INQUISIÇÃO
Qualquer dialecta brilhante, pensador utopista, e espírito progressista como era o
caso de Vieira, produzia, consequentemente, textos caracterizados pelo rigor das
3
M. Scotton de Bassano, Os Jesuítas, (tradução), Lisboa, 1888.
5
"A circunstância de tal escrito haver sido denunciado à Inquisição haveria feito recuar a outro
que não tivesse a sua pugnacidade. Vieira, porém, é antes estimulado à elaboração da obra reveladora,
em cuja larga e decisiva projecção em toda a Igreja Católica ele punha toda a desmedida confiança ... "
4. SERMÃO DA SEXAGÉSIMA
O Sermão foi pregado na Capela Real, em 1655. Vieira faz a sátira à arte
oratória da época, podendo ser, assim, o Sermão da Sexagésima considerado um meta-
sermão. Especialmente visados são os pregadores dominicanos, assim como os
sacrifícios a que se expõem os missionários:
"Entre os semeadores do Evangelho há uns que saem a semear, há outros que semeiam sem sair.
Os que saem a semear são os que vão pregar à Índia, à China, ao Japão; os que semeiam sem sair são
os que se contentam com pregar na Pátria. [...] Os de cá, achar-vos-ei com mais paço; os de lá com
mais passos"
"Dizei-me pregadores (aqueles com quem eu falo, indignos verdadeiramente de tão
sagrado nome), dizei-me: Esses assuntos inúteis que tantas vezes levantais, essas empresas ao vosso
parecer agudas que prosseguis, achaste-las alguma vez nos Profetas do Velho Testamento, ou nos
Apóstolos e Evangelistas do Testamento Novo, ou no autor de ambos os Testamentos, Cristo? - É certo
que não, porque desde a primeira palavra do Génesis até à última do Apocalipse não há tal cousa em
todas as Escrituras."
4
Hernâni Cidade, Padre António Vieira, Obras Escolhidas, Vol. VIII - História do Futuro, Prefácio, p.
XII.
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"Tudo isto padeceram os semeadores evangélicos da Missão do Maranhão, de doze anos a esta
parte. Houve missionários afogados, porque uns se afogaram na boca do grande rio das Amazonas;
houve Missionários comidos, porque a outros comeram os bárbaros na Ilha dos Aroãs; houve
missionários mirrados [...] da fome e da doença"
Para além dos diversos aspectos que envolvem este sermão, as citações bíblicas
constituem um elemento muito especial que confere ao texto, não só uma força e uma
autenticidade religiosas, como também uma grande riqueza, uma chuva intensa,
persistente e fértil, muito produtiva
BIBLIOGRAFIA
Cidade, H., Padre António Vieira, Obras Escolhidas, Sá da Costa Ed., Lisboa, 1951.
Pradt, M, Jésuitisme Ancien et Moderne, A. Leroux et Chautpie, Ed., Paris, 1826.
Leite, S., Suma Histórica da Companhia de Jesus no Brasil, Junta de Investigações do
Ultramar, Lisboa, 1965.
Ferreira, Maria E.T., Antologia Literária, Ed. Aster, Lisboa, s.d.
Saraiva, A.J., História da Literatura Portuguesa, Porto Ed., 8ª ed., Porto, 1975.
Bassano, M., Os Jesuítas, (traduç